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ISSN: 2525-8761
DOI:10.34117/bjdv7n1-110
Adriany da Silva
Acadêmica de Farmácia - UFMT/CUA - Barra do Garças - MT
Instituição: Universidade Federal de Mato Grosso - CUA
Endereço: Rua Simeão Arraia, 1000 - Centro - Barra do Garças - MT
E-mail: adriany.silva12@hotmail.com
Claudemir Batalini
Doutor em Química Orgânica pela USP/FFCLRP - Ribeirão Preto - SP
Instituição: Universidade Federal de Mato Grosso - CUA
Endereço: Rod. MT 100, km 3,5 - Zona Rural, Pontal do Araguaia - MT
E-mail: pirapotimao@msn.com
RESUMO
A maioria dos fármacos encontrados atualmente na terapêutica moderna são de origem
sintética, levando os grupos de pesquisa a estarem constantemente à procura de novos
candidatos a fármacos. Sínteses e processos conduzidos com vistas a uma menor agressão
ao meio ambiente ganham espaço atualmente em meios acadêmicos e industriais,
alinhados aos princípios da “Química Verde”. Este trabalho foi realizado seguindo esse
propósito, em que as substâncias N-(L-fenilalaninil)-benzamida (P1) e N-(L-benzoato de
tirosinil)-benzamida (P2) foram preparadas através de reações de benzoilação dos
aminoácidos de partida L-fenilalanina e L-tirosina, pelo clássico método de Schotten-
Baumann, em meio aquoso e temperatura ambiente. Os produtos foram purificados por
recristalização e caracterizados por ponto de fusão, cromatografia em camada delgada
(CCD) e espectroscopias no ultravioleta-visível (UV-VÍS) e no infravermelho (IV).
Foram ainda investigadas as atividades antioxidante qualitativa com o radical
difenilpicrilhidrazil (DPPH) e de potencial tóxico frente à larvas de Artemia salina Leach.
Apenas P1 indicou significante atividade antioxidante. O teste de toxicidade dos produtos
revelou serem atóxicos, de acordo com os valores de concentração letal média (CL50)
obtidos. Apesar dos rendimentos baixos obtidos nas reações, as caracterizações sinalizam
para o sucesso das sínteses de P1 e P2, numa estratégia sintética econômica, rápida e de
baixo impacto ambiental.
1 INTRODUÇÃO
A procura por candidatos a fármacos que possuam atividades biológicas está
presente na humanidade desde os primórdios e geralmente envolvem etapas complexas
em seu planejamento e desenvolvimento molecular. Levantamentos na literatura creditam
que cerca de 85% dos fármacos disponíveis na terapêutica moderna são de origem
sintética (BARREIRO; FRAGA, 2008). O ramo da química medicinal se preocupa
principalmente em estudar as relações moleculares da ação dos fármacos, relacionando a
atividade biológica com a estrutura química, visando, sempre que possível, gerar
substâncias candidatas a novos fármacos que se revelem seguros quanto ao uso
(BARREIRO et al., 2002; ALCÁNTARA, 2017).
lcántara AR (2017) Biotransforma ons in Drug Synthesis: A Green and
Powerful Tool for Medicinal Chemistry. J Med Chem Drug Des 1(1)
A síntese orgânica é o processo de construção de moléculas orgânicas a partir de
precursores simples. As sínteses de compostos orgânicos são realizadas por muitas
razões, uma delas com o fim de descobrirem moléculas com caraterísticas estruturais que
aumente determinado efeito medicinal ou reduzam efeitos indesejáveis. Em outras
situações, as sínteses orgânicas podem ser necessárias para testar hipóteses sobre um
2 METODOLOGIA
2.1 MODIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS PELO MÉTODO SCHOTTEN-
BAUMANN
A estratégia de síntese deste trabalho baseou-se na clássica reação de Schotten-
Baumann, conduzida em meio aquoso básico e temperatura ambiente (SCHOTTEN,
1884; BAUMANN, 1886; MARVEL; LAIZER, 1941; SOARES; SOUZA; PIRES, 1988;
BALAJI; DALAL, 2018). Nessa reação, cloretos de ácido aromático podem combinar
com fenóis e aminas aromáticas para a produção de ésteres e amidas aromáticas. Na figura
1 encontra-se o esquema geral das duas sínteses:
Figura 1 - Esquema geral das sínteses dos aminoácidos modificados N-(L-fenilalaninil)-benzamida (P1) e
N-(L-benzoato de tirosinil)-benzamida (P2).
COOH
H N CH
CH2 O COOH
H CH + HCl
L-fenilalanina
N CH2
H
NaOH 10%, t. a.
P1
N-(L-fenilalaninil)-benzamida
O
C
Cl COOH O
H
cloreto de benzoíla H CH
N CH2 O COOH O
H L-tirosina CH O + HCl
N CH2
NaOH 10%, t. a. H
P2
N-(L-benzoato de tirosinil)-benzamida
Fonte: Os autores.
Para a execução de cada uma das duas reações, foram adicionados inicialmente
0,012 mols de cada aminoácido (L-fenilalanina e L-tirosina) em solução aquosa de NaOH
(hidróxido de sódio) a 10% e as reações foram mantidas em agitação à temperatura
ambiente por 30 minutos. Em seguida, adicionou-se lentamente 0,06 mols de cloreto de
benzoíla e o sistema foi mantido sob agitação em temperatura ambiente por 6 horas. Foi
realizada a correção do pH da reação, adicionando-se lentamente HCl (ácido clorídrico)
concentrado. Os cristais formados foram filtrados em funil de Büchner, lavados com água
destilada e secos em estufa à cerca de 50ºC (SOARES; SOUZA; PIRES, 1988).
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 MECANISMOS DE REAÇÃO DAS PREPARAÇÕES DOS AMINOÁCIDOS
MODIFICADOS P1 E P2
Nas figuras 2 e 3 estão representados os mecanismos de reação propostos para
elucidar as etapas previstas para as preparações dos produtos das sínteses P1 e P2. Em
um primeiro momento constata-se que os produtos de partida (L-fenilalanina e L-
tirosina) possuem o mesmo mecanismo de reação para o grupo amínico (NH2) (Figura
2). Porém, a L-tirosina possui um grupo a mais onde ocorre outro mecanismo de reação
(grupo fenólico - OH), apresentado na figura 3.
As etapas do mecanismo de reação são as mesmas tanto para a benzoilação do
grupo amínico quanto para o grupo fenólico. Na primeira etapa, o meio básico favorece
a desprotonação do fenol, gerando um ânion fenóxi. Seguindo mecanismo SN2
(substituição nucleofílica bimolecular), o ânion fenóxi é fortemente básico para atacar a
carbonila do cloreto de benzoíla, na segunda etapa, gerando um intermediário iônico com
carbono sp3 tetraédrico, cuja estabilidade é intermediária. A terceira e última etapa é o do
restabelecimento da carbonila, com retorno a um carbono de hibridização sp2
estabilizado, mediante a saída do grupo fortemente eletronegativo cloro, formando assim
o produto éster aromático e/ou uma amida aromática.
Figura 2 - Mecanismo de reação proposto para a benzoilação do grupo amínico (NH 2) presente nos
aminoácidos de partida L-fenilalanina e L-tirosina.
O
-
C
R N + OH t.a. R NH- Cl
+
H H (do NaOH 10%) (1a etapa) (ânion aminóxi) (2a etapa)
(amina; R=aromático)
(cloreto de benzoíla)
O-
O
C Cl C
N R N R
(3a etapa) H
H
Fonte: Os autores.
Figura 3 - Mecanismo de reação proposto para a benzoilação do grupo OH fenólico presente no aminoácido
de partida L-tirosina.
O
-
C
R O + OH t.a. R O- Cl
H
+
(do NaOH 10%) (1a etapa) (ânion fenóxi) (2a etapa)
(fenol; R=aromático)
(cloreto de benzoíla)
O-
O
C Cl C
O R O R
(3a etapa)
Fonte: Os autores.
(lit.) = literatura; (exp.) = experimental; (N/E) = não encontrado; ( máx.) = comprimento de onda máximo;
(nm) = nanômetros.
Fonte: Os autores.
diferença nesses valores pode estar relacionada com a perda de hidrogênio na estrutura
tanto do P1 e do P2 durante as sínteses, fazendo com que o ponto de fusão reduza
demasiadamente, fato este esperado e que ocorreu.
Em relação aos fatores de retenção (FR), usando CCD, tanto os aminoácidos de
partida quanto os produtos da síntese apresentaram uma única mancha em eluente
diclorometano metanol 10%; observa-se que os valores de FR dos produtos é maior que
dos aminoácidos e esses resultados eram os esperados pois P1 e P2, tendo sido
modificados a partir da benzoilação dos aminoácidos de partida, apresentam menores
polaridades e portanto, tem mais afinidade com o eluente, dando valores maiores de FR.
Com relação aos rendimentos obtidos, podem ser classificados como baixos,
possivelmente devido a perdas no processo de obtenção dos cristais no final da síntese e
ainda perdas durante a recristalização.
De acordo com Pavia e colaboradores (2015), o espectro de ultravioleta-visível
(UV-VÍS) é mais útil quando se tem uma ideia geral da estrutura da molécula, sendo
importante combinar esses dados com infravermelho e RMN; na ausência de
infravermelho e RMN os dados de UV-VÍS devem ser levados apenas como dica. Ao
analisarmos os espectros observamos que P1 e P2 apresentam comprimento de onda
máximo bem característico e esses dados não foram encontrados na literatura.
Na tabela 2 são expostos os dados de infravermelho obtidos dos dois produtos
sintetizados P1 e P2 e os espectros de infravermelho são exibidos nas figuras 4 e 5.
Fonte: os autores
Fonte: os autores.
Figura 6 - Estruturas químicas dos aminoácidos utilizados como materiais de partida e os dois produtos
obtidos.
O COOH
COOH
CH
H N CH N CH2
CH2
H
H
L-fenilalanina N-(L-fenilalaninil)-benzamida (P1)
O COOH O
COOH O
H
CH O
H CH N
N CH2 CH2
H H
Fonte: Os autores.
Tabela 4 - Valores de CL50 encontrados nas análises de toxicidade das substâncias sintetizadas N-(L-
fenilalaninil)-benzamida (P1) e N-(L-benzoato de tirosinil)-benzamida (P2).
Fonte: Os autores.
Figura 7 - Gráficos de CL50 obtidos para os produtos sintetizados; (A) N-(L-fenilalaninil)-benzamida (P1);
(B) N-(L-benzoato de tirosinil)-benzamida (P2).
(A) (B)
Fonte: os autores.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A modificação estrutural dos aminoácidos L-fenilalanina e L-tirosina seguindo a
estratégia clássica de Schotten-Baumann revelou-se simples, econômico e menos
agressivo ao meio ambiente, enquadrando-se em praticamente metade dos princípios da
“Química Verde”, com destaque para: Princípio 1 - Prevenção, pois evita a produção de
resíduos; Princípio 3 - Síntese de produtos menos perigosos; Princípio 4 - Desenho de
produtos seguros; Princípio 5 - Solventes e auxiliares mais seguros; Princípio 6 - Busca
pela eficiência de energia e Princípio 8 - Evita a formação de derivados (LENARDÃO et
al., 2003). Os rendimentos das sínteses não foram satisfatórios, sendo necessária a
otimização no processamento sintético. Quanto à caracterização dos produtos, os mesmos
apresentaram características de acordo com as estruturas planejadas, demostrando que as
sínteses ocorreram com êxito. Apenas o produto P1 apresentou atividade antioxidante e
tanto P1 como P2 demonstraram atoxicidade nos testes frente às larvas de Artemia salina,
o que os condicionam como substâncias modificadas de uso seguro.
AGRADECIMENTOS
À UFMT - Campus Universitário do Araguaia e aos membros pesquisadores do
LAPQUÍM - Laboratório de Pesquisas em Química de Produtos Naturais, UFMT/CUA.
REFERÊNCIAS
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Oxford University Press, 1998.
SINGH, M. M.; SZAFRAN, Z.; PIKE, R. M. Microscale chemistry and Green Chemistry:
complementary pedagogies. Journal of Chemical Education, v. 76, n. 12, p. 1684-1686,
1999.
SOLOMONS, G.; FRYHLE, C.; SNYDER, S. Organic chemistry. 11. ed. John Wiley
& Sons, 2014.
SORGELOOS, P.; Van Der WIELEN, C. R.; PERSOONE, G. The use of Artemia nauplii
for toxicity tests. A critical analysis. Ecotoxicology and Environmental Safety, v. 2, n.
3-4, p. 249-255, 1978.
SOUSA, C. M. M.; ROCHA e SILVA, H.; VIEIRA JR, G. M.; AYRES, M. C. C.;
COSTA, C. L. S.; ARAÚJO, D. S.; CAVALCANTE, L. C. D.; BARROS, E. D. S.;
ARAÚJO, P. B. M.; BRANDÃO, M. S.; CHAVES, M. H. Fenóis totais e atividade
antioxidante de cinco plantas medicinais. Química Nova, v. 30, n. 2, 351-355, 2007.