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Solange Menezes da Silva Demeterco

SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

2.ª edição
2009
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ção por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

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SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

D449s
2.ed.

Demeterco, Solange Menezes da Silva.


Sociologia da educação / Solange Menezes da Silva Demeterco. - 2.ed. - Curitiba, PR :
IESDE Brasil, 2009.
352 p.

ISBN 978-85-387-0265-8

1. Sociologia educacional. I. Inteligência Educacional e Sistemas de Ensino.


II. Título.

09-1973 CDD: 306.43


CDU: 316.74:37

Capa: IESDE Brasil S.A.


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Solange Menezes da Silva Demeterco

Doutora e Mestre em História do Brasil pela UFPR. Especialista em Currículo e


Prática (Tutoria a Distância) pela PUC-Rio. Graduada em Ciências Sociais pela
UFPR.
Sumário
A sociologia e a educação ..................................................... 13
O que é sociologia? .................................................................................................................. 14
A sociologia da educação e alguns conceitos básicos................................................. 19
A socialização e seus agentes ............................................................................................... 20

A sociologia da educação...................................................... 33
Os primeiros grandes sociólogos:
a educação como tema e objeto de estudo .................................................................... 34
As teorias sociológicas e a educação ................................................................................. 43

A sociologia da educação no Brasil.................................... 51


Formação da sociedade brasileira:
economia agrário-exportadora e economia industrial ............................................... 52
A sociologia continua seu caminho: dos anos 1970 aos dias atuais....................... 55

Educação e família ................................................................... 63


As transformações da família ................................................................................................ 64
Educação e família no Brasil .................................................................................................. 70

Concepções de infância e juventude ................................ 81


O sentimento de infância – o trabalho de Ariès ............................................................. 82
O surgimento das escolas e as visões da infância ......................................................... 85
A escola como instituição social ......................................... 99
A escola como organização .................................................................................................103
Algumas possibilidades ........................................................................................................105

A escola e o controle social.................................................113


Padrões sociais de comportamento .................................................................................116

A escola e o desvio social ....................................................133


Comportamentos desviantes .............................................................................................135
Conformidade versus conformismo ..................................................................................137

A mudança social ...................................................................151


Fatores que desencadeiam a mudança...........................................................................154
A ação pedagógica e a mudança social ..........................................................................157

A estratificação social ...........................................................169


Formas de estratificação social...........................................................................................173
A educação e a estratificação social .................................................................................177

A mobilidade social ...............................................................189


Tipos de mobilidade social ..................................................................................................190
Educação como fator de mobilidade social...................................................................193

Educação e movimentos sociais .......................................203


As formas de luta e ação coletiva ......................................................................................206
Alguns tipos de movimentos sociais e educação ........................................................210
A educação e o Estado .........................................................223
O conceito de Estado e suas funções ...............................................................................226
Estado e educação no Brasil ................................................................................................228

Educação e desenvolvimento ............................................241


As desigualdades sociais e o subdesenvolvimento ....................................................245
Origens históricas do subdesenvolvimento ..................................................................247
As desigualdades sociais e o papel transformador da educação ..........................248

Educação e cotidiano no Brasil..........................................259


O difícil cotidiano dos “menos iguais”..............................................................................263

Problemas da educação no Brasil.....................................275


O fracasso escolar: uma tentativa de explicação .........................................................279

A profissão de professor ......................................................293


A questão da formação profissional .................................................................................295
O ofício de professor e seu papel na sociedade...........................................................298

Perspectivas da educação no Brasil .................................311


A questão da diversidade cultural – o multiculturalismo .........................................315
A democratização da educação .........................................................................................317

Gabarito .....................................................................................329

Referências................................................................................343

Anotações .................................................................................349
Apresentação

O que você espera dessa disciplina? Quais são suas expectativas em relação à so-
ciologia? No que a sociologia se aproxima da educação? Essas e outras perguntas
nos acompanharão a partir daqui.
Mas, antes disso, seria interessante esclarecer algumas questões que nortearão
nosso trabalho. Inicialmente, deve-se destacar que o que se apresenta aqui é uma
síntese dos temas mais relevantes da sociologia enquanto Ciência Social, preocu-
pada em tentar explicar a vida social e as questões relacionadas à vida do homem
em sociedade, em seus múltiplos aspectos. Não se pretendeu elaborar um manual
e muito menos um compêndio que pretendesse dar conta de todos os temas e/
ou conceitos relacionados a essa ciência. Optou-se por privilegiar alguns tópicos
que são considerados básicos e depois relacioná-los com a questão da educação.
A sociologia da educação tem como objetivo pesquisar e analisar a educação em
seus aspectos sociológicos, isto é, os fenômenos sociológicos.
O objetivo maior é procurar conhecer e analisar a inter-relação entre o homem, a
sociedade e a educação, à luz de diferentes teorias sociológicas, bem como das
práticas pedagógicas ratificadoras e/ou transformadoras dos contextos cultural,
social, político, econômico e ecológico.
A proposta é despertá-lo para discussões futuras a partir do embasamento teórico
que essa ciência oferece e, sempre que possível, trazer o debate para a realidade
educacional brasileira. Para tanto, sugere-se alguns textos de apoio, bem como
atividades para autoavaliação. Indicações de leituras complementares e filmes
acompanharão o texto-base, e são importantes para aprofundar algum assunto/
tema que se considere relevante.
Vale lembrar também que nada substitui a leitura dos próprios mestres, no caso
aqui, os “fundadores” da sociologia e da sociologia da educação. Portanto, não de-
sanime em buscar na própria fonte as respostas às suas inquietações. Vá em frente!
A disciplina pretende desenvolver módulos que possibilitem a compreensão
da constituição da realidade social e sua relação com a educação, por meio do
estudo de aspectos dos processos sociais presentes na produção e configuração
do sistema educacional. Assim, o livro está estruturado em 18 unidades, em que
se propõe uma discussão sobre a relação entre a sociologia e a educação, apresen-
tando as contribuições dos autores clássicos e sua percepção acerca das questões
relacionadas à educação (A Sociologia da Educação) e contextualizando a ciência
no Brasil (A Sociologia da Educação no Brasil).
A partir daí, tem-se a discussão de alguns temas/conceitos fundamentais para
a reflexão aqui proposta. Na unidade intitulada educação e família apresenta-se
uma síntese das transformações pelas quais passou a família ao longo do tempo
e sua importância quando se discute educação. Para tanto, também se faz ne-
cessário observar como o sentimento de infância surge e se modifica a partir do
que se tem, inclusive o surgimento dos colégios e novas visões da infância e da
juventude (concepções de infância e juventude).
A discussão sobre a escola à luz de alguns conceitos sociológicos compõe as
próximas unidades: a escola como instituição social, a escola e o controle social e a
escola e o desvio social. Em seguida, são abordados outros conceitos também im-
portantes para a sociologia da educação: a mudança social, a estratificação social,
a mobilidade social, educação e movimentos sociais e a educação e o Estado.
Finalmente, são apresentados alguns temas mais amplos que dizem respeito à rea-
lidade do país (educação e desenvolvimento, educação e cotidiano no Brasil e pro-
blemas da educação no Brasil), da escola e do professor (a profissão de professor),
além de chamar a atenção para questões que exigem muita reflexão por parte do
docente, no sentido de avaliar sua prática pedagógica (perspectivas da educação
no Brasil).
Vale ressaltar, enfim, que vivemos um momento privilegiado na história, uma vez
que a presença da sociologia no currículo está intimamente ligada à democratiza-
ção do acesso ao conhecimento científico, com vistas ao incremento da discussão
consciente, racional e bem fundamentada do educador na realidade social.
Bom trabalho!

Solange Menezes da Silva Demeterco


A sociologia e a educação

Solange Menezes da Silva Demeterco

A sociologia nasce enquanto ciência como uma tentativa de explicar as


mudanças sociais produzidas num novo momento histórico, num contex-
to de grandes e profundas transformações sociais, cujos marcos principais
foram a Revolução Industrial, a Revolução Francesa e a formação dos Es-
tados Nacionais. Esse momento de mudanças radicais na sociedade e na
mentalidade das pessoas – a chamada modernidade –, em decorrência do
surgimento e da consolidação do capitalismo como modo de produção,
trará consigo a necessidade de se pensar teoricamente as novas deman-
das que surgem. Que sociedade é essa que surge?

Mas por que sempre que se fala em sociologia não falta quem per-
gunte para que ela serve? Por que não acontece o mesmo com a maioria
das outras ciências? A resposta está relacionada com a própria natureza
dessa ciência, que tem o homem em interação e a sociedade como objeto
de estudo. A questão que se coloca de imediato é por que isso se tornou
necessário? O que teria mudado tanto na vida do homem ou da sociedade
como um todo que demandariam a existência de uma nova ciência para
dar conta de explicar essas transformações? Assim, está feito o convite à
reflexão sobre a relação existente entre sociedade e educação a partir da
perspectiva sociológica.

A sociologia da educação é uma ciência produtora de conhecimen-


tos específicos que levam à discussão da democratização e do papel do
ensino, promovendo uma reflexão sobre a sociedade e seus problemas
relacionados à educação, tendo como subsídios alguns conceitos socio-
lógicos como processos sociais, socialização, poder, status, grupo social,
ação social, mudança social e outros.
Sociologia da Educação

Vamos procurar perceber quais são os valores sociais que definem os obje-
tivos da educação, do ensino e seus métodos, além de tentar estabelecer as re-
ações existentes entre a sociedade e o que se privilegia ensinar, e como isso é
feito no cotidiano da escola e fora dela, por outras instituições sociais – tais como
a família, por exemplo. É fundamental entendermos que os sistemas educacio-
nais relacionam-se com as instituições sociais e com as determinantes culturais
que regem a vida em sociedade.

É importante também a discussão sobre o papel do educador no atual con-


texto educacional, bem como alguns dos vários problemas educacionais brasi-
leiros. O saber docente tem sua especificidade a partir do princípio de que é um
ofício que exige uma capacitação que, na verdade, nunca se esgota. Além disso,
o papel da escola cresceu e se modificou, exigindo ainda mais de todos os atores
envolvidos no processo educativo.

O que é sociologia?
Podemos começar tentando esclarecer o que é a sociologia, lembrando que
os homens diferenciam-se dos animais por sua capacidade de se relacionar de
maneiras diferentes, incluindo a própria linguagem, código que lhe possibilita
comunicar-se com outros homens e, assim, tornar-se um ser social. E qual a im-
portância disso para nós? Esse é um dado fundamental para entendermos como
o homem biológico torna-se um ser social capaz de ter e produzir cultura – que
envolve a todos e modela nossa personalidade – e quando se internalizam regras
sociais, maneiras de ser, de pensar e de agir, transmitidas através do processo de
socialização. Laraia (1989, p. 46) nos diz que “o homem é o resultado do meio
cultural em que foi socializado”.

Mas o que seria a cultura? O homem, ao longo do tempo, vem procurando


organizar a vida em sociedade, usar os recursos naturais de diferentes manei-
ras, o que acaba por gerar diversas formas de ver e entender a realidade. Essas
diferenças podem eventualmente desencadear confrontos, conflitos e estranha-
mento entre culturas e indivíduos. Assim, conforme Santos (1986, p. 8), “cultura
diz respeito à humanidade como um todo e ao mesmo tempo a cada um dos
povos, nações, sociedades e grupos humanos”. Ainda de acordo com o autor,
haveria duas concepções básicas de cultura: “a primeira concepção de cultura
remete a todos os aspectos de uma realidade social; a segunda, refere-se mais
especificamente ao conhecimento, às ideias e crenças de um povo” (p. 23).

14
A sociologia e a educação

Fernando Peres Rodrigues.


Istock photo.

Istock photo.
O homem precisa compreender-se, compreender os outros e buscar respos-
tas para as perguntas que a vida lhe coloca, participando de forma diferente
de sua cultura. Ao fazer isso, está sempre produzindo cultura e internalizando
padrões e caracteres culturais. A cultura é dinâmica e opera de várias formas,
condicionando a visão de mundo do homem e interferindo no plano biológico.
Finalmente, é preciso destacar que a cultura é dinâmica e tem sua própria lógica
(LARAIA, 1989). Tentar captar essa lógica é o começo para se fugir do etnocen-
trismo, que ignora as diferenças e a pluralidade cultural, como sendo algo que
deveria agregar e não separar os homens.

Particularmente, como educadores, devemos sempre lembrar que “o modo


de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes com-
portamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma
herança cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada cultu-
ra” (LARAIA, 1989, p. 70). Caso contrário, cai-se no chamado etnocentrismo que,
ainda conforme Laraia (p. 75), constitui-se na “crença de que a própria sociedade
é o centro da humanidade, ou mesmo a sua única expressão”, o que desencadeia
a autodeterminação de alguns povos, a intolerância e o preconceito nos mais
variados graus.

Vimos, então, que a sociologia é uma ciência e, como tal, deve ter uma base
teórico-metodológica que serve para estudar os fenômenos sociais, tentando
explicá-los e analisando os homens em suas relações de interdependência. Utili-
za-se de estratégias e técnica de pesquisa que lhe são próprias e que lhe garante
o caráter de cientificidade. Afinal, conforme nos diz Thiollent (1987, p. 21),
[...] sem investigação concreta, a sociologia não está longe de ser um discurso filosófico ou
político arbitrário. Por outro lado, sem problemática teórica, a sociologia é considerada apenas
como enquete e degenera em vulgar pesquisa de opinião ou em pesquisa administrativa
totalmente permeada pelo empirismo e pela ideologia a curto prazo dos utilizadores da
pesquisa. O uso de questionários e entrevistas não é sinônimo de empirismo quando estas
técnicas, consideradas como meio de captação de informação, a ser criticada, e não como
fins em si, são submetidas ao controle metodológico e subordinadas a uma verdadeira
preocupação de teoria sociológica.

15
Sociologia da Educação

Como se pode apreender das palavras do autor, a sociologia dispõe de base


teórico-conceitual-metodológica específica e da escolha dos recursos meto-
dológicos que serão empregados pelo sociólogo em seu trabalho, de alguma
forma. Deve estar a serviço de sua pesquisa e demanda sempre uma análise crí-
tica dos dados, para que se configure como pesquisa consistente e que atenda
aos objetivos da sociologia enquanto ciência.

Assim, compreender as diferentes sociedades e culturas é um dos objetivos


da sociologia, que irá tomar como objeto de estudo exatamente essa nova so-
ciedade – que se configura a partir das transformações pelas quais passou a hu-
manidade, a partir do final do século XVIII.

Essas mudanças estão relacionadas com as revoluções burguesas que eclo-


dem num momento em que a ordem reinante não conseguia mais dar respostas
às demandas das populações cada vez mais empobrecidas e oprimidas, em meio
à nobreza, que usufruía de privilégios estabelecidos às custas do trabalho e da
exploração desse povo, durante o chamado Antigo Regime1.

Nesse contexto, a Revolução Francesa constitui-se num dos momentos de maior


expressão na história do Ocidente – quando se fala em movimentos sociais e po-
líticos – apresentando uma pro-

Domínio público.
posta baseada em ideais como
liberdade, igualdade e fraternida-
de. Mesmo deixando muito a de-
sejar em relação a esses valores
revolucionários, atualmente não
se pode negar que o seu poder
transformador se concretizou
em várias regiões do mundo e re-
percutiu a ponto de mudar para
sempre a história do homem e da
sua vida em sociedade.

Sendo decisiva para a transição do Feudalismo2 ao capitalismo, essa revolu-


ção aconteceu num período de violentos conflitos e lutas sociais, levando ao
poder uma nova classe social, a burguesia, que viria a acabar com os privilégios
feudais e colocar abaixo a aristocracia que deles usufruía. Essa elite social vivia
indiferente à pobreza da maioria, especialmente as populações rurais, que se
1
Termo que designa a organização político-institucional e a ordem social vigente na França, até a Revolução de 1789, pautado na monarquia
absoluta, sociedade estamental e direitos feudais.
2
Feudalismo foi um fenômeno histórico restrito à Europa na Idade Média; tratava-se de um sistema econômico, político, social e cultural, definido
pelas relações servis de produção, em que o senhor é o proprietário da terra e o servo depende dele, devendo cumprir obrigações servis, tanto da
prestação de serviços gratuitos quanto na entrega de parte da produção agrícola.

16
A sociologia e a educação

debatiam com a alta dos preços, as más colheitas, o êxodo rural em razão do
avanço das atividades têxteis, o descaso e o abandono. As graves repercussões
sociais e econômicas desse quadro foram a base que impulsionou os revolucio-
nários. Essa revolução ultrapassou os limites da França e seus ideais se estende-
ram por toda a Europa, ameaçando hierarquias e privilégios.

Como se viu, além da Revolução Francesa, outros momentos de ruptura ge-


raram transformações significativas para o mundo. A Revolução Industrial cons-
tituiu-se em outro momento importantíssimo para entendermos o contexto do
surgimento da sociologia enquanto ciência. Trata-se de acontecimentos que
mudaram a história para sempre.

A partir da instalação definitiva do capitalismo e da nova sociedade industrial,


tem-se um modelo de produção pautado na industrialização, que dissocia tec-
nologia, natureza e homem. Ocorreu inicialmente na Inglaterra, o país que criou
as condições políticas econômicas que possibilitaram a implantação dos ideais
burgueses. Dentre os fatores que contribuíram para esse pioneirismo, pode-se
citar a superioridade tecnológica e científica, a consolidação da monarquia par-
lamentar, a disponibilidade de mão de obra, a exploração do carvão como fonte
de energia e a acumulação de bens de capital.

Novas formas de organização, que de certa maneira “abalaram” a ordem social


estabelecida, trouxeram inquietações aos setores mais conservadores da socie-
dade europeia da época e representaram mais que uma revolução técnico-cien-
tífica. A separação do homem, dos meios de produção, do local de trabalho e o
processo de urbanização que cresceu intensamente, trazem consigo uma pro-
funda mudança social – que transformou a vida dos homens com novas formas
de trabalho, elevados custos sociais e ambientais. A exploração dos recursos na-
turais se realiza numa intensidade nunca vista e sem nenhum critério; que não
fosse o avanço da própria industrialização.

Além das novas formas de trabalho,


Domínio público.

o próprio significado do que era o tra-


balho mudou nesse momento. O traba-
lho, que antes era visto como um casti-
go divino em razão do pecado original,
adquiriu novo sentido. Tornou-se uma
condição básica para a salvação e, além
disso, uma forma de se conseguir ri-
queza, prosperidade e dignidade. O
Indústria de carros. Birmingham, 1960.

17
Sociologia da Educação

trabalho passa a ser visto e vivido de outra maneira, não mais como algo humi-
lhante, degradante ou “privilégio” dos escravos (tal como era visto na antiguidade)
ou dos servos (no mundo feudal). Adquire um caráter de atividade que dignifica e
qualifica o homem, podendo gerar lucro e riqueza.

Passa a haver uma separação entre

Domínio público.
o trabalhador e o produto final do
seu trabalho, uma vez que o capitalis-
ta é quem passa a exercer o controle
técnico do processo de produção e a
deter os chamados meios de produção
(terra, ferramentas e instrumentos de
trabalho). O trabalhador tem “apenas” Mulheres trabalhando em indústria de whisky
sua força de trabalho e passa a vendê- em Louisville, Kentucky, EUA.
-la em troca de um salário, alienando-
-se do processo e perdendo a visão

Domínio público.
global da produção.

A transição do século XIX para o


século XX foi marcada por movimentos
operários e sindicais – que já eram fruto
dos novos ideais iluministas e das revo-
luções acima citadas – que abalaram
ainda mais a ordem social estabeleci-
da, exigindo ferramentas para pensar o Parque industrial, 1955, EUA.
conflito e as contradições decorrentes
desses fatos. A sociedade de classes que emerge nesse novo contexto e que viria
substituir a ordem feudal, passa a ser marcada pela divisão do trabalho que, por
sua vez, traz conquistas e frustrações para todos os atores sociais. A sociedade
industrial vive crises e conflitos, especialmente pelo rompimento entre o capital
e o trabalho, que divide e agita a sociedade como um todo.

Ao lado dessas, outras mudanças aconteceram, na maneira das pessoas vive-


rem, morarem, trabalharem e se organizarem em sociedade. As cidades mudam
e muitas delas, especialmente as industriais, transformam-se em locais insalu-
bres e desagradáveis para os operários viverem. Faltam moradias (e as existen-
tes, em sua maioria, acomodam muitas pessoas de forma precária); as jornadas
de trabalho são longas e exaustivas; crianças, idosos, gestantes e mulheres, em
geral, são empregados em péssimas condições. A noção de privacidade emerge
e transforma profundamente a vida em família, a concepção de criança, juven-

18
A sociologia e a educação

tude e as relações entre os homens. Hábitos, costumes e ideias se transformam


rapidamente, gerando, inclusive, uma nova mentalidade e a separação entre o
público e o privado – explicitada, sobretudo, pela separação do local de trabalho
e moradia.

As novas formas de organização do trabalho e da família seguiram modifi-


cações. Novas demandas passam a existir, sugerindo que o corpo teórico e me-
todológico, do qual se dispunha naquele momento, não seria suficiente para
analisar e conseguir explicar as questões que se colocavam diante dos olhos dos
espectadores de todas essas transformações tão importantes para a humanida-
de. Isso foi decisivo para a constituição da sociologia como ciência, uma vez que
será a área do conhecimento que terá a “missão” de pensar essa nova sociedade
que surgia.

Do que vimos até agora, podemos concluir que o homem passa a ser o grande
objeto de estudo da nova ciência – num contexto que estava se tornando cada
vez mais racional e científico – em detrimento às análises baseadas nas explica-
ções e dogmas religiosos, filosóficos e do senso comum. Essa inquietude intelec-
tual estimulou e instigou a reflexão sobre o homem, a vida social e a sociedade
como objetos de estudo. Com nomes como Comte (“pai” da sociologia com sua
“física social”), Durkheim e Marx, a sociologia se consolida como ciência e abre
caminho para novas teorias e métodos que vão se constituindo à medida que
avançam as reflexões sobre os consensos, os conflitos e os problemas gerados
por essa sociedade capitalista e industrial – em suas múltiplas manifestações.

A sociologia da educação
e alguns conceitos básicos
E assim como existem várias culturas e várias sociedades, tem-se também mais
de uma sociologia. Dentre essas várias sociologias, a sociologia da educação – ci-
ência que investiga a escola enquanto instituição social, analisando os processos
sociais envolvidos – assim como as demais sociologias “especializadas”, têm como
base as teorias sociológicas. O que importa discutir, neste momento, é que todas
aquelas transformações vividas pela sociedade trouxeram novos temas para dis-
cussão no campo da educação – entendida aqui tal como Meksenas (2002, p. 19),
como o conjunto das várias “maneiras de transmitir e assegurar a outras pessoas
os conhecimentos de crenças, técnicas e hábitos que um grupo social já desen-
volveu a partir de suas experiências de sobrevivência”.

19
Sociologia da Educação

Segundo outro autor, a sociologia da educação


[...] põe em relevo a transmissão da cultura através da educação sistemática, parassistemática
e assistemática, bem como a mútua influência entre a educação e os grupos sociais, as
instituições sociais, a estratificação social, o controle social, o desvio social, o desenvolvimento
social, a mudança social etc. Enfoca, também, as relações intergeracionais e o condicionamento
sociocultural da personalidade. Estuda, ademais, a escola como instituição social, como grupo
social e o status e papéis na organização escolar. Apresenta, ainda, como a educação se situa
nas diversas formações sociais [...]. Investiga, por fim, as perspectivas da educação. (PESSOA,
1997, p. 15)

Partindo desse conceito, pode-se perceber como o campo de estudos da so-


ciologia da educação pode ser amplo e diversificado, uma vez que não se pode
esquecer que a educação e o processo educativo não estão descolados da socie-
dade na qual estão inseridos.

Vimos que o conceito de cultura é fundamental para a sociologia. Os con-


ceitos a esse relacionados são fundamentais para se pensar sociologicamente
a educação, em sua relação com o contexto social em que acontece o proces-
so educativo. Não se pode esquecer que tanto o educando quanto o educador,
assim como todo o sistema educacional, estão inseridos nesse contexto, sendo
produtores e resultados dessa interação que acontece durante todo o tempo,
construindo social e historicamente os fatos e eventos que serão – ou não – elei-
tos pela sociologia para serem analisados. Deve-se frisar aqui que a sociologia
pode ter um caráter conservador ou transformador, conforme a teoria que se
busca para pautar as pesquisas e análises sociológicas. Na verdade, o que você
deve ter em mente é que o fenômeno educativo é relevante socialmente e
requer, portanto, uma análise teórica específica e detalhada.

É importante ressaltar que os primeiros teóricos da sociologia não analisaram


diretamente os problemas educacionais, o que não os impediu de perceberem a
ligação entre o sistema escolar e o restante da sociedade, discutindo questões re-
lacionadas à educação, seus diferentes atores, os projetos educacionais, a questão
do poder, a questão curricular, entre outras. A escola surge como uma instituição
que terá como uma de suas funções “preparar” o indivíduo para a vida em socieda-
de, além de desenvolver suas potencialidades e capacidades individuais.

A socialização e seus agentes


Para se discutir a socialização e outros temas ligados à sociologia e à sociolo-
gia da educação é necessário explicar alguns conceitos básicos – tais como pro-
cesso social, interação social, instituição social, sistema escolar, poder, status,
papel social e outros.
20
A sociologia e a educação

Podemos começar pela noção de

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interação social, processo por meio
do qual o homem se constrói en-
quanto ser social, isto é, adquire seu
caráter de humanidade, diferencian-
do-se de outros seres vivos. Ao estar
em relação a outro, o homem conce-
be sua identidade.

A ideia de processo social é básica


para se entender a própria dinâmica da sociedade – que não é estática, quer dizer,
que não está parada; mas, pelo contrário, está em constante movimento. Trata-
-se da maneira como os atores sociais se relacionam – ou não. É a comunicação
que garante que o ser biológico se torne um ser social e sociável. Podem ser
processos associativos (que tendem a aproximar) ou dissociativos (que tendem
a separar), sendo que os mais comuns são o isolamento, o contato, o conflito, a
competição, a interação, a cooperação, a adaptação, a acomodação e a assimila-
ção. Em diferentes graus, cada um deles implica uma maior ou menor proximi-
dade entre os indivíduos, de acordo com seus interesses, que ligam-se à classe
social, ao status e aos papéis desempenhados pelos indivíduos.

O conceito de classe social, por sua vez, relaciona-se com mobilidade social,
diferentemente da noção de estamentos3, que se baseavam em hierarquia e/ou
códigos de honra, muitos ligados à própria condição de nascimento. De acordo
com Vieira (1996, p. 58), as classes sociais
[...] organizam-se em camadas sociais fundadas na separação entre trabalhadores e proprietários
dos meios de produção, às vezes com consciência social correspondente às suas condições de
existência [...] e admitem mobilidade entre si, abrindo-se aos movimentos sociais e revelando
também conflitos, principalmente quanto à distribuição do poder entre elas, na disputa sobre
o domínio econômico, político e intelectual na sociedade industrial.

Já status social é definido socialmente e diz respeito ao lugar ou à posição


que o indivíduo ocupa na estrutura social, de acordo com o consenso do grupo
social, podendo advir mais ou menos prestígio, conforme os elementos que o
determinam e as funções a ele relacionadas. A partir dessa posição, caberão ao
indivíduo determinados papéis, que podem ser definidos como conjuntos de
imagens e expectativas que são ligadas a cada status, determinando como as
pessoas deverão se comportar em suas relações com ocupantes de status supe-
rior e/ou inferior.
3
Estamento é uma camada social semelhante à casta, porém, mais aberta. Numa sociedade estamental, a possibilidade de ascensão social é difícil,
mas não impossível como na sociedade de castas. A sociedade feudal é um exemplo de sociedade estamental (OLIVEIRA, P. dos Santos. Introdução
à Sociologia. 24. ed. São Paulo: Ática, 2003. p. 240).

21
Sociologia da Educação

Um indivíduo tem também vários papéis na sociedade. Podemos dar o exem-


plo do professor: em determinadas sociedades, é uma categoria social que tem
certo prestígio e ao mesmo tempo exerce o papel que se espera dele enquanto
tal – além de desempenhar também o papel de marido, pai, membro de um
clube etc. Na verdade, o que está em jogo aqui é uma relação de poder, visto que
o comportamento dos indivíduos está ligado aos papéis que desempenham e
ao seu status na sociedade, o que, por outro lado, implica em normas e sanções
que compõem esses papéis. A superioridade de um indivíduo advém do poder,
isto é, da força, do prestígio e do reconhecimento que o grupo vê nele ou lhe
atribui, a partir de sua posição social.

Toda essa discussão nos leva à necessidade de explicitar melhor o que vem
a ser socialização, fundamental para se entender o processo social e também o
processo educativo. A criança quando introjeta valores e regras a partir da família,
principal grupo de socialização, está se “capacitando” para a vida em sociedade,
garantindo inclusive a perpetuação do próprio grupo social (entendido como co-
letividade) e a formação da sua personalidade. A família é vista como um órgão
de controle social e agente da socialização na medida em que “regula grande
parte do comportamento de seus membros, impedindo ou procurando impedir
conduta que a sociedade considere condenável”(LENHARD, 1985, p. 115).

No momento, é preciso destacar a importância da socialização para a forma-


ção da consciência humana e social, da internalização da cultura, que acontece
ao longo da vida inteira. A difusão dos valores comuns que compõem a cultura
de um grupo social se dá de várias formas, especialmente na atualidade, quando
os diversos meios de comunicação colocam-se ao lado da família e da escola
como agentes da socialização. Como existem várias culturas e várias sociedades,
pode-se deduzir que a socialização deve respeitar e considerar essa pluralidade
cultural. E educação exerce um papel fundamental nesse processo, mesmo que
se leve em conta que é impossível interiorizar a totalidade social.

Mas conhecer os aspectos culturais de


Jupiter Images / DPI images.

seu grupo possibilita a transformação de


um indivíduo em um ser social. A socializa-
ção começa na infância e segue pela vida
toda, sempre que se interioriza aspectos
da cultura.

O processo educativo adquire cada vez


mais importância ao longo da vida, uma

22
A sociologia e a educação

vez que é pela ação educativa e no contexto da aprendizagem que se aprende


os papéis que se deve representar. Sempre que houver um processo educativo,
se estará falando de socialização. De acordo com Pessoa (1997, p. 26),
[...] nessa altura da evolução social, o processo de socialização assume um caráter que exige
a ação de pessoas especializadas e a criação de instituições voltadas para a tarefa educativa,
em que os indivíduos se socializam de forma diferenciada, em função da posição ocupada na
sociedade, em face da propriedade.

Pode-se perceber então, que a socialização e a educação são vivenciadas de


forma diferenciada numa mesma sociedade.

Texto complementar

A formação da sociologia
(BRASIL ESCOLA, 2009)

No final do século passado, o matemático francês Henri Poicaré referiu-se


à sociologia como ciência de muitos métodos e poucos resultados. Ao que
tudo indica atualmente, poucos duvidam dos resultados alcançados pela so-
ciologia. A sua realidade é atestada pelas inúmeras pesquisas dos sociólogos,
pela sua presença nas universidades e empresas e nos organismos estatais.
Ao lado desta crescente presença da sociologia no nosso dia a dia, continua,
porém, chamando a atenção de todos os que se interessam por ela, os fre-
quentes e acirrados debates travados em seu interior sobre o seu objeto de
estudo e seus métodos de investigação.

A falta de um entendimento comum entre os sociólogos sobre a sua ciên-


cia possui, em boa medida, uma relação com a formação de uma sociedade
dividida pelos antagonismos de classe. A existência de interesses opostos na
sociedade capitalista penetrou e invadiu a formação da sociologia. Esse con-
texto histórico influenciou enormemente suas visões sobre como deveria ser
analisada a sociedade, o que refletiu também no conteúdo político de seus
trabalhos. Esse antagonismo deu origem ao aparecimento de diferentes tra-
dições sociológicas ou distintas sociologias, como afirmam alguns sociólogos.

Não podemos esquecer que a sociologia surgiu num momento de grande


expansão do capitalismo e, por isso mesmo, alguns sociólogos otimistas as-

23
Sociologia da Educação

sumiram, diante da sociedade capitalista nascente, que os interesses e os


valores da classe dominante eram representativos do conjunto da sociedade
e que os conflitos entre as classes sociais eram passageiros.

Os conservadores chamados de “profetas do passado” construíram suas


obras contra a herança dos filósofos iluministas. Não eram intelectuais que
justificavam a sociedade por suas realizações políticas ou econômicas. Ao
contrário, a inspiração do pensamento conservador era a sociedade feudal,
com sua estabilidade e acentuada hierarquia social. Não se interessavam em
defender uma sociedade moldada nos princípios defendidos pelos iluminis-
tas, nem um capitalismo que se transformava mostrando sua faceta indus-
trial e financeira. O fascínio que as sociedades da Idade Média exercia sobre
esses pensadores conferiu às suas obras um forte sabor medieval. Por inte-
resse direto, alguns deles eram defensores ferrenhos das instituições religio-
sas, monárquicas e aristocráticas, em franco processo de desmantelamento.

As ideias dos conservadores eram um ponto de referência para os pionei-


ros da sociologia, interessados na preservação da nova ordem econômica e
política que estava sendo implantada. Adaptando, inclusive, algumas con-
cepções dos “profetas do passado” às novas circunstâncias históricas, pela
impossibilidade total de retorno ao passado. É entre os autores positivistas,
como Saint-Simon, Auguste Comte e Emile Durkheim, que as ideias dos con-
servadores exerceriam uma grande influência. [...]

Saint-Simon acreditava que a nova época era a do industrialismo, que


trazia consigo a possibilidade de satisfazer todas as necessidades humanas e
constituía a única fonte de riqueza e prosperidade. Percebeu que no avanço
que estava ocorrendo no conhecimento científico havia uma grande lacuna,
nesta área do saber, qual seja, a inexistência da ciência da sociedade. Admi-
tia, mesmo tendo uma visão otimista da sociedade industrial, a existência de
conflitos entre os possuidores e os não possuidores.

Várias das obras de Saint-Simon seriam retomadas por Auguste Comte


(1798-1857), seu secretário particular, pensador menos original, embora
mais sistemático que Saint-Simon, a quem deve suas principais ideias. A
motivação da obra de Comte repousa no estado de “anarquia” e de “desor-
dem” de sua época histórica. Segundo ele, as sociedades europeias encon-
travam-se em um verdadeiro estado de caos social. Entendia que se as ideias
religiosas não teriam mais forças para reorganizarem a sociedade, muito

24
A sociologia e a educação

menos as ideias dos iluministas. Era extremamente impiedoso no ataque a


esses pensadores, a quem chamava de “doutores em guilhotina”, vendo em
suas ideias o “veneno da desintegração social”. Para ele, para haver coesão
e equilíbrio na sociedade, seria necessário restabelecer a ordem nas ideias
e nos conhecimentos, criando um conjunto de crenças comuns a todos os
homens. Comte considerava como um dos pontos altos de sua sociologia a
reconciliação entre a “ordem” e o “progresso”, pregando a necessidade mútua
desses dois elementos para a nova sociedade.

Também para Durkheim, (1858-1917) a questão da ordem social seria


uma preocupação constante. De forma sistemática, ocupou-se em estabe-
lecer o objeto de estudo da sociologia, assim como indicar o seu método
de investigação. Foi através dele que a sociologia penetrou a Universidade,
conferindo a essa disciplina o reconhecimento acadêmico. Sua obra foi ela-
borada em época de crises econômicas constantes, quando o desemprego
e a miséria provocavam o acirramento das lutas de classes com os operários,
utilizando a greve como instrumento de luta e fundando seus sindicatos.
Vivendo nesta época em que as teorias socialistas ganhavam terreno,
Durkheim não poderia ignorá-las, tanto é que em certo sentido, suas ideias
constituíam a tentativa de fornecer uma resposta às formulações socialistas.
Discordava das teorias socialistas mormente quanto à ênfase atribuída aos
fatos econômicos para diagnosticar a crise das sociedades europeias. Acre-
ditava que a origem dos problemas não era de natureza econômica, mas
originados na fragilidade da moral em orientar adequadamente o compor-
tamento dos indivíduos.

Preocupado em estabelecer um objeto de estudo e um método para a


sociologia, Durkheim dedicou-se a essa questão, salientando que nenhu-
ma ciência poderia constituir-se sem uma área própria de investigação. A
sociologia deveria ocupar-se com os fatos sociais que se apresentavam aos
indivíduos como exteriores e coercitivos. Isso quer dizer que o indivíduo
quando nasce já encontra a sociedade formada, criada pelas gerações pas-
sadas, cuja organização deverá ser transmitida às gerações futuras através
da educação.

O seu pensamento marcou decisivamente a sociologia contemporânea,


principalmente as tendências que se têm preocupado com as questões da
manutenção da ordem social. A sua influência fora do meio acadêmico fran-
cês começou por volta de 1930, quando, na Inglaterra, dois antropólogos

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Sociologia da Educação

– Malinowski e Radcliffe-Brown – armaram, a partir de seus trabalhos, os


alicerces do método de investigação funcionalista (busca de explicação das
instituições sociais e culturais em termos da contribuição que estas forne-
cem para a manutenção da estrutura social). Nos Estados Unidos, a partir da-
quela data, as suas ideias começaram a ganhar terreno no meio universitário,
exercendo grande fascínio em inúmeros pesquisadores. No entanto, foram
dois sociólogos americanos, Mertom e Parsons, em boa medida, os respon-
sáveis pelo desenvolvimento do funcionalismo moderno e pela integração
da contribuição de Durkheim ao pensamento sociológico contemporâneo,
destacando a sua contribuição ao progresso teórico dessa disciplina.

A formação e o desenvolvimento do conhecimento sociológico crítico e


negador da sociedade capitalista, sem dúvida liga-se à tradição do pensa-
mento socialista, que encontra-se em Marx (1818-1883) e Engels (1820-1903)
a sua elaboração mais expressiva. Esses pensadores não estavam preocupa-
dos em fundar a sociologia como disciplina específica. A rigor, não encon-
tramos neles a intenção de estabelecer fronteiras rígidas entre os diferentes
campos do saber, tão ao gosto dos “especialistas” de nossos dias. Eles, em
suas obras, interligavam disciplinas como antropologia, ciência política, eco-
nomia, procurando oferecer uma explicação da sociedade como um todo,
colocando em evidência as suas dimensões globais. Seus trabalhos não
foram elaborados nos bancos das universidades, mas, frequentemente, no
calor das lutas políticas.

A formação teórica do socialismo marxista constitui uma complexa ope-


ração intelectual, na qual são assimiladas de maneira crítica as três principais
correntes do pensamento europeu do século passado, tais como o socialis-
mo, a dialética e a economia política. O socialismo pré-marxista, também de-
nominado “socialismo utópico”, constituía uma clara reação à nova realidade
implantada pelo capitalismo, principalmente quanto às suas relações de ex-
ploração. Marx e Engels, ao tomarem contato com a literatura socialista da
época, assinalaram as brilhantes ideias de seus antecessores sem deixarem
de elaborar algumas críticas a esse socialismo, a fim de dar-lhe maior consis-
tência teórica e efetividade prática. Assinalavam que as lacunas existentes

26
A sociologia e a educação

nesse tipo de socialismo possuíam uma relação com o estágio de desenvolvi-


mento do capitalismo da época, uma vez que as contradições entre burgue-
sia e proletariado não se encontravam ainda plenamente amadurecidas.

Atuavam os “utópicos” como representantes dos interesses da humani-


dade, não reconhecendo em nenhuma classe social o instrumento para a
concretização de suas ideias. A filosofia alemã da época de Marx encontrara
em Hegel uma de suas mais expressivas figuras. Como se sabe, a dialética
ocupava posição de destaque em seu sistema filosófico. A tomarem contato
com a dialética hegeliana, eles ressaltaram o caráter revolucionário, uma vez
que o método de análise de Hegel sugeria que tudo o que existia, devido às
suas contradições, tendia a extinguir-se. A crítica que eles faziam à dialética
hegeliana se dirigia ao seu caráter idealista. Assim, procuraram “corrigi-la “,
recorrendo ao materialismo filosófico de seu tempo.

A intenção em conferir à sociologia uma reputação científica encontra


em Max Weber (1864-1920) um marco de referência. Durante toda sua vida,
insistiu em estabelecer uma clara distinção entre o conhecimento científico,
fruto de cuidadosa investigação, e os julgamentos de valor sobre a realidade. A
busca de uma neutralidade científica levou Weber a estabelecer uma rigorosa
fronteira entre o cientista – homem do saber, das análises frias e penetrantes
– e o político – homem de ação e de decisão, comprometido com as questões
práticas da vida. Essa posição de Weber, que tantas discussões têm provocado
entre os cientistas sociais, constitui, ao isolar a sociologia dos movimentos re-
volucionários, um dos momentos decisivos da profissionalização dessa disci-
plina. A ideia de uma ciência social neutra seria um argumento útil e fascinante
para aqueles que viviam e iriam viver da sociologia como profissão.

A sociologia por ele desenvolvida considerava o indivíduo e a sua ação


como ponto chave da investigação. Com isso, ele queria salientar que o ver-
dadeiro ponto de partida da sociologia era a compreensão da ação dos in-
divíduos e não a análise das “instituições sociais” ou do “grupo social”, tão
enfatizadas pelo pensamento conservador.

(Disponível em: <http://www.brasilescola.com/sociologia/formacao-dasociologia.


htm>. Acesso: em fev. 2009)

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