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ABERTURA EM MAIORES DIMENSÕES - CONTRIBUIÇÃO DA MINERAÇÃO

SUBTERRÂNEA NA CONSTRUÇÃO CIVIL

Silvano de Souza Andrade1

Resumo - A mineração subterrânea no Brasil, muito embora não tenha a tradição e a experiência acumulada de outros
países, ditos benchmarket, já desenvolveu uma capacitação e uma maturidade, conduzida pelas empresas do ramo,
sejam elas empresas de mineração, de consultoria ou de prestação de serviços. Isto foi proporcionado pela introdução de
novas tecnologias, equipamentos e métodos, tanto desenvolvidos ou adaptados pelos nossos técnicos, tanto pela
aquisição de know-how via consultoria internacional. Essa capacitação na lavra de minas subterrâneas, pode
perfeitamente ser utilizada na construção ou escavação de obras civis subterrâneas, pela similaridade da aplicação. Este
trabalho mostra a experiência da operação da mina subterrânea da Mineração Caraíba S.A. que opera a única mina de
cobre subterrânea atualmente em lavra no Brasil, com escavações de grandes dimensões, lavra mecanizada e aplicação
de tecnologia de ponta. Serão apresentados dados gerais sobre o histórico e layout da mina, métodos de escavação e
suporte e de monitoramento da estabilidade das escavações.

Palavras – Chave - Lavra Subterrânea, Escavações de Grande Porte, Mineração Caraíba S.A.

INTRODUÇÃO
A mineração e as escavações subterrâneas no mundo remontam de uma era muito antiga, a princípio de forma
rudimentar e com o emprego de mão de obra extensiva. A crescente demanda mineral, seja para uso como material de
construção, seja para transformação de metais, impulsionaram a extração de minerais e o desenvolvimento crescente de
métodos e equipamentos. A princípio toda a extração era feita basicamente na superfície, mas com o passar do tempo
foram surgindo as primeiras lavras subterrâneas.
No Brasil a história da mineração subterrânea [1] vem desde o tempo dos bandeirantes com a abertura de
galerias em encostas, perseguindo veios de ouro, escavações estas feitas de forma muito rudimentar com ponteiras e
marretas e uso de pólvora caseira, quando necessário. As dimensões eram sempre acanhadas, com pouca iluminação e
péssimas condições de higiene e segurança. Os poços verticais e inclinados, quando necessários eram abertos da mesma
forma e o minério içado em baldes de madeira por sarilhos manuais. O minério era carregado em pás e transportado em
carrinhos de mão, ou em carroças com tração animal quando para distâncias maiores. A mão de obra empregada era na
maioria das vezes escrava. A falta de conhecimento geológico dificultava sobremaneira o trabalho.
As primeiras lavras subterrâneas mais sofisticadas no Brasil foram as de ouro, com a abertura da mina da
Passagem, em Mariana, em 1819, pelo Barão de Echewege seguida de várias outras, com especial destaque para a mina
Velha da Saint John Del Rey Mining Co, em Nova Lima em 1834, que eram consideradas, à época, referência no
emprego de tecnologia, trazidos pelos seus engenheiros, capitães de mina e mineiros ingleses.
Já na década de 60, exemplos bem sucedidos foram as minas de Boquira na Bahia e Plumbum no Paraná, do
Grupo Penarroya, com a aplicação de técnicas francesas de lavra de veios estreitos por sub-níveis e posterior
enchimento. Ao mesmo tempo as minas de Camaquã no Rio Grande do Sul foram bem conduzidas com a cooperação
técnica de engenheiros japoneses da Mitsubishi.
A evolução da mineração subterrânea brasileira não parou mais e podemos citar os exemplos mais recentes, bem
sucedidos como a mina de calcário de Santa Helena, em Sorocaba, São Paulo, única lavra subterrânea de calcário no
país, que recebeu contribuição de tecnologia finlandesa, e que usava o método sub-level stoping, hoje paralisada; a mina
do grupo Ferbasa na Bahia, com uso de método de lavra subterrâneo de alta produtividade (sub-level caving) no final
dos anos 70, também com contribuição de engenheiros finlandeses; a mina de Taquari-Vassouras em Rosário de Catete,
Sergipe, com o método de câmeras e pilares e com o uso de mineradores contínuos, assistida no início dos anos 80 por
técnicos franceses; a mina Caraíba, em Jaguarari, Bahia, no início dos anos 80, com método de alta produtividade (sub-
leve stoping) com contribuição de técnicos americanos e posteriormente chilenos, bem como do novo projeto de
aprofundamento da mina, no final dos anos 90, com introdução de tecnologias pioneiras no país, com consultoria
canadense.
Outros inúmeros exemplos de projetos de minas subterrâneas bem sucedidas no país podem ser citados como: a
mina São Bento em Barões de Cocais, a mina de Cuiabá, a mina de Morro Agudo, em Paracatu, a mina de Vazante e
Fortaleza de Minas, todas em Minas Gerais, a mina Fazenda Brasileiro, em Teofilândia, Bahia, a mina Crixás em Goiás,
e ainda outras de carvão, principalmente em Santa Catarina, bem como um sem número de outras minas de menor
porte, mas não menos bem sucedidas como as anteriormente citadas.

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Silvano de Souza Andrade – silvano@minacaraiba.com.br - Gerente de Operações da Mina Subterrânea - Mineração Caraíba S. A.
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NOVAS TECNOLOGIAS
A tecnologia de mineração subterrânea tem sido desenvolvida continuamente devido à necessidade de melhorar
as condições de higiene e segurança dos mineiros, as condições de estabilidade das escavações para assegurar a
completa extração das reservas, a produtividade das operações unitárias, o conhecimento geológico e geotécnico dos
maciços rochosos, bem como de enfrentar novos desafios com as minas cada vez mais profundas. Assim, os principais
avanços têm sido nas áreas descritas abaixo:
• Softwares os mais diversos possíveis para modelamento e simulação de várias operações mineiras, dentre
elas: avaliação geológica de reservas, estabilidade de escavações, contenções, planejamento de minas,
controle e manutenção de frotas de equipamentos, ventilação, acompanhamento topográfico,
monitoramento sísmico, treinamento de mineiros em operação de equipamentos, etc.
• Refrigeração do ar para ventilação.
• Comunicação de áudio e vídeo, bem como transmissão de dados remotamente.
• Operação remota de equipamentos, inclusive telecomandados da superfície (perfuratrizes, carregadeiras e
caminhões).
• Equipamentos de grande porte, alta produtividade e performance, e contínua mecanização, substituindo
quase todas as operações antes manuais, levando em conta os aspectos de segurança e ergonomia para os
operadores.
• Contenções com a introdução de novas técnicas de suporte como tirantes resinados e grauteados,
cablebolting e cablelacing, chumbadores de fricção tipo split-set e swelex, telas metálicas, concreto
projetado reforçado com fibras metálicas, polímeros especiais de revestimentos, etc.
• Enchimento de escavações (backfill).
• Desmonte de rochas, com a introdução de explosivos eficientes, seguros e mais baratos, bem como de
acessórios como os reforçadores, iniciadores não elétricos e os eletrônicos.
• Instrumentação de maciços com os medidores de tensão/deformação contínuos, medições de tensões in-
situ, monitoramento de eventos sísmicos, vibração de detonações, etc.
• Aparelhos topográficos de precisão, e de medições e escaneamento de cavidades a laser.

CONCEITUAÇÃO DE PROJETO
Um projeto de mineração subterrânea tem que levar em conta alguns parâmetros convergentes e outros diferentes
de um projeto de escavação subterrânea para fins civis. Algumas das principais diferenças são:

1) Em mineração todas as escavações são feitas com o objetivo básico de extrair o minério existente, que foi
disposto pela natureza, durante a gênese da jazida, com distribuição geográfica e de teores aleatórios. Assim um
completo conhecimento geológico do corpo mineralizado é indispensável para a concepção do projeto, levando em
consideração essa distribuição espacial e de teores a serem lavrados. Enquanto que num projeto civil a locação das
escavações tem outra origem, determinada por outros condicionantes.

2) O tempo que as escavações permanecerão abertas é distinto. Para mineração subterrânea o conceito de fator de
segurança é diferente e se trabalha levando em conta o tempo necessário de utilização das galerias ou escavações em geral.
Assim tem-se o conceito de escavações temporárias, para aberturas com duração de até 6 meses, escavações permanentes,
com duração até 2 anos, e escavações definitivas, com duração superior a 2 anos. A abordagem em relação ao tipo de
suporte varia de acordo com cada caso. Já na construção civil, as escavações são normalmente projetadas para uma longa
duração, com fatores de segurança mais elevados e abordagem de projeto dirigida para essa finalidade.

3) O projeto civil é concebido de uma forma estática em relação ao campo de tensões atuantes, ou seja, o campo
de tensões atuantes sobre as escavações considerado na época de projeto não vai mudar com o passar do tempo, além
das escavações se situarem normalmente a pequenas profundidades, ou sob coberturas não muito expressivas, o que faz
influir um menor campo de tensões. Já na mineração subterrânea, é muito difícil prever exatamente como vai variar o
campo de tensões atuante em volta das escavações até o final da mina, à medida que novas escavações vão sendo feitas;
pode-se dizer que é um processo dinâmico. Muito embora existam softwares de avaliação das condições de estabilidade
e variação dos campos de tensão em torno das escavações, que podem ser usados para fazer simulações do
comportamento futuro do campo de tensões, a prática mostra que isso não traduz com fidelidade as alterações
experimentadas no decorrer da vida da mina. Além disso as minas subterrâneas podem estar submetidas a um forte
estado de tensões em função da profundidade.

4) A duração da obra, que em escavações com finalidades civis, normalmente tem um tempo mais curto, e
geralmente pré-determinado, amarrado a um cronograma, enquanto que a duração de uma mina subterrânea é bem mais
longa, podendo se estender a várias décadas, e a sua duração está associada à reserva geológica, escala de produção e
fatores econômicos. Essa maior duração da obra mineira favorece a possibilidade de treinamento, capacitação e
desenvolvimento continuado da força de trabalho, exercendo uma influência sócio-econômica na equipe e na
circunvizinhança onde está instalada a mineração, enquanto que o caráter mais provisório da obra civil, favorece em
menor escala estes aspectos mencionados.
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MÉTODOS DE LAVRA SUBTERRÂNEOS
Uma importante distinção também em relação à mineração e escavações subterrâneas para fins civis diz respeito
ao tipo de escavação realizado. Em obras subterrâneas civis o formato da escavação é ditado pela utilização da mesma,
assim um túnel tem um comprimento definido pela extensão da montanha a ser atravessada e a seção ditada pelo porte e
fluxo do tráfego, sendo cada caso projetado a fim de atender a sua utilização proposta.
Já na mineração o formato e dimensões das escavações são definidos de forma diferente. A princípio podemos
distinguir três tipos de escavações. Todos eles levam em consideração as características geológicas e geotécnicas do
maciço rochoso, bem como no caso de obras civis, acrescenta-se entretanto os seguintes condicionantes:

a) desenvolvimento: são todas as escavações de acesso e preparação do corpo mineralizado para a lavra, como
rampas, planos inclinados, galerias e poços de acesso com elevadores para pessoal e/ou produção de minério/estéril e
ainda poços exclusivos de ventilação. O desenvolvimento é projetado de acordo com o layout ou traçado da mina,
profundidade dos trabalhos, tipo de equipamentos empregados, projeto de ventilação, entre outros;

b) áreas de apoio: como oficinas, câmaras de britagem, área para escritórios, depósitos, almoxarifados,
reservatório de água, sub-estações, etc. Estas se assemelham mais aos critérios de projeto de obras civis e obedecem
traçados ou dimensões apropriados para a sua finalidade específica.

c) escavações de produção ou realces: são os blocos individualizados de lavra, de onde uma certa quantidade
de massa e teor conhecidos é retirada. Estas escavações são definidas obedecendo a critérios de geometria (inclinação,
espessura, continuidade) e a características de resistência e estabilidade tanto do minério a ser escavado, como das
rochas encaixantes que circundam o mesmo. Elas são definidas em métodos de lavra e têm inúmeras variantes
adaptadas para cada caso. Os principais grupos de métodos de lavra são citados abaixo.

• Métodos com realces auto-portantes:


o Lavra por Sub-níveis – Sublevel Stoping, Long Hole, SLR (Sublevel Retreat)
o VCR (Vertical Crater Retreat), VRM (Vertical Retreat Mining), Slot-slash
o Câmaras e pilares

• Métodos com suporte das encaixantes:


o Recalque (Shrinkage)
o Corte e enchimento (Cut and Fill)

• Métodos com abatimento


o Abatimento por Sub-níveis (Sublevel Caving)
o Abatimento por Blocos (Block Caving)

Não entraremos em detalhes na descrição e aplicação de cada um deles, e o objetivo de citá-los aqui é apenas de
mostrar que as escavações subterrâneas para mineração têm uma grande variedade de possibilidades, a depender dos
condicionantes citados acima. Além disso, esses métodos podem apresentar variantes quanto às dimensões dos realces e
painéis de lavra, além de pequenas adaptações introduzidas pelas minas a depender de particularidades específicas.

PROJETO INTEGRADO DE MINERAÇÃO SUBTERRâNEA


Para uma mina entrar em operação tem uma série de passos a serem tomados que diferenciam em relação a uma
obra civil. De forma simplificada, as etapas podem ser sumarizadas como a seguir.
A primeira etapa de qualquer empreendimento mineiro é a pesquisa geológica cujo objetivo é identificar um
recurso natural e quantificar uma reserva geológica. Esse é um processo lento e oneroso com alto risco de investimento
podendo ou não obter resultado positivo. As técnicas de pesquisa geológica são variadas e o modelo prospectivo a ser
utilizado depende do ambiente geológico típico do bem mineral pesquisado. Mas de um modo geral, pode compreender
as fases de geoquímica (análise de sedimentos de corrente e geoquímica de solo), geofísica (aérea ou terrestre), métodos
elétricos (IP ou polarização induzida), magnetismo (magnetometria) ou diferenças de densidade (gravimetria) das
rochas. Após a seleção de alvos promissores são realizadas sondagens rotativas diamantadas para checar as anomalias,
onde são descritas as litologias atravessadas e quantificados os teores associados. Os dados de sondagem juntamente
com o mapeamento geológico de superfície e a análise estrutural da área são usados para estabelecer uma hipótese da
gênese do corpo mineralizado e um modelo geológico. Estes dados são então processados por softwares de
modelamento geolócico, que com o auxílio de ferramentas de geoestatística, estabelecem e quantificam finalmente o
corpo mineralizado, disponibilizando essa informação para a etapa seguinte do processo.
A próxima etapa é o estudo de viabilidade técnica e econômica do aproveitamento comercial do recurso mineral,
que abrange um leque extenso de aspectos, como a seguir;
1) Estudo de mercado e preços, oferta e demanda atual e futura, concorrentes, ameaças, etc;
2) Análise de estabilidade das escavações e definição do método de lavra, bem como tipo e quantidade de
suporte para as escavações;
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3) Definição do layout geral da mina – acessos para homens e equipamentos, rota de extração do minério, circuito
de ventilação e de desaguamento da mina, áreas de apoio como oficinas, almoxarifados, depósitos, etc;
4) Definição e dimensionamento de todos os equipamentos – frota de equipamentos móveis, bem como fixos:
guinchos de minério e pessoal, britagem, correias, bombas, ventilação principal e secundária,
compressores, etc;
5) Definição da escala de produção;
6) Definição da estrutura de pessoal técnico e operacional;
7) Definição dos custos de investimento, de operação e de capital;
8) Proceder as análises financeiras do investimento, considerando a previsão de diferentes cenários (otimista,
realista e pessimista) ou de outros adequados a cada caso, verificando os principais indicadores
financeiros, tais como taxa interna de retorno, valor presente e pay-back.

Uma vez verificada a viabilidade econômica do projeto, um detalhamento das etapas 2, 3 e 4 é requerido para dar
início à fase de implantação. O acompanhamento permanente dos parâmetros definidos na fase de projeto se faz
necessário, para adequar os ajustes cabíveis durante a fase de execução. Assim se inicia uma nova mina.

A MINA CARAÍBA
A Mineração Caraíba S.A. localizada no município de Jaguarari, nordeste do estado da Bahia, a cerca de 500 km
de salvador, lavrou uma mina a céu aberto entre 1979 e 1998, extraindo 51 milhões de ton de minério de cobre com
0,96% de Cu e 170 milhões de estéril, deixando uma cava com dimensões aproximadas de 1.300 m de comprimento,
700 m de largura e 300 m de profundidade. A mina subterrânea entrou em operação em 1986, lavrando o mesmo corpo
de minério, que se estendia em profundidade, com uma produção acumulada até outubro de 2003 de 15 milhões de ton
com um teor de 2,15% de Cu. O projeto concebido previa a exaustão conjunta da mina a céu aberto e da mina
subterrânea no segundo semestre de 1998.
A lavra da mina subterrânea foi feita, até 1998, através do método sublevel stopping (lavra por sub-níveis), com
realces de grandes dimensões (90m X 35m X 60m), mantidos abertos após a lavra. Esta prática resultou em resultados
não satisfatórios de overbreak e diluição, bem como de estabilidade geral do maciço, culminando com problemas de
estabilidade pós lavra nos pilares estruturais entre a mina a céu aberto e a mina subterrânea e nos pilares horizontais
entre os dois painéis de lavra no subsolo.
A partir de 1995 foi decidido implementar um programa de pesquisa geológica para aprofundamento da mina
subterrânea. Em 1996 iniciou um estudo de viabilidade técnico econômico do aprofundamento da mina, todo
desenvolvido pelo pessoal próprio da Caraíba. O projeto foi auditado por uma empresa canadense para verificar sua
consistência. Este projeto foi implementado em 1997, com o desenvolvimento da continuidade da rampa principal de
acesso até o final do corpo mineralizado, de forma a garantir a continuidade operacional da extração do minério de
cobre, sem interrupção nos resultados financeiros da empresa (figura 1).
A redução na escala de produção, anteriormente garantida pela operação conjunta das minas a céu aberto e
subterrânea, foi compensada com o aumento na produção da mina subterrânea de 80.000 para 100.000 t/mês, bem como
pelo aumento do teor médio de cobre, obtido na parte mais profunda da mina.

Figura 01: Vista geral da Mina Caraíba (céu aberto e subterrânea)


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Mudanças significativas foram introduzidas no novo projeto da mina subterrânea, com o aporte de novos
métodos, equipamentos e tecnologias, muitas delas inéditas no Brasil, para fazer frente às novas condições adversas que
o aprofundamento da lavra causou.

PROJETO DE APROFUNDAMENTO DA MINA SUBTERRÂNEA


Uma das principais condicionantes para o desenvolvimento desse projeto foi a adversa condição geomecânica do
maciço caracterizada por um ambiente submetido a elevadas tensões, considerando a profundidade onde seriam
realizados os trabalhos de lavra, cerca de 500 a 800 m de profundidade (figura 02).

Figura 02: Galeria exibindo desplacamento típico decorrente do elevado estado de tensões na Mina Caraíba.

Estas elevadas tensões eram equivalentes a tensões encontradas em outras minas a cerca de 1.500 a 2.000 m de
profundidade. Além disso, a complexidade estrutural do maciço, aliada a extensas zonas cisalhadas, bordejando o corpo
mineralizado, desde a superfície e com continuidade em profundidade, completam o quadro de condicionantes
geomecânicos (Figura 03).

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Figura 03: Galeria exibindo os danos progressivos, decorrentes do elevado estado de tensões na Mina Caraíba.

Visando manter a estabilidade regional do maciço, aumentar a recuperação da reserva, proporcionar alta
mecanização e segurança e garantir a previsibilidade dos resultados, foram feitas várias modificações em relação aos
métodos usados na lavra anteriormente, podendo citar algumas abaixo, todas elas pioneiras no Brasil:
• Mudança do método de lavra para VRM – Vertical Retreat Mining ou lavra em recuo vertical. Este
método exige a utilização de perfuratrizes ITH – In the hole – para garantir perfuração de grandes diâmetros (6
½ “) e comprimento (até 60m), com acurácia otimizada.
• Introdução de backfill – foi utilizado o sistema Pastefill, onde o enchimento dos realces já lavrados é feito
por uma pasta composta de rejeito da usina e cimento, sem necessidade de desaguamento posterior e mantendo
uma resistência suficiente para a lavra dos pilares entre dois realces já lavrados e enchidos, expondo paredes
auto-sustentáveis com dimensões médias de 30m de comprimento e 60m de altura.
• Utilização de monitoramento topográfico a laser em realces já lavrados para otimização dos projetos dos
pilares adjacentes. Isto é feito utilizando um aparelho de escaneamento automático a laser nas escavações
gerando o volume escavado em 3D com importação dos dados para outros softwares de manipulação como
Topograph e Autocad.
• Equipamentos de produção telecomandados e de grande porte, bem como outros equipamentos para
batimento de choco, instalação mecanizada de tirantes e concreto projetado.
• Instalação de instrumentação para monitoramento micro sísmico do maciço rochoso.

NOVOS CONDICIONANTES PARA A LAVRA


Além das condições adversas descritas acima, a partir de 1997 quando do desenvolvimento da continuidade da
rampa principal de acesso, começou a aparecer um novo condicionante em relação à estabilidade geral das escavações e
segurança de homens e equipamentos em geral. Foi o aparecimento de uma sismicidade induzida pela lavra. Desde esta
data que sismos induzidos pela lavra começaram a se tornar mais freqüentes na Mineração Caraíba em conseqüência de
seu aprofundamento e incremento da taxa de extração. Ocorreram cerca de 2 eventos de magnitude considerável (Mn 2
a 3) por ano a partir de 1997 e algumas dezenas de outros de menor intensidade, bem como a ocorrência de alguns
rockbursts.
Rockbursts são danos ao maciço provenientes de atividades sísmicas. Os efeitos destes eventos podem ser
visualizados nas galerias como demonstra a figura 04.

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Figura 04: Rockburst ocorrido na Mina Caraíba, observe o lançamento de material da lateral da galeria.

Entre julho e outubro de 1998 ocorreram dois eventos, registrados em estações sismográficas localizadas a
200km de distância, nas usinas hidrelétricas de Itaparica e Xingó (CHESF), com magnitude de 3.1 e 2.5,
respectivamente [2]. O sismo de julho chegou a ser captado pela estação de Brasília, a 1087km de distância. Outros
eventos de escala mais regional detectados pelas estações Itaparica e Xingó foram nos dias 28 de março de 1999
(magnitude 2.8) e 25 de outubro de 1999 (2.2).
Pode-se afirmar que estes eventos foram induzidos pela atividade de lavra, devido ao fato da região em que se
encontra a mina, ser uma de menor atividade sísmica no Brasil. A única referência de sismos naturais na região foi um
tremor de magnitude 4.8 em 1905, a 70km de distância [3].
O pessoal envolvido no trabalho direto na mina subterrânea aceita um nível determinado de ruídos e vibrações,
podendo em certos casos abandonar a frente de trabalho ou retardar a entrada para dar continuidade a um novo ciclo de
atividades. A operação da mina pode ser então afetada, mesmo que temporariamente, em situações onde não ocorram
danos físicos (rockbursts). Um evento significativo não precisa ser então necessariamente um grande evento, mas sim
um que interrompa a rotina da mina.

GEOLOGIA DA MINA
A geologia da Mina Caraíba é constituída por um conjunto de rochas máficas-utramáficas diferenciadas,
intrudidas, supostamente sob a forma de um sill sintectônico à fase 1 de deformação, em um conjunto de rochas de
natureza supracrustal que vão de gnaisse bandados, até a presença de calcosilicatadas, mármores e rochas graníticas e
pegmatoides, conferindo ao corpo um aspecto de lentes irregulares.
O teor do minério é extremamente heterogêneo em sua distribuição espacial, não se verificando uma
continuidade lateral, longitudinal ou vertical nos diversos níveis. Mapas de isoteores mostram que houve concentração
de sulfetos de cobre nas charneiras das dobras da fase 2. Estas zonas ricas constituídas de corpos cilíndricos horizontais
(RODS), foram posteriormente verticalizados pela fase 3.
A necessidade de um alto grau de conhecimento dos fatores que controlam a complexa estrutura do corpo
Caraíba, fez com que houvesse a necessidade de implantação de um sistema mais especializado de modo a possibilitar
a melhor modelagem geológica e avaliação de reservas, sendo adquirido em 1995 o software Datamine com objetivo de
desenvolver e aprimorar técnicas de analise e tratamento dos dados, modelagem geológica e avaliação dos recursos
minerais, além do planejamento de lavra.

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O trabalho de modelamento geológico do corpo mineralizado foi conduzido de acordo com a seguinte seqüência
de trabalho:
• Treinamento e capacitação dos técnicos
• Organização, conhecimento e validação do banco de dados
• Análise dos dados
• Digitalização das seções geológicas verticais e horizontais
• Criação do modelo tridimensional do corpo geológico
• Criação do modelo de blocos usando IQD com anisotropia
• Verificação do modelo geológico com os dados realizados em lavra

Foram modeladas inicialmente, as áreas já lavradas nos painéis I e II da mina, para aferição de parâmetros e
calibragem do modelo. Atualmente o modelo é atualizado apenas quando novas sondagens de detalhamento são
requeridas.
Após a criação tridimensional do corpo mineralizado e da individualização de volumes e teores através do
modelo de blocos, o planejamento projeta os realces, e estes depois de lavrados e o minério ter sido processado na
usina, compara-se o teor previsto pela geologia e efetivamente lavrado. A diferença percentual entre o teor previsto e
realizado é inferior a 1,5% mostrando a enorme eficiência desta estimativa.
Abaixo na figura 05 vemos o resultado do modelamento geológico pela apresentação de uma seção vertical
típica, mostrando a complexidade estrutural da mina Caraíba.

Figura 05 - Seção vertical geológica 40 da Mina Caraíba mostrando os corpos mineralizados

Qualidade das rochas


Apesar das características favoráveis quanto às propriedades físicas das rochas como resistência à compressão e
módulo de elasticidade, o elevado estado de tensões das rochas dificulta as condições de escavação pela elevada
sismicidade ativa em algumas frentes de desenvolvimento, com a presença de pequenos eventos sísmicos associados às
detonações.
Os ensaios laboratoriais de resistência mecânica das rochas foram conduzidos pelo Instituto de Pesquisas
Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT). A Tabela 1 apresenta um resumo dos resultados dos testes.

Tabela 1- RESUMO DOS RESULTADOS DOS ENSAIOS EM ROCHA


Módulo Elástico UCS Peso Unitário Coef. de
Tipo de Rocha
(GPa) (MPa) (t/m3) Poisson

Rocha Encaixante (Média) 65 162 2.70 0.25


Minério (Média) 100 180 3.13 0.21
UCS = Resistência à compressão simples (Uniaxial Compressive Strength)

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Estado de tensões
O nível de tensões encontrado na mina é relativamente elevado considerando-se a pouca profundidade em que
estão ocorrendo as atividades produtivas, atualmente (535 a 800 m), principalmente relacionado a uma forte
componente horizontal. Este fenômeno é evidenciado através de empastilhamento de testemunhos de sondagem,
esfoliação da rocha em galerias tipo “casca de cebola” e fechamento de furos de perfuração de 3 ½” a 6 ½”.
Como tentativa de quantificar o regime de tensões na mina, dois estudos de medidas de tensões in-situ foram
realizados em 1984 [4] e em 1990 pelo IPT [5], IPT. Estes estudos, contudo, produziram resultados incapazes de definir
de forma precisa o regime de tensões atuantes no maciço. Inspeções subterrâneas conduzidas em outubro de 1999
forneceram evidências da ocorrência de níveis de tensões superiores aos que seriam normalmente esperados para
escavações em suas respectivas profundidades, e que estes estariam compatíveis com os comumente encontrados em
minas canadenses que atingiram profundidades superiores a 1.500m [6].
O regime de tensões foi então definido com base em observações de campo, retro-análise usando modelamento
numérico, evidência de empastilhamento de testemunhos de sondagem, e na similaridade do comportamento induzido
por tensões nesse nível com as condições de lavra em profundidade equivalente, em minas com maciços semelhantes no
Canadá. A tensão horizontal máxima in-situ foi estimada variando de 80 MPa a 90 MPa na parte mais profunda,
evidenciando que o gradiente de tensões não é significativo a partir dos 535 m até o final da mina (800 m).

PLANEJAMENTO DE LAVRA
O planejamento de lavra é responsável por traduzir as metas de produção em planos executáveis pelas áreas
operacionais, acompanhar o seu cumprimento, assegurando o resultado previsto e antevendo possíveis dificuldades
futuras, propondo soluções antecipadas. Projeta todo o traçado da mina, o sequenciamento de desenvolvimento e lavra,
e elabora os planos de produção de curto (até 3 meses), médio (de 3 meses a 1 ano) e longo prazo (de 1 a 5 anos). Estão
sob sua responsabilidade as áreas de planejamento de lavra propriamente dito, a topografia que orienta e acompanha as
escavações e faz locações orientativas diversas na mina, a mecânica das rochas, responsável pela estabilidade geral das
escavações e a ventilação da mina, além de toda a área de projetos específicos para o desenvolvimento e lavra, como os
planos de perfuração e contenção.
É uma área altamente técnica, de grande responsabilidade e de muita importância numa mina subterrânea, que
precisa ter grande visão holística e de futuro e um enorme senso de coordenação de atividades múltiplas, além de uma
aguçada capacidade de visão tridimensional. Erros nesta área geralmente têm conseqüência desastrosa.
Na mina Caraíba o planejamento de lavra é suportado por modernas ferramentas de planejamento e controle das
escavações, como os softwares Datamine, de planejamento de lavra, AutoCad, para desenhos e projetos em geral,
TopoGraph, para controle e projetos topográficos, MS-Project, para sequenciamento de atividades múltiplas (de
sondagem, desenvolvimento, contenções, perfuração e lavra), V-Net para simulação e controle da ventilação da mina,
além de diversos outros softwares de análise da estabilidade das escavações. Tem ainda o sistema de monitoramento
micro-sísmico, com registro on-line, 24 horas por dia dos eventos sísmicos da mina, o CMS (Cavity Monitoring
System) que é um medidor de cavidades a laser, usado para gerar sólidos tridimensionais de cavidades abertas, além de
estações totais para controle topográfico de todas as atividades de perfuração e escavação na mina.

DESENVOLVIMENTO E CONTENÇÕES
Compreende a abertura das galerias, com perfuração horizontal e desmonte com explosivos, instalação de todas
as contenções, bem como todas as linhas de utilidades como água, ar comprimido, tubulação para backfill, ventilação
secundária, etc, entregando para a lavra os realces já prontos para a perfuração, com todos os requisitos atendidos em
relação a dimensões, contenções, ventilação e utilidades (ar comprimido e água).
Para garantir o nível de produção requerido (100.000 t/mês) é necessário o desenvolvimento médio de 200 m de
galerias por mês. As seções típicas das galerias são de 4,5 m X 4,0 m (18 m2) e 6,0 m X 4,8 m (29 m2). Esta metragem
mensal, aparentemente pequena, representa um volume de trabalho considerável por envolver um esforço significativo
referente às necessidades de suporte tais como: batimento de choco, atirantamento (2.500 un/mês), instalação de telas
metálicas (500 un/mês – 2,45m X 3,0 m cada), projeção de concreto (800 m3/mês) e injeção de cable bolting
(5.000m/mês).
A perfuração é feita com 3,65 m de comprimento para um rendimento de 92 a 93%. Os explosivos usados são o
ANFO escorvado com um cartucho de emulsão de 1 ½ X 8”. Os iniciadores são espoletas de retardo não elétricas. O
carregamento é feito com um caminhão plataforma e uma máquina de carregamento pneumática. A razão de carga
usada fica em torno de 3,0 Kg/m3.
Atualmente na mina Caraíba o atirantamento faz parte do ciclo de escavação de todas as galerias desenvolvidas;
ou seja, não é permitido perfurar um novo avanço sem que o anterior tenha sido atirantado, assim o atirantamento se
constitui o suporte mínimo necessário para o avanço das frentes. Em algumas frentes onde o estado de tensões é mais
acentuado, telas metálicas são instaladas nos tetos, próximas à face de desmonte, para garantir a segurança da equipe de
carregamento.
Depois de escavadas, as galerias passam por uma avaliação geotécnica e têm seu suporte definitivo determinado
usando-se um procedimento operacional já estabelecido. Esse suporte adicional pode ser apenas telas metálicas,
cccccccc
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concreto projetado reforçado com fibras de aço, ou concreto projetado sobre as telas metálicas. Cable Bolting é
adicionado nas galerias que serão futuros tetos de realces e nas principais galerias de acesso.
Ocasionalmente reabilitação de algumas áreas já contidas anteriormente se faz necessário devido ao fator tempo,
à mudança no estado de tensões, ao efeito cumulativo das vibrações de detonação e também à atividade sísmica.
Os tirantes são barras de aço com 2,4 m de comprimento, diâmetro de 7/8”, totalmente resinados e com malha de
1,20 X 1,50 m. As telas metálicas são com malha quadrada de 10 X 10 cm e fio de 6 mm de espessura com reforço de
solda em todas as interseções da malha. O concreto projetado tem normalmente de 5 a 8 cm de espessura e é aplicado
sobre a tela metálica ou com reforço de fibra de aço. A malha de cable bolting completa o sistema de suporte tanto nas
principais galerias de acesso como nos realces de produção; são instalados cabos de 7 fios com 15 mm de diâmetro em
furos de 21/2” de diâmetro, malha que varia de 2,0 X 2,0m a 2,5 X 2,5 m e média de comprimento de 6,5m.
Além da abertura de galerias em rocha a mina Caraíba também desenvolve galerias dentro da pasta de
enchimento dos reaces (pastefill), com um sistema próprio de escavação e suporte, técnica essa pioneira no Brasil. Este
desenvolvimento é necessário para a lavra dos realces terciários, localizados no sill-pillar entre dois painéis adjacentes.
Também em função das dificuldades da abertura de galerias em relação à sismicidade induzida pela lavra que foi
introduzido na Mineração Caraíba em 2001, a técnica de destress blasting, em aberturas de galerias que apresentavam
alto nível de tensão horizontal provocando acentuada perturbação sísmica após cada detonação, como uma forma de
manter o ritmo de escavação dentro do programado e reverter os atrasos no cronograma de execução originados por tais
eventos sísmicos considerando os aspectos de segurança de pessoal. Esta técnica também foi introduzida pioneiramente
no Brasil pela mina Caraíba.

Principais Equipamentos usados


02 Jumbos de dois braços (Minimatic HS 205 D) eletro-hidráulico, com perfuratriz HL 500 S
01 Rock Bolting de um braço (Secoma) eletro-hidráulico com perfuratriz HL 200
01 Carregadeira LHD (TORO 650 DL) com capacidade de 9 jd3
01 Carregadeira LHD (EJC 180) com capacidade de 5 jd3
02 Caminhões rebaixados (EJC 430 D) com capacidade de 27ton
01 Scaler
03 Caminhões plataforma
01 Caminhão projetor de concreto
01 Caminhão betoneira

LAVRA
Compreende a perfuração primária, desmonte do minério, carregamento e transporte até o ore-pass que alimenta
o britador primário. No ore-pass há uma grelha para limitar o tamanho dos blocos que alimentarão a britagem. Os
blocos maiores que a abertura da grelha têm o tamanho reduzido com a utilização de um rompedor hidráulico.
A perfuração primária é feita tanto descendente com a utilização de perfuratrizes ITH (in the hole) com
diâmetros de 6 ½” e 4 ½”, com furos que variam de 35 a 55m de comprimento, tanto ascendente usando-se uma
perfuratriz tipo fandrill com diâmetro de 3 ½”, para furos de até 25m de comprimento. O desmonte de rochas utiliza
explosivo granulado tipo ANFO para os furos descendentes de leques, e emulsão encartuchada na abertura da chaminé
de face livre. Nos furos ascendentes ou aqueles descendentes com umidade ou água usá-se emulsão bombeada. Os
iniciadores são do tipo não elétricos.
A mina Caraíba testou o método VRC (Vertical Creater Retreat) durante a fase de estudo de viabilidade
técnico-econômico de aprofundamento da mina, mas optou pelo método VRM (Vertical Retreat Mining) como método
principal de lavra por causa de vantagens em relação à produtividade. Este método é uma variante do VCR, onde se usa
uma chaminé de face livre como apoio ao início do desmonte e a combinação de faces livres verticais e horizontais no
desmonte.
A dimensão dos realces é de 15m de largura por cerca de 30m de comprimento máximo e altura variada de
acordo com a altura do painel em lavra, podendo variar de 25, 35, 40, 55 ou 60m. A seqüência de lavra estabelece a
extração inicialmente dos realces primários, seu enchimento (backfill) logo após a extração, e então a lavra dos realces
secundários (ou pilares) adjacentes aos mesmos (figura 06). Estes também são enchidos, mas sem o uso de cimento,
podendo ser usados como bota-fora do estéril do desenvolvimento. Um terceiro sequenciamento de lavra é feito com a
extração dos realces primários e secundários no pilar estrutural deixado entre os dois painéis iniciais de lavra (sill
pillar). Para isso é necessário a reabertura de galerias dentro dos realces já enchido com o pastefill. Esta seqüência de
lavra e enchimento com a extração de todos os pilares de sustentação permite uma alta recuperação da reserva e uma
atividade com diluição minimizada.

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Realces primários já lavrados
e preenchidos com pasta. Realce secundário, ou
pilar, ainda por ser
lavrado.

Realce secundário, ou
pilar, já lavrado,
aguardando
enchimento com
pasta.

Figura 06 – Mostra a seqüência típica de lavra de realces e pilares

O Método de Lavra VRM (Vertical Retreat Mining)


A preparação para o VRM consiste na abertura de dois níveis operacionais: o nível superior (top sill), de
perfuração, é caracterizado por uma ou duas galerias, conforme a largura do realce. Neste nível é executada a
perfuração descendente, normalmente furos longos, com diâmetros de 4 ½” para os leques e 6 ½” para as travessas de
face-livre (slot raise) e leques com comprimento superior a 35m.
No nível inferior (bottom sill), ou nível de extração, é aberta a galeria de recolhimento e produção, e a partir de
onde se procede a perfuração ascendente, em leque radial de 3 ½” de diâmetro (figura 07).

top sill top sill top sill

overcut
overcut overcut

slot
undercut slot
undercut
undercut

Bottom Bottom
sill sill Bottom
sill

Figura 07 – Seqüência de perfuração e desmonte no VRM

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O desmonte se inicia pela abertura ascendente da face-livre (slot raise), com avanço médio por fogo de 2,5 m. Após
o terceiro fogo na subida, procede-se, concomitantemente com o mesmo, o alargamento da travessa para face livre dos
leques. Esta medida visa colocar o realce em produção logo no início do desmonte. No alargamento da travessa a coluna de
explosivos é de 4 metros. O desmonte do under cut, é iniciado assim que tenha sido liberada face livre suficiente.
O desmonte do over cut, com perfuração descendente de 4 ½” é feito com o explosivo tipo ANFO, conforme a
seqüência de desmonte mostrada na figura 08. Os fundamentos básicos para adoção desta seqüência são: aproveitar ao
máximo as faces livres verticais e horizontais e durante o desmonte minimizar a área dos blocos remanescentes em
balanço para evitar desplacamentos. A coluna carregada pode ser de até 12 m, em caso de furos com água, onde é usada
a emulsão explosiva (1,15 g/cm3), em caso de furos secos, sem água usa-se o ANFO, onde, neste caso a coluna
carregada com explosivo, pode chegar até 16 metros. A quantidade ideal de explosivos por furo é um fator importante
no controle da estabilidade dos realces, pois as paredes são menos afetadas devido às detonações, razão pela qual existe
um controle severo na obediência à carga máxima por espera adotada (150 kg/espera), obtida a partir de medições
sismográficas para controle das vibrações das detonações.
A fim de evitar desplacamentos e promover um melhor controle das paredes é preciso lavrar o realce o mais rápido
possível e com o menor número de detonações. Portanto, faz-se necessário utilizar, sempre que possível, um explosivo de
baixa razão linear de carregamento (baixa densidade), tornando as colunas de explosivo maiores, porém, sem ultrapassar a
carga máxima por espera adotada. Neste método de lavra a velocidade de desmonte é de grande importância.
A produção se inicia desde a detonação da chaminé, atingindo um ritmo normal, logo após o alargamento da
face livre. Durante toda a fase de desmonte as carregadeiras trabalham com operação normal e a face de extração
sempre cheia de minério. Após o término do desmonte total do realce, continua a extração, até que chega uma fase onde
é exigido o uso de controle remoto na carregadeira que passa a adentrar o realce, até sua completa exaustão.

19 16 13 11

10
12
18 15 9
7
6
5
8 4
14
17 3
2
1

Figura 08 – Seqüência de lavra num realce típico com o método VRM.

Algumas variantes são possíveis, e às vezes necessárias, por motivos de segurança, quando da lavra de realces
sobre outros realces já lavradas, com condições insatisfatórias de estabilidade do teto para perfuração ascendente,
fazendo-se toda a perfuração descendente a partir do topsill.
Destacam-se dentre as principais vantagens do método: sensível diminuição no custo de desenvolvimento,
conseqüentemente, maior tonelagem por metro desenvolvido; obtenção de ótima fragmentação do material desmontado;
permite alta mecanização, obtendo-se alta produtividade; baixa diluição (< 5%) e boas condições de segurança.
Dentre as ressalvas, destacam-se: exposição da LHD a desplacamentos do teto e/ou das laterais do realce quando
da extração via controle remoto; apenas um ponto de extração acarretando na necessidade de vários realces em lavra
simultaneamente; diminuição da acuidade da perfuração para furos longos (maiores que 35 m).

Principais Equipamentos usados


02 Perfuratrizes ITH Cubex 5.200
01 Fandrill SOLO Tamrock com perfuratriz HL 1.000
03 Carregadeiras LHD (TORO 650 DL) com capacidade de 9 jd3
01 Carregadeira LHD (TORO 010) com capacidade de 9 jd3
05 Caminhões Atlas Copco Wagner (MT 5.000) com capacidade de 50ton
02 Caminhões rebaixados Getman de apoio para carregamento de fogos – 1 para emulsão bombeável
01 Motoniveladora
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O ENCHIMENTO DOS REALCES – BACKFILL
A experiência de lavra anterior usando o método de lavra sublevel stoping e realces mantidos abertos apresentou
problemas de estabilidade posterior à lavra dos realces que tornaria impossível a continuidade dessa prática no
aprofundamento da mina. Os valores de recuperação da reserva geológica também inviabilizavam o projeto de
aprofundamento, com apenas mais quatro anos de lavra. Assim como uma maneira técnica e econômica de viabilizar o
projeto de aprofundamento da mina, é que foram estudados métodos de enchimento das escavações e mudança do
método de lavra. Como método de enchimento foram comparados o enchimento hidráulico (hidraulic fill), enchimento
com rocha (rockfill) e enchimento com pasta (pastefill), sendo que este último foi o implantado.
O enchimento hidráulico tem o inconveniente de se ter obrigatoriamente uma boa drenagem dentro do realce
durante o enchimento e ainda ter que bombear de volta a água captada na parte inferior do mesmo. Além disso é mais
indicado nos métodos de corte e enchimento, onde serve como piso para o próximo corte, mas não têm exposição das
paredes do enchimento.
O enchimento com rocha teria um custo de investimento menor que com pasta, mas o custo operacional seria
cerca de 50% maior, o que não recomendou sua adoção após análise do fluxo de caixa. Outras desvantagens seriam a
necessidade do aumento da frota de caminhões circulando na mina para transporte do enchimento, o que demandaria
um incremento na necessidade de ventilação e um maior trânsito de equipamentos, interferindo na produtividade dos
equipamentos de produção.
Desse modo ficou decidido pela construção de uma planta para produção de pasta, aproveitando os rejeitos
espessados da flotação. Essa pasta tem 78% de sólido, 3 a 4% de cimento a depender da altura do realce, e produz cerca
de 210 t/h. Toda a produção de rejeito da usina de tratamento de minérios é direcionada de volta para a mina
subterrânea sob a forma de enchimento; o material é enviado para a barragem de emergência apenas quando não há
disponibilidade pontualmente para enchimento na mina subterrânea. Todo o transporte de pasta para o subsolo é feito de
forma gravitacional, através de uma rede de distribuição composta de furos desde a superfície até o subsolo, furos inter-
níveis no subsolo e de tubulações horizontais nas galerias. Uma câmara filma a queda da pasta no realce e manda o sinal
de vídeo para a sala do operador na superfície, bem como sinais de pressão ao longo da linha para um correto
monitoramento da operação de transferência da pasta. O valor da resistência à compressão obtida com 28 dias é de 0,55
MPa, que é suficiente para a exposição de uma parede de 1.800 m2 (60m de altura X 30m de comprimento).
Este método de enchimento é relativamente recente no mundo e pioneiramente implantado em minas brasileiras
pela Mineração Caraíba. Ele tem as seguintes principais vantagens:
• Baixo custo operacional;
• Diminuição da deposição de rejeitos na superfície com redução da necessidade de recuperação ambiental;
• Maior recuperação de água no processo, especialmente importante para áreas com dificuldades ou alto
custo para abastecimento, como é o caso da mina Caraíba;
• Maior recuperação da reserva lavrável (lavra de pilares secundários e terciários);
• Maior estabilidade regional para o maciço rochoso;
• Alta disponibilidade para operação, sem interferência com a produção;
• Completo enchimento dos realces proporcionando perfeita adequação ao método de lavra;
• Possibilidade de uso alternativo, como enchimento para recuperação de galerias com problemas de
estabilidade – (técnica desenvolvida na mina Caraíba).

MONITORAMENTO DE ESCAVAÇÕES
Sistema Micro-Sísmico
O principal objetivo do monitoramento é fornecer informação contínua sobre a sismicidade para o pessoal
técnico responsável por obras de engenharia que pode, a partir de então, tomar decisões para garantir a segurança dos
equipamentos e do pessoal nas obras.
Um sistema de monitoramento sísmico não tem a pretensão de prever eventos sísmicos, mas sim de ajudar no
gerenciamento de decisões em ambientes onde a sismicidade induzida pela lavra passa a ser um condicionante para
manutenção dos níveis de produção e segurança (previsibilidade e não previsão). Assim o que se pretende é entender
melhor as respostas do maciço ao avanço da lavra, verificando as áreas com atividade sísmica mais intensa e ajudando
na tomada de decisões e gerenciamento da produção, estabelecendo protocolos de abandono e retorno à áreas afetadas.
Um sistema de monitoramento micro-sísmico foi instalado na mina Caraíba desde junho de 2002 e foi o primeiro
do gênero em operação no Brasil. Este sistema é composto de 14 sensores sísmicos (geofones uniaxiais e triaxiais)
instalados no subsolo. Esses geofones captam todas as perturbações no maciço, sísmicas e não sísmicas, e enviam os
registros para um computador na superfície, 24 h/dia. Diariamente um técnico processa os eventos registrados, visualiza
(figura 09) e identifica os eventos sísmicos (figura 10), quantificando uma série de variáveis como localização,
magnitude, energia associada, etc.
Características do Sistema:
• Monitoramento integrado sísmico e geotécnico;
• Processamento, interpretação e visualização on line de dados sísmicos;
• Sistema de alarme, incluindo controles;
• Ampla faixa de cobertura em amplitude, freqüência e duração para aquisição de dados sísmicos;
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• Sistema flexível de comunicação de dados;
• Sistema modular de fácil expansão e reconfiguração.

Principais Benefícios do Sistema:


• A identificação das áreas com maior sismicidade;
• O maior conhecimento da inter-relação da atividade sísmica com o avanço da lavra dos realces e painéis;
• O estabelecimento de uma inspeção sistemática das escavações em função da atividade sísmica;
• Mudança / revisão nos padrões de contenção aplicados nas galerias em função da sismicidade.
• Auxiliar na decisão de interdição de áreas com sismicidade ativa e no retorno às áreas interditadas.

Figura 09 – Exemplos de sismogramas de eventos sísmicos

Figura 10 – Exemplo de visualização de eventos sísmicos em planta num determinado nível da mina subterrânea

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Sistema de Levantamento Tridimensional de Escavações
Uma instrumentação em uso corrente na mina é o CMS (Cavity Monitoring System), um medidor de cavidades a
laser que determina os contornos das escavações em três dimensões. O CMS consiste de uma unidade laser integrada a
uma cabeça de varredura motorizada. Esta cabeça pode ser introduzida em uma cavidade subterrânea inacessível,
coletando mais de 53.000 pontos em varreduras usando incrementos de 1º. Estes pontos produzem uma malha em 3
dimensões, que pode ser processada pelos programas lasrd e QVOL, e usada em um programa CAD. Com o QVOL
pode-se modelar, visualizar, secionar e calcular distâncias, áreas e volumes.
Para a lavra de realces com recuperação total de pilares é imprescindível o monitoramento dos contornos das
escavações (realces) após a sua completa extração. O layout adotado na mina Caraíba é de dois realces separados por
um pilar (realce secundário). O pilar é perfurado e desmontado após o enchimento e cura do pastefill dos dois realces
adjacentes. Se não houver uma precisa determinação do overbreak dos realces, corre-se o risco de perfurar e desmontar
a parede de pasta (figura 11), causando diluição do minério e acarretando sérios problemas nas etapas consecutivas de
transporte, britagem e tratamento.

Realces já
lavrados e
Pilar entre
cheios com
dois realces já
pastefill.
lavrados.

Figura 11 - Perfuração otimizada de realce secundário (pilar).


Ilustrações CMS: material promocional OPTECH.

Outra aplicação importante é a necessidade de determinação dos contornos das escavações para a contínua
otimização dos planos de fogo pela determinação de over e underbreaks. Isso permite melhorar a recuperação da
reserva e reduzir as possibilidades de diluição durante a lavra. Pode-se também determinar o volume remanescente de
minério ou o nível do enchimento de pasta nos realces para auxílio ao planejamento, bem como acompanhar
progressivamente a estabilidade das escavações.

ESTRUTURAS DE APOIO NA MINA


A mina subterrânea Caraíba conta com algumas áreas básicas de apoio às atividades de produção no subsolo,
com características que mais se aproximam de estruturas civis, devido ao caráter definitivo de sua utilização, tais como
oficina mecânica, câmara de britagem, escritórios para supervisão, subestações elétricas, poço de produção,
reservatórios para água industrial e para água a ser bombeada, etc.
A câmara de britagem tem dimensões de 15m de largura por 13m de altura e 20m de comprimento e abriga dois
britadores de mandíbula 120 X 90, com os respectivos alimentadores de sapatas e correias de escoamento do minério,
cada um com taxa horária de produção de 450 t/h. A oficina de apoio à manutenção de equipamentos tem uma área
escavada total de 266m de galerias com seções que variam de 30 m2 até 85 m2 num total de 4 boxes, almoxarifado, área
para afiação de bits, abastecimento e lubrificação de equipamentos e escritórios para a supervisão. O poço vertical
(shaft) tem 650m de extensão, seção circular com 6m de diâmetro, e comporta 2 skips de produção com 15t de
capacidade cada, uma gaiola de pessoal com 2 decks e capacidade de transporte para 100 pessoas por viagem, escadas
para acesso de emergência, cabos elétricos e tubulações de água e ar comprimido.
A mina conta ainda com uma rampa de acesso para homens e equipamentos com 4.700m de extensão e
inclinação variando de 15 a 20%, desde a superfície até a cota mais baixa na mina, estações de bombeamento para o
desaguamento para a superfície e alimentação de água nova e eletricidade. A ventilação principal é feita por exaustão
forçada a partir de 3 poços na superfície e a entrada de ar novo é via shaft e rampa.

CONCLUSÕES
A mina Caraíba é lavrada sob condições severas em relação à estabilidade das escavações e a taxas de extração
elevadas, considerando sua distribuição geométrica do corpo mineralizado muito confinada. Ela já acumulou, desde a
sua abertura até Outubro de 2003, uma metragem total de cerca de 51.000m de galerias escavadas e mais cerca de
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9.000m de outras escavações como rampas, poços para ventilação e serviço, além de mais de 15 milhões de toneladas
de minério produzidas. Podemos considerar uma lavra bem sucedida e com fortes traços de modernidade e inovações
tecnológicas introduzidas no país. A dinâmica com que as condições de estabilidade do maciço têm evoluído e as
dificuldades que têm se apresentado para o desenvolvimento e a lavra, forçaram a mudanças e introdução de novos
processos e sistemas de trabalho.
Muitas técnicas e sistemas de trabalho aplicados na mineração subterrânea podem servir de referência para as
obras subterrâneas civis. Falta ainda uma maior interação entre esses dois ramos de atividades e um maior intercâmbio
de conhecimento e experiências entre os dois setores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] Germani, D. J.(2002) – A Mineração no Brasil – Relatório Final
[2] IAG (1999) Monitoração da Sismicidade Induzida em Caraíba. Relatório.
[3] Berrocal, J. et al. (1984) Sismicidade do Brasil. IAG-USO/CNEN, São Paulo.
[4] IPT (1984) – Determinação de Tensões no Maciço Rochoso da Mineração Subterrânea da Mina Caraíba –
Jaguarari/Ba – Rel 19.763. Relatório Interno.
[5] IPT (1990) – Tensões in situ na Mina Subterrânea da Caraíba – Rel 28.170. Relatório Interno.
[6] Golder Associates (1999) – Recomendações de Engenharia com Base em Modelamento Numérico para a Lavra
Subterrânea na Mina Caraíba – Nov 1999. Relatório Interno.

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