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o destino os obriga a enfrentar seus medos e a lutar um pelo outro. Mas será
que eles terão coragem para se entregar ao que sentem ou o destino vai acabar
separando-os outra vez?
PRÓLOGO
“Por mais longa que seja a noite... a aurora chegará. “ — Provérbio Africano.
la!
maiores.
garotos.
incompatíveis. Mas esquece ele e vamos curtir — avisei e nós fomos ao bar
pegar mais bebidas.
Assim como o Matheus, o irmão dele, Alex, não estava na boate. Era
estranho, porque ele era o namorado da Karen e aqueles dois viviam
grudados. Onde a Karen estava o Alex estava também, e provavelmente os
dois estavam se pegando. Isso era certo.
Eu perdi a Karen.
Abri meus olhos, mas não tive vontade de levantar. Aquele seria o
meu primeiro dia de aula depois de tudo o que aconteceu.
decente para o meu ensino médio. Eu mal saíra de casa naquele verão. A
minha mãe e a minha avó compreenderam e respeitaram meu luto me dando
espaço e tempo. Elas não insistiram quando eu quis largar a terapia, mas me
persuadiram a voltar a comer um pouco e a pelo menos levantar da cama por
algumas horas por dia.
Respirei fundo e cocei meus olhos. Virando na cama, olhei para foto
que ficava na cabeceira. Nela, Karen e eu, ambas com doze anos, sorríamos
como se aquele fosse o melhor dia das nossas vidas.
Não sabia o que faria sem ela, era a minha irmã de alma, minha
melhor amiga. Esse era para ser o nosso ano, o último ano nessa cidade antes
de mochilarmos pelo mundo.
— Não é bem assim, Alana. Você sabe que só quero seu bem, minha
filha. Ver a minha garotinha nesse estado me dói tanto... — ela disse e eu vi
as lágrimas em seus olhos.
minha sala e fui até ela, levei minhas coisas até as últimas cadeiras da sala,
sentei e abaixei minha cabeça.
Ainda estava com sono, então fechei os olhos e tentei tirar um cochilo
antes da entrada da professora, mas a sensação de ser observada foi muito
incômoda. Levantei minha cabeça e vi alguns rostos conhecidos olhando para
mim.
Fingi não dar importância e peguei o meu diário, onde fiquei fazendo
alguns rabiscos até a professora começar a aula e todos focarem em outra
“Você é mais corajoso do que acredita, mais forte do que parece e mais esperto do que pensa. “ —
Christopher Robin (A.A Milne)
conversa. Como sabem, todo o colégio foi muito compreensiva com toda a
situação de vocês, respeitamos o luto, mas precisamos completar as notas do
histórico de vocês, então, até a metade do ano vocês farão matérias
complementares para organizarmos as notas do ano passado — ela disse e eu
tarde — Matheus disse se justificando, porém era fácil saber que ele só estava
tentando fugir das aulas extras. Os pensamentos dele deviam ser os mesmos
que os meus, e no momento eu só pensava que precisava arrumar uma
desculpa, também.
que vocês façam. Assim talvez as coisas voltem ao normal — ela disse e eu
me enfureci. Normal?
— As coisas nunca, nunca vão voltar ao normal. Ela não está mais
aqui — disse me levantando e saindo da sala, batendo a porta atrás de mim.
“Nenhum ato de bondade, por menor que seja, jamais será desperdiçado. “
— Esopo.
— A Alana voltou tão estranha, né? Quer dizer, ela já era estranha, o
que a deixava um pouco normal era a Karen, uma pena que ela se foi —
reconheci o falso lamento da Tiana. Ela era uma antipática.
com ele — disse partindo para cima dela e colocando o dedo em sua cara. Ela
se amedrontou, retraindo-se um pouco. — Tenha respeito pelos mortos, sua
ridícula! — Gritei pegando a minha mochila e saindo em direção à sala de
aula.
E eu sabia que ele era o único que me entendia, mas eu mal aguentava
olhar para ele. As lembranças que trazia com ele eram muito dolorosas.
— Exaustivo. Acho que nunca fui tão encarada em toda minha vida.
— Desculpe por não falar sobre as aulas. Achei melhor que a diretora
comunicasse isso a você. Eu e a Lúcia iremos dividir os custos com os
professores, já que essas aulas vão ser só para você e para o Matheus.
— Filha, eu sei que você não está feliz, mas é para o seu futuro. E
você ainda vai ter tempo para fazer as coisas que você gosta, como o jornal.
Eu sei o quanto você gosta de escrever e de estar com a equipe, você é tão
boa escritora...
perguntou:
subitamente preocupada.
— Vou tomar banho e desço para almoçar — avisei andando até meu
quarto. Comecei a me despir, mas antes de entrar no chuveiro o meu celular
apitou.
“ Se alguma vez se sentir perdido, deixe o coração ser sua bússola. “ — Emily
Levou uns três dias até as aulas extras começarem. Tanto eu quanto o
Matheus almoçávamos no colégio e, depois de comermos, íamos para uma
sala reservada onde tínhamos aulas com alguns dos nossos professores. Ficar
constantemente na presença dele me incomodava um pouco, mas eu tentava
me acostumar.
Tirei meus fones e encarei com mais atenção, agora sem nenhum
pudor. Em letras finas e garrafais, havia uma frase em inglês e uma data. Era
letra de uma música que se tornou uma das minhas favoritas depois daquele
dia: The Scientist, do Coldplay.
— Queria fazer uma, mas não consegui... foi difícil sair de casa
durante esses meses — revelei e ele se aproximou.
— Então é por isso que o seu cabelo está tão grande? — Ele
perguntou puxando a ponta do meu cabelo.
— Descobri há alguns dias que ela mantinha contato com vocês e...
— Fui interrompida pela porta, que se abriu para revelar o professor de
matemática. Matheus assentiu com a cabeça para mim e foi para o lugar dele.
tinha escolha a não ser prestar atenção. Matemática não era meu forte, mas o
professor era bastante paciente. Quando ele nos dispensou mais cedo, devido
às aulas extracurriculares que faríamos, eu senti que entendia mais do que
normalmente entenderia numa aula comum. Levantei-me e caminhei pelo
corredor com o Matheus, novamente silencioso ao meu lado. Chegamos à
saída para a quadra e eu continuei meu caminho para a sala do jornal, mas
quando não ouvi a porta se abrir, olhei para trás e vi Matheus encarando a
maçaneta.
— Parece que o passado quer rir da nossa cara, toda vez que olho para
o campo eu vejo o meu irmão correndo comigo — ele disse com melancolia.
— Toda vez que olho para o campo vejo seu irmão e a Karen se
pegando na arquibancada — disse com um pouco de humor. Ele soltou uma
risada seca.
los por aí quando não estou pensando muito. Ainda não consigo aceitar que
eles se foram — ele disse.
— Também não consigo. É tão injusto. Eles tinham a vida toda pela
frente. A minha mãe diz que tudo acontece por uma razão, que nada acontece
por acaso... mas eu ainda estou tentando achar uma razão nisso tudo — disse
e então ele segurou minha mão.
>> Minha flor, mesmo quando o dia parecer escuro, veja o sol nos
pequenos momentos.
almoçar e, depois de comer, fui ajudar minha avó com os bordados que ela
vendia.
Depois da separação dos meus pais, nós fomos morar com a vovó. A
minha mãe dizia que era por minha causa, que ela temia que eu ficasse muito
solitária, mas no fundo eu sabia que era mais por causa dela própria. Ela
ficara muito fragilizada depois de todo o processo e precisava de um carinho
de mãe. Por ser filha única, as duas sempre foram muito ligadas, então era
natural que minha mãe quisesse estar em casa.
assistente de um poderoso do marketing, mas mudou sua vida toda para ficar
comigo. Ela dizia que éramos uma família de mulheres fortes, mas
precisávamos do apoio uma da outra, e por isso ela não hesitou em largar
tudo para me ajudar a superar. E eu a amava ainda mais por isso.
— Está assim, pode entrar — disse dando espaço para eles entrarem e
tentei arrumar minha roupa desajeitadamente.
— Lúcia, que bom que você veio! Estava mesmo querendo sua
opinião!
Segui minha mãe e Dona Lúcia até a cozinha, onde as duas discutiam
sobre a paleta de cores do bolo que estava pronto e cheirava muito bem.
Peguei o suco e voltei para sala para entregá-lo à vovó. Ela estava fazendo
um monólogo sobre suas flores e como ela fazia para vê-las crescendo muito
bem, e Matheus estava bastante compenetrado na explicação. Achei a cena
um pouco cômica, porque não sabia se ele estava apenas sendo educado ou
estava realmente interessado nos segredos da jardinagem, mas as duas opções
eram igualmente engraçadas.
— Que centro de mesa mais lindo, Alana! Dona Teresa disse que foi
você que fez — Dona Lúcia disse sorrindo para mim.
— Ah, é mesmo? Dessa eu não sabia! Achei que o talento dele era
— Que nada! Você precisa ver tudo o que ele escreve, cada poesia
maravilhosa... um dia desses eu te mostro — ela falou animada.
— Você nunca vai ter acesso a eles — ele sussurrou para mim e eu
gargalhei bem alto. Fazia muito tempo que eu não ria.
novo.
SEIS
Após o jantar, eles foram embora. A mãe do Matheus era uma pessoa
muito simpática, mas ainda conseguia ver em seu olhar a mesma tristeza que
via nos olhos do Matheus e nos meus próprios, quando me encarava no
espelho.
Eu já tinha ido deitar há algumas horas, mas meu sono não vinha.
Respirei fundo e me remexi na cama. Alguns dias eram mais fáceis que
outros, e algumas noites eram especialmente difíceis.
madrugada, que prometia ser longa. Decidi por uma comédia que eu conhecia
muito bem e que me confortava sempre que eu via: “As Patricinhas de
Beverly Hills”.
meio sonolento. Peguei-o no colo e acariciei seus pelos. Quando meu celular
vibrou, avisando que havia chegado uma mensagem, eu me surpreendi,
afinal, não era comum eu receber mensagens às três e meia da manhã.
Pela primeira vez, não era um incentivo, mas um convite para uma
conversa. Estava tão focada no jornal e nas aulas extras que tinha esquecido
de responder! Mas dessa vez eu não precisava pensar muito, então salvei o
número com o nome “romântico anônimo” e respondi:
<< Ok. Eu acredito e vou respeitar isso por enquanto, mas aviso que
sou curiosa. Me diz uma coisa, já nos conhecemos?
>> Sim.
<< Oh, é uma pena. Vou voltar para lá essa semana, mas estou meio
nervosa.
<< Às vezes não gosto das coisas que escrevo e também não gosto de
tanta atenção. Essa semana está sendo bem ruim.
>> Ok, então... Acho que vou alternar entre bruxinha e minha flor.
Quais dos seus feitiços você usou em mim?
— Oh, querida, eu fiquei tão feliz de te ouvir rindo mais cedo, achei
que essa noite fosse ser mais fácil. Eu vou fazer um chá para te acalmar um
pouco.
anônimo”.
>> Será que terei sorte de te ver amanhã para você me enfeitiçar
novamente?
>> ALANA!
Ao ler, não pude evitar que os cantos dos meus lábios se curvassem
para cima. Era muito bom ter alguém se preocupando comigo.
<< Eu também acho! Ela voltou, vou tomar o chá e dormir, tente
também, ou vai ter olheiras amanhã.
fazia isso. Pouco depois do meu pai nos deixar, ela deitou comigo na cama e
me contou que a partir daquele dia seriamos nos duas contra o mundo, para
sempre.
minha mãe sozinha por muito tempo. Ela virou o meu alicerce depois que a
Karen se foi.
— Ok, vamos fazer isso logo. Não sei se vai dar tempo de descolorir e
pintar, pelo que entendi aqui, isso leva tempo. Mas vamos pelo menos
descolorir — ela disse me fazendo subir a escada até o meu quarto.
— É melhor mesmo, vou chamar a Lúcia para vir aqui, ela sabe fazer
essas coisas... quer saber? Acho melhor você ir ao salão dela — ela disse
pegando o celular.
— Não mãe, não quero dar trabalho — falei prendendo meus cabelos.
Eles estavam bem longos e sua cor mesclava entre o castanho escuro e o
louro mel nas pontas.
— Trabalho nenhum, vou ligar para ela e você vai com o Matheus,
ok? — Ela questionou.
"Palavras gentis não custam muito e ainda sim conquistam muito. “ — Blaise Pascal
— É, não dormi muito bem. Mas ei, minha mãe disse para te levar lá
em casa hoje depois da aula — comentei.
— Tem cadeira para todo mundo, Laís — disse tentando fazê-la sair
do meu colo.
Naquele momento, a Alana entrou na sala, olhou para nós dois com
uma cara de nojo e foi até o fundo da sala.
A professora chegou e a Laís finalmente desceu, mandando um beijo
para mim e andando até a carteira dela. A manhã passou tranquilamente, mas
eu não consegui prestar atenção nas aulas porque a Alana estava de cara
fechada e não olhou em minha direção nenhuma vez, nem falou mais nada
comigo.
Será que ela estava assim por ter me visto com a Laís?
Olhei para ela que, ao ver minha mensagem, sorriu e olhou ao redor,
procurando quem tinha enviado. Discretamente caminhei até a arquibancada
para me esconder e aguardei sua resposta. Logo o celular vibrou com a
mensagem da “Bruxinha”.
>> Eu sei que você sente falta da sua amiga, mas não fica triste não,
o mundo fica melhor quando você sorri.
>> Sou real sim, e não estou brincando com você, apenas não sou tão
corajoso para me mostrar a você.
<< Ah, é uma pena. Seria bom ter pelo menos um amigo.
Senti uma enorme tristeza ao ler aquilo. Ela estava muito sozinha sem
a Karen.
>> Nós já somos amigos. Mesmo você não sabendo quem eu sou, eu
sou seu amigo. Você pode contar comigo.
<< É bom saber disso. Fico muito feliz. Mas agora tenho que ir,
preciso redigir um texto para o jornal de amanhã. Espero que você leia.
>> Eu adorarei ler qualquer coisa que você escrever; tenha certeza.
Até mais tarde.
— Também acho. O Ronaldo até que joga bem, mas o Lucas vacilou
duas vezes e por pouco não levamos um gol. Isso não pode acontecer em jogo
— Por que a gente não troca de zagueiro e coloca o Tony? Eu sei que
ele é só do primeiro ano, mas a gente podia tirar ele da reserva e dar uma
chance a ele no time principal. Assim a gente cobre esse buraco na nossa
defesa — Nicolas sugeriu.
— Pô, cara, mas aí a gente coloca o Lucas no banco? Ele não vai ficar
feliz, esse é o último ano dele — falei.
vive falando que a gente não pode ser individualista no esporte — Albert
disse e Nicolas concordou com a cabeça.
— Verdade. Vocês têm razão. Vou falar com o Tiago, ele leva bem a
sério minhas opiniões. E se for para o bem do time, ele vai concordar.
fui até ela. Os outros nerds pareciam não acreditar que eu estava ali, me
“A felicidade não é algo pronto. Ela vem de seus próprios atos. ” — Dalai Lama
— Foi bom, mas diferente. Foi a primeira vez que eu tive coragem de
entrar em campo esse ano. Eu preciso seguir com a minha vida — ele disse
reflexivo, e depois perguntou: — E você, como foi no clube de jornalismo?
<< Ficou sim, mas na verdade foi mais uma apresentação da coluna
que será publicada amanhã.
>> E como vai ser essa coluna? Vai escrever sobre o que nela?
>> Gostei da ideia! Quem sabe um dia eu não mande um e-mail para
você?
>> Eu não disse que éramos amigos? Você pode contar comigo!
<< Nada, não gosto desse sentimento, ainda mais quando é por algo
que não é meu, sabe?
>> Está gostando de alguém? Achei que tínhamos alguma coisa aqui.
<< Não estou gostando, não. Ele é uma coisa do passado, amor de
infância, sabe? Gosto dele há tempo demais e sei que as coisas entre nós não
dariam certo.
<< Porque eu não sou o “tipo” dele. Mas ah, deixa para lá, viu? Não
é nada. Eu estou pintando os cabelos e preciso terminar aqui, te mando uma
mensagem mais tarde. Beijos, meu romântico anônimo.
Coloquei meu celular em cima da mesa e fui até a outra cadeira para a
Dona Lúcia enxaguar o meu cabelo. Assim que eu chegasse em casa eu veria
se meu signo era compatível com o dele.
— Uau, bem. Não sei o seu nome ainda, minha mãe não o conhece,
pelo menos eu acho que não, afinal, nem eu mesma o conheço, mas sim ele é
lá do colégio — revelei.
— Hmm, e você não tem medo, não? Falando assim com um estranho
— Ela perguntou voltando a lavar meus cabelos.
mensagens com ele não me faz nenhum mal... — disse olhando para ela
através do espelho.
— Está certo, então. Só não marque nenhum encontro com ele, ok?
Mesmo ele te fazendo bem, você não o conhece — ela me aconselhou e eu
concordei.
— Foi tudo bem, deu tudo certo — ele disse a ela, mas pelo tom da
sua voz percebi que ele estava mentindo.
— Oh, que bom, fico muito feliz — ela disse bagunçando seus
cabelos como se ele fosse uma criança. — Seu pai ligou mais cedo, disse que
vai ligar depois para falar com você — ela falou e eu vi o rosto do Matheus
mudar repentinamente.
— Desculpa por isso, querida. Mas a relação do Math com o pai dele
só piorou depois do acidente. Às vezes ele tem alguns acessos de raiva e é
muito difícil para mim...
em mil opções de decoração, em tudo que faríamos naquele lugar. Era difícil
não lembrar da Karen, que tinha sonhado isso junto com a gente. Eu sentia
muita falta dela, o tempo ainda não tinha curado as minhas feridas, mas eu
esperava que isso acontecesse logo.
“ Nada pode tornar nossa vida, ou a vida das outras pessoas, mais bonitas do que a gentileza eterna. “
— Leon Tolstói
“Só se pode entender a vida olhando para trás; mas deve vive-la olhando para frente. “ — Soren
Kierkgaard
— Opa, opa! Não vou andar nisso não — eu queria muito ir com ele,
mas morria de medo de andar de moto.
— Que saco, garoto! Não gosto de motos. Se você quer sair, vamos
andando ou de Uber — respondi grosseiramente.
Como não estávamos indo tão rápido, apreciei o vento contra o meu
rosto e tentei descobrir para onde íamos. Quando passamos pela ponte que
ligava o centro ao litoral, eu entendi.
O mar estava revolto e o vento estava frio, apesar do sol forte. Por um
Esqueci essa paixonite depois de alguns anos, porém ela voltou com
força depois que a Karen e o Alex começaram a namorar. Ambos pareciam
ter a missão de unir seus irmãos para que pudéssemos sair em casais. Nem eu
nem o Math dávamos muita corda para os planos dos dois, apesar do meu
coração acelerar sempre que os dois nos deixavam sozinhos. A Karen tinha
certeza que assim que ficássemos sozinhos ele se declararia para mim e
seríamos o casal mais feliz do mundo.
para minha mãe. Foi a partir daquele momento que eu decidi que tocaria as
pessoas com as minhas palavras. Eu queria ser jornalista e teria um
compromisso com a verdade e integridade dos fatos, e era isso que eu vinha
tentando fazer desde então.
— Math, quer me dizer o que aconteceu entre você e o seu pai? Sei
que vocês não se gostam, mas agressão física é demais... foi algo sério? —
Questionei calmamente na tentativa de fazê-lo me contar algo.
— O Valdir é um completo idiota, um canalha que não valoriza o que
tem. Ele poderia ter ficado comigo e com a minha mãe quando o Alex
morreu, mas não, ele não teve coragem e nos abandonou — ele respirou
fundo, limpando algumas lágrimas do seu rosto. — Agora ele acha que pode
interferir em nossas vidas, aparecendo lá em casa completamente bêbado e
fazendo minha mãe sofrer ainda mais.
vê-la daquele jeito de novo, então comecei a discutir com ele, trocamos
vários xingamentos até ele dar o primeiro soco e eu revidar. Nos
engalfinhamos por um tempo até os vizinhos separarem.
— Foi bom. Temos algumas ideias novas para o time. Estava com
saudade de jogar com o resto do time.
— Esse sempre foi seu sonho, né? — Ele perguntou apertando de leve
a minha mão.
— Sempre, desde que aprendi a ler eu soube que queria ser jornalista.
— Já ouvi falar! Assisti ao filme e ele é muito bom, então o livro deve
ser melhor ainda.
— Pode ter certeza que é! Espero que você leia e me conte, quero
saber sua opinião. Acho que também vou ver o filme e aí nós podemos
comparar os dois!
— Mas ei, será que esse brinquedo vai demorar muito aqui em cima?
— Perguntei olhando para baixo, o que foi uma péssima ideia.
Subi na moto e o Matheus pilotou até minha casa, indo bem rápido e
“Não espere até descobrir quem você é para começar. “ — Austin Kleon
— A gente? Então quer dizer que você também estava com ela,
Matheus? São dois irresponsáveis agora? Você não pensa na sua mãe não,
rapazinho? — Ela questionou irritada, alternando seus olhares entre mim e
Matheus.
— Fica calma, Susana. Eles estão bem e é isso que importa, não é? —
O delegado Cortez falou para a minha mãe, colocando as mãos em seus
ombros. Ela pareceu relaxar um pouco.
O Matheus, que até então tinha ficado estático, em silêncio, foi até a
mãe dele e conversou baixinho com ela.
Voltei minha atenção para minha mãe, que agora levava o delegado
até a porta, conversando baixinho com ele. Todo mundo tirou o dia para
sussurrar, foi?
— Bem, meu trabalho por aqui acabou — Ele disse para todos e
depois olhou diretamente para mim. — Tenta não dar tanto trabalho a sua
mãe.
— Vou tentar, mas o problema é que ela não é muito paciente. Você
viu que ela te chamou sendo que não tinha sumido nem por 24 horas — falei
e minha mãe revirou os olhos. Sentei-me no sofá ao lado da minha vó e
Pudim deitou em meu colo.
Que sacana!
— Aff, mãe! Que saco! Já estou muito grande para ficar de castigo —
falei a ela.
Qualquer um que olhasse para ela diria que éramos um casal, porque
de fato parecíamos com um.
O que será que ele queria com aquela foto? Que eu visse o quão bem
nós ficávamos juntos? Isso era bem estranho, ele nunca nem demonstrou
querer sequer a minha amizade.
Quando cheguei na sala, notei que Matheus e sua mãe já tinham ido
embora. Fiquei decepcionada com isso, tinha esperanças de confrontar ele
sobre a foto e fazê-lo me dizer porque tinha a deixado lá. Beijei a testa de
vovó e caminhei até a cozinha, encontrando minha mãe fazendo os recheios
dos cupcakes para o casamento.
ser melhor que isso! — Ela esbravejou batendo a colher na beira da panela,
sem nem ao menos olhar na minha direção.
— Ok. Eu conheço você e sei que foi apenas um descuido. Mas que
seja a última vez.
— Certo. Então está bem. E como foi o passeio com o Matheus? Ele
— Contou sim. Foi por isso que fomos para o parque, ele precisava
espairecer um pouco. Parece que a briga foi séria — eu disse colocando a
primeira leva de cupcakes no forno.
— Amigos, hm, sei... você sabe que pode me contar a verdade né,
— Sei sim, filha. E pode ter certeza de que se acontecer alguma coisa
você será a primeira a saber, mas dessa vez não tem nada acontecendo
mesmo — ela falou sem me encarar. Senti meu sorriso ficando maior. Ela
não estava preparada para me contar, mas os trejeitos de adolescente com
uma quedinha não escondiam nada. E olha que a adolescente ali era eu!
“Querida Alana.
“Querida, Y.
dizer NÃO! Se você não se sente preparada, você não se sente preparada,
não tem o que discutir aqui, o que nos leva ao segundo problema da sua
pergunta.
apenas porque ele quer. Namorado da Yara e qualquer outro garoto que
esteja lendo isso: respeitem as meninas!
ele não está com você por interesse? Se você acha que ele vai terminar por
você dizer não, querida, eu sinto lhe dizer que ele não te ama e que esse
relacionamento não é nem um pouco saudável. Eu tenho certeza que você é
uma pessoa incrível que merece alguém que te ame e te respeite, alguém com
quem você vai ter momentos maravilhosos e, o mais importante de tudo, com
consentimento e amor de verdade.
Alana Soares.”
minutos.
A professora de inglês estava dando sua aula e ela era gente boa, mas
odiava atrasos, então optei por não interromper sua aula. Fui direto para sala
do jornal, liguei o computador para olhar como estava a diagramação do
exemplar da semana.
todo para a festa, que seria no dia seguinte, na casa dela. Revirei os olhos e
ignorei, eu nunca apareceria na casa dela depois das coisas que ela e a Laís
disseram sobre a Karen.
Voltei minha atenção para minha mesa, organizei alguns textos para
serem postados ao longo da semana e, quando o sinal bateu, fui para sala no
segundo horário. Assim que entrei, deparei-me com a Laís praticamente em
cima do Matheus.
De novo!
Eu queria conversar com ele, queria saber por que ele tinha deixado
aquela foto no meu quarto.
Sentei ao lado da Luana, que tinha olheiras enormes abaixo dos seus
olhos, a menina parecia que não tinha dormido nada.
— Vai ser o jeito, apesar de que o café da cantina tem gosto de tinta
velha — ela disse com uma careta, fazendo-me rir. — Mas ei, já que você
está aqui, me diz uma coisa, está acontecendo alguma coisa entre você e o
Matheus? — Ela questionou intrigada. Senti uma contração no estômago e
meu coração acelerou imediatamente.
— Ele não para de olhar na nossa direção e, como sei que ele não está
olhando para mim, achei que vocês estavam tendo alguma coisa — ela disse.
sussurrou:
— Não estou cega, pelo contrário estou vendo tudo e não estou
gostando. Acho bom você parar o que está fazendo, o Matheus é meu, sua
santinha — com um grande e falso sorriso, ela voltou para a carteira dela.
Eu devia ter ficado irritada, mas tudo o que eu consegui sentir foi
apatia. Que garota patética! Revirei os olhos e a Luana me ajudou a pegar os
meus materiais para que eu pudesse prestar atenção na aula.
Lu, que me deu um abraço para comemorar. Eu ofereci um pedaço para ela,
mas ela disse que não queria, que se meu apetite tinha voltado era para eu
aproveitar.
nos interceptou.
Ele apenas riu e me levou até o pátio do colégio, não longe dali, onde
ele me soltou como se nada tivesse acontecido.
— Meu irmão me deu aquela foto, ele pegou em uma das visitas à
casa da Karen e me deu. Ele achou que seria engraçado me provocar com
— Muito. Olha só, nunca mais entra no meu quarto, seu babaca! —
Ela gritou para mim, deu-me o dedo do meio e deu as costas para mim,
marchando até a nossa sala sem olhar para trás.
me fazia um bem danado, mas ela parecia gostar mais do romântico anônimo
alguém para fazer comigo, preferencialmente a Alana, ainda que ela estivesse
brava comigo. E foi aí que o professor cortou o meu barato, anunciando que
ele definiria as duplas por sorteio. Vi a Alana ser sorteada para fazer dupla
com o Tadeu, um dos caras da equipe de natação. Eu não ia com a cara dele
porque ele era um babaca metido a besta.
Quando ela arrastou a carteira para junto da dele, toda sorrisos, e eles
começaram a conversar, senti um desconforto no estômago. Eu tentei desviar
meu olhar do casalzinho e, quando meu nome finalmente foi chamado,
percebi que as coisas podiam ser piores. Minha dupla seria a Laís.
— Foi mal, Laís, mas estou sem cabeça para fazer esse trabalho
agora, não consigo me concentrar com todo esse barulho. Vai lá em casa mais
tarde que a gente escreve lá, está bem? — Disse a ela, que bufou para mim e
tirou o celular para mandar mensagens, provavelmente reclamando de mim
para a Tiana.
Paciência.
Quando o sinal bateu, peguei minhas coisas e saí sem olhar para
ninguém. A última aula seria de educação física. Quando chegamos na
quadra, as meninas começaram a se agrupar fora da área, esperando as
Dessa vez, errei meu saque propositalmente para que ele batesse com
um forte estrondo no bloqueio de Tadeu, voltando com força para o nosso
lado da quadra, tocando o chão antes que alguém pudesse se mover. Foi um
ponto entregue, mas a exclamação de dor que escapou dos lábios dele foi
ainda mais satisfatória. A partir de então, independentemente da posição que
ele se encontrava, fazíamos o possível para tornar as jogadas dele muito
difíceis.
Eu estava me divertindo bastante até ver a Alana de papo com ele de novo.
Aproveitei sua distração e gritei:
gargalhei e cumprimentei o Albert com um high five, mas de repente ele veio
em minha direção, já me empurrando. Empurrei de volta e ele perguntou:
— Qual o seu problema, garoto? Por que fez isso com o Tadeu? —
Ela questionou irritada.
“Você pode reclamar porque as rosas tem espinhos, ou pode ser grato porque os arbustos com
espinhos tem rosas. ” – Ziggy (Tom Wilson)
Fiquei surpresa quando o Math me levou para a casa dele assim que
saímos do colégio, já que naquele dia ele não ia ter aula de reposição. Achei
que ele ia me pedir para ir apenas mais tarde, mas não, ele me levou até a
moto dele sem falar nada e eu, que não sou boba, aproveitei para abraçá-lo
pelas costas no caminho. Quando chegamos, a mãe dele foi muito receptiva
comigo e almoçamos os três juntos.
Esta era a oportunidade perfeita para ficar com o Math mais uma vez.
Nós já tínhamos ficado algumas vezes, mas depois da morte do Alex ele
esfriou e se afastou de mim. Eu me preocupava um pouco com o bem-estar
dele, ele era muito próximo do Alex e sofreu muito com a perda. Queria
ajuda-lo e estar lá por ele, mas ele rejeitou todas as minhas investidas e eu
tinha certeza que era por causa da santinha.
— Matheus! Qual é, cara? Não quero ficar com nota baixa nessa
matéria não, lá na sala você não prestava atenção e aqui só fica no celular,
não vai me ajudar? — Reclamei e ele me encarou.
encostei mais a porta do quarto e peguei o celular que, para a minha sorte,
não tinha senha.
Que maravilha!
mensagem.
>>De: Bruxinha:
Meu querido romântico anônimo, você está bem sumido. Há dias não recebo
mensagens sua, aconteceu alguma coisa?
quem era, mas precisava descobrir quem era aquela garota para ter certeza.
— Estou mesmo, ainda bem que terminamos logo esse trabalho — ele
disse ainda de olhos fechados.
— Acho que sim, vou falar com os caras — ele respondeu abrindo os
olhos e me encarando.
— Sim, mãe. Vou levar a Laís até a casa dela, tudo bem? — Ele
questionou, levantando e beijando a bochecha dela. Eu levantei também para
Entrei em casa e, antes mesmo de ele dar a partida, tirei meu celular
às pressas para ligar para a Tiana.
— Meu irmão? O que você quer com ele? Ele disse que não vai mais
que ele está de bom humor. Mas antes me explica essa história direito —
Tiana questionou curiosa.
Então quando meu celular apitou, eu corri até ele e abri a foto que a
Tiana tinha mandado.
“Use o talento que você tem: as florestas seriam muito silenciosas se só cantassem os pássaros que
cantam melhor. ” – Henry van Dyke
jornal, usando com meus fones de ouvido e escutando uma das minhas
músicas favoritas do momento, “I Don”t Wanna Live Forever” — apesar de
eu não gostar muito da Taylor Swift, esse dueto com o Zayn estava
maravilhoso.
Quando estava já perto casa, fiquei surpresa ao ver uma moto muito
conhecida estacionada ali. Apressei meus passos e encontrei a minha mãe na
cozinha com o Matheus, fazendo carinho no Pudim, que imediatamente se
desprendeu dele e correu ao meu encontro.
— Oi, minha filha. Por que chegou agora? Muito trabalho no jornal?
— Ela perguntou beijando minha testa.
— Primeiro que você não tem que me proteger de nada porque eu sei
me cuidar, segundo que você está falando do Tadeu mesmo? Porque ele não
me pareceu ser assim, pelo contrário, foi muito gentil e educado — disse com
— Você que sabe, só não quero ter que dizer o famoso “eu avisei”
quando ele te machucar — ele falou assim que estacionei e saiu do carro sem
se despedir.
pensava que era para me dizer essas coisas? Uma menina bobinha que não
sabe avaliar o caráter de ninguém? E ainda saiu do carro sem me dar o direito
de revidar!
Otário.
Voltei para casa puta da vida com ele. Mas com o tempo fui me
acalmando e passei a pensar no que ele disse: eu realmente conhecia muito
pouco do Tadeu, mas nunca ouvi nenhum boato ruim dele no colégio. Talvez
o Matheus estivesse exagerando.
“Felicidade é um perfume que não dá para borrifar nos outros sem também ser atingido pelas gotas. ”
– Autor desconhecido
— Boa noite, minha neta. Senta aqui ao meu lado — Vovó apontou
onde eu deveria me sentar e eu obedeci. Não era meu lugar de sempre, mas
aparentemente ela queria que a minha mãe sentasse ao lado do delegado.
casualmente.
— O quê? Por quê? Eu achei que ele amava Porto Alegre! Não que eu
não vá ficar feliz de vê-lo novamente, mas o que aconteceu? — Perguntei
confusa.
— Ah. O Jordan... Bem, não tem outra palavra para isso. Ele estava
sofrendo bullying. Uns três babacas estavam perseguindo, espalhando boatos
e fazendo da vida dele um inferno. A gota d’água foi quando eles resolveram
agredir o meu garoto. O colégio não fez nada, a polícia muito menos, então
eu conversei com a mãe dele e achamos melhor ele vir morar comigo — ele
respondeu se servindo e então virou-se para minha mãe: — O cheiro está
divino!
— Que babacas! Coitado do Jor, mas que bom que ele está vindo.
Sinto saudades dele.
— Ah, isso seria muito bom, Brian. É bom ter uma segunda opinião...
Olhei para minha avó, indicando que estávamos de vela daquele novo
casal, mas ela não percebeu e continuou comendo. Revirando os olhos, eu
disse:
— Vovó, será que pode ir comigo lá em cima? Quero te mostrar um
bordado novo que aprendi na internet.
jantar e disse:
— Tchau, Brian. Diga ao Jordan para ele aparecer aqui quando voltar.
vi que ela estava sentada em sua cama, seu rosto estava um pouco vermelho.
Ela estava chorando. Corri até ela e sentei-me ao meu lado, colocando a mão
em seu ombro.
— Mãe, o que foi que aconteceu? Por que está chorando? Brian fez
— Não aconteceu nada, meu amor. É só que nunca pensei que fosse
encontrar alguém depois do seu pai. E aí agora, com isso tudo que está
acontecendo entre o Brian e eu... não sei, eu fico pensando se vale a pena me
entregar a isso. Não quero que aconteça tudo o que aconteceu novamente.
Você era muito pequena, mas sofri muito com o seu pai.
— Mãe, eu não tenho muita bagagem no assunto, mas não baseie seus
— É, mas sou muito mais esperta e rápida que ele, aposto — disse
divertidamente.
— Que tal uma sessão de cinema em casa, com muita pipoca e Ritmo
Quente? — Ela propôs e eu joguei o punho no ar, comemorando.
Enquanto ela fazia a pipoca, peguei meu celular e notei que o meu
toda hora pegava meu celular para ver se tinha alguma mensagem. Estava tão
dispersa que minha mãe percebeu.
silencio do romântico.
Era ele.
— Oi, filho. Foi bom e divertido. Fazia tempo que eu não fazia algo
assim. E você, o que fez?
— Ah, que bom que se divertiu. Seu pai apareceu por aqui?
— Ele me ligou dizendo que passaria por aqui, achei que fosse se
desculpar pelo que aconteceu na última vez.
— Ah, ele não apareceu e foi até bom, ainda não o perdoei —
respondi bebendo um copo de suco.
— Sei que seu pai errou, mas gostaria que vocês tivessem uma boa
relação.
desinteressado.
— Quem é esse homem, mãe? E por que que você nunca me falou
dele?
— Eu sei que não pode, mãe. E nem deve, a senhora nunca mais se
relacionou com ninguém desde o acidente do Alex. Sei que, assim como eu,
ele ficaria contente se a senhora estivesse feliz.
para sala.
Peguei meu celular e notei uma mensagem da Alana, percebi que ela
tinha mandado outra ontem e eu não tinha visto. Estranho. Não lembrava de
ter aberto, mas ela estava marcada como lida.
>> Meu querido romântico anônimo, você está bem sumido. Há dias
não recebo mensagens sua, aconteceu alguma coisa?
Estava cansado disso. Tudo bem que fui eu quem começou, mas eu
gostava da Alana e queria que ela gostasse de mim, e não do anônimo! Odiei
vê-la com o Tadeu, precisava dar um basta nisso.
<< Você não fez nada, eu só cansei desse joguinho que eu mesmo
comecei. Quero que você goste de mim e não de alguém que você imagina
>> Você está falando sério? Não está brincando comigo, não é?
>> Bem, eu estarei usando um vestido rosa, mas você sabe quem eu
sou, só preciso saber quem você é!
>> Verdade, esqueci dessa parte... Será que irei gostar de sua voz?!
<< Você irá amá-la. Não querendo me gabar, mas minha voz é muito
bonita, poderia até ser cantor se eu quisesse.
>> Mas você não é nem um pouco convencido, hein, boy? Vou
dormir e sonhar com você, ou como imagino que você seja. Bons sonhos,
anônimo.
“Como é extraordinário ninguém precisar esperar um momento específico para melhorar o mundo. ”
– Anne Frank
A aula daquela sexta foi bem entediante, quase ninguém foi para o
colégio por causa da festa, nem o Matheus apareceu. Apesar do Tadeu e da
Lu me fazerem companhia, foi terrível perceber que eu queria vê-lo, o quanto
manhã toda treinando, não tive tempo nem de almoçar direito, saí do banho e
corri para cá. O senhor Andrade mandou um papel para justificar meu atraso
— ele entregou o papel a ela e sentou próximo a mim, balançando seus
cabelos molhados.
— Que isso não se repita, Matheus! Ser jogador não vai te dar um
futuro decente se você não tiver estudo — ela disse para ele, virando para o
quadro começando a escrever.
— Quero uma síntese desse texto na minha mesa até o final da aula,
ela deve ter duas laudas completas. As instruções do que vocês devem
observar está na lousa — avisou sentando em sua mesa.
— Esse texto — mostrei a ele um texto de seis páginas que ela tinha
me entregado assim que entrei na sala. — Você tem que ir buscar sua cópia
com ela.
— Acho que vamos ter que dividir o texto, porque não vou enfrentar
esse dragão de novo — ele disse encostando sua cadeira na minha e pegando
o texto da minha mão, colocando-o na mesa de uma maneira que nós dois
pudéssemos ler.
que eu fizesse!
— É mesmo? O quê?
— Ah, legal! Só toma cuidado para não ser um babaca igual seu
amiguinho Tadeu.
— Nossa, você tem uma implicância com ele, deixa o garoto em paz!
— Você que pensa, Alana. Você ainda vai perceber quem ele
realmente é. Te vejo na festa? — Ele disse acenando com a mão, indo até a
sua moto.
— Olha quem fala, você era menor que eu quando saiu daqui e agora
não alcanço nem seu ombro! — Respondi abraçando-o novamente.
— Vejo que tem muita saudade aí, mas agora vai tomar um banho
para jantarmos, Alana. Estávamos te esperando — Minha mãe disse
levantando e me entregando minha mochila, que eu havia jogado de qualquer
jeito na sala.
— Você pode ir depois que jantarmos, ande logo que você não se
atrasa!
optei por usar o vestido rosa que eu havia informado ao Romântico que
— Oi, Brian! Tudo bem? Desculpa por não ter falado com você antes
— falei cumprimentando-o.
— Não tem problema, Alana. Como foi no colégio? Sua mãe me disse
que tem uma festa para ir — ele disse me dando novamente aquele abraço tão
paternal.
Sorrindo, respondi:
<< Estou tão ansiosa que sinto meu coração palpitar! Estarei aí
— Vou para uma festa e lá pretendo encontrá-lo. Mas agora não posso
te contar a história toda, ela é longa! Preciso me arrumar!
— Faz um resumão que eu entendo, Lana. Faz muito tempo que não
conversamos!
— Calma, Lana! Vamos torcer para que esse cara seja um bonitão.
— Não é isso, não me importo com a aparência dele, só estou
nervosa. Esperei tanto por isso e agora que vai acontecer tenho até medo de
Inflando meu peito de coragem, caminhei até a fonte que ficava entre
os jardins da entrada. Minhas mãos suavam e eu tentava me acalmar.
dizer:
“A melhor maneira de fazer seus sonhos se tornarem realidade é acordar. ” – Paul Valéry
— Então era você esse tempo todo? Eu não acredito! Qual era o seu
objetivo em me fazer de besta? Me iludir, me fazer acreditar que você
gostava de mim? — Perguntei irritada me aproximando dele.
— Como você pode achar isso? Eu nunca quis brincar com seus
Lágrimas inundam o meu rosto, mas não queria chorar, não na frente
deles.
chorei pelo que tinha acabado de acontecer, por saudades da Karen, por
perder o Romântico e o Matheus. Ele não podia ter feito isso comigo, não
podia ter brincado com meus sentimentos assim.
— Deixa eu me explicar, por favor, nada do que ela disse é... — Ele
começou a dizer em tom suplicante, mas eu o interrompi.
— Só posso concordar com isso, mas vou adorar quando você tiver
atitudes impulsivas como essa — ele disse erguendo meu rosto e me dando
um selinho.
— Precisamos sim, mas estou tão feliz por você não ter acreditado nas
mentiras da Laís que queria curtir um pouco mais esse clima entre nós dois.
— Acho que posso concordar com isso, mas só se você me levar para
andar de moto — falei ainda presa em seus braços.
— Seu desejo é uma ordem, bruxinha — ele respondeu me dando
mais um selinho.
Viramos para sair dali e o Math finalmente notou o Jordan que estava
de costas para a gente, mexendo no celular. Meu amigo tinha presenciado
tudo, e novamente um rubor surgiu nas minhas bochechas,
Caminhei até o meu amigo, que estava com um sorriso grande demais
para o seu rosto.
— Ainda bem que tu continua sendo uma garota esperta, viu. Vai lá
ficar com o teu não-tão-anônimo assim que eu vou ver se as pessoas ainda
lembram de mim por aqui. De repente eu também descolo uns beijinhos —
ele disse brincando. — Não faça nada que eu não faria e amanhã a gente
coloca o papo em dia, viu — ele disse me abraçando, beijando minha testa e
se despedindo.
“Tenha uma árvore sempre verde no coração, e talvez um pássaro venha cantar. ” – Provérbio chinês
Foi ali, no quintal dos avós dele, que nos conhecemos. Ele jogava
— Como não lembrar? Meu Deus, que saudades desse lugar, nunca
mais vim aqui desde que meus pais se separaram e meus avós morreram —
respondi tentando esconder a tristeza em minha voz.
— Minha avó ainda mora aqui, ela ficou bem abalada depois que meu
avô faleceu, mas não quis sair dessa casa. Eu venho visitá-la algumas vezes e
gosto de estar aqui, me faz lembrar de você.
Sorrindo, eu disse:
— Sabe que tentei por anos deixar de gostar de você? Mas parece que
não fui muito feliz nessas minhas tentativas, você sempre esteve presente em
meus pensamentos, por mais que eu não quisesse.
— Até quando iríamos negar isso que sempre foi tão claro para nós
dois?
— Eu não sei, a única coisa que eu quero agora é ficar com você.
— Posso fazer isso acontecer. O que eu mais quero é ficar com você
para sempre — ele jurou olhando em meus olhos.
entre bocejos.
— Vamos fazer outra coisa então. Está com fome? Tem uma
lanchonete ótima aqui perto, vamos comer e depois eu te levo para casa.
— Quer pilotar?
você!
— Nada disso, você vai pilotar até a lanchonete, ela fica a duas
quadras daqui e essas ruas não são movimentadas — ele disse e eu ia
contestar mais uma vez, porém ele me interrompeu:
dirige, sabe dosar o acelerador e o freio, então sobe logo que quero lanchar
com minha namorada — ele disse de maneira tão natural que eu acabei
soltando um suspiro apaixonado.
ser assim mesmo? Sem um encontro, sem um pedido? Que decepção, boy! —
Falei e ele ficou muito constrangido. Sério, a cara que ele fez foi impagável.
— Cara, eu não sabia que você gostava dessas coisas não, mas a gente
pode fazer isso aí sim, que tal um cineminha amanhã?
Comecei a guiar e, por incrível que pareça, não era mesmo tão difícil
eu estava louca para assistir. Era o terceiro de uma série de filmes que seriam
lançados. O Math não conhecia, então meio que resumi tudo para ele, que
pareceu bastante interessado em tudo o que eu falava e sugeriu que fôssemos
juntos. Ficamos ali por algumas horas, apenas conversando com bons amigos.
— Felizmente, não foi. Um sonho não seria tão perfeito assim — ele
disse dando um beijo nos meus cabelos.
— Ah, ele seria, já sonhei com você muitas vezes, por isso perguntei.
— Preciso ir, prometi a minha mãe que não iria chegar tão tarde e já
— Pode ser, vou falar com a dona Lúcia e te aviso — ele me beijou
novamente e foi embora.
deitei na cama. Estava cansada, o dia havia sido bem agitado, mas eu não
conseguia pegar no sono, então peguei meu celular e olhei minhas redes
sociais. A maioria das fotos recentemente publicadas eram da festa da Tiana.
Vi uma foto do Jordan com a Luana e o Tadeu e sorri. Ele já estava se
sentindo em casa, cheio de amigos, como o Jordan que eu conhecia na
infância. Os dias de sofrimento ficaram para trás, eu tinha certeza.
— Não falei que a minha voz era irresistível pelo telefone? — Ele
disse assim que eu atendi.
— Sério? Vai ver ela saiu para algum lugar e resolveu dormir fora.
— Sei muito bem onde ela deve estar, mas não quero nem pensar
nisso, ainda estou me acostumando com a ideia de ter minha mãe namorando.
Quase deixei meu celular cair com a novidade. Parecia que todo
mundo estava começando a namorar ao mesmo tempo!
— Ai, meu Deus! Que máximo, com quem que ela está?
— E depois eu sou a lerda, né? Fico muito feliz por ela, sua mãe
merece todas as coisas boas que a vida pode dar a ela.
— Super te entendo, ainda mais agora que tenho quase certeza que o
delegado está dormindo no quarto ao lado com a minha mãe.
— Nossa, parece que está todo mundo se encaixando.
— É sim. Sabe, eu tenho certeza que eles ficariam felizes com isso —
— É, mas eles estão bem onde estão, pelo menos é nisso em que eu
tento acreditar.
Apesar de ter ido dormir tarde, acordei muito cedo na manhã seguinte.
Era incrível a minha capacidade de acordar cedo nos dias em que eu poderia
dormir até tarde! Mas naquele dia eu nem consegui sentir ódio de mim
mesma, porque depois de alguns segundos acordada, as cenas da noite
Sorrindo, levei meu sanduíche e meu café até a sala e resolvi ver um
desenho da minha infância: Três espiãs demais. Aninhando-me no sofá,
liguei a TV, e então ouvi um barulho da vindo da escada. Esperava ver minha
mãe ou minha avó, mas me surpreendi ao ver o Delegado vestindo um short e
uma camisa de dormir. Ao me ver, ele ficou bem sem graça, acho que
imaginava que eu acordaria tarde e não descobriria que ele havia dormido
com a minha mãe.
— Ah... bom dia, Alana — ele coçou a nuca, evitando fazer contato
visual comigo. — Eu, hm, acabei passando a noite aqui porque...
— Olha, eu só queria dizer que o que eu sinto pela sua mãe é muito
especial. Ela é uma mulher incrível — ele falou, a voz repentinamente muito
formal.
— Ela é mesmo. E eu acredito que o senhor vai fazer muito bem para
ela, não precisa se preocupar comigo. Ela é uma mulher forte e sabe o que
faz, mas eu espero que o senhor tenha consciência de que nós nos protegemos
nessa casa. Se uma de nós é ferida, todas nós ferimos — falei casualmente,
mascarando a seriedade em minha voz. Eu sabia que ele não machucaria
minha mãe, mas algumas coisas precisavam ser faladas.
— Ah, só me diz o que você vai usar que eu pego — disse indo até os
armários, retirando os ingredientes solicitados pelo Brian e colocando-os no
balcão.
Enquanto ele estava fazendo o pão, separei e cortei algumas frutas, fiz
um suco de laranja e o café. Trabalhávamos em um silêncio agradável, quase
— Claro que sim, mamãe é uma romântica, ela vai adorar — disse
colocando a bandeja em sua frente. Ele a pegou, colocou-a novamente no
balcão e segurou minhas mãos.
— Você é uma ótima filha e uma garota maravilhosa. Ela tem muita
sorte em te ter por perto e eu espero compartilhar dessa mesma sorte daqui
para frente — ele disse me puxando para um abraço e eu o retribui, sentindo
meus olhos encherem de lágrimas. Disfarcei e ele beijou minha testa, levando
a bandeja consigo até o quarto da minha mãe.
Limpei algumas lágrimas que caíram. Meu pai nunca tratou a minha
mãe desse jeito e eu me sentia muito feliz por ela estar recebendo tanto amor
quanto ela merecia.
Decidida, fui até meu quarto. Tomei um banho rápido e coloquei uma
roupa confortável, um short jeans e uma blusa regata. Prendi meus cabelos
em um rabo de cavalo e desci, encontrando minha avó na sala, fazendo seu
tricô.
— Bom dia, minha linda — beijei suas bochechas e ela me deu sua
benção.
Não mais, pelo menos. Estava feliz como não me sentia há muito tempo, mas
a verdade é que a dor da perda nunca desapareceria. Eu estava acostumada a
conviver com essa tristeza e cada dia ficava mais fácil, mas o amor que eu
sentia por ela continuava forte. E isso nunca mudaria.
porta. Levou um tempo até que a Vitória, a mãe da Karen, aparecesse. Ela
estava muito mais magra do que na última vez que eu a vira, e também estava
bastante pálida. Meu coração apertou um pouco e eu me senti culpada por
não ter vindo visitá-la antes.
— Oh, minha pequena Alana! Você está tão linda! Claro que senti
saudades... Entre, o Manuel teve que viajar, mas deve voltar hoje ainda — ela
melhor amiga.
— Trouxe o café da manhã para comermos juntas, que tal? Sei que a
senhora adora suco de laranja — disse tirando a térmica com suco da bolsa e
incentivando-a a comer.
— Não estou com fome, Lana. Desculpe-me, mas já comi algo mais
— Ah, tem certeza que não quer nem um pouquinho? Está delicioso.
— Que bom, fico feliz por ela — ela disse apertando minha mão. —
E você? O que tem feito? Como vai no colégio?
— Minha Karen ficaria feliz com isso, ela sempre adorou os seus
textos — ela apertou um pouco mais a minha mão e disse: — Sinto tanta falta
dela... eu não sei como viver sem a minha princesa, Alana — e então
começou a chorar copiosamente.
Manuel, pai da Karen, chegou com um ar cansado e a tirou dos meus braços,
ocupando meu lugar sem mudar a expressão impassível. Fiquei ali por alguns
segundos, apenas observando os dois, então anunciei que estava indo embora.
O tio Manuel apenas acenou com a cabeça para mim, enquanto a tia
Vi não deu sinais de ter me ouvido. Com o coração apertado, corri até em
Bem que me falaram que seguir em frente era a parte mais difícil.
VINTE E TRÊS
“O mundo não sabe quanto deve às pequenas gentilezas que existem em toda parte! ” – J.R. Miller,
The beauty of kindness
— Sei que não pode e nem quero que se afaste dela, minha filha,
apenas desejo que você seja sensata e que não vá sozinha, não faz bem para
você.
— Está certo, meu amor. Apenas me prometa que irá até lá apenas
comigo, eu odeio te ver desse jeito — ela disse fazendo cafuné em meus
cabelos. Assenti com a cabeça. Ainda fiquei deitada em seu colo por alguns
aliás, ele vai buscar o Jordan daqui a pouco e os dois vêm almoçar conosco
hoje.
Impossível!
— Oi, linda, estava dormindo até agora, foi? — Ele perguntou com a
voz macia, levemente rouca. Senti borboletas no meu estômago e não pude
deixar de sorrir.
— Não, acordei bem cedo, fiz umas coisas e cheguei em casa agora
pouco, mas eu não levei meu celular e não vi que você tinha me ligado.
— É uma pena que ela guarde essa mágoa de vocês, que não tem
culpa de nada. Todos nós estamos sofrendo, se ao menos ela se deixasse ser
ajudada...
— Eu devo aparecer aí antes do meio dia, mas a minha mãe não vai
— ele disse com certo ressentimento. — Ela falou que vai passar o dia fora
com o treinador no município vizinho — percebi que a mágoa em sua voz só
podia significar uma coisa e não pude deixar de soltar uma risada debochada.
chateado.
— Você nem me fale nisso! Leva mesmo! Acredita que peguei minha
mãe aos beijos com o Brian agora há pouco?
— Mas acho que nós vamos ter que nos acostumar, não é? — Ele
falou em meio as risadas.
vem, eu vou convidar a Lu para almoçar aqui. Ela me contou que os pais dela
viajaram e fico preocupada que ela não se alimente direito.
— Talvez. Então é bom você convidar o Nicolas, já que disse que ele
é doido por ela.
— Até, beijos!
passaram pela sala, indo em direção à porta. Fingi estar mexendo no celular e,
pelo canto do olho, observei eles se despedindo na porta.
Para dar privacidade aos dois, fui até a cozinha beber água. Não
demorou muito para minha mãe entrar, indo direto para pia temperar o
frango. Observando a aura de felicidade que a rodeava, fui até ela e dei-lhe
— Não precisa falar nada, nem ficar com vergonha, ok? Se ele te fizer
feliz, por mim está tudo bem — sussurrei no ouvido dela, que se virou para
me ver e sorriu.
— Hmm, quer vir aqui hoje? Mamãe está fazendo lasanha! — Falei
com entusiasmo. Ela ficou em silêncio por alguns instantes e eu achei que a
ligação tinha caído, mas então ela finalmente falou, a voz ainda muito baixa:
— Acho que não, Lana. Não sou uma boa companhia hoje...
— Ah, não faz isso, Lu! Você tem que vir para cá, muita coisa
aconteceu ontem e eu preciso te contar tudo — insisti um pouco, desligando
o creme de leite e colocando o chocolate na mistura.
me conta.
— Que droga, Alana! Será que é tão difícil escutar um não? Eu não
sou a Karen, não sou a sua melhor amiga e não quero ser! Para de tentar
forçar as coisas e não manda o Matheus passar aqui, eu não quero sair hoje!
Me deixa em paz um pouquinho! — Ela explodiu desligando na minha cara.
— Na verdade, não. Queria uma carona até a casa da Lu, você pode
me levar?
pouco tempo, mas as coisas que ela me falou... ela nunca agiu assim, tem
alguma coisa muito errada!
voltar da igreja.
— Ok, toma cuidado naquela moto e me liga se for algo sério com a
Luana — ela falou preocupada.
camiseta, já que andar de moto de vestido era uma péssima ideia, peguei
minha carteira e o celular e desci ao escutar a buzina do Math.
“Não tenha medo de dar um grande passo. Não se pode cruzar um abismo com dois saltos
pequenos. ” – David Lloyd George
Cortes profundos.
amiga eu era...
cega?
ficar tudo bem, ela vai ficar bem — Matheus disse tentando me acalmar, mas
eu podia ouvir o desespero na voz dele, também.
— Não vai ficar tudo bem, Math! Olha como ela está! Eu não
enxerguei isso, não a ajudei e agora ela pode morrer! — Falei derramando
algumas lágrimas.
— Nada disso é culpa sua, Alana! Fica calma, nós precisamos tentar
amenizar o sangramento. Eu preciso que você fique calma — ele disse com a
voz mais firme. — Alana, olha para mim — ele chamou, e eu o encarei. —
Ela precisa de nós agora. Ela vai ficar bem, mas agora nós temos que nos
focar. Faça mais pressão no corte — ele ordenou e eu percebi que ele estava
certo. Eu concordei com a cabeça e passei a fazer pressão com as duas mãos
no corte profundo que subia pelo braço da Lu.
— Ela vai junto. Eu vou avisar os pais dela. Alana. Alana, olha para
mim. Eles vão levar a Lu para o hospital e você vai junto, ok? Eu logo vou te
encontrar, eu vou buscar a sua mãe.
Eu não olhei para ele, meus olhos estavam na ambulância e nos outros
dois médicos. Apenas concordei e corri para me juntar à Lu.
corpo tremia.
escorrerem pelo meu rosto, eu só conseguia desejar que a Karen estivesse ali
comigo.
— Acredita que eles nem deram importância para tudo que contei? É
como se ela nem fosse filha deles! Eles só queriam saber se ela estava viva, e
então transferiram a ligação com a maior frieza! Foi a secretária quem me
passou tudo, eles apenas disseram que não poderiam abdicar de
compromissos sérios por causa de uma brincadeira da Luana — ela disse
nervosa, nunca havia visto mamãe tão chateada assim.
jeito, acho que faz sentido que ela tenha alguns problemas. Não sei como eu
não pensei nisso antes, na verdade... Eu sou mesmo muito privilegiada por ter
uma mãe maravilhosa — estiquei a mão para a mamãe, que a segurou e
pareceu relaxar um pouco.
percebi que cochilei quando acordei com a voz grave do doutor que atendeu a
Luana.
— Ela ainda está sob efeito da anestesia, mas deve acordar em breve.
Ela passará por uma avaliação psiquiátrica e será encaminhada para
acompanhamento psicológico assim que ela estiver estável o suficiente.
Geralmente isso é difícil para pacientes psiquiátricos, então será bom que ela
veja rostos familiares. Por favor, me acompanhe.
— Filha, veja com seus amigos quem pode doar sangue para a Lu,
certo?
mesmo.
— Ela vai ficar bem — ele sussurrou no meu ouvido. Levantei o rosto
para lhe dar um beijo casto e perguntei:
— Não sei, mas acho que o Nicolas, talvez. Vou ligar para ele para
perguntar — ele disse tirando o celular do bolso e indicando que faria a
porque o que foi utilizado nela precisa ser reposto para outros pacientes —
ele avisou.
horas que vemos quem vale a pena e quem não vale — ele disse com raiva.
— Ótimo, vou conversar com ela sim, obrigada, querido — ela disse
fazendo um carinho no rosto dele, e depois virou para mim dizendo: —
Agora vamos para casa. Vocês precisam tirar essas roupas com sangue. Vou
pedir para o Brian fechar a casa dela, amanhã arrumo alguém para limpá-la.
Dito isso, fomos os três para casa, minha mãe de carro e eu fui de
moto com o Math. Queria sentir o vento sobre o meu rosto e relaxar um
pouco.
— Você precisa comer. Foi isso que levou a sua amiga para o
hospital, podia ser você — ela disse levantando e me pegando pela mão,
levando-me para a cozinha.
— Não, não é a mesma coisa! A Lu tem anorexia, eu não... —
comecei, mas me interrompi.
E falhei terrivelmente.
— Dormir com a minha mãe me ajudava, mas hoje ela não está aqui,
então vou virar a noite assistindo filmes até ser vencida pelo cansaço.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, então disse, com certa
hesitação:
disse que me amava! Claro que eu já imaginava que esse sentimento fosse
recíproco, mas ter essa certeza foi demais para o meu coração.
Saltitei feito uma criança para abrir a porta e ali estava ele, o amor da minha
vida. Inclinei-me para ele e recepcionei-o com um beijo digno de cinema.
Nossas línguas se encontraram e as mãos dele envolveram minha cintura,
trazendo-me para mais perto dele. Quando nossas bocas se separaram, deitei
minha cabeça em seu ombro, apreciando o cheiro maravilhoso do perfume
que ele usava.
aborrecido.
Meio confusa, pisquei para ele e então me dei conta do que aconteceu:
eu e o Math dormimos juntos no sofá e o Brian tinha acabado de flagrar a
cena.
Meu Deus!
Não queria nem imaginar o que ele pensou quando nos encontrou ali.
VINTE E CINCO
“O que você faz todos os dias importa mais do que o que você faz de vez em quando. ” – Autor
desconhecido
— Ai, meu Deus! Não é nada disso que o senhor está pensando! —
Disse apressada e empurrei o Math, que ainda dormia.
— Poxa, Alana! Minha coxa! — Ele reclamou comigo, mas então viu
o Brian e sentou-se rapidamente, assustado. — Delegado, caramba! O senhor
está aí há muito tempo?
— Estou aqui há tempo o suficiente para ver o que aconteceu — ele
respondeu friamente. O Matheus passou pelos mesmos estágios de confusão
Minhas bochechas esquentaram mais uma vez, feliz por saber que ele
pretendia me pedir em namoro logo. Mas o delegado não pareceu
convencido. Ele pigarreou e encarou Matheus, procurando intimidá-lo.
— Serei sincero com você, garoto. Como os pais da Alana não estão
presentes, eu vou ter que assumir certos papéis aqui. Eu não acho que vocês
— E vocês podem sair juntos, desde que não cheguem muito tarde,
mas não quero que o relacionamento de vocês atrapalhe os estudos. Sair dia
de semana atrapalharia isso, então esse é mais um tópico que vocês precisam
conversar com as mães de vocês — ele foi categórico e nós concordamos.
Fui atrás de Brian, que estava cortando pães debruçado sob a bancada
da cozinha. Fui até a geladeira e tirei alguns hambúrgueres congelados.
Quando liguei o fogo, o delegado tocou em meu ombro.
— Que bom que não ficou chateada. É estranho assumir esse papel
paternal, na verdade... Só tive o Jordan e ele não conviveu muito comigo.
Mas é bom saber que estou fazendo o certo — ele coçou a cabeça, sem jeito.
— Está sim. Eu às vezes acho que preciso de limites mesmo, o meu
pai não é muito presente e a mamãe é mole demais para me repreender de
verdade — disse rindo. Ele coçou minha cabeça com o punho, brincalhão, e
voltou-se para a cafeteira.
enquanto eu mandava uma mensagem para minha mãe para saber como ela e
a Lu tinham passado a noite.
Olhei para o relógio e percebi que minha avó estava muito quieta,
De novo!
— Bom dia. Lembrou que tem vó só agora, foi? — Ela disse sem me
encarar.
— Vó! A senhora não desceu e eu fiquei preocupada — exclamei
sentando-me ao lado dela.
Nos outros dias, entre aulas normais e aulas extras, visitei a Luana e
nós criamos um laço ainda maior do que o que já tínhamos antes, ela estava
se dando muito bem com a minha mãe também e eu estava adorando isso. Ela
— Sim, minha linda. Seria um prazer tê-la em nossa casa, não quero
te ver sozinha naquela casa enorme — minha mãe falou segurando a mão
dela.
— Tudo bem, ficarei com vocês sim. Quando meus pais voltarem eu
vejo o que faço, também não quero ficar sozinha. Eu nem sei como agradecer
tudo o que vocês estão fazendo por mim — ela disse com lágrimas nos olhos.
— Lu, saiba que você pode contar com a gente para o que precisar,
amigos são para essas coisas.
toda, fui liberada das aulas extras da sexta e avisei no jornal que faria minha
coluna em casa. Assim que as aulas comuns acabaram, dei um beijo rápido
no Math e saí correndo para casa para arrumar o meu quarto e abrir espaço
para acomodar as coisas da Lu ali, porque eu queria que ela se sentisse
— Alô?
perguntou preocupada.
— Está tudo bem sim, só tive que correr para pegar o celular — disse
colocando a mão no peito, tentando recuperar o fôlego.
— Isso, filha, mas lembra do que a terapeuta disse para a gente. Nada
que seja muito difícil para ela comer, o corpo dela ainda não está acostumado
a digerir.
— Eu sei, mãe, pode deixar, vou fazer uma comidinha bem leve. Eu
quero que ela se sinta bastante acolhida aqui, vamos ajudá-la a superar tudo.
abrir. Corri para receber a Luana, que não estava com sua melhor aparência.
Os olhos dela estavam vermelhos e inchados, a pele ainda estava um pouco
pálida e a expressão dela era de muita tristeza.
Assim que nós nos olhamos, como um filme, aquele trágico momento
passou pela minha cabeça. Senti meus olhos encherem de lágrimas e corri
para abraça-la. Imediatamente ela retribuiu e começou a soluçar em meu
ombro. A mamãe fechou a porta atrás de nós e nos abraçou, também, e ali
ficamos por um tempo.
— Calma, Lu. Vai ficar tudo bem, nós vamos cuidar de você. Está
segura agora — disse enquanto acariciava seus cabelos, desejando que coisas
boas acontecessem.
comer, chorando a cada garfada que colocava na boca. Nós tentávamos não
prestar muita atenção nisso para não a desencorajar, mas mamãe sentou ao
lado dela e colocava a mão nos ombros dela o tempo todo, dando suporte.
“Ninguém é bom em tudo, mas todo mundo é bom em alguma coisa. ” – Clark
Eu estava tão absorta no filme que nem percebi meu celular vibrando
na mesinha de centro. Jordan se esticou para pegá-lo e anunciou:
Senti meu rosto corar e evitei fazer contato visual quando peguei o
aparelho da mão dele para ir até a cozinha atendê-lo.
— Oi, Moreno — disse assim que fechei a porta atrás de mim.
— Está bem. Por que não leva o Jordan e a Luana com você? — Ela
questionou olhando para os dois.
Jordan me encarou e eu dei graças aos céus por ele entender as coisas
— Não precisa, tia. Não sei a Lu, mas eu estou descansando o almoço
ainda — ele disse acariciando o próprio estômago e sorrindo para ilustrar sua
fala.
para perto dele, dando-me um beijo casto. Eu sorri, mas ele continuou sério e
me entregou o segundo capacete, montando na moto e esperando que eu
subisse atrás dele.
Sem uma palavra, ele ligou o motor e dirigiu até a casa dos avós dele.
Desci e me sentei no mesmo balanço da noite do nosso primeiro beijo, e ele
veio até o meu lado, esticando o braço para pegar minha mão.
Eu fiquei em silêncio por alguns instantes, mas não pude impedir uma
risada fraca de escapar dos meus lábios.
meu pai não era daquele jeito comigo, sabe? Eles se entendiam tão bem, ele
era tão carinhoso... não sei. Era como se ele fosse o pai que eu queria ter,
sabe? E quando ele e a minha mãe começaram a namorar, eu vi a felicidade
nos olhos dela. Eu acho que ele vai fazer muito bem para ela, e para mim
também — expliquei e ele soltou nossas mãos, apenas para me puxar para o
colo dele.
— São mesmo. Mas agora nós temos que conversar com elas sobre a
gente, antes que o delegado conte. Espero que elas não encrenquem muito...
— ele falou
mais de perto, percebi que nossos apelidos estavam gravados na parte interna:
na minha estava escrito “moreno”, e na dele, “bruxinha”.
apaixonado.
— Isso, Lu, nós vamos bater o pé caso alguém diga algo. E além do
mais, as pessoas estarão mais ocupadas falando do casalzinho aí — Jordan
falou apontando para mim e o Math.
camisa 10 do time.
— Opa, subiram de nível! Isso vai render muita fofoca. Meu Deus! —
— Bem, crianças o papo está muito bom mais já são dez horas e
amanhã vocês têm aula.
— É, Jordan! Vamos que amanhã ainda temos que levar o resto dos
papéis da sua matrícula — Brian disse. Ele deu um beijo casto na minha mãe,
acenou para nós e andou até o carro, esperando que o filho o seguisse.
deixando-nos sozinhos.
Ele me deu mais um selinho e foi embora em sua moto. Observei até
ele virar a esquina e entrei em casa suspirando. Encontrei minha mãe na
cozinha, arrumando caixas com doces encomendados para a festa do dia
seguinte.
— Nossa, quanta coisa! Quando a senhora teve tempo para fazer tudo
isso? — Perguntei sentando-me no balcão.
— A Laura fez uma boa parte, fiz alguns hoje à tarde e decorei o bolo
— ela respondeu mostrando-me o bolo com detalhes de princesa.
— Não precisa nem pedir — ela passou o braço por meus ombros e
“Bons amigos são como estrelas. Você nem sempre as vê, mas sabe que estão ali. ” – Autor
desconhecido
rabo de cavalo.
— Hmm, bom dia! Você está querendo alguma coisa, não é? Espero
que não seja dinheiro, porque eu não tenho.
— Vocês chamam ele assim, por que não posso chamar? Quer que eu
seja mais moderna e chame ele de crush? — Ela perguntou com muita
naturalidade.
— E pode deixar que eu falo com a sua tia, sim, querida — vovó
falou antes que nós saíssemos.
— Oi, Nico. Tudo bem sim, aconteceu alguma coisa? Por que você
está ofegante? — Perguntei.
no olhar.
— Recebeu sim, mas não é disso que estou falando. Adivinha quem
está na capa hoje? — Ele perguntou fazendo um suspense.
Meu Deus! Será que essas pessoas me conheciam tão pouco a ponto
de pensar que eu gostaria de uma exposição dessas?
— Não, não gostei. Não acredito que vocês fizeram isso! Minha
própria equipe me expondo dessa maneira! — Disse irritada.
— Cara, você tem noção do que você está dizendo? O absurdo? Estão
querendo lucrar com o meu relacionamento! — Falei furiosa.
Olhei para quadra e vi o Math com seus amigos, porém dessa vez
quem os acompanhavam não eram as meninas da torcida, mas a Laís e a
Tiana.
Eles conversavam animadamente, como se fossem velhos amigos.
Quando o Matheus riu de algo que a Laís falou, não consegui ficar olhando.
se passam na minha cabeça. O Tito estava certo: será que eu aguentaria toda
essa pressão da mídia? Afinal, jornalismo não era sempre justo ou correto,
haviam algumas frutas podres no pé.
“Viver é como velejar. Você pode usar qualquer vento para seguir em qualquer direção. ” – Robert
Brault
— Estou bem, e você? Estranho te ver por aqui, você costuma ficar
mais na área norte do colégio — ele comentou.
— Ah, eu até tentei, sabe? Mas eu odeio ser o centro das atenções, ver
o colégio toda comentando sobre o meu relacionamento com o Math não é
algo que me agrada.
— Eu entendo, mas se você quer ficar mesmo com ele, vai ter que se
acostumar, né? — Ele disse dando de ombros.
inventando coisas.
Era o Matheus.
cara, só isso.
— Eu não vim me encontrar com ele, eu vim para ficar sozinha. Mas
ele é meu amigo e quis me ajudar. Além do mais, você me pareceu bem
ocupado quando eu te vi, primeiro dando atenção para as meninas da torcida
e depois falando com a Laís. A Laís! Eu não sei se você lembra, mas ela é a
garota que tentou separar a gente.
— Eu lembro muito bem o que ela fez, ela estava conversando com os
outros caras e eu estava te esperando — ele se justificou.
— Não foi isso que eu vi. Mas quer saber? Não quero brigar, não
quero dar o gostinho a ela de ser o pivô das nossas brigas — ergui as mãos
em frustração.
como falou com o Tadeu. Ele estava me apoiando enquanto você estava com
outras garotas — retruquei sublinhando as últimas palavras.
— Não fala dessa maneira, até parece que eu estava fazendo algo
errado. Não distorce as coisas, você que estava aqui abraçada com aquele
babaca.
— Ele é meu amigo, Matheus, meu amigo! Não posso mais ter
amigos, agora? Você desconfia tanto assim de mim? — Perguntei com raiva.
— Sou eu quem devia te apoiar, Alana. Por que você não foi atrás de
mim, independente de com quem eu estava?
—Sabe por que eu não fui? Porque se estavam falando de mim, foi
por culpa sua! — Explodi. Ele me encarou estarrecido, mas logo a expressão
dele voltou à raiva.
Senti uma mão passar nos meus cabelos e alguém sentou ao meu lado.
Não precisei nem perguntar quem era, apenas pelo cheiro do perfume
amadeirado eu sabia que era o Matheus.
com a Luana.
— O que aconteceu? Por que está esse clima tenso entre vocês? —
Ela perguntou sentando-se na minha frente.
para ele... está rodeado de gente o tempo todo. Se você gosta mesmo dele,
amiga, vai ter que se adaptar — ela disse resignada.
— Não fala assim, Lu. Muita gente quer te ver bem, você tem que
— Quando será que esse povo vai achar outro assunto para falar? —
Perguntei irritada.
— Vai demorar, viu. As meninas estão loucas para saber o que você
fez para fisgá-lo — Tamires respondeu olhando para quadra.
— Se eu fosse tu eu aproveitava! O Matheus poderia ter qualquer
garota, mas te escolheu, sua boba! Deixe de besteira e curta isso! Deixe que
falem, ignore o que não te acrescenta em nada. Vai curtir teu namorado,
garota — Jordan falou e eu ri. Só ele para me confortar nessas horas.
Mesmo ele estando todo suado, enlacei seu pescoço e o beijei. Foi
beijo leve e casto que eu esperava que transmitisse as minhas desculpas. Ele
intensificou, roubando-me um beijo apaixonado e intenso.
“Se você é sortudo o bastante para ser diferente, nunca mude. “ – Taylor Swift
— Como nosso plano pode ter dado errado? Não era para eles estarem
se pegando agora! — Tiana disse irritada ao meu lado.
— Não deu errado. Se você parasse para pensar iria perceber que ele
deu muito certo! — Falei observando o casal se pegando na beira do campo.
— Como assim, miga? Não estou entendendo! Você não está vendo o
que eu tô vendo? — Ela disse confusa, apontando para os pombinhos.
— Vamos falar com o Tadeu! Se ele quer ficar com a santinha, vai ter
— Sabia que ia me procurar uma hora ou outra — ele disse sem olhar
diretamente para mim, arrumando a touca em sua cabeça.
— Não seja tão convencido. Só vim te falar que nosso plano ocorreu
como planejado. Abalamos as estruturas do casalzinho e agora que sabemos o
ponto fraco deles, podemos lutar com unhas e dentes pelo que queremos.
— Ótimo, vamos nos dar muito bem se você seguir essa linha de
gelo o dia inteiro, mas não, ela soube relevar a situação — disse a Nico no
vestiário.
comigo. Mas sei lá, ela está namorando com você e não com ele, né? Talvez
seja o caso de relevar.
— Não vou relevar isso não! Controlar os ciúmes é uma coisa, deixar
um otário dar em cima da minha mina bem na minha frente é outra. Eu já
percebi que ele faz a linha de bom moço, mas isso não cola comigo não! Tem
alguma coisa muito estranha nele e naquele maldito sorrisinho falso. Sacou?
— Tirei a toalha de meus ombros e sequei meus cabelos. O Nicolas sentou no
banco atrás de nós e começou a calçar os tênis, pensativo.
— Vish, cara! Ela vai ter que aprender a viver com isso, você é
Matheus Vieira! Um dos melhores jogadores do time!
— Eu sei, mas ela não gosta da atenção. Eu entendo, mas não posso
mudar quem eu sou, nem por ela nem por ninguém, estou fazendo o que eu
amo e sou feliz com isso — disse terminando de me vestir e sentando ao lado
— Acho que isso é a coisa mais justa que tem. Mas nesse caso, você
também não pode exigir que ela mude. Ela não vai aprender a gostar da
exposição, então você vai ter que ensinar ela a pelo menos aceitar. Sei lá,
mostra o lado bom. De repente isso não dá mais visibilidade para a coluna
dela — ele sugeriu bebendo um pouco de água.
— Mulheres, né, bicho. Ruim com elas, pior sem elas — ele disse me
dando tapinhas no ombro e levantando.
— Foi boa. Ela ainda está bem tímida e relutante em se abrir comigo,
mas conseguimos conversar um pouco hoje e foi bom. Ela acabou de passar
por um perrengue enorme e ainda não está curada, né, eu estou indo com
calma.
se tirar desse buraco — ele disse e fiquei bastante surpreso com a maturidade
dele.
— É, mas certamente ter alguém para escutar ajuda muito. Vamos ver
como as coisas vão andar, cara. Mas ó, vou lá na biblioteca pegar um livro.
saltou aos meus olhos, mas então me surpreendi ao escutar a risada de Alana.
Ah, finalmente chegara o dia em que eu iria socar o rosto desse cara!
TRINTA
— Oi!
— Alana, oi! Será que podemos terminar aquele trabalho hoje? — Ele
perguntou com um sorriso caloroso.
coisas na mesa, fomos procurar livros para começar o trabalho. Ele sussurrou
para mim indicando que encontrara, mas que só havia um exemplar.
Sussurrei de volta para dizer que nossa biblioteca precisava de mais
investimento, mas que por enquanto íamos ter que dividir, e voltamos para a
mesa, sentando lado-a-lado.
Foi apenas quando ouvi o Math falar que levei um susto e a puxei de
volta para mim:
— Achei que já tivesse ido para casa — eu nunca ouvira tanta frieza
na voz dele.
entreguei para o Tadeu fazer a parte dele. Despedi-me dele, mas o Math não
disse uma palavra, guiando-me para fora do prédio pela mão. Já estávamos
quase no estacionamento quando ele parou subitamente.
— Nossa, amor! Vamos voltar para buscar então, você vai precisar
para amanhã?
Fui para o carro e esperei por ele lá por alguns minutos, mas ele não
demorou a aparecer e seguimos para minha casa.
— Isso é bom, estarei torcendo por você! Estou feliz com as aulas de
— Nós poderíamos ir sim, acho que vai ser divertido! — Falei e pelo
resto do caminho fomos discutindo sobre as músicas que tocavam na rádio.
— Oi, moça! Viu o passarinho verde, foi? Ou foi azul igual aos olhos
— Não, ele disse que todos irão para festa, mas que ele quer me levar
ao restaurante da mãe dele — ela disse sorrindo muito. Eu estava muito feliz
de vê-la sorrindo novamente, então dei um breve abraço nela.
como as outras meninas do colégio... eu sou quebrada por dentro, Lana. Ele
não vai gostar de uma garota cheia de problemas... — ela disse isso com os
olhos cheios de lágrimas.
— Lu. Você não é quebrada, você é uma pessoa inteira. Uma pessoa
incrível, inclusive. E é por isso que ele já gosta de você, e há muito tempo!
Ele jamais brincaria com você, nem com ninguém. Ele não é assim. E
acredita em mim, você não quer ser que nem as outras meninas. Ser diferente
é o que te torna tão especial, e quem não enxerga isso perde a companhia de
uma menina maravilhosa e muito forte. Por favor, não se menospreze assim,
está bem?
— E está conseguindo. Vai ficar tudo bem, você vai ver — prometi
dando-lhe um beijo na testa.
Depois de eu tomar um banho, eu e a Luana descemos para jantar. A
mesa já estava posta e eles só estavam nos esperando para comer.
Ele retirou o celular do bolso e fez uma careta ao ver quem era.
“Um único raio de sol é suficiente para desfazer muitas sombras. – São Francisco de Assis
— Vou lá dar uma força para a Tiana, o carro dela ficou sem bateria a
algumas quadras daqui.
— Hhm, é mesmo? O carro dela quebra e ela liga justo para você?
Você é algum mecânico, Matheus? — Questionei erguendo as sobrancelhas
para ele.
— Não, não sou, mas não custa ajudar, deixa de ciuminho. De lá eu
vou para casa, belê? — Ele disse tentando me beijar outra vez, mas eu
desviei.
— Não estou com ciuminho. Meu ciúme não vem no diminutivo, meu
amor! Vai lá, ajudar ela e me liga assim que chegar em casa, belê? —
Respondi com ironia, controlando minha irritação.
cama.
— Não gostei, mas estou tentando abafar meu ciúme. O Math só foi
— Puta merda! Esses caras vão me pagar! Tão achando que eu sou o
quê para ficar me apostando? E o Matheus, aquele cachorro! Por que ele fez
isso? Fingiu que estava tudo bem e depois voltou para bater no Tadeu! —
Exclamei com raiva e devolvi o celular para o Jordan antes que eu o atirasse
contra a parede.
— Eles são uns babacas, a única pessoa legal do jornal era você. O
resto está só preocupado com o que vende e vocês são notícia! Mas seguinte,
o Tadeu fez alguma coisa na biblioteca para provocar essa ira? — A Luana
perguntou olhando para o próprio celular.
— Você sabe como teu boy é ciumento! E esse Tadeu adora provocar,
fica fazendo o bom moço na tua frente, mas eu conheço o tipo dele — o
Jordan disse com seriedade.
— Não viaja, Jor! O Tadeu é meu amigo, ele sabe que eu tenho
namorado.
— Eu sei que ele sabe, mas isso não o impede de comer pelas
beiradas até chegar ao prato principal, que é tu mesma! Abre o olho, Lana!
relacionamento.
Mas não pude voltar a ler, porque meu celular apitou e eu o peguei
para abrir a mensagem:
>> Aconteceu alguma coisa nesse meio tempo que ficamos longe?
Joguei o celular na cama, sem esperar por uma resposta. Fui ao quarto
da minha mãe e encontrei-a sozinha, olhando a planta da sua confeitaria.
são jovens, sei que agora tudo parece grande e complicado demais, mas não é
o fim do mundo, meu amor.
— É tão difícil às vezes, mãe! Tem hora que temos tantas coisas em
comum e em outras vezes somos como água e óleo. Eu gosto dele, de
— Claro que é, você só tem dezoito anos, Alana. Tem muita coisa
para viver e construir ainda. Tenha calma, não brigue por pequenas coisas,
tenta escutar ele e faça ele te escutar. Se vocês se amam de verdade, vai dar
certo — ela disse e ficamos ali, em silêncio, por um tempo refletindo sobre
tudo que ela havia me falado.
— Não precisa agradecer. Eu não sei muita coisa sobre carros, mas
não se nega ajuda aos amigos — sorri para ela.
— Que pena que nem todo mundo pensa assim. Eu liguei para uma
galera e nem meu irmão quis vir me ajudar. Obrigada de verdade.
<< Aconteceu alguma coisa nesse meio tempo que ficamos longe?
Que babacas!
— Amor! Não foi só ciúmes, você sabe que eu confio em você, mas
ele faz as coisas de propósito e eu não consigo deixar de pensar que tem
alguma coisa muito estranha com ele, eu só estava tentando...
— Sei que talvez seja cedo para falar esse tipo de coisa, mas não
consegui mais guardar aqui no meu coração, eu precisava te falar isso para
— Linda, como você pode me falar uma coisa dessas por telefone?
Agora tudo o que eu quero é ir para aí e te beijar até que a gente fique sem ar
— falei e ela riu.
essa sensação.
pequenas nos afetarem. Caramba, eu sou ciumento, mas parece que aquele
babaca fica perto de você de propósito. Tem alguma coisa muito errada
naquele sorriso falso dele.
— Não fala, mas fica de cara feia depois. Não posso ficar ignorando
as meninas, não sou mal-educado — justifiquei.
que a gente gosta de ficar brigando por coisa pouca. A gente precisa parar
com isso, Math. Não há amor que sobreviva a tanto ciúme.
— Não, vim para a varanda, acho que todos foram dormir e eu estou
aqui. Quero dormir escutando sua voz hoje — ela disse e eu me decidi.
— Vai para onde, menino? Você acabou de chegar! Nem para mais
— Foi mal, mãe! Depois a gente conversa sobre isso, acho que vou
dormir fora! — Falei e saí antes que ela pudesse contestar.
Peguei a moto e fui até a casa da Alana o mais rápido que pude.
Como a varanda era nos fundos da casa, estacionei com cuidado e corri até lá,
escalei até encontrar ela com o telefone na orelha, de costas para mim,
chamando meu nome no telefone.
— Pronto, cheguei! — Falei e ela se virou, levando um susto.
olhos arregalados.
o rosto no meu pescoço. Fiz cafuné até ela adormecer e eu senti meus olhos
pesarem, apagando logo depois.
TRINTA E TRÊS
Peraí.
Corpo quente?
— Lu! — Exclamei.
— Graças a Deus você acordou! Está quase na hora da sua mãe
chamar a gente e ele está aqui! Por que não me avisou que ele dormiria aqui
— Bom dia — falei virando para lhe dar um selinho, mas ele
intensificou nosso beijo. A Lu pigarreou alto, então eu lembrei que tínhamos
plateia.
— Deixem para namorar depois! Vou distrair sua mãe e vocês saem
pelos fundos! Não demorem! — Ela disse com urgência, virando-se para sair
do quarto.
— Acho que seis e vinte. Minha mãe nos acorda cedo. Ainda bem que
Lu costuma acordar antes da mamãe, já que você não foi embora.
— A Luana vai me matar e não vai mais encobrir a gente! Deixa para
a gente namorar no colégio! — Falei dando um selinho nele e levantando da
cama.
— Estou fazendo o que não poderei fazer lá, não vou para o colégio
hoje — ele avisou sentando-se e colocando a camisa.
calçava a sandália.
— Ok, ok, dessa vez você está perdoado. Mas vamos logo, antes que
você foi dormir tarde ontem — mamãe disse, servindo café em uma xícara e
entregando-a para mim.
você, ouviu bem? — Ela enfim disse, levantando-se. Sorri para ela e fiz que
sim com a cabeça. Satisfeita, ela apanhou as louças sujas e foi para a cozinha.
— Aconteceu que eu já falei com sua tia e ela liberou a casa, então
deixa para dormir com o boyzinho lá! Vocês não sabem ser discretos! — Ela
falou revirando os olhos e meu queixo foi no chão. Olhei para Lu e ela estava
se controlando para não rir, escondendo o rosto com seu café e fingindo que
não estava ouvindo.
— Eu não sei do que você está falando, vovó — disse com minha
melhor voz de inocência e pigarreei, desviando o olhar do dela. — Mas
obrigada por conseguir a casa com a tia Lucélia, vou organizar as coisas para
irmos depois do jogo.
— Está bem, está bem. Mas vão logo escovar os dentes que eu vou
levar vocês duas para o colégio — ela disse apontando para a Luana.
— Vai? Mas por quê? — Perguntei confusa, olhando para a Lu, que
deu de ombros.
— Por favor, tia, leva a gente junto, a gente pode ajudar com o que
faltar!
— Eu não acredito que ficou pronta tão rápido, ai meu Deus, mãe!
— Eu mal posso esperar para ver, aposto que o tom de rosa que eu
sugeri para as paredes está lindo!
fugir nesse meio tempo — mamãe acrescentou com um sorriso e nós duas
assentimos, novamente animadas.
Eu odiava isso.
— Precisamos saber com quem que você vai ficar, Alana! Confesso
que estou torcendo para o Tadeu ganhar e ficar com você, assim o Math fica
comigo! A gente combina muito mais! Sabe, eu não sei por quanto tempo
você vai aguentar isso tudo, mas eu espero que seja por pouquíssimo tempo
— Laís disse com um sorriso falso.
— Sai da minha frente, Laís! — Falei tentando passar por ela, mas ela
me empurrou e eu pude sentir a Luana se encolher ao meu lado.
— Não vamos sair da sua frente. Você se julgava tão boa e agora está
brincando com dois caras, Alana! Eu esperava isso de qualquer uma, mas da
santinha do colégio não! Foi um choque para mim! — Tiana falou jogando o
jornal em mim.
— Qual foi, resolveu criar culhões? Onde é que estava essa coragem
na hora de fazer o serviço completo? — Ela perguntou apontando para os
pulsos enfaixados da minha amiga. Os olhos da Luana imediatamente se
encheram de lágrimas e ela baixou a cabeça.
— Cala a boca, deixa a Lu em paz! Você não sabe do que está falando
— exclamei com raiva.
— Ih, ficou nervosinha? Assim até parece que você tem culpa no
cartório, viu... — A Tiana disse olhando para as próprias unhas, levemente
entediada.
— Você lava a sua boca para falar da Karen! Saiam da minha frente
agora, antes que eu arrebente a cara de vocês! — Gritei. As pessoas estavam
começando a se reunir perto de nós, cochichando e apontando para mim.
Senti minha visão ficar turva. — Me deixem em paz, todos vocês! — Berrei
para que todos que estavam ao redor pudessem escutar e, ao me virar,
encontrei minha mãe parada observando tudo completamente abismada.
“Em algum lugar, alguma coisa incrível está esperando para ser descoberta. “ – Carl Sagan
— Bom dia, senhora Soares. Ao que devo a sua presença aqui pela
manhã? Aconteceu alguma coisa? — A diretora Núbia perguntou assim que
minha mãe bateu na porta e abriu-a.
envolvendo dois rapazes e a Alana. Além disso, eu tenho quase certeza que
incitação ao suicídio é crime, não é? — Ela perguntou e se virou para mim.
Antes que a diretora Núbia pudesse dizer qualquer coisa, minha mãe
completou:
inspetores nos pátios e corredores para evitar esse tipo de coisa, além de uma
política de zero tolerância com bullying — ela disse calmamente.
— Pois eu duvido que essa tenha sido a primeira vez, a senhora já viu
a publicação do jornal hoje? Em vez de publicarem notícias ou fatos
importantes, estão manchando a imagem da minha filha como numa revista
de fofocas! — Minha mãe disse mais nervosa, pegando o jornal que Tiana
jogara em mim e entregando-o bruscamente para a diretora. — Eu sei que a
imprensa precisa ser livre, mas vocês não têm nenhuma regra para
publicações nesse jornal? Nenhuma supervisão de um professor? Eu procuro
não tinha conhecimento da situação do jornal. Vou apurar tudo isso que está
me relatando e tomarei atitudes — a diretora disse levemente nervosa,
voltando-se para o computador e começando a digitar. — Convocarei uma
reunião com os pais e alunos do terceiro ano, conversarei com os professores
para que alguém passe a supervisionar as atividades do jornal. De imediato, é
o que posso fazer, mas vou convocar os professores e funcionários para
criarmos novas políticas contra o bullying. Isso não pode continuar assim.
fundamental e confesso que só deixei que ela continuasse aqui porque era seu
último ano. A minha filha perdeu a melhor amiga há pouco tempo e ela não
precisava voltar a um ambiente com tantas lembranças positivas para sofrer
esse tipo de coisa. Francamente, o jeito que estavam falando da Karen... —
minha mãe disse indignada.
— A perda dela e do Alex foi dura para todos nós. Alana — ela me
chamou e eu levantei o rosto para ela. — Peço que venha até mim caso algo
dessa magnitude volte a acontecer, ok? Eu farei tudo no meu poder para que
isso não se repita.
mais doía era que o colégio todo acreditava que eu estava jogando com o
Math e o Tadeu... eu não devia me importar com o que eles pensavam, mas
eu não conseguia suportar a ideia de todos esses boatos.
— Acho que é melhor vocês não irem para aula, minhas meninas.
Vamos para a confeitaria, vocês queriam me ajudar, não é? — A mamãe
disse tentando nos animar.
minha mãe virou para a Lu e começou a falar algo sobre marcar terapia de
emergência para ela, mas eu desliguei meu cérebro tentando esquecer tudo
aquilo. Alguns instantes depois, meu celular vibrou e eu o peguei, vendo uma
nova mensagem do Matheus.
>> Linda, acabei de saber por alguns caras do time o que aconteceu
e sinto muito que você tenha passado por isso tudo sozinha. Eu queria poder
sair daqui para estar ao seu lado, mas estou preso na clínica até meus
resultados saírem. Se isso te deixar feliz, saiba que estou pensando em você
durante todo esse tempo. Te amo muito.
— Em relação ao quê?
— Sim, mãe. O nosso namoro não pode interferir nos nossos planos
futuros.
— Já pensei, mas não curto muito a ideia. Vai ser difícil, mas vamos
nos ajustar — falei e nós sorrimos uma para a outra. Logo depois minha mãe
estacionou em frente a confeitaria. A mamãe tinha decidido o nome há alguns
dias, mas queria me fazer uma surpresa, então desci cheia de expectativas
para descobrir.
sei que ela estaria comemorando conosco como sempre esteve durante todos
esses anos — mamãe falou beijando minha testa.
TRINTA E CINCO
Como eu queria que ela estivesse aqui agora, como queria que aquele
— Tia, isso aqui está muito lindo, acho que a galera do colégio vai
amar! Vai virar o novo point, vai ser o maior sucesso! — Lu disse abraçando-
a e eu não podia deixar de concordar.
— Também acho viu, mãe! Não tem como não amar seus doces, e
esse lugar está maravilhoso! — Falei e ela sorriu para mim, emocionada.
Mamãe nos levou para os fundos para nos mostrar a cozinha e todos
os equipamentos. Era uma parte mais técnica, e mamãe nos explicou para o
que cada coisa servia, mas eu não entendi boa parte. Pela expressão da Lu,
ela também estava se esforçando para acompanhar, mas mamãe estava muito
animada falando sobre estufas, fornos e batedeiras, então apenas sorrimos e
fingimos entender. Depois de nos mostrar até mesmo o interior dos fornos,
mamãe sorriu, emocionada.
sorrindo.
— Ih, deixa que eu monto essa Playlist aí, Lu. As suas músicas são
emo demais — disse brincando, o que gerou uma exclamação de protesto
vinda da Luana, mas todas rimos.
Depois que chegamos em casa, minha mãe foi fazer o almoço, Luana
resolveu fazer companhia a minha avó, já que ela não tinha terapia, e eu fui
para o meu quarto.
— Garoto, que nojo! Não podia ter tomado um banho antes de vir,
— Qual foi, linda! Vim correndo te ver e você me trata assim? — Ele
perguntou sorrindo e mostrando suas covinhas.
— Sabe que sua mãe me ama né? Mas não foi ela que me deixou
subir não, vim correndo do colégio para cá, pulei a sacada e vim para o seu
— Vamos nada! Eu só queria ficar com você. Fiquei muito mal pelo
que te fizeram no colégio. A diretora marcou uma reunião de pais e mestres
para quinta, minha mãe me ligou e tudo — ele disse me soltando, sério.
aquilo.
Não é novidade, elas fazem isso desde que entrei no colégio, a Karen sempre
foi o meu escudo, ligando o foda-se para tudo o que elas diziam. As coisas
que elas disseram dela... foi horrível, Math. Ela não está mais aqui para se
defender, nem a mim, e eu preciso aprender a lidar com tudo isso sozinha —
triste.
— Bem, ele não estava errado, né? — Disse encostando meu rosto no
ombro dele, depositando um beijo ali. Ele ficou em silêncio por um tempo,
então me envolveu com os braços.
— Sinto falta dele. Tanta falta que as vezes me sufoca, não sei como
conseguirei entrar no campo sábado para jogar sem ele — ele finalmente
disse com a voz marcada pelo choro.
— Meu amor, ele vai estar lá com você. Tenha certeza disso. E eu
também vou — assegurei-o, tentando soar confiante e segurando minhas
próprias lágrimas.
TRINTA E SEIS
— Pode ser, mas não vai pegar bem eu descer aqui, sua mãe vai
descobrir que ando pulando a sacada — ele disse com uma fungada, um
pouco mais descontraído. Dei uma risadinha involuntária.
— Verdade, acho melhor você entrar pela porta da frente. Vou dizer a
mamãe que te convidei para o almoço — falei me levantando.
— Foi sim, deu tudo certo. Ele já deve estar chegando — disse
levando os pratos e talheres até a sala de jantar, colocando-os nos lugares.
Logo, a Lu apareceu conversando animadamente com a vovó, e a mamãe
trouxe a comida para a mesa. Todas nos sentamos e vovó começou a servir a
— Ele brigou com você? Por isso você está com essa cara? —
Perguntei disfarçando.
— Será que ele vai falar com minha mãe? — Disse forçando um
sorriso e esticando o braço para pegar comida. A mamãe estava me olhando
com uma expressão engraçada, decididamente percebendo nossa nem tão
secreta conversa sussurrada. Fingi que não era comigo.
— Acho que não. Se ele falar, você confirma, primeira e última vez.
— Sim, foi tudo bem, tanto para mim, quando para o Albert e o
Nicolas. Estamos liberados para jogar — Math disse com um grande sorriso
orgulhoso.
— Seria muito bom, meu bem. Há muito tempo não vou na casa da
Pelo amor de Deus! Vocês não vão! Eu estou planejando isso há dias e não
vai ser a mesma coisa com vocês lá!
divertir um pouco antes dos cursinhos e dos vestibulares, não estraguem isso
— falei sentando novamente e cruzando os braços.
— Eu estou mesmo planejando levar sua mãe para algum lugar nesse
fim de semana — Brian continuou — e nós confiamos em vocês dois, ainda
mais depois da conversa que tive com o Matheus, certo? — Ele perguntou
— Sim, tudo certo, iremos curtir, mas com todo o respeito, senhor —
ele respondeu com bastante seriedade.
Por mais que tenha tudo sido uma brincadeira, eu ainda estava um
pouco alterada. Eu sabia que eu estava errada, mas a verdade é que eu estava
bastante ansiosa para sábado, e a possibilidade de tudo dar errado mexeu
comigo. Todos voltaram a conversar e comer normalmente, mas eu estava
sem fome. Quando a mamãe serviu a sobremesa, senti meu estômago
embrulhar como não fazia há semanas. Olhei de relance para a Lu, que estava
com uma aparência nervosa. Ainda era difícil para ela e eu às vezes esquecia
que precisava servir de exemplo, então me servi de uma pequena porção e
comecei a comer, ainda que sem vontade. Ao me ver comendo, ela
legal, mas caso você não se sinta bem fora de casa... — disse levemente
preocupada.
— Fica tranquilo, meu bem. Você treinou para isso e é um líder nato.
Eu tenho certeza que os olheiros vão notar todo o seu talento e dedicação —
disse levantando-me para sentar ao lado dele.
— Espero que sim, porque esse é todo o meu futuro — ele falou
— Vou, mas também quero tentar PUC, UEL e... hm. USP — revelei.
— Minha mãe não gostou nada quando eu contei para ela.
— Até que eu entendo ela. Para mim não tem coisa pior que viver
longe de você, linda — ele disse me puxando para um beijo intenso e, por
alguns minutos, eu me perdi em sua paixão.
TRINTA E SETE
“Você é livre para fazer suas próprias escolhas, mas nunca estará livre das consequências delas. “ –
Srishti
Meus pais sempre foram obcecados pela aparência física e pelo que os
outros pensariam de nós. Desde muito nova, minha mãe controlava o que eu
colocava no meu prato e dizia o quanto eu ficaria feia se eu continuasse
comendo aqueles chocolates que eu ganhava da minha avó. Eu sempre aceitei
e ficava até feliz, porque esse era o único momento que ela prestava atenção
em mim. Para o meu pai, eu servia apenas para ser levada a eventos, para ser
mostrada. “Olhem como minha filha é linda”, ele queria dizer para todos.
Mas isso não o impedia de gritar com a minha mãe para dizer que ela
não estava me pressionando o suficiente, que eu estava crescendo e ficando
cada dia mais feia. Como consequência, minha mãe gritava comigo.
— Essa garota nem parece que é nossa filha — ouvi meu pai falar,
certa vez. — São os seus genes, sua família é cheia de gente desleixada igual
ela.
começou a surtar.
Fiz inúmeras dietas, todas ministradas por ela, e fui induzida ao uso
de remédios, mas nada me fazia perder peso. Eu continuava gorda. Isso fazia
minha mãe me odiar e meu pai não querer mais olhar na minha cara. Eles
continuaram a comprar roupas do mesmo tamanho, sem se importar se elas
caberiam em mim.
culpava sempre por tudo o que estava acontecendo, não conseguia me ver
como inocente naquilo tudo quando meus pais diziam que eu não conseguia
as coisas por ser gorda.
Nem nada.
Apenas um vazio.
Segurei a lâmina entre meus dedos e meu celular tocou. “Deve ser a
operadora”, pensei, mas o peguei do chão mesmo assim. Era a Alana.
Estranho.
— Tudo bem sim, Lana. Acho que estou ficando gripada — menti.
— Hmm, quer vir aqui hoje? Mamãe está fazendo lasanha! — Ela
disse meu estômago roncou com a menção da comida, mas minha cabeça
imediatamente começou a contar quantas calorias tinha em uma lasanha.
Comida que, aliás, eu comera pouquíssimas vezes, já que a minha própria
— Acho que não, Lana. Não sou uma boa companhia hoje... — falei
baixinho.
— Ah, não faz isso, Lu! Você tem que vir para cá, muita coisa
aconteceu ontem e eu preciso te contar tudo! — Ela insistiu. Comecei a me
irritar um pouco. Não era como se eu não me importasse com o que
acontecia com ela, mas tinha tanta coisa acontecendo na minha vida e ela
não fazia ideia. Ela nunca perguntava...
Explodi.
— Que droga, Alana! Será que é tão difícil escutar um não? Eu não
sou a Karen, não sou a sua melhor amiga e não quero ser! Para de tentar
forçar as coisas e não manda o Matheus passar aqui, eu não quero sair hoje!
Me deixa em paz um pouquinho! — Gritei, desligando sem esperar pela
resposta.
Aumentei o som e ergui minhas mangas, pegando a lâmina na mão e
encostando-a primeiro na minha perna.
“depressão”. Eu sempre pensei que pudesse tê-las, mas nunca levei a sério.
Às vezes eu ainda me pergunto se eu não estou só sendo dramática, mas a
terapia estava me ajudando a aceitar que o que eu tinha não era invenção
minha. Cada dia era uma batalha e uma vitória, mas não era nada fácil. Só
eu podia lutar essa luta.
O que me ajudava era ter uma família para quem pedir ajuda, uma
família que me apoiava. Claro, não eram meus próprios pais. Eram a tia
Susana, a Alana e a Vovó. Naquele dia, a tia Susana me abraçou, me
permitiu sofrer e chorar, e também disse que tudo ficaria bem. E, pela
primeira vez em muito tempo, eu me permiti acreditar.
>> Claro, busco sim! Podemos tomar um açaí depois do filme, sei que
você adora e encontrei um lugar bem legal na orla.
Como ele podia gostar de mim se eu mesma mal conseguia fazer isso?
Eu ficava tão nervosa perto dele que nem sabia como agir e o que
falar. Caramba! Eu tinha dezessete anos e nunca tinha beijado ninguém. E
toda essa situação com ele só me deixava mais insegura.
não ia me salvar, nem fazer eu aprender a me amar. Isso era algo que tinha
que acontecer de dentro para fora.
>> Oi, gatinha! Como está sendo seu encontro com o Nicolas?
>> Nervosa por quê? O Nic gosta de você, gosta de verdade! Vai com
calma, que tudo vai dar certo!
<< Vou tentar, mas você sabe é a primeira vez que eu faço isso. Não
sei como agir, o que falar... e se ele tentar alguma coisa? Vou surtar!
>> Não vai não, tenta ficar tranquila, que quando acontecer você vai
saber exatamente o que fazer... Me diz uma coisa, o que vocês vão fazer
depois do cinema?
>> O Math deve saber. Vamos encontrar vocês lá, mas tenta relaxar!
Isso é um encontro, não um bicho de sete cabeças, relaxa e curte! Tenho
certeza que ele deve estar bem mais nervoso, beijooos!
— Tudo sim! Vou avisar o Matheus onde nós vamos, ele conhece o
lugar — ele falou pegando o celular e digitando algo rapidamente. Olhei para
a comida e meu estômago embrulhou.
— É sim, espero que esteja com fome! — Ele disse sorrindo para
mim. Eu forcei um sorriso de volta, mas fiquei um pouco chateada. Eu estava
começando a conseguir comer direitinho, mas comer porcaria era um pouco
demais para mim. O Nicolas não sabia disso, não era culpa dele, mas eu senti
uma leve vontade de chorar. — Vamos entrar, acho que o filme já vai
começar — ele disse levantando e esticando a mão para mim.
Entremos na sala e logo depois o filme começou. Percebi que a sala
estava bem fria, então vesti meu cardigã, que não ajudou muito. Ele colocou
não estava comendo e ia começar a me julgar, e então ele não ia mais querer
sair comigo. Desviei o olhar e fingi prestar atenção no filme.
Ele estava preocupado comigo? Olhei para ele, surpresa. Não vi pena
nos olhos dele, nem julgamento. Apenas preocupação e carinho.
história do filme. Quando entramos, ele não ligou o carro, mas virou-se para
mim e disse:
— Açaí é ok — concordei.
entender muito bem pelo que você está passando, mas eu estou tentando. Eu
andei lendo um pouco sobre transtornos alimentares e quero que você saiba
que eu estou aqui se você precisar conversar — ele me pegou de surpresa
com essa, mas fiquei feliz.
— Você vai conseguir, sim. Mas me promete que da próxima vez vai
me avisar quando eu for insensível? — Ele perguntou, colocando o cartão do
estacionamento na máquina.
Ergui as sobrancelhas.
— Próxima vez?
— Ah, você não vai gostar... — disse dando play na música. A Alana
vivia me dizendo que eu só gostava de música emo, e eu reconhecia que eu
podia ser muito melancólica quando eu queria.
— Eu cresci ouvindo isso! Mas não menciona isso para ninguém não,
o Matheus vive me zoando, dizendo que eu só gosto de velharia. Quer ver
quando eu resolvo ouvir Oasis perto dele...
— Você gosta de Oasis? — Praticamente gritei, animada.
eu precisava aproveitá-la.
TRINTA E OITO
— Então, tudo pronto para o fim de semana? O jogo dos meninos será
sexta à tarde e chegaremos na casa de praia antes de anoitecer para
comemorarmos ainda sexta — falei me aconchegando ao Math.
— Então! Tem uns três quartos só, mas os cômodos são enormes. Vai
dar para dormir uma boa quantidade em cada canto se dividirmos direitinho.
Mas precisamos levar nossos próprios suprimentos, então temos que ver
quem vai levar o quê — respondi
pensar um pouco.
— É, pode ser. Vamos ser umas vinte pessoas no total, né? Alguns
caras do time e algumas meninas. Vai ser perfeito! — Falei e eles assentiram.
tinha sido um sucesso e minha mãe não poderia estar mais feliz e eu mais
orgulhosa.
— Claro que estou, eu que estou organizando tudo. Ontem eu fui com
as meninas ao mercado e você não tem ideia do quão exaustivo é sair para
fazer compras com várias meninas, cada uma com um gosto? Pegamos tanta
comida que vai dar para um batalhão — respondi.
— Ai, meu Deus, Jor! Eu-eu, ainda não sei, v-vou deixar acontecer...
— gaguejei sentindo meu rosto corar.
— É o melhor que tu faz. Não tem nada pior que fazer as coisas e se
arrepender depois, vai por mim — ele disse torcendo o nariz. — Só transe
com ele se estiver mesmo afim — ele completou e eu tapei a boca dele.
— Você está louco? Como pode falar isso alto? Quer que todo o
— Ai, meu Deus. Eu espero que todo mundo seja responsável, isso é
a última coisa que precisamos que aconteça. Vou pedir para a minha mãe
preparar alguns doces para o caso de precisarmos de glicose emergencial.
— Boa ideia, mas não te preocupe. O rolê só vale a pena caso a gente
não lembre de nada no outro dia — Jordan completou, rindo.
Do Math.
>> Como a luz do seu quarto está acesa, eu presumo que você esteja
acordada. Que tal descer para matar essa saudade, morena?
— Estou um pouco nervoso, não vou mentir, mas também estou bem
confiante. Eu vou jogar para valer mesmo — ele disse beijando a minha testa
delicadamente.
— Espero que sim — ele disse, mas ainda estava com a expressão
bastante séria. — Sabe, conhecemos um olheiro ontem. Ele é amigo do
treinador Andrade e vai nos acompanhar no campeonato.
— Uau. Mas isso é muito bom, não é? Por que você está com essa
cara?
— É... mas... e se der? O próprio treinador vive falando que você tem
talento, e até eu, que estou só começando a entender de futebol, sei que você
é bom. E não estou falando isso só porque você é meu namorado, não —
falei, o que finalmente arrancou um sorriso dele.
— Ah, é? Eu também vou começar, mas achei que você não fosse
fazer — disse levemente surpresa.
— É, eu não ia, mas a minha mãe quer que eu não me iluda com o
futebol e tenha uma segunda opção no futuro — ele explicou.
— Tudo bem, amor, você não precisa saber agora. Vamos viver um
Odiava essa distância que se instalava entre a gente, mas não havia
nada o que eu poderia fazer contra ela. O Math e eu teríamos que trilhar os
nossos próprios caminhos algum dia, e eu não sabia se trilharíamos juntos.
TRINTA E NOVE
“ Ontem à noite o sol se foi, e ainda assim hoje ele está aqui. “ – John Donne
— O Brian não vai, ele tem que ficar na delegacia hoje, mas eu vou
— Ah, que bom! A tia Lu vai precisar de apoio, ela estava meio triste
nesses últimos dias — mencionei passando o delineador.
— Eu sei, meu amor, eu também já estou com saudade dela. Mas ela
não podia morar aqui para sempre, né — a mamãe disse sentando na minha
escrivaninha.
rosto corou.
— Mãe! — Protestei.
— Não, filha, deixa eu falar. Eu só posso falar isso uma vez na vida.
Não quero que se sinta obrigada ou pressionada a fazer nada. Faça só se você
indicou que não era sobre a praia que ela estava falando.
Era o primeiro jogo do Nico que ela iria assistir e ela estava bastante
ansiosa. Eu achava muito fofa a relação deles dois, era o primeiro
relacionamento sério de ambos, e vê-los descobrindo pouco a pouco as
peculiaridades de cada um era bastante gratificante.
O hino começou e todos nós nos levantamos para cantar. Meus olhos
não saíam do meu namorado e, quando o hino terminou, ele olhou em minha
direção e sorriu. Sorri de volta, tentando passar toda confiança e amor que eu
tinha por ele. Soprei um beijo para dar boa sorte, e ele fingiu pegar com a
mão, levando-a até o coração.
“ Às vezes as perguntas são complicadas, mas as respostas são simples. – Dr. Seuss
orquestradas aí, mas não sei exatamente o que está acontecendo. Sei lá, as
explicações do Math são empolgadas demais, eu me perco um pouco porque
acho o entusiasmo dele a coisa mais fofa do mundo — respondi sorrindo,
lembrando de como os olhos dele brilhavam quando ele estava animado.
— Sério? Ah, não, eu vou ouvir muito por ter perdido esse lance,
mesmo sem entender direito — falei tentando prestar atenção. O outro time
O primeiro tempo não teve nenhum gol, mas teve um cartão amarelo a
favor do outro time quando a bola bateu no braço do Nicolas e uma pequena
confusão se formou. Quando o árbitro apitou, os garotos pararam e foram
para o vestiário com caras não muito boas. O Matheus, pela expressão dele,
estava tentando animar o time.
longe um do outro.
Mas não era hora de pensar nisso. “Um dia de cada vez”, repeti
mentalmente.
senti meus olhos encherem de lágrimas, porque sabia bem o que isso
significava.
despencar.
emburrada.
respectivos namorados.
O caminho foi um pouco longo, mas foi bem tranquilo, sem qualquer
imprevisto.
Assim que todos viram a casa da minha tia, ficaram de boca aberta
assim como eu quando vi pela primeira vez. O lugar era incrível, toda de
madeira com janelas e portas de vidro, por causa da maresia, ainda contava
com uma extensa área verde, piscina e um deck que tinha uma vista
maravilhosa para o mar. Depois de abrir toda a casa e acomodar algumas
pessoas eu corri para fechar o quarto que eu e o Math ficaríamos. As outras
pessoas se adaptariam nos outros quartos, que mostrei para todo mundo antes
ver que era a Lu, deixei-a entrar. Ela ainda estava com a mesma roupa.
— Lu, nada disso! Você está entre amigos! Todos nós aqui temos
cicatrizes, algumas visíveis e outras nem tanto, mas isso não nos faz mais
fraco ou pior que ninguém. Não quero que se prive de nada por causa delas
conversando com uma garota que não pude reconhecer. Todos estavam se
divertindo, e isso fez meu coração se encher de amor.
Cada toque.
Cada beijo.
“ Pessoas fortes não põem as outras para baixo. Elas as puxam para cima. “ – Michael P. Watson
tortuoso.
— Quero ficar mais tempo com você. Sinto sua falta — falei.
— Eu sei, também não gosto disso, mas vamos ter que dar um jeito —
ele disse.
minha cabeça no peito dele — mas precisamos pensar em algo. Não suporto
só te ver no fim de semana.
— Não podemos abrir mão dos nossos estudos e dos seus treinos. É o
nosso futuro...
— Sei que não é, eu também não sou! Mas eu sei que eu quero estar
com você e nós vamos fazer dar certo — ele disse me puxando para um beijo.
Concordei com ele, precisávamos fazer dar certo.
Cogitei acordá-lo, mas o dia anterior tinha sido muito cansativo, então
apenas levantei e, de pijamas mesmo, caminhei pela casa, indo até a cozinha.
A maioria das pessoas ainda estavam dormindo, jogadas de qualquer jeito nos
quartos e na sala. Parecia que a festa tinha sido muito animada e, a julgar pela
Remexi nas sacolas que havíamos trazido e achei o café, que coloquei
na cafeteira. Assim que liguei, a Tamires e a Luana entraram na cozinha,
ambas com a cara meio amassada. Imediatamente, ao olhar para mim, a Lu
sorriu de orelha a orelha, deixando-me vermelha.
— Ih, olha a carinha dela! A noite deve ter sido boa, hein? — Tami
brincou.
— Ai, meninas, não vou mentir não, foi maravilhosa! — Falei e elas
se entreolharam, sorrindo, vindo me abraçar. Nós três pulamos juntas,
comemorando, e só paramos de rir quando o Albert entrou na cozinha
coçando os olhos, procurando cegamente por um pouco de água. Pigarreei e
fingi que nada estava acontecendo.
Luana já tinham colocado boa parte da comida, e voltei para a cozinha para
pegar o suco. Foi então que senti mãos em minha cintura e virei a cabeça para
ver um Math de cabelos muito bagunçados.
— Bom dia, meu amor — ele disse beijando o topo da minha cabeça.
Quando percebi que os meninos tinham montado uma rede, pedi para
o Math me ensinar a jogar futevôlei, não deu muito certo. Eu era péssima.
— Math, fala para eles pararem. Ela não quer entrar na água, eles são
surdos? — Falei com urgência.
— Cauã, larga a menina! Não está vendo que ela não está a fim de
brincadeira? — O Math gritou e nós começamos a andar mais rápido.
— É uma brincadeira, Math. Deixa de ser careta — o Thales falou
rindo e eu comecei a me assustar.
enquanto eles se afastavam de nós. A Luana veio para o meu lado com
lágrimas nos olhos.
Não tínhamos mais ânimo para ficar na praia. Voltamos para a casa da
titia e começamos a retirar as coisas dos quartos. Logo, as outras garotas
vieram ajudar a limpar o segundo andar e, quando descemos, os meninos
estavam terminando de limpar a sala, a cozinha e o quintal. Quando tiramos o
lixo, o clima estava um pouco pesado, então antes mesmo do almoço já
estávamos voltando para casa. Se estávamos animados na viagem de ida, a de
volta foi bem silenciosa.
— Sim, mas podia ter sido muito mais sério. E o Thales também é
culpado. Esses garotos precisam aprender a respeitar quando eles escutam um
não!
— Não se preocupe, linda. Essa não é a última vez que os dois vão
folgas extras da confeitaria. Mas eu sei que ela vai me dar se eu explicar os
motivos — falei sorrindo.
namorando o Nico, mas eu sentia falta de ter minha melhor amiga por perto
fazer psicologia, e todos nós aprovávamos a ideia. Eu, é claro, estava muito
animada com a perspectiva de morarmos juntas novamente.
>> Lana, nós vamos fazer alguma coisa amanhã? O Nicolas me ligou
e pediu para eu fazer uma mochila para passar a tarde ao ar livre. Você
também vai?
Franzi o cenho para a tela e respondi:
<< Não sei, eu vou passar o dia com o Math, mas até agora ele não
>> Vish, será que vamos ser só nós dois indo a algum lugar? Eu não
<< Relaxa um pouco, migs! Tenho certeza que vai ser bem legal, só
não esquece de levar repelente! Se o Math me falar alguma coisa eu aviso,
mas eu realmente acho que vão ser só vocês dois...
>> Ai. Ok. Vou tentar ficar calma. Acho que ele deve estar tentando
passar um tempo a mais comigo, agora que os treinos começaram a ficar
pesados a gente quase não se vê.
<< Ah, amiga. Ele quer ser jogador profissional, você sabe como é
uma carreira imprevisível. A gente não sabe para onde ele vai com isso, e eu
>> Ah, Lana, dessas coisas a gente nunca sabe. Vai que o destino
>> Bom. De qualquer forma, eu sei que vocês merecem ser felizes.
Vocês vão encontrar um jeito.
>> Oi, Alana! É o Tadeu, tudo bem? Tem um tempo que a gente não
se fala, né. Poderia me encontrar hoje? Eu sei que já está um pouco tarde,
mas eu queria conversar com você.
Salvei o número dele antes de responder.
<< Oi, Tadeu, tudo bem? Então, não poderíamos nos encontrar
>> Entendi, tudo bem. Pode ser amanhã sim. Às nove, na praça perto
da confeitaria da sua mãe?
Era o Matheus.
que nem você para entender as jogadas — ele respondeu rindo um pouco
— Ei, eu me esforço! — Ri junto com ele. — Mas fico feliz que você
esteja lidando bem com isso, achei que você fosse estranhar mais.
— Eu tenho que lidar, né, amor? Eu quero que a mamãe seja feliz.
— Ah, verdade. Ele me disse que eles iam fazer uma trilha e convidou
a gente. O Nico é todo ligado nessas coisas de natureza. Você quer ir?
vem para cá? Minha mãe e o treinador não vão estar em casa.
— Tudo bem, mas vou depois do almoço, pode ser? Vou fazer umas
coisas de manhã e também tenho que esperar minha mãe chegar.
Já estava bem tarde para voltar a ler, e eu estava exausta. Deitei e logo
devo ter adormecido. Naquela noite, sonhei com a Karen, coisa que há muito
“ Se você não pode mudar seu destino, mude de atitude. “ – Amy Tan
— Faz tudo como planejamos, tem que dar certo dessa vez!
— Eu sei, Laís. Não precisa ficar repetindo isso o tempo todo, eu vou
ser bem convincente e a Alana vai acreditar em mim, tudo vai depender se
você vai conseguir fazer a sua parte.
Torci nariz para o tom petulante dele. Esse garoto me dava nos
nervos, sinceramente! O plano era meu, quem era ele para duvidar da minha
competência?
— Eu vou fazer a minha parte. O Matheus vai estar aqui, você é quem
— Eu sei, garota, que saco! Quantas vezes eu preciso falar que vou
fazer tudo certo? Se liga, você não manda em mim — ele respondeu
revirando os olhos.
— Não, você não manda. Não importa que você tenha idealizado toda
essa merda, nesse jogo ou os dois ganham ou ninguém ganha, coloque isso na
sua cabeça.
— Você está caindo fora!? Achei que fosse mais corajoso, seu
covarde! Vai deixar ele ficar com ela? — Berrei.
— Abaixa a sua voz para falar comigo! E olha, se ela quisesse ficar
comigo, ela ficava. Estou cansado de joguinhos, Laís. Cansado desses seus
maneira muito clara, mas você vive num mundo paralelo e não quer ver as
coisas. Vê se cresce e percebe que toda essa história de que o Matheus só não
está com você por causa da Alana é coisa da sua cabeça. Acorda, Laís!
Mesmo que ele termine com ela, ele nunca vai olhar para você! Você é
egoísta e mimada demais!
— Você é muito iludida! Não conta comigo mais para nada! — Ele
avisou e eu me enfureci ainda mais.
— Quantas vezes eu vou ter que falar? Vou falar diferente para ver se
você entende: eu vou finalmente andar para frente. Tchau, Laís — ele disse
me deixando sozinha no banco da praça.
Berrei de frustração, mas ele nem sequer olhou para trás. E agora, o
que eu ia fazer? Eu não podia ficar parada. Prendi meus cabelos em um coque
e respirei fundo. Precisaria mudar os meus planos e para isso eu precisava
estar calma. Reprimi minha raiva e escondi o rosto nas mãos, tentando bolar
alguma coisa. Eu precisava ter o Math para mim.
— Não brinca, migs! Por que ele fez isso? Que canalha!
— Porque ele é um babaca! Perdi a paciência com ele aqui, foi tão
afrontoso que tive vontade de socar a cara dele. Vê se pode, ele estava
querendo insinuar que meu plano ia dar errado! — Falei ainda nervosa,
minha mente fervilhava.
— Ai, haja paciência para lidar com eles, né? Bando de gente chata!
— Ela disse maliciosa, mas eu não estava com paciência para falar mal das
pessoas.
— Ti, se liga na urgência do negócio! Tem que ter alguém que a gente
possa usar! De repente um dos jogadores, não sei! — Falei esbaforida.
— Eu posso tentar chegar no Albert, acho. A gente ficou na minha
festa... Foi péssimo, mas ele é um dos melhores amigos do Matheus. Se eu
fingir que estou interessada num remember, vamos estar incluídas no círculo
deles.
“ Seja você mesmo, pois para isso não há uma segunda chance. “ – Daniel
<< Tudo bem, Tadeu! Espero que não seja nada grave.
— Bom dia, minha neta! Sua mãe ligou, disse que está chegando e
com novidades.
— Não, pela voz dela foi algo bom. Ela estava muito animada, então
achei que seria caso de comemoração — minha avó disse, deixando-me
aliviada. Terminamos de trazer as coisas para a mesa e logo minha mãe
chegou.
Sozinha.
— Oh, deixe-me olhar você! Está tão linda, filha! E com um brilho
diferente... – ela falou alisando meus cabelos e sorrindo.
— Imagino que sim! Vamos sentar e você me conta tudo. Oi, mamãe
— ela disse abraçando a vovó, e então sentamos as três à mesa, comendo as
delicias que minha avó tinha feito. Contei a elas tudo que havia acontecido lá
(omitindo a minha noite com o Math, isso por enquanto era só de nós dois) e
elas me escutaram atentamente.
precisam ser mais responsáveis, imagina se algo sério acontece sem nenhum
— Sim. Foi bem tenso na hora, tanto que não conseguimos ficar mais
por lá e viemos embora mais cedo — disse com pesar.
cabeça, murmurando algo muito parecido com “esses jovens de hoje em dia”.
— Ah que lindo! Não imaginava que ele fosse assim, parece ser tão
durão — comentei, sorrindo para ela. Eu estava muito feliz por ela também
estar contente.
— Ele quer que nós moremos juntos como uma família. Nos
convidou para morar com ele — ela disse e eu arregalei os olhos para ela.
tempo e eu amo morar com as duas. O convite foi estendido para todas nós,
na verdade, mas não sei o que vocês querem fazer, então eu ainda não dei
uma resposta definitiva.
nos rir.
vivendo com ele, não quero que fique sozinha quando eu for para faculdade
daqui uns meses — respondi dando a minha resposta final.
— Nem me fala disso! Os meses estão passando tão rápido! Não sei
se vou conseguir dormir tranquila com você longe.
— Eu sei, filha. Eu sei. Então é isso. Vamos nos mudar! Vou contar a
novidade ao Brian. Ele está animado com tudo isso, o Jordan também.
— O Jordan já sabe?
— Nós conversamos com ele antes de vir para cá. O garoto mal podia
conter a animação, disse que vai adorar te ter como irmã adotiva — ela disse
rindo e eu ri junto.
O Jordan nunca ficava muito tempo triste, mas eu ainda queria saber o
que estava acontecendo com meu amigo. Fiz uma anotação mental para falar
com ele mais tarde.
— Vai ser uma fase muito boa na nossa vida, mãe. Eu te amo.
Sorri para ela e subi para me ajeitar para ir até a casa do Matheus. Fiz
uma mochila com umas coisas básicas, me despedi de mamãe, da vovó e fui.
A manhã estava muito bonita, então coloquei uma Playlist bem alegre
Muita mesmo.
QUARENTA E CINCO
“ Nós damos sentidos ao nosso mundo por meio da coragem de nossas perguntas e da profundidade de
nossas respostas. “ – Carl Sagan
treinador, me deu uma pequena bronca por deixar tudo jogado por aí,
sabendo que a responsabilidade de manter as minhas coisas no lugar era
minha e todo aquele blábláblá de sempre. Ela estava certa, claro, mas eu não
pude deixar de revirar os olhos antes de dizer que, quando ela voltasse, ia
estar tudo no seu devido lugar. Ela então sorriu para mim e eu pude ver o que
há muito tempo eu não via nos olhos dela: felicidade plena. Prometi para
mim mesmo que faria o possível para mantê-la assim.
fui arrumar as roupas que eu deixara espalhadas por aí. Liguei o som e resolvi
passar uma vassoura no chão, porque queria deixar tudo perfeito para a
Alana.
Depois de terminar, bebi uma boa caneca de café para estar mais
alerta, fui tomar banho e me arrumei para esperar a minha namorada. Quando
a campainha tocou, corri para atender imaginando que fosse ela, mas não era.
— Claro, entra aí — falei abrindo mais a porta para permitir que ela
passasse.
— Precisava falar com você, não queria mandar mensagem nem nada
disso, preferi vir pessoalmente — ela se explicou sentando no sofá.
— Pode falar, Laís — respondi rezando para que fosse algo rápido. A
Alana não ia gostar de encontrá-la quando chegasse.
sobre isso.
não vai muito com a minha cara, fiquei pensando que talvez você se sentisse
da mesma forma — Laís disse com tristeza na voz. Balancei a cabeça
negativamente.
algumas coisas das quais eu não me orgulho, mas estou tentando me redimir.
Observei-a por alguns instantes. Algo me dizia que ela não viera
apenas para pedir desculpas, mas ela parecia verdadeiramente arrependida.
“Bom”, pensei. “Quem sou eu para julgar alguém, não é?”
— Vai dar certo! Os dois merecem ser felizes. Mas viu, eu já vou, tá?
Só queria te pedir desculpas e deixar as coisas às claras para ficar mais
tranquila.
Sentei no sofá para esperar a Alana, que já devia estar chegando. Mas
se passou mais de meia hora e ela não tinha chegado, então comecei a ficar
preocupado e mandei mensagens para ela.
>> Morena, tô ficando preocupado, você falou que estava vindo e até
agora não chegou aqui!
>> Amor, me diz onde você está! Vou ligar para sua casa, já estou
preocupado.
Esperei exatos dez minutos, mas não obtive nenhuma resposta. Liguei
para casa dela já aflito.
— Ela ainda não chegou, achei que ela estivesse indo para sua casa —
ela disse e senti uma pontada de preocupação.
— Então, eu também achei, mas até agora ela não chegou, eu estou
ficando preocupado.
— Calma, querido, eu vou ligar para ela e vê o que está acontecendo,
se eu conseguir fala com ela, eu mando ela te ligar.
uma mensagem.
>> Não precisava ter ligado para minha mãe. Para de me mandar
mensagens e me deixe em paz, Matheus. Se tem uma coisa que eu não quero
fazer nesse momento é falar com você.
QUARENTA E SEIS
“Poxa, será que elas não cansam nunca?”, pensei escondendo o rosto
nas mãos, frustrada.
Era a Laís.
santinha.
Fechei meus olhos e os apertei com força. Eu não iria chorar por isso.
pouco receosa de deixar a minha casa e a minha avó para trás, mas que faria
tudo para minha mãe ficar feliz depois que eu fosse embora. Queria que ele
me tranquilizasse, desse apoio e dissesse que tudo ficaria bem. Mas não, ele
estava com ela, na casa dele, mesmo sabendo tudo o que ela fez comigo,
conosco.
Assim que cheguei na praia, aproveitei que o sol não estava muito
Meu celular vibrou novamente e dessa vez era o Matheus. Tinha três
mensagens dele.
>> Morena, estou ficando preocupado, você falou que viria daqui a
pouco e até agora não chegou aqui!
era o Matheus. Se Fábio Junior cantava “Só você”, só podia ser a minha mãe.
— Oi, filha. Onde você está? Achei que tinha ido para casa do
Matheus, mas ele acabou de me ligar e nem sabe onde você está — ela falou
bem rápido, parecendo aflita.
— Eu ia para casa dele, mas mudei de ideia, mãe. Vim para a praia.
— Não, nada. Está tudo certo, fique tranquila. Eu vou avisar ao Math
onde eu estou. Só estava precisando de um tempo para mim, mais tarde eu
volto para casa!
— Eu também, beijo!
>> Amor, me diz onde você está! Vou ligar para sua casa, já estou
preocupado.
<< Não precisava ter ligado para minha mãe. Para de me mandar
mensagens e me deixe em paz, Matheus. Se tem uma coisa que eu não quero
fazer nesse momento é falar com você.
>> O quê? Por que não quer falar comigo? Que diabos aconteceu?
Eu não estou entendendo nada! Onde você está?
<< Eu não quero falar com você porque você me prometeu que não ia
falar com ela e, depois de tudo que ela aprontou, você deixou ela entrar na
sua casa!
>> Ah, você encontrou com a Laís? Amor, ela veio aqui para pedir
desculpas e está bem arrependida! Ela nem ficou nem muito tempo, nada
aconteceu!
acreditar!
<< Claro que não vão ser melhores amigos, até porque amizade é
algo que ela não quer de você.
>> Você está exagerando, me fala onde você está que nós vamos
conversar direito.
>> Nada disso, vamos conversar hoje! Não quero que você fique
criando coisas que não aconteceram na sua cabeça.
<< Eu já disse que hoje não. Será que você pode me respeitar? Até
amanhã, Matheus.
“ Mire na lua, porque, mesmo que você erre, acabará entre as estrelas. “ – Les Brown
— Ela vai ter dois eventos essa semana e disse que precisa adiantar.
Acho que vocês irão mudar fim de semana que vem.
— Sim, minha neta. Chegaram algumas flores para você, junto com
uma carta. Coloquei tudo no seu quarto.
quem era.
“Alana,
amo, mas não posso amar sozinho. Uma vez você disse que não iríamos
brigar por coisa pouca e que iríamos confiar e conversar um com o outro
sempre, mas isso não está acontecendo. Você foge sempre que tem a
oportunidade e eu não sei mais o que fazer. Depois da noite linda que
tivemos, eu achei que tudo ficaria bem, mas estava enganado. A confiança é
a base de um relacionamento e o nosso está desmoronando.
Matheus.”
atentamente
— Meu amor, acho que com tudo isso que aconteceu entre vocês, um
tempo não é de todo o ruim, nesse momento acho que é até o melhor para os
dois — ela disse afagando meus cabelos.
— Está doendo agora, mas vai passar, tudo vai ficar bem. E eu vou
marcar um horário para você com a terapeuta da Lu, você está precisando
conversar um pouco com ela. E nem invente de negar.
Ela ficou comigo por um tempo e depois voltou para o seu quarto.
Deitei e tentei controlar meus sentimentos. Estava olhando as minhas fotos
com o Matheus quando recebi uma mensagem da Luana.
<< O Math pediu um tempo. Acho que ele cansou do meu ciúme
excessivo, eu mereci.
>> Nada disso! Estou indo aí para você me contar essa história
direitinho.
<< Não, Lu. Hoje não, eu preciso ficar sozinha, mas te conto tudo no
colégio, tudo bem? Passa aqui e nós vamos juntas.
me desse coragem para ir para o colégio no dia seguinte. Eu não sabia se iria
suportar ver o Matheus sem poder tocá-lo.
QUARENTA E OITO
“ A vida não é medida pelo número de vezes que respiramos, mas pelos momentos que nos tiram o
fôlego. “ – Autor desconhecido
Quando o sol raiou, abri os olhos e senti uma enorme tristeza, mas
demorei alguns segundos até lembrar o motivo. Quando lembrei, me encolhi
inteira, sem querer levantar.
Vamos acordar?
Se a minha mãe achou que tinha que me acordar, é porque ela estava
muito preocupada, e isso era tudo o que ela não precisava. Suspirando,
levantei e tentei dar um sorriso para ela, que nem por um segundo acreditou
que eu estivesse bem.
Eu baixei a cabeça, tentando não chorar e fui para sala, com uma
Luana muito aflita segurando minha mão.
frente, bastante atento na aula, ao contrário de mim, que não parava de olhar
para a nuca dele, esperando que ele me desse um pouquinho de atenção.
— Pode deixar, obrigada — agradeci indo até minha mesa para pegar
meu material e saí da sala sem olhar para trás, sentindo muitos pares de olhos
nas minhas costas.
não podiam curar a tristeza, então fui até os jardins perto da quadra e me
deitei na grama, sentindo o calor do sol no meu rosto, permitindo-me chorar.
— Não vem com essa, Jor. Nós somos quase irmãos agora. Você não
confia em mim?
— Eu nunca faria isso, Jor. As pessoas que fizeram isso com você são
— Aquela velha história. Ele era meu amigo primeiro, aí um dia ele
me beijou do nada. Eu achei que ele estivesse só experimentando, mas acabei
me envolvendo igual, e quando eu vi, ele estava se declarando e me pedindo
em namoro. A gente foi bem feliz por um tempo, só que tu sabe como é gente
heteronormativa, né? Tinha que ser tudo escondido. Se a gente queria sair,
tinha que ser em outra cidade, se a gente queria privacidade, tinha que ir para
o motel. Quando a gente ia para o colégio, ele me ignorava. E eu, bobo,
aceitava tudo, porque eu amava ele demais — ele disse fungando.
soco no estômago por si só. Mas eu relevava, tentava pensar que ele
precisava se proteger, ninguém sabia que ele era gay. Enfim. Eu devia ter
terminado tudo nesse momento, né?
Meu coração doeu de saber que o Jordan tinha passado por isso. Ele
estava sempre tão feliz, tão animado. Nunca imaginei que algo tão sério tinha
acontecido. Eu sabia que alguns caras tinham feito a vida do Jor bem difícil,
mas nunca pensei que alguém pudesse ser tão baixo.
— Era — ele riu sem humor. — Agora eu vou só para ficar perto da
minha mãe, já que ele resolveu postar no Facebook que vai se mudar para
Santa Catarina com a namorada dele.
post dele dizendo que tinha se inscrito pra UFSC, que estava ansioso para
morar em Floripa. Achei muito esquisito, ele não tinha me falado nada. Então
fui olhar o perfil e ele tinha postado uma foto beijando uma conhecida nossa.
E os amigos babacas dele todos comentando sobre o quanto ele era sortudo,
já que ela é “mó gostosa” — ele fez aspas no ar. — Aí eu percebi que ele era
— Ai, Jor, eu não acredito que ele teve a pachorra de fazer isso com
você! Que babaca! — Falei extremamente indignada. — Como alguém podia
ser tão sujo com outra pessoa? É compreensível não estar pronto para se
assumir, mas usar as pessoas para manter uma imagem é extremamente
desprezível.
— Então vamos fazer o seguinte. Hoje foi a última vez que nós
choramos por causa de homem, ok? — Estendi o mindinho para ele e
selamos o pacto.
— Mas tu e teu homem logo vão se ajeitar. Não faz essa cara que eu
tenho certeza disso.
Eu não tinha certeza, mas a verdade é que, depois daquele dia, nós
dois começamos a nos recuperar e eu não chorei mais. O Jor voltou a ser o
Algumas noites depois, minha mãe e o agora noivo dela tinham saído
para uma festa de casamento de um dos amigos do Brian, deixando o Jor e eu
como responsáveis pela confeitaria. Minha mãe tinha deixado muita coisa
pronta, e a funcionária nova da cozinha, a Olga, estava cuidando do resto.
Era a primeira vez desde que nós demos um tempo que eu via ele
sozinho. O Matheus me encarou por um tempo, a expressão impassível, e
depois sentou em uma das mesas, pegando o cardápio distraidamente.
— Não faz isso, Jor! Por favor, faz isso por mim.
— Não quero falar com ele aqui, não agora, por favor!
— Não tem conversa, Alana. Vai até lá! — Ele disse colocando o
— Eu sei que não, tive que ser corajoso por nós dois. Foi bem difícil.
Não era novidade nenhuma ouvir isso, mas eu fiquei feliz de ouvi-la
— É, tentei lidar com isso da melhor maneira que pude, mas me doía
saber que você não confiava em mim — falei surpreendendo até a mim
mesmo com a mágoa na minha voz. Apertei a mão dela novamente quando os
olhos dela se encheram de lágrimas.
— Tenho que fechar a loja com o Jordan hoje, minha mãe saiu com o
Brian.
fez o mesmo. Acariciei seu rosto e lhe dei um beijo, estava com tanta saudade
de tê-la perto de mim. — Senti muito a sua falta, bruxinha — disse e ela
sorriu.
Fui de moto até minha casa, indo direto para garagem e colocando na
mala do carro a barraca de acampamento. Entrei em casa colocando alguns
refrigerantes em lata e suco no cooler. Separei algumas coisas para a gente
comer, mas logo percebi que teria que passar no mercado antes de ir buscá-la.
Peguei o celular e mandei uma mensagem para o Nicolas e, quando ele
respondeu afirmativamente, dei a partida no carro e coloquei a música bem
alta. Estacionei na casa do Nico e ele veio até o carro trazendo uma caixa
com toras de madeira que ele colocou no porta-malas. Em seguida, ele abriu a
porta e sentou ao meu lado.
— A vida é agora e não há tempo para perder. Não é isso que você
sempre.
mim.
— Vai lá buscar sua mina, mas não esquece que você prometeu pagar
o Uber de volta — ele disse e eu revirei os olhos, mas mesmo assim agradeci
pela força.
do carro.
dias, está sendo bem legal ter o Jordan oficialmente como meio-irmão.
— Posso imaginar, ele é um cara bem legal. Sua avó foi também?
— Não, ela disse que preferiria ficar em sua própria casa, então
respeitamos a vontade dela. Vou visitá-la sempre que tenho um tempo livre e
ela me obriga a assistir a Maria do Bairro — falei e ele riu um pouco.
comer, ali com certeza tinha comida mais que suficiente para nós dois, afinal
o Math comia muito quando resolvia sair do plano de alimentação do
treinador dele.
confiança. Com o tempo irei confiar mais em você, por isso tenha ainda mais
paciência comigo, tudo bem?
confeitaria.
— Sim, do jeito que a minha mãe sonhou, estou muito feliz por ela —
falei e ficamos um tempo em silencio contemplando o luar.
— Ah, eu gostei! Apesar de nunca ter ido até lá, algumas pessoas
disseram que lá é lindo e super romântico.
— Não vivo bem sem você, então acho que vamos ter que dar um
jeito de estar sempre ao lado um do outro.
“ Neste mundo, é preciso ser bom um pouco demais para ser bom o suficiente. “ – Pierre Carlet de
Chamblain de Marivaux
O Math estava bem ansioso, ele esperara por isso por muito tempo.
Era o jogo que definiria tudo. O Tiago tinha treinado ele muito bem e ele
estava cheio de expectativas. Eu estava feliz por ele, mas também estava
provocações tinham cessado e concluí que ela estava, como todos os outros,
preocupada com o vestibular e também muito ocupada com a comissão de
formatura, afinal tanto a viagem quanto a festa estavam chegando.
Considerando que a festa seria apenas alguns dias depois das provas finais,
eram várias coisas para fazer ao mesmo tempo.
Caminhei até ela e sentei do seu lado, esperando ela falar alguma
coisa. Mesmo estando mais na dela, aquela garota nunca perdia a
oportunidade de me provocar. Mas ela nem ergueu os olhos do livro.
minutos.
— Tudo bem... olha, não vou pedir desculpas por tudo porque eu não
faço isso, mas acho que podemos pelo menos tentar nos dar bem nessa
viagem, ok? Afinal, depois que tudo isso acabar a gente não vai se ver tanto e
eu não quero que você leve para sempre a imagem de que eu era uma pessoa
tão ruim.
farpas lançadas uma contra a outra? Meu jesus, eu estou bem chocada!
— A Laís não é de todo ruim, lembro que ela mudou bastante depois
que os pais se separaram. A Karen que era bem próxima a ela na época, e
depois disso começou a afastar todo mundo, falar mal da Karen e espalhar
boatos maldosos. Foi o jeito que ela conseguiu lidar com tudo, eu acho.
Espero que ela tenha de fato amadurecido. Mas ei, vamos logo no shopping,
preciso de um biquíni novo com urgência.
ligou.
colégio.
— Pois então. O jogo está cada vez mais próximo, estou começando a
ficar ansioso.
— São só alguns dias, amor. E você pode vir com a gente se quiser —
sugeri animada, mas ele não pareceu gostar muito da ideia.
— Estava pensando em algo mais romântico, ano que vem, com a
faculdade, nosso tempo juntos vai diminuir bastante.
Mas eu vou descansar, preciso dormir para estar descansado para as provas
de amanhã.
— Até, bruxinha.
para casa relaxar, então foi exatamente isso que eu fiz. Assim que cheguei em
casa, engoli o meu almoço e subi para meu quarto. Descansei até a hora de ir
para o cursinho, para o qual eu fui me arrastando. A prova de física esgotara
as minhas energias.
Mais tarde, naquela noite, depois de eu arrumar minha mala para o dia
— Queria saber como você estava, quando seria sua formatura e onde
— Que vem para sua formatura e que quer que você passe algumas
semanas das férias com ele — ela comentou e eu senti a irritação me
dominar.
— Ahhh, mãe! Fala sério, pensei em passar esse tempo com o Math.
— Alana, ele é seu pai! Vocês mal se viram durante esses anos.
— Se não nos vimos, não foi por culpa minha — reclamei
amargamente.
— Eu sei que não foi culpa sua. Mas se ele deu o primeiro passo, cabe
a você dar o segundo.
— Não sei de onde veio esse interesse súbito em mim. Olha, eu vou
passar uns dias com ele sim, só para não parecer ingrata, mas o Math não vai
— Ele supera isso, vocês têm a vida toda para ficar juntinhos — ela
falou e eu senti um peso no estômago.
— Não sei disso, mãe. O Math tem quase certeza que o olheiro vai
levar ele para o tal time que ele tanto quer ir. Ele está se esforçando como
nunca. Eu assisti aos jogos, ele foi incrível.
— Eu imagino, mas não podemos prever o futuro. Quem sabe ele não
vai para a tal da USP com você? — Ela disse sorrindo, mas eu não retribuí.
— Ele não seria feliz se fosse — falei com pesar e ela me abraçou,
fazendo um cafuné em meus cabelos e eu adormeci novamente.
CINQUENTA E DOIS
“ Se alguma vez se sentir perdido, deixe o coração ser sua bússola. “ – Emily
— Eu percebi, sua mãe disse que você pegou no sono. Eu não cheguei
muito tarde, o Jordan mandou mensagem cedo demais — a Luana comentou
fazendo uma careta.
— Nós precisávamos dormir cedo, né, gata? Eu sei que tu queria ficar
com o teu boy, e eu também queria ficar com o meu, mas aí nós não íamos
aproveitar em nada a viagem! — O Jordan retrucou, fazendo a Luana rir.
— E como estão as coisas com o Lucas? — Eu perguntei servindo-me
de café.
— Bem boas. É muito cedo para afirmar qualquer coisa, mas ele é
bem atencioso. E pegou na minha mão em público, o que é algo que o meu ex
nunca faria.
— Que máximo, Jor. Você merece! Mal posso esperar para sairmos
— Alana, minha tia me disse que vamos poder ficar no apê dela lá em
São Paulo! — A Lu exclamou sem tirar os olhos do celular.
— Sim, estou tentando controlar minha ansiedade, mas você não sabe
o quanto estou feliz por estarmos indo juntas.
— Ah que bom! Engenharia ambiental que ele quer fazer, né? Tomara
que ele passe! Como eu queria que as coisas fossem mais simples e que o
Math pudesse ir também, mas eu sei que não é isso que ele quer.
— Ele quer jogar futebol, Lu. Esse olheiro vai decidir o futuro dele e
talvez não seja comigo ao seu lado... É tão difícil aceitar isso — falei com
algumas lágrimas molhando os meus olhos.
— Não fica assim! Viva o agora, Lana. O Nicolas vive dizendo isso, e
ele está certo, sabe? Não pensa no futuro, curta esse momento com ele e crie
memórias inesquecíveis, assim, mesmo que vocês estejam longe, ainda estão
pertos um do outro — ela disse e suas palavras aqueceram meu coração.
ele.
— Estou chocada com aquele casal — ela disse olhando para a Laís
de mãos dadas com o Tadeu.
— Percebi no barco. Sei lá, acho que as brigas eram amor reprimido.
Pelo jeito eles resolveram o conflito, porque eles estavam bem diferentes.
Fiquei observando como ele agia perto dela e como ela agia perto dele, a Laís
nunca se permitiu enxergar ninguém além do Matheus.
— Isso foi algo que vimos claramente durante esses anos, mas acho
que depois que vocês voltaram, ela se aquietou mais.
pedra verde. Chegando lá, vimos uma placa indicando que ela estava dentro
do lago e que teríamos que mergulhar.
terceira pista.
ida, que foi bastante animada, a volta foi muito silenciosa. Estávamos todos
muito cansados e eu dormi no ombro do Math o caminho inteiro.
— Sua mãe acordou enjoada. Ontem ela sentiu umas tonturas, e como
ela estava dormindo, preferi não a acordar e eu mesmo vim buscar vocês.
— Foram poucos dias, mãe. Como está? Soube que não anda se
sentindo bem.
— Já estou melhor. Deve ser essa virose que está se alastrando pelo
bairro.
— Pode deixar, mocinha. Mais tarde a sua avó vem jantar aqui, ela
quer te ver, está com saudades.
— Também estou com saudades dela, mas agora vou tomar um banho
e descansar. Depois eu desfaço as malas, ok?
>> Amor, vou dormir, ainda estou muito cansada. De noite nós nos
falamos. Te amo.
Minha mãe concordou quando eu pedi permissão que ele viesse dormir
Esperei que ele chegasse e fomos direto para meu quarto. Ele
imediatamente se jogou na cama e sorriu para mim, mas pedi que ele
esperasse um pouco. Depois de escovar os dentes, vesti o meu pijama me
vai conseguir.
Ele sorriu e ergueu a mão para colocar meu cabelo atrás da minha
orelha.
“ Este é o início do conhecimento: a descoberta de algo que não entendemos. “ – Frank Herbert
— O que aconteceu?
Meu coração se quebrou, mas eu precisava ser forte por ele, então
muito calmamente soltei as nossas mãos para segurar seu rosto e falei:
— Tiveram sim. Se você não tivesse ido tão bem em todos os outros,
o time não estaria na final do campeonato hoje.
— Estou com medo de não ser bom o suficiente. Eu não sou o Alex
— ele praticamente sussurrou.
— Não é mesmo, mas você é tão talentoso quanto ele era. Dê o seu
melhor em campo hoje, meu amor. Vai ser mais que o suficiente — falei
abraçando-o.
Não havia muito tempo para consolá-lo, mas eu senti seu corpo
— Eu te amo, Alana. Não sei o que faria sem você — ele disse me
beijando e me abraçando ainda mais forte.
O Brian a carregou até o carro e eu fui atrás, assim como o meu meio-
irmão.
— Vou levar ela para o hospital, sua mãe é muito teimosa, Alana.
Estou falando com ela para ir desde que você voltou — ele disse nervoso e
— Eu vou com você, minha mãe nunca passou mal desse jeito —
falei e ela olhou para mim, piscando.
consultório.
sem mim.
— A sua mãe quer falar com você. Ela está sendo levada para
enfermaria, vai ter que ficar mais umas horas aqui. Vem que eu vou te levar
— Não, meu amor. É uma coisa maravilhosa. Você vai ganhar mais
um irmãozinho ou irmãzinha, eu estou grávida — ela me contou e eu
arregalei os olhos.
— Também te amo, meu amor. Sabia que você ia ficar feliz — ela
beijou minha bochecha e eu a encarei emocionada.
— É, mas vai dar tudo certo. O Brian com toda certeza vai estar lá por
você em todo o processo. Ah, mamãe, mal posso esperar para conhecer esse
neném lindo! Espero que ele resolva nascer em uma semana tranquila, eu
quero poder viajar para vê-lo nascer!
— Eu vou te querer do meu lado, filha. Mas agora vai para o estádio,
vai lá apoiar o Math, eu vou ficar bem — ela disse me abraçando e eu assenti,
dando-lhe mais um abraço e correndo para fora do quarto, dando de cara com
um Brian muito sorridente.
Pelo tempo que havia passado, eu sabia que o jogo já tinha terminado.
— Você ajudou! Sem você, o Matheus não teria jogado, e ele foi a
estrela do segundo tempo!
— Ai, meu Deus! Tenho certeza que sim, o Matheus treinou muito
para esse momento. Ah, quantas notícias boas hoje! Mas e você, não pretende
seguir carreira profissional?
pegada sempre foi a natureza! E eu pretendo ir para São Paulo com vocês —
ele informou.
— Você e a Lu eu tenho certeza que vão, mas eu, já não sei. Você já
deu uma olhada na concorrência de Ambiental na USP? Mas de qualquer
forma, eu não me importo de me encaixar em qualquer outra faculdade em
São Paulo. Eu só quero estar perto da Lu.
— Ah, não, você é muito fofo, Nicolas. Vai lá encontrar com ela que
eu tenho certeza que ela está doida para te dar os parabéns — falei
abraçando-o novamente.
aparência séria, que assumi ser o olheiro. E logo atrás deles saiu o Matheus,
com os olhos cheios de lágrimas.
Assim que ele me viu, veio correndo até mim e me abraçou. Ele me
apertou em seus braços sussurrando que tinha conseguido e eu não podia
estar mais feliz por ele. Choramos juntos e, quando ele me beijou, foi como
se pudéssemos compartilhar tudo o que não conseguíamos dizer em palavras.
sobre o jogo e toda a adrenalina que ele tinha sentido. Eu apenas o escutei,
em silêncio. Não conseguia nem mesmo olhar para a comida.
diferentes. Vá para Espanha e seja o melhor jogador que eu sei que você pode
ser. Siga os seus sonhos e eu vou seguir os meus — falei já não controlando o
choro.
— Então vai ser assim? Lutamos tanto para morrer na praia? Você
está terminando comigo mesmo eu dizendo que desisto de tudo para ficar
com você?
— Não, estou terminando com você porque não quero que você
desista dos seus sonhos por ninguém.
sono agitado e cheio de pesadelos. A mamãe tentou falar comigo, mas eu não
conseguia explicar sem cair em prantos, então ela chamou o Jordan, que ligou
para a Luana. Eles ficaram comigo, pacientemente esperando que eu estivesse
pronta para falar e tentando me distrair falando sobre uma série de televisão
que eles estavam assistindo. A mamãe nos fez descer para jantar e eu engoli a
comida sem sentir o gosto de nada.
Eu não tinha falado com o Math, mas eu sabia que eu teria que
encará-lo no dia seguinte. O dia da nossa formatura.
Mas eu não podia ser egoísta, o Matheus merecia tudo de melhor que
a vida poderia dar a ele.
Aproveitei o tempo livre para ligar para o meu pai para combinarmos
minha visita. Eu iria para casa dele logo depois da formatura e só voltaria
Meu coração doía de tanta saudade que eu sentia dele, mas a escolha
havia sido minha e eu precisava seguir em frente.
Depois de prontas, ela me deu um abraço e disse que ficaria tudo bem,
o que quase fez com que eu recomeçasse a chorar, mas consegui me controlar
porque não queria estragar a maquiagem. Descemos e encontramos o Jordan
— Ah, minha irmã. Eu sei que você esteve comigo esse ano, cuidando
de mim e acompanhando toda a turbulência que aconteceu. Mas eu sinto sua
falta todos os dias. Especialmente agora... — falei, voltando meu olhar para a
minha foto com o Matheus. Estava cogitando tirá-la também quando escutei
sua voz atrás de mim.
— Eu sei, mas isso foi o melhor para nós dois — falei me virando
para encará-lo.
— Para de dizer que isso foi o melhor para nós dois. Não é o melhor
para mim, Alana — ele gritou.
— Mas para mim é!
sofrendo assim como eu — ele disse passando a mão nos cabelos, frustrado.
— As coisas não são tão simples, Matheus. Olhe para além de nós
dois e você vai ver que não são tão simples.
— Tudo que importa para mim somos nós dois, Alana. E nada mais.
Eu te amo.
Fui para casa com a cabeça rodando. Muita coisa havia acontecido
naquele ano. Eu perdi uma das pessoas mais importantes da minha vida, mas
também me apaixonei perdidamente e conheci pessoas que levaria para
sempre em meu coração. E nada fora em vão.
nunca estive tão feliz quanto naquele dia, foi um dos nossos momentos
únicos, aqueles nos quais eu sentia que você me amava na mesma proporção
que eu te amava.
as consequências.
A Lu está muito feliz com o Nicolas, mas eu sei que você sabe disso.
Sei que ela manteve contato com você durante esses anos, mas mordi muito
minha língua antes de perguntar qualquer coisa.
Eu não sei onde você está agora, nem para que time está jogando, e
sei que eu não tenho nem o direito de te pedir isso depois de anos ignorando
suas mensagens.
Pois então, espero te ver amanhã, mas caso você não apareça,
saberei que esse é o sinal para eu seguir em frente de uma vez por todas.
Matheus, que tinha pegado com a Lu no dia anterior. Ela praticamente surtou
de felicidade ao digitar o número em meu celular.
Ela torcia muito por nós dois e me mostrava isso em cada sessão
informal de terapia que fazia comigo no meu quarto. Minha futura psicóloga
só se formaria no ano seguinte, assim com o Nico, mas eu já havia entregue o
TCC e sido aprovada com nota máxima.
que soube tirar forças dos seus traumas de maneira sublime. Eu a amava, ela
era como uma irmã para mim.
— Vish, está chateada, amiga? Desabafa aí, o que foi que aconteceu?
Achei que você já estaria começando as produções para a formatura.
— Por que isso agora? Você estava tão felizinha quando eu saí daqui
mais cedo. Não conseguiu falar com o Math? — Ela perguntou e eu me virei
para a parede apenas para não a encarar.
— Não respondeu. Eu não sei porque achava que ele iria querer falar
comigo depois de tanto tempo — falei controlando as lágrimas que enchiam
meus olhos.
— Ele deve estar ocupado, Lana. Nem o Nicolas consegue falar com
ele às vezes, de tão atarefado que ele está — a Luana disse. — E olha que os
dois não se desgrudam, às vezes eu tenho que cancelar meus planos porque o
meu digníssimo namorado estava conversando com o Matheus e se atrasou
para nossos compromissos. Uma hora ou outra ele vai te responder, agora
levanta que nós vamos até aquele salão que tem perto do campus, sua mãe vai
me matar se chegar aqui amanhã e ver que você nem fez as unhas ainda —
ela falou me puxando.
sempre que podia. O Jor nem sempre conseguia voltar ao mesmo tempo que
eu, mas em todas as férias de verão nós passávamos uma semana em São
Paulo e uma em Porto Alegre antes de irmos visitar nossos pais no Paraná.
Assim como a Lu, ele ainda iria demorar um ano para se formar.
emocionante surgiu.
Deitei na cama e mais uma vez olhei para o celular. Ainda não havia
nada.
Durante esses quatro anos, minha carreira teve altos e baixos. Troquei
de time, de empresário, de país. Muitas coisas mudaram na minha vida.
Depois que o jogo acabou, lavei os pratos que tinha usado e me joguei
na cama com o celular na mão. E qual não foi a minha surpresa ao me
deparar com uma mensagem dela?
Mesmo depois de tanto tempo, o que eu sentia pela Alana não tinha
mudado. Eu custei a entender que o que ela tinha feito, mas anos depois eu
sabia que tinha realmente sido o melhor para nós dois.
E foi assim que eu decidi que eu não podia procurá-la e tinha que a
acompanhar de longe, sabendo de tudo o que acontecia com ela através do
Nicolas ou da Luana, que falavam comigo constantemente.
Depois de ler e reler sua mensagem, eu respondi com o coração
acelerado devido a emoção:
<< Sinto muito a sua falta e estou muito orgulhoso por você estar
realizando seu grande sonho. Eu ainda te amo, e muito. Me espera amanhã,
vou voltar por você e pelo nosso amor.
jogo. E tratei logo de procurar rapidamente algum voo para São Paulo.
Encontrei um que sairia na manhã seguinte, o que me daria tempo de avisar
ao meu empresário e ir conversar rapidamente com o treinador, já que eu
havia sido escalado o próximo jogo.
Mandei uma mensagem para minha mãe avisando que estava indo
para São Paulo, caso ela quisesse me encontrar lá, e meu celular notificou
outra mensagem da Alana.
empresário. Ele achava a viagem arriscada, mas torcia para que eu estivesse
de volta a tempo do jogo.
aqui perto — ele disse pegando a minha mala e colocando-o no porta malas
de um carro alugado.
quarto de hotel, minha mãe me recepcionou com um abraço que só ela sabia
dar.
Assim que chegamos lá, percebi que boa parte da cerimônia já havia
Ela havia conseguido realizar o seu sonho e eu não poderia estar mais
feliz e orgulhoso.
— Você veio mesmo, não acredito que você está aqui — ela disse
sorrindo.
— Eu vim por você, meu amor. Você não sabe o quanto senti sua
falta.
mim, me dando total liberdade para lhe dar um beijo longo e apaixonado.
— Só se for louco por você. Não quero mais ficar longe de você,
Alana.
Perguntei esperançoso
precisava falar com a mãe antes de responder. Enfim, a dona Susana assentiu
e a Alana voltou-se para mim, sorrindo.
— Espero que você cuide bem da minha filha lá em Madri, viu rapaz!
— A dona Susana disse me abraçando.
— Cara, quanto tempo! Quer dizer nem tanto tempo assim, mas dessa
vez você mal chegou e já vai embora! Nem vai dar tempo de te dar uma surra
no videogame como na outra vez — ele disse me puxando para um abraço.
— Só nos seus sonhos! Mas dessa vez vim só para buscá-la. Tem
noção de quanto tempo esperei por isso?
— Tenho sim. Esqueceu que era para mim que você ligava quando
bebia demais? Agora acabou o chororô, aproveita agora cada segundo com
ela, porque é isso que eu vou fazer com a Luana — ele disse olhando para a
FIM
SOBRE A AUTORA
Mila Maia é baiana, Pedagoga e uma leitora voraz que resolveu se arriscar no
mundo da escrita. É viciada em romances, gênero em que se encontrou como
escritora. Autora da Trilogia Chances, ela possui outras obras na Amazon e
no Wattpad.
Facebook: www.facebook.com.br/autoramilamaia
Instagram: @autoramilamaia
Email: autoramilamaia@gmail.com
Wattpad: @autoramilamaia
AGRADECIMENTOS
resultado final.
A todos aqueles que conheci através dos meus livros, não posso citar
todos, pois com certeza acabaria esquecendo de alguém, mas saibam que
lembro de cada um. Muito obrigada por acreditarem em mim e por me
inspirarem tanto.
OUTRAS OBRAS DA AUTORA
Livros:
Mais uma chance para o amor – Trilogia chances – I
Uma nova chance ao amor – Trilogia Chances – II
Outra chance ao amor – Trilogia Chances - III
Apenas fique
Apenas um olhar
Box Trilogia Chances
Contos:
Na ponta dos sonhos
NEROS
Cartas para mamãe
Um doce reencontro
Uma chance para recomeçar – Um conto da Trilogia Chances
O natal da família Sullivan – Um conto de natal da Trilogia Chances
CRÉDITOS
Copyright 2018 © Mila Maia
Capa: ML Capas