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Resumo - A mineração subterrânea no Brasil, muito embora não tenha a tradição e a experiência acumulada de outros
países, ditos benchmarket, já desenvolveu uma capacitação e uma maturidade, conduzida pelas empresas do ramo,
sejam elas empresas de mineração, de consultoria ou de prestação de serviços. Isto foi proporcionado pela introdução de
novas tecnologias, equipamentos e métodos, tanto desenvolvidos ou adaptados pelos nossos técnicos, tanto pela
aquisição de know-how via consultoria internacional. Essa capacitação na lavra de minas subterrâneas, pode
perfeitamente ser utilizada na construção ou escavação de obras civis subterrâneas, pela similaridade da aplicação. Este
trabalho mostra a experiência da operação da mina subterrânea da Mineração Caraíba S.A. que opera a única mina de
cobre subterrânea atualmente em lavra no Brasil, com escavações de grandes dimensões, lavra mecanizada e aplicação
de tecnologia de ponta. Serão apresentados dados gerais sobre o histórico e layout da mina, métodos de escavação e
suporte e de monitoramento da estabilidade das escavações.
Palavras – Chave - Lavra Subterrânea, Escavações de Grande Porte, Mineração Caraíba S.A.
INTRODUÇÃO
A mineração e as escavações subterrâneas no mundo remontam de uma era muito antiga, a princípio de forma
rudimentar e com o emprego de mão de obra extensiva. A crescente demanda mineral, seja para uso como material de
construção, seja para transformação de metais, impulsionaram a extração de minerais e o desenvolvimento crescente de
métodos e equipamentos. A princípio toda a extração era feita basicamente na superfície, mas com o passar do tempo
foram surgindo as primeiras lavras subterrâneas.
No Brasil a história da mineração subterrânea [1] vem desde o tempo dos bandeirantes com a abertura de
galerias em encostas, perseguindo veios de ouro, escavações estas feitas de forma muito rudimentar com ponteiras e
marretas e uso de pólvora caseira, quando necessário. As dimensões eram sempre acanhadas, com pouca iluminação e
péssimas condições de higiene e segurança. Os poços verticais e inclinados, quando necessários eram abertos da mesma
forma e o minério içado em baldes de madeira por sarilhos manuais. O minério era carregado em pás e transportado em
carrinhos de mão, ou em carroças com tração animal quando para distâncias maiores. A mão de obra empregada era na
maioria das vezes escrava. A falta de conhecimento geológico dificultava sobremaneira o trabalho.
As primeiras lavras subterrâneas mais sofisticadas no Brasil foram as de ouro, com a abertura da mina da
Passagem, em Mariana, em 1819, pelo Barão de Echewege seguida de várias outras, com especial destaque para a mina
Velha da Saint John Del Rey Mining Co, em Nova Lima em 1834, que eram consideradas, à época, referência no
emprego de tecnologia, trazidos pelos seus engenheiros, capitães de mina e mineiros ingleses.
Já na década de 60, exemplos bem sucedidos foram as minas de Boquira na Bahia e Plumbum no Paraná, do
Grupo Penarroya, com a aplicação de técnicas francesas de lavra de veios estreitos por sub-níveis e posterior
enchimento. Ao mesmo tempo as minas de Camaquã no Rio Grande do Sul foram bem conduzidas com a cooperação
técnica de engenheiros japoneses da Mitsubishi.
A evolução da mineração subterrânea brasileira não parou mais e podemos citar os exemplos mais recentes, bem
sucedidos como a mina de calcário de Santa Helena, em Sorocaba, São Paulo, única lavra subterrânea de calcário no
país, que recebeu contribuição de tecnologia finlandesa, e que usava o método sub-level stoping, hoje paralisada; a mina
do grupo Ferbasa na Bahia, com uso de método de lavra subterrâneo de alta produtividade (sub-level caving) no final
dos anos 70, também com contribuição de engenheiros finlandeses; a mina de Taquari-Vassouras em Rosário de Catete,
Sergipe, com o método de câmeras e pilares e com o uso de mineradores contínuos, assistida no início dos anos 80 por
técnicos franceses; a mina Caraíba, em Jaguarari, Bahia, no início dos anos 80, com método de alta produtividade (sub-
leve stoping) com contribuição de técnicos americanos e posteriormente chilenos, bem como do novo projeto de
aprofundamento da mina, no final dos anos 90, com introdução de tecnologias pioneiras no país, com consultoria
canadense.
Outros inúmeros exemplos de projetos de minas subterrâneas bem sucedidas no país podem ser citados como: a
mina São Bento em Barões de Cocais, a mina de Cuiabá, a mina de Morro Agudo, em Paracatu, a mina de Vazante e
Fortaleza de Minas, todas em Minas Gerais, a mina Fazenda Brasileiro, em Teofilândia, Bahia, a mina Crixás em Goiás,
e ainda outras de carvão, principalmente em Santa Catarina, bem como um sem número de outras minas de menor
porte, mas não menos bem sucedidas como as anteriormente citadas.
1
Silvano de Souza Andrade – silvano@minacaraiba.com.br - Gerente de Operações da Mina Subterrânea - Mineração Caraíba S. A.
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NOVAS TECNOLOGIAS
A tecnologia de mineração subterrânea tem sido desenvolvida continuamente devido à necessidade de melhorar
as condições de higiene e segurança dos mineiros, as condições de estabilidade das escavações para assegurar a
completa extração das reservas, a produtividade das operações unitárias, o conhecimento geológico e geotécnico dos
maciços rochosos, bem como de enfrentar novos desafios com as minas cada vez mais profundas. Assim, os principais
avanços têm sido nas áreas descritas abaixo:
• Softwares os mais diversos possíveis para modelamento e simulação de várias operações mineiras, dentre
elas: avaliação geológica de reservas, estabilidade de escavações, contenções, planejamento de minas,
controle e manutenção de frotas de equipamentos, ventilação, acompanhamento topográfico,
monitoramento sísmico, treinamento de mineiros em operação de equipamentos, etc.
• Refrigeração do ar para ventilação.
• Comunicação de áudio e vídeo, bem como transmissão de dados remotamente.
• Operação remota de equipamentos, inclusive telecomandados da superfície (perfuratrizes, carregadeiras e
caminhões).
• Equipamentos de grande porte, alta produtividade e performance, e contínua mecanização, substituindo
quase todas as operações antes manuais, levando em conta os aspectos de segurança e ergonomia para os
operadores.
• Contenções com a introdução de novas técnicas de suporte como tirantes resinados e grauteados,
cablebolting e cablelacing, chumbadores de fricção tipo split-set e swelex, telas metálicas, concreto
projetado reforçado com fibras metálicas, polímeros especiais de revestimentos, etc.
• Enchimento de escavações (backfill).
• Desmonte de rochas, com a introdução de explosivos eficientes, seguros e mais baratos, bem como de
acessórios como os reforçadores, iniciadores não elétricos e os eletrônicos.
• Instrumentação de maciços com os medidores de tensão/deformação contínuos, medições de tensões in-
situ, monitoramento de eventos sísmicos, vibração de detonações, etc.
• Aparelhos topográficos de precisão, e de medições e escaneamento de cavidades a laser.
CONCEITUAÇÃO DE PROJETO
Um projeto de mineração subterrânea tem que levar em conta alguns parâmetros convergentes e outros diferentes
de um projeto de escavação subterrânea para fins civis. Algumas das principais diferenças são:
1) Em mineração todas as escavações são feitas com o objetivo básico de extrair o minério existente, que foi
disposto pela natureza, durante a gênese da jazida, com distribuição geográfica e de teores aleatórios. Assim um
completo conhecimento geológico do corpo mineralizado é indispensável para a concepção do projeto, levando em
consideração essa distribuição espacial e de teores a serem lavrados. Enquanto que num projeto civil a locação das
escavações tem outra origem, determinada por outros condicionantes.
2) O tempo que as escavações permanecerão abertas é distinto. Para mineração subterrânea o conceito de fator de
segurança é diferente e se trabalha levando em conta o tempo necessário de utilização das galerias ou escavações em geral.
Assim tem-se o conceito de escavações temporárias, para aberturas com duração de até 6 meses, escavações permanentes,
com duração até 2 anos, e escavações definitivas, com duração superior a 2 anos. A abordagem em relação ao tipo de
suporte varia de acordo com cada caso. Já na construção civil, as escavações são normalmente projetadas para uma longa
duração, com fatores de segurança mais elevados e abordagem de projeto dirigida para essa finalidade.
3) O projeto civil é concebido de uma forma estática em relação ao campo de tensões atuantes, ou seja, o campo
de tensões atuantes sobre as escavações considerado na época de projeto não vai mudar com o passar do tempo, além
das escavações se situarem normalmente a pequenas profundidades, ou sob coberturas não muito expressivas, o que faz
influir um menor campo de tensões. Já na mineração subterrânea, é muito difícil prever exatamente como vai variar o
campo de tensões atuante em volta das escavações até o final da mina, à medida que novas escavações vão sendo feitas;
pode-se dizer que é um processo dinâmico. Muito embora existam softwares de avaliação das condições de estabilidade
e variação dos campos de tensão em torno das escavações, que podem ser usados para fazer simulações do
comportamento futuro do campo de tensões, a prática mostra que isso não traduz com fidelidade as alterações
experimentadas no decorrer da vida da mina. Além disso as minas subterrâneas podem estar submetidas a um forte
estado de tensões em função da profundidade.
4) A duração da obra, que em escavações com finalidades civis, normalmente tem um tempo mais curto, e
geralmente pré-determinado, amarrado a um cronograma, enquanto que a duração de uma mina subterrânea é bem mais
longa, podendo se estender a várias décadas, e a sua duração está associada à reserva geológica, escala de produção e
fatores econômicos. Essa maior duração da obra mineira favorece a possibilidade de treinamento, capacitação e
desenvolvimento continuado da força de trabalho, exercendo uma influência sócio-econômica na equipe e na
circunvizinhança onde está instalada a mineração, enquanto que o caráter mais provisório da obra civil, favorece em
menor escala estes aspectos mencionados.
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MÉTODOS DE LAVRA SUBTERRÂNEOS
Uma importante distinção também em relação à mineração e escavações subterrâneas para fins civis diz respeito
ao tipo de escavação realizado. Em obras subterrâneas civis o formato da escavação é ditado pela utilização da mesma,
assim um túnel tem um comprimento definido pela extensão da montanha a ser atravessada e a seção ditada pelo porte e
fluxo do tráfego, sendo cada caso projetado a fim de atender a sua utilização proposta.
Já na mineração o formato e dimensões das escavações são definidos de forma diferente. A princípio podemos
distinguir três tipos de escavações. Todos eles levam em consideração as características geológicas e geotécnicas do
maciço rochoso, bem como no caso de obras civis, acrescenta-se entretanto os seguintes condicionantes:
a) desenvolvimento: são todas as escavações de acesso e preparação do corpo mineralizado para a lavra, como
rampas, planos inclinados, galerias e poços de acesso com elevadores para pessoal e/ou produção de minério/estéril e
ainda poços exclusivos de ventilação. O desenvolvimento é projetado de acordo com o layout ou traçado da mina,
profundidade dos trabalhos, tipo de equipamentos empregados, projeto de ventilação, entre outros;
b) áreas de apoio: como oficinas, câmaras de britagem, área para escritórios, depósitos, almoxarifados,
reservatório de água, sub-estações, etc. Estas se assemelham mais aos critérios de projeto de obras civis e obedecem
traçados ou dimensões apropriados para a sua finalidade específica.
c) escavações de produção ou realces: são os blocos individualizados de lavra, de onde uma certa quantidade
de massa e teor conhecidos é retirada. Estas escavações são definidas obedecendo a critérios de geometria (inclinação,
espessura, continuidade) e a características de resistência e estabilidade tanto do minério a ser escavado, como das
rochas encaixantes que circundam o mesmo. Elas são definidas em métodos de lavra e têm inúmeras variantes
adaptadas para cada caso. Os principais grupos de métodos de lavra são citados abaixo.
Não entraremos em detalhes na descrição e aplicação de cada um deles, e o objetivo de citá-los aqui é apenas de
mostrar que as escavações subterrâneas para mineração têm uma grande variedade de possibilidades, a depender dos
condicionantes citados acima. Além disso, esses métodos podem apresentar variantes quanto às dimensões dos realces e
painéis de lavra, além de pequenas adaptações introduzidas pelas minas a depender de particularidades específicas.
Uma vez verificada a viabilidade econômica do projeto, um detalhamento das etapas 2, 3 e 4 é requerido para dar
início à fase de implantação. O acompanhamento permanente dos parâmetros definidos na fase de projeto se faz
necessário, para adequar os ajustes cabíveis durante a fase de execução. Assim se inicia uma nova mina.
A MINA CARAÍBA
A Mineração Caraíba S.A. localizada no município de Jaguarari, nordeste do estado da Bahia, a cerca de 500 km
de salvador, lavrou uma mina a céu aberto entre 1979 e 1998, extraindo 51 milhões de ton de minério de cobre com
0,96% de Cu e 170 milhões de estéril, deixando uma cava com dimensões aproximadas de 1.300 m de comprimento,
700 m de largura e 300 m de profundidade. A mina subterrânea entrou em operação em 1986, lavrando o mesmo corpo
de minério, que se estendia em profundidade, com uma produção acumulada até outubro de 2003 de 15 milhões de ton
com um teor de 2,15% de Cu. O projeto concebido previa a exaustão conjunta da mina a céu aberto e da mina
subterrânea no segundo semestre de 1998.
A lavra da mina subterrânea foi feita, até 1998, através do método sublevel stopping (lavra por sub-níveis), com
realces de grandes dimensões (90m X 35m X 60m), mantidos abertos após a lavra. Esta prática resultou em resultados
não satisfatórios de overbreak e diluição, bem como de estabilidade geral do maciço, culminando com problemas de
estabilidade pós lavra nos pilares estruturais entre a mina a céu aberto e a mina subterrânea e nos pilares horizontais
entre os dois painéis de lavra no subsolo.
A partir de 1995 foi decidido implementar um programa de pesquisa geológica para aprofundamento da mina
subterrânea. Em 1996 iniciou um estudo de viabilidade técnico econômico do aprofundamento da mina, todo
desenvolvido pelo pessoal próprio da Caraíba. O projeto foi auditado por uma empresa canadense para verificar sua
consistência. Este projeto foi implementado em 1997, com o desenvolvimento da continuidade da rampa principal de
acesso até o final do corpo mineralizado, de forma a garantir a continuidade operacional da extração do minério de
cobre, sem interrupção nos resultados financeiros da empresa (figura 1).
A redução na escala de produção, anteriormente garantida pela operação conjunta das minas a céu aberto e
subterrânea, foi compensada com o aumento na produção da mina subterrânea de 80.000 para 100.000 t/mês, bem como
pelo aumento do teor médio de cobre, obtido na parte mais profunda da mina.
Figura 02: Galeria exibindo desplacamento típico decorrente do elevado estado de tensões na Mina Caraíba.
Estas elevadas tensões eram equivalentes a tensões encontradas em outras minas a cerca de 1.500 a 2.000 m de
profundidade. Além disso, a complexidade estrutural do maciço, aliada a extensas zonas cisalhadas, bordejando o corpo
mineralizado, desde a superfície e com continuidade em profundidade, completam o quadro de condicionantes
geomecânicos (Figura 03).
Visando manter a estabilidade regional do maciço, aumentar a recuperação da reserva, proporcionar alta
mecanização e segurança e garantir a previsibilidade dos resultados, foram feitas várias modificações em relação aos
métodos usados na lavra anteriormente, podendo citar algumas abaixo, todas elas pioneiras no Brasil:
• Mudança do método de lavra para VRM – Vertical Retreat Mining ou lavra em recuo vertical. Este
método exige a utilização de perfuratrizes ITH – In the hole – para garantir perfuração de grandes diâmetros (6
½ “) e comprimento (até 60m), com acurácia otimizada.
• Introdução de backfill – foi utilizado o sistema Pastefill, onde o enchimento dos realces já lavrados é feito
por uma pasta composta de rejeito da usina e cimento, sem necessidade de desaguamento posterior e mantendo
uma resistência suficiente para a lavra dos pilares entre dois realces já lavrados e enchidos, expondo paredes
auto-sustentáveis com dimensões médias de 30m de comprimento e 60m de altura.
• Utilização de monitoramento topográfico a laser em realces já lavrados para otimização dos projetos dos
pilares adjacentes. Isto é feito utilizando um aparelho de escaneamento automático a laser nas escavações
gerando o volume escavado em 3D com importação dos dados para outros softwares de manipulação como
Topograph e Autocad.
• Equipamentos de produção telecomandados e de grande porte, bem como outros equipamentos para
batimento de choco, instalação mecanizada de tirantes e concreto projetado.
• Instalação de instrumentação para monitoramento micro sísmico do maciço rochoso.
Entre julho e outubro de 1998 ocorreram dois eventos, registrados em estações sismográficas localizadas a
200km de distância, nas usinas hidrelétricas de Itaparica e Xingó (CHESF), com magnitude de 3.1 e 2.5,
respectivamente [2]. O sismo de julho chegou a ser captado pela estação de Brasília, a 1087km de distância. Outros
eventos de escala mais regional detectados pelas estações Itaparica e Xingó foram nos dias 28 de março de 1999
(magnitude 2.8) e 25 de outubro de 1999 (2.2).
Pode-se afirmar que estes eventos foram induzidos pela atividade de lavra, devido ao fato da região em que se
encontra a mina, ser uma de menor atividade sísmica no Brasil. A única referência de sismos naturais na região foi um
tremor de magnitude 4.8 em 1905, a 70km de distância [3].
O pessoal envolvido no trabalho direto na mina subterrânea aceita um nível determinado de ruídos e vibrações,
podendo em certos casos abandonar a frente de trabalho ou retardar a entrada para dar continuidade a um novo ciclo de
atividades. A operação da mina pode ser então afetada, mesmo que temporariamente, em situações onde não ocorram
danos físicos (rockbursts). Um evento significativo não precisa ser então necessariamente um grande evento, mas sim
um que interrompa a rotina da mina.
GEOLOGIA DA MINA
A geologia da Mina Caraíba é constituída por um conjunto de rochas máficas-utramáficas diferenciadas,
intrudidas, supostamente sob a forma de um sill sintectônico à fase 1 de deformação, em um conjunto de rochas de
natureza supracrustal que vão de gnaisse bandados, até a presença de calcosilicatadas, mármores e rochas graníticas e
pegmatoides, conferindo ao corpo um aspecto de lentes irregulares.
O teor do minério é extremamente heterogêneo em sua distribuição espacial, não se verificando uma
continuidade lateral, longitudinal ou vertical nos diversos níveis. Mapas de isoteores mostram que houve concentração
de sulfetos de cobre nas charneiras das dobras da fase 2. Estas zonas ricas constituídas de corpos cilíndricos horizontais
(RODS), foram posteriormente verticalizados pela fase 3.
A necessidade de um alto grau de conhecimento dos fatores que controlam a complexa estrutura do corpo
Caraíba, fez com que houvesse a necessidade de implantação de um sistema mais especializado de modo a possibilitar
a melhor modelagem geológica e avaliação de reservas, sendo adquirido em 1995 o software Datamine com objetivo de
desenvolver e aprimorar técnicas de analise e tratamento dos dados, modelagem geológica e avaliação dos recursos
minerais, além do planejamento de lavra.
Foram modeladas inicialmente, as áreas já lavradas nos painéis I e II da mina, para aferição de parâmetros e
calibragem do modelo. Atualmente o modelo é atualizado apenas quando novas sondagens de detalhamento são
requeridas.
Após a criação tridimensional do corpo mineralizado e da individualização de volumes e teores através do
modelo de blocos, o planejamento projeta os realces, e estes depois de lavrados e o minério ter sido processado na
usina, compara-se o teor previsto pela geologia e efetivamente lavrado. A diferença percentual entre o teor previsto e
realizado é inferior a 1,5% mostrando a enorme eficiência desta estimativa.
Abaixo na figura 05 vemos o resultado do modelamento geológico pela apresentação de uma seção vertical
típica, mostrando a complexidade estrutural da mina Caraíba.
PLANEJAMENTO DE LAVRA
O planejamento de lavra é responsável por traduzir as metas de produção em planos executáveis pelas áreas
operacionais, acompanhar o seu cumprimento, assegurando o resultado previsto e antevendo possíveis dificuldades
futuras, propondo soluções antecipadas. Projeta todo o traçado da mina, o sequenciamento de desenvolvimento e lavra,
e elabora os planos de produção de curto (até 3 meses), médio (de 3 meses a 1 ano) e longo prazo (de 1 a 5 anos). Estão
sob sua responsabilidade as áreas de planejamento de lavra propriamente dito, a topografia que orienta e acompanha as
escavações e faz locações orientativas diversas na mina, a mecânica das rochas, responsável pela estabilidade geral das
escavações e a ventilação da mina, além de toda a área de projetos específicos para o desenvolvimento e lavra, como os
planos de perfuração e contenção.
É uma área altamente técnica, de grande responsabilidade e de muita importância numa mina subterrânea, que
precisa ter grande visão holística e de futuro e um enorme senso de coordenação de atividades múltiplas, além de uma
aguçada capacidade de visão tridimensional. Erros nesta área geralmente têm conseqüência desastrosa.
Na mina Caraíba o planejamento de lavra é suportado por modernas ferramentas de planejamento e controle das
escavações, como os softwares Datamine, de planejamento de lavra, AutoCad, para desenhos e projetos em geral,
TopoGraph, para controle e projetos topográficos, MS-Project, para sequenciamento de atividades múltiplas (de
sondagem, desenvolvimento, contenções, perfuração e lavra), V-Net para simulação e controle da ventilação da mina,
além de diversos outros softwares de análise da estabilidade das escavações. Tem ainda o sistema de monitoramento
micro-sísmico, com registro on-line, 24 horas por dia dos eventos sísmicos da mina, o CMS (Cavity Monitoring
System) que é um medidor de cavidades a laser, usado para gerar sólidos tridimensionais de cavidades abertas, além de
estações totais para controle topográfico de todas as atividades de perfuração e escavação na mina.
DESENVOLVIMENTO E CONTENÇÕES
Compreende a abertura das galerias, com perfuração horizontal e desmonte com explosivos, instalação de todas
as contenções, bem como todas as linhas de utilidades como água, ar comprimido, tubulação para backfill, ventilação
secundária, etc, entregando para a lavra os realces já prontos para a perfuração, com todos os requisitos atendidos em
relação a dimensões, contenções, ventilação e utilidades (ar comprimido e água).
Para garantir o nível de produção requerido (100.000 t/mês) é necessário o desenvolvimento médio de 200 m de
galerias por mês. As seções típicas das galerias são de 4,5 m X 4,0 m (18 m2) e 6,0 m X 4,8 m (29 m2). Esta metragem
mensal, aparentemente pequena, representa um volume de trabalho considerável por envolver um esforço significativo
referente às necessidades de suporte tais como: batimento de choco, atirantamento (2.500 un/mês), instalação de telas
metálicas (500 un/mês – 2,45m X 3,0 m cada), projeção de concreto (800 m3/mês) e injeção de cable bolting
(5.000m/mês).
A perfuração é feita com 3,65 m de comprimento para um rendimento de 92 a 93%. Os explosivos usados são o
ANFO escorvado com um cartucho de emulsão de 1 ½ X 8”. Os iniciadores são espoletas de retardo não elétricas. O
carregamento é feito com um caminhão plataforma e uma máquina de carregamento pneumática. A razão de carga
usada fica em torno de 3,0 Kg/m3.
Atualmente na mina Caraíba o atirantamento faz parte do ciclo de escavação de todas as galerias desenvolvidas;
ou seja, não é permitido perfurar um novo avanço sem que o anterior tenha sido atirantado, assim o atirantamento se
constitui o suporte mínimo necessário para o avanço das frentes. Em algumas frentes onde o estado de tensões é mais
acentuado, telas metálicas são instaladas nos tetos, próximas à face de desmonte, para garantir a segurança da equipe de
carregamento.
Depois de escavadas, as galerias passam por uma avaliação geotécnica e têm seu suporte definitivo determinado
usando-se um procedimento operacional já estabelecido. Esse suporte adicional pode ser apenas telas metálicas,
cccccccc
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concreto projetado reforçado com fibras de aço, ou concreto projetado sobre as telas metálicas. Cable Bolting é
adicionado nas galerias que serão futuros tetos de realces e nas principais galerias de acesso.
Ocasionalmente reabilitação de algumas áreas já contidas anteriormente se faz necessário devido ao fator tempo,
à mudança no estado de tensões, ao efeito cumulativo das vibrações de detonação e também à atividade sísmica.
Os tirantes são barras de aço com 2,4 m de comprimento, diâmetro de 7/8”, totalmente resinados e com malha de
1,20 X 1,50 m. As telas metálicas são com malha quadrada de 10 X 10 cm e fio de 6 mm de espessura com reforço de
solda em todas as interseções da malha. O concreto projetado tem normalmente de 5 a 8 cm de espessura e é aplicado
sobre a tela metálica ou com reforço de fibra de aço. A malha de cable bolting completa o sistema de suporte tanto nas
principais galerias de acesso como nos realces de produção; são instalados cabos de 7 fios com 15 mm de diâmetro em
furos de 21/2” de diâmetro, malha que varia de 2,0 X 2,0m a 2,5 X 2,5 m e média de comprimento de 6,5m.
Além da abertura de galerias em rocha a mina Caraíba também desenvolve galerias dentro da pasta de
enchimento dos reaces (pastefill), com um sistema próprio de escavação e suporte, técnica essa pioneira no Brasil. Este
desenvolvimento é necessário para a lavra dos realces terciários, localizados no sill-pillar entre dois painéis adjacentes.
Também em função das dificuldades da abertura de galerias em relação à sismicidade induzida pela lavra que foi
introduzido na Mineração Caraíba em 2001, a técnica de destress blasting, em aberturas de galerias que apresentavam
alto nível de tensão horizontal provocando acentuada perturbação sísmica após cada detonação, como uma forma de
manter o ritmo de escavação dentro do programado e reverter os atrasos no cronograma de execução originados por tais
eventos sísmicos considerando os aspectos de segurança de pessoal. Esta técnica também foi introduzida pioneiramente
no Brasil pela mina Caraíba.
LAVRA
Compreende a perfuração primária, desmonte do minério, carregamento e transporte até o ore-pass que alimenta
o britador primário. No ore-pass há uma grelha para limitar o tamanho dos blocos que alimentarão a britagem. Os
blocos maiores que a abertura da grelha têm o tamanho reduzido com a utilização de um rompedor hidráulico.
A perfuração primária é feita tanto descendente com a utilização de perfuratrizes ITH (in the hole) com
diâmetros de 6 ½” e 4 ½”, com furos que variam de 35 a 55m de comprimento, tanto ascendente usando-se uma
perfuratriz tipo fandrill com diâmetro de 3 ½”, para furos de até 25m de comprimento. O desmonte de rochas utiliza
explosivo granulado tipo ANFO para os furos descendentes de leques, e emulsão encartuchada na abertura da chaminé
de face livre. Nos furos ascendentes ou aqueles descendentes com umidade ou água usá-se emulsão bombeada. Os
iniciadores são do tipo não elétricos.
A mina Caraíba testou o método VRC (Vertical Creater Retreat) durante a fase de estudo de viabilidade
técnico-econômico de aprofundamento da mina, mas optou pelo método VRM (Vertical Retreat Mining) como método
principal de lavra por causa de vantagens em relação à produtividade. Este método é uma variante do VCR, onde se usa
uma chaminé de face livre como apoio ao início do desmonte e a combinação de faces livres verticais e horizontais no
desmonte.
A dimensão dos realces é de 15m de largura por cerca de 30m de comprimento máximo e altura variada de
acordo com a altura do painel em lavra, podendo variar de 25, 35, 40, 55 ou 60m. A seqüência de lavra estabelece a
extração inicialmente dos realces primários, seu enchimento (backfill) logo após a extração, e então a lavra dos realces
secundários (ou pilares) adjacentes aos mesmos (figura 06). Estes também são enchidos, mas sem o uso de cimento,
podendo ser usados como bota-fora do estéril do desenvolvimento. Um terceiro sequenciamento de lavra é feito com a
extração dos realces primários e secundários no pilar estrutural deixado entre os dois painéis iniciais de lavra (sill
pillar). Para isso é necessário a reabertura de galerias dentro dos realces já enchido com o pastefill. Esta seqüência de
lavra e enchimento com a extração de todos os pilares de sustentação permite uma alta recuperação da reserva e uma
atividade com diluição minimizada.
Realce secundário, ou
pilar, já lavrado,
aguardando
enchimento com
pasta.
overcut
overcut overcut
slot
undercut slot
undercut
undercut
Bottom Bottom
sill sill Bottom
sill
19 16 13 11
10
12
18 15 9
7
6
5
8 4
14
17 3
2
1
Algumas variantes são possíveis, e às vezes necessárias, por motivos de segurança, quando da lavra de realces
sobre outros realces já lavradas, com condições insatisfatórias de estabilidade do teto para perfuração ascendente,
fazendo-se toda a perfuração descendente a partir do topsill.
Destacam-se dentre as principais vantagens do método: sensível diminuição no custo de desenvolvimento,
conseqüentemente, maior tonelagem por metro desenvolvido; obtenção de ótima fragmentação do material desmontado;
permite alta mecanização, obtendo-se alta produtividade; baixa diluição (< 5%) e boas condições de segurança.
Dentre as ressalvas, destacam-se: exposição da LHD a desplacamentos do teto e/ou das laterais do realce quando
da extração via controle remoto; apenas um ponto de extração acarretando na necessidade de vários realces em lavra
simultaneamente; diminuição da acuidade da perfuração para furos longos (maiores que 35 m).
MONITORAMENTO DE ESCAVAÇÕES
Sistema Micro-Sísmico
O principal objetivo do monitoramento é fornecer informação contínua sobre a sismicidade para o pessoal
técnico responsável por obras de engenharia que pode, a partir de então, tomar decisões para garantir a segurança dos
equipamentos e do pessoal nas obras.
Um sistema de monitoramento sísmico não tem a pretensão de prever eventos sísmicos, mas sim de ajudar no
gerenciamento de decisões em ambientes onde a sismicidade induzida pela lavra passa a ser um condicionante para
manutenção dos níveis de produção e segurança (previsibilidade e não previsão). Assim o que se pretende é entender
melhor as respostas do maciço ao avanço da lavra, verificando as áreas com atividade sísmica mais intensa e ajudando
na tomada de decisões e gerenciamento da produção, estabelecendo protocolos de abandono e retorno à áreas afetadas.
Um sistema de monitoramento micro-sísmico foi instalado na mina Caraíba desde junho de 2002 e foi o primeiro
do gênero em operação no Brasil. Este sistema é composto de 14 sensores sísmicos (geofones uniaxiais e triaxiais)
instalados no subsolo. Esses geofones captam todas as perturbações no maciço, sísmicas e não sísmicas, e enviam os
registros para um computador na superfície, 24 h/dia. Diariamente um técnico processa os eventos registrados, visualiza
(figura 09) e identifica os eventos sísmicos (figura 10), quantificando uma série de variáveis como localização,
magnitude, energia associada, etc.
Características do Sistema:
• Monitoramento integrado sísmico e geotécnico;
• Processamento, interpretação e visualização on line de dados sísmicos;
• Sistema de alarme, incluindo controles;
• Ampla faixa de cobertura em amplitude, freqüência e duração para aquisição de dados sísmicos;
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• Sistema flexível de comunicação de dados;
• Sistema modular de fácil expansão e reconfiguração.
Figura 10 – Exemplo de visualização de eventos sísmicos em planta num determinado nível da mina subterrânea
Realces já
lavrados e
Pilar entre
cheios com
dois realces já
pastefill.
lavrados.
Outra aplicação importante é a necessidade de determinação dos contornos das escavações para a contínua
otimização dos planos de fogo pela determinação de over e underbreaks. Isso permite melhorar a recuperação da
reserva e reduzir as possibilidades de diluição durante a lavra. Pode-se também determinar o volume remanescente de
minério ou o nível do enchimento de pasta nos realces para auxílio ao planejamento, bem como acompanhar
progressivamente a estabilidade das escavações.
CONCLUSÕES
A mina Caraíba é lavrada sob condições severas em relação à estabilidade das escavações e a taxas de extração
elevadas, considerando sua distribuição geométrica do corpo mineralizado muito confinada. Ela já acumulou, desde a
sua abertura até Outubro de 2003, uma metragem total de cerca de 51.000m de galerias escavadas e mais cerca de
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9.000m de outras escavações como rampas, poços para ventilação e serviço, além de mais de 15 milhões de toneladas
de minério produzidas. Podemos considerar uma lavra bem sucedida e com fortes traços de modernidade e inovações
tecnológicas introduzidas no país. A dinâmica com que as condições de estabilidade do maciço têm evoluído e as
dificuldades que têm se apresentado para o desenvolvimento e a lavra, forçaram a mudanças e introdução de novos
processos e sistemas de trabalho.
Muitas técnicas e sistemas de trabalho aplicados na mineração subterrânea podem servir de referência para as
obras subterrâneas civis. Falta ainda uma maior interação entre esses dois ramos de atividades e um maior intercâmbio
de conhecimento e experiências entre os dois setores.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] Germani, D. J.(2002) – A Mineração no Brasil – Relatório Final
[2] IAG (1999) Monitoração da Sismicidade Induzida em Caraíba. Relatório.
[3] Berrocal, J. et al. (1984) Sismicidade do Brasil. IAG-USO/CNEN, São Paulo.
[4] IPT (1984) – Determinação de Tensões no Maciço Rochoso da Mineração Subterrânea da Mina Caraíba –
Jaguarari/Ba – Rel 19.763. Relatório Interno.
[5] IPT (1990) – Tensões in situ na Mina Subterrânea da Caraíba – Rel 28.170. Relatório Interno.
[6] Golder Associates (1999) – Recomendações de Engenharia com Base em Modelamento Numérico para a Lavra
Subterrânea na Mina Caraíba – Nov 1999. Relatório Interno.