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Universo
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1 Ili IJ li 10 / 2009

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senac
Universidade de
Brasília

erviçq
~ Nacional de Aprendizagem Comercial
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PEDROSA, li . . .
Janeiro: Sen:.Israel. O Universo da Cor. 4 re1mpr.Rio de
':<rlacNacional, 2009. 160 p. li.
ISBN 85-74A
A meu filho
168-126-7
Ulianov
Cor: Aspect· ,
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_____ __-ro Histórico: Optica: Arte: Pintura: Teoria das Cores .
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OLJp r iol d I livro
Uma obra
imponente
Marco Luc eh es i

Israel Pedrosa é um modelo de artista e intelectual, cuja


v tíssima cultura tem construído uma síntese ou uma ponte
bsolutamente rara entre ciência e poesia - tal como a entendi-
m Goethe e Leonardo da Vinci. Jamais uma árida vivissecção
do conhecimento da forma ou da cor. Mas uma integração. Uma
sinfonia. Das seis lições de ltalo Calvino, Pedrosa participa in-
tensamente da que trata da multiplicidade, das formas que se
buscam e se completam. Poucas vezes me deparei com tan-
tos olhos num só homem, com tantas janelas num só espírito,
com tanta fome de horizonte como em Israel. Desde o livro
inaugural, Da cor à cor inexistente - como dizia Guimarães Rosa.
bastava o termo da cor inexistente para consagrá-lo-. que re-
presenta um divisor de águas no pensamento estético em nosso
país, obtendo repercussão internacional, debates e aplausos,
que culminaram - dentre outras homenagens - com o Prêmio
Thomas Mann. Depois, outros e muitos trabalhos se seguiram,
surpreendentes. fascinantes. como o Tarô, e a série vastíssima
da cor inexistente. Mas o ensaísta rigoroso e sutil caminhou
com a r:nesma verdade e com a mesma demanda. terminando
suas Dez aulas magistrais, nas quais. não satisfeito de levar a
cabo uma forte reflexão acerca da história da pintura no Oci-
dente. Israel (esse homem impossível!) resolveu realizar com
alma e pincéis nada menos que Leonardo. Bosch. Vermeer.
Turner. Portinari, dentre outros, promovendo um diálogo valoro-
so, congenial aos mestres que inventaram a pintura, tal como a
entendemos, desde a do/ce cosa ao seu carattere
Pedrosa ultimou aqui sua genealogia. Homenagem a outros em
vivace. Sumário
que vemos a si mesmo. Foi um susto quando vi em seu ateliê a
Anunciação de Da Vinci. Não sei de uma inquietação e de uma O colorido do mundo está em nós ..........................
15
perfeição que convivam de modo tão harmonioso no mesmo
ateliê. no misterioso refúgio de Israel, laboratório químico e te-
O que é cor? ..........................................................................
19

atro alquímico. buscando a clara geometria das coisas, em seus A natureza das cores .......................................................
25
diálogos noturnos, do pincel ao computador. como se fora uma Composição da luz branca ....................................................... 27
espécie de Maquiavel estudando Tito Lívio, em tempos de exí- Três tríades de cores primárias ............................................... 28
lio. Mas ao contrário do florentino, Israel não vive exilado, reve- Como surge o preto em síntese subtrativa ............................ 31
lando-se antes o mais contemporâneo de seus colegas de arte Classificação das cores ............................................................ 32
e de existência. Os ensaios deste O Universo da Cor represen- Características da cor ............................................................... 34
tam, pois, o espírito leonardiano. com seu gênio prudente e
O ateliê do pintor ...............................................................
37
arrebatado, de poeta e engenheiro, sábio e operário da cor.
Laboratório experimental de Arte e Ciência ........................... 38
A arte modular ............................................................................ 40
A beleza na Antiguidade Clássica ........................................... 49
O sapateiro não deve ir além da sandália .............................. 53
Vitral: um grito de luz nas trevas ............................................. 54
A pirotécnica como arte cinética ............................................. 56
O ateliê renascentista ................................................................ 57
O tratado Da pintura. de Leon Battista Alberti ..................... 58
Como pode uma catedral
passar pelo buraco da fechadura? .......................................... 60
As quatro cores de Alberti são três ........................................ 61
/\ força da comparação
hom m como medida das coisas ....................................... 62
Leonardo da Vinci. vanguarda e modernidade ...................... 64 A beleza do colorido ......................................................
117
Sua beleza física desafiava qualquer elogio .......................... 65 Elementos de harmonia ........................................................... 121
A ciência da pintura ................................................................... 67 Combinação de cores .............................................................. 123
A ciência do desenho ................................................................ 68 Escala cromática em Modos Maior ou Menor ..................... 124
O nascimento da Teoria das Cores .......................................... 69 Mapeamento das cores ........................................................... 126
Leonardo comprova a composição da luz branca ................ 70 Harmonia consonante .............................................................. 130
Luzes originais e derivadas ...................................................... 71 Harmonia dissonante ............................................................... 130
Lanterna mágica e sombras coloridas .................................... 72 Harmonia assonante ................................................................ 130
Relação dos estágios de luz e sombra .................................. 73 Contrastes simultâneos. sucessivos e mistos de cores .... 131
Perspectiva aérea ....................................................................... 73
Cor inexistente ..................................................................
135
Contrastes simultâneos de valores e tons ............................. 75
Uma experiência e um conselho .............................................. 76 Decálogo do colorista ...................................................
143
A experiência .............................................................................. 76 Glossário ...............................................................................
147
O conselho .................................................................................. 77
Notas bibliográficas .......................................................
151
Um surpreendente contemporâneo de Leonardo .................. 80
De Caravaggio a Vermeer ....................................................... 83
Goethe e a Teoria das Cores ..................................................... 84
Um impressionista que precede ao Impressionismo ........... 85
Presença de Cézanne ................................................................ 87
A cor liberta-se do motivo ......................................................... 91
Nova voga da pintura mural ...................................................... 92
O emprego das cores no Brasil ............................................... 94
Hoje. o que é o ateliê do pintor? .............................................. 96
Manipulação de cores no computador .................................. 100

O aprendizado do olhar ...............................................


103
A visão humana ........................................................................ 104
Cores fisiológicas ou subjetivas ............................................ 107
A tricromia na reprodução gráfica ......................................... 108
Quem sabe mais vê mais ...................................................... 109
Enriqueçamos então nosso conhecimento ........................... 110
Por que não existe cor pura? .................................................. 111
Visualização das cores ............................................................ 113
O colorido do mundo
está em nós
O grande amor nasce do profundo
conhecimento das coisas amadas 1.
Leonardo da Vinci

Desde o início da realização deste livro. meu espírito foi


invadido por um turbilhão de emoções que me transportava
para o fim de minha longínqua infância e os primeiros anos da
adolescência, quando o desenho e a pintura deixavam de ser
predominantemente lúdicos. e, forçado por premências. co-
meçava a vê-los como uma quase impossível possibilidade
de profissionalização. Sem que eu suspeitasse, mais que uma
profissão. já se desencadeara ali os insondáveis percalços do
imprevisível destino.
Então meu pensamento de agora volta-se para os milhares
d iniciantes, de todas as origens. de Norte a Sul do país, em
us primeiros contatos com a Arte. e um fervor me domina na
rteza de que posso contribuir com uma parcela. mínima que
ja, para auxiliar esses principiantes a encontrar um rumo
n difíceis caminhos onde, atualmente, surgem inúmeras
'P cializações derivadas do artesanato e da própria e rara
r oliz ção artística: pintores. desenhistas. cenógrafos, figu-
r1n1. t, . d corador s. vitrinistas. cineastas. fotógrafos. came-
11111 11. rti l r ficas programadores visuais. Esse

15
incontável contingente de produtores e manipuladores de ima- humanidade se redime. em parte, de seus pecados e se afasta
gens de todos os tipos e para todos os fins destinadas a suprir um pouco mais de sua animalidade original.
a crescente, e cada vez mais sofisticada, demanda social. Particularizando o conceito de interação homem-Arte, Paul
Com sua magnificência, a cor integra e comanda o extra- Klee escreve em seu Diário de viagem à Tunfsia. em 16 de
ordinário espetáculo da vida. abril de 1914: "A cor apoderou-se de mim. Sei que ela me
Ao escrever este livro, o que me proponho é a busca de tomou para sempre. Tal é o significado deste momento aben-
um íntimo diálogo - prioritariamente com esse novo público çoado. A cor e eu somos um. Sou pintor 3 ".
jovem orientado pelo Senac -. em forma de fraterna revela- Os pré-requisitos para esse momento mágico. ele os
ção: por mais incipientes que sejam os seus meios e modes- adquiriu no longo aprendizado em Berna. nos preparatórios da
tas as instalações da iniciação do primeiro contato com a Arte, escola particular de pintura do professor Knirr, na Academia de
aí se abrem as portas de um novo mundo de maravilhamentos. Artes de Munique, na viagem à Itália e na vivência artística na
Umbrais do Paraíso antevistos por Dante em seu Canto 1,"nos- Alemanha e Suíça, no período anterior à Primeira Guerra Mundial.
so intelecto se aprofunda tanto, que a memória não o pode Testemunho eloqüente da transformação do homem e da
acompanhar 2 ", e as almas predispostas a vivenciar grandes Arte numa mesma entidade nos é dado também por Van Gogh.
emoções irão adquirir os mais eficazes meios de desencadeá- Como é sabido. a grande revelação da Arte só se realizaria
las ao seu redor. nele quatro anos antes de sua morte - ele se suicidaria a 29
A forma que adotei neste livro. aliás. a única em que sei de julho de 1890. Até então, todos os seus trabalhos. que cor-
me expressar, é como se estivéssemos em meu ateliê, nessas respondem ao período holandês, teriam feito dele um apaixo-
infindáveis conversas sobre Arte. cujo mote herdei de Portinari, nado pintor particularmente sensível, mas apenas mais um
que por sua vez o herdara de Batista da Costa, Rodolfo Amoe- entre inúmeros outros de seu país. O alto conhecimento da
do e Lucílio de Albuquerque, que também o herdaram ... cor forneceu, aos seus dons naturais. o instrumental forjador
Assim poderia dizer que três séculos de contatos diretos d sua genialidade.
entre artistas desfilam por estas páginas, na busca de pere- Em outubro ou início de novembro de 1885, cerca de um
nizar e dignificar a família espiritual a que pertencemos. ano antes da eclosão do sublime colorido de sua pintura, ele
Por possuir apenas e exclusivamente a vida do ateliê, meu , s revera em longa carta a seu irmão Théo: "Eu ouvi falar de
refúgio e mirante, usei a metáfora d'O ateliê do artista para urna experiência feita com uma folha de papel de cor neutra,
trazer à lembrança quase 40.000 anos de Arte, desde odes- qu torna-se esverdeada sobre um fundo vermelho, avermelha-
pertar do Homo sapiens aos nossos dias, para ter presente o d I sobre um fundo verde, azulada sobre o alaranjado. alaranjada
sentido de imortalidade da Arte e o de que o homem e a Arte •,obr o azul. amarelada sobre o violeta e violetada sobre o
são uma só coisa. umarolo ( ... ). Se encontrares algum livro sobre essas questões
Nasce daí a certeza de que não apenas a Arte é fruto do da cor. um livro que seja bom, envie-me-o antes de qualquer
homem, mas a de que ele também é fruto dela, pois a histó- utr coi a. pois necessário que eu saiba tudo sobre isso.
ria nos mostra que a cada período de esplendor artístico a um dia m qu u procur m instruir 4 ".

16 17
Poucos dias depois. escreve ele a Théo: "Presentemente.
minha paleta está começando a degelar. a esterilidade do iní-
cio desapareceu".
Na carta seguinte. ainda em novembro, ele faz a célebre
confissão: "No momento, meu espírito está inteiramente to-
mado pelas leis das cores. Ah. se elas nos tivessem sido
ensinadas em nossa juventude!".
Os meses que se seguem são para Van Gogh de alucina- O que é cor?
das e febricitantes investidas nos domínios da cor.
A cor não tem existência material. Ela é. tão-somente, uma
Ouase um ano depois. em carta de Paris. no verão ou ou-
s nsação provocada pela ação da luz sobre o órgão da visão.
tono de 1886, dirigida ao pintor inglês H.M. Levens. que conhe-
Epicuro, há mais de 2.300 anos, desenvolvendo o racio-
cera em Auvers. Van Gogh declara: " ... Estou pintando uma
cínio de que "a cor guarda íntima relação com a luz. uma vez
série de estudos de cor, simplesmente flores, papoulas verme-
que. quando falta luz, não há cor", afirmaria que a coloração
lhas, azulados miosótis. rosas brancas e rosadas. crisântemos
os objetos varia de acordo com a luz que os ilumina, con-
amarelos; buscando as oposições de azul com laranja. de ver-
cluindo que "os corpos não têm cor em si mesmos".
melho com verde. do amarelo com o violeta. procurando os
Hoje. a Óptica, parte da Física que trata das proprieda-
tons rompidos e neutros para harmonizar a brutalidade dos ex-
des da luz e da visão. apoiada pela Óptica fisiológica, de-
tremos, ensaiando tornar as cores intensas, e não uma harmo-
monstra que, quando a luz atravessa a pupila e o cristalino.
nia em cinza. (... ) Em suma. como dizíamos antigamente. 'na
tingindo os cones que compõem a fóvea e a mácula da re-
cor procurando a vida'".
tina no fundo do olho, é por estes decomposta nos três gru-
As réplicas de obras dos grandes mestres da pintura
pos de comprimento de onda que caracterizam as cores-luz:
universal. feitas por mim, que aparecem aqui publicadas pela
primeira vez. destinam-se a ilustrar o livro de minha autoria
em preparo, intitulado Dez aulas magistrais. Esse termo pro-
cura traduzir a magistralidade dos ensinamentos à humanida-
de ministrados pelos dez artistas que inspiraram o texto.
N
Nesta oportunidade. agradeço ao Conselho Editorial da ::::, A luz é o estímulo
_j
Editora Senac Nacional o ensejo de dirigir-me aos artesãos,
artistas, professores e alunos. em especial aos do Senac. fa-
zendo deste livro uma espécie de cátedra. de tribuna. de púl- A sensação é a cor

pito e - por que não dizer - de confessionário privilegiado.

1/usrr. 1 Ao a11ngIr o córtex occipital. na parte posterior do cére-


ti I o. o. 1 itos ri luz pI ovocam a sensação de cor.

19
RADIAÇÃO SOLAR

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espectro eletromagnético
1/usrr. 3 Fnso dos couros. Gruta de Lascaux. Dordogne. Frani,a.
e opI,1 d detalhe da parte esquerda do friso. Acervo do autor.

, 11 se nte sentido evolutivo, tornou-a o mais extraordinário meio


ili• projeção de sentimentos, conhecimentos. magia e encan-
I 11111•nto.
Registro de sua evolução social, física e psíquica.
lluscr. 2 - Da imensa área de radiação solar a vista humana alcança M ,s. l I como seu ancestral do Paleolítico Inferior. não podia
apenas diminuta faixa compreendida entre os raios infravermelhos e os
ultravioleta cuios limites extremos são. de um lado. o vermelho com 700 ,111HI. definir com precisão o que era a cor.
mµ (milimfcrons). e. do outro. o violeta com cerca de 400 mµ de compri- rssa precisão conceptual só surgiria com a evolução e a
mento de onda.
i 0111ugção de vários elementos da Óptica física, da Óptica quí-
vermelho, verde e azul-violetado, cor esta cuja melhor deno- 111Ica da Ópuca fisiológica, a partir de meados do século XIX.
minação. em português. é índigo. A noção dos primórdios da utilização da cor na realização
O resultado dessa decomposição e de suas infinitas pos- .rrll ·uc , a organização de períodos e estilos da Arte do
sibilidades de misturas é transmitido pelo nervo óptico e pelas /'.1/onlit,co Superior devem-se ao pré-historiador e eclesiástico
vias ópticas ao córtex occipital. situado na parte posterior do 11,111 s Henri Breuil (1877-1961).
cérebro, onde se processa a sensação cromática (ilustr. 1 e 2). Quase solitário, durante cinqüenta anos. Breuil estudou
Em linguagem corrente, a palavra cor tanto designa a sen- 410rn1I nios de Arte do Paleolltico Superior. Em pesquisas de
sação cromática, como o estímulo (a luz direta ou o pigmento , .rm o nos santuários paleolíticos da África do Sul, Espanha
capaz de refletí-la) que a provoca. Mas. a rigor, esse estímulo 11l I.inçc, e em trabalhos de gabinete, procurou determinar os
denomina-se matiz, e a sensação provocada por ele é que lu11cl<1rnnlos das obras. das intenções dos artistas e a su-
recebe o nome de cor. ', ,,.., 10d slilos do período.
Numa história de mais de 3 milhões de anos. desde as c'u livro, Quatrocentos séculos de arte parietal (1952),
primeiras manifestações de atividade humana até bem pró- .11>11u novos caminhos o · studo da evolução da Arte e do
ximo de nós, o homem descobriu e manipulou a cor e, em p•,Iq11IsIt10hum no.
llusrr. 4 - Cabeça de Ek I tri-
bo do noroeste da Repúblic~ ·dos
Camarões. Madeira e couro co"m 23
cm de altura. Museu de Volkeri rkund
de Munique, Alemanha. C() ópia.
Acervo do autor.

1/u Ir li Índia do Xingu


1111A 111,np,rança. de O Brasil
,! Tarô. de Israel

1 111, 111cl1q na brasileira e


1 1 111111111no mprego da cor
1 01 .io corporal. na arte
1 t 11, 11, "º~ trançados e na
1 111111 d1 Mnra16 e Santarém.
I li 111li (IS la

m nosso país. é relativamente recente a pesquisa da


,li t I upeslre, e os registros do uso da cor. representados pela
e 1•1, mica indígena, não ultrapassam 1.500 anos 5.

Por serem perecíveis. os mais antigos exemplares do


p1•ríodo ureo dos trançados de fibras vegetais. bem como
do, rnanlos. cocares e adornos de plumas existentes em vá-
' I0s mus us da Europa, são. apenas, os do período próximo
1/ustr. 5 - Cerâmica de Santarém. A cerâmica de Santarém (PA)o. d
elaborados motivos antropomórficos e zoomórficos. e a da ilh~· d: 10 I11IcI0 d colonização portuguesa.
Maraj6, datadas entre os anos 1000 e 1500 de nossa era, represen-.: Os pnm Iros estudos sistemáticos sobre nossa ances-
ao lado da arte plumária e da abstração geométrica. princ1palmen am.
1 tI 1l1dr1cl lor m mpr ndidos pelo naturalista dinamarquês
dos cadiveus, o nível mais alto de desenvolvimento artístico de no~ e ª
índios. Cópia Acervo do autor. sos 111 t, 1 (Wdli 1111)LumJ (1801 1880). cons1d rado o pai d nossa
Paleontologia. Seu nome ficará para sempre ligado à desco-
berta do Homem da Lagoa Santa e das grutas da serra do
Espinhaço, especialmente a de Maquiné.
Mais ricos em elementos de estudos sobre origens e ves-
tígios do emprego da cor por nossos índios foram os traba-
lhos do naturalista suíço Emílio Augusto Goeldi (1859-1917).
Os materiais colhidos por ele. existentes no Museu que
leva o seu nome. no Pará. bem como seus livros Resultados A natureza
ornitológicos
meridional.
de uma viagem de naturalista à costa da Guiana
As aves do Brasil e Álbum das aves amazónicas
das cores
trazem importantes subsídios para o estudo do universo da Os efeitos luminosos, constituídos por radiações eletro-
arte plumária de nossos índios. n, gnéticas. capazes de provocar a sensação que denomina-
Sob esse aspecto da arte indígena. merece destaque es- mos cor. dividem-se em três grupos distintos. São eles: o das
pecial o livro Arte plumária dos índios Kaapor6. do antropólogo, cores-luz. o das cores-pigmento opacas e o das cores-pigmento
escritor e político mineiro Darcy Ribeiro ( 1922-1997). que abor- r, insparentes. Mesmo tendo a luz como origem comum. es-
da ainda outro aspecto fecundo da arte indígena brasileira. o • 1 stímulos constituem espécies diferentes.
dos padrões geométricos. no livro Kadiwéu- Ensaios etnológicos Além da luz solar. o homem moderno manipula ainda inú-
sobre o saber, o azar e a beleza. m ras outras luzes produzidas por ele. Mas nada se compara
Em sensível estudo intitulado Abstração na arte dos índios o espetáculo de força e beleza do colorido da natureza pro-
brasileiros, Antonio Bento (de Araújo Lima) ( 1902-1988). um dos vocado pela luz solar incidente sobre os elementos físicos e
pioneiros da crítica de arte regular no Brasil. lança novas luzes químicos. no interior da atmosfera terrestre. por efeitos de ab-
sobre o riquíssimo filão de nossas raízes estéticas. orção. dispersão. reflexão e refração.
Desde a Antiguidade esses fenômenos vêm sendo estu-
dados por filósofos e artistas. acumulando observações e con-
iderações valiosas.
Já mais perto de nós. o humanista, poeta, matemático.
rquiteto e pintor Leon Battista Alberti ( 1404-1472). que. com
cus tratados sobre Arquitetura. Pintura e Escultura. tornara-
e o primeiro teórico das artes do Renascimento, definiu o
v rmelho. o verde e o azul como sendo as cores fundamentais
qu dão origem a todas as outras.
Alguns séculos depois, essa tríade de Alberti seria consa-
1rada pela Física moderna. Só que. para reverenciar o princípio

24 25
Composição
dos quatro elementos da natureza, Alberti incluíra o cinza (mis- da
tura do branco com o preto), que a rigor não é cor, para com-
luz branca
pletar o quarteto: vermelho, cor do fogo; verde, da água; azul,
do ar; cinza, da terra.
A formulação de cores fundamentais ou primárias já con-
tinha em si a idéia de síntese cromática, aprofundando ob-
servações e conceitos milenares referentes aos intrigantes
fenômenos do arco-íris. das reflexões e refrações da luz pro-
duzidos por superfícies ou corpos transparentes, translúci- 1/u~tr 7 Leonardo da Vinci observou que, quando o raio de luz
(11111111 (tinza azulado) penetra por um respiro no interior da câmara es-
dos e lâminas delgadas gordurosas sobre as águas. , 111 1 , nvolve por um lado o corpo opaco. que é Iluminado do outro lado
No mais importante conjunto de meditações, formula- I" l I 1111de uma vela (amarelo-alaranjado). ali onde as duas luzes se
11 ontr,1m surge o branco.
ções e preceitos sobre Arte de todos os tempos, O tratado
da pintura, o pioneiro criador da Teoria das Cores. o mais
sublime artista da Alta Renascença. pintor. escultor. enge-
nheiro, cientista, humanista, filósofo e escritor, Leonardo da
Vinci (1452-1519), de quem voltaremos a talar mais à frente.
demonstra experimentalmente. pela primeira vez de forma
cabal. a composição da luz branca.
Completando afirmações. ditas em várias circunstâncias.
de que "o branco não é uma cor, mas sim a potência receptiva Ao razer as cores do espectro solar saldas de um prisma
111 v ,.111 ,n um segundo prisma invertido, recompondo a luz branca
de toda cor". Leonardo teoriza: "O corpo sombrio (o que não 11 1111
li, Nt'wton demonstrou que as cores eram propriedade da luz e não
tem luz, em oposição ao corpo luminoso), colocado entre as 1 !ratares. como se acreditava anteriormente.

paredes próximas de um lugar escuro. que está iluminado de d a


um lado pelo esplendor de uma vela e do outro por um peque-
no respiro de ar, será branco; então esse corpo se mostrará de
um lado amarelo e do outro azulado ... " (ilustr. 7).
Ao revitalizar as idéias de Aristarco de Sarnas (c. 310-c.
230 a.C.) e Nicolau de Cusa (1401-1464). o astrônomo polo-
b
nês Nicolau Copérnico (1473-1543) abria as portas da Revolu- Circulo de proporções
/111 11 fl,1
w11l11Js. t11 L on,irdo da Vinci
ção Científica às mais avançadas concepções referentes à cor.
Cfrculo cromauco ou
Nessa perspectiva. Galileo Galilei. dito Galileu ( 1564-1642), 1/1 , " d, Muwlon Q., qraus de refraç o
afirmaria com convicção não haver fora dos sentidos huma- t , 1111 o q111 campo m a luz
1111111110•
o 1Iu,11 D I c.wndo d1f rança de seus percentuais. Newton
nos nem odor, sabor. som. nem cor. preparando o terreno para ,ln (ou d1,.i;o) do e p eira solar (vermelho. 60° 45'
M 10• Ili 1111<111110
l,il li 1• 1•. vrmfo. 60" 45' 34' azul, 54° 41'
10' 8, vtolt ld hQ 45' 311)
27
que o filósofo e matemático francês René Descartes (1596-
1650) inaugurasse novo patamar para a discussão sobre cor,
o defini-la apenas como sensação.
Apoiado em conceitos da Dióptrica ( 1610). de Kepler. nos
trabalhos do sábio holandês Villebrord Snell. a quem se atri-
bui a descoberta das leis da refração, juntamente com Des-
cartes. Isaac Newton ( 1642-1727). matemático e astrônomo 1/ustr 1O - Cores-luz pnmárias·
1111•lho. verde e azul-violetado Por
inglês, lança em 1704 seu Óptica, livro fundamental para a 11111 denominada ad1t1va. essas
compreensão da cor or produzem o branco

Como método de investigação, Newton cercava por to-


dos os lados o objeto em análise, virando-o pelo avesso. O
célebre episódio da maçã revela que mais importante do que
a constatação de que a maçã caíra para baixo é a indagação
feita a si mesmo: - Por que ela não caiu para cima? Daí tirou
a luminosa formulação de que "os corpos se atraem na razão
direta das massas". fazendo saltar o dado particular para a
esfera da transcendência universal.
1/usrr 11 Cores pigmento opa-
Na ordem de raciocínio de seu processo de investigação, cas primárias vermelho. amarelo e
azul. Em síntese subtrativa. essas
é possível que. para a representação gráfica da luz contendo cores produzem o preto.
todos os matizes do espectro, Newton tenha se inspirado nos
desenhos circulares. de Leonardo da Vinci, contendo os per-
centuais das sombras à ausência total de claridade observa-
dos na natureza, substituindo tais percentuais pelos índices de
refração dos raios luminosos. Seria. do ponto de vista gráfico.
apenas a inversão da sombra pela luz (ilustr. 8, 9a e 9b).
1/usr, 12 Cores-pigmento trans-
1' , 111 s pnmJnas magenta. amare-
Três tríades de cores primárias lo , c1c1no Em síntese subtrativa. tam-
1, rn produzem o preto.
Cores-luz são as que provêm de uma fonte luminosa dire-
A d monstração teórica e a su-
ta, estudadas mais detidamente na área da Física. com vasto l 1 10 p.in ,ncluir esta tríade pnmá-
11 1 1, i:or ao lddo das duas outras
emprego na sociedade contemporânea. São elas que ilumi- 11 1 011 1 11 111.i foram feitas publlca-
nam as nossas vidas, como a luz do sol, a de uma vela, a de 11, 1 prrm ir, v z or Israel
1 1111 1'1',h p 11 , um grupo de
uma lâmpada ou a de uma descarga elétrica. Sua tríade pri- , 111110 d,1 U P em pa

m ria é constituída pelo vermelho, verde e azul-violetado. 1, t, 1 111,1111111 p, ln tisico 'CIÍIICO


h 1111 M 111 1111111)1 r 1

()
Em mistura óptica equilibrada. tomadas duas a duas. o preto em síntese

..
essas cores produzem as secundárias: magenta, produzida
pela mistura do vermelho com o azul-violetado.

com o azul-violetado.
O amarelo.
mistura do vermelho com o verde. O ciano. mistura do verde
/111 ,, 13,,
..,.
u
:i
a,
a:
~
••
••••
••••
•••••• •••
••
.. --~ '

_,
O amarelo em cor-luz é cor secundária. só obtido pela
mistura do vermelho com o verde, ao contrário do que ocorre
nas cores-pigmento. em que ele é cor primária, indecomponí-
vel. Só é obtido por ele mesmo.
A mistura proporcional das cores-luz produz o branco. em
1/ustr. 13b
síntese denominada aditiva (ilustr. 10).
Cores-pigmento opacas são as cores de superfície de
determinadas matérias químicas, produzidas pela proprieda-
de dessas matérias em absorver, refletir ou refratar os raios
luminosos incidentes. Sua tríade primária é composta pelo
vermelho. amarelo e azul. cores que em mistura proporcional
produzem um cinza neutro escuro, o preto. Esse fenômeno é
denominado síntese subtrativa (ilustr. 17 e 13).
/111 ft f Ir
N
•••
••
..--~ '

3
Cores-pigmento transparentes são as cores de superfície
produzidas pela propriedade de alguns corpos químicos de
filtrar os raios luminosos incidentes, por efeitos de absorção.
reflexão e transparência, tal como ocorre nas aquarelas. nas
5
películas fotográficas e nos processos de impressão gráfica ~ llustr.13d
IC
a,
em que as imagens são produzidas por retículas e por pontos
nos processos computadorizados (ilustr. 12). 3

/111 lf I 1) A uI11t1Ic1 v rmelha absorve todos os raios verdes e azuis


li I lu1 I11c1dnte, refletindo para os nossos olhos apenas os
1 110 vurm lhos.
J,J A up rfIc1 verde bsorve os raios vermelhos e azuis.
1 11,llntlo os V rd S
1·) A up, rlíc11 1uu/ bsorve os raios vermelhos e verdes. en-
I 111dop11I1 os no sos olhos os azuis
r/J o 1111 to, 1h orv ndo todos os r I0s luminosos, não envia
1111111111111,1 111, p.irtJ os no os olhos
Classificação das cores
Segundo a composição de suas estruturas, as cores são
classificadas com as seguintes denominações:
Cor primária ou geratriz é cada uma das três cores inde-
componíveis que, misturadas em proporções variáveis, pro-
llusrr. 14 - Cores-pigmento opacas primárias:
duzem todas as cores do espectro solar, que dão cor a toda vermelho, amarelo e azul.
natureza (ilustr. 10, 11, 12 e 14).
Cor secundária é a cor formada pela mistura equilibrada
de duas cores primárias (ilustr. 15).
Cor complementar é a designação dada à cor secundá-
ria, pelo fato de que ela, justaposta à cor primária que não
entra em sua composição, complementa o espectro solar. Pela
mesma razão, uma cor primária, quando justaposta à secun-
dária, formada pelas outras duas cores primárias, é também
denominada complementar.
Dessa forma, o espectro solar é sintetizado em cada um
/111 11 U, O laranja é a soma do vermelho com o amarelo. O verde,
dos três pares de cores complementares: laranja-azul, verde- 11111 d11 ,1111<11lo com o azul, e o violeta, a do vermelho com o azul.
vermelho e violeta-amarelo (ilustr. 16).
Os exemplos citados aqui são constituídos por cores-pig-
mento opacas, por serem as mais utilizadas pelos artistas e
artesãos na realização de suas obras.
Quase sempre, com sentido utilitário, nos círculos profis-
sionais surgem designações apropriadas para as cores, algu-
mas delas alcançando foro de validade lingüística. É o caso
da designação de cores quentes e frias. utilizada inicialmente
nos ateliês de pintura.
Cor quente é a designação genérica empregada para definir
1/11 11 11, l'nms complementares: laranja-azul, verde-vermelho e
as cores em que predominam o vermelho e o amarelo. I, 11 1111111 lo 1 111 c<1da um desses pares. tomado isoladamente, está
1111111 111d 1 , 11quu1 do espectro solar.
Cor fria por oposição às denominadas quentes, designa
as cores em cuja composição predomina o azul (ilustr. 77).
A partir dessa classificação, surgem as Escalas de cores
quentes e frias, conhecidas como Escalas em Modo Maior e
Modo Menor quando analisadas do ponto de vista harmônico.

2
1/u 11 18 Mauz, que comumente é denominado cor. é a designa-
r ori !> vermelho, amarelo. azul e suas derivadas

llustr 17 - Escalas de cores quentes e fr,as. O verde-amarelado que


parece í110 numa escala de vermelhos e amarelos. em comparação com
vários tons de azul. parecerá quente

Tomadas separadamente, essas Escalas revelam a parti-


cularidade de harmonização por tonalidades afins ou de har-
monias consonantes, popularmente chamadas combinação de
tom sobre tom {ton sur ton). As questões relativas ao empre-
go da cor são tratadas mais adiante, no capítulo em que tra- 1'I Valor, lum,nos,dade ou bnlho representam o lndíce de
luminosa da cor.
tamos da harmonização de cores.
O mais completo estudo sobre essas cores foi realizado
por Chevreau, determinando os contrastes simultâneos, su-
cessivos e mistos.
Cores fisiológicas são as produzidas pelo organismo hu- C,oma refere-se ao lnd1ce de pureza da cor, dando ori
, verde puro ou verde-v,vo, amarelo-puro ou amarelo
mano, em condições especiais. sob a ação de determinados Ir;.io , s designações. verdes e amarelos-escuros (reba1-
estímulos externos ou internos, classificadas como cores sub- 1m,1relos claros (dessaturados)

jetivas. Considerações mais detalhadas sobre essas cores são


encontradas. neste livro, no capitulo em que tratamos do ,,. 111,, 1 p li ivr cor é empregada como sinônimo de matiz.
mecanismo da visão, onde são também abordados os fenô- 111 1 1, 1111111idos casos, tom é também empregado como
menos das cores patológicas. ui 111111 d1 m.it1z Cm variação sinonímica, emprega-seco-
11111 111 1, pr •ssao tons matizados (ilustr. 18 e 21).
Características da cor ou brilho - Termos utilizados
1 ,1,,, l11111111os1dade para
No ato perceptivo, distinguem-se três características prin- u cl
11111111 111d11 luminosidade da cor (ilustr. 19 e 27).
cipais que correspondem aos parâmetros básicos da cor· Ih 1 " s saturação, percebida como intensi-
Matiz - Variedade do comprimento de onda da luz direta lI j, ri 1 1 Ili t,1u10 m que o vermelho apresenta-se mais
ou refletida. percebida como vermelho. amarelo, azul e de- do zul e do amarelo: o amarelo mais
mais resultantes das misturas dessas cores. Em linguagem v rei.; o· ,ui m 1s zul (!lusu 20 e 27)
Quando uma cor apresenta alto índice de cromaticidade
é, comumente, chamada de cor viva.
Essas características correspondem às propriedades in-
trínsecas reveladas em cada cor, guardando certa relação
perceptiva com os corpos em que elas se apresentam. Daí a
origem de inúmeras designações verbais. algumas curiosís-
simas, que procuram defini-las. tais como: amarelo-canário,
verde-abacate. azul-piscina. verde-bandeira. cor excitante, cor O ateliê
de cuia, cor de canela, sapoti, alazão, cor de burro quando
foge e inúmeras outras. o pintor
Dentre as curiosidades referentes à nomenclatura da cor.
existe aquela a que se refere Antonio Houaiss, em memorá-
vel texto: "Antropólogos. seres estranhos, esses, por vezes.
1/ustr. 22 - Vermeer de Delfl. O AtellfJ ou A
Pois os há que alegam que há povos. ditos primitivos. que Arre da Pmtura. c 1666-1667 Óleo sobre leia. 130
saberiam dar nomes a até três mil cores ... ". X 11O cm. Kunsth1storisches Museum. Viena
Réplica, 1999-2000 Óleo sobre tela. 73 X
60 cm Ateliê do artista

A divindade que tem a ciência da


pIntur transforma a mente do pintor em
semelhança da mente divina 7 •
Leonardo da Vinci

a) Matiz ou compnmenro de onda


b) Lummos1dade ou bnlho
111pI11I1 :-; o d, p squisa parte de algum ponto de refe-
c e d) Croma ou grau de saturação da cor. ' lr m orno certo, para deduções comparativas
ou dessemelhantes. A partir dos estu-
111111 , ct outros pré-historiadores. pode-se de-
i,, o, 11rpo ilum no foi o primeiro campo experimental
lll 1110 1111 tIc..,1,com aplicação de plumas, pêlos, peles
d1v11 ,ofi ncontr dos na natureza.
d ri, l 11111 .ilbor s do Paleolft1co, em que. lentamen-
1 11111, 111,111110 1111rn I foi dando espaço ao nascimento da
1/ustr 21 - As formulações de Helmholtz sobre as características
da cor. popularizadas pelo Atlas do sistema de cores Munse/1, vêm sendo 111 111, 111 I1t>rlwnhrno J, tr z1 em si o gérmen de todas as
divulgadas no Brasil por duas séries de ilustrações do autor deste livro
A de números 18.19 e 20 e esta. de número 21 111111111lr
l11l111t1 Lm lorm d nI ma. C rios Drummond

7
de Andrade gostava de dizer que. para alguns puristas. a úni- Numa lenta e contínua evolução das formas, em mais de
ca obra realmente original teria sido a primeira. feita por um d, 111Il mil anos, na passagem da Perigordiense para a era
artista paleolítico. ',11/11•:trnse. os artistas dão mostra do início de notável matu-
Da utilização da cor de uma parcela vegetal. animal ou 1Id11d stilística na representação de animais, caracterizan-
mineral para colorir o corpo à percepção da fluidez e capaci- do o I rfodo Arcaico.
dade de fixação e aderência de outros dados, vai um longo m esse período. surgem as séries de gigantescas
percurso de observações e aprendizagem. até o estágio de 11I111I11a
parietais de cavalos. bovinos, seguidos de mamutes e
busca e coleta consciente de tais elementos. , 1h111,montesas. impondo um estilo e uma organização de
Todo esse processo evolutivo de coleta e produção de 1I11I11,l'l
que se tornarão constantes nos frisos das grutas pré-
elementos necessários para colorir o próprio corpo até che- hI•1t 11, . como os das regiões de Eyzies e Charente, na França.
gar à culminância das pinturas parietais das grutas de O I rfodo Clássico da Arte pré-histórica corresponde à
Lascaux. Altamira e Niaux (com a utilização de corantes como 111 1 M 1yclalenense, entre 14000 e 9500 a.C. Período de es-
os ocres ferruginosos. o bióxido de magnésio, carvões de pl1111dor.que coroa longo processo evolutivo. esteticamente
produtos orgânicos, emolientes, solventes e fixadores de ori- , 11111p.i1 v I aos demais grandes períodos artísticos da his-
gem animal, vegetal e mineral) faz do pintor paleolítico um tort,1 d I humanidade. Nele estão presentes, plenamente de-
misto de artista e cientista. Seu ateliê é a natureza inteira, no t111volv1do, a beleza das formas, o ritmo. as sínteses e a
âmbito de seu clã. 1111 lr111l1dadena captação das mais diferentes posturas do
1111111I
r tratado. Essas obras só poderiam ser fruto de lon-
Laboratório Experimental de Arte e Ciência 11 p11 nd1.rndo, de um estudo consciente, como comprova a
Como podemos observar em O livro da Arte. de Cennino v 111d iclo d objetos portáteis ligados às mesmas conven-
Cennini (c. 1370-início do séc. XV), muitos milênios depois, no 1I JlllOtivas presentes na Arte parietal.
início do Quatrocentos. o ateliê do pintor continuou sendo o ludo I l supor ter sido a gruta pré-histórica, em seu perí-
mais desenvolvido laboratório da Química aplicada, na época. 1 1111('/ l.'is1co. um amplo ateliê de aprendizagem e realizações
Recorrendo-se aos estudos e à volumosa documentação 111llc: i'l Laboratório de pesquisas estéticas e almoxarifado
coletada por arqueólogos, paleontólogos e pré-historiadores. 11 u • p1 11,v is quantidades de materiais corantes para execu-
principalmente, dos dois últimos séculos. nota-se o coeren- , d ,, obra policrômicas e estocagem de resíduos argilo-
te traçado do mapeamento das origens de nossa evolução o p 11 111 onf cção de objetos portáteis.
artística, a partir dos aproximados trinta e cinco mil anos l'or 1:1 rl a plaquetas de barro em que se desenhava, gra-
que nos precederam. v v 1 , p111tnva.tão raras por sua pouca resistência ao temP,o,
Nesse período, classificado como Primitivo. surgem, em 11111111o·, "1:,HI rno " de exercício do jovem pintor e o campo dos
meio a traços geometrizados, os primeiros desenhos, gravuras 11111111111
1 d I brL nim lística da era Magdalenense.
e pinturas de mamutes e cabeças de felinos realizados em blo- 1 11vol1,., m ma ias. a paredes das grutas cobrem-se
cos e plaquetas de argila característicos da era Aurignacense. d mI11111·, 1111 s m rn nch colorid s mareias, v rm lhas

38 .9
llustr. 23 D l Ih d
J/ustr. 26. 1/ustr 24 - Detalhe da
tlustr. 26.

e ocres. debruadas por incisivos contornos pretos e verme- dos rios Tigre e Eufrates, região dividida entre o Irã e o Iraque.
lhos. Figuras colossais atingem até 5,50 m de altura, como no desde muito. denominada Suméria. Já por volta de 3500 a.e. a
Friso dos touros, da gruta de Lascaux. cultura sumeriana começava a impor-se. tendo por centro de ir-
Surpreende a constatação de que esse imenso centro radiação várias cidades. em que se destacavam Uruk e Susa.
cultural da pré-história estende-se por um sítio arqueológico Em outra vertente histórica. influindo e influenciando-se pela
que abrange desde o departamento de Yonne. na França. até cultura dos povos vizinhos. ao longo do vale do rio Nilo, desen-
a região cantábrica espanhola. ressaltando as culminâncias volveu-se a civilização egípcia no curso de mais de 500.000
da gruta de Lascaux. na Dordonha. e a da Sala das pinturas, anos. do Paleolítico ao período de dominação romana.
da gruta de Altamira, na província de Santander. No fim do Neolítico. a Arte egípcia começa a formar-se.
Referindo-me a esse espetáculo visual pré-histórico, mais com marcas de grande originalidade. Mas a verdadeira Arte
de uma vez. afirmei: "De todos os artistas modernos. os que egípcia só adquire feição própria com o inicio da monarquia
mais me impressionam são os de Altamira e Lascaux". faraônica. em 3200 a.e .. quando Narmer unifica os dois rei-
nos: o do Alto Egito, cuja coroa branca ele usava. e o do Baixo
A arte modular Egito, em que o soberano usava coroa vermelha.
A passagem do período Neolítico à proto-história, e daí aos Essa Arte teria longevidade excepcional. de mais de 3.000
primeiros tempos históricos. é caracterizada pelo surgimento das anos. no curso dos quais. mesmo sob a constante uniformi-
Ideias (até o IV milênio a.e.) que se transformariam progressi- dade canônica que lhe dava sentido. manifestaria períodos de
vamente nas cidades mesopotâmicas. entre os cursos inferiores xtr ordinária evolução.

40 41
Império Faraônico. Unificado todo o r ino. Nar m r (ou
Menés) estabeleceu em Tínis sua capital. dando início ao
período tinita. constituído pelas I e li dinasti s. qu dur -
ram aproximadamente 420 anos. entre 3200 2780 <1.C. e
lançou os alicerces de Mênfis. que viria ser, logo d pois. a
capital do reino.
Antigo Império. Por volta de 2800 a.e .. D16ser, primeiro
rei da Ili dinastia, inaugurou o Antigo lmpéno. qu terminou
com a VI dinastia. em 2400 a.C. Djóser estabeleceu capital
em Mênfis e seu ministro lmotep construiu a primeira pirâmi-
de de degraus. em Sacará. que seria seguida pelas colossais
pirâmides de Gizé, construídas por Ouéops, Ouéfren e Mique- 1/ustr. 25 - Detalhe da ilusr. 26. Hator. no Egito Antigo. deusa da
Beleza e do Amor, cujo nome sign1f1ca morada de Hórus (o Sol).
rinos. Ouéops. segundo faraó. da IV dinastia (c 2600 a C ). é identificada a uma das vacas celestes. por isso aparece coroada com
sobretudo lembrado pela pirâmide que construiu, o maior blo- dois chifres em forma de lira, envolvendo o disco solar
co edificado de todos os tempos. Sua tumba, revestida de
calcário fino multicolorido. com inventiva e original decoração. Fascínio e enigma. durante vários milênios. envolveram a
foi saqueada e destruída por várias incursões de vândalos. Arte egípcia. Tudo fazia crer que aquelas maravilhas. acom-
antigos e modernos. panhadas de vasta ordenação simbólica, só poderiam ser fru-
Vários são os testemunhos da grandeza incomparável to de uma alta civilização. cujo sentido oculto continuava a
dessa Arte que se encontra espalhada pelos quatro cantos do desafiar as ciências posteriores.
mundo, exibindo a suntuosidade artística do Antigo Império. Coube ao filólogo francês Jean-François Champollion
Várias também são as ruínas deixadas pela ação do tem- (1790-1832). apoiado no estudo das línguas árabe. copta e
po e dos homens nos sítios arqueológicos do período. verda- hebraica. a partir das análises da "pedra da Rosetta", decifrar
deiros santuários da fé talhada em pedra. os hieróglifos. em 1822. A partir desse feito, Champollion co-
A reconstrução do propileu de Djóser. em Sacará, com sua meçava a julgar a Arte egípcia com inteira clareza. Em 1824,
longa arquitrave e colunas caneladas. impõe a comparação com ele escreveu. da Itália: "Somente no Museu Real de Turin. no
as colunatas do Período clássico grego, que surgiriam dois mil meio dessa massa de destroços tão variados de uma antiga
anos depois. civilização, a história da Arte egípcia me pareceu estar ainda
O grupo escultórico de Miquerinos. tendo à frente a deusa inteiramente a ser feita. Tudo mostra que será precipitado jul-
Hator. do Museu de Boston. já traz a marca da idealização do gar os processos, determinar os meios e sobretudo assinalar
conteúdo ritual expresso no realismo das formas. Idealismo seus limites. ( ... ) Eu creio que os antigos artistas da Grécia,
conteudístico e realismo formal: síntese da dualidade de ele- arquitetos, xilógrafos. toreumatólogos, estatuários e esculto-
mentos. sobre a qual repousará toda a história da Arte egípcia r ,sr c b mm as primeiras lições dos egípciosª".
Médio Império. Com os príncipes d r n , , t.ir XI
dinastia, e o primado religioso foi dado ao d u • l b 1110 Arnon.

O período estende-se até 1580 a.e .. quando o h1c o ssu-


mem o trono do Egito. instalando-se no delta do Nilo
Durante todo o período. continua a existir gr. nd c1t1v1da-
de artística, mas sem atingir a grandiosidade n m 3 p rfe1-
ção das formas do Antigo Império.
Novo Império. Inaugurado com a vitória de Am nóíts 1.
fundador da XVIII dinastia, sobre os hicsos. Época d splen-
dor da monarquia faraônica. que corresponde à f s m is bri-
lhante da Arte egípcia, incluindo aí a Arte amarniana, n scida
com a transferência da capital, de Tebas para EI-Amarna. por
Amenófis IV (1372-1354 a.e., filho de Amenófis Ili). reformador
religioso, denominado Aquenaton.
EI-Amarna foi construída segundo um bem desenvolvido
plano urbanístico, com requinte de detalhes. Seus palácios
serviram de modelo para as casas da nobreza, construídas
em dimensões bem menores. com separação das partes de
livre acesso do povo, dos grandes salões de recepções e das
dependências privadas. Edificaç_ões construídas com tijolos
cozidos. com salas de refeições, quartos para a esposa e para
as concubinas, adegas. armazéns. terraços e piscinas.
Na Arte egípcia, seu apogeu é bem representado pelos
colossais templos divinos e funerários de Karnak e Luxor. O
1/ustr. 26 - Seu I e a deusa
de Luxor. começado por Amenófis Ili e acabado por Ramsés Hator. Baixo relevo em calcário
11,com enormes colunas papiriformes e lotiformes que atin- pintado e esculpido em um
piloti, oriundo da tumba de Seti
gem mais de 20 m de altura, atesta o fausto e o poder nunca 1 em Tebas. XIX dinastia. Mu-
igualado por outras dinastias. seu do Louvre, Paris.
Cópia, 2003. Tinta acríli-
O Novo Império é considerado o período clássico da es- ca sobre tela. 46 X 27 cm.
cultura egípcia. durante o qual convivem harmoniosamente a Acervo do autor.

tendência ao idealismo e aos preceitos acadêmicos das ofi-


cinas com a procura de um realismo cada vez mais acentua-
do. principalmente sob o reinado de Amenófis IV, que t nt
alterar a estrutura rígida imposta pelos princípios dos sacer- Sem romper o cânone modular da lei da frontalidade. os
dotes de Amon. dotes da anatomia se fazem presentes. como no baixo-relevo
Dentre as jóias artísticas desse período áureo. ressaltam colorido da deusa Hator e Seti 1. A exaltação do observador
o busto policrômico do Museu de Berlim e o busto de quartzita faz supor um alto grau de atração da deusa pelo faraó e vice-
rosada, inacabado. do Museu do Cairo. retratando Nefertite, versa. instigados pela beleza física de ambos.
esposa de Amenófis IV, Aquenaton. de quem se separou por A cor que estivera. por longo tempo, prisioneira das
razões religiosas. incrustações. dos códigos. convenções e cânones. das
Desenvolvendo seu curso, a magnificência do Novo Im- reentrâncias e relevos da escultura liberta-se. conquistando
pério firma-se ainda mais com Seti I e amplia-se com as obras autonomia. fazendo da pintura a mais importante disciplina
verdadeiramente faraônicas de seu filho. Ramsés li. artística do período.
Seti I é sempre lembrado como protetor das Artes e cons- Atestados eloqüentes dessa conquista são os livros dos
trutor do templo de Abidos. composto de sete santuários. Sua mortos, os murais sobre estuque ou calcários e a pintura dos
tumba no Vale dos Reis, em Tebas. é célebre pela beleza dos sarcófagos e das câmaras mortuárias. como demonstram as
baixos-relevos coloridos. obras do segundo império tebano.
A apreensão de um novo colorido. A relativa liberdade de Sem que houvesse individualização de autoria nessas obras
criação artística em relação aos cânones sacerdotais. estimu- das XVIII e XIX dinastias. podiam-se reconhecer. pelas particu-
lada pelas novas concepções religiosas. quase monoteístas. laridades do desenho e da cor. os ateliês que as produziam.
de Amenófis IV. continua a gerar. cada vez mais. novos frutos. rompendo uma tradição que vinha desde o Antigo Império.
Favorecida por esse clima. desenvolve-se. lentamente. a Arte Com os numerosos estudos de historiadores. antropólo-
do olhar. buscando ver a realidade. Com ela. surgem os notá- gos e sociólogos. começa-se a ter uma idéia. cada vez mais
veis coloris tas do Novo Império. E. com eles. todo um univer- clara. do que teria sido a vida dos ateliês. oficinas e canteiros
so de sutilezas começa a povoar os ateliês - misto de ofici- de obras dos vários períodos históricos do Egito.
nas artesanais e canteiro de obras. Obedecendo ao gigantismo das empreitadas. a produção
Constata-se então que a mais original descoberta desse artística, desde o Antigo Império, foi essencialmente coletiva.
nascente realismo é a captação da sensualidade visual. trans- o que não excluía uma nítida separação hierárquica entre arqui-
formada em formas e cores. Nela se conjuga um certo erotismo tetos. artistas e artesãos. todos submetidos às ordens do vizir
estético, impregnado de surpreendente naturalidade angelical. ou chefe de trabalho real. responsável pela obra.
O gérmen dessa lição - realismo, sensualidade e idealis- Guardando as suas peculiaridades. assim como na escola
mo - seria altamente apreciado e largamente utilizado pelos de escribas. o aprendizado do artista era também rigoroso.
artistas primitivos. pré-renascentistas e renascentistas italia- transcorrendo no interior das oficinas e nos canteiros de obras.
nos dos séculos XIII, XIV e XV. herdeiros. conscientes ou não. Os num ro os óstracos pintados. existentes ainda hoje.
da tradição greco-romana. onde esse gérmen proliferou. O mostram t r ido I s a superfície em que se exercitava o
cadinho da mitologia nutrindo a imagística do cristiani m pr nd11t1 1 d d'· nho. da r vur e da pintura.

46 47
1/ustr. 29 Cratera da fase da figura vermelha. executada pelo olei-
llustr. 27 - Detalhe da ilustr. 29 Sarpédon. herói da Guerra de Tróia. ro Euxíteos e pintada por Eufrônio. sendo esta sua obra-prima. conside-
entre o Sono e a Morte. rada por muitos a mais importante pintura dos vasos gregos Cena repre-
sentando Sarpédon morto. retirado do campo de batalha pelo Sono e
pela Morte, com 19 cm de altura Final do século VI a C Metropolitan
Por serem os hieróglifos. essencialmente. desenhos de sím- Museum of Art, Nova York, EUA.
bolos ideográficos, o escriba era também considerado um ar- Cópia, 2003 Tinta acrll1ca sobre tela. 27 X 35 cm Acervo do autor

tista. misturando-se aos pintores, gravadores e escultores.


Subordinada às aptidões e aos talentos diversos, a pas- A beleza na Antiguidade Clássica
sagem do aprendiz à condição de artesão e artista era um Meu primeiro contato com a Arte grega foi auditivo, aos
processo natural. O método de cópia dos modelos padroniza- onze anos de idade, no antigo curso de admissão ao ginásio.
dos. próprio do sistema de produção modular. além de servir Uma cativante professora de História, entre explicações
ao aprendizado artístico. era também uma maneira infalível sobre as guerras de Tróia e do Peloponeso, contava-nos len-
de avaliação dos dotes do aprendiz. das e histórias, que me prendiam muito mais a atenção.

1/ustr 28 llustr 30

1
Daqueles distantes tempos da infância, permaneceu com
nítida clareza, em minha memória, a história de um concurso

I, de pintura entre dois dos mais renomados artistas da Grécia.


Um deles pintava uvas tão perfeitas que os passari-
nhos vinham bicá-las, acreditando serem elas de verdade.
O outro pintava obJetos e cenas da vida cotidiana que pare-
ciam reais. Quando o segundo concorrente e os jurados vi-
ram as uvas pintadas pelo primeiro artista foram tomados
de grande admiração
Depois, ao chegarem à casa do segundo concorrente. seu
adversário pediu: "- Por favor, afaste a cortina para que pos-
samos ver o quadro". Tendo o outro respondido: .._ Como
afastá-la? Ela é a própria pintura!".
Os jurados concluíram que, se era grande o mérito do
llustr 31 Num processo evolutivo constante. até atIngIr o período
Clássico, a cerâmica grega criou os padrões universais definitivos de
pintor que iludia os pássaros, maior ainda seria o daquele que
todos os vasos existentes, de tal forma que as buscas posteriores de conseguia Iludir quem iludira as aves.
renovação formal não têm sido mais que repetições e variantes dos
modelos helênicos. Muito mais tarde. quando reencontrei a Arte e a vida de
As figuras 1 e 2 são cahces, do denominado grupo de vasos b1b1tónos Zêuxis, o pintor das uvas, e acumulei maiores dados sobre a
A de numero 3 é o lec,to, destinado aos óleos de unção Figuras 4 e 5,
enócoas, Jarros com as curvas das asas mais altas que a boca. utiliza- Arte e a extravagante e extraordinária personalidade de Parrásio.
dos para retirar vinho de recIpIentes maiores Figuras 6 e 7, crateras, fiquei sabendo que a ciência do emprego das luzes e das
taças de grandes dimensões, des11nadas a levar a mesa vinho ou água,
servindo ainda, para misturá los Figuras B e 9, h1dnas. potes boJudos, sombras. e do claro-escuro na pintura, devia muito ao primei-
com três alças para facilitar a transferência do conteudo para outros
ro, e que os estudos da beleza e dos recursos do desenho a
recipientes. usados pr1nc1palmen1e para guardar água Figura 10. ànlora.
vaso boJudo de gargalo estreito e base afilada com um par de asas traço, como disciplina artística, encontrara. no segundo, um
simétricas para facil11ar o transporte. usado para buscar água a fonte,
servindo lambem de depósito de líquidos Figura 11, cântaro, vaso com mestre inigualável em toda a história da Arte helênica.
as mesmas características da ànfora. servindo para os mesmos fins Parrásio foi um dos primeiros a optar pela pintura de ca-
Figura 12, vaso cinerano. destinado a guardar as cinzas de um morto
valete em detrimento da pintura mural.
llustr 28, 30, 32 e 33 - As barras gregas, tipicamente geometncas, Os pósteres não tiveram a ventura de ver os originais da
ás vezes com motivos florais, constituem um tipo original de remate
ilustrativo usado com frequência em vasos. utens1l1os, no vestuáno e no grande pintura grega. Tudo o que sabemos sobre ela são rela-
r vest1mento arqu11etôn1co tos, lendas, descrições e relações de obras de alguns artistas.
ll11str 32
llustr 33
Além dos relatos. os séculos seguintes debruçaram-se afirmarem que os gregos não tinham capacidade perceptiva
m estudos das formas e do colorido da Arte cerâmica do para essas cores. o cotidiano grego era fartamente colorido
período Clássico. influenciada diretamente pela pintura. como por sua Arte decorativa. seu artesanato e principalmente por
única forma de resgatar seu vestígio. de vez que a pintura suas pinturas-mural. de cavalete e de revestimento escultórico.
helenística. produzida em outros meios culturais. distanciava- dando mais vida à extraordinária escultura do período.
se espiritualmente dos modelos originais. Os grandes pintores eram alvo da reverência pública e
A multiplicidade de formas de potes e vasos tornou-se o participavam do círculo de eminências do país.
suporte e o veículo ideal para a exportação da Arte grega. Boa parte dos textos e referências sobre pintura e pinto-
numa época em que a produção cerâmica ricamente decora- res de que se tem notícia foi feita por filósofos, cronistas e
da. confeccionada em olarias e ateliês atenienses. aquecia autores teatrais da época. revelando curiosidades que. até hoje.
não apenas o comércio com o exterior fornecendo recipientes continuam a nos encantar.
para vinhos. óleos. grãos e outros produtos. mas sobretudo o Consta que foram a pintura de Agatarco (c. 440-41 O a.C.)
desenvolvimento da Arte decorativa helênica (ilustr. 27 a 33). e seus escritos sobre cenários teatrais que inspiraram as pri-
Até a descoberta de Tel1 Hamad (Síria) e Tel1 al-Sultan meiras reflexões filosóficas sobre perspectiva.
(Jericó). da pré-cerâmica neolítica A. precedida de alguns ves- Para pintar a Vênus agrigentina, esse pintor reuniu as mais
tígios protoneolíticos de cerca de 8000 anos. a cerâmica era belas moças do lugar para compor. com as partes mais favo-
considerada uma das características do Neolítico. ráveis de cada uma. a figura ideal.
Pela diversidade e evolução de seus temas decorativos. Depois de juntar muito dinheiro como fruto de sua pintu-
la tem sido um meio eficaz de estudo de determinados as- ra. Agatirco começou a dar de graça suas obras. por julgar
pectos culturais de vários períodos históricos. que nenhum preço alcançaria seu devido valor.
Com as escavações de Tel1 Hassuna. no norte do Iraque. Quando Alexandre Magno (o Grande), apaixonado por sua
foi possível datar a aparição da cerâmica pintada. trazendo bela escrava Campapse. desejou que Apeles a retratasse nua.
novos subsídios ao estudo da evolução das culturas neolíticas depois de algumas sessões de pintura. percebeu que o pintor
danubianas da Europa Central. com forma típica e motivos também se apaixonara por ela. Quando o quadro ficou pronto.
incisos ou pintados dos vasos campaniformes. freqüentemente não sabendo quanto pagar por ele. Alexandre deu a moça para
associados à difusão metalúrgica. o pintor e ficou com o retrato.
Desde cedo. em seu período pré-dinástico. os egípcios
descobriram a faiança. fabricada à base de quartzo. A vitrifi- O sapateiro não deve ir além da sandália
cação turquesa. produzida por eles. foi provavelmente a pri- Dizem que Apeles expunha seus quadros ficando escon-
meira a ser feita em cor. Essa técnica é reencontrada na Assíria dido atrás da tela para ouvir a opinião do público. Certo dia
e na antiga Pérsia, vindo a ser a glorificação visual da Babilônia. um sapateiro criticou a sandália de uma das figuras do qua-
Apesar de a língua grega propiciar confusões para a de- dro. Logo em seguida o pintor a corrigiu. Pouco depois. o sa-
i nação das cores verde e azul. levando alguns afoitos a P t ir < h u qu d via criticar outras partes do quadro. mas

5 5
Apeles. saindo de seu esconderijo, disse a m im que se
tornou célebre. "O sapateiro não deve ir além d sandália".
Não se salvou do tempo nenhum original de Apeles. ape-
nas tem-se uma idéia da grandiosidade da sua pintura pelas
descrições feitas por seus contemporâneos. Baseado nelas.
Sandro Bott1cell1 ( 1445-151 O). quase dois mil anos depois. pin-
tou o belo quadro A Calúma. existente no acervo da Gallena
degli Uffize. em Florença.

Vitral: um grito de luz nas trevas


Na obscuridade dos imensos espaços criados pela in-
venção gótica. os vitrais surgem como um grito de luz. colo-

1/ustr 35 - Os fogos
de art1fíc10 contem a
mais fascinante essên
eia da arte cinética.
2003 Tinta acrll1ca so-
bre tela. 33 X 24 cm
Ateliê do artista

rindo o interior das catedrais. iluminando as pinturas murais e


dando vida à policromia da estatuária (ilustr. 34).
Trabalho minucioso de criação artística e apurado artesa
nato. o vitral é a bíblia luminosa que. com seu poder de con
vencimento e de encantamento, conta histórias miraculosas
aos fiéis analfabetos.
Cenas bíblicas e vidas de santos colorem e ostent m a
manipulação da luz pelos pintores. inaugurando um novo pa-
tamar do domlnI0 empírico da natureza.
Os l.clnl ,Iros cl obras das 1nf1ndáve1sconstruçõ s das
Cdl dr.ir 101111v,irns o t1leli" privil 1aclodo pintor m cl1 vai
d l I l '" / M tÍI
século XIII, precedeu ao emprego da pólvora na criação das
armas de fogo.
Das várias formas de produção de cores. a mais curiosa
é a pirotécnica. Nela. o técnico invade a área da Arte quando.
por estudados processos de dosagem. mediante conhecimento
do efeito das misturas. reações de incêndios e combustão
dos elementos químicos empregados. busca os estados
oníricos das deslumbrantes imagens de queima e das explo-
sões simultâneas ou retardadas dos produtos empregados.
Com formas geométricas precisas. que se desdobram em
movimentos previstos. neste estágio de produção. o técnico passa
à condição de artista cinético, criador de formas em movimento.
Os espetáculos de fogos de artifício que se realizam nas
festas de fim de ano. no Rio de Janeiro. começam a se trans-
formar em eventos-símbolo da cidade, onde se desenvolve um
1/ustr 36 Noite luminosa, 2002 Quadro realizado para participa- poder de criatividade cada vez mais ousado. Com seu colorido
ção nas comemorações do 20º Aniversário dos Jornais de Bairro. de O misturado a estrondos. eles são, em si mesmos. verdadeiro
Globo. Visão dos fogos de artificio sobre a Bala de Guanabara Tinta
acrílica sobre tela, 50 X 73 cm Ateliê do artista espetáculo inequívoco de som e luz (ilustr. 35 e 36).

Desde a catedral de Chartres (1194). passando pelas O ateliê renascentista


catedrais de Saint-Denis. Amiens e Sainte-Chapelle de Paris Durante a Idade Média. desprezaram o pintor. rebaixan-
(1241). quando definem-se os padrões básicos dos vitrais em do-o à condição de artesão. Para longe ficara o tempo em
rosáceas, painéis laterais e lancetas. a sofisticação dos meios que. com Alexandre Magno. na Academia de Atenas. os pin-
empregados não pára de crescer e espraia-se pela Espanha. tores ocupavam o primeiro plano entre as Artes liberais.
Inglaterra e Alemanha. Já na Alta Renascença, Leonardo da Vinci continuava a
No século XX, dentro de novos valores estilísticos. ocorre protestar pelo fato de os pintores não serem incluídos entre os
o ressurgimento dos vitrais, especialmente na Alemanha e Fran- integrantes das profissões liberais. Desse protesto nasceram
ça. Braque realiza vitrais para a igreja de Varangeville e Matisse. os textos que compõem sua Apologia da pintura.
para a capela das dominicanas de Vence. A valorização da pintura como trabalho intelectual constI
tui uma tradição justificada por vários tratados desde a Anti-
A pirotécnica como arte cinética guidade Clássica grega. Pela importância de seus cont údos.
O fascínio da queima de pólvora. conhecido na China d t, e rn . ntr I s, o de Eufrânor (360-330 a.C.). sobr
desde o século XI e trazido para a Europa pelos árabes no COI ', . PI í)OI . o de Agatarco (440-41 O a.C.). sobr

6 7
pintura de cenários para teatro, contendo as primeiras abor- No amplo movimento de idéias que agitava a península
dagens sobre a idéia de perspectiva; e os de Apeles, sobre Itálica. desde o século XIII. destacam-se as figuras do arqui-
vários aspectos de sua própria obra. teto e escultor florentino Filippo Brunelleschi (1377-1446). au-
Contudo, o primeiro tratado sobre pintura que conquistou tor do primeiro edifício renascentista e do domo de Santa Maria
a posteridade foi O livro da Arte, de Cennino Cennini, extraor- Dei Fiore. e do escultor Donatello (dito Donato di Betto Bardi,
dinária fonte de informações sobre as técnicas e os debates 1386-1456), de cujas pesquisas nas ruínas da Roma Imperial
de idéias relativos à pintura nas vésperas do Renascimento. seria extraída a essência das formas clássicas, que nutririam
Nele, o ateliê pré-renascentista aparece por inteiro - sua apa- o Renascimento e o próprio sentido de rinascita.
rência física e seu aspecto moral, impregnado de conceitos e Ávido de novos conhecimentos e de aprofundamento das
métodos do fazer pictórico e dos materiais usados pelos ar- idéias reinantes, a eles se juntou o jovem humanista. poeta,
tistas, refletindo o clima de renovação formal despontado em arquiteto e pintor Leon Battista Alberti, que viria a ser o autor
Cimabue e Pietro Cuvallini, mas sobretudo concretizado em da célebre trilogia sobre Arquitetura, Escultura e Pintura, in-
Giotto di Bondone (1266-1337). ventário e elaboração teórica das Artes visuais renascentistas.
Enriquecido com a experiência dos canteiros de obras das Das preocupações de Alberti envolvendo elementos filo-
catedrais e com os elementos de ciência das especulações sóficos, da Óptica, da Física e da Geometria, reveladas na obra
filosóficas, o ateliê pré-renascentista surge como estágio ini- citada. surge novo interesse pelo classicismo greco-romano.
cial do ateliê do século XV, núcleo pioneiro e insubstituível de norteado por uma crítica de avaliação do patrimônio herdado.
Arte e ciência que prepara a Revolução Científica que inaugu- Com Da pintura, um dos livros da trilogia. Alberti atinge
raria os tempos modernos. o mais elevado estágio de especulação científica sobre pin-
Com a sublimação do fazer artístico e por sua abrangên- tura, no alvorecer dos tempos modernos. Pioneiro, o livro é
cia multidisciplinar (onde transparece o amor no trato com os exemplar modelo de teorização artística. obra de concentra-
materiais, dando vida aos produtos químicos e instrumentos da erudição, em que o autor tece considerações gerais so-
inanimados que compõem o mundo real do artista), Cennini b(e a magnitude da pintura e do fazer pictórico. definindo o
surge, também, como autor do "primeiro tratado tecnológico pintor ideal como homem excepcional. de caráter afável. qua-
renascentista, manual pioneiro da química aplicada", segun- se um deus. capaz de recriar a Natureza, leitor dos poetas e
9 pensadores. observador atento da vida humana, das meno-
do Franco Brunello .

res manifestações da Arte às grandes paixões da alma. Ver-


O tratado Da pintura, de Leon Battista Alberti dadeira apologia a Trismegisto.
Em nenhuma outra época da História da Arte houve um fer- Apoiado em autores latinos, principalmente Plínio, o
vor cultural tão grande quanto o existente na século XV, na Itália. Velho, Ouintiliano e Diógenes Laércio, Alberti fala sobre
A paixão pela Arte e pela cultura em geral fez do artista renas- desaparecidos tratados e obras de pintura de Xenócrates.
centista um precursor das ciências modernas. Não por acaso, Apeles, Demétrio. Agatarco. Eufrônio. Apolodoro. sobre
nesse período, foi cunhada a expressão ciência da pintura. c nogr< fi m perspectiva. emprego da luz e da sombra.

58 59
da pirâmide visual a ser reproduzida. Esse véu durante vários
séculos foi utilizado nas Academias de Arte. principalmente
pelos pintores de retrato (ilustr. 40).

Como pode uma As quatro cores de Alberti são três


catedral passar pelo De forma cautelosa. por reconhecer que o estudo da cor
buraco da fechadura? abrangia variados campos do saber. Alberti adverte: "Falo como
llustr. 37 - Durante o Renascimento, enquanto se propagavam pelos pintor. Digo que pela mistura das cores nascem infinitas outras
ateliês ~s in_dagações sobre os fenõmenos da percepção visual, surgia cores. mas existem apenas quatro cores verdadeiras de acor-
como divertimento um curioso aforismo: como pode uma catedral pas-
sar pelo buraco da fechadura? Uma vez que, quando olhamos pelo buraco do com os elementos e, dessas quatro. muitas e muitas outras
da fechadura, a catedral o atravessa e atinge nosso olho. espécies de cores nascem. Existe a cor do fogo. o vermelho; a
A resposta a essa pergunta está na configuração do princípio da
pirâmide visual. Quando o prolongamento das linhas, superior e inferior, do ar, o azul; a da água. o verde e a terra tem cor cinzenta e
que constituem a pirâmide visual, faz com que elas conviriam uma para
a outra. para que seu vértice penetre na pupila do olho próximo ao buraco
parda". Excluída a quarta cor. a da terra. cinzenta e parda (que
da fechadura, esse estreitamento do ângulo das linhas permite que a não são cores. matizes. e sim valores). colocada aí por Alberti,
catedral, nelas contida, passe pelo buraco da fechadura.
visivelmente, para concordar com os quatro elementos, as ou-

desenho linear, que influenciaram as pinturas de vasos, tras três citadas. vermelho, verde e azul. são exatamente as
que a Física moderna consagra como tríade das cores-luz pri-
ânforas. crateras. enócoas, lécitos (ilustr. 31) e plasmaram a
helenização artística da Etrúria. má rias (ilustr. 1O).
Em enfoque perceptivo, afirma " ... mostramos suficien-
Teorizando os conceitos herdados. Alberti abandona os dos
temente como a luz tem força para alterar as cores; ensina-
cones visuais da Óptica de Euclides e adota os das pirâmides
mos como uma mesma cor, de acordo com a luz que recebe,
visuais de Alkindi e Alhazem, definindo a pintura como "a
intersecção da pirâmide visual representada com Arte por linhas altera sua aparência ( ... ) uma vez que toda cor colocada na
e cores numa dada superfície" (ilustr. 37 e 38). Pirâmide visual sombra não parece ser o que é na claridade".
cuja base é constituída pela área do objeto tratado. tendo seu 1/ustr. 38 - Alberti define a pintura como "intersecção da pirâmide
ângulo oposto. vértice, dentro do olho do observador. Segundo o visual representada com arte por linhas e cores numa dada superfície".

autor. na natureza. discernimos mais distintamente as cores e


as qualidades das superfícies e. como toda diferença se origina
da luz, com propriedade podemos chamar sua representação
de recepção de luzes. Portanto. a pintura resulta da circunscri-
ção (desenho das formas). composição e recepção de luz 1º.
Alberti declara-se inventor do véu quadriculado que. mon-
tado em um chassi. é colocado entre o artista e o objeto da
r presentação. para facilitar a execução correta da intersecção

61
60
Vermelho verde Azul Cinza

llustr 39 - As quatro cores primárias de Leon Batt1sta Albert 1, ver-


melho, verde, azul (as mesmas que a Física moderna consagraria vários
s~culos depois como tríade primária das cores-luz) e cinza. A rigor, são
tr~s. se considerarmos que o cinza não é cor. Cinza é valor, fruto da 1/ustr 40 - O véu quadnculado inventado por Albert! é demonstrado
mistura do branco com o preto em funcionamento por Durar, como instrumento auxiliar para a reprodu
ção de um objeto ou cena, com precisão, em perspectiva linear Um
chass1 com o espaço interior quadriculado por fios é colocado entre o
Para a prática da pintura, Alberti adverte: " ... o branco e objeto a ser reproduzido e o pintor. O mesmo quadriculado do véu, na
proporção deseiada, é traçado na tela ou no papel a ser desenhado
o preto não são verdadeiras cores. O pintor não encontra nada Copiando a incidência das partes da imagem nos quadrados do véu, con
com que represente o mais puro da luz senão com o branco e segue-se, com maior facilidade, reproduzir o modelo desejado.
Cópia em guache do desenho de Albrecht Durar. Acervo do autor
só tem o preto para significar as trevas( ... ) o ponto mais alto
da competência e da Arte está em saber usar o branco e o força, a de mostrar nas coisas o que é mais, o que é menos
preto e. para se servir bem deles, convém aplicar todo o es- ou igual( ... ). O marfim e a prata são brancos. mas postos ao
forço e dedicação. Como a luz e a sombra fazem as coisas lado do cisne e da neve parecerão pálidos. Por essa razão, na
parecerem em relevo, da mesma forma o branco e o preto pintura as coisas aparecem extremamente brilhantes onde
dão relevo às coisas pintadas e conferem o prestígio que foi existe uma boa proporção de branco com preto, semelhante
dado ao pintor ateniense Nícias. Dizem que Zêuxis, pintor muito ao que nas coisas vai do luminoso ao escuro. Assim, essas
antigo e famoso, foi quase o príncipe dos pintores por conhe- coisas todas se conhecem por comparação ( ... )_ Como para
cer a força da luz e da sombra". nós o homem é a coisa mais conhecida, talvez, Protágoras,
ao dizer que o homem era a dimensão e a medida das coisas,
A força da comparação entendesse que todas as dimensões das coisas podiam s r
O homem como medida das coisas conhecidas, comparadas com as dimensões dos homens ( )
Aqui a proporção humana é considerada como medida parece-me que Timantes, melhor que todos os outros pinto-
para avaliação subjetiva de outros corpos. Os efeitos visuais,
res antigos, soube apreciar essa força da comparação, pois
que modernamente são estudados sob a denominação de con-
ele, pintando em um quadro bem pequeno um Ciclope gig n-
traste, Alberti os abordou pelo ângulo da comparação, como
dorm cido, colocou lá alguns deuses sátiros que tinham o
forma de ressaltar diferenças. "Assim, essas coisas todas se
li1111t1nho
d• s u d do polegar; dessa forma. comparando-se
conhecem por comparação. A comparação tem em si esta
o q111 d1111111.i r orn os s tiros. o Ciclope parecia enorme"

).
Leonardo da Vinci, vanguarda e modernidade
Com Leonardo da Vinci (1452-1519). o espírito de busca
e totalização, empírico e teórico, nas Artes visuais atinge um
clímax até hoje não superado. Todo o saber da Antiguidade
enriquecido pela contribuição árabe é assimilado por
Leonardo de forma crítica em sua essência e acrescido com
inúmeros elementos de investigação e descobertas, mas
sobretudo, de gênio.
As milhares de páginas de seus manuscritos. grafados
de trás para a frente, que só podem ser lidos com a ajuda de
espelho, revelam o artista, o filósofo, o cientista, o literato, o
profundo pensador, cujas intuição e preocupações apontam 1/ustr. 42 - Leonardo da Vinci.
Mona Lisa -A Joconda, 1610-1615.
para campos do saber ainda inexplorados em seu tempo, fru-
Óleo sobre madeira, 77 X 53 cm.
to de vasta atividade empírica jamais igualada. Museu do Louvre, Paris.
Réplica em processo de fei-
Mas essa febricitante e pioneira atividade estética e cientí- tura. 2002-2003 Óleo sobre tela.
fica, que buscava no estudo da Natureza, "mestra dos mestres". 77 X 53 cm. Ateliê do artista.

a origem das causas e efeitos de todos os fenômenos naturais,


fazia crescer contra Leonardo um clima de intolerância e má von-
tade. que o leva a "se afastar (de Florença) bruscamente porque
não aceitava o vago esteticismo, o espiritualismo abstrato da-
quela filosofia de corte, passa à oposição. até então, no terreno avolumam-se. também, obras em que o Mestre florentino é
do neoplatonismo 11 ". estudado, ao lado de seus trabalhos estéticos, científicos e
Na imensa bibliografia universal leonardiana, com supor- filosóficos, como importante autor de cont_os, facécias e tex-

,
tes dos mais importantes intelectuais dos últimos séculos. tos ligeiros, aspectos aprofundados pela autora de Leonardo
omo sanza /ettere e de Leonardo ieri e oggi, Giuseppina
llustr. 41 - Detalhe da ilustr. 42.
Fumagalli. que o vê "filosófico na essência. poeta no modo
12
expressivo (primeiro poeta cósmico moderno, Leonardo!) ".

Sua beleza física desafiava qualquer elogio


Leonardo era um ser, também, privilegiado fisicamente
Belo, lto, louro, de olhos azuis, com excepcional vigor físico:
c nhoto, ct pois d xaustivos esforços, tornou-se ambidestro
0111.i .i 11,irl,, q111 . .io m smo tempo em que tirava mav,osos

6
e suavíssimos sons de melodias de sua autoria. em alaúde interpretação dos sonhos e nos Três ensaios sobre a teoria da
confeccionado por ele próprio. era capaz de torcer com as mãos sexualidade. dedicando ao Mestre de Vinci o ensaio de cará-
um pino de ferro ou uma ferradura. como se fossem de chumbo. ter biográfico: Uma lembrança de infância de Leonardo da
Todos os dotes de Leonardo que contribuiriam para o apo- Vinci 16. Ao lado das preocupações exclusivas de Freud com
geu da Alta Renascença foram apreciados de forma apaixona- neurose e homossexualidade em Leonardo. o livro traz um
da por Vasari. na biografia do artista escrita por ele. como se admirável repertório de citações estéticas de vários autores.
pode ver desde as primeiras linhas do texto: "Por vezes os que enaltece e sublima o artista e sua obra.
imensos dons que caem naturalmente do céu sobre todos os
homens; de forma sobrenatural acumulam-se em um único A ciência da pintura
indivíduo. dotando-o só de beleza. graça e talento. de tal ma- Para Leonardo da Vinci a pintura era a mais elevada sín-
neira que. faça ele o que fizer. sua ação é tão divina que. ultra- tese de conhecimentos. E esse dado ele procura demonstrar
passando a de todos os outros homens. se manifesta como em inúmeras passagens das incontáveis páginas de seus tex-
dádiva de Deus e não como conquista da Arte humana ( ... ). tos e ilustrações. de onde seu discípulo e herdeiro. Francisco
17
Sua beleza física desafiava qualquer elogio 13". Melzi. retirou as que compõem o Tratado de la pintura edita-
O fascínio que Leonardo exerceu sobre os intelectuais e do somente 132 anos após a morte do Mestre.
artistas de seu tempo continua ainda hoje. acrescido pelos Num conjunto de afirmações de apologia à pintura.
atributos da mitificação. Paul Valéry, em busca da "teoria do Leonardo diz que "a pintura representa para os sentidos as
instrumento" que lhe permitisse estabelecer a unidade obras da natureza com mais veracidade e precisão que as
criadora do espírito. não encontrou melhor exemplo e título palavras ou as letras. uma vez que o olho se engana menos
para seu desafiante trabalho que Introdução ao método de que o juízo( ... ). A pintura é uma filosofia".
Leonardo da Vinci. Demonstrando sua formulação de que "a pintura é uma
Terminando. Valéry fala de uma disciplina que a muitos poesia que se vê". afirma: "A pintura aspira ver uma beleza que
pareceria árida. "Eu vejo Leonardo da Vinci aprofundando essa a encante. e é dona do poder de criá-la( ... ). Oh ciência maravi-
mecânica que ele chamava de paraíso das ciências. com a lhosa! Tu conservas vívidas as perecíveis belezas dos mortais".
mesma força natural que ele se entregava à invenção de ros- Mas Leonardo não tinha dúvida de que esses conhecimen-
tos puros e famosos" e lembra o eterno sonho de Leonardo: tos eram apenas instrumentos para se alcançar a Arte. dai sua
"i/ primo voto il grande uccello ... 14 ... formulação que parece feita nos dias atuais: "A ciência da pintu-
Ao compor um modelo de ética intelectual. Monsieur Tes- ra reside no espírito que a concebe; de onde nasce em seguida
te. Paul Valéry deixa que a sombra de Leonardo. como con- a execução bem mais nobre que a referida teoria ou ciência 18 •
trapeso. flutue sobre os raciocínios. por vezes delirantes em Defendendo sempre a pesquisa e a experimentação na
lógica pertinente. do personagem título 15 . práxis pictural. Leonardo aconselha os pintores sobre o apren-
Também Freud viu em Leonardo magnífica oportunidade dizado do olh r p ra atingir "a elevada percepção visual qu
de aplicação de suas teses e lucubrações contidas em A c n:ti1l11 11 prin ip I d pintura". Sobre o amor o faz r

66 67
pictórico, diz: "O grande amor nasce do profundo conhecimento Teorizando os elementos que constituem a pintura, já vi-
das coisas amadas, e se tu não as conheceres, pouco ou nada mos que Alberti cita circunscrição, composição e recepção
poderás amar". da luz. No detalhamento desses dados, Leonardo grupa-os
Esse conhecimento de que fala Leonardo é o "conheci- em contorno das formas, proporção. expressão. movimento.
mento dos ateliês renascentistas", núcleo privilegiado dos mais composição e claro-escuro.
altos estágios do saber da época, embrião da futura produ- Esse último item é tratado em alentado estudo que in-
ção industrial que se avizinhava, demonstrando ser a pintura clui. também, as abordagens leonardianas sobre luz e som-
uma das "Artes liberais", apesar do seu não reconhecimento bra. Nele, pela primeira vez. a relação entre luz e sombra é
até então. Mágoa de Leonardo. mensurada e representada proporcionalmente. Leonardo cria
Pelos documentos visuais existentes. pode-se afirmar que a representação gráfica circular. dividindo os 360° do círculo
desde a juventude, quando pinta o anjo à esquerda do quadro por raios e diâmetros. para expressar a quantidade de luz.
Batismo de Cristo, de Verrocchio, Leonardo já é senhor dos sombra ou trevas desejada.
elementos essenciais da ciência da pintura, que ele irá de- Essa forma circular de representação gráfica da luz cria-
senvolver a partir daí, apoiado nas lições do "ateliê" do Mes- da por Leonardo. sem dúvida, foi a inspiradora da forma de
tre. em suas leituras e na intensa atividade empírica. representação gráfica das cores dos discos de Newton. Cabe
A perfeição atingida na realização do desenho leva Leonardo aqui sua célebre frase: "Se pude ver tão longe, é porque gi-
à constatação de que, apesar de o desenho ser indispensável gantes me transportaram em seus ombros".
à pintura. ele possui características próprias, muito embora a
sombra e o modelado o aproximem da pintura. O nascimento da Teoria das Cores
Tornando o desenho independente, ficava claro que o cam- Todas as abordagens da cor, desde as de Platão e Aristó-
po específico da pintura é o infinito campo da ciência da cor. teles. passando pelas experimentações dos pintores gregos.
dos sábios árabes e artistas medievais, não chegaram a cons-
A ciência do desenho tituir uma teoria. Essa extraordinária tarefa histórica coube a
O que em Alberti é apenas indicado como "circunscrição" Leonardo da Vinci.
e "composição", Leonardo trata em inúmeras observações nos Nas páginas de seus manuscritos, entre considerações
campos da Óptica geométrica, da Geometria, do Desenho as mais diversas, são inúmeros os elementos que, juntos, for-
analítico. da Anatomia e dos estudos de luz e sombra, criando mam um sólido e coerente corpo de matérias teóricas sobre a
a ciência do Desenho. Com Leonardo, o desenho atinge um cor. E. como prólogo dessas considerações, ele afirma que
nível de realização e beleza tão alto que se transforma em "Dentre os estudos das causas e efeitos naturais. o da luz é o
19"
disciplina intelectual autônoma. Em seu desenho a traço, os que tem mais fervorosos cu 1tores .
lineamentos das escalas de valor, criando sombreado. luz. Mesmo declarando que "todos os nossos conhecimentos
trevas e projetando volumes na superfície plana, continuam pro d m das sensações", Leonardo. como verdadeiro fundador
até hoje insuperáveis. d ~•mI mod rnidad temporal. formula conceitos cósmicos

68 69
infinitesimais, demonstrando conhecer as limitações dos sentidos orifício, ele percebeu que, na parte em que as duas luzes se mistu-
humanos. Sobretudo para a integração das vastas áreas do ravam. surgia o branco (ilustr. 7). Essa experiência. também, sem
conhecimento que se abriam com a revitalização dos primados dúvida, está na origem da ação de Newton que, depois de disper-
heliocêntricos de Aristarco de Sarnas e Nicolau de Cusa. sar um raio de luz branca com um prisma, reuniu novamente as
Privilegiando o ato de pensar. precede no tempo e ultrapassa sete cores do espectro por meio de um segundo prisma invertido,
em amplitude e em essência o célebre "cogito" e a idéia central obtendo a luz branca original (ilustr. 8). Dessa experiência o físico
do Discurso sobre o método de Descartes. afirmando: "Se inglês tirou várias conclusões sobre o grau de refringência das fai-
duvidamos de cada coisa que passa pelos sentidos, como não xas coloridas. comprovando definitivamente que o aparecimento de
duvidar daquelas que são rebeldes aos referidos sentidos. tais cores pela refração da luz branca não era fruto de propriedade do
como a essência de Deus. a alma e outras questões similares meio refrator. mas sim propriedade da luz que fora refratada.
sobre as quais eternamente se discute e responde?( ... ) Diremos,
então, que ali onde se discute (infinitamente) não há verdadeira Luzes originais e derivadas
ciência: pois a verdade só tem um termo, e este. uma vez Ao definir a iluminação dos corpos. Leonardo diz: "Todos
expresso. destrói o litígio para sempre 2º". os corpos se revestem de luzes e de sombras. As luzes são de
duas naturezas: original e derivada. Original é a produzida pela
Leonardo comprova chama do fogo, ou pela luz do sol, ou do ar; derivada é a luz
a composição da luz branca refletida". Dessa forma ele abre caminho à concepção does-
Com a formulação enfática de Leonardo, "O branco não é paço renascentista, pleno de cores e imagens refletidas pelos
uma cor, e sim o composto de todas as cores", a Física passa corpos soo a ação da luz incidente. O que significa dizer tratar-
a integrar definitivamente o campo experimental da ciência se de um espaço aberto à investigação da Física.
da pintura. assim como a Química já o integrava desde seu Mas para a ação prática do pintor, o campo palpável era
nascimento. Ao lado do milenar conhecimento referente às o da Química. no manuseio de pigmentos, aglutinantes.
cores-pigmento (cores químicas). abre-se o campo de inves- fixadores e vernizes .. na produção de tintas. ou cores. como
tigações das cores-luz. numa perspectiva que se desdobrará são geralmente denominadas.
até a produção de imagens coloridas do cinema, da fotogra- Para Leonardo, dentre a infinidade de cores produzidas,
fia, da televisão e da computação gráfica. existiam apenas quatro cores simples. O amarelo, o verde, o
Muito embora já se conhecesse a propriedade de vários azul e o vermelho. "Chamo cores simples aquelas que não po-
meios retratores e o registro de Sêneca. no primeiro século de dem ser produzidas pela mistura de outras cores". E adverte
nossa era, sobre a dispersão da luz branca por uma vara de vidro que, apesar de o branco e o preto não serem cores verdadeiras
com caneluras. coube a Leonardo da Vinci a primeira comprovação (o branco por ser a síntese de todas as cores e o preto por s r
experimental da composição da luz branca. a ausência da luz). o pintor não pode prescindir deles, por não
Ao iluminar um corpo opaco de um lado, com a luz amarelada po uir outro m io para conseguir o brilho intenso da luz
de uma vela, e do outro com a luz azulada diurna filtrada por um UII ld d li va

70 71
Relação dos estágios de luz e sombra
e das sombras coloridas com o sfumato
Para Leonardo, que dominara o processo de formação das
sombras coloridas, elas continham um arsenal de possibilida-
des e mistério que ele poderia ter usado mas não usou. Isso
porque defendia a tese "de que a sombra participa da cor do
Vermelho verde Azul objeto de acordo com a menor ou maior distância, e com o
Amarelo
l!ustr._ 43 - As quatro cores de Leonardo englobavam as três cores- grau de luminosidade do mesmo".
luz pnmánas e as três cores-pigmento opacas.
Nesse nível de acuidade perceptiva, num paralelismo de
Como Leonardo pesquisava simultaneamente luzes conceitos e de envolvimento empírico, atento aos estágios da
coloridas e cores-pigmento, suas quatro cores simples são passagem da sombra à luz e da luz à sombra, que revelam
exatamente as que compõem as duas tríades primárias de sempre diferenças de tonalidade do objeto, Leonardo chega
cores-luz: vermelho, verde e azul e de cores-pigmento: ao império do sfumato, reino onde a técnica é pura sedução.
vermelho, amarelo e azul (ilustr. 43).
Perspectiva aérea
Lanterna mágica e sombras coloridas Após falar da perspectiva linear, Leonardo define a pers-
Fascinado pelo universo da luz, Leonardo tenta medir sua pectiva aérea: "Há uma perspectiva que se denomina aérea
intensidade e cria curioso processo para aferir sua velocida- (nome derivado da quantidade de ar que se interpõe entre o
de, baseado no princípio de que todo corpo que se desloca olho e o objeto 'listo) e que, por degradação dos matizes no
de um ponto a outro se desloca em determinada velocidade. ar, torna sensível a distância dos objetos ... Englobando as
Desenvolve a lanterna mágica, para projeção de imagens e duas perspectivas. a linear e a aérea, surge a perspectiva
sombras, e original processo de manipulação da luz em câ- pictórica que tem três partes: a diminuição quantitativa dos
mara escura. Com auxílio da luz de uma vela e de um raio de
luz diurna, explica convincentemente o fenômeno das som-
bras coloridas, fenômeno que vários séculos depois ainda
continuava intrigando físicos e artistas que desconheciam as
experiências leonardianas 21 .

llustr. 44 - Filtrada por um orifício. a luz de 1/ustr 45 - Para criar a sensação de distâncias variadas, Leonardo
uma vela ilumina um corpo azul. O resultado é recom nda 'Tarâs sobre o referido muro o primeiro edifício com sua cor
como se misturássemos o amarelo ao azul que. n.itur,1I, o mms d1stunte. faça o menos definido e mais azulado ( ) esta regra
1untos. reproduzem um belo verde. 1 r,1 com q11 os e t11ffc10squ estão na mesma linha e do mesmo tamanho
p 1(1l111lnse 1111
'>t 1.i111 m11nt . qual o mais distante e qual o maior d les"

7 73
llustr. 47 - Iniciando as revelações do segredo do colorido, Leonardo
drz· "Toda cor se destaca mais ao lado de sua cor contrária (complementar)"

Contrastes simultâneos de valores e tons


Nestes textos seguintes os efeitos da luz e da sombra.
ou o claro-escuro. são tratados em termos de reciprocidade e
de reversibilidade. "Quando o preto faz limite com o branco e
o branco com o preto, cada um parece mais intenso no limite
com seu contrário que na parte do meio de sua própria área".
llustr. 46 Por ação do ar entreposto entre as bolas e o olho do observa-
dor. a medrda que elas se afastam. as ma,s coloridas perdem cor freando
Falando da potência da imagem. aconselha: "O fundo deve
mais claras A branca escurece no sentido da coloraçao do ar que a envolve. contrastar com a figura; isto é: a clara no fundo escuro e a
escura, no claro. o branco com o preto e o preto com o branco
corpos; a atenuação de suas cores; a diminuição das figu- parecem mais potentes. um em relação ao outro. e. assim, os
ras e dos contornos a diversas distâncias". Continuando: "A contrários mostram-se sempre mais potentes em presença um
superfície de todo corpo iluminado participa da cor da luz do outro"(ilustr. 47 e 48).
que o ilumina, e também tem a cor do ar que se interpõe Tecendo considerações que revelam elementos de har-
entre o olho e este corpo; quer dizer. a cor do meio transpa- monia, Leonardo diz: "Dentre cores iguais, apresentará maior
rente interposta entre o objeto e a vista 22 "(ilustr. 46). beleza a que se encontre ao lado de sua cor contrária: o azul
Por efeito da aeração, "As coisas mais escuras que a área ao lado do amarelo-dourado e o verde ao lado do vermelho".
em que se destacam parecerão menos escuras à proporção
que se distanciam; e a coisa mais clara que a área em que se 1/ustr. 48 - Leonardo ensrna "Quando o preto faz limite com o bran-
co e o branco com o preto, cada um parece mars intenso no lrmrte com
destaca parecerá menos clara à medida que se distancia do seu contrário que na parte do mero de sua própria área".
olho. As coisas mais escuras e a mais clara que a área em
que se projetam. a longa distância trocam de cor, porque a
clara fica mais escura e as escuras tornam-se mais claras".
Essa é a origem da instigante formulação de que "o preto
na luz é mais claro que o branco na sombra", frase que ouvi
de Portinari, pela primeira vez, em 1942.

7S
-- ---

/
"-
(
)
llusrr. 49 - Observação de Leonardo " Várias vezes eu v1 um obieto
branco Iluminado por luzes vermelhas produzir sombras azuladas; isso acon-
\ /
tece nas montanhas de neve. quando o sol declina na linha do horizonte"
" /

------
Para maior consciência e enriquecimento dos contrastes,
ele aconselha o pintor a observar a paisagem através de vi-
-...._-------- ~
--
dros coloridos e memorizar os efeitos obtidos. '{•~

·r~
Uma experiência e um conselho
Abordei até aqui apenas alguns poucos exemplares da imen-
'.·l,
sa relação de experimentos científicos ligados à prática artística llustr 50 - Leonardo diz. "Dando-se a um lição um movimento circular,
leonardiana, mas não poderia deixar de citar uma experiência mag- sua circunferência parecerá de fogo"
nífica e um conselho extraordinário do Mestre de Vinci.
efeitos e tempos diferenciados de saturação, latência e aco-
A experiência modação retinianas no ato perceptivo, demonstrando que a
cor está em nós e não fora de nós; abrindo caminho à cons-
Considerando o processo da percepção visual, Leonardo
traz à lona elementos do mecanismo da visão, que fazem lem- tatação de que a cor é tão-somente uma sensação e que, fora
brar sua descoberta do cristalino, durante as mais de trinta dos órgãos dos sentidos, não há cor, odor ou gosto.
dissecações de cadáveres que procedeu para estudo do fun-
cionamento dos órgãos e desenho do mais perfeito mapa
O conselho
anatômico de que se tem notícia. Contrastando com o copioso registro material do pensa-
mento nobiliárquico, são poucas e fragmentadas as informa
É nesse estágio da Medicina que a Óptica abre caminho
ções das constantes e ruidosas discussões esté.tica~ q~e
à Oftalmologia e à Psicologia, na senda das reações percep-
agitaram a vida dos ateliês florentinos. centro de 1rrad1açao
tivas, numa experiência que vincula elementos da Química e
da autêntica vida cultural da Itália renascentista.
da Física, rica de deduções implícitas. Partindo da formula-
Mas os raros documentos existentes nos dão conta da
ção "Todo corpo que se move com rapidez parece tingir seu
exuberância intelectual e violência das paixões que moviam
percurso com sua própria cor", Leonardo diz: "Dando-se a um
esses espíritos de escol que forjaram o mais deslumbrant
tição um movimento circular, sua circunferência parecerá de
fogo"(ilustr. 50). Isso trazia consigo novos elementos com- século da história da humanidade. Através deles, podemos
,m 9 ,nar o g,Lado ambiente em que se moviam esses ar
probatórios sobre a imaterialidade da cor e a evidência dos
ti 1,1s No p,1r,íqrr1fo íinal da dedicatória do De p1ctura .1
76
77
Fillippo Brunellesch1, Albcn1 diz· "Quanto a mim, desejo,
sobretudo, ser corrigido por t1 para não sofrer as dentadas
dos meus detratores 23 ".
Conta Cellini. em suas Memónas, o relato do escultor
Pietro Torrigiane, quando ainda adolescentes, nas sessões de
desenho na Capela Masaccio. cansado das zombarias de
Miguel Angelo sobre seus trabalhos: "Apliquei-lhe um soco
tão terrível no nariz que senti os ossos e cartilagem quebra-
rem-se sob minha mão como se fossem biscoito 24 ". 1/ustr. 52 Leonardo da Vinci
Dama com arminho. c. 1483 •
Mais espiritualizado, num texto em que transparece iro-
1490. Óleo sobre madeira, 54,8 X
nia e respeito, Leonardo, ao defender o estudo da natureza, 40 _3 cm Czartorysk Museum.
Cracóvia. Retrato da jovem aman-
faz velada crítica a Sandro Botticelli. Mas o interesse maior te de Ludovico. o Mouro, Cecília
dessa passagem é a revelação da visão leonardiana referente Gallerani o mais belo canto de
amor pintado em todos os tem-
a complexos elementos psicológicos da percepção, dadoses- pos. deslumbramento de um ho-
tudados nos últimos séculos na área da Psicanálise e da Psi- mem ante a beleza feminina
Réplica. 2000. Óleo sobre
cologia, em que se destacam os testes de Rorschach. tela. 62 x 45 cm. Ateliê do artista
Deixemo-nos enfeitiçar pelas maviosas considerações
leonardianas: "O pintor que não tende à universalidade, que
não ama todas as coisas por igual, dentro do domínio da pin-
tura; que não deseja a paisagem, considerando tratar-se de

um gênero de curta e medíocre investigação, como nosso


1/ustr. 51 - Detalhe da llustr. 52 Botticelli, que qualifica de vão seu estudo, alegando qu~, se
se atira contra um muro uma esponja empapada com diver-
sas cores, se produz uma mancha na qual é possível ver uma
bela paisagem, tem razão; em semelhante m_ancha se pode
ver extravagantes invenções; quero dizer com isso que aquel
que queira olhar atentamente a mancha achará nela cabeças
humanas, diversos animais, uma batalha, penhascos, o mar,
nuvens e outras coisas mais; é como o repique dos sinos,
• •
que permite escutar tudo quanto se imagina ( ) Por mais
que essa mácula possa sugerir idéias, não lhes ensina d
t rm1n,11co1s e I uma. e. em consequência, o refendo pinto1
• '!í"
1 1, tit 11.i p1 ,1m, s paisagens .
Defendendo sempre o conceito de que a Arte é fruto de
uma prospecção da Natureza tratada de forma ideal por seres
com dotes específicos. Leonardo explica: "Aquele que execu-
ta uma coisa com perfeição demonstra que a natureza odes-
tinou para tal coisa. e não para outra. e. assim. se se dedica
com amor. a força mesma do amor o fará ainda mais aplica-
do 26 ". Com formulações próprias de Galileu. quase um século
depois. quando estabelece a Matemática como fundamento
das ciências exatas. da Revolução Científica e do advento das
ciências naturais como princípio. Leonardo repete o mesmo
conceito inúmeras vezes. em textos diferentes: "Nenhuma in- 1/ustr. 53 - Hierony-
mus Bosch. O Jardim das
vestigação humana pode intitular-se verdadeira ciência antes
de/feias. Tríptico. óleo so-
de ter passado pela demonstração matemática( ... ). Direi que bre madeira Detalhe do
painel lateral d1re1to que
aqueles que só estudam os autores e não as obras da nature- mede 220 X 97 cm Museu
za são. em Arte. netos e nunca filhos dessa natureza. mestra do Prado. Madri.
Réplica (detalhe).
dos bons autores( ... ) a pintura que está no espírito do artista 2000-2001 Óleo sobre
só alcança sua perfeição mediante a operação manual. com tela, 65 X 54 cm. Ateliê
do arusta
seus princípios verdadeiros e científicos".
E no mais elevado estágio antiacadêmico. numa
conceituação implícita sobre sua vasta explanação, declara:
"Estas regras tendem a que possuas um bom e livre juízo; o
bom juízo nasce da boa compreensão 27 ".

Um surpreendente
contemporâneo de Leonardo
Hieronymus Bosch (1450-1516) nasceu em Flandres. dois
anos antes do nascimento de Leonardo, e viveu um ano me-
nos que o Mestre de Vinci. Filho e neto de pintores. seu pri-
meiro vocabulário plástico teria sido inteiramente gótico. como
herança familiar.
As marcas do goticismo que povoam a fértil inventiva da llustr. 54 - Detalhe da 1/ustr
Baixa Idade Média permaneceriam em toda sua obra, por ve-
zes metamorfoseadas. tanto nos trabalhos de juventude como

8
nos de sua fase de maturidade. Neles coexistem o clima opres-
sor do fim do medievalismo e os anseios luminosos renas-
centistas (ilustr. 53 e 54).
Com Bosch a História da Arte ganha a primeira recoita
visual de um profundo mergulho na alma humana, sem pie-
dade ou compaixão para com a concupiscência e demais
fraquezas humanas.
Obra complexa de elevado teor moral, compondo um uni-
verso de permanente ascendência cultural, com seus instigan-
tes símbolos cabalísticos, alquímicos, místicos ou esotéricos,
continua a desafiar a argúcia de filósofos, estetas. críticos e
historiadores de Arte que desejam ver em Bosch algo mais
que o simples poder da criação artística.
1/ustr 55 - Vermeer
Nessa ampla retratação do variável comportamento de Delft Mulher em azul.
individual ou coletivo, o pintor se transforma em diretor de lendo uma carta. 1 663-
1664 Óleo sobre madei-
orquestração cênica presidida por germens de futuros ra, 46.6 X 39, 1 cm. Rijks-
gêneros artísticos, grotescos ou sublimes, indo da sátira às museum, Amsterdam
Réplica. 2000 Óleo
especulações sociológicas ou psicanalíticas. num arco que, sobre tela. 46 X 39 cm.
misteriosamente, abarca as origens de um sarcástico Ateliê do artista

Realismo e do mais profundo subjetivismo engastado nas


trilhas do Surrealismo.
Essa obra de Bosch pode despertar toda espécie de dis-
cussões, mas ela nunca é discursiva. Ela está na origem do De Caravaggio a Vermeer, visões opostas
cartum, dos desenhos de humor e das bandas de anedotas, da abordagem da luz
Passado o apogeu renascentista, em franca oposição ao
mas ela nunca é anedótica. Seus meios e vocabulário, por
barroquismo e maneirismo, surge em Roma a avassaladora in-
mais extravagantes que pareçam e por mais metamorfoses
fluência do lombardo Caravaggio, li tenebroso (Michelangelo
que provoquem, são essencialmente e especificamente pic-
Merisi. dito - 1571 ou 1573-161 O). Seu brutal realismo, expresso
tóricos. Aí reside a força avassaladora do seu gênio.
sobretudo pela violência dos contrastes de luz e sombra emer-
O céu e o inferno, o bem e o mal, a luz e as trevas inte-
gentes de fundos pretos, criou o Tenebrismo, que em variados
gram as contingências humanas em genes perpétuos, em que
graus de absorção marcou a pintura de Georges de La Tour. d
seres de um gênero se transformam em espécies de outro.
T rbru en. Hals, Rembrandt. Ribera, Velázques, Zurbarán e inú
abrindo as cortinas de um fabuloso teatro alquímico, de onde
mi ro, outro.., r nd s artistas até o advento do Romantismo
surgirão Goyas. Klees. Kafkas e Garcías Márquez.

X1
!L
No outro extremo. tendo a luz como tema e poesia. manifestações de cores fisiológicas e que a visão humana. como
Vermeer de Delft (Johannes Vermeer. dito - 1632-1675) não forma normal de funcionamento. tende à totalização cromática.
influenciaria ninguém. mas sua obra já registrava os acordes produzindo ela mesma as cores de que necessita.
libertários do Iluminismo. a orquestração cromática do Roman- O interesse de Goethe pelas Artes plásticas manifes-
tismo e o processo da pura visão como método pictural. que tou-se desde cedo. nos estudos de pintura e desenho. na
caracterizaria o Impressionismo: germens latentes (ilustr. 55). juventude. Em 1780, traduziu para o alemão a autobiografia
Esquecida por muito tempo, só depois de sua redesco- de Benvenuto Cellini. Mas sua maior contribuição às Artes
berta por William Bürger (Théophile Thoré. dito. cognominado visuais está em seus conceitos estéticos que fizeram avan-
William Bürger), em 1866. sua obra atingiria a consagração çar o Romantismo na Alemanha. sobretudo em seu Esboço
devida aos grandes mestres da pintura universal. de uma teoria das cores 28, que impulsiona o estudo dos ele-
mentos que viriam a compor a Óptica fisiológica. que im-
Goethe e a Teoria das Cores pressionaria vivamente o pintor William Turner.
A partir das experiências realizadas em 1730 pelo grava-
dor alemão Jakob Christof Le Blon (1667-1741). abria-se novo Um impressionista que precede
foco de interesse relativo à análise dos fenômenos perceptivos. ao Impressionismo
comprovando-se serem o vermelho. o amarelo e o azul as três Joseph Mallord William Turner (1775-1851). visto por
cores-pigmento primárias. seus inúmeros admiradores como o maior gênio da época.
Com pequenos pontos bem próximos uns dos outros. de em crescente evidência no transcurso das últimas cinco
vermelho e azul. Le Blon conseguiu produzir a mistura óptica. décadas do século XX e encarnando o próprio espírito de
causando no observador a sensação de violeta. Com verme- vanguarda. destaca-se cada vez mais no panorama artísti-
lho e amarelo fez surgir a sensação de laranja; com o amarelo co deste início de milênio.
e o azul, a do verde. Por temperamento, audácia e autenticidade, ao enfrentar
No âmbito das cores-luz. Goethe (Johann Wolfgang, 1749- a fúria dos elementos naturais. transformando-a em espetá-
1832). com o auxílio de prismas. chegara à conclusão de que culos visuais. Turner, como indivíduo. vislumbra e ultrapassa
a tríade primária era verde, vermelho e violeta. revigorando a sozinho vários estágios da Arte dos últimos duzentos anos.
tese defendida anteriormente por C. Wünch. Sua aguda intuição o leva do Neoclassicismo inicial aos
• Considerando as experiências leonardianas. do que mais alicerces do Romantismo inglês e, deste. aos fundamentos
tarde seriam denominados contrastes simultâneos de cores. e cerne do Impressionismo. Em ascensão. como observ~ John
saturação retiniana e latência, Goethe faz avançar o conceito Ruskin (1819-1900). num processo de observação realista.
de que o olho humano sob a ação de determinados estímulos extrai da natureza os mais surpreendentes elementos da ab
é capaz de produzir cores.
tração pictórica.
Observador atento. Goethe realiza aprofundado estudo des- /\t nto s conquistas culturais de seu tempo. d dica do1
ses fenômenos. chegando à conclusão de que se tratava de u.iclr . r 11,1d Cor s. de Go th . N clim d bu •

84
llustr. 56 - William Turner Paisagem com um rio e a bafa a d1s1An- f/ustr. 57 - William Turner Barque,ros descarregando carvão à luL
c1a, c. 1835. Óleo sobre tela. 94 X 123 cm. Museu do Louvre, Paris Nesta do luar, 1835 Óleo sobre tela. 92.3 X 122.8 cm National Gallery of Art,
tela. elementos abstratos encantam o ato perceptivo de Turner Washington. DC
Réplica, 2001-2002 Óleo sobre tela. 75 X 100 cm Ateliê do artista. Réplica. 2001 Óleo sobre tela. 73 X 100 cm. Ateliê do artista

e sublimação do saber, descobre a coloração violácea das Chevreul 3 1, procurando evidenciar o caráter científico do Neo-
sombras, que influenciaria os pré-impressionistas. impressi- impressionismo. Curiosamente, em seu livro de justificativa
onistas e pós-impressionistas. Suas conquistas técnicas me- teórica desse Movimento, é nas considerações de Ruskin. em
receriam de Constable a bela observação crítica: "Evanescen- grande parte dedicadas à pintura de Turner. que Signac encon
te e aéreo, ele parece pintar com vapor colorido 29 ". Colorido tra os mais inovadores conceitos e a entusiástica compreensão
que levara Ruskin à fundamental advertência: "A missão do pin- quanto ao emprego dos pequenos toques de cores puras, frag
tor é pintar; se ele sabe colorir sua tela. é pintor. mesmo que mentadas. em justaposição ou formando escalas de degrada
32
não saiba fazer nada mais. Se ele não sabe colorir. não é um ção de tons. Em suma. da técnica pontilhista •

pintor, mesmo que saiba fazer tudo, menos isso ... 3 º".
Ao falar da obra de Turner. numa antevisão do futuro Presença de Cézanne
Ruskin parece referir-se ao pontilhismo de Georges Seurat Num cenário em que repercute intensamente o colorido
( 1859-1891) e de Paul Signac ( 1863-1935). Como a maioria dos d D lacroix, as ressonâncias dos acordes cromáticos de Goy
pintores cultos de seu tempo, Signac enaltece as teorias de c1 d c,c oh rt dos randes coloris tas ingleses. em Turn r

87
Constable, a cor começa a despontar cada vez mais como
anseio de uma linguagem autônoma. que busca independen-
tizar-se do jugo do motivo, do tema e da forma, para expres-
sar uma pura linguagem de sensações.
Interpretando (ainda sem uma noção consciente) esse
estado de espírito. um grupo de jovens pintores franceses.
egresso do ateliê de Gleyre (Renoir. Sisley, Bazille, Monet) e
da Academia Suíça (Cézanne. Guillaumin. Pissarro). a que se
juntam o holandês Jongkind e o norte-americano Whistler, ter-
minaria por realizar um evento de importância histórica com a
exposição de 1874. no ateliê do fotógrafo Nadar. denominada.
posteriormente. de impressionista.
De importância capital para esse movimento de renova-
ção estética que se esboçava contra os ditames do academi-
cismo. nutrido por todos os indicadores dos novos tempos
que se aglutinavam na capital mundial da pintura. foi a des-
coberta de William Turner por Monet. durante o período em
que este último esteve na Inglaterra fugindo da guerra franco-
prussiana. nos anos 1870-1871. llustr. 58 _ Paul Cézanne. A curva da estrada. 1879-1882. Óleo sobre
O processo técnico de pequenas pinceladas de cor. o tela 59 5 X 72 cm. Museum oi Fine Arts. Boston.
• Réplica. 2002-2003. Óleo sobre tela. 60 X 73 cm Ateliê do artista.
revolucionário posicionamento do artista diante da natureza e
até mesmo os títulos de várias obras de Turner, tais como do
os últimos vestígios de romantismo e enriquece sua paleta
nascer do sol. dos efeitos de luar. das brumas e das tempes-
com os tons luminosos dos impressionistas (ilustr. 58).
tades sobre o mar (Nascer do sol sobre o castelo de Norham,
Durante a permanência de Cézanne em Auvers-sur-Oise,
1835-1840; Chuva, vapor e velocidade; The Great Western
cada vez mais se faz sentir a influência de Pissarro sobre sua
Raílway. 1844; e praticamente toda a grande série de im-
pintura. Muito depois. Cézanne diria: "Quanto ao velho
pressões de variados aspectos da natureza). seriam apre-
Pissarro. ele foi um pai para mim. Era um homem a ser con-
sentados por Monet em um novo cenário social de palpitante 33"
repercussão mundial. sultado. alguma coisa assim como o bom D eus •
No grupo impressionista, desde cedo, Cézanne sentia
o pintor e crítico de Arte Émile Bernard ( 1868-1941).
principal divulgador dos conceitos estéticos de Cézanne. na
grande afinidade com Camille Pissarro ( 1830-1903). que teve
pr sentação de suas anotações de diálogos com o Mestr
considerável importância na evolução artística do jovem Paul
d11 /\1x n Provence. destacou algumas de suas formul çõ s
Cézanne (1839-1906). Sob sua influência. Cézanne abandona
referentes ao colorido. ricas de ensinamentos para a prática
Ressaltando a importância da obra de Cézann 1,1111 "
da grande pintura:
Arte contemporânea. Giulio Cario Argan escreve: "É porl" nt
.._ Pintar do natural não é copiar o objeto, é realizar
uma imagem nova de Cézanne que traz a presente obra (d
suas sensações.
Lionello Venturi): a luta do artista contra toda cultura
- Ler a natureza é vê-la sob o véu da interpretação por
institucionalizada e a elaboração de uma nova cultura da for-
manchas coloridas se sucedendo segundo uma lei da harmo-
ma-cor. um primitivismo que não é ingenuidade simulada mas
nia. Essas grandes colorações se analisam assim por modu-
consciência de estar na origem de uma nova era da Arte, uma
lação. Pintar é registrar suas sensações coloridas.
vontade obstinada de neutralizar a vida do homem para viver
- A sombra é uma cor como a luz, mas ela é menos brilhan- 34
somente. sem reservas, a existência do artista ".
te: luz e sombra não são mais que uma relação de dois tons.
- O desenho e a cor não são coisas distintas; ao mesmo
A cor liberta-se do motivo
tempo em que se pinta. se desenha; quanto mais a cor se
Desde o início do século XX. numa proliferação de ismos
harmoniza. mais o desenho se precisa. Quando a cor atinge
(Futurismo. Raionismo. Expressionismo. Fauvismo. Abstracionis-
sua riqueza, a forma atinge sua plenitude. Os contrastes e as
mo. Cubismo. Realismo. Surrealismo. Expressionismo abstrato)
relações de tons. eis aí o segredo do desenho e do modelado.
em que se debatiam as vanguardas artísticas embriagadas de
- Tudo se resume nisto: sentir as sensações e ler a Natureza." sensações. em um mundo catastrófico em desenfreada veloci-
dade de transformações. destacaram-se coloristas como Robert
Delaunay, Paul Klee. Pablo Picasso e Henri Matisse.
Aprofundando as pesquisas da cor como linguagem au-
tônoma. abria-se o caminho da abstração pictórica com s
obras de Vassili Kandinsky, Delaunay, Klee e Pieter Mondriaan.
Essa revolução no emprego da cor se faz sentir imediatamen-
te nos mais diferentes ramos das Artes industriais, das Artes
aplicadas e decorativas.
Sob esse impulso renovador da pintura. todas as disci-
plinas artísticas ampliam suas linguagens. Na Arquitetura. com
o predomínio da forma sobre a função; na Música. com o pre-
llusrr. 59 - Paul Cézanne. Auto- domínio de efeitos sonoros sobre a linha melódica; e at n
retrato, 1873-1874. Óleo sobre tela.
64 X 53 cm. Musée d'Orsay, Paris. Literatura. com todo tipo de experiências formais. em d tri-
Réplica em processo de feitura. mento do tempo cronológico e do enredo tradicional. Tal como
2002. Óleo sobre tela, 60,5 X 46 cm.
Ateliê do artista. ocorre com as imagens visuais. a descrição de coisas e ratos
rde interesse para o texto. que se tr nsform em conv,t
p,ir,1 x rcícios interpret tivos viag ns intros ctiv s

91
Nova voga da pintura mural
Durante o período de consolidação da vitória da Revolu-
ção Mexicana, em 1920. sob os auspícios da Secretaria de
Educação, surgiu o amplo movimento muralista. procurando
reviver elementos autóctones das culturas asteca e tolteca.
com processos de renovação técnica europeizante, de cunho
eminentemente social.
Os muros da capital do México e de algumas províncias
cobriram-se de pinturas que influenciariam toda a Arte do
continente americano. revelando ao mundo as figuras de três 1/ustr. 60 - David Alfaro
extraordinários artistas: José Clemente Orozco (1883-1949). Siqueiros. E/ Centauro de la
Conquista, 1944. Piroxilina
Diego Rivera (1886-1957) e David Alfaro Siqueiros (1896- sobre tela. 79 X 60 cm. Col
1974). Este último. principal idealizador e articulador do Arturo Camllo Gr11alva
Réplica, 2001. Óleo so-
movimento, lúcido e combativo teórico da Arte social bre tela. 72.5 X 55 cm. Ateliê
contemporânea, artista de inegável genialidade. em seu do artista.
ateliê de Nova York. Experimental Workshop, em 1935. teve
Jackson Pollock como discípulo.
A passagem de Siqueiros pelo Brasil. em 1934. quando
realizou palestras para intelectuais e artistas de São Paulo e -o de formas não lhe satisfazia. Para ele. Arte era
repro d uça 0
Rio de Janeiro. teve grande influência para a consolidação de criação e não repetição de formas. Mas todo esse process
novos rumos da consciência modernista entre nós. Na apre- . h om a Arte pela Arte.
de realização estética nada tin a a ver c .
sentação da Exposição Comemorativa do centenário de nasci- Endereçava-se fundamentalmente para o en~a1amento
mento de Siqueiros. Dolores Olmedo Patino diz: "David Alfaro voluntário. para a mensagem de participação soe,~!.
Siqueiros. um dos artistas contemporâneos mais importantes Seus trabalhos revelam uma personalidade eminentem~n-
de nosso país. com grande inteligência e talento contribuiu te vibrante, que se alteia com um vigoroso vocab_ulário _plást1c~
para introduzir o México na história da Arte universal. Seu pen- . pictórica onde surgem inventivas pai-
voltado para a pesquisa •
samento, sua produção e pesquisas plásticas o colocaram à s vulcânicas com céus ameaçadores. retratos verazes.
sagen tas em per-
frente das novas propostas artísticas internacionais. uma vez multidões solidárias ou enfurecidas. naturezas-mor -
que suas influências estéticas são inegáveis nas criações de . t Tudo desaguando em suas elucubraçoes em
pétuo mov,men o. A
outros respeitáveis artistas. como por exemplo alguns repre- torno do acidente pictórico, ou dos caprichos do acaso e~ rlde.
sentantes da Escola de Nova York 35 ". Desde sua generosa origem. todo esse legado dei e
Siqueiros foi pesquisador por excelência. Sua insatisfação si, m ic no para pertencer humanidade.
em pintar o que já fora pintado era permanente. A simples
91
O emprego das cores no Brasil
Durante quase três séculos o ateliê do artista colonial no
Brasil foi o claustro dos mosteiros e igrejas, onde produção e
aprendizado artísticos eram essencialmente empíricos.
Nesse período. entre numerosos artistas. em sua maioria
eclesiásticos. destacaram-se as figuras de Agostinho da Pie-
dade. Domingos da Conceição. Joaquim José da Rocha e. com
relevo especial. Manuel da Costa Ataíde. pela originalidade
do colorido de sua pintura e pela inclusão de feições mesti-
ças nos séqüitos celestiais que cobriram as paredes e os te-
tos das igrejas barrocas das Minas Gerais.
Com a chegada da Missão Cultural Francesa. trazida por D.
João VI. inicia-se o ciclo da oficialização da Arte. Sob a direção
do escritor e político francês Joachin Lebreton ( 1760-1819). em
1816, foi criada, no Rio de Janeiro. a Escola Real de Ciências.
Artes e Ofícios (mais tarde. Academia Imperial de Belas-Artes.
Escola Nacional de Belas-Artes. hoje Escola de Belas-Artes da
UFRJ). introduzindo no pais o Neoclassicismo e o Academismo.
A secularização da Arte trouxe a modernização dos ateliês
de pintura. seguindo os padrões de estúdios e galerias de
arte franceses.
O Neoclassicismo formou numeroso grupo de artistas
nacionais em que se destacam Vitor Meireles ( 1832-1903). Pedro
Américo (1843-1905). Almeida Junior (1850-1899). Rodolfo Amoedo
(1857-1941 ). Batista da Costa ( 1865-1926) e vários outros.
Ainda no século XIX. em torno de Georg Grimm (1848- 1/usrr 61 - Candido Port1nar1. Mulher e criança, 1936. Óleo sobro
1887). surgiu o mais especulativo e original movimento paisa- C I M na da Glória da Cruz Machado.
tela. 100 ~ 81 cm. óº. a b tela 100 X 81 cm. Ateliê do artista
Réplica. 2003. leo so re •
gístico de pintura ao ar livre das Américas. revelando. dentre
outras. as figuras de Giovanni Battista Castagnetto (1862-1900)
e de Antonio Parreiras ( 1860-1937).
Paralelamente ao paisagismo do Grupo Grimm 36 , nossa
pintura se enriquece com o colorido impressionista da obra
de Eliseu Visconti ( 1866-1944).

95
Com Candido Portinari (1903-1962). nossa pintura integra
a corrente do modernismo internacional e amplia a potenciali-
dade de nossa modernidade, revelando um Brasil ignoto, em
imagens visuais dramáticas, de um vjolento realismo até então
não registrado na História da Arte.
Mas Portinari não é apenas o pintor das tragédias do sub-
desenvolvimento. Pintando todos os aspectos da vida nacio-
nal, de Norte a Sul, ele transforma-se, também, em visionário
do porvir da grandeza de seu país (ilustr. 61).
A amplitude de sua visão estética está gravada nos mu- 1/ustr. 62 - Hoje o ateliê do pintor não é apenas um organismo vivo
rais da Fundação Hispânica da Biblioteca do Congresso dos ligado à produção de imagens visuais da socied_ade _contemporânea. Ele
é também uma relíquia renovadora de toda a História da Arte.
EUA. em Washington; do Ministério da Educação, no Rio de
Janeiro; da Igreja da Pampulha, em Belo Horizonte; quadros
de grandes dimensões como os painéis Tiradentes, Chegada
de D. João VI ao Brasil e nos gigantescos painéis Guerra e
Paz, do edifício da ONU, em Nova York.
No texto de seu livro Portinari, o crítico Antonio Bento ( 1902- 1/ustr. 63 - A tríade verme-
lho. verde e azul dos spot - que
1988) registra: "Pietro Maria Bardi teve a primazia de apontá-lo cria desde a magia dos mais sin-
como um intérprete das misérias do Terceiro Mundo". Já na gelos espetáculos de marionete e
das misteriosas sombras colori-
apresentação do referido livro. Bento afirma: " ... Portinari foi das até grandes representações
em suas obras dramáticas e trágicas. o mais representativo teatrais e as mesas de efeitos es-
peciais do cinema. da televisão e
dentre os artistas do Terceiro Mundo. Tornou-se mesmo o mais da computação gráfica - é a mira-
culosa atual paleta eletrônica ma-
impressionante intérprete do sofrimento de um povo37"_
nipulada por cérebros. almas e
mãos de pintores.
Hoje, o que é o ateliê do pintor?
A partir do século XIX, com o crescente desenvolvimento
Hoje. tomando-se a pintura tal como a concebera Leon
científico e tecnológico dos meios de criação e reprodução de
Battista Alberti, "A circunscrição. composição e recepção de
imagens. filósofos e estetas chegaram a prever o desapareci-
luz, tratadas com Arte", vemos que ela tornou-se um organis-
mento da pintura.
mo dinâmico composto de inúmeras células em perpétua ex-
Mas o que ocorreu no curso do século XX e vem ocorrendo
pansão. Como nunca, a luz recria a própria vida.
no início deste provam exatamente o contrário. Tudo o que pa-
Se da Pré-história até o Renascimento o ateliê do pintor
recia ameaçar a existência da pintura passou a integrar o seu
for 1m núcleo disseminador de especulações e de difusão
universo e a enriquecer as possibilidades de seu vocabulário.

7
por excelência. Nele as câmeras de fotografia. de cinema. de
televisão e os computadores transformam-se na moderna pa-
leta e em instrumentos da pintura atual.
Mesmo pintando quadros, o pintor sabe que o grande
público que ele poderá atingir não é o de museus e galerias
de arte, e sim o dos livros, das reproduções gráficas e trans-
missões eletrônicas.
Tudo isso, longe de confirmar o prognóstico pessimis-
ta que apregoava a morte da aura do poeta e da obra de
arte original, faz com que a Arte, sempre rediviva, incorpo-
re no seu repertório de sedução a mítica aura eletrônica dos
dias atuais.
É nesse quadro geral que cresce a importância dos cur-
sos de desenho e pintura tradicionais, por serem eles um
núcleo de sonhos, sensibilização e humanização. Esses cur-
sos são os degraus por onde passarão os futuros integran-
llu s rr. 64 - Comissão de Frente da E 1 .
com o enredo do carnavalesco Mário M sco a de Samba Unidos da Tijuca, tes da infinidade de novas profissões e especializações que
Pais do Carnaval ( 1989). "Comissão d ;,nte1ro De Portugal à Bienal no irão suprir a necessidade de imagens visuais manifestada
homenageando o Mestre Israel Pedr e rente - Re~resentando a COR e
x1stente. Cada integrante vest' d osa, autor do livro Da cor à cor ine- pela sociedade. Sem falar na possibilidade da revelação de
o lirismo da Cor38." °
in uma das cores do arco-íris simboliza
novos artistas.
Além da homenagem à M' -
Arte Moderna e à Bienal de A /s~ao .t:rtfst1ca Francesa. à Semana de
também os artistas Debre r e e Sao Paulo. o desfile homenageou
Cavalcanti Vicente do R t, Tars1la do Amaral, Anita Malfati. Di
Volpi, Ald~m1r Martins ':J:n~u:~1e1rib P~rltnari. Lasar Segai!. Alfredo
Manabu Mabe, Canbé. ·Ruben Vai~~ 1 ª.va. Kra1~berg. L1gia Clark.
Oiticica e Heitor dos Prazeres. ttm. Chico da Silva. D1an1ra, Hel10

de Arte e conhecimentos, agora ele apresenta-se como orga-


nismo. c~talisador, formado por complexo sistema mundial de
~~pec1al1zações artísticas, científicas e tecnológicas. No ate-
Ire c~_ntemporâneo, o artista dedica-se a pesquisas, criação,
1/usrr. 65 - O computador tornou-se peça indispensável ao atual
man,.pulação e difusão de imagens voltadas tanto para os produtor de imagens. Este livro foi InteIramenle produzido numa das
a~se,.os essenciais da Arte, como para o vasto campo da in- alas do ateliê (ilusrr 62) com um monitor 19". doth pitch 0.20 mm
resolução de 1600 X 1200 dp1, placa de video de 64 MB e 256 bits em cor,
dustria cultural de massa , , .
• que e seu 1aboratorro experimental scann r d r soluçao ópttca de 2400 dpi. 48 bits e veloc1dad USB
º'"
11111111 p,tr, formato A3, 1600 X 1200 dpi e 8 MB d m mórta RAM

9
Manipulação de cores no computador 0% YELLOW
0%M 10%M 20%M 3J%M 40%M 50%M 60%M 70%M 00%M 90 M 100 M
Os elementos básicos que regem a Teoria das Cores são

-=------- ~--~--------
0
_s_mesmos para as áreas da Física, Química, Fisiologia. Es- 0%C

- ------
tet1ca ou da Informática. O que varia são os códigos de lin- 10%C
guagem, principalmente no campo da aplicação prática,

---------
20%C
adotados pelas disciplinas artísticas ou científicas.

-- -------
30%C
Como fica evidente já nas duas siglas RGB e CMY, usa-

----------
40%C
das pela maioria dos programas de tratamento de imagemJs,

----------
o computador trabalha simultaneamente com as cores-luz 50%C

(v~rmelho. verde e azul) e as cores-pigmento transparentes 60%C


(c1ano, magenta e amarelo) (ilustr. 66 e 67).
70%C·----------
As imagens coloridas que aparecem no monitor, forma-
das pela tríade primária de cores-luz. são codificadas com a 00%C·----------

designação das cores-pigmento transparentes utilizadas nos 90%C·----------


processos de impressão gráfica.
100%C·----------

100% YELLOW

0%C

------
0o/oM 10%M 20%M D%M

----------
40%M 50%M 60%M 70%M 00%M 90%M 100%M

----------
10%C

----------
20%C

Do/oC
llustr. 66 - Espectro cromá-
40%C __________ _
tico da Corei Corporation, um dos
programas mais utilizados no tra-
tamento de imagem
50%C·----------

60%C·-····-----

00%C--------
70%C·----------

90%C ·----------
100%C·----------
A Red G~Green B=Blue C=Cyan
M=Magenta Y•Yellow llustr. 68 e 69 - Nos gráficos de cores do manual de instruções do
(Vermelho) (Verde) (Azul) (C,ano)
(Magenta) (Amarelo) programa da Corei Corporalion, o ciano (na vertical) e o mag nta (na
llustr. 67 - Sínteses primárias RGB e CMY. horizontal) parecem em escalas 1dên11cas, o que vari nas duas mos
111 1 o p rc ntu I o am r lo que cobre os dois gr f1cos.

101
O aprendizado do olhar
Ao Dr. Adalmir M. Dantas

A paleta de um pintor não significa nada.


É seu olho que faz tudo• 0 •
Renoir

Todos os nossos conhecimentos


procedem das sensações• 1 •
Leonardo da Vinci

A partir da formulação de Goethe: "de que vale olhar sem


ver?", difundiu-se a caracterização da diferença entre olhar e
ver. Esse conceito, que desde a Antiguidade era patrimônio
de artistas e filósofos. passou a integrar o vocabulário das
demais pessoas ilustradas.
Mesmo assim persistiu. como ainda persiste. nítida dife-
rença entre o conhecimento do conceito e a capacidade de
transformar o ato do olhar em dado perspectivo integral.
Todo o arsenal de conhecimentos trazido pelas modernas
áreas da Física. da Fisiologia e da Psicologia não alterou qua-
litativamente o ato perceptivo do olhar. Essa qualidade per-
ceptiva que transforma o olhar em ver continua sendo
patrimônio dos pintores e de todos aqueles que exercitam
continuamente a perscrutação visual munidos de determina-
d d.ido co nnivos que ampliam a eficácia de tal ex rcfcio
Escala de cores da PANTONE

10
10
llustr 72 - Esquematização da retina humana. Ao centro está a fóvea
retiniana (azul, amarelo, vermelho e verde). sensível às cores. À sua volta
estão os bastonetes. responsáveis pela visão em preto-e-branco. O pe-
queno círculo branco central corresponde à localização do nervo óptico.

A visão humana
Nossos olhos abrangem uma área pouco inferior a 180º ao
redor de nosso corpo. Na parte da frente de nosso olho encon-
tra-se a íris, que funciona como diafragma, limitando os raios
luminosos que penetram em seij interior para atingir a retina.
A superfície da retina é composta por duas áreas distin-
tas. A do centro. denominada fóvea retiniana. é formada por
cerca de 7 milhões de fibrilas nervosas. denominadas cones. 1/ustr. 73 - Olhando fixamente durante cerca de 40 segundos para o
responsáveis pela visão em cores: visão tricromática. Esses conjunto dessas formas coloridas e depois desviando a vista para a área
branca acima. veremos a bandeira nacional com suas cores originais.
cones estão divididos em três grupos. O primeiro é sensível
ao vermelho. o segundo ao verde e o terceiro ao azul. Não
existem cones específicos para a sensação do amarelo. Essa A parte da retina que circunda a fóvea é constituída por
cor só é percebida pela sensibilização simultânea dos cones cerca de 100 milhões de bastonetes. sensíveis às imagens
vermelhos e verdes. m pr to br nco

10
No centro da retina se encontra o nervo óptico, responsá-
vel pela transmissão ao cérebro das sensações captadas pe-
los cones e bastonetes (ilustr. 72).
Deve-se o conhecimento do funcionamento da visão
tricromática aos fisiólogos Thomas Young (1780-1829).
Hermann Ludwig Helmholtz (1821-1894) e ao físico James
Clerck Maxuell (1831-1879).

Cores fisiológicas ou subjetivas


Por ser a cor uma sensação, em princípio, toda cor é
fisiológica e subjetiva. Mas a designação de cor fisiológica,
para classificação científica, aplica-se apenas às cores em
que nosso organismo interfere de maneira preponderante em
sua produção. Isto tratando-se de organismos sadios. Quan-
do essas cores são produzidas por disfunções ou enfermida-
des, passam a pertencer ao rol das cores patológicas.
As cores fisiológicas mais comuns são as produzidas por
saturação retiniana.
Como a percepção visual não é instantânea, necessitan-
do de certo tempo de latência para sua captação. também
seu desaparecimento da retina não é imediato, fazendo com
que no ato visual haja sempre uma superposição de imagens.
A da que começa a ser percebida sobre a que ainda não de-
sapareceu completamente (ilustr. 73 a 75).
Esses fenômenos são estudados na área da Oftalmolo-
gia, da Psicologia e. por vezes de forma delirante, na área
da Parapsicologia.
As cores fisiológicas estão condicionadas ao grau de po-
tência dos estímulos luminosos e aos tempos de saturação
e acomodação retinianas, de onde surgem os contrastes si-
multâneos (ilustr. 47 e 48), as imagens posteriores e mistas
1/ustr. 75 - Girando-se o disco .anuma
velocidade superior a 60 rpm
s cores vermelho e azul produzem a sensação de violeta. por mistur~ d cores, origem do fenômeno do violeta subjetivo e das co-
ópuca (disco .t2l
r s compl m nl res. vistos nas ilustr. 74 e 75.

10
107
A tricr?m!a na reprodução gráfica '--'
tricromáticos. Chama-se seleção à decomposição das cor s
e na cr,açao de imagens computadorizadas
Maxwell. um dos fund d d . . naturais nas três cores primárias. Isso é feito através de
. . a ores a teona tncromática ao
fotografias com três filtros coloridos (vermelho. verde e azul).
det_in,~o fluxo luminoso como radiação eletromagnética. ju.nta-
Cada filme possibilita a obtenção de uma película mo-
va a hipótese ~otoquímica a hipótese fotoelétrica como compo-
nentes da Óptica fisiológica, abrindo as portas de . nocromática contendo todas as gamas de uma das cores
d · . . um universo primárias existentes no objeto fotografado. Obedecendo aos
e incomensurave1s possibilidades de desenvolvimento d
mesmos princípios de seleção. modernamente a sensibiliza-
element~s e meios de expressão e comunicação visuais. os
Aplicando o enun • d d . ção das três cores é feita numa única película composta de
era o e seus princípios. em 1859
Maxwell reproduziu pel • • três camadas. cada uma destinada a receber determinada
.. • a pnmerra vez, uma imagem colorida
por síntese ad1t1va.inaugurando o método de sele - d cor primária, criando os diapositivos ou slides coloridos. Com
(.'/ çao e cores base nesse princípio. desenvolveram-se a grande indústria
, ustr.76). Passo inicial para a realização de tod
os os processos
gráfica do século XX. a fotografia em cores e o cinema colo-
rido. A descoberta de Maxwell está ainda na essência do
colorido da televisão que. servindo-se de elementos compu-
tadorizados na criação e manipulação de imagens. desenca-
deou o atual império da virtualidade.

Quem sabe mais vê mais


No estudo da cor. parodiando ou completando a senten-
ça Quem vê mais sabe mais. podemos afirmar que também
quem sabe mais vê mais. formando um círculo evolutivo per-
pétuo: Quem vê mais sabe mais; quem sabe mais vê mais;
Quem vê mais sabe mais ... Isso significa que cada nova visão
amplia nosso conhecimento; conhecimento que amplia nossa
visão que amplia nosso conhecimento ...
O ato de ver do pintor, na busca do aprendizado do olhar.
ultrapassa o dado puramente sensorial, transformando-o em
complexo fenômeno perceptivo coadjuvado por indagações
e pelo acervo de conhecimentos. aspirações. sonhos e fan-
tasias do artista. Assim. todo novo conhecimento adquirido
amplia a capacidade perceptiva do pintor. O que é válido
l mbém para todos os homens que se preocupam com
< uici VI U 1.
10

)
500

490

700

1/ustr 78 - o espectro solar é composto por uma faixa continua de


comprimento de onda Por essa razão as cores se interpenetram, 1mpos
s1b1lltando a ex1stênc1a de uma cor pura

A partir de então. o Diagrama tricromático, indicado pela


400
Comissão Internacional de Iluminação (CIE). passou a ser a
llu~tr. 77 - Diagrama tncromát,co 1nd1cado pela Comissão
lnternac,onal de Iluminação (Commission Interna/tona/e de / 'Ec/a,rage) imagem visível do vocabulário matemático das cores, expres-
Esta é a representação gráfica da composição da luz branca. slntese da
parte v1slvel do espectro solar. compreendida entre 400 mµ (abaixo dos so em milimícrons (ilustr. 77).
quais se encontram os raios ultrav1olêta) e 700 mµ (acima dos quais
começam os raios infravermelhos).
Por que não existe cor pura 7
Sendo o raio solar (a melhor expressão da luz brancal
Enriqueçamos então nosso conhecimento
uma síntese do espectro eletromagnético, nele estão cont1
Para superar a insuficiência vocabular de todos os idio-
das todas as cores. Como o espectro é contínuo. as cores s
mas na designação das cores, e facilitar o intercâmbio inter-
interpenetram na passagem de uma para outra. criando m1s
nacional de corantes químicos e instrumentos eletrônicos de
turas que definem sua composição. Essa interpenetração, por
criação e manipulação de cores, no início do século XX foi
5
r constitucion I das cores. elimina qualquer poss1bil1dad
oficializada a padronização mundial para a colorimetria deno-
cJ.i, 1 11 11 ,.i ct, um, cor pur A cor pura p ss nt o p, r o
minada padronização tricromática.

111
110
RESUMO DA TABELA DOS ESTÍMULOS
TRICROMÁTICOS DO ESPECTRO
Adotada pela Comissão Internacional de Iluminação (CIE)- 1931

COMPRIMENTO DE X y z
ONDA (mµ) (vermelho) (verde) (azul)

400 014.31 O 000.396 067.850


410 043.510 001.21 O 207.400
420 134.380 004.000 645.600
430 283.900 011.600 1.385.600
440 348.280 023.000 1.747.060
460 290.800 060.000 1.669.200
480 095.640 139.020 812.950
490 032.010 208.020 465.180
500 004.900 323.000 272.000
510 009.300 503.000 158.200
520 063.270 710.000 078.249
540 290.400 954.000 020.300
560 594.500 995.000 003.900

•••••••
580 916.300 870.000 001.650
600 1.062.200 631.000 000.800
620 854.449 381.000

•••
000.190
640 447.900 175.000 000.020
660 164.900 061.000 ........
680 046.770 017.000 ........ 1/ustr 79 - Circulo das 12 cores-luz. Primárias: vermelho, verde
690 022.700 008.21 O ........ azul violetado; secundárias: magenta, amarelo e ciano. formando 7/12
700 011.359 004.102 ........ de cores frias e 5/12 de cores quentes •

terá grande importância para quem deseja se aprofundar n


reino encantado da abstração vocabular, aumentando ainda
mais seu fascínio (ilustr. 78). ciência e nos mistérios da cor.
Como podemos observar no Resumo da Tabela dos Es-
tímulos Tricromáticos, X, Y e Z, o violeta de 400 mµ de com- Visualização das cores
Quando um indivíduo, de qualquer idade, começa a m
primento de onda é composto por 014.310 unidades de ver-
xer com cores, em sua mente se desencadeia um processo
melho, 000.396 de verde e 067 .850 de azul. O vermelho de
de raciocínio sensível, específico da experiência relativa o
700 mµ é composto de 011.359 unidades de vermelho e
004.102 de verde. O amarelo de 560 mµ é composto por trato com imagens coloridas.
O conLinuado exercício com cores. visando ao aperl 1
594.500 unidades de vermelho, 995.000 de verde e 003.900
ço rn nto do colorido. Lermina por levar o pratic nt um
de azul. O conhecimento dessas composições e proporções

11
112
J
•••••••
•••
llustr. 80 - Cfrculo das 12 cores-pigmento transparentes Primárias·
•••••
••••
1/ustr 81 - Cfrculo das 12 cores-pigmento opacas. Primárias v r
magenta. amarelo e c,ano, as mesmas cores que são secundárias em cor- melho, amarelo e azul. secundárias: laranja, verde e violeta. Ao contr
luz. O vermelho, o verde e azul-v1oletado em cor-pigmento transparente rio dos c,rculos cromáticos anteriores, este é constituldo por 5/12 d
são cores secundárias Este círculo tem as mesmas cores terciárias que cores frias e 7/12 de cores quentes
o anterior, com a mesma proporção de cores Irias e quentes

estágio superior de atividade mental sensível, em que o artis- Daí a importância das representações gráficas das cor s

.
ta não emprega nenhuma palavra em seu raciocínio,
apenas em cores.
pensa secundárias. terciárias e outras, evidenciando
nentes como instrumento
seus compo
de mentalização e memorização da
Quando o artista atinge essa condição de pensar em co- estrutura e composição das cores (ilustr. 79, 80 e 81).
res. no ato de colorir, ao buscar um determinado amarelo, ele Diante da infinita gama de cores da natureza. o olhar ex-
não formula a palavra amarelo, mas visualiza essa cor. periente do pintor é capaz de perceber, ao primeiro relanc ,
Em sua faina, durante longo período, esse pintor não quais são seus componentes, suas composições, seus graus
empregará uma só palavra em seu raciocínio: é o maravilhoso de pureza e seus índices de luminosidade.
curso das sensações. Ao querer pintar um amarelo-limão, por Nessa capacidade perceptiva reside toda a riqueza do
exemplo, seu cérebro funcionará como um decomponedor, e r p rtório cromático dos grandes Mestres coloristas d to-
ele verá mentalmente as cores que o compõem. d so l rrtf)OS

114 11
Em nossos dias o conhecimento desse repertório cromáti-
co transborda das telas para refletores. holofotes. gambiarras.
cenários dos palcos teatrais. câmeras fotográficas. cinemato-
gráficas e televisivas, para os gigantescos desfiles das escolas
de samba. dos shows de rock-and-roll e pop-music. que se trans-
formam em verdadeiros espetáculos eletrônicos de som e luz.
É de se ressaltar que o despertar profissional do imenso
contingente de artesãos e artistas que se expande em dezenas
A beleza do
de novas especializações. produzindo o encantamento visual de colorido
nosso século. tem origem comum nas aulas de desenho e pintu-
ra dos cursos secundários ou profissionalizantes. Há artistas que se destacam por uma sensibilidade es-
Esses cursos são os canteiros onde germinam talentos pecial aliada a um elevado grau de especialização no trato
diversos. E aí há sempre a possibilidade do surgimento de das cores, junção que evidencia talento ou genialidade.
um talento excepcional que. sozinho. para a glória de seus Candido Portinari. um dos maiores coloristas de nosso tem-
mestres. justificaria toda a existência dos vários cursos e sis- po. "confessou a Augusto Frederico Schimidt que se conside-
temas educacionais. rava completo por ter sabido entrelaçar vocação e formação,
42
o que valia por dizer: sensibilidade e técnica ".
Analisando a história do aprendizado. constatamos que
todo ser humano é capaz de evoluir a partir de seu nível de
sensibilidade e de conhecimento.

llustr 82 - Colocar qualquer quantidade de cor sobre uma tela mo


vim n1, r tod s as faixas do espectro. criando tensões entre a cor plicad·
,, o lumlo llr,mco ou com as demais cores porventura x1s1ent s no quadro

117
11l
lSCALA D TON VALOR
lndices de luminosidades(aproximados)

Tal como acontece com o conhecimento, a sensibilidade ioo J( ) ) ) ) )


pode ser despertada e desenvolvida. É claro que o índice desse
90
desenvolvimento estará condicionado a características, dons
ou limitações individuais.
Sobre o aprendizado do olhar, para atingir a amplitude e
complexidade do ver, Guimarães Rosa constrói o monólogo in-
80

••••
••••••
terior em que Riobaldo. relembrando a singela beleza da florzi-
nha do vale, diz ter sido Diadorim quem lhe ensinara a vê-la 43 .
Inúmeros depoimentos de grandes coloristas de várias
épocas comprovam ser a capacidade de ver o ato principal
70

.,•••••••
•••••••
de colorir. De onde constatamos que o exercício contínuo do
aperfeiçoamento do olhar para ver mais e melhor termina por
fazer desse exercitante um supervidente, verdadeiro atleta
do olhar. Possuidor, como diria o poeta Murilo Mendes. de
.........
,.

um olho armado.

•••••••
30 •••••••

•••••••
,.

•••••••
,.
,
1/us/f 84

É O olho armado desse supervidente que dispara os d1s


positivos capazes de apreender e organizar os elementos que
compõem a beleza do colorido.
Apaixonado pelo estudo da cor sob todos os ângulos,
Goethe via sua beleza como desencadeadora de complexas
manifestações psíquicas, concluindo que "a cor produz sobr •
a alma humana um efeito específico. sempre definido e sign 1
ticativo, que se radica intimamente na esfera moral e, cons1
der da como elemento de Arte. pode colocar-se a serviço dos
1/ustr. 83 - Para Goethe. a mais bela harmonia das cores encontra-
44
va-se na representação gráfica do círculo cromático No círculo criado r'l'ldl", 1 Vc dos fins estétícos ".
por ele, cada cor está diametralmente oposta à sua complementar

li
11
• ■ ■ ■I ■ ■

1/ustr. 87 - Tom-rompido. À medida que os tons complementares se


interpenetram. inicia-se o processo de ruptura do tom Quando_ as duas
cores misturadas atingem proporções equivalentes. surge o cinza n u
tro Vejamos o acorde magenta-verde: por mistura gradativa com verde,
o magenta vai perdendo crominância até atingir o ci~za-neutro no cen
tro. Pela mistura com o magenta. o verde também ena uma escala que
vai até o cinza-neutro Fenômeno idêntico de mistura é produzido pelos
outros dois acordes· amarelo-azul-violetado e ciano vermelho.
llustr. 85 - Circulo cromá11co dessaturado pelo cinza. formando
uma escala de cinzas coloridos. Diminuindo o impacto cromático das
cores. o cinza facilita a harmonização dos acordes.
Nesse clima de alta voltagem estética, damo-nos conta
de que aprender a colorir é abrir as comportas do mundo inte
rior para uma forma superior de comunicação.

Elementos de harmonia
llustr 86 - Magenta dessaturado, formando uma escala de Para o pintor criar ou reproduzir um elevado estágio de
gradações de cinzas coloridos.
beleza em sua obra, é necessário lembrar que a harmonia dos
tons está condicionada a um justo equilíbrio de valores. M s
Rebatendo a formulação de que a pintura era uma poesia
mo numa escala de tons, esses valores próprios de cada cor
muda, Leonardo, tendo sempre em vista a beleza do colorido
se manifestam. E quanto mais ampla for essa escala de v lo
como fator de valorização da Arte, afirmaria: "A pintura é uma
r s. qu poder ir do preto ao branco, como nos quadros d
poesia que se vê 45 ".
,,ir,1v,teJr110
ou d Mon ri an. maior será seu impacto.
PRIMÁRIAS

método usado era. em síntese. o seguinte: se uma cor gritava


(destoava) no quadro, em lugar de equacionar sensivelmente o
problema. rebaixava-se tal cor adicionando-lhe ocres ou terras.
Por rebaixamento ou dessaturação, terminava-se por conseguir
equilibrar todos os acordes numa marcha em direção à
monocromia. No final nenhuma cor gritava. mas, por outro lado.
nenhuma tinha luz própria.

Combinação de cores
Denomina-se combinação de cores a propriedade que têm
certos pares de cores de formar acorde - cores que se ajustam
umas às outras, em duplas. Por efeito de ação de contrastes
simultâneos. todas as duplas tendem. em maior ou menor grau.
a formar acordes consonantes ou dissonantes. segundo a na-
tureza das mesmas (vermelho, amarelo. azul etc.). Em princí-
pio. pode-se afirmar que toda cor combina com qualquer outra.
o que não significa que todo grupo de cores forme uma harmo-
nia. Assim como não existe em termos absolutos uma qualifi-
cação de cor bela e de cor feia. não existe também dupla de
1/ustr. 88 - Círculo das 12 cores-pigmento transparentes. com indi- cores irreconciliáveis que não se consiga combinar. Uma cor
cação das primárias. secundárias e terciárias. combina com outra por afinidade. semelhança. aproximação
etc .. ou por contraste. dessemelhança. oposição etc.
De modo geral. fugindo da violência desse impacto. a Para a formação do equilíbrio no acorde de uma dupla de
maioria dos coloristas prefere optar pelos cinzas que cores, há três métodos principais:
permeiam os extremos. seguindo o exemplo de Rafael e,
1) Pela intensificação ou diminuição do tom ou do índice
principalmente. de Velázquez.
de luminosidade de uma das cores. sem perda de crominância.
Nesses casos, os cinzas são sempre coloridos. enrique-
Tomemos como exemplos as duplas complementares:
cendo-se ainda mais pelo efeito de induções cromáticas pro-
Magenta-verde
vocado pelas cores vizinhas.
a) Mantendo o magenta em seu estado natural. pode-se
No intuito de contornar dificuldades na harmonização de
tornar o verde mais claro. pela mistura com o amarelo. ou mais
cores. o ensino acadêmico criou variantes similares ao empre-
escuro. com o azul.
go do cinza. A mais desastrosa dessas receitas foi a da inclu-
b) Deixando o verde em seu estado natural. pode-se es-
são dos ocres e terras como elementos de harmonização. O
cur r o magenta com o azul. ou clareá-lo com o amarelo.

122
12
ESCALA CROMÁTICA EM MODO MAIOR
(Gênero Quente)

Amarelo-azul-violetado
a) Conservando o amarelo em seu estado natural, pode-
se clarear o azul-violetado pela mistura com o ciano. ou
escurecê-lo com o magenta.
b) O amarelo não pode tornar-se mais claro pela mistura
com qualquer outra cor. Com o branco, perde cromaticidade.
dessaturando-se. Seu escurecimento, entretanto, poderá ser
obtido pela mescla com o vermelho, quando se torna alaranja-
do, ou com o azul, tornando-se esverdeado.
Ciano-vermelho
ACORDESCONSONANTES )
a) Deixando o vermelho em seu estado natural, pode-
se clarear o ciano pela mistura com o verde, ou escurecê-lo
com o magenta.
b) Clareia-se o vermelho misturando-o com o amarelo, e
obtém-se o seu escurecimento com o magenta.

2) Pela dessaturação ou pelo rebaixamento do tom, atra-


vés da mistura com o branco ou com o preto. Nesses casos a
perda de crominância dos tons é inevitável e marcha-se para
combinações de valores. 1/ustr. 89

(Gênero Frio)
3) Pela utilização do debrum, ou cercadura das cores. O ESCALA CROMÁTICA EM MODO MENOR
branco, o preto, ou a mistura deles - o cinza - sempre equili-
bram os tons que envolvem. Mas nesses casos já não se pode
ESCALA CROMÁTICA EM MODO MAIOR
mais falar em acordes de dois tons. As cores ditas puras cer-
cadas pelo debrum criam um acorde 'de três elementos, que
pertence ao grupo dos acordes mistos (tons e valores).

Escala cromática em Modos Maior ou Menor


ESCALA CROMÁTICA EM MODO MENOH
As cores quentes são classificadas como pertencentes
ao Modo Maior, constituindo ainda uma relação sensível que,
por analogia, as vinculam aos sons graves em música. As-
sim também as cores frias se identificam com os sons agu-
dos formam a escala em Modo Menor. No círculo de 12 1111,, •m
llustr. 91
llustr. 92

tons, tomando-se do magenta ao verde (no sentido horário) cromática. Os círculos em preto-e-branco (ilustr. 97 1 .J) 1, 1

como limites da escala, todos os tohs intermediários serão codificação numérica dos círculos em cores (ilustr. 9:t, 1/ I)
quentes, formando a escala em Modo Maior. Os tons frios, que Esses círculos são divididos diametralmenl 111 1 , 1111, t
se encontram entre o verde e o magenta, formam o Modo Me- circularmente em 8 anéis concêntricos que, partindo d, l1111ol 1
nor. Por ser o círculo contínuo e pelas cores interpenetrarem-se. para o interior, representam cada cor, desde u 111111
111111111
o verde e o magenta participam de ambas as escalas. de crominância, passando por graduais etap 111 11 1
ção, até atingir o branco no centro ou o preto n 1 1 r,1111 111 t
Mapeamento das cores micírculo oposto.
Na busca de uma representação gráfica dos elementos har- A codificação de A a L, das doz pa, l ·, d, , 1111
mônicos, na década de 1960, criei os Cfrculos de harmonização (llustr. 91 e 92). uma vez determinado o comp11111I
11111oi

126
__)

da luz que caracteriza a área colorida, permite que se racioci-


1/ustr. 93 e 94 - Cfrculos de harmonização. As cores e os valores
ne apenas com números para determinar acordes e elemen- estão colocados diametralmente opostos às suas cores e aos valores
tos harmônicos em qualquer colorido 46 . complementares. desde os tons saturados até a complementação bran-
co-preto. no centro de cada círculo. Os quatro semicírculos se comple-
A precisão numérica do colorido facilita o emprego das tam. a parte de cima de um com a parte de baixo do outro, formando dois
círculos um de cores dessaturadas. no sentido do branco. e o outro de
cores-luz na produção de todos os espetáculos visuais.
cor s rebaixadas, no sentido do preto

12
)
Harmonia consonante
equivalem em nível de saturação e criam. por semelhança ou
No círculo cromático de 12 tons em cor-pigmento trans-
aproximação estrutural. um acorde tônico, valorizado pela or-
parente agrupam-se, de um lado, as sete cores aparentadas
ganização e qualidade de outros acordes que funcionam como
que guardam maior afinidade com a luz, influenciadas predo-
cor dominante e de passagem.
minantemente pelo amarelo e pelo vermelho _ amarelo-
Dependendo da organização das formas. as harmonias
esverdeado, amarelo, laranja, vermelho-violetado e magenta.
assonantes encontram sua melhor expressão nos dois acordes
De outro lado, as que são afins ao azul, identificadas com a
constituídos pelas seis cores principais: 1) magenta. amarelo
sombra - verde, verde-azulado, ciano, azul, azul-violetado
violeta e magenta. • e ciano; 2) vermelho, verde e azul-violetado. Quando essas co-
res estão em presença umas das outras em igualdade de for-
Cada um desses grupos de cores forma um acorde con-
ma e de qualidade. obedecendo à seqüência de posicionamento
sonante (ilustr. 89). Portanto. o caráter harmônico que existe
do Círculo de Harmonização. altera-se o conceito anterior da
nos acordes consonantes é fruto de afinidades dos tons entre
formação de tônicas vinculadas às escalas de Modos Maior.
si, pela presença de uma cor geratriz comum, que participa
de maneira variável da estrutura de todos eles. Menor ou Misto.

Harmonia dissonante Contrastes simultâneos, sucessivos


e mistos de cores
Dois tons que se complementam formam sempre uma
A principal dificuldade na harmonização de cores pro-
dissonância - daí chamar-se dissonante a harmonização a que
eles servem de base. vém da alteração na aparência que elas sofrem em presença
umas das outras.
Para manter o caráter dissonante na harmonização de
Como vimos em páginas anteriores. Leonardo da Vinci foi
um acorde de três tons, sendo dois deles complementares.
o primeiro a estudar o fenômeno dessa alteração. detectando
surge a seguinte particularidade: a de que o tom que harmo-
sua causa nas afinidades e nos contrastes de determinadas
niza uma dupla de tons complementares é capaz de
cores entre si.
desalinhar todas as demais duplas complementares. o úni-
Com isso, estava aberto o caminho para novas investi-
co tom que reúne essa qualidade é o amarelo-esverdeado.
gações que resultariam na classificação e denominação dos
Sua constituição originada das potencialidades do amarelo e
contrastes simultâneos, sucessivos e mistos das cores.
do azul é um campo fértil para todas as ressonâncias cromá-
Reunindo elementos dos estudos de Haüy, Scherffer,
ticas. elementos da maior importância na harmonização de
cores fortemente contrastantes. Goethe e outros. o químico francês Michel-Eugêne Chevreul
( 1785-1889) desenvolveu pesquisas concludentes publicadas
Harmonia assonante sob o título Da lei dos contrastes simultâneos das cores.
Esses fenômenos são nitidamente observados nas ilus-
Por harmonia assonante. entende-se uma larga escala har-
trações 95. 96 e 97 das páginas seguintes.
monizada (acordes múltiplos) em que várias cores tônicas se

130
1 1
1/ustr. 95 Contraste sucessivo de cores. Fixando-se a vista no cen-
tro de cada um dos quadriláteros, ao cabo de alguns segundos. o cinza
do arabesco interno parece tingir-se com a cor complementar da do
fundo em que se encontra

1/ustr 97 - Justapos1çáo de cores. Duas superflcies coloridas 1usta-


postas exibem mod1f1cações de valor e de tom. Exemplos· o _mesmo
laranja, sobre o fundo vermelho. parece mais amarelado e mais claro
_llustr 96 - Contraste misto de cores Depois de saturar a reuna pela que sobre o fundo amarelo. Em contraste com o vermelho _e c_om o azul.
f1xaçao do clrculo vermelho durante 40 segundos (tempo relativamente o mesmo violeta parece mais azulado e mais escuro no primeiro caso. e
longo, para melhor definição da imagem fisiológica) e olhando-se para o mais avermelhado mais claro no segundo O mesmo verde parec mais
quadrado amarelo ao lado, produz-se a mistura da imagem posterior m,H lo m r IAçao ao zul e mais azulado em relação ao amarelo
lf1s1ológ1ca) com a cor flsico-qulm1ca observada
Cor
inexistente
O que denominei cor inexistente é a cor complementar
surgida nas superfícies brancas ou neutras. produzida por en-
trechoques de várias gamas de uma cor primária e levada ao
paroxismo por ação de contrastes.
llustr. 98 - Cor inexistent á • Em artigo publicado na revista Manchete, em 6 de se-
alaran1adas. O fundo do papel é ~r:~:o c~s azuis e verdes com relraçôes
vemos que lodo ele é diferente do branc • uando observamos com atenção. tembro de 1975, o critico Flávio de Aquino diz:" ·o que seria
rosáceas tanto das azuis como d odque circunda a pintura. No interior das
várias to~alidades. Todas essas va~fa;~r es. surg~m refrações alaran1adas de
de nós sem o auxílio do que não existe?' A frase de Paul Valéry
dem ser mensuradas analisadas oes perceptivas (cores inexistentes) po- é uma citação adequada para a pintura de Israel Pedrosa.
código verbal para o i~equívoco c6d;~n~~~:1i~~- e transferidas do impreciso
Com o auxílio de cores inexistentes ele encontrou novas rela-
ções matemáticas entre os tons e criou uma nova poética da
cor ( .. ). Sua arte elaborada conscienciosamente não é ape-
nas ciência pura. é também uma revelação das característi-
cas da cor como mensagem lírica".
No prefácio do livro Da cor à cor inexistente, eu relato como
esse fenômeno penetrou em meu universo pslquico e passou
a dominar todas as minhas preocupações.
Numa tarde de fevereiro de 1951. ao cair do dia. nessa
hora em que as cores se tornam incomparavelmente brilhantes
por ação de contrastes entre as luzes que se atenuam e as
sombras que se intensificam. minha atenção foi atraída pela
beleza da relação de várias gamas de amarelo: um barranco
cortado em desmonte para abertura de ruas num subúrbio do
Rio. gram s queim das pelo sol e arbustos calcinados

14
••••••••••••••••••• ••••••
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•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 1/ustr. 100 .-.
Vela ao vento da sérte Os navegadores'. 1993.
• x 150 cm. Ateliê do artista
virtuais. Tinta acnl1ca sobre te 1a. 150
•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••
··············~············
•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••
•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••
Extasiado pelo efeito da harmonia dos tons ~ue iam do
amarelo puro à coloração da terra-de-sombra-queimada. per-
aneci algum tempo a contemp 1ar a pais
• agem Uma mulher

•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••
llustr. 99 - Cor inexistente. O mesmo azul com a mesma forma. variando
:stendeu no varal três lençóis brancos. precisamente sob meu
a quantidade. produz refrações diferentes sobre o mesmo fundo. Na parte de campo visual. a uns cinqüenta metros de distância. Em dado
baixo. com os pequenos círculos azuis mais próximos uns dos outros. surge um
momento. os lençóis e alguns papéis que se_encontravam no
laranja bastante forte; na área intermediária. com o afastamento dos círculos.
surge uma coloração azulada: na parte superior, em que os círculos estão bem nhados de um violeta intenso. sem qu
eh- 0 p rec ram-m b
mais afastados. o azul irradiado é mais claro.

17
llustr. 1O1 - Vermelho e
ciano em muraçôes cromáticas.
O mesmo vermelho do quadri-
látero central. submetido à
ação de contrastes do amarelo
e do azul-escuro, transforma-se
em laranja na parte superior e
em violeta na parte inferior O
c,ano da barra superior hori-
zontal escurece e o da barra
inferior clareia, provocando a
sensação de dessaturação .

••••
houvesse nenhum elemento dessa cor que pudesse influenciá-
los, nem nas proximidades, nem na atmosfera, pois o azul do
céu era límpido.
Tive naquele instante a imediata intuição de que se trata-
1/ustr. 102 - Vermelho em mutação cromática, 1981. O vermelho do fundo
va de um fenômeno físico e não de uma ilusão óptica. Que se do quadro é O mesmo que se transforma em violeta e laranja nas largas barras
eu conseguisse reproduzir num quí;ldro as mesmas relações verticais no centro do circulo. Serigrafia, 44 X 44 cm. Ateliê do artista.

cromáticas. surgiria sobre o fundo branco da tela uma cor ine-


xistente (que não fora pintada). quimicamente sem suporte. Essas pesquisas colocavam-me no cerne da harmonia cro-

À medida que buscava novas relações que pudessem mática, onde a poesia íntima do diálogo dos matizes engen-
conduzir-me ao domínio do fenômeno da cor inexistente, ia dra a transcendente sinfonia das cores de contraste.
Para a materialização estética desse fenômeno, pintei a
descobrindo outro sentido na pintura e cada vez sentindo
mais atração pela obra dos grandes coloristas como Leonar- série Mutações cromáticas, revelando o segredo da transfor-
do, Vermeer, Veronese, Turner. Delacroix, Van Gogh, Malevitch, mação de uma cor em outra. Na mesma busca de ess nc1as,
Klee. Delaunay e Portinari. pint Ias rie Formas virtuais.

11)
118

llustr. 103 - Quadrado em decomposição regular. 1981 Cor inexisten-
te, verdes com refrações róseas. Serigrafia. 47 X 47 cm Ateliê do artista.

1/ustr. 104 (Página ao lado) - Cor inexistente, 1985. Azuis e formas


virtuais com refrações laranja Serigrafia. 55 X 30 cm Ateliê do artista.

llustr. 105 (Pág,na 142) - Mutaçôes cromáttcas, 1981. Verde, larania


e azul em mutações. Serigrafia, 57 X 37,5 cm. Ateliê do artista.

1O
Decálogo do
colorista
1- O artista que aspire dominar a ciência do colorido deve
considerar. em primeiro lugar. o fato de que a luz solar-
que tem por síntese as cores-luz primárias. vermelho,
verde e azul - é refletida para os nossos olhos pelos
corpos naturais cujas camadas exteriores são formadas
por cores de refletância que têm por síntese o vermelho.
o amarelo e o azul. A mesma tríade de cores-pigmento
de que se serve o pintor para reproduzir o universo visível
O único meio de que dispõe o pintor para penetrar nes-
se complexo universo é o olhar. Torna-se então evidente
que ele precisará desenvolver ao máximo a capacidade
perscrutadora do olhar. Para tanto, terá que transformar
a observação de tudo que o cerca em permanente exer
cfcio de aperfeiçoamento
da acuidade visual.
li - Ter sempre em mente que o aprendizado da análise das
imagens visuais começa pela hierarquização das part s
das áreas mais escuras em relação às das mais clar s.
tendo o preto e o branco como limites extremos. sem s
esquecer de que esses limit s também são coloridos
d qu entre I s encontr m-s todas as possibilid d
eram tic dos c,nzas colondos
Ili Con 1d r r u ~ s1v1d d
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que se estabelece no conjunto da área em análise, des- a visão não se desenvolve além de um determinado limi-
cobrindo nele o conflito da complementaridade, que te. nem tem como aferir seu grau de acuidade percepti-
só encontra equilíbrio com uma justa intervenção dos va. É no domínio da técnica que o fazer pictórico atinge
tons rompidos. plena liberdade de execução e grande dose de automação.
IV - Não se esquecer de que, desde a primeira pincelada. VIII - O domínio da técnica é praticamente infinito. Nesse está-
o colorir deve ser um ato de reflexão sensível, procu- gio desencadeiam-se todas as possibilidades de espe-
rando relacionar as cores mais claras. aquelas em que culação, pesquisas diversas e renovações formais que
predominam os amarelos, com as áreas mais lumino- possibilitarão a alguns raros pintores atingir o estilo, fase
sas do quadro. suprema da realização artística.
V - Inversamente, buscar o relacionamento das cores mais Essa fase só é atingida quando todos os raciocínios do
escuras da paleta, aquelas em que predominam o azul pintor. no ato de pintar. processam-se apenas com co-
com as áreas sombrias. Esse exercício possibilitará ao res. por longos períodos. sem que uma única palavra in-
pintor relacionar os índices da escala de tons (de cores) terfira em seu pensamento. Alguns filólogos afirmam que
com os da escala de valores (de luminosidade). o pensamento humano só se realiza através da palavra,
O domínio desse fenômeno poderá levar o pintor a inver- mas os pintores agregam que ele também se realiza atra-
ter os termos da questão, tornando as luzes frias e as vés de gamas de cores; os músicos. através de frases
sombras quentes, sem perder harmonia. sonoras e os matemáticos afirmam raciocinarem com abs-
VI - Nesse nível de desenvolvimento sensível. já será possí- trações e equações numéricas e geométricas.
J..'
vel ao pintor determinar a cor dominante de uma ima- IX - Por seu poder de fascínio, quanto maior for o dom do artis-
gem, sua cor tônica e as cores de passagem. Pode-se ta. o colorido cria um reino de experiências inolvidáveis
dizer que tal nível de aperfeiçoamento sensível corres- nas áreas do psiquismo e da esfera moral desse
ponde à conclusão da formação artesanal do colorista. o manipulador de cores. O que chamamos dom é a capaci-
artesanato surge então como primeiro estágio da forma- dade de tal pintor ou criador de imagem em transmitir com
ção artística do pintor. sua obra toda a carga emotiva vivenciada ou imaginada.
VII - O artesanato é o reino do sab~r empírico que abre as X - A partir do advento dos efeitos especiais eletrônicos,
portas da técnica aos mais sensíveis, dotados de deter- dos espetáculos de som e luz, dos monumentais des-
minada dose de imaginação abstrata. O que caracteriza files carnavalescos, da fotografia, do cinema e da tele-
o estágio da técnica no saber pictórico é a capacidade visão coloridos, da computação gráfica e da absorção
sensível de detectar os componentes cromáticos de cada dos novos recursos tecnológicos pela pintura. todos os
cor e saber de que outras cores eles são compostos. A criadores e manipuladores de imagens: modernos sa-
consecução desses saberes só é possível adquirir atra- cerdotes da luz. com seus sonhos e fantasias. em in-
vés de longo processo prático no manuseio da cor. A vi- fluências intercambiantes. integram e enriquecem o
são guia a execução no ato de colorir, mas sem esse ato atual Universo da Cor.

144 145
)

Glossário

Abstracionismo - Tendência artística já preconizada por Turner, pre-


dominante a partir da segunda metade do século XX, em que os temas
ou motivos da obra abstraem-se das formas naturais.
Acomodação retiniana - Adaptação da retina a determinados índi-
ces de luminosidade ou de obscuridade.
Acorde - Reunião de tons que compõem um conjunto harmônico.
Aforismo - Máxima ou sentença que indaga ou explica regra ou princi-
pio de alcance geral.
Agrigentino - Natural de Agrigento, na Sicília.
Alta Renascença - Corresponde ao apogeu do Renascimento, situ-
ando-se entre 1495 e 1520. Seus maiores representantes foram Leo-
nardo da Vinci. Miguel Angelo (Michelangelo Buonarroti) e Rafael
(Rallaello Sanzio).
Anil - Azul intenso que se aproxima do indigo.
Antropomórfico - Trabalho que evoca ou retrata a figura humana.
Arte acidental - Tendência que privilegia o acidental, o acaso, na
execução da obra.
Arte gótica - Estilo artístico que predominou na Europa no final da
Idade Média. Meados do século XII até o século XV ou XVI.
Arte modular - Arte realizada segundo determinado módulo. Que obe-
dece a determinado padrão estético.
Arte parietal - Arte realizada nas paredes das grutas pré-históricas.
Arte plumâría - Arte realizada com penas de aves, plumas.
Arte rupestre - Arte gravada ou pintada por povos primitivos. nas
rochas e cavernas.
Arte secular - O mesmo que arte leiga, não religiosa.
Artes liberais - Denominação atribuída a partir do século I d.C. ao
conjunto dos nove corpos de saber: Gramática, Retórica, Lógica, Aritm •
tlca, Geometria. Astronomia. Música. Arquitetura e Medicina, em oposI-
ç o s ort s d caréter manual ou ar1 anal.

147
Artesanato - A arte e a técnica do trabalho manual não industrializa- ?e
física da cor inexistente é o fato de o processo domíni? do !enômen?
I I
do. Etapa de aprendizagem do domínio do ofício artístico que precede ao revelar _ tornar visíveis - os elementos cromat1cos. ate entao. 1nv s -
estágio da técnica. em pintura. literatura etc. veis os denominados fundos brancos e neutros da tela.
Autóctone - Oue é natural do país ou que descende de raças que ali Cor. secundária _ Cor produzida pela mistura equilibrada de duas
sempre viveram. aborígine. indígena. cores primárias. . _
Automação - Estágio pictórico em que a mão atinge tal liberdade de Cor subjetiva _ Cor fisiológica produzida pelo órgão da v1sao ~orno
movimento que parece ser. ela mesma. um centro de resoluções. reação a determinados estímulo~ e que não corresponde ao comprimen-
Barroco - Movimento artístico pós-renascentista. de origem romana. to de onda dos estímulos exteriores.
surgido por volta de 1600. Arte dinâmica em que predominam as linhas e Cor terciária _ Cor produzida pela mistura equilibrada de uma cor
os entrelaçamentos de movimentos sinuosos. · • • c om uma cor secundária que a complemente.
primaria
Bebitório - Relativo a bebidas. Vaso destinado a bebidas. Cor-luz _ Luz emitida por uma fonte direta - o sol. fogo. a lu~ de _uma
Cinético - Relativo a movimento. Arte do movimento. Essência das vela ou de uma lãmpada elétrica etc. Radiação eletromagnética capaz
esculturas de Alexander Calder, por exemplo. denominadas móbiles. de provocar sensações coloridas. .
Círculo - Superfície plana limitada pela circunferência. Cor- i manto _ Propriedade que têm os corpos químicos_ de refletirem
e ab~~rverem determinados raios luminosos das luzes 1nc1dentes. Den_o-
Circunferência - Linha curva fechada que limita um círculo.
minação geral das tintas que produzem a coloração dos corpos _naturais.
Claustro - Parte interior do mosteiro ou da igreja. Parte fechada.
Cor-primária _ Também denominada fundamental ou geratriz. Cada
Colorimetria - Análise quantitativa da composição das cores. por afe- uma das três cores indecomponíveis, só produzidas por elas mesmas.
rição do comprimento de onda de seus componentes. que misturadas produzem todas as demais cores do espectro.
Configuração - Forma exterior de um corpo, aspecto geral de um con- Croma _ Termo que corresponde à saturação ou ao grau de pureza do
junto de seres ou de coisas.
matiz (cor). .
Contraste de cor - É a sensação produzida pela alteração que sofre Crominãncia _ lndice de saturação cromática. Em imagens lumino-
uma cor quando colocada ao lado de outra. sas. trata-se da diferença colorimétrica entre uma cor e um padrão de
Contraste misto de cores - É o nome dado à sensação produzida igual intensidade.
pela retina saturada por uma cor fisiológica, quando entra em contato Cubismo _ Movimento artístico iniciado na _primeira metade do sécu 1o
com outra cor. Exemplo: uma retina que sob a ação de um vermelho- XX. pelo pintores Georges Braque e Pablo Picasso. . .
alaranjado tenha produzido um azul como cor fisiológica. diante de um Decálogo _ Acepção relativa aos Dez Mandamentos divinos. regra.
amarelo. produzirá a sensação de verde. O azul. que já se encontrava na
preceito ou programa constituídos por dez partes. . _ .
retina. mistura-se ao amarelo. produzindo a sensação de verde.
Discursivo _ Idéia expressa em forma de di~curso. Des1gnaçao peJO·
Contraste simultâneo de cores - É a sensação provocada pela alte-
rativa de pinturas em que O descritivo predomina so~re o da_do v1su~I.
ração mútua que sofrem as cores na presença umas das outras.
Domo _ Palavra italiana designativa da principal igre1a católica da cida-
Contraste sucessivo de cores - É a sensação de cor complementar
produzida pela retina sob o efeito de um estímulo externo e que perma- de. correspondente à catedral. . . . . .
nece por algum tempo na vista. Exemplo: a vista sob a ação do vermelho Empírico _ Saber adquirido pela prática de uma d1sc1pl1na art1st1ca ou
produz como autodefesa uma cor fisiológica. complementar à cor do
estímulo. Essa cor complementar permane'ce no olho por alguns segun-
dos. dependendo do índice de saturação da vista.
ramo científico.
Esfumado _ Esbatido. atenuado. Termo o~igi_nado do italiano.
Recurso técnico criado por Leonardo da Vinci para atenuar ou
:~::e:~
Cor - Sensação provocada pela ação da luz sobre o órgão da visão. passagem entre luz e sombra. entre o claro e o escuro. . _
Palavra usada comumente como sinônimo de matiz. Estética _ Ramo da filosofia que estuda a criação ou a 1nterpretaçao
Cor complementar - É a cor secundária que. justaposta a determina- sensível das formas de Arte.
da cor primária. complementa o espectro. Por extensão. toda cor que • - t' t·ca em que todas as ca-
Estilo - Estágio superior da rea 1Izaçao ar 1s 1 , . .
complementa outra. racterísticas essenciais do artista criador se manifestam. deixando sua
Cor de contraste - Cor subjetiva ou fisiológica provocada pela ação marca inconfundível.
de uma cor indutora. XIX. carac-
Expressionismo - Tendência artística surg_ida no século
geralmente
Cor inexistente - Cor que. sem ser pintada, surge no fundo branco ou terizada por uma visão emocional e sub1et1va do mundo.
Kokoschka.
neutro da tela, por entrechoques de gamas de uma cor primária. levadas atormentada. tendo como seus maiores representantes
ao paroxismo. por ação de contrastes. O que comprova a existência Munch e Van Gogh.

149
14
Expressionismo abstrato - Corrente artística essencialmente nor-
te-americana. surgida nos anos 40 e 50 do século XX.
Facécia - Dito chistoso, gracejo, pilhéria. Em literatura, texto cheio de
graça e brincadeiras.
Fauvismo - Movimento pictórico francês. surgido em 1905. caracteri-
zado pela exacerbação do colorido. Termo derivado do francês fauve:
fera. Seus principais representantes foram Henri Matisse. Albert Marquet
e Maurice de Vlaminck.
Futurismo - Movimento artístico criado por Filippo Marinetti. em 1909,
que buscava. na retratação da velocidade. a caracterização do século.
Geratriz - Cor indecomponível que. através de mistura.
cores. O mesmo que cor primária ou fundamental.
gera outras
Notas
Imagem - Reprodução da forma ou do aspecto de um ser ou objeto por
meios artísticos, podendo ser verbal. sonora ou visual. Bibliográficas
Lanceta - Na janela gótica. cada um dos compartimentos alongados
que terminam em arco.
Latência - Tempo necessário para percepção de uma imagem visual.
Matiz - O mesmo que cor. caracterizado pelo comprimento de onda do
raio luminoso que o compõe. 1_ VINCI. Leonardo da. Tratado de la pint_ur_a dei paysage,
sombra y luz. Trad. e classificação metod1ca de Péladan.
Milimícron - Medida de comprimento. O mesmo que nanõmetro. Cor- Buenos Aires : Joaquin Gil Editor, 1944. p. 80.
responde à bilionésima parte do metro.
2- ALIGHIERI. Dante. Paradiso. canto 1. ln : -· La divina co-
Óstraco - De ostra. Pedaço de concha ou terracota que os egípcios
antigos usavam como lousa para aprendizado de desenho ou pintura. ou media. Milano : Mursia Editore. 1965. p. 343.
para esboços. Os gregos também o usaram para fins diversos. 3_ KLEE. Paul. Diários. São Paulo : Martins Fontes, 1990. p. _33~.
Paleolítico Inferior - Período mais antigo dos tempos pré-históricos. 4_ CORRESPONDENCE complete de Vincent Van Gogh enrich1e
quando aparecem as primeiras manifestações de atividade humana, da- de tous les dessins originaux. Paris : Gallimard-Grasset. 1960.
tadas de cerca de 3 milhões de anos.
T. 11.p. 493,494.497; T. Ili, p. 4. .
Paleolítico Superior - Marcado pelo aparecimento do Homo sapiens.
iniciado por volta de 35000 a.e. 5_ CRULS Gastão. Arte indígena. ln : -· As artes plásticas
no Bra~il. Rio de Janeiro : Graf. Ouvidor. 1952. v. 1, p. 73-
Pigmento - Substância que confere cor aos tecidos ou às células de
um organismo. 11 o. .
Pirotécnica - Efeitos especiais com fogos de artificio. 6_ RIBEIRO, Darcy; RIBEIRO. Berta. Arte ~lu_mária dos índios
Kaapor. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira. 1957.
Purista - Termo empregado pejorativpmente ao indivíduo que defende
com zelo excessivo a pureza de determinados princípios. 7- VINCI, Leonardo da. Cod. Urb. 36r, P 39. .
Rosácea - Geometrização da rosa desabrochada. Denominação do prin- 8_ CAPART. Jean. L'.Art Êgyptien : L'.Art des origines a nos Jours.
cipal vitral das catedrais góticas. Paris: Larousse. 1932. T. 1, p. 7.
Tom - Sinônimo de cor ou matiz. 9 _ CENNINI. Cennino. li libro deli 'arte. Vicenza : Neri Pozza
Trismegisto - Três vezes máximo. Nome dado pelos gregos ao Thot Editore, 1995. p. 29-30. .
dos egípcios. inventor das artes. Cognome de Hermes para os gregos, de
Mercúrio para os romanos. 10 _ ALBERTI. Leon Battista. Da pintur~. Trad. de Antonio da
Silveira Mendonça. Campinas : Edunicamp, 1992. .
Valor - Termo que. empregado em relação às cores. significa o mesmo
que luminosidade. 11 _ ARGAN. Giulio Cario. Storia dell'arte italiana. Firenz
Sansoni Editore, 1988. p. 237.
12 FUMAGALLI. Giu ppina. Leonardo leri e oggi. Pis N1 lfl
L1sch1. 1 9. P 4 47

150 151
33 _ Citação de GASOUET. Joachim. Cézanne. Paris : d1t1on
13 - VASAR_I. Giorg_io. Da le vite de 'piu eccellenti pittore, Bernheim-Jeune. 1921.
sculton e archttettori. Novara : EDIPEM, 1974. p. 154. 34 _ ARGAN. Giulio Cario. Apresentação. ln : VENTURI, Lionello.
14 - VAL~RY, Paul. ln!roduction à la méthode de Léonard Cézanne. Nova ed. [S.1.J : Skira. 1991. P 7.
de Vinci. Paris: Editions Gallimard, 1957. p. 1153-1199. 35 - Catálogo da EXPOSIÇÃO SIOUEIROS, 1996, Mexico. Museo
Oeuvres 1.
Dolores Olmedo Patino.
15 - - Oe~vres li. ln: -· La soirée avec Monsieur Teste. 36 - LEVY. Carlos Roberto Maciel. O grupo Grimm. Rio de Janei-
Paris : Editions Gallimard. 1988. p. 15-75.
ro : Ed. Pinakotheke. 1980.
16 - F~E~D. Sigmund. Un souvenir d'enfance de Léonard de 37 _ BENTO. Antonio. Portinari. Rio de Janeiro : L. Christiano.
Vin~I. Trª?·. do alemão para o francês por Marie Bonaparte.
Paris : Ed1t1ons Gallimard, 1927. 7980. p. 23-24 e 336.
38 _ Sinopse do enredo da Escola de Samba Unidos da Tijuca, car-
17 - VINCI, Leonardo da, 1944. p. 35, 36 e 80.
naval do Rio de Janeiro, 1989.
18 - -· Traité de 1~ peinture. Trad. e apresentação de André 39 - Para tratamento de imagens e utilização de cores. os progra-
Chastel. Paris: Editions Berger Levrault, 1987. p. 12. mas mais utilizados no Brasil são os da Adobe Systems l~cor-
19 - Es~a frase foi tirada de um texto bem mais longo de Leonardo porated. que inclui o Photoshop 7 .O, e da Corei Corpo_rat1on.
e e uma tradução quase literal do prefácio da Perspectiva 40 _ Citação de ELUARD. Paul. Les freres voyants. Paris : Editions
comunis. de John Peckham, morto em 1292.
Cercle d' Art, 1952. p. 13.
20 - VINCI. Leonardo da, 1944. p. 29.
41 - VINCI, Leonardo da. 1944. p. 31.
21 - Esse fenômeno é estudado mais detalhadamente no livro: 42 - Citação do Acadêmico Marcos Almir Madeira._ na _saudação a
PEDROSA, Israel. Da cor à cor inexistente. 9. ed. Rio de Israel Pedrosa. em sua conferência sobre Portinari. na Acade-
Janeiro : L. Christiano, 2003. p. 60-61.
mia Brasileira de Arte, em 28/04/2003.
22 - VINCI. Leonardo da, 1944. p. 98-100. 43 - ROSA, João Guimarães. Grande sertão. veredas. Rio de
23 - ALBERTI, op. cit., p. 24. Janeiro : J. Olympio. 1956.
24 - CELLINI, Benvenuto. Mémoires. Paris Sulliver. 1951. p. 20. 44 - GOETHE. op. cit., p 536.
25 - VINCI, Leonardo da, 1944. p 75. 45 - VINCI. Leonardo da, 1944. p. 50.
26 - ibid. p. 74. 46 - O conjunto dos dados que compõe esse Sistema Harm~nic~ é
27 - ibid. p. 32 e 86. encontrado no livro PEDROSA. Israel. Da cor à cor inexis-
tente. 9. ed. Rio de Janeiro : L. Christiano, 2003. p. 751-165.
28 - GOETHE, Johann Wolfgang von. Esbozo de una teoria de los
colores. ln: -· Obras completas. 4. ed. Madrid : Aguilar
1963. T. 1. p. 431-667. ,
29 - DICIONÁRIO Oxford de Arte. São Paulo : Martins Fontes, 1996.
p. 536. ,
30 - RUSKIN. John. Os pintores modernos. [S.I. : s.n.]. 1843-
1860. 5 v. Epílogo escrito em 1888. Livro iniciado com a defe-
sa e a apologia da obra de Turner. extendendo-se ao exame
geral da Arte.
31 - CHEVREUL, Michel-Eugeme. De la loi du contraste simul-
tané des couleurs. Paris : Chez Pitois-Levrault et C.•, 1839.
32 - s.lGNAC, Paul. D'Eugàne Delacroix au néo-impression-
nIsme. Paris: Hermann, 1987. p. 131.132, 133. 134,137.139,
142, 151, 156, 182. 185.

1 "
152
ste livro~ i impre o pela Gráfica Rettec
em dezembro de 2009, em papel off et 90g/m 2 no miol
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