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Administração Contábil e Financeira

TEORIA DAS E
-
RESTRIÇOES
CONTABILIDADE GERENCIAL:
INTERLIGANDO CONTABILIDADE A
-
PRODUÇAO

José Augusto Veiga da Costa Marques


Doutor pela EAESP/FGV e Professor dos
cursos de pós-graduação e graduação da
EGN/UFRJ e do IAG/PUC.

Joanília Neide de Sales Cia


Doutoranda na EAESP/FGV, Professora e
Consultora de Empresas.

RESUMO: Como instrumento de apoio à contabilidade gerencial, a teoria das restrições significou uma evolução
dos métodos de rateio existentes em razão das mudanças ocorridas no ambiente de manufatura. A escolha da
combinação de produtos a serem fabricados emprega uma medida até então esquecida pelos contadores: o ganho
por unidade do recurso restritivo.

ABSTRACT: As a supporting instrument of management accounting, theory of constraints meant an evolution of


allocation procedures due to changes in manufacture plant. The mix of goods to be processed takes a measure that
has been forgotten by accountants: the gain by unit of bottleneck output.

PALAVRAS-CHAVE: teoria das restrições, contabilidade gerencial, restrição, avaliação de desempenho.

KEY WORDS: theory of constraints, management accounting, performance evaluation.

São Paulo, v. 38, n. 3, p. 34-46 J uL/Set. 1998


34 RAE - Revista de Administração de Empresas
TEORIA DAS RESTRIÇÕES E CONTABILIDADE GERENCIAL

ASPECTOS INTRODUTÓRIOS EVOLUÇÃO DOS MÉTODOS DE


CUSTEIO DE PRODUTOS
Dentre as mudanças mais importantes
surgidas no âmbito das práticas contábeis Tornou-se nítida a mudança do
recentes destacam-se as introduzidas pelos paradigma, mas as companhias relutavam em
novos instrumentais colocados à disposição mudar seus sistemas de informação
da contabilidade gerencial, em especial as contábeis, notadamente aqueles referentes ao
metodologias de rateio dos custos de fabri- custeio de seus produtos. A atribuição de
cação dos produtos desenvolvidas a partir valores "verdadeiros" aos produtos passou a
dos anos 80: o custeio com base em ativida- constituir um dos principais objetivos da
des (activity-based costing - ABC) e o cri- Contabilidade, tanto para a divulgação em
tério com base na Contabilidade dos suas demonstrações financeiras periódicas -
Ganhos (throughput accounting - TOC). o montante do estoque final (em agregado
Os métodos clássicos de custeio - por no balanço e parcialmente aberto por tipo de
absorção e direto - ainda permanecem como estoque em nota explicativa) e do custo dos
os mais utilizados pelas empresas para fins produtos vendidos (na demonstração de re-
de evidenciação externa e gerência interna, sultados) - quanto como base para decisão
respectivamente, a despeito de suas limita- sobre o mix ótimo de produtos. A própria
ções cada vez mais evidentes em ambientes margem operacional bruta compunha o elen-
econômicos de acentuada competitividade. co das medidas de avaliação de desempenho
Da mesma forma, o ambiente de produção mais relevantes.
também se transformou, o que contribuiu
para a mudança na composição relativa dos ...........................................
. custos industriais. Não obstante, ambas as
metodologias permaneceram até certo pon- GOLDRATT CRITICA A FIXAÇÃO
to estáticas em face da nova realidade.
A partir dos anos 80, contudo, começa- PELO CÁLCULO DO "CUSTO DO
ram a proliferar estudos - a maior parte de PRODUTO" DEVIDO AOS RATEIOS
natureza acadêmica - ressaltando a
inadequação dos instrumentos convencionais INERENTES À SUA OBTENÇÃO,
adotados pela Contabilidade Gerencial e, EMBORA O "CUSTO TOTALMENTE
sobretudo, os efeitos das decisões derivadas
destes instrumentais sobre a posição econô- VARIÁVEL" REPRESENTE, DO
mica e financeira das empresas. MESMO MODO, UM "CUSTO DO
No chão de fábrica, cada vez mais os
engenheiros de produção se distanciavam PRODUTO". ENTENDE-SE, EM
dos contadores. As informações extraídas da TERMOS APARENTES, QUE O
contabilidade não coincidiam com os plane-
jamentos da produção, embora ambas hou- AUTOR NÃO ACREDITA NOS
vessem partido dos mesmos conjuntos bási- RATEIOS DE CUSTOS AOS
cos de dados. Por exemplo, a elevação do
estoque final de produtos acabados ou em PRODUTOS, E NÃO DO CUSTO DO
processo era considerada um bom indicador PRODUTO PROPRIAMENTE DITO.
para o contador, haja vista aumentar o ativo
total da entidade e permitir o pleno atendi- ........................................
mento às iminentes requisições (solicitações
dos clientes ou das estações de trabalho sub- Alguns daqueles estudos, em adição, dis-
seqüentes). Ao contrário, o engenheiro per- seminaram novas metodologias de custeio
cebia aquela elevação como um fator gera- tidas como mais apropriadas ao ambiente
dor de custos e despesas, ou seja, o ativo industrial moderno - com predomínio, nos
cresceria pela capitalização (ativação) de países de origem, da manufatura sincroniza-
custos, ao passo que as despesas do período da e de alto grau de automação e informati-
seguinte seriam acrescidas pelos encargos zação. As práticas de economias de escala -
adicionais necessários para manutenção e produção no nível máximo de capacidade de
movimentação daqueles excedentes. modo a minimizar o custo unitário do insumo

© 1998, RAE - Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil. 35
- foram alinhadas às economias de escopo - de produtos de pequeno volume que deman-
a mesma máquina desempenhando várias davam substancial consumo de atividades,
funções simultaneamente. Foi neste contex- com incentivo à concentração de produtos.
to que a abordagem do custeio por ativida- Também em meados de 80, uma outra
des (ABC) se desenvolveu. abordagem passou a ser difundida em perió-
O ABC parte da premissa de que produ- dicos de renomada tradição como, entre ou-
tos consomem atividades, e estas consomem tros, Management Accounting. A exemplo da
recursos. Assim, as atividades surgem quan- anterior, esta abordagem pode ser entendida
do determinadas ações direcionadoras de como um aprimoramento em face do novo
custos acontecem, com o sacrifício de recur- ambiente e do custeio direto convencional:
sos. Por exemplo, diversas ações ocorrem o custeio com base na teoria das restrições.
diariamente nas empresas, que consomem
A TEORIA DAS RESTRiÇÕES
...............................
A abordagem metodológica criada pela
o ABC SIGNIFICA, EM teoria das restrições (theory oi constraints -
TOC) foi inicialmente introduzida por meio
ESSÊNCIA, UM da publicação do livro The goal, em 1985,
APRIMORAMENTO AO de autoria do físico israelense Eliahu M.
Goldratt, traduzido em diversos países.' Es-
CUSTEIO POR ABSORÇÃO crito sob a forma de romance, o livro des-
TRADICIONAL, MAS creve as experiências do autor (personifica-
do pelo protagonista Jonah) na elaboração de
REVESTIDO DE UMA métodos de otimização de processos indus-
ABORDAGEM MAIS triais, em especial pelo emprego do progra-
ma Optimum Production Technology (OPT)
SISTÊMICA. - uma aplicação metodológica de Pesquisa
............................... Operacional - desde 1980.2 A partir dessa
publicação, a abordagem expandiu-se para
recursos na execução do trabalho dos empre- outras áreas da empresa, inclusive pela adi-
gados, expedição de produtos aos clientes, ção de novos instrumentais à contabilidade
requisições de materiais nas linhas de mon- gerencial.
tagem etc. No rateio, os custos totais ineren- Embora recente, a teoria das restrições
tes a cada atividade são distribuídos aos pro- pode ser dividida em três campos distintos:
dutos de acordo com o número de vezes que 1. Um conjunto de ferramentas destina-
foram desempenhadas em suas fabricações. das à solução de problemas gerenciais: estes
Em outras palavras, o custo indireto de fa- instrumentos são denominados Processos de
bricação (CIF) associado a cada atividade Raciocínio da TOC (Thinking Processes -
seria distribuído aos produtos proporcional- TP) e são empregados de modo a responder
mente ao número de vezes que este a reque- lógica e sistematicamente às três questões
reu. O custo do produto resultaria do essenciais de qualquer processo de melhoria
somatório dos CIFs proporcionais consumi- de resultados: "o que mudar", "para o que
dos pelas atividades. Na prática, todavia, mudar" e "como causar a mudança".
apenas aquelas atividades mais dispendiosas 2. Um subconjunto de ferramentas de
seriam rastreadas e valoradas para determi- gerenciamento do dia-a-dia, extraídos dos
nação dos custos dos produtos. Processos de Raciocínio, usados para aper-
O ABC significa, em essência, um apri- feiçoar as habilidades gerenciais em pontos
moramento ao custeio por absorção tradicio- vitais como, por exemplo, comunicação (ne-
nal, mas revestido de uma abordagem mais gociação, viabilização de idéias), realização
sistêmica. Técnicas como JIT (Just in Time) de mudanças (resolvendo conflitos crônicos),
1. GOLDRATT, E. M., FOX, R. A meta. um
processo de aprimoramento contínuo. e TQM (Total Quality Management) foram empowerment (delegando efetivamente) e
São Paulo: Educato, 1993.
incorporadas à abordagem. Não obstante, a formação de equipes (para atingir objetivos).
2. Para maiores esclarecimentos preocupação pelo alcance do custo "verda- 3. Soluções inovadoras criadas a partir da
ver JAYSON, S. Goldratt & Fox:
deiro" do produto permaneceu. Essa fixação aplicação dos processos de raciocínio TOC
Revolutionizing. Management
Accounting, May 1987, p.18-22. levou muitas empresas a abandonarem linhas em áreas específicas, como produção (con-

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TEORIA DAS RESTRIÇÕES E CONTABiliDADE GERENCIAL

forme discutido no livro citado), distribui- retar em ganho imediato de dinheiro pelas
ção, marketing e vendas, gerência de proje- vendas. A taxa de retorno contábil irá cair,
tos e planejamento estratégico. além de aumentarem as despesas com arma-
A partir da adoção de conceitos simples zenagem e manuseio de materiais. Por outro
e usuais, a TOC estabeleceu uma integração lado, caso a organização opte por manufatu-
mais efetiva entre as áreas de Contabilidade rar somente 40 peças ao mês, o mercado ab-
e Produção, o que acabou por viabilizar a sorverá esse volume sem reflexos no acrés-
tomada de decisões mais eficazes, sempre cimo de despesas, mesmo às custas de man-
com vistas a atingir o objetivo primário de ter dado nível de ociosidade nos recursos A
qualquer negócio: ganhar dinheiro agora e e C. Em tal situação, a taxa de retorno do
sempre - a meta. mês será mais favorável.
O conceito-chave da TOC refere-se à A abordagem TOC recomenda que as res-
"restrição", ou seja, o fator que restringe a trições físicas sejam gerenciadas de acordo
atuação do sistema como um todo. Em es- com o seguinte processo decisório:
sência, restrição significa qualquer obstácu-
lo que limita o melhor desempenho do siste-
ma em direção à meta. Dois tipos de restri- 1. Identificação da(s) restrlção(ões), ou
ções podem ser identificadas: (1) físicas, as- seja, o(s) fator(es) que restrlnge(m) o
sociadas ao fornecimento de materiais, à ca- sistema.
pacidade produtiva, à logística e ao merca- 2. Definição de como explorar a(s)
do; e (2) não-físicas, ou políticas, ligadas a restrlção(ões) do sistema.
aspectos gerenciais e comportamentais, por
3. Subordinação de todos os aspectos às
meio das normas, procedimentos e práticas
decisões tomadas acima.
usuais.
4. Elevação da(s) restrlção(ões) do sistema.
Em condições usuais, as restrições físi-
cas são de mais fácil detecção, sendo conhe- 5. Retomo ao elo agora mais fraco, sem
cidas como "gargalos" (bottleneck) quando deixar que a Inércia se tome a nova
relacionadas à capacidade instalada de fa- restrição.
bricação.
Por exemplo, suponha que, numa deter-
minada empresa de vestuário, existam três No exemplo exposto, o fator que restrin-
recursos de produção (máquinas ou operá- ge o desempenho do sistema como um todo
rios), dispostos de acordo com o fluxo de é a máquina B (ou operário B, da costura).
produção mostrado na Figura 1. Identificada a restrição, a empresa deve ini-
Na hipótese de o mercado consumidor cialmente procurar aproveitá-la da melhor
absorver quaisquer quantidades de peças de forma possível, com ações do tipo: não per-
tecido fabricadas, o "recurso restritivo de mitir que se costurem peças com defeito de
capacidade" consiste no recurso B. Nesse corte; evitar que o recurso fique parado à
sentido, caso a firma produza uma quanti- espera de peças ou por outro motivo, como
dade acima de 40 peças ao mês, o efeito desta nos intervalos de almoço; ou, ainda, traba-
decisão será a formação de estoques inter- lhar apenas com as peças que precisem ser
mediários, mas não maiores vendas efetivas vendidas. A seguir deve-se subordinar os
do período. Tais estoques elevarão o total do recursos de não-restrição (A-corte e C-em-
ativo (investimento) da entidade, sem acar- balagem) ao ritmo da restrição (B-costura),

Figura 1 - Fluxo de produção

•• ••
Recurso A Recurso B Recurso C
Corte Costura Embalagem
Capacidade Capacidade Capacidade
= = =
60 peças/mês 40 peças/mês 100 peças/mês

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fornecendo apenas o suficiente para não pro- 7. O lote de transferência pode não ser, e
vocar paradas na costura (recurso B). muitas vezes não deve ser, igual ao lote pro-
Controlada a situação, a firma pode aumen- cessado. Em atividades industriais mais com-
tar a capacidade física, adquirindo outra má- plexas, o tamanho do lote a ser completamente
quina ou modificando-a de modo a aumentar processado por um recurso antes que este seja
seu nível de atividade. Após a implementação reconfigurado de modo a fabricar outro tipo
da primeira decisão, o nível de atividade glo- de produto pode não coincidir com o tamanho
bal crescerá até que alguma melhoria na restri- do lote a ser transferido de um recurso para
ção não reflita em aumento das vendas. Isto outro, e deste para o seguinte, dentro da linha.
significa que uma outra máquina e/ou operá- Essa flexibilidade poderia, segundo a aborda-
rio, ou ainda o mercado, toma-se a nova restri- gem TOC, diminuir o ciclo de fabricação e o
ção, devendo o processo ser reiniciado. nível médio dos estoques intermediários.
Ainda com base no exemplo sugerido, 8. O lote processado deve ser variável, e
algumas constatações parecem evidentes e não fixo. Uma vez que cada recurso realiza
comuns ao cotidiano das empresas: uma ou mais operações industriais, possivel-
1. Equilibrar o fluxo de produção, e não a mente suas características individuais (tama-
capacidade de produção. O fluxo sincronizado nho do lote de processamento) se diferenci-
de 40 peças ao mês não favoreceu a formação am. Logo, o lote manufaturado por cada re-
de estoques. Após a quebra da restrição, o novo curso deveria ser variável em relação a ou-
patamar de atividade ficaria mais alto. tro, inibindo a formação de estoques.
2. O nível de utilização de um recurso não- 9. Os planos de controle da produção de-
gargalo não é determinado por seu próprio po- vem ser estabelecidos pela percepção de to-
tencial, mas por qualquer outra restrição do sis- das as restrições simultaneamente. O tempo
tema. O nível de capacidade do recurso B de- despendido na produção é o resultado de um
terminou o nível global do sistema, ainda que quadro e não pode ser predeterminado. O pla-
os recursos A e C permanecessem ociosos. nejamento da produção requer, nesta abor-
3. A utilização e a ativação de um recur- dagem, a observação da(s) restrição(ões)
so não são sinônimos. A utilização dos re- existente(s) dentro e fora da linha de fabri-
cursos A e C correspondem a 40 peças se- cação de modo a se evitar atrasos nas requi-
manais, ao passo que suas "ativações" po- sições de material, em especial junto ao(s)
tenciais poderiam superar aquele nível de recurso(s) restritivo(s).
atividade determinado pela restrição B. Embora empiricamente simples e lógi-
4. Uma hora perdida num gargalo repre- cas, tais constatações camuflam um confli-
senta uma hora perdida para todo o sistema. to clássico entre dois mundos existentes no
Na hipótese do recurso B deixar de funcio- interior das organizações: o mundo dos
nar por um dia, em termos proporcionais, ganhos e o mundo dos custos.
duas peças (40 peças dividido por 20 dias
úteis) deixariam de ser fabricadas por dia, o MUNDO DOS GANHOS (TO C) E O
elevando a ociosidade dos outros recursos e MUNDO DOS CUSTOS (ABC E
reduzindo o nível máximo de produção para ABSORÇÃO)
38 peças (redução do ganho).
5. Uma hora economizada em um recur- Uma vez visualizados os efeitos das restri-
so não-gargalo é apenas uma miragem. Eco- ções sobre o desempenho do negócio, a TOC
nomizar o tempo de operação dos recursos estabeleceu uma comparação entre o mundo
A e C é irrelevante, uma vez que ambos es- dos custos - a visão convencional do processo
tão ociosos. A ociosidade destes recursos de tomada de decisões pela Contabilidade - e
pode contribuir para uma diminuição parcial o mundo dos ganhos - a nova abordagem, que
c das despesas operacionais, mas não afeta o enfatiza os ganhos - ao empregar de maneira
ganho do sistema. didática a analogia da corrente.
6. Os gargalos governam o fluxo de pro- Em condições habituais, o objetivo de qual-
dução e o nível dos estoques. Caso a empre- quer corrente diz respeito à sua capacidade de
sa restrinja o nível de produção do sistema transmitir esforço sem se partir. No mundo dos
ao do recurso B, não surgirão estoques de custos, a principal medida de avaliação de de-
produtos em processo. Não há, pois, incenti- sempenho consiste no custo-padrão e na análi-
vo à formação de estoques. se das variâncias, o que significa que as deci-

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TEORIA DAS RESTRIÇÕES E CONTABiliDADE GERENCIAL

sões para alcance da meta visam a redução dos de análise de eficiências ou disfunções no
custos, que, na analogia, corresponderia à re- emprego dos recursos. Em adição, a ênfase
dução de peso da corrente. Controlar os pa- pela otimização dos insumos resulta em maio-
drões de custos de fabricação no intuito de di- res níveis médios relativos de estoque, bem
minuir o custo total equivale à diminuição do como das despesas adicionais na sua movi-
peso da corrente via redução do peso de al- mentação, manutenção e manuseio, além do
gum elo independente. As características des- acréscimo às perdas (defeitos, quebras e
ta abordagem seriam assim resumidas: obsolescência). Por conseguinte, parte-se do
pressuposto de que a elimina-
ção da ociosidade de qualquer
Qualquer melhoria em qualquer elo da recurso contribuiria para a ele-
corrente melhora a corrente. A redução de vação do ganho global da enti-
peso melhora o todo. A melhoria global dade, o que, em verdade, so-
representa o somatório das melhorias locais mente ocorreria se este repre-
Individuais. Tudo é possível na melhoria sentasse o fator restritivo.
global. Na visão do mundo dos
ganhos, apenas a máxima utili-
zação do recurso restritivo de
Segundo ficou evidenciado no exemplo, capacidade (gargalo) determinaria o desem-
entretanto, o controle dos custos inerentes penho global do negócio. Ao se manter a má-
aos recursos A e C não se traduziu em xima eficiência neste recurso - mesmo em
melhoria efetiva no ganho do negócio. Au- detrimento de níveis de ociosidade nos de-
mentar a capacidade de fabricação destes mais -, a receita permaneceria estabilizada,
recursos não resultaria em acréscimo às ven- mas a diminuição relativa dos custos e des-
das, mas sim em maiores estoques de pro- pesas poderia ser expressiva, elevando o re-
dutos em processo. A melhoria global so- sultado global.
mente seria conseguida se o recurso B ma-
nufaturasse mais de 40 peças ao mês. MEDIDAS CONTÁBEIS DE
Do lado inverso, no mundo dos ganhos, DESEMPENHO NA TOC
a entidade compõe-se de sub-sistemas, os
elos, ao passo que as decisões visam ao au- A abordagem TOC apresenta outra ana-
mento da resistência da corrente, e não à re- logia com a finalidade de associar a meta
dução de seu peso. Logo, somente o fortale- da empresa às medidas de desempenho dis-
cimento de seu elo mais fraco determinaria poníveis. Nesse sentido, supondo-se que a
a resistência do sistema no intuito de organização deseje adquirir uma "máquina
maximizar a capacidade da corrente na trans- de fazer dinheiro", com certeza a decisão
missão de esforço. Em outras palavras: seria por aquela que produzisse o maior
volume de recursos (lucro lí-
quido) em proporção ao capi-
A maioria das melhorias na maioria dos elos tal despendido (investimento).
do sistema não melhora a corrente. A Esta decisão de lucratividade
o melhoria global difere do somatório das se fundamenta em três concei-
melhorias locais. A Identificação da(s) tos, como mostra a Figura 2:
c:x::x::::o restrlção(ões) e os outros quatro passos de 1. Ganho (throughput): diz
otimização das restrições físicas capacita a respeito ao dinheiro gerado pelo
melhoria do sistema.
sistema durante o período. Em
condições normais, a receita
operacional líquida se converte
em disponível em prazo relati-
Em verdade, na visão tradicional busca- vamente curto, assim como expressiva par-
se a máxima eficiência na utilização dos fa- cela das encargos variáveis o consome. O
tores de produção - economias de escala -, ganho deriva-se da diferença entre a receita
reduzindo ao máximo seu custo por unidade líquida e os "custos totalmente variáveis".
de produto. A diferença entre valores reais e 2. Despesas operacionais: correspondem
padrões preestabelecidos representa objeto aos custos e despesas incorridos no proces-

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Figura 2 - Medidas contábeis da TOe tabilidade financeira convencional, exceto
pelos estoques. Estoques na Contabilidade
dos Ganhos, como no custeio direto, abran-
Ganho gem somente os custos totalmente variáveis,
(vendas - matéria-prima) os quais também têm sido incluídos no re-
gistro dos custos das vendas.
A Despesa Operacional consiste de to-
(Investimento) das as despesas (e custos) que não são
deduzidas na obtenção do ganho. A soma das
despesas operacionais e das deduções da
receita na determinação do ganho é idênti-
ca à soma das despesas reconhecida na de-
monstração de resultado sob o custeio por
absorção convencional, exceto pelo registro
dos custos adicionais capitalizados em esto-
ques sob a contabilidade financeira conven-
so de transformação de matérias-primas em cional. "3
produtos acabados que não sejam "totalmente
variáveis" . Em síntese, o ganho na abordagem TOe
3. Investimento (ativo): recursos que, em expressa, na vasta maioria dos casos analisa-
algum período, serão empregados no esfor- dos, a diferença entre a receita operacional
ço de gerar receita. Numa avaliação conser- líquida e o custo da matéria-prima. Por sua
vadora, poderia significar o montante do ati- vez, o investimento equivale ao ativo total di-
vo operacional médio. vulgado para o período menos o eIF fixo ra-
O emprego das medidas contábeis na abor- teado no custeio por absorção. Já a despesa
dagem TOe pode ocorrer com pequenas mo- operacional inclui todas as despesas e custos
dificações, dependendo do segmento de ne- fixos ou semifixos. Não obstante, a forma de
gócio envolvido. Em estudo sobre a imple- registro de determinados eventos - como ar-
mentação da abordagem TOe em empresas rendamento mercantil, P&D, treinamento de
industriais européias e norte-americanas, pessoal, amortização de intangíveis e campa-
Noreen, Smith & MacKey constataram que: nhas de propaganda - poderia alterar de ma-
neira acentuada os montantes do investimen-
"A definição oficial corrente de ganho é to e da despesa operacional, a exemplo da prá-
receitas menos 'custos totalmente variáveis. tica cotidiana (legislação societária em opo-
Contudo, na maior parte da literatura TOC, sição aos princípios contábeis).
ganho tem sido conceituado como receitas Por outro lado, os três conceitos derivam as
menos o custo do material direto. Na práti- medidas de desempenho abaixo relacionadas:
ca, observamos ambas as versões em uso. 1. Lucro líquido do período: obtido da
Algumas empresas deduzem apenas o custo diferença entre o ganho e os custos (e as des-
do material direto das receitas de modo a pesas operacionais), significa uma medida
chegar ao ganho, enquanto outras deduzem absoluta de lucratividade para avaliação do
outros custos variáveis como mão-de-obra nível de geração de dinheiro pelo sistema;
subcontratada, despesas variáveis de ven- 2. retorno sobre o investimento: resul-
das e custos variáveis de expedição. A ver- tante da divisão entre o lucro líquido e o in-
são mais simples pode ser utilizada haja vestimento empregado; corresponde à medi-
vista não existirem outros custos variáveis da relativa de lucratividade do modelo;
relevantes além do material direto. Suspei- 3. fluxo de caixa: medida absoluta de
tamos, todavia, que alguns gerentes têm liquidez; por aproximação, pode ser
empregado a definição mais simples conseguida pela dedução ao capital de giro
apenas porque é a definição usada na das operações da variação positiva líquida
maior parte da literatura TOC. Não dos ativos circulantes (exceto disponível) e
aprofundamos essa questão nesta área inclusão da variação positiva líquida dos
3. NOREEN, Eric, SMITH, D., MACKEY, J. de investigação. passivos circulantes. Representa uma condi-
T. The theory ot constraints and its
Ativos (investimento) na Contabilidade ção necessária à manutenção de níveis ade-
imp/ications for management acco/Jnting.
s.l., The North River Press, 1995. p.13. dos Ganhos são idênticos aos ativos da con- quados às medidas de lucratividade.

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TEORIA DAS RESTRIÇÕES E CONTABILIDADE GERENCIAL

Dentro destes princípios, a TOC desen- uma questão de tradição acadêmica do que
volveu uma ferramenta de medição, deno- de resistência à mudança. Em termos lite-
minada bússola," que possibilita determinar rais, toda a literatura contábil existente as-
o impacto financeiro de uma decisão espe- sociada à análise do custo-volume-lucro e
cífica. Desta forma, cada pessoa conta com custeio direto incorpora a MOD aos encar-
um mecanismo coerente para a tomada de gos variáveis. Sua adaptação tornaria ambas
decisão, com o qual é induzido a fazer o que as metodologias equivalentes, nas medidas
é bom para a organização como um todo, se- gerais de desempenho.
guindo sempre a direção da meta de ganhar
dinheiro hoje e sempre.

A TEORIA DAS RESTRiÇÕES E O


EM QUALQUER LINHA DE
CUSTEIO DIRETO
MANUFATURA EXISTE PELO MENOS
Como pode ser notado, em muitos aspec-
UM RRC. MESMO ASSIM, OS
tos a abordagem TOC se aproxima do cus-
teio direto no tocante às medidas de desem- ESTOQUES DE PROTEÇÃO DEVEM
penho. A nova visão representaria, assim,
SER PLANEJADOS EM DOIS
uma metodologia radicalmente inovadora em
face das técnicas contábeis hoje conhecidas? LUGARES: (A) ANTES DO RRC E (B)
Certamente não. A abordagem TOC signifi-
APÓS O ÚLTIMO RECURSO (NÃO-
ca, sim, uma evolução ao método de custeio
direto, mas revestida por uma visão sistêmica GARGALO) A FIM DE ATENDER ÀS
- à semelhança da evolução do custeio por
DEMANDAS RANDÔMICAS DO
absorção para o ABC. Na opinião de Noreen,
Smith & MacKey: MERCADO.

"Ao nível conceitual, o ganho não se


distingue da margem de contribuição. O
ganho consiste da receita menos os 'cus- Um aspecto curioso diz respeito à inter-
tos totalmente variáveis', e a definição pretação daqueles autores acerca da postura
geral de margem de contribuição é recei- de Goldratt sobre "custo do produto":
ta menos os custos variáveis. Também ao
nível conceitual, não existem diferenças "Como outros críticos das práticas de
entre a Contabilidade dos Ganhos e o cus- contabilidade de custos tradicionais,
teio direto. Na prática, porém, existe uma Goldratt acredita que o custeio por absor-
diferença relevante - o tratamento do custo ção usual foi razoavelmente exato nos
da mão-de-obra direta. Na Contabilidade primórdios da contabilidade de custos, quan-
dos Ganhos o custo da mão-de-obra dire- do o custo da mão-de-obra direta era variá-
ta não é deduzido quando computado o vel e existia um reduzido overhead. Todavia,
ganho e não é capitalizado ao estoque. Ao mão-de-obra agora é largamente fixa e o
invés, é incluído como parte das despesas overhead tem se tornado uma grande parce-
operacionais. O tratamento usual no cus- la do custo total. Goldratt critica a compa-
teio direto consiste em considerar mão-de- nhia, assim como aqueles que advogam o
obra direta um custo variável. Entretanto, custeio por atividades como um meio de res-
esta é apenas uma convenção e, caso a taurar a relevância da contabilidade de cus-
mão-de-obra direta seja considerada fixa tos, por não acreditar que o custeio por ati-
sob o custeio direto, então este custeio se- vidades pode fornecer respostas confiáveis
ria igual à Contabilidade dos Ganhos, à questão 'Qual impacto a decisão terá so-
alheio ao modo com que umas poucas con- bre os ganhos, as despesas operacionais e
tas são trabalhadas."? os ativos?'.
4. Esta ferramenta é estudada no seminá-
De modo a nos livrar do tipo de racioci- rio "Mundo dos Ganhos", ministrado pelo
Em verdade, a inclusão no custeio direto nio que conduz aos custos dos produtos to- AGI - Instituto Goldratt do Brasil.
da mão-de-obra direta (MOD) no conjunto talmente distribuídos, Goldratt acredita 5. NOREEN, Eric, SMITH, O., MACKEY, J.
dos custos e despesas variáveis tem sido mais que se torna necessário expurgar o termo T. Op. cit., p.13-4.

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'custo do produto' de nosso vocabulário. Ele SISTEMA LOGíSTICO DO TAMBOR·
está certo de que não existe uma coisa como PULMÃO·CORDA
custo do produto na realidade, embora de-
duza os 'custos totalmente variáveis' das Goldratt & Fox desenvolveram um siste-
receitas de maneira a chegar ao ganho para ma logístico denominado tambor-pulmão-cor-
um produto. "fi da, o qual passou a representar a interligação
entre a Contabilidade e a Produção. Tal siste-
Ou seja, Goldratt critica a fixação pelo ma limita o planejamento do fluxo de produ-
cálculo do "custo do produto" devido aos ra- ção à restrição física da linha, denominada
teios inerentes à sua obtenção, embora o "cus- recurso restritivo de capacidade (RRC):
to totalmente variável" represente, do mesmo
modo, um "custo do produto". Entende-se, em "Em qualquer fábrica existem uns poucos
termos aparentes, que o autor não acredita nos recursos restritivos de capacidade (RRCs) -
rateios de custos aos produtos, e não do custo os soldados mais fracos. Esta percepção do
do produto propriamente dito. RRC reconhece que tais restrições decidirão
O Quadro 1 mostra uma comparação de a taxa de produção de toda a fábrica. Assim,
custeio variável com contabilidade do ganho.' permita-nos tratar o principal recurso
As duas posições - mundo dos custos e restritivo como o tambor. Sua taxa de produ-
dos ganhos - diferem de modo acentuado ção servirá como um ritmo para toda a ma-
quanto à ênfase em cada um dos três concei- nufatura. Também precisaremos estabelecer
tos citados. No mundo dos custos, enfatiza- um estoque de proteção para cada RRC. Esse
se relativamente mais a redução das despe- nível de segurança será constituído apenas
sas operacionais, haja vista serem de mais do estoque necessário para manter o RRC
direto controle da Administração. Em segun- ocupado durante o próximo intervalo de tem-
do nível ficam as decisões ligadas a ganhos po predeterminado (iremos nos referir como
e, por último, aquelas associadas ao investi- pulmão a este tempo de proteção). Em conse-
mento empregado. qüência, este pulmão produzirá o tempo de
Em contraste, no mundo dos ganhos, a processamento da fábrica contra qualquer
ênfase maior recai sobre o ganho, em tese disfunção que possa ocorrer dentro do inter-
considerado de crescimento infinito. Em se- valo de tempo predeterminado".
guida, as decisões voltam-se para as despe-
sas operacionais, as quais possuem um limi- De modo a assegurar que aquele estoque
te máximo de redução sem que o ganho seja não crescerá acima do nível estabelecido pelo
afetado. Por último, permanecem as decisões pulmão, devemos limitar a taxa na qual a
relacionadas a investimento. matéria-prima é transformada na manufatura.

Quadro 1 - Comparativo da contabilidade de ganho X custeio variável

Custeio variável Custeio varfável com mão-de-obra Contabilidade " Contabilidade .dó
cOl,lveneional direta classificada como fix:~ do ganho ganho simplificada

Receita Receita Receita Receita

H Materiais H Materiais H Custos H Materiais


diretos diretos totalmente diretos
H Mão-de-obra variáveis
direta
H Despesas H Despesas
administrativas' administrativas'

= Margem de = Margem de = Ganho = Ganho


contribuição contribuição
(-) Despesas (-) Despesas H Despesa H Despesa
fixas fixas operacional operacional

-- Lucro -- Lucro -- Lucro -- Lucro


6. ldern, p.23-4.

7. Idem, Ibidem. "Despesas gerais e administrativas tanto de produção como de não-produção.

42 RAE· v.38 • n. 3 • Jul./Set. 1998


TEORIA DAS RESTRIÇÕES E CONTABiliDADE GERENCIAL

Uma corda deveria ser amarrada do RRC à Do ponto de vista contábil e da produ-
primeira operação. Em outras palavras, a taxa ção, as informações relevantes são listadas
na qual da operação inicial a matéria-prima abaixo:
se transforma em produto acabado seria dita-
da pela taxa em que o RRC está produzindo. • O investimento total empregado pela
empresa corresponde a R$ 160 mil.
"Tais conceitos parecem sonoros, assim, A empresa tem uma unidade de cada re-
permita-nos derivar um procedimento de curso.
modo a implementar a abordagem logística • Cada recurso pode ser utilizado durante
do RRC, o sistema tambor-pulmão-corda, na 8 horas ao dia, nos 5 dias da semana, num
fábrica. Um bom sistema logístico deveria total de 2.400 minutos (8 ' 5 ' 60).
possuir os meios (planos e quadros de pro- Os gastos incorridos por semana signifi-
dução) a fim de controlar o fluxo de materi- cam:
ais dentro, através efora das indústrias sem (a) mão-de-obra direta: 4 operários, 40 ho-
relação a quanto complicados possam ser. ras semanais, com taxa horária de R$ 5,
Este representa justamente o procedimento totalizando R$ 800 (4 ' 40 ' 5);
que necessitamos desenvolven'" (b) custos indiretos de fabricação: pelo total
de R$ 5.200.
Com base neste raciocínio, em qualquer li-
nha de manufatura existe pelo menos um RRC. Ou seja, somando MOD e CIF tem-se
Mesmo assim, os estoques de proteção devem como resultado R$ 6 mil.
ser planejados em dois lugares: (a) antes do
RRC, segundo explicado pelos autores, e (b) • Conforme a figura divulgada (Figura 3),
após o último recurso (não-gargalo), a fim de pode-se calcular os tempos de fabricação
atender às demandas randômicas do mercado. de ambos os produtos:
(a) P = 15 + 10 + 10 + 15 + 5 = 55 minutos
SIMULAÇÃO: EMPRESA por cada peça;
INDUSTRIAL P&Q (b) Q = 15 + 5 + 5 + 10 + 15 = 50 minutos
por peça.
Como forma de realizar uma análise com-
parativa sobre os efeitos contábeis das deci-
sões gerenciais obtidas com base nas abor-
...... '" .
dagens convencional e da TOC, o exemplo
da firma P&Q9 foi transcrito a seguir: o EMPREGO DA MEDIDA "GANHO
UNITÁRIO NO GARGALO" TEM
A empresa industrial P&Q Ltda.fabrica
e vende os produtos P e Q. Essa firma atua FICADO AUSENTE DA LITERATURA
em condições ideais, ou seja, só fabrica os CONTÁBIL TRADICIONAL DESDE
dois produtos, possui um mercado consumi-
dor firme, os preços são fixos, há disponibi- HÁ MUITO.
lidade ilimitada de matéria-prima, as má-
quinas não quebram e não existe refugo no
..........................................
processo de industrialização.
A demanda semanal pelo produto P cor- A questão a ser resolvida diz respeito a
responde a 100 unidades, ao preço unitário qual combinação de produtos maximizaria
de R$ 90, ao passo que para Q significa 50 o resultado líquido semanal da empresa.
peças, ao preço de R$ 100 cada. Afirma utili- Pela abordagem convencional (custeio
za as máquinas (recursos de produção) A, B, por absorção), seria considerado preferí-
C e D de modo a transformar as matérias-pri- vel aquele produto com maior margem bru-
mas MP 1, MP2, MP 3 e MP4 em produtos aca- ta. Pelo emprego do custeio direto, aquele
bados. As três primeiras custam R$ 20 cada que apresentasse a maior margem de con- 8. GOLDRATI, E. M., FDX, R. The rsce
unidade, enquanto a MP4 custa R$ 5. Os flu- tribuição - considerando a MOD como New York: North River Press, 1985. p.98.

xos dos processos, os preços, as quantidades variável. Pela adoção do custeio por ativi- 9. GOLDRATT, E. M. The Haystack
e os tempos despendidos na fabricação se en- dades, o mix seria composto a partir do pro- Syndrome: shifting inlormalion out 01lhe
data oceano New York: lhe North River
contram esquematizados na figura 3. duto de maior margem total (receita me- Press, 1990.

RAE· v.38 • n.3 • Jul./Set. 1998 43


nos custo total ponderado pela quantidade distribuição dos R$ 5.200 proporcionalmen-
de atividades consumidas). Por fim, com te ao custo total da MOD para aquelas quan-
base na abordagem TOC, a seleção levaria em tidades de produto. Assim, a margem bruta
conta aquele que mostrasse o maior ganho de unitária equivaleria a R$ 4,67 para P e R$
acordo com suas restrições inerentes (ganho 23,33 para Q. Em decorrência, com base no
no gargalo). Nesta última visão, a decisão se- custeio por absorção, a ênfase recairia so-
ria obtida a partir da análise do recurso bre o produto Q.
restritivo de capacidade (RRC). Contudo, a empresa possui determina-
Os cálculos a seguir evidenciam os re- das limitações da planta quanto à fabrica-
sultados dos diferentes métodos de custeio, ção desses produtos naquelas quantidades.
bem como os conflitos envolvidos. Uma vez Na hipótese daqueles volumes serem ma-
que o mercado potencial pode absorver 100 nufaturados, a máquina B teria de ser utili-
unidades do produto P e 50 unidades de Q, zada em horário superior a sua capacidade
os custos unitários da matéria-prima (MP) semanal, ultrapassando as 2.400 horas dis-
e da mão-de-obra direta (MOD) de cada pro- poníveis em 25%. As demais máquinas ain-
duto seriam obtidos com o auxílio do fluxo da permaneceriam ociosas. Logo, o recurso
de produção exposto. Já o custo indireto de que restringe a capacidade da fábrica con-
fabricação unitário (CIF) seria obtido pela siste na máquina B.

Figura 3 - Empresa P&Q recursos produtivos

CJ
P
DEMANDA = 100 DEMANDA = 50
PREÇO DE VENDA = $ 90 PREÇO DE VENDA::: $100

MP4 - Botão
R$5 ~-------------,
D - Embalagem ·10 min D • Embalagem· 5 mln

I~,
1....//

c . Costura· 10 min C • Costura· 5 mln B· Bordado ·15 mln

/
'Cc::.
A - Corte· 15 mln B • Bordado· 16 mln A· Corte ·10 mln

MP1 - Seda MP2 - Algodão MP3 - Rami

R$ 20 R$ 20 RS 20

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TEORIA DAS RESTRIÇÕES E CONTABILIDADE GERENCIAL

Haja vista essa restrição, a prioridade seria pectivos preços deduzidos de seus custos to-
a produção de 50 unidades de Q, o que consu- talmente variáveis, a MP), Q seria preferí-
miria 1.500 horas do tempo disponível sema- vel a P: ganhos de R$ 60 e R$ 40, respecti-
nal de B. As 900 horas restantes se destinariam vamente. Não obstante, ao se considerar o
à fabricação de P. Ou seja, a composição "óti- RRC neste cálculo, verifica-se que P possui
ma" abrangeria 50 unidades de Q e apenas 60 um ganho unitário de R$ 3 no gargalo, en-
unidades de P. Tal composição levaria a firma a quanto Q, somente R$ 2. Desse modo, a ên-
um prejuízo contábil de R$ 300 por semana. fase recairia sobre a produção de P. O mix
O mesmo raciocínio poderia ser aplicado ao seria composto de 100 unidades de P e ape-
custeio direto, que considera, por convenção, a nas 30 de Q. Essa combinação conduziria a
MOD como variável. A margem de contribui- firma a um lucro líquido de R$ 300.
ção do produto Q também supera aquela obtida A despeito de sua simplicidade, o exemplo
para P. Por sua vez, a adoção do sistema ABC citado confirma a necessidade de uma maior
como um aprimoramento ao custeio por absor- integração entre as práticas contábeis geren-
ção, enfatizaria o produto Q da mesma maneira. ciais e as medidas de desempenho oriundas da
Ao contrário, na abordagem da TOC, a produção. O emprego da medida "ganho uni-
decisão seria condicionada ao ganho por uni- tário no gargalo" tem ficado ausente da litera-
dade de produto no uso do recurso B. Ob- tura contábil tradicional desde há muito.
servando-se apenas o montante dos ganhos Serão mostradas a seguir as tabelas de
unitários dos dois produtos (no caso, os res- cálculo do exemplo.

TABELAS DE CÁLCULO DO EXEMPLO P&Q


a) Abordagem tradicional

Tabela 1 - Demonstração de resultado

P Q
"p ,~o Q e+Q
t-
Unitário Total Total
Quantidade 100 50

Receita de vendas 90,00 100,00 9.000 5.000 14.000


Custo das vendas (85,33) (76,67) (8.533) (3.833) (12.367)
Matéria-prima (45,00) (40,00) (4.500) (2.000) (6.500)
MãO-de-obra direta (4,58) (4,17) (458) (208) (667)
Custos indiretos fabricação (35,75) (32,50) (3.575) (1.625) (5.200)
Margem bruta 4,67 23,33 467 1.167 1.633

Tabela 2 - Cálculo de capacidade de fabricação

q('mi~1' x50
-----
§Ir
Oi;; ~-~ Toral
.- P(min) x 100 / 2.400 Pofencial
Recurso A 15 1.500 10 500 2.000 83% Ocioso
Recurso B 15 1.500 30 1.500 3.000 125% Excesso
Recurso C 15 1.500 5 250 1.750 73% Ocioso
Recurso D 10 1.000 5 250 1.250 52% Ocioso

Tabela 3 - Cálculo da utilização do recurso B (restrição)

Minutos de B para 50 unidades Q 1.500 Mix otimizante


Minutos restantes para P = (2.400 -1.500) 900 P(u) 60
Quantidade possível de P = (900/15) 60 Q(u) 50

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45
Tabela 4 - Demonstração gerencial de resultado

,-B$ll!lli- j.-R$/un. R$ Total __

Receita unitária de vendas 90 100

Custo unitário da matéria-prima (45) (40)

Margem para cobertura CIF e MOD (un.) 45 60

Unidades fabricadas e vendidas 60 50

Margem para cobertura CIF e MOD (Tot.) 2.700 3.000 5.700

Custo total = MOD + CIF (6.000)

Prejuízo líquido contábil (300)

b) Abordagem da TOC

Tabela 5 - Demonstração gerencial de resultado

P (R$lun.) Q (R$/Ull.) R$ Total

Receita unitária de vendas 90 100

Custo totalmente variável = MP (45) (40)

Ganho unitário 45 60

Classificação estratégica 2 Q 1Q

Tempo usado no RRC = Fator B 15 30

Ganho por minuto no RRC 3,00 2,00

Nova classificação de prioridade 1~ 2"

Tempo efetivo usado pelo RRC 1500 900

Mix otimizante pela TOC (un.) 100 30

Ganho total 4.500 1.800 6.300

Despesas operacionais = CIF + MOD (6.000)

Lucro líquido contábil 300

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES de produtos (linhas de produtos emergen-


tes, mas de alto consumo de atividades
Nos anos recentes, o sistema econômico não eram incentivadas) e não considera-
se tornou mais competitivo e o ambiente de va as restrições inerentes ao processo de
manufatura, mais informatizado e fabricação.
automatizado. A globalização dos mercados Pouco depois, a abordagem TOC ini-
nacionais conduziu as empresas uma eleva- ciou sua difusão. Esta visão procurou es-
ção de seus níveis de produtividade a fim tabelecer uma ligação mais estrita entre
de sobreviverem. Todavia, as inovações Contabilidade e Produção ao associar os
introduzidas no chão de fábrica não foram registros contábeis e decisões gerenciais
acompanhadas por avanços significativos aos "gargalos" existentes nas linhas de fa-
nas técnicas utilizadas pela Contabilidade bricação e/ou no mercado (restrições fí-
Gerencial e de Custos: a ênfase persistia no sicas). Ainda muito recente, esta aborda-
controle dos custos. gem tenderá a expandir-se nos próximos
O ABC significou a primeira grande al- anos, haja vista a ausência de estudos
teração de enfoque, mas, ainda assim, empíricos e experimentais em algumas de
apresenta va distorções quanto a seu pro- suas áreas de conhecimento. Nesse senti-
cesso decisório, haja vista derivar da abor- do, a presente pesq uisa visou a acrescen-
dagem convencional: incentivava a con- tar parte dessas novas idéias que come-
centração da produção em poucas linhas çam a se desenvolver no país. O

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