Você está na página 1de 11

SONETOS & POEMAS (OU QUASE)

THIAGO LIMA GOMES

VENTO DE OUTUBRO

Com a folha verde em seu lábio,

Ela sopra seu destino incerto...

Mas a brisa que passa por perto

É um pouco do meu senso hábil.

As palavras que brotam sem fim

Não são ditas na tua presença,

Pois a sensação é de descrença;

Teu olhar diz tudo para mim!

A flor dos lábios abre a sorrir,

E o contágio dela é imediato:

Fraqueza que tenho a dividir...

Ela fecha os olhos ao meu gosto,

Para viajar sem estrelato,

Com o calor das mãos em seu rosto!


ASTRO GUIA

As ondas que observo, na falua,

São desses mares que desconheço;

E sem saber sobre esse endereço,

Sigo apenas o brilho da lua...

Lua que divide o que mereço

E faz-me companheiro da sua

Nova face, para que eu possua

Um pedaço desse mar travesso...

Onde se destacam novas curvas,

Novos faróis, e um porto seguro

Que nos livra das lembranças turvas!

Mar - que demonstra o ser imaturo,

Ondas - que espumejam o perigo,

Lua - que desejo ver comigo!

SAUDOSISMO DA MENTE INSATISFEITA


"[...] O adeus, teu adeus, minha saudade faz que o insano do viver me prive
[...]"

Álvares de Azevedo

Ó, flor dos campos, luz de Caliban!

Deixei-te em sonhos meus; nesse retiro

Procuro-a para tê-la em meu divã

E sorver o silêncio em que respiro!

Vencido pela insônia... só... suspiro...

E meu semblante, tal qual Don juan,

Segue a sílfide e risca num papiro:

Dá-me um sossego, sana meu afã!

E sob as sombras o sono pincela;

Se ao meu lado vejo as formas dela,

Livro-me dum sonâmbulo pecado,

Mas, se o alvorecer for anunciado,

O despertar - será a sua partida,

E o abrir dos olhos meus - a despedida!

II
A luz que passa no vão corredor

Não fulgura meu quarto e nem a mente,

Pois não traz dela o brilho, somente

Faz da partida caso de rancor...

Tu, que sendo luz, não és minha flor,

Por que mesmo com o teu corpo ausente

Ariel me diz que "ela está presente"

Sendo o coração o meu eu sonhador?

Deixo meu leito sob um turbilhão

De ecos e devaneios e alimento

As lembranças ardentes dum verão;

Verão saudoso que, por um momento,

Trouxera o luzir da flor, e paixão

Ao genésico olhar do sentimento!

III
Na fronte minha deixo a mão espalmada

Anelar-se na nuvem de cabelos

Que ela dantes quisera recebê-los

Com as mãos virgens à tez perfumada!

Afastei-me... confesso... a pobre amada

Não entendera meu rúbeo pela face,

Pois um casulo fora nosso impasse:

Tornara-me o verme dessa camada!

Quanto tempo não sei, mas se desfez,

Mãos sóbrias enlevaram meus sentidos;

E o frenesi dos lábios, mais uma vez,

Lembraram-me os momentos suspendidos,

Em que Vênus perdera a sensatez

Sobre o palpitar dos seres despidos!

OS OLHOS TEUS

Os olhos teus... incertos do meu ser,


Mostram, para mim, céticos recados;

E os lábios denotam o quão exortados

Vivem os laços do desconhecer...

Nos olhos teus procuro compreender,

A vida tua que tenho ao meu lado,

Presente no meu verso rabiscado

Que descreve o que sinto por você.

A nudez em teus braços me consome:

Quero, além do palor da tua face,

Sentir a calidez do teu pescoço,

Entrando no meu cerne em alvoroço,

Trazendo para ti um velho disfarce,

Vestindo os olhos teus um novo nome!

COMPROMISSO

Sentada estavas tu! Que aguardava

A chegada, - vir a presença minha;


O relógio que marca não adivinha,

Une o momento e tão logo a palavra!

O deleite melífluo que buscava

Em mim traz a recíproca vizinha:

Silhuetas que dançam sobre a linha

São composições que o destino lavra.

Direis na escada a jura preterida,

Na dimensão onde teu ser me define,

Constelação onde o cosmo nos aduna;

E ao ver tua expressão um tanto ferida,

Lembro-me do passado, tempo insigne,

Em que a promessa era a nossa fortuna!

MEMÓRIAS OFUSCADAS

Memórias sopram em minha janela

E, aos ruídos, caem os fragmentos do amor;

Vejo as pétalas que lembram a flor


Que das tantas escolhas... somente ela!

Lábios soturnos na face em rubor

Deram-me a liderança às caravelas

Onde naveguei sobre as ondas belas

Formadas num sorriso encantador!

Ainda sob lentes, nela, o olhar existe,

Se o mal a natureza lhe fizera,

Eu não pude sentir, pois, quando triste,

Estive em outro mundo, em outra era;

Tudo ficou distante e assim persiste:

Saudade que não lembro, já não espera!

OUTONO

Estava eu no silêncio da floresta

Usando terno cinza, que a ternura

Das rubras folhas a estação apura,

E nas árvores seu tom manifesta.


Não se planta amor com o desamparo
Da companheira,,, seus olhos sem véu
Tendem não me deixar olhar pro céu,
Mas sim um sorriso em vestido claro...

Não conheço o segredo dessas cores


Que faz do ventre dela uma morada
Refletida no aroma de outras flores;

Em que o leite da Mãe-terra, na estrada,


Espelha a noite sob velhos amores
Preparando o casal para a jornada!

ÁRVORES GÊMEAS

Duas folhas flutuavam num sopro frio


Não era insensato dizer que faziam parte daquele vasto azul
As cores da alvorada eram um contraste para os olhares
Dos sonâmbulos do sol
Da terra banhada pela chuva
E também das lágrimas de saudade de um tempo

Havia duas silhuetas advindas de um caule


Uma sombra encobria parte das maçãs
E intervia sobre o passar do dia e o chegar da noite
Imersos em conclusões e atirados ao relento para si diziam
"A lua devia uma prece àqueles sentados próximo à fogueira
e, o sol, colorir os passos cinzentos envelhecidos pelo clima"

A tarde composta demonstrava um tom rosado no céu


E uma melodia entoada pela juventude
Ascendia o sentimento nos olhares
Os dois sentados pareciam árvores gêmeas
A contemplar com eufonia
O pôr do sol.

DANÇA DE SALTO (II)

Vê-la dançar com vestido desfiado,


É para minha visão um lindo ensaio
Enquanto ébria, girando, aos saltos,
Mantenho fértil o meu imaginário!
Planejo dar o compasso à eufonia,
Que envolve todo este exímio ato!
E, sinto o peito pulsar de imediato,
Vendo o cabelo que exala euforia!

Elevo minha mão ao pálido rosto


Dela! Nos dedos, percebo que amparo:
Certa tristeza e também um enfado
Que oculta rúbea lascívia no absorto!

Deslizo sobre os contornos da mão


Dela! Tocando sua luva rasgada,
Sinto a vaidade já enfim aspirada,
E vejo-a digna em doce abstração!

Você também pode gostar