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EU SOU A FLOR QUE

POUSOU NA SUA
MOSCA
Este livro é dedicado à
toda pessoa LGBTQI+,
especialmente às
pessoas trans.

Assim proponho-me a
divulgar, além da poesia,
a força que todas nós
precisamos dispor toda
manhã para sairmos e
voltarmos vivas para
casa.

DEBAIXO DISSO TUDO O


QUE SOMOS É
DESEJADAS.

APRENDAM

ARTES

MARCIAIS

MENINAS!
EU SOU A FLOR QUE
POUSOU NA SUA
MOSCA
FLOR

2020
A

S E U

S O L

H O

S
Majestosa flor que brota

Glorificadas pétalas
Desejo é crescer

Brotar florescer

Por dentro da carne dos malditos


Sapatão 54

Sala 1

Terceiro andar
É preciso respeitar a ordem das coisas,
por exemplo, quando digo que sou
possessiva, quero dizer na verdade que
sou um amor.
Você pode não acreditar, mas meu
bem, Flor, não se case com estes
espinhos.
Pela manhã, café

Mentira

Se proponho me a ser sincera

Leite.
Todo bom romance começar se há sem
pé nem cabeça, mas lá estava ela,
sentada na cadeira de madeira feita
pelo avô em mil oitocentos e noventa e
dois. Ela está lendo um livro cuja capa
azul não me remete ao nome. Logo a
frente, bem de pé, molhando as
plantas.
Mas tão repentinamente quanto
tempestade de vento assim foi sua
história, bela, comovente, porem já
findou se.
Sou santa

Santa

De um homem só

Um homem só

Sento me ao seu lado

Qual

Para ver o mar


Ar

Para ver

O ar
Língua afiada que lamina as paredes
de casa com ferros nos dentes garras
nos pés paredes penduro no teto
rodopio pios de euforia a alegria só de
se ser é estar em plena sintonia com o
ventilador abstrato que quando pisco

ele para
FECHADO DAS 23 AS 02

Dizia a placa do restaurante da BR101

Geralmente se coloca o período em


que se está aberto não é mesmo dizia
ela

Rimos juntos naquele dia


Um romance poético

entre Luar e Jasmim

Eu perguntava se estava certo o bilhete


de passagem, pois íamos para

um cachorro

ocupando uma cadeira

que lindo
quando na verdade estávamos indo ou
tínhamos que ir

meu bem este lugar está errado

ela não sabia mais o que fazer

Seus espinhos já deixaram de ser


confortáveis assim que o carro ficou
parado no trânsito.

Ele sabia que era apenas uma pequena


crise
Se afastou

Ascendeu um cigarro assoviou e jogou.


Caiu entre seus dedos. Eles haviam
treinado bastante. Mesmo aborrecida
soltou um sorriso, sempre soltava um
sorriso por conseguir.
Ele perguntou se os espinhos estavam
sóbrios

Ela disse sim

Ela disse sim

Sim
Então foi apenas procurar uma aliança
na loja do bairro vizinho e pronto. A
data era para ser dezoito de maio e
assim foi durante os quatro primeiros
meses que antecedem a data. Que
belíssimo romance esse que merda de
romance as avessas Jasmim coitado via
se em pleno estado de plenitude.
Ela era linda sempre foi. Eles tinham
um fusca azul celeste ela dirigia

Sempre

Amanheci
Adormecida em meios os escombros

Olhei para o lado ali estava ele

Dormindo

Parecia uma bela princesa presa no


castelo
Todas as vezes ele corre pra mim

Todas as vezes ele me busca consolo

Quando acordo pela manhã olho para


o lado e minha visão se completa

Lindo adormecido

Me dê um beijo

Ou jogue suas tranças


Ao acordar estarei aqui

Plena

Com belíssimas flores que nasceram


durante a noite
São responsáveis pelo fim das guerras

Elas dizem com discernimento

Que quem comanda é lixo

Que quem comanda é lixo

Que quem comanda apenas acha


Um ato de egoísmo é capaz de fuder
toda uma nação

Nação que se auto destrói

Falta o cérebro
Toda forma de amar importa

Toda forma de amar importa

Toda forma de amar importa

Toda forma de amor importa

Toda forma de amor importa

Qualquer forma de amor é amor

Qualquer amor
As vezes eu só queria acordar

E tomar um leite

Na mamadeira

DELE
LUAR!

Gritou desesperado

Não sabia o que fazer com tanto


sentimento.
Casaram, tiveram um filho, foram
morar numa casinha pacata com dois
cachorros e uma muda de bananeira

Queriam filhos

Sempre quiseram, mas as coisas


andavam meio tortas para eles.

Solar seu nome.

Ao completar um ano já lia, escrevia e


xingava

Acordava primeiro
Ligava o gato, os cachorros e a casa

Fazia café na sua mini cafeteira de


brinquedo

Um fofo
TRA
VES
TI
Joga na cara
Fala na cara
Ejacule-se de si
As dores são incomodas

As dores de ter que te abraçar com


esses espinhos

Mas o que fazer se eu te amo

Mas o que fazer se esses seus espinhos


não o deixam me abraçar
Sou uma mulher de pau

Sustento minha cu ceta no glamour

Amarula na garganta

Coragem lá no pé

Você me olha por que?

O que quer?

Sou sim essa mulher!


Que bate no peito

Agora de vagar porque dói

Grito

Vindo lá de dentro

Vá olhar!
Essa criança encapetada

Super dotada de esperteza

Tem um motor no cu?


Essa pétala do demônio que me acorda
as três da manha

Quer leite

Quer leite

Bebê

Ou você ou eu!
Transexualidade não tem idade

É sua verdade

Que precisa fluir

A sua coragem precisa existir

Para que sua felicidade possa nascer

Do sol
Daqui de casa consigo ouvir os tiros

Todos os dias na hora do almoço

Eles entram e tudo muda

Ninguém sai

Ninguém sai

NINGUEM SAAI!!!
CORRE
VIADO
CORRE
ATÉ PARECE!

Sou gostosa meu amor

Sou linda até do avesso

Tu achas mesmo que vou correr atrás


de tu?

Acorda bebê

Você que se esforce!

Beijo!
Luar e Jasmim e pequeno Solar saíram
de férias, em julho, quando todo
mundo está de férias. Foram para o
interior, queriam que Solar esfregasse
o rosto na lama. Jasmim, contra,
insistia para voltarem que era uma
péssima ideia, pois Solar ia ficar
doente. Já Luar não ouvia, continuava
dirigindo seu fusca azul celeste a todo
vapor. Ela gostava de funk dos anos
90, ele rock clássico. Solar, em seus
plenos dois anos, construiu uma
playlist que agradasse a todos.

Gui ado pê los cor pô nu


Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxoxxxxxxprsidentexxxxxxxxd
oxxxxxxxxxquexxxxxxxachaxxxxquexxx
xéxxxxxxxxxxxxxcoitadoxxxxxxxxxxxxxx
xxxxcaiaxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxf
alsoxxxxxxxxxxxxxxxxxxxmentiraxxxxxx
xxxxxxxxxmáfiaxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxx
Alguém diga à Marina que posso dar
mais do que solidão com vista para o
mar

Pois além disso tudo também sei voar

Pelas horas intermináveis do tempo


Apenas lamento

Que em meio minhas pernas

Exista algo que além de tudo

Fura

Causa furor
Não chega nunca – perguntava Solar

Já estamos chegando – respondia Luar

Duas horas e meia haviam se passado.


Justo Solar estar casadx

Está vendo, Solar, aquele morro?

Uhun

É depois
Luar adorava sacanear com as
percepções de Solar; Dizia ela que
deixaria ele experto para a vida.
Tem sentimento que a gente não
controla

Tem sentimento que a gente não


controla

Tem sentimento que domina a gente

E depois vai embora


O restaurante todo de madeira na
beira da pista era quase impossível
não perceber. Pararam. Solar ao
banheiro. Luar comida. Jasmim foi
escolher a sobremesa.
VOCÊ SÓ ESTÁ VIVO AQUI HOJE

PORQUE UMA MULHER

PERMITIU QUE TU EXISTISSES



ESSAS ROUPAS QUE COBREM MEU CORPO
DIZEM AOS SEUS OLHOS QUE MEU CORPO
ESTÁ COBERTO ASSIM COMO O SEU E
QUALQUER ATITUDE ALEM DO PERMITIDO
POR MIM SERÁ TIDO COMO AMEAÇA À
MINHA PESSOA PORTANTO PASSIVEL DE
AUTODEFESA
LUAR ERA O DEMÔNIO EM PESSOA
MAS UM DEMÔNIO DE LUZ
A

DÚVIDA
PERMANECERÁ

TE POSSUINDO
Mas tão repentinamente quanto
tempestade de vento assim foi sua
história, bela, comovente, porem já
findou se.
O dia termina

E os sutiãs

Não existem mais !


FIM DESCULPE

POR SER TÃO REPENTINA E ALIMENTAR SUA DÚVIDA


Mas To bi continued...

ALGUM DIA.
A AUTORA

Olá meu nome é Flor, Flor Sturião Liparizi.


Sou escritora/poetisa/teatróloga, tatuadora,
artista visual plástica, psicóloga*, performer,
faço uns beats com umas letras
experimentais, sou cabelereira, depressiva
dislexa crônica, sou diretora teatral, bruxa,
toco um pouco de ukulele, teclado, bateria e
canto desafinadamente. Tenho um contato
instantâneo consciente com meu inconsciente
para tratar qualquer assunto criativo. Tirei
925 na redação do ENEM - Não vou citar a
outra parte. Sou uma ultra romântica perdida
no século 21. Taurina e aquariana louca
desvairada por consumir, possuir, gulosa
falante de boca cheia. Me considero uma
pessoa de fácil relacionamento, apesar de ser
obrigada a dar umas patadas de vez em
quando, mas somente para os que faltam
deselegância e bom senso. Não incomodo
ninguém, não questiono sua vida, as vezes
nem quero saber dela. Não estou falando de
egoísmo, não, mas, é simples.

Nasci. Semi morta aos seis meses e meio


resolvi pular pro mundo. Claro que minha
ansiedade me trouxe consequências: fiquei na
incubadora por um bom tempo. Fui pra casa,
voltei pro hospital, fui, voltei algumas vezes
até ter vida o suficiente em mim para me
colocar andante pra frente. Enfim me
restaurei. Em casa, na roça, fiquei e cresci,
ao lado dos meu avós paternos minha família
se instaurou e lá ficamos. Fui a neta mais
querida por um tempo, mimada era levada
nas costas do meu avô pela roça para irmos
fazer alguma coisa. Sempre fui muito apegada
a eles até ao ponto de morar lá um tempo.

Lembro que era, e ainda é, uma casa grande


com cinco quartos, duas salas, varanda e rio
passando do lado. Ali se reuniam todos os
oito filhos com seus respectivos filhos que
totalizavam uns vinte e poucos netos, todo
domingo, o grande almoço com frango caipira
e macarrão feito na hora na grande mesa da
cozinha. Me lembro que quando eu chegava
da escola deitava no chão da cozinha e ficava
olhando para o teto porque lá havia um
degrau. Cheguei a perguntar para minha avó
várias vezes o motivo daquele degrau, mas
ela não sabia responder.

Parei de chupar chupeta quando tentei descer


sozinha do carrinho de mão, porem eu era
muito pequena e cai de boca no chão me
impedindo, então, de usufruir da minha
deliciosa chupeta, então por decisão própria,
aos dois anos, creio, larguei esse vício.

Apanhei muito tadinha de mim, com vara de


goiaba, cinto, tamanco de madeira e varias
outras coisas imagináveis encontradas nos
matos. Fui criada no berço da ignorância com
muito amor envolvido. Minha adolescência foi
uma típica adolescência roceira rockeira
gótica. Desde cedo pintei minhas unhas,
pintei os cabelos, produzia minhas roupas
com entrelaços e tudo. Estudei parte do
ensino médio em uma escola federal, o que
me agregou muito conhecimento e
curiosidades satisfeitas.

Sempre fui muito muito tímida introspectiva,


ao ponto de ter que me levar a vários lugares
desde rezadeiras a padres loucos para que eu
conseguisse ficar sozinha em sala de aula,
tamanha dependência eu tinha. Sempre fui
calada com estranhos, não era e não sou de
puxar assuntos no interesse de amizade ou
qualquer coisa. Com meus amigos, porem,
sempre fui um livro aberto e louco. De tudo
fazíamos, cidade pequena sem muitas opções,
inventávamos.

Iniciei minha vida sexual cedo por sempre ter


certeza da minha sexualidade, não posso
dizer que nunca tive dúvida porque em um
dado período eu as tive, justamente aquele
período de tomada de consciência do quão
perigoso e errado e estranho é. Então toda
aquela naturalidade infantil que tu vinhas
tratando sua sexualidade, ela simplesmente
some e tu sentes que é a pior coisa que pode
existir. Começa a repulsão, a negação, a
autoafirmação de que não se passa de uma
mentira e logo logo vai passar. Mas todos nós
sabemos que não passa né bb??!!!
Hoje com todas as certezas que tenho, com a
idade e consciência que tenho posso dizer
que sim, sou uma mulher linda e forte, bem
criada, bem desenvolvida e educada. Tenho
algumas profissões no curricullum da vida ê.
Sou feliz e me basta. Sou uma mulher
transexual bem sucedida pessoalmente e com
pessoas que me amam. Eu nasci com um
órgão genital que intitularam masculino, mas
todo o meu ser sempre foi feminino. Meus
olhares, meus desejos, meus trejeitos, minha
forma de olhar a vida, meu ódio por homens
(kkk), enfim.
Hoje, depois de muito me estudar, de muito
lutar comigo mesma, depois de tirar metade
do meu sofrimento de dentro, consegui, estou
conseguindo me adequar fisicamente ao que
me sou interiormente. Por muito tempo da
minha vida podei todas minhas vontades para
agradar o próximo, alimentar seus orgulhos,
seus egos, afim de vê-los bem e para mim
estava bem, afinal meu amor é incondicional.
No entanto a psicologia muito bem me
ensinou muitas coisas sobre os desejos e
sentimentos escondidos do ser humano, uma
delas é que eles se transformam em uma bola
de neve de vez em quando na vida e sai
esbravejando seu arredor.
Cheguei num momento que não posso
continuar com esse altruísmo empático
benevolente, pois ele está e estava me
fazendo muito mal, então um dia levantei a
cabeça e disse para mim mesma: Ou você faz
alguma coisa e toma as rédeas da sua vida ou
você vai morrer aos 40 por depressão. E
adivinhem só quem se tornou a pessoa mais
importante da minha vida? Eu!

AQUI ESTOU EU MEU AMOR

Meu nome é FLOR, gosto de ficar olhando


‘morangos mofados’ e nem sempre estou
florindo!

Bjos!
*não tenho formação universitária ainda
como psicóloga . Apenas cursei os dez
períodos e larguei.

ESTE É UM TRABALHO
INDEPENDENTE, PORTANTO NÃO
CONTA COM O AUXILIO DE UMA
EDITORA.

Capa e contracapa: Nicole Crys & Flor


Flor Sturião Liparizi

20 20

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