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Copyright © 2019 Larissa Braz

Capa: Mia Klein


Revisão: Carla Santos

Livro registrado na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em Julho de


2019.
Goiás – GO, Brasil, 2019.

Todos os direitos reservados.


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CONTATO:
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SUMÁRIO
CONTATO:
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
EPÍLOGO
NOTA DA AUTORA
OUTROS LIVROS DA AUTORA
BIOGRAFIA
Dedico o fim dessa história para você que acompanhou Maya e Victor até
aqui. Deixo nessa dedicatória o meu muito obrigada. Espero que se divirta.

Com amor,
Larissa Braz
Tudo o que você precisa para realizar seus sonhos , é apenas acreditar que
é possível torná-los realidade, sejam quais forem.
Victor White
PRÓLOGO

Tudo o que você precisa para realizar seus sonhos, é apenas


acreditar que é possível torná-los realidade, sejam quais forem. Às vezes, é
difícil chegar lá, mas não impossível. Eu tinha muitos, mas para ser
honesto, eram mais ambições e desejos do que sonhos propriamente. No
entanto, duas das coisas que listei mentalmente, eram sim sonhos que eu
queria tornar realidade. O primeiro: viver um amor. Eu precisava saber
como era sentir o que fazia tantas pessoas sorrirem à toa e “andar nas
nuvens”. O segundo: ter uma família. Desejava tanto quanto qualquer outra
coisa no mundo.
Comecei a amar tarde demais. Foi aos trinta anos que a conheci. Ela
era linda e fascinante. Aquela foi a melhor viagem à França, com certeza.
Aos trinta e cinco, nós nos casamos, mas não durou muito. O destino a
levou de mim antes mesmo que pudéssemos formar nossa família. A
depressão, o desespero e a saudade me levaram a fazer escolhas erradas. A
escolher pessoas erradas para a minha vida. Acho que isso era vontade de
amar e ser amado outra vez. Pelo menos, algo de bom saiu de tudo aquilo:
Caleb.
Mesmo sendo dominante, sentia falta desse sentimento tão puro e
aconchegante. Nem sempre uma boa e excitante cena de bondage me
satisfazia. Por melhor que fosse sua qualidade, ou quantidade, nunca era o
suficiente e sempre parecia estar faltando algo. Mas, eis que o tempo passou
e o mundo me trouxe o que tanto esperei de volta. Quando a vi pela
primeira vez, não foi somente desejo de dominá-la. Eu soube que seria ela.
Que seria Maya quem me faria amar de novo depois de mais de vinte anos.
Mesmo me decepcionando uma vez, eu a perdoei. Que atire a primeira
pedra quem nunca errou. Ainda mais uma jovem de vinte e um anos que
estava aprendendo a viver. O que importava era que agora Maya era meu
sonho prestes a se realizar.
E para quem diz que Dominadores não amam, você nunva esteve
mais errado!
CAPÍTULO 1

Ser pedido em casamento era tudo que eu menos esperava. Quando


Maya fez a proposta, eu não acreditei que fosse sério e sim uma brincadeira
ou que ela estivesse apenas dizendo o que tinha vontade, já que estávamos
falando de sonhos. Mas era real. Minha garota se pôs de joelhos mais uma
vez para mim e então me pediu novamente. Havia um brilho intenso em
seus olhos. Maya era tudo o que eu queria. Passar meus últimos anos ao seu
lado era o que eu mais desejava.
Antes de tudo acontecer, eu já tinha esses planos. Em minha viagem
a Shanghai, havia lhe comprado um presente. Mandei que fizessem um anel
de noivado para ela, igual ao que pertenceu a minha mãe. Quando garoto,
eu achava aquela joia a mais linda de todas. Não era muito grande, mas
reluzente e delicada, assim como ela. Meu pai era pobre e o mundo
conspirava contra o relacionamento dele com a filha do homem mais rico
de Nova Iorque. Ele trabalhou duro por um ano inteiro na siderúrgica,
pegando todos os adicionais noturnos possíveis e poupou tudo o que podia
para lhe comprar o anel que viu na vitrine de uma loja de penhora. Então,
finalmente, em uma tarde de sábado depois do trabalho, ele foi até a loja e
comprou o anel de ouro amarelo modelo enchanté, com uma pedra redonda
de rubi ao centro e brilhantes em todo seu contorno.
O anel, que tinha quase um século de vida, foi perdido em uma
manhã de primavera quando minha mãe mexia no jardim de casa com as
mãos desprotegidas de luvas. Ela só deu falta dele em seu dedo, quando foi
lavar as mãos na pia da cozinha. Eu estava de pé ao seu lado, assistindo seu
desespero. Naquela época, tinha apenas quatro anos e demorei a entender o
porquê ela chorava. Até tentei ajudá-la a encontrá-lo, mas não achamos.
Quando meu pai chegou em casa no final daquele dia, ela, chorando, contou
a ele que havia perdido o anel que ele tanto se esforçou para lhe dar.
— Perdoe-me, amor. Eu vou procurá-lo até encontrar — falou ela
com desespero.
Meu pai gargalhou e puxou-a para um abraço.
— Te dei aquele, porque era o melhor que podia dar na época e não
porque era o que você merecia ou por ser o mais bonito. Não se desespere,
amor. Darei-lhe um melhor.
Ainda chorando, ela se afundou em seu peito e ele a consolou. Para
mim aquele era e continuou sendo o mais belo anel de todos. Não porque
era feito de uma pedra rara ou por causa do seu valor de mercado, mas sim
porque havia amor dentro dele. Meu pai namorou aquele anel na vitrine por
trezentos e sessenta e cinco dias pensando em minha mãe. Sonhando com o
dia em que a faria sua. Infelizmente, o anel nunca foi encontrado. Quando a
neve em Nova Iorque derretia, eu fuçava a terra mole na esperança de
encontrá-lo, mas nunca consegui concluir minha missão. Nós nos mudamos
da casa quatro anos depois, quando meus avôs faleceram em um acidente de
avião e herdamos tudo, já que minha mãe era filha única. Morando na maior
casa do Upper East Side, eu via a neve derreter pela janela do meu quarto
no terceiro andar e sentia vontade de voltar a Staten Island, até nossa velha
casa, e procurar por aquela joia outra vez, mas nunca fiz.

O piloto anunciou que estávamos chegando e prestes a pousar.


Acordei Maya, que dormia em meu peito e abraçada a mim, para que se
sentasse corretamente e afivelasse seu cinto. Logo que o avião pousou, já
havia um carro esperando para nos levar até em casa.
— Não é melhor irmos direto ao hospital? — perguntou ela quando
se deu conta de que estávamos fazendo o caminho oposto.
— Acho que merecemos tomar um banho e almoçar primeiro.
Depois a levo até lá.
— Certo. — Sorriu.
Ao entrarmos em casa, meu celular tocou e era o Caleb quem ligava.
— Oi, filho.
— Pai? Está tudo bem? Eu cheguei da escola agora para o almoço
e estou vendo umas coisas estranhas na TV. A Maya está bem?
— Sim, Caleb. Ela está bem, não se preocupe. Estamos em Tulsa
agora.
— Mas o que foi que aconteceu?
— Aconteceu que eu achava que você era meu imã para problemas,
mas me enganei. Meus parabéns, você desceu da primeira posição no pódio.
Maya parou à minha frente encarando-me de cara feia e braços
cruzados. Sorri e pisquei para ela.
— Nossa... graças a Deus! Não aguentava mais essa posição de
primeiro lugar — respondeu Caleb com seu humor irônico, fazendo-me rir.
— Nos falaremos depois, filho. Vou a Nova Iorque assim que der.
Se cuide.
— Tudo bem. Diga a Maya que ligo para ela depois.
— Direi sim. Tchau.
Encerrei a chamada.
— Então, quer dizer que eu sou a problemática número um na sua
vida? — perguntou brava.
— Não. Você não é um problema para a minha vida, mas tem que
concordar que é um imã para o perigo. — Aproximei-me abraçando-a pela
cintura.
— Com isso, eu concordo — disse triste, dependurando-se em meu
pescoço.
— Suba e tome seu banho, enquanto mando alguém preparar algo
para comermos.
— Você não vem comigo? — perguntou provocante.
— Não. Se eu for, sabemos que não iremos sair daquele quarto tão
cedo. — Beijei seu pescoço, deixando-a arrepiada.
— E mais tarde? — perguntou baixo em meu ouvido.
— Mais tarde, eu te pego de jeito! — Dei um tapa em sua bunda.
Ela riu baixinho com seu rosto escondido em meu pescoço e depois
me soltou.
— Tudo bem. Vou subir.
Selou meus lábios e caminhou em direção à escada.
— Caleb disse que mais tarde irá ligar para você — avisei-a.
— Okay.
Ela subiu enquanto fui até o bar no canto da sala, servir-me de uma
dose dupla de um bom conhaque. Ainda era meio-dia, mas eu merecia pela
noite anterior terrível que tivemos. Sentado no sofá, me perdi em inúmeros
pensamentos. Um deles era: será que Maya irá querer se casar logo, ou
será um daqueles noivados que durará por anos? Eu não sabia sua vontade,
mas não queria que fosse assim. Queria que nosso matrimônio acontecesse
logo. Tinha pressa! Era óbvio que ela não iria querer deixar a mãe aqui,
logo agora que voltou para casa e, ciente disto, estava disposto a me mudar
para Tulsa.
— Senhor — chamou Noberto ao entrar na sala.
— Sim.
— O Sr. Valentine está no portão. Ele quer entrar e deseja falar com
a filha. Está ameaçando chamar a polícia se não permitirmos a sua entrada.
Bufei e revirei os olhos, levantando-me.
— Deus! Esse homem é cheio de exageros. Mande-o entrar.
Enchi meu copo mais uma vez e esperei por ele, imaginando o que
vinha fazer ali e o que queria com Maya. Magoá-la mais? Espero que nem
tente! A porta da frente foi aberta e Teddy entrou na sala acompanhado por
Noberto, que me encarou sem saber se devia ficar ou sair. Assenti para ele,
lhe garantindo, com um pequeno gesto, que estava tudo bem e que poderia
ir.
— Onde está minha filha? — perguntou Teddy, rude.
— Agora ela é a sua filha? — questionei sarcástico. — Até vinte e
quatro horas atrás, você não se importava com ela.
— Quem é você para dizer com quem me importo ou não? —
perguntou alto, vindo até mim e apontando o dedo em meu rosto.
— Quem cuida dela! — respondi grosseiro.
— Até onde eu sei, você foi o primeiro a abandoná-la!
— Então assume que a abandonou? Posso ter feito o mesmo, mas
soube ver o erro que cometi e pedi perdão. Maya está atrás de você desde
que voltou para cá, depois de se mudar para Chicago, e tudo que faz é
magoá-la e a ignorar. Um pai não faz isso com sua filha!
— Você quer me ensinar a ser pai? — gritou.
— Talvez você precise que alguém lhe ensine como fazer isso!
— Seu cretino! — berrou e acertou-me um soco no rosto, fazendo-
me cambalear para trás e meu copo cair no chão encharcando o tapete com
a bebida.
Sem demora, revidei e ele caiu sobre o piso duro de madeira. Teddy
rapidamente se pôs de pé e veio em minha direção jogando-nos no chão e
caindo sobre mim, acertando-me outro soco no rosto.
— Mas o que é isso? Parem já! — gritou Maya.
Teddy foi retirado por Noberto e Maya correu até mim ajoelhando-
se ao meu lado tocando a ferida abaixo do olho, sobre a maçã do rosto.
— Você está bem? — perguntou preocupada.
— Estou.
— Seu filho da mãe! — xingou Teddy.
Maya encarou-o furiosa, levantou e aproximou-se dele parando à
sua frente.
— Mas o que você tem na cabeça, pai? Veio até aqui para agredi-lo
dentro de sua própria casa? — questionou-o, apontando com a mão para
mim, que levantava do chão.
— Eu vim falar com você, mas esse velho medíocre me provocou.
— Não fale assim dele!
— Disse apenas verdades — ressaltei.
— Por favor, Victor! — fui repreendido por Maya. — Pai! O que
veio fazer aqui, enfim? A mamãe está bem? Aconteceu alguma coisa? Eu já
estava indo vê-la — interrogou preocupada.
— Ela está bem e mais calma agora. Porém, eu estou preocupado
com você, por isso vim.
— Preocupado? Comigo? — perguntou incrédula.
Teddy encarou-me e depois a olhou novamente.
— Será que podemos conversar a sós? — pediu ele.
— Solte-o, Noberto — mandou Maya.
Ele olhou-me em busca de aprovação e concordei com um aceno,
então o soltou.
— Pode nos deixar a sós? — pediu-me ela, implorando com seu
olhar.
— Claro. Estarei em meu escritório se precisar.
— Obrigada.
Caminhei até ela e selei seus lábios com um beijo um pouco
demorado. Quando a soltei, olhei para Teddy e ele encarava-me com a
mandíbula contraída. Sorri para ele e saí em direção ao escritório, mas parei
no corredor e escorei-me à parede.
— Vai ficar aí e ouvir a conversa deles? — questionou-me Noberto.
— Não estou interessado na conversa. Só quero garantir que, caso
ele comece a insultá-la, estarei por perto para impedir que a machuque
ainda mais e tirá-lo daqui a pontapés.
Ele sorriu e saiu, enquanto fiquei ali tentando permanecer o mais
quieto possível para que ela não sentisse minha presença.
CAPÍTULO 2

— Sente-se, pai — pedi e sentei-me no sofá maior à sua frente,


enquanto ele se acomodou em uma das poltronas.
— Como você está? — perguntou esfregando as mãos uma na outra
com agonia.
— Bem. E você?
— Estou bem. — Fez uma breve pausa encarando os próprios pés,
como se buscasse palavras ou algum ponto de onde continuar com o
diálogo. — Queria... Queria ter ligado para você há alguns dias, mas... não
tenho o seu novo número. — Olhou-me novamente.
— Por que não pediu a Clarice ou a tia Jenna?
— Você foi embora com raiva de mim. E, como não me passou seu
número, imaginei que não quisesse que eu o tivesse. Por isso não pedi a
elas.
— Desculpe. Quando estive aqui, nem me toquei sobre isso. Mas o
que queria me dizer quando quis ligar?
— Eu fui à reunião do AA na segunda. Entrei no ônibus e fui até lá
sozinho. Não contei a ninguém que estava indo, apenas fui.
Sorri com imensa alegria e orgulho de sua atitude.
— Você gostou? Conte-me como foi.
— Achei estranho, mas gostei. — Sorriu fraco. — Você me
conhece, não sou muito de me abrir para as pessoas. Muito menos a
estranhos.
— Eu sei. — Aumentei o sorriso que ainda habitava meu rosto.
— Também tinha outra coisa que eu queria falar.
— Diga.
— Eu contei a sua mãe que perdemos a casa e a oficina.
— Meu Deus! — Desfiz meu sorriso. — E como ela reagiu?
— Disse que tudo bem e que nosso lar será sempre onde estivermos
juntos. — Calou-se por alguns segundos novamente. Senti que ele havia se
emocionado.
— Concordo com ela. Nosso lar será onde nós três estivermos
reunidos, seja em uma casa de dois andares no subúrbio ou em um trailer,
na beira do lago.
Ele sorriu triste.
— Há outra família morando lá agora, sabia? Eles têm um gato. —
Deu uma risada baixa e sem humor. Senti um enorme aperto no peito.
— Não consigo imaginar o quanto deve ter sido difícil contar a ela.
— Foi difícil sim, mas ela segurou minhas mãos e disse que me
amava. Confortou-me quando isso deveria acontecer ao contrário.
— Mas era você quem precisava mais naquele momento. — Dei-lhe
um pequeno sorriso. — Você ainda está na casa da tia Jenna?
— Sim, mas é só por enquanto, até eu arranjar um emprego e poder
alugar uma casa para nós.
— Nós? — perguntei pensando se estaria referindo-se somente a ele
e minha mãe.
— Sim. Eu, você, sua mãe e Bow.
Sorri abertamente e, emocionada, com os olhos marejados.
— Desculpe-me, filha. Fui um imbecil estúpido. Não estava lá
quando precisou de mim, perdoe-me — pediu com a voz embargada. —
Meu orgulho machista berrou mais alto.
— É claro que eu perdoo você, pai — respondi-o em lágrimas.
Levantei-me e fui até ele, que se colocou de pé e abraçou-me forte.
Em seu peito, eu chorei apertando-o entre meus braços.
— Senti sua falta, querida. Por favor... Por favor, me perdoe se a feri
e decepcionei falhando em ser um bom pai.
— Está tudo bem. — Soltei-o e vi que ele também chorava
silenciosamente. — Está tudo bem, pai!
— Eu te amo, filha — declarou-se em meio ao choro que ficava
alto. — Fui um completo imbecil, eu assumo, mas não deixe que o que lhe
fiz nos atrapalhe daqui para frente. Não deixe de amar este homem cheio de
falhas aqui — referiu-se a si mesmo.
— Não vou. Nunca. Jamais irei deixar de amá-lo. Você é meu pai. O
homem que fez tudo por nossa família a vida toda. Tudo bem errar. É
errando que se aprende, não é? Você me ensinou isso.
— Você promete?
— Prometo!
Ele beijou minha testa e abraçou-me novamente.
— Quando vi a reportagem na TV, fiquei completamente
desesperado e assustado. Tive tanto medo de perdê-la. Medo de que eles a
tivessem machucado e eu não estava lá para proteger a minha garotinha.
— Estou bem, já disse. Eles não me machucaram, fique tranquilo. A
polícia agiu rapidamente e os criminosos agora estão presos.
— Não vá mais embora.
— Não irei. Eu te amo, pai! Te amo muito, me ouviu? — declarei-
me com a cabeça deitada em seu peito, ouvindo as batidas aceleradas do seu
coração.
— Ouvi sim, querida. Prometo tentar ser um bom pai.
— Você sempre foi.
— Talvez... — disse soltando-me outra vez e encarando-me nos
olhos com carinho — seja hora de contar a sua mãe tudo o que aconteceu
com você. Tudo aquilo que me contou.
— Tudo? — perguntei tensa.
— Tudo! Toda a verdade. Ela merece saber, Maya. Chega de
mentiras e esconder as coisas. De hoje em diante, verdade e clareza sempre!
— Não sei se consigo.
— Você consegue. Estarei lá com você.
— E se ela se decepcionar comigo?
— Estamos falando de Meredith Valentine. Aquela mulher incrível
com quem me casei e que é a sua mãe. A boa samaritana que ainda ajuda o
próximo, mesmo sabendo que não haverá reciprocidade alguma depois.
— Okay — concordei sentindo um enorme nervoso tensionar meus
músculos.
— Certo. Então por que a gente não vai agora para o hospital contar
a ela?
— Agora?
Ele assentiu.
— Tudo bem. Vou me trocar e depois nós iremos. — Sorri
apreensiva.
— Eu te espero aqui.
Assenti e deixei a sala em direção à escada. Ao sair do banho e
escutar os gritos da briga entre meu pai e Victor, mal tive tempo de vestir
um roupão de banho e logo desci às pressas sem nem mesmo pentear os
cabelos. Ao chegar à escada, olhei para o lado em direção ao escritório e
Victor estava ali, escorado à parede de braços cruzados à frente. Ele sorriu e
eu retribuí com alegria. Um dos meus sonhos havia acabado de se realizar!
Depois de me vestir e arrumar os cabelos, eu desci. Fui até o
escritório e o encontrei aberto. Victor estava sentado à mesa e olhando para
o lago através das portas francesas abertas. Por elas entravam uma brisa
leve e fresca, fazendo as finas cortinas dançarem ao vento fraco.
— Oi — cumprimentei ao entrar chamando sua atenção.
— Noberto irá levá-los e depois vamos nos encontrar para jantar.
— Certo. — Caminhei até ele e sentei-me em seu colo.
— Você está bem?
— Estou. E você? — Alisei o machucado em sua face.
— Vou sobreviver. — Fez um drama.
Sorri e beijei-o.
— Eu te amo, Victor.
— Eu te amo, futura esposa — disse e olhou-me com os olhos
brilhantes e um sorriso reluzente.
— Deus... Como sou apaixonada por você!
— Eu sei — respondeu, e só então me dei conta de que havia dito
em alto e bom som o meu pensamento, enquanto observava sua beleza
madura com fascínio.
Sorri um pouco envergonhada e ele riu baixo antes de beijar meu
rosto.
— Até mais tarde. E não fique sem comer.
— Sim, Senhor. Pode deixar. — Selei seus lábios e levantei-me
saindo do escritório.
A caminho do hospital paramos em uma cafeteria. Desci com meu
pai e compramos uma vitamina sem açúcar, cafés e alguns donuts para
viagem. Quando chegamos lá, senti meu estômago embrulhar e revirar de
nervoso. As portas do elevador se abriram e caminhamos sem pressa até o
quarto. Meu pai bateu de leve na porta e entrou na frente.
— Trouxe alguém comigo — anunciou ele.
— Oi, mãe.
— Maya! Graças a Deus! — disse com alívio, apoiando a mão
espalmada em seu peito.
Corri de encontro a ela e abracei-a. Seus finos braços me apertaram
com tanta força, que quase chegaram a me sufocar. Senti meu ombro
umedecer percebendo que ela chorava.
— Por favor... não chore — pedi tentando conter minha emoção.
— Então nunca mais nos preocupe desse jeito! — Soltou-me.
— Me perdoe, mamãe. Perdoe-me por fugir daqui quando estava em
coma. Perdoe-me por não voltar quando acordou, eu sei que meu lugar é
aqui cuidando de você, mas fui egoísta e não quis ver isso. — As lágrimas
escorreram em abundância por meu rosto.
— Não tem que me pedir perdão. — Secou minhas lágrimas e
depois as suas.
— Não, tenho sim. Fiz algumas escolhas erradas um tempinho atrás
e por consequência delas tive tanta coisa afetada em minha vida de modo
terrível. Por isso eu fui para longe. — Olhei para trás e lá estava meu pai,
ainda de pé perto da porta. Ele encarou-me seguro e assentiu firme,
mostrando-me que estava ali para mim.
— Sejam lá quais tenham sido suas escolhas, ainda vou amar você
do mesmo jeito. Você ter se mudado e deixado a faculdade me chateou, mas
não me decepcionou. — Segurou minha mão.
Encarei nossas mãos unidas e sorri ao sentir a força que ela me
dava. Aquela era a chance de finalmente me libertar das mentiras e
segredos. Dizer a ela tudo do começo até o fim. Respirei fundo e olhando
em teus olhos, iguais aos meus, comecei a falar iniciando pelo jeito real de
como conheci Victor e depois toda a sequência de acontecimentos que veio
em seguida. Ela permaneceu em silêncio, apenas escutando de olhos
marejados e segurando firme minha mão. Senti vergonha e raiva de mim
mesma e a cada minuto que continuava a falar, me dava conta do quanto
havia sido estúpida e irresponsável com certas ações que tomei. Em
momento algum vi em seu rosto raiva, nojo, ressentimento ou qualquer
outro sentimento do tipo. Havia tristeza. Muita tristeza e emoção.
— Perdoe-me, mãe. Jamais tive a intenção de envergonhar você ou
o papai, e jogar fora minha educação que deram com tanto sacrifício.
— Embora você tenha tomado decisões erradas e precipitadas, eu
vejo e sinto o quanto estava desesperada. O desespero é capaz de nos fazer
perder a cabeça e realizar coisas sem pensar direito. Apesar de tudo, tenho
que lhe dizer: admiro o quanto foi valente em tentar tomar à frente e ir
sozinha em busca de uma solução para a nossa família. É assim que se
aprende a caminhar sozinha. Acho que fizemos um bom trabalho com nossa
filha. Você concorda, Teddy? — Sorriu e olhou para ele, que se aproximou.
— Concordo. Agora vejo isso.
— Mas você me perdoa, mãe?
— Não há o que ser perdoado. Só peço que, a partir de hoje, tenha
mais cuidado com suas escolhas e ações. Quando algo parecer impossível
ou complicado demais, pare, pense e respire. Verá que surgirão ideias
melhores do que as medidas desesperadas e imediatas que brotarão em sua
cabecinha.
— Okay. Anotado. — Sorri ainda chorando.
— Ótimo, mocinha. — Deu leves palmadinhas no dorso da minha
mão que segurava. — Agora me digam o que tem dentro daquela caixa ali.
— Apontou para a caixa branca sobre a mesinha alta aos pés da cama. —
São donuts?
— Mas é claro que são. — Levantei-me secando minhas lágrimas e
peguei-a. — Trouxe vitamina de melão com cacau também.
— Oba! Essa notícia foi música para meus ouvidos. Não aguento
mais a comida deste hospital — brincou.
Meu pai e eu nos sentamos aos pés da cama e comemos juntos todas
as rosquinhas banhadas de cobertura doce. Conversamos sobre vários
assuntos e ele nos contou em detalhes sobre sua reunião no grupo do AA.
Às seis horas, minha avó chegou, e depois de me repreender sobre os
perigos do mundo, ela me abraçou e me fez prometer nunca mais me mudar
para tão longe. Às sete horas, Victor mandou uma mensagem dizendo ter
feito reservas no restaurante Green Lake para as oito. Quando chegou
minha hora de partir, meu pai me acompanhou até o estacionamento e nos
despedimos com um abraço apertado.
— Tenho uma entrevista de emprego na segunda.
— Sério? Isso é ótimo! Por que não contou essa novidade lá dentro?
— Vou dizer a ela quando eu conseguir o emprego. Não quero
correr o risco de entristecê-la, caso eu não consiga.
— Onde será a entrevista?
— Em uma concessionária de carros aqui perto.
— Vaga para vendedor?
— Sim. Acha que consigo fazer isso?
— É claro que sim! Vai se sair muito bem na entrevista, será
contratado e irá tirar de letra a função. Será o próximo vendedor do mês,
você verá — disse com entusiasmo para animá-lo.
— Você é incrível, querida. Quer jantar comigo e tia Jenna amanhã?
Ela também está preocupada e quer vê-la.
— Claro. Combinado. — Abracei-o de novo.
— Sabe, querida... — Soltou-me. — Se eu conseguir aquele
emprego, vou logo alugar uma casa e você não terá mais que morar com
aquele homem. Não precisará mais dele.
— Pai... Essa insistência de novo não. Entenda e aceite logo de uma
vez — disse um pouco impaciente. — Victor e eu nos amamos. O que
sentimos um pelo outro é amor de verdade, não é só uma paixonite! Não
estou com ele por interesse ou conveniência. Estou com ele porque o amo
de corpo e alma! Não vou deixá-lo. Você terá de compreender isso. Ele faz
parte de mim, parte da nossa família agora. Se você quer que moremos
juntos, tudo bem. Vou gostar disso. Porém, nesta casa, Victor será bem-
vindo a hora em que ele quiser entrar. Não me chateie com conversas de
que ele não serve para mim, que não nos quer juntos ou de que é velho
demais, porque não vamos nos separar outra vez! E eu espero, do fundo do
meu coração, que hoje tenha sido a última vez que você o agrediu.
Chateada, não esperei que ele respondesse. Dei-lhe as costas e entrei
no carro. Noberto assumiu a direção e dirigiu em silêncio para o
restaurante. Quando chegamos, logo que entrei, avistei Victor sentado
exatamente à mesma mesa onde jantamos juntos pela primeira vez. A noite
estava mais fria do que aquele dia, mas ainda assim agradável. Caminhei
até ele, que, quando me viu aproximar, levantou-se e puxou a cadeira à sua
frente para mim.
— Como foi a sua tarde?
— Foi ótima. E a sua? — perguntei acariciando seu rosto.
— Foi entediante sem você.
Beijei-o com carinho e saudade. Ele retribuiu com lentidão
segurando minha cintura com suas duas mãos. Separei nossos lábios e beijei
seu pescoço fazendo-o se arrepiar de leve. Sorri para ele e sentei-me. Victor
chamou o garçom e pediu um vinho tinto italiano. Depois que nossas taças
foram servidas, o garçom se retirou e começamos a conversar. Contei a ele
sobre a minha tarde com meus pais e a respeito da conversa com minha
mãe.
— Que tal mudarmos um pouquinho de assunto? Acho que
devíamos falar sobre nosso futuro agora.
— O que tem nosso futuro? — perguntei, continuando o carinho que
fazia em sua mão sobre a mesa.
— Você me pediu em casamento e eu aceitei — falou humorado. —
Agora é hora de planejarmos nosso futuro.
— Okay. — Ri. — Por onde quer começar?
— Acho que devíamos marcar a data do casamento.
— Mas já? Quando as pessoas ficam noivas, elas esperam um pouco
até marcarem a data.
— Querida... Não tenho trinta anos. Tenho o dobro disso. Não pense
que irá me enrolar com o casamento por meses ou até anos, porque isso não
vai acontecer.
— Acho que devíamos fazer um test drive antes de assinar os papéis
oficializando nossa união.
— Está falando de morarmos juntos?
— Sim.
— Não. Test drive se faz quando está em dúvida sobre algo para a
sua vida. Eu não tenho dúvida sobre nossa união.
— Então, está me dizendo que, quando me pediu para morarmos
juntos aquela vez, não tinha certeza sobre nós?
— Meu anjo... Nunca tive dúvidas sobre você ou nós. Se dependesse
de mim já estaríamos casados, mas o destino adiou isso. E aquela vez em
que a convidei para morar comigo, não era dúvida. Só não queria assustá-la
com um pedido repentino de casamento tão cedo.
— Está disposto a se mudar de Houston? Eu gostaria de morar mais
perto dos meus pais e em um lugar que eu possa dar continuidade à
faculdade.
— Podemos nos mudar para Oklahoma. Sei que andou pesquisando
faculdades por lá.
— Você olhou o histórico de pesquisa no seu computador aquele dia
em que estive no seu escritório?
— Olhei sim. Desculpe. — Sorriu sem graça.
— Então acho que podemos marcar a data.
— Março está bom para você? É tempo suficiente para planejar um
casamento, não é?
— Nossa! Pensei que você diria junho ou julho, mas março parece
bom.
— Março parece ótimo! — Rimos juntos.
Pedimos nosso jantar e continuamos a conversar, planejando nosso
futuro juntos que estava cada dia mais próximo.
— Acho que devíamos ir para Oklahoma depois do réveillon e
procurar uma casa. O que você acha? Quem sabe até visitar algumas
faculdades.
— É uma boa ideia. — Tomei mais um gole do doce vinho. —
Como acha que meu pai irá reagir a esta notícia?
— Ele vai querer me socar de novo.
— Pedi a ele para não fazer mais isso.
— Ele vai fazer.
— Talvez você quem deve contar a ele sobre o casamento.
— Vou pensar em um jeito de fazer isso e continuar com o rosto
inteiro.
— Está bem. — Ri.
Terminamos de comer e após a sobremesa fomos para casa. Quando
chegamos, Bow já estava à minha espera. Victor puxou-me pela mão no
hall de entrada e agarrou-me pela cintura prensando-me contra a parede. Ele
me beijou e apertou a minha coxa, a qual enlacei em seu quadril. Sem
separar nossos lábios, sorrateiramente, ele desabotoou os botões da minha
blusa e a tirou jogando-a no chão. Sua boca desceu para o meu pescoço e o
mordeu deixando-me arrepiada.
— Vamos para o quarto — pedi ofegante.
Ele me soltou e subiu a escada logo atrás. Mal entramos e Victor
pegou-me em seu colo e me jogou sobre a cama deitando-se em seguida
sobre mim, encaixando-se entre minhas pernas. Sua boca tomou a minha e
depois desceu para os meus seios, enquanto suas mãos arrancavam meu
sutiã. Senti sua língua quente tocar meu mamilo enrijecido, fazendo-me
gemer alto agarrando seus cabelos.
— Me amarre — pedi baixo.
— Hoje não. — Ergueu-se um pouco e encarou-me.
— Por quê? — questionei-o com estranheza da sua recusa.
— Estou a fim de algo menos dominante e mais selvagem hoje.
Sorri e agarrei-o.
Nossa noite foi tão gostosa quanto qualquer outra. Nós transamos
loucos e efervescentes de paixão um pelo outro. Sempre agarrados e
gemendo juntos sem pudor, deixando marcas de tapas, arranhões, chupões e
mordidas no corpo um do outro. Experimentamos diversas posições
explorando o máximo das possibilidades. Encerramos nossa maratona de
sexo depois de algumas horas, com pequenas pausas, exaustos e suados.
Um silêncio confortável reinava o quarto. Estávamos felizes e satisfeitos.
Eu estava em seus braços acariciando sua barriga, enquanto ele acariciava
meus cabelos com delicadeza.
— Maya...
— Sim. — Olhei-o e o vi fitando o teto.
— Tudo bem para você não podermos ter filhos?
— Por que está perguntando isso agora?
— Porque vamos nos casar e você nunca comentou sobre ter ou não
vontade de ter filhos. Entende que isso é algo que não poderei dar a você,
não é?
— Fala isso por causa da vasectomia? — Ele encarou-me sério. —
Podemos adotar. Existem várias crianças que precisam de um lar.
— Então você quer ser mãe — concluiu.
— Claro. Podemos fazer isso juntos.
— Não podemos. Você não me entendeu, Maya.
— Não quer mais filhos? É isso?
— Não, eu não quero!
Nunca havíamos conversado sobre filhos. Afinal, nunca nem mesmo
havíamos falado de casamento antes. Mas confesso que sua resposta direta
me deixou com uma pequena tristeza no peito. Casar e ter filhos sempre
foram meus planos para o futuro. Agora, um deles eu teria de abrir mão e
não seria o de me casar com Victor. Espero que o desejo avassalador de ter
filhos não me atinja depois que nos casarmos. Se isso acontecer, será
bastante difícil para mim.
— Tudo bem.
Aconcheguei-me novamente em seus braços e permanecemos em
silêncio até que ele adormeceu. Vagarosamente, levantei-me da cama e vesti
sua camisa, que estava jogada no chão. Caminhei até a poltrona perto das
portas, que levavam para a varanda, e peguei meu celular dentro da bolsa.
Já passavam das duas da manhã e havia uma mensagem do meu pai.

Desculpe-me, filha.
Sei que a chateei.
Não medi as palavras que usei.
Não foi minha intenção magoá-la.
Papai
09:12 p.m.

Está tudo bem.


Nos vemos amanhã.
Boa noite.
Maya
02:33 a.m.
CAPÍTULO 3

Despertei às seis e não consegui mais dormir. O sono havia ido


embora, simples assim. Levantei e fui ao banheiro. Depois de um banho,
me arrumei pronta para dar uma caminhada. Sentia que precisava sair e
correr o mais rápido que eu pudesse. Desci a escada e já havia
movimentação dos funcionários por toda parte na casa.
— Bom dia, Sra. White — desejou uma das empregadas. Pensei em
corrigi-la, mas para quê? Eu seria a Sra. White em breve. — O que gostaria
para o café da manhã?
— Ah... Eu não sei. Faça o mesmo de sempre.
— Tudo bem, como queira.
Sorri e virei-me indo em direção à porta.
— A senhora vai sair para se exercitar sem se alimentar?
Parei e olhei para ela.
— Estou bem. Não tenho o costume de comer antes de sair para
correr. — Abri a porta. — Se Victor acordar antes que eu volte, diga a ele
que retorno logo.
— Sim, senhora. — Sorriu simpática colocando as mãos para trás.
Deixei a casa e caminhei pelo passeio de pedras que levavam até a
rua.
— Maya! — chamou Noberto alto, antes que eu chegasse aos
portões.
— Noberto. — Virei-me para ele. — Bom dia.
— Onde pensa que vai?
— Sair para correr.
— Sabe que Victor não aprova isso. É melhor que um segurança vá
com você.
— Por quê? Vou sair apenas para correr no bairro, não vou muito
longe!
— Você acabou de ser sequestrada. Higor ainda está solto por aí e
até onde sabemos pode estar na cidade. Por favor... Deixe que um segurança
lhe acompanhe.
Suspirei frustrada e revirei os olhos para ele e toda aquela situação
de merda que eu estava vivendo. Quando tudo isso vai acabar?
— Okay. Tudo bem — cedi para evitar maiores confusões.
Noberto aproximou o punho da boca e, através de um ponto de
comunicação, ordenou que mandassem um segurança preparado para me
acompanhar na corrida matinal.
— Victor sabe que está saindo?
— Ele está dormindo. E depois... Não tenho que pedir permissão de
tudo a ele! — disse um pouco irritada, cruzando os braços à frente.
O dia mal havia começado e eu já estava me sentindo estressada.
— Victor parece estar bem feliz.
— Eu o pedi em casamento.
Ele encarou-me com uma expressão de espanto total, arregalando os
olhos.
— Uau! Nossa! Não consigo imaginar qual tenha sido a resposta
dele.
— Ele disse sim da maneira dele.
— Isso é ótimo, mas... por que você não está me contando isso com
empolgação ou um enorme sorriso no rosto?
— É só que... eu nunca tinha parado para pensar que ele não iria
querer ter uma família grande, sabe?
— Está falando de filhos?
— Sim.
— Filhos sempre foi o sonho do Victor, isso era algo que ele não
escondia de ninguém. Quando Caleb nasceu, eu me lembro do modo como
ele ficou perdido e desesperado durante o caminho até o hospital. — Sorriu
com a memória. — Mas acontece que o tempo passou para ele, Maya.
Victor não tem mais seus quarenta e poucos anos. Ele agora tem sessenta e
daqui a alguns meses, sessenta e um. Até que vocês se casem e que você se
sinta pronta para terem filhos, anos poderão ter passado e ele estará ainda
mais velho.
Abaixei minha cabeça. Noberto tinha razão. Era eu quem devia
aprender a levar uma vida sem filhos, ao menos enquanto minha vida fosse
ao lado do Victor. E, talvez, quando ele não estivesse mais comigo, a
vontade, o momento e a idade para a maternidade já tenham chegado e ido
embora.
— Está pronta, Srta. Valentine? — perguntou o segurança ao se
aproximar de nós.
— Estou. — Caminhei até o portão e digitei a senha para abri-lo.
— Sabe que se algo acontecer a ela, você é um homem ferrado! —
falou Noberto com um tom ameaçador para o homem. — Palavras do Sr.
White — disse e bateu de leve com a mão no ombro do segurança, antes de
se afastar.
— Qual é o seu nome? — perguntei a ele assim que pisamos na
calçada.
— Elliot, senhorita.
— Ainda não conhecia você.
— Fui contratado há uma semana pelo Sr. White.
— E para quê exatamente?
— Para fazer a sua guarda particular, senhorita.
— A minha guarda particular? — perguntei encarando-o.
— Sim.
Bufei e revirei os olhos. Coloquei os fones de ouvido e comecei a
correr aumentando gradativamente a velocidade das minhas passadas e
deixando-o para trás. Ele respeitou meu espaço e manteve dois metros de
distância. Se eu já estava com mau humor, naquele momento fiquei mais
ainda. Lá estava Victor outra vez colocando um guarda-costas atrás de mim
o tempo todo. Os homens que queriam me matar estavam presos em
Chicago e não iriam sair de lá tão cedo, ou talvez nunca mais. Quanto ao
Higor, honestamente, eu não estava preocupada que ele fizesse algo comigo
e sim com a Grace por dinheiro.
Corri até minhas pernas se cansarem e meu pulmão queimar pela
falta de ar, mas minha intenção de cansar o segurança falhou. Ele parecia ter
um ótimo preparo físico para aquilo. Talvez Victor tenha pensado até
mesmo nisso quando o contratou. Voltamos para casa caminhando um ao
lado do outro em completo silêncio. Quando entrei em casa, fui direto até a
sala de jantar e encontrei Victor fazendo seu desjejum com o laptop ligado
sobre a mesa, no canto esquerdo à sua frente.
— Bom dia — desejou ele, dirigindo-me o olhar que estava fixo na
tela do laptop. — Ah! Vejo que já conheceu o Elliot.
— Então ele será meu novo segurança? — questionei-o com
insatisfação, sentando-me à mesa.
— Por favor, Maya. Não comece com um chilique agora. Ainda são
oito da manhã. Ao menos coma primeiro!
— Eu não preciso disso — retruquei-o, enquanto servia-me de uma
caneca bem cheia de café.
— Honestamente, não me interessa o que você acha que precisa ou
o que quer! — disse alto e rude.
Encarei-o assustada com seu tom de voz.
— Estou cansado de ficar me preocupando com você o tempo todo!
Não tenho mais idade para isso. E vá se acostumando, porque quando nos
casarmos, sua segurança irá dobrar. Pois o mundo saberá que é minha
esposa. O meu ponto fraco!
Não tive palavras para debater com ele. Algo em minha cabeça
dizia: “Cale a boca e abaixe a cabeça”. E, instintivamente, foi o que eu fiz.
— Agora coma! — ordenou e levantou-se da mesa deixando a sala
de jantar, levando seu laptop consigo.
Elliot pediu licença e retirou-se em seguida. Depois do café da
manhã, subi para o quarto e tomei um banho demorado sozinha. Ao sair do
banheiro, meu celular tocou sobre a cama e caminhei apressada até ele.
— Oi, pai. Bom dia! — desejei ao atendê-lo.
— Bom dia, querida. Estou ligando para confirmar nosso jantar. Eu
e sua tia Jenna queremos que você e Victor venham comer conosco esta
noite, aqui na casa dela.
— Eu e Victor? — perguntei surpresa e sentei-me na cama.
— Sim! Vocês dois.
— Foi ela quem mandou convidá-lo, não é?
— Foi.
— Promete se comportar e manter suas mãos longe dele? — Houve
um minuto de silêncio.
— Prometa, Teddy! — Escutei tia Jenna sussurrar a bronca para ele
e assim soube que o telefone estava no viva-voz.
— Okay. Prometo tentar.
— Pai! — repreendi-o.
— Tudo bem. Tudo bem. Eu prometo me comportar e não socá-lo,
mas desde que ele se comporte também.
— Ele irá. Dou minha palavra.
— Ótimo! Esperamos vocês às oito! — disse tia Jenna com
empolgação.
— Combinado, tia Jenna. Até mais tarde.
Desligamos e eu fui ao closet me vestir. Desci à procura do Victor e
encontrei-o no escritório. Entrei sem bater pensando que ele estivesse
sozinho, mas estava em reunião com os seguranças. Todos me olharam ao
passar a porta e isso me constrangeu. Victor encarou-me sentado à sua mesa
e arqueou a sobrancelha.
— Precisa de algo, Maya? — perguntou ele.
— Desculpem-me. Não sabia que estavam em reunião. Não é nada
de mais, eu volto depois quando terminar. — Saí e fechei a porta.
Enquanto esperava Victor se desocupar, sentei-me no jardim e
brinquei com Bow arremessando uma bolinha para ele. Troquei mensagem
com Grace para saber como ela estava e ela demonstrou estar bastante
preocupada comigo, mas a assegurei de que estava tudo bem. Aproveitei o
tempo de espera e liguei para a minha mãe e depois para a minha avó.
Bow se cansou e deitou aos meus pés sobre o piso de pedras,
esquentando-se ao sol. Com o inverno aproximando-se, as temperaturas
tendiam a cair bastante. Enganava-se quem achava que Oklahoma não tinha
um inverno rigoroso. Logo para os últimos dias do ano, tínhamos
temperaturas que chegavam aos 8°C.
— O que queria falar comigo? — perguntou Victor parando ao meu
lado.
— Que temos um compromisso para esta noite.
— Que tipo de compromisso? — Sentou-se ao meu lado.
— Vamos jantar na casa da tia Jenna.
— Seu pai vai estar lá?
— Vai. Ele mora lá agora.
— Acho melhor que só você vá.
— Ela convidou a nós dois! E meu pai prometeu se comportar se
você fizer o mesmo.
— Eu fazer o mesmo? É ele quem sempre começa!
— Mas é você quem o provoca, sabemos bem disso! Por favor... —
implorei-o com o olhar.
— Esse jantar é importante para você?
— É sim! É muito importante que meu pai comece a se dar bem
com o homem com quem irei me casar em breve.
— Certo. — Olhou para mim e respirou fundo passando a mão em
sua barba, que começava a crescer. — Tudo bem, eu irei.
— Obrigada.
Sorri e me aproximei mais dele, escorando-me em seu corpo e
deitando minha cabeça em seu ombro. Victor passou o braço por de trás de
mim apoiando-o sobre o encosto do banco e acariciou meus cabelos.
— Quando vamos contar a todos sobre o casamento?
— Ainda não sei. Acho que vamos pegar a todos de surpresa.
— Seu pai, principalmente. Como acha que ele irá reagir?
— Não quero nem pensar nisso agora.
— Então vamos falar de como serão as coisas daqui uma semana?
— O que tem daqui uma semana? — Levantei minha cabeça e
olhei-o.
— Tenho que voltar para Houston na segunda. Você vem comigo ou
deseja ficar aqui com sua família?
— Eu vou ficar.
— Então, teremos que organizar nossas agendas. Precisaremos achar
um jeito de nos ver com frequência. Meu trabalho é viajar pelo país e, às
vezes, pelo mundo. Quero que me acompanhe, porém, entendo que nem
sempre poderá fazer isso. Você também terá de entender que nem sempre
poderei vir e você terá de ir até mim.
— Okay. — Parei e pensei um pouco em uma solução que
funcionasse. — E se durante a semana eu cuidar das coisas por aqui e você
trabalhar. Aí nos fins de semana a gente se encontra. Podemos revezar. Em
um final de semana, eu vou até você; e no outro, você vem me ver.
— Parece uma boa solução. E quando eu tiver de fazer viagens
longas, quero que me acompanhe. Se for algo rápido, entenderei se não
quiser ir.
— Tudo bem.
— Mas saiba que Elliot ficará aqui com você. Ele será seu
segurança e motorista particular a partir de agora e não discuta comigo.
Faço isso porque quero que fique bem e segura! E também porque amo
você!
Sorri e acariciei seu rosto antes de beijá-lo.
— O que quer fazer hoje? — perguntou ao separar nosso beijo.
— Podemos ir visitar minha mãe, depois voltar para casa e fazer
nada juntos.
— Hum... Isso me parece bom. — Sorriu.

O dia passou e como planejado, fomos ver minha mãe depois do


almoço e voltamos para casa às quatro horas, onde não fizemos nada juntos
até as sete. Somente ficamos largados na cama do quarto assistindo TV,
trocando beijos e carícias. Momentos como aquele eram raríssimos e eu os
aproveitava ao máximo.
— Já está pronta? — perguntou ele do quarto.
— Quase. Vou calçar as sandálias! — gritei para ele do closet.
Terminei de arrumar e descemos. Quando ele abriu a porta da casa,
estacionado à frente estava seu Alfieri cinza-chumbo.
— É você quem vai dirigir? — perguntei.
— É sim. Mas Noberto e Elliot nos seguirão à paisana. Não quero
chamar a atenção.
— Ah, mas claro! Até mesmo porque uma Maserati não chamaria a
atenção nem um pouco no subúrbio — ironizei.
— Entra no carro, Srta. Valentine — falou sério e deu-me um leve
tapinha na bunda.
Ri baixo e entrei assim que ele abriu a porta. Logo Victor assumiu a
direção e fomos para casa da tia Jenna com Noberto e Elliot nos seguindo a
poucos metros de distância em uma BMW preta. Ao chegarmos, Victor
estacionou em frente à casa e Noberto um pouco mais distante, em uma
parte mais escura da rua, onde tinha uma visão completa da casa e dos
arredores. Descemos e subimos os degraus que levavam até a porta. Bati e
esperei por alguém abri-la.
— Pai! Oi — cumprimentei ao vê-lo depois da porta.
— Oi, querida — retribuiu com um sorriso e abraçou-me. —
Entrem.
Segurei na mão do Victor e entramos.
— Theodoro — cumprimentou Victor estendendo sua mão para ele.
Meu pai a encarou e depois olhou para mim, que esperava pela sua
retribuição ao cumprimento, de braços cruzados.
— Victor. — Apertou sua mão, enfim, cedendo.
— Vocês chegaram! — disse tia Jenna com empolgação ao entrar na
sala e abraçou-me apertado. — Não sabe o quanto estou feliz em recebê-los
aqui! — Soltou-me.
— Nós agradecemos ao convite, tia Jenna.
— Eu trouxe um vinho — disse Victor, entregando-lhe o vinho que
havíamos comprado naquela tarde quando voltávamos do hospital.
— Obrigada! Seja bem-vindo, Victor. Fiquem à vontade. — Pegou a
garrafa.
— Precisa de ajuda na cozinha, tia Jenna?
— Não, querida. Está tudo sob controle. Faça sala para o Victor, eu
já volto. — Entrou na cozinha.
— Sente-se — pedi a ele, que se sentou ao meu lado no sofá de
frente para a lareira.
— Eu estava no hospital até agora há pouco. Sua mãe me disse que
você esteve lá esta tarde.
— Sim. Nós estivemos lá, na verdade. — Apontei para mim e para
Victor, que encarava meu pai.
— Vou pegar uma água. Vocês aceitam? — perguntou meu pai
levantando-se da poltrona.
— Não. Estamos bem, obrigada — respondi.
Meu pai assentiu com sua cabeça e saiu para a cozinha.
— Está tudo bem? — perguntei ao Victor.
— Por que não estaria?
— Não sei... Você está encarando meu pai.
— Ele está sendo muito cordial. — Estreitou os olhos.
— Isso é porque ele está cumprindo com a promessa que me fez.
— Voltei! — falou tia Jenna ao entrar na sala. — Victor, você
gostaria de ver fotos da Maya quando mais nova?
— Não! — respondi rápido intervindo sua resposta. — Tia Jenna!
— repreendi-a.
— Mas é claro que eu quero! — discordou Victor.
— Viu só, ele quer! — disse toda sorridente. — Vou pegar alguns
álbuns e já volto.
Ela foi até seu pequeno escritório e voltou em seguida trazendo
consigo alguns álbuns de fotografia.
— Ai, meu Deus! Isso é humilhante. Vou ver o que meu pai está
aprontando na cozinha.
Levantei e fui até lá, encontrando-o sentado na banqueta ao redor da
ilha.
— Está tudo bem por aqui? — perguntei.
— É uma ideia muito inteligente trazer uma garrafa de vinho para
um jantar com um alcoólatra em recuperação — criticou.
— Você sempre odiou vinho. E depois, a ideia foi minha, pai.
Trouxe o vinho não necessariamente para bebermos no jantar e sim como
um presente para tia Jenna, que adora um bom e caro vinho.
Ele encarou-me sério.
— Como se apaixonou por ele?
— Eu não sei. Apenas aconteceu. Quando me dei conta, minha raiva
por ele era paixão retraída, que rapidamente se tornou amor.
— Acha que vocês têm um futuro juntos?
— Acho sim.
— E você quer isso? Quer um futuro com um homem que tem o
triplo da sua idade?
— Eu quero muito! — respondi-o convicta.
Ele desviou seu olhar do meu e encarou seus braços cruzados sobre
o balcão. Da cozinha ouvi Victor gargalhar na companhia da tia Jenna.
— Sabe que o relacionamento de vocês tem data de validade, não é?
— Eu sei. Somos bastante cientes disso.
— Está mesmo ciente de que nunca terá uma família com aquele
homem? — Olhou-me e eu encarei-o com um pouco de tristeza.
Parecia que meu pai queria me ferir de qualquer modo.
— Eu sei, pai. E para mim está tudo bem.
— Você ainda será jovem quando ele tiver oitenta anos. Quer
mesmo cuidar de um velho e viver presa a ele, quando poderia estar com
um homem bem mais jovem, ou até mesmo da sua idade, constituindo uma
família feliz?
— Não preciso estar com um homem mais jovem e constituindo
uma família para ser feliz! — respondi amargurada. — E sim! Eu ainda
serei uma mulher jovem quando Victor tiver mais idade e, se ele precisar
dos meus cuidados em tempo integral, farei isso com o maior prazer. E sabe
por quê? Porque eu o amo como jamais amarei outro homem, posso sentir.
— Do que estão falando? — perguntou tia Jenna ao entrar na
cozinha na companhia do Victor.
— Nada de mais — respondi-a e sorri falsamente, mas Victor soube
detectar isso.
Ele aproximou-se e beijou meu rosto abraçando-me pelo ombro.
— Vamos até lá fora — sussurrou em meus ouvidos.
Fomos até a varanda dos fundos.
— O que houve lá dentro? — perguntou parando à minha frente e
segurando meu rosto entre suas mãos.
— Ainda é muito difícil para o meu pai aceitar a gente.
— E isso magoa você.
— Eu só queria entender por que as pessoas não conseguem ver
nosso amor. Por que, Victor? Por que é tão difícil elas enxergarem nossa
paixão e compreender que seremos felizes, mesmo que você tenha quase o
triplo da minha idade?
— Acho que ninguém além de nós será capaz disso.
Acariciou minhas bochechas com seus polegares e aproximou-se
mais. Ergui minha cabeça para olhá-lo e fechei meus olhos quando ele
tocou sua testa na minha, roçando a ponta dos nossos narizes um no outro.
— Não vejo a hora de chamá-la de esposa... De colocar uma bela
aliança neste dedinho delicado. — Segurou minha mão esquerda junto ao
seu peito e acariciou delicadamente meu dedo anelar. — Eu amo você,
querida. Não duvide ou se esqueça disso.
— Eu não vou — sussurrei para ele.
Seus lábios se juntaram suavemente aos meus selando-os com
carinho, enquanto seus braços envolviam meu pequeno corpo apertando-o
contra ele. Ao separar nosso beijo, deitei minha cabeça em seu peito e abri
meus olhos, assustando-me quando vi meu pai parado na porta nos
observando.
— Pai... — disse envergonhada e soltei Victor.
— O jantar está pronto — avisou e voltou para dentro.
Respirei fundo e entramos. O jantar seguiu de maneira tranquila e
descontraída. Victor se esforçou ao máximo para tornar tudo leve e
agradável. Tia Jenna riu bastante com ele e dele. Já meu pai, ficou em
silêncio na outra ponta da mesa comendo de cabeça baixa o tempo todo.
Após a sobremesa, nos despedimos e fomos para casa.
CAPÍTULO 4

Quase seis semanas se passaram e as coisas pareciam estar


funcionando bem de acordo com nossos planos. Victor havia viajado na
segunda após o jantar na casa da tia Jenna e eu fiquei. Na sexta, ele mandou
um dos seus jatinhos às sete da manhã para me buscar e levar até Houston,
onde passamos o fim de semana juntos. Na segunda retornei para Tulsa e
quando o fim de semana chegou outra vez, foi ele quem veio me ver
retornando no começo da semana para casa. Mais uma semana passou e fui
me encontrar com ele em Seattle – onde tivemos um fim de semana
maravilhoso – retornando na segunda para Oklahoma. Na sexta, à noite,
Victor chegou cansado e estressado com o trabalho, louco por sexo e sem
muita conversa. Foi um fim de semana intenso e tenso. Antes de partir
novamente na segunda cedo, combinamos que ele voltaria no próximo fim
de semana e chegaria na quinta-feira para passarmos o feriado de Ação de
Graças junto com a minha família.
Minha mãe estava com seu quadro de saúde estável e por isso o
hospital a liberou para passar a quarta e quinta-feira do mês de novembro
conosco. Nós estávamos empolgados e felizes por tê-la de volta em casa,
mesmo que fosse somente por vinte e quatro horas. Minha avó preparava o
jantar em sua casa com maior alegria e satisfação. Meu pai estava mais do
que feliz por ter minha mãe em seus braços fora daquele lugar frio com
cheiro de formol e álcool, em um dia tão especial. Victor estava viajando a
trabalho para Portland naquela semana e eu aguardava ansiosamente por
sua chegada.
Estava arrumando a mesa para o jantar, enquanto minha avó
finalizava os pratos com ajuda da Clarice, quando fui abraçada por trás pela
cintura. Apesar de ter me assustado, eu soube reconhecer a pegada e os
braços que me agarraram com firmeza.
— Amor... — disse feliz em vê-lo, quando virei para trás.
— Oi, querida. — Sorriu e beijou-me.
— Senti saudade.
— Também senti a sua, meu anjo.
— Esta será nossa primeira Ação de Graças juntos.
— A primeira de muitas.
Sorri.
— Venha, vamos até a sala ficar com todos enquanto minha avó não
chama para o jantar.
Peguei em sua mão e fomos até lá onde todos riam alto e
conversavam sobre tudo animadamente. Victor se sentou na única poltrona
vazia ao canto perto da lareira e puxou-me para sentar em seu colo. Fiquei
um pouco constrangida, mas ninguém pareceu se importar ou perceber, nem
mesmo meu pai, que gargalhava ao lado da minha mãe. A conversa estava
boa e fluiu bem. O dia estava se saindo melhor do que imaginei. Em um
momento de pura empolgação, beijei Victor abraçando-o pela nuca e todos
ao nosso redor se calaram. Completamente envergonhada, separei nosso
beijo e escondi meu rosto em seu pescoço, que exalava o seu cheiro
perfeito.
— Vocês são lindos juntos — disse minha mãe, quebrando o
silêncio e atraindo meu olhar para ela. — Diga-nos, Victor. Quando irá
pedir minha filha em casamento? — Desta vez, os olhares e atenção foi
dirigida a ela. — Preciso realizar o sonho de ver minha menina se casar.
Sua última frase soou para mim um tanto fúnebre. Ela tentou
expressar sua necessidade de realizar este sonho antes que sua morte
precoce a levasse de nós. E deduzindo pelo olhar de todos, eu não fui a
única a sentir e perceber isto.
— Será logo, eu prometo — respondeu Victor.
Meu pai soltou um riso sarcástico, atraindo meu olhar e o de minha
mãe.
— Por que o sarcasmo, Teddy? — perguntou ela.
— Nada. Achei que você tinha sonhos melhores para a nossa única
filha.
— Acho que Maya sabe o que é melhor para ela! — retrucou-o
sendo um pouco rude.
Olhei para Victor e ele tinha um pequeno sorriso nos lábios.
— O jantar está servido — anunciou minha avó ao entrar na sala e
eu agradeci mentalmente. Estava com medo de onde aquela situação iria
parar.
Depois do jantar, todos foram embora e eu ajudei minha mãe a se
preparar para dormir antes de ir também.
— Me prometa uma coisa — pediu ela.
— Claro. O quê?
— Que, quando se casar, usará meu vestido de noiva.
— Quando eu me casar... usarei seu vestido de noiva com o maior
prazer, mãe — prometi olhando-a nos olhos.
Ela sorriu feliz e emocionada. Eu a abracei e me despedi antes de
deixar ela e meu pai a sós.
Victor e eu fomos embora e tivemos uma noite deliciosa, assim
como todo o restante do nosso final de semana que passamos grudados um
no outro. Depois que ele se foi na segunda logo pela manhã, resolvi ir até o
trabalho da Grace e convidá-la para almoçar comigo. Fizemos tudo do
modo que era antes. Comemos, depois saímos para tomar um sorvete no
caminhãozinho estacionado na praça e, por último, deixei-a de volta no
trabalho.
No caminho para casa, abri meu aplicativo do banco no celular para
ver como andava minha situação financeira. Eu estava economizando ao
máximo e ainda não havia conseguido um emprego. Temia já estar
chegando no vermelho ou de já ter estourado o limite da minha conta
corrente. Mas... para meu espanto, havia muito dinheiro na minha conta.
Exatamente vinte e sete mil, trezentos e três dólares e quarenta centavos.
Esperei chegar em casa e liguei para o Victor, que atendeu no terceiro
toque.
— De onde veio todo aquele dinheiro da minha conta? Fui bem
clara que não queria sua ajuda financeira, a não ser que eu o pedisse! —
disse irritada.
— Se acalme, amor. Nem é tanto dinheiro assim. Isso são apenas os
juros de algumas ações que comprei para você. É um presente.
— Vinte e três mil dólares é muito dinheiro para mim. Eu entendo
que foi um presente, mas não acha que devia ter me consultado antes?
— São apenas ações, Maya. Pode vendê-las se quiser, mas não
aconselho a fazer isso agora.
Respirei fundo. Por que eu estava tão irritada afinal? Se não fosse
aquele dinheiro, eu estaria no vermelho com o banco. Engula esse orgulho,
Maya! Lembre-se do que sua mãe lhe disse certa vez: “Ceder não é sinal de
fraqueza”. Preciso deixar que, às vezes, ele cuide de mim. Talvez agora
seja a hora.
— Obrigada por isso.
— De nada, querida. É só um presente. Fique com ele até conseguir
um trabalho e depois você decide o que fazer com as ações. Okay?
— Okay.
— Amo você, mas agora tenho que ir.
— Eu também te amo.

Mais dias se foram e dezembro chegou trazendo com ele as festas de


fim de ano. Faltavam quatro dias para o Natal e eu estava em Nova Iorque
indo me encontrar com Sasha e Kim para irmos até Kleinfeld escolher seu
tão sonhado vestido de casamento.
— Maya! — gritou Sasha quando me viu aproximar delas, que me
esperavam na entrada da loja.
— Sasha! Oi. — Sorri e abracei-a.
— Que saudade! — disse entusiasmada.
— Também senti tanto a sua falta.
— Okay. Agora é a minha vez — falou Kim puxando-a para trás
pelo capuz do casaco que usava.
— Também senti saudade. — Ela abraçou-me apertado e eu retribuí.
— Nos falarmos pelo Skype não é a mesma coisa. — Soltei-a.
— Não mesmo. — Riu.
— Será que a gente já pode entrar? Estou congelando aqui — disse
Sasha.
— Claro. Vamos. — Entramos.
— Minha sogra e minhas cunhadas já estão lá dentro nos esperando.
A essa altura, elas já desorientaram a vendedora.
— A sogra da Kim quer que ela use o vestido de trezentos anos da
família — contou Sasha.
— O quê? Por quê? — perguntei.
— Ela disse que é tradição e que todas as mulheres da família, ou as
que entram para a família, usam o vestido. O problema é que ele é velho,
feio, cheio de manchas e sete números maior que o meu manequim. Isso
não vai dar certo — falou Kim com um pouco de desespero.
— Se acalme! — Segurei-a pelo ombro parando à sua frente. —
Respire fundo. O estresse pode fazer seu cabelo cair e não queremos isso,
não é?
— Não. — Continuou e respirou fundo.
— Fique tranquila. Ela não pode obrigá-la a usar o vestido velho da
família. Que usem as filhas dela. Você tem direito de escolher o que quer
vestir. É o seu dia!
— Tenho dito isso para ela a semana toda! — falou Sasha cruzando
os braços à frente e encarando Kim com um olhar tedioso.
— Agora vamos até elas e começar a caçada pelo seu vestido.
Ela sorriu feliz e fomos.
— Maya, querida! — disse Maggie sorridente e levantou-se vindo
até mim.
— Oi, Maggie. — Abracei-a.
— Como você está? — perguntou com preocupação, afastando-se
um pouco e dando-me uma boa olhada dos pés à cabeça.
— Estou ótima! Melhor do que nunca — garanti.
— Fico tão feliz em ouvir e ver isso. Como está Victor?
— Ele está bem. Está em Kentucky, agora.
— Você está tão linda. Amar faz bem às pessoas. — Rimos.
— Concordo.
— Maya. Deixe eu lhe apresentar a família do Jack. Esta é a mãe
dele, Viola. E essas são as irmãs, Aja, Michelle e Bonnie.
A família do Jack era toda como ele. Extremamente parecidos, altos,
cabelos pretos e olhos amendoados claros. Viola parecia muito jovem para
ser mãe de quatro filhos adultos. Aja era a mais velha, tinha trinta anos.
Depois vinha Jack com vinte e oito, Michelle com vinte e cinco e Bonnie
com vinte e três.
— Esta é Maya, a amiga de quem falo o tempo todo — disse
entusiasmada com um enorme sorriso no rosto, agarrando meu braço
direito.
— É um prazer conhecer todas vocês finalmente. Kim fala muito da
sua futura família. — Sorri simpaticamente.
— Olá! Já estão todas aqui? — perguntou a vendedora.
— Sim — respondeu Maggie.
— Então me acompanhem, por favor.
Acompanhamos a mulher até um espaço com sofá e cadeiras.
Depois que Kim disse como desejava que fosse seu vestido, ela foi com a
vendedora até o provador.
— Acho isso uma perda de tempo — disse Viola com desdém.
— Comprar vestido de noiva não é perda de tempo — retruquei
encarando-a.
— Nossa família tem uma tradição e Kim está desrespeitando ela!
— falou Aja.
— Kim não está desrespeitando nada! Ela apenas está usufruindo do
direito de liberdade que tem! — disse irritada.
— Aqui está a noiva — anunciou a vendedora e lá veio Kim
vestindo seu primeiro vestido com design de princesa.
— Ah, meu Deus! Você está linda, minha filha — falou Maggie
completamente emocionada.
— Uau! Quem diria que você poderia ficar bonita, Kim — provocou
Sasha nos fazendo rir.
— Você está linda! — elogiei.
— Ainda tem mais três modelos no provador. O que acharam desse?
— perguntou ela.
— Eu não gostei — falou Viola.
— Eu amei. Está parecendo uma verdadeira princesa — disse a ela,
que sorriu. Seus olhos reluziam como duas lanternas.
— Eu gostei, mas quero provar os outros.
— Então vá, querida — disse Maggie.
Kim saiu e minutos depois voltou com o segundo vestido, que era
ainda mais bonito. Ele não era tão rodado quanto o primeiro, mas ainda
assim tinha a aparência de vestido de princesa que ela tanto queria.
— E então... o que acharam desse? — perguntou ela.
— É lindo — respondeu Sasha.
— Eu também achei maravilhoso — disse.
— É uma pena que você não possa comprar o vestido que quer de
verdade — falou Michelle. — Tentar achar um que vá substituir o vestido
dos sonhos é missão falha, querida. — Seu “querida” soou com falsidade.
Ainda bem que Kim estava casando com Jack e não com sua família
antipática. Nesse quesito, eles eram bem diferentes. — Concordo com a
mamãe. Acho que estamos perdendo tempo aqui. Você devia pegar o
vestido da família e procurar uma boa costureira para fazer os ajustes.
— E uma boa lavanderia também para tirar todos aqueles ácaros e
manchas de cem anos causadas por sei lá o quê — retrucou Sasha com
raiva. Eu também estava com raiva pelas coisas que Michelle disse.
Olhei para Kim e ela tinha os olhos cheios de lágrimas e a tristeza
estampada em seu rosto. Maggie encarava Michelle incrédula e sem
palavras. Como poderia haver tanto amargor em um ser humano assim? O
que de bom atrairia para ela destruir o sonho de uma mulher que estava nas
nuvens com seu casamento?
— Que vestido é esse, Kim? — perguntei.
— É um vestido Pnina Tornai, que custa onze mil dólares. Ele
pertence à nova coleção e eu não posso comprá-lo. Meu orçamento é de três
mil.
— Por que não vai para o provador experimentar o próximo —
sugeri.
— Okay.
Ela saiu cabisbaixa e eu me levantei parando à frente da família do
Jack.
— Por que estão aqui? Para ajudá-la a escolher o vestido é que não
é! — disse irritada. — Se for para atrapalhar ou magoá-la, vocês podem ir
embora! Mas se ficarem é bom começarem a sorrir, rasgar elogios e
desfazer essas feições horrorosas, porque estou começando a me chatear
com vocês quatro! E não queiram me ver chateada — ameacei com olhos
estreitos. — Eu vou até lá ver como a Kim está e quando eu voltar é melhor
que já tenham ido ou que estejam sorrindo.
Dei-lhe as costas e saí. Procurei pela vendedora e a encontrei saindo
do provador.
— Oi. Será que você pode me mostrar o vestido que ela falou?
— O de onze mil dólares? — perguntou incrédula.
— Sim.
— Tudo bem, me acompanhe.
Segui-a até o estoque e lá estava o vestido embalado com todo
cuidado. Ele era perfeito! Saia rodada, busto “tomara que caia” com decote
coração, costas nuas com decote em “V” até a metade, branco, feito de seda
e organza com pedrarias em cristais swarovski translúcidos e reluzentes por
todo o corpete do vestido e parte da saia.
— Nossa... diria que ele vale cada centavo.
— Sim. É perfeito.
— Me dê. Eu mesma vou levar para ela até o provador.
— Mas o vestido está muito além do orçamento dela. Não fazemos
isso aqui. Achamos desrespeitoso dar algo para a noiva experimentar que
ela possa vir a se apaixonar e não poder pagar.
— Dinheiro não é problema. Eu darei o vestido a ela.
A vendedora encarou-me com espanto e depois sorriu.
— Tudo bem. Aqui. Vou esperar por vocês no corredor dos
provadores. — Entregou-me o vestido.
— Obrigada.
Caminhei até lá e bati de leve na porta antes de entrar em seguida.
— Maya! O que faz aqui? — Virou-se para mim.
— Vim trazer este vestido. Acho que ele será aquele que te fará
chorar quando provar. Afinal, acredito que é isso que toda noiva quer que
aconteça nesse momento.
Dependurei o vestido e abri o saco que o revestia.
— Ah, meu Deus! — disse com espanto. — Maya, esse é... esse é...
é o vestido. — Olhou-me surpresa.
— É sim. Quero que prove. E se esse for o vestido... ele é seu, Kim.
— Afinal, eu poderia fazer isso por ela. Havia vinte e três mil na minha
conta.
— Você me ajuda a vesti-lo?
— Claro.
Ela tirou o robe que vestia e eu a ajudei com o vestido delicado e
pesado. A vendedora entrou e ficou admirada com o quanto ela havia ficado
perfeita.
— Se quiser, podemos colocar algumas joias e um véu para
complementar o visual de noiva — ofereceu a Kim.
— Eu quero — respondeu animada.
A vendedora montou todos os acessórios nela e seguimos para o
salão onde todas nos aguardavam.
— Kim! Não! Combinamos de que não ia provar este vestido! —
repreendeu Sasha.
— Não resisti — respondeu ela.
Kim subiu no pequeno altar redondo e Maggie se levantou indo até
ela.
— Você está perfeita, querida! Perfeita! Uma verdadeira princesa.
Emocionadas, as duas se abraçaram e choraram silenciosamente.
— Meus parabéns — disse Viola parando de pé ao meu lado. — Ao
invés de ajudá-la, você apenas reforçou que ela não pode ter o que quer. —
Afastou-se e sentou novamente.
— E então... Esse é o seu vestido dos sonhos, Kim? — perguntei
aproximando-me dela.
— É ele que quer, querida? — perguntou Maggie. — Se sim,
venderei meu carro para pagá-lo. — Sorri com o gesto de amor de uma mãe
para com sua filha.
— É sim! — respondeu com convicção em meio às lágrimas. —
Este é o vestido com o qual irei me casar. — Seu sorriso não cabia em seu
rosto.
— Ótimo! Temos o vestido então — comemorou a vendedora.
— Mas não será preciso que você venda seu carro, mamãe. Este
vestido é um presente da Maya.
Maggie olhou-me com espanto.
— Isso é verdade?
— Sim! Este é meu presente de casamento para Kim.
— Oh, meu Deus! Obrigada! — Maggie abraçou-me apertado,
quase me sufocando. — Obrigada, querida. Obrigada!
— Se eu não ganhar um vestido desse quando for me casar, eu
coloco fogo no seu cabelo! — brincou Sasha nos fazendo rir.
— Eu nem sei como te gratificar por isso — disse Kim com um
sorriso gigantesco.
— Gratifique-me sendo muito feliz com o Jack. Vocês merecem
isso. — Abracei-a mais uma vez. Vê-la tão feliz assim, não tem preço.
— Qual será a forma de pagamento? — perguntou a vendedora.
— À vista.
— Me acompanhe, por favor.
Ao virar para segui-la, a família do rancor estava em meu caminho,
encarando-me com raiva expressa nos olhos. Sorri com ironia.
— Dê licença, porque a fada madrinha do dinheiro está passando —
gritou Sasha com provocação, segurando-me de leve pelos ombros e
empurrando-me para começar a andar.
Era óbvio que elas não gostaram nem um pouco de eu ter dado o
vestido a Kim. Queriam forçá-la a usar um vestido velho que estava na
família há anos. Tudo bem que ele tivesse valor sentimental e uma
simbologia para elas, e eu respeitava isso, mas ainda assim não tinham o
direito de destruir um dia tão especial, magoar e forçá-la a se casar com o
que não queria.
Depois de efetuarmos o pagamento, uma costureira da loja anotou as
mudanças necessárias a fazer e nós fomos embora. A mãe e as irmãs de
Jack foram para o hotel e Maggie disse que tinha uma amiga no Brooklin
que queria visitar. Depois de embarcá-la em um táxi, seguimos para um
café não muito longe dali e nos sentamos para nos aquecer, conversar e
matar a saudade. Desde que me mudei de Chicago, nunca mais havíamos
nos visto pessoalmente.
— Nossa! Vocês viram a cara da Viola quando Kim disse que você
daria o vestido?
— Achei que fosse sair fumaça pelos ouvidos dela — disse e
gargalhamos.
Meu celular tocou e era Caleb quem me ligava.
— Caleb! Oi, como você está?
— Maya, me ajude! Eu não sei o que fazer... Eu não sei o fazer... —
Ele estava completamente desesperado, ofegante e com a voz embargada.
— Calma! Calma, Caleb! Respire fundo e conte o que houve?
— É a minha mãe. Ela não está respirando, Maya! Ela tomou
remédios! Muitos remédios! — disse alto em meio ao choro que começava.
Assustada, levantei-me em um pulo.
— Onde vocês estão?
— Na cobertura.
— Estou indo para aí. Ligue para a emergência.
— Está bem. — Encerramos a ligação.
— O que houve, Maya? — perguntou Sasha assustada.
— Acho que a ex-esposa do Victor tentou suicídio. Eu tenho que ir.
A gente se fala mais tarde.
— Tudo bem — disse Kim.
Saí apressada e atravessei a rua correndo até o carro estacionado do
outro lado. Assim que me aproximei, Elliot abriu a porta e perguntou o que
houve.
— Para a cobertura da Eliza. Rápido!
— Sim, senhorita.
A caminho de lá, mandei uma mensagem para Noberto contando o
que estava acontecendo, já que Victor estava incomunicável preso em uma
reunião de negócios. Ao chegarmos, desci do carro correndo e entrei no
prédio indo direto para o elevador ignorando o homem no balcão que
gritava dizendo para me registrar antes de subir. Quando as portas se
abriram direto na cobertura, entrei chamando pelo Caleb.
— Aqui! Estamos no quarto!
Corri a ele e os encontrei no banheiro. Eliza estava dentro da
banheira seca e Caleb ajoelhado ao seu lado chorando desesperado.
— Já ligou para a emergência?
— Já. Eles estão vindo.
— Me ajude a tirá-la da banheira.
Ele ajudou a pegá-la e a colocamos deitada no chão. Chequei seus
sinais e, apesar de fracos, seu coração ainda batia.
— Preciso de uma toalha molhada.
Virei Eliza de lado e introduzi dois dos meus dedos em sua goela
para fazê-la regurgitar tudo o que havia em seu estômago. Precisei insistir
por três vezes até que ela vomitou. Seus lábios estavam roxos e sua pele
pálida ao extremo.
— Há quanto tempo ela está assim? — perguntei colocando a toalha
úmida em sua nuca.
— Eu cheguei há uns dez minutos ou menos. Liguei para você assim
que a achei. Não sabia o que fazer.
— Você fez o certo. Ela está fraca, mas está respirando e ainda tem
batimentos.
— Olá! — gritou alguém da sala.
— Devem ser os paramédicos, traga-os até aqui.
Ele saiu e eu encarei a mulher, que ainda se sustentava nesse mundo
por um fio de vida.
— A que ponto isso chegou... Eu sinto muito, Eliza. — Tirei seus
cabelos, que estavam grudados no rosto pelo suor frio.
— Deixe com a gente — disse a paramédica ajoelhando-se ao meu
lado.
— Ela vomitou? — perguntou outro paramédico.
— Sim. Eu a fiz vomitar, mas acho que não foi o suficiente. Não
sabemos há quanto tempo ela está assim e nem o que tomou.
— Vamos removê-la para o hospital e o garoto não pode vir, ele é
menor de idade. Você pode acompanhá-la?
— Claro.
Eles a removeram e fui atrás do Caleb encontrando-o sentado na
sala com um olhar perdido e o rosto lavado de lágrimas.
— Peça a Elliot para que te leve ao hospital. Preciso acompanhar
sua mãe. Vai ficar tudo bem, Caleb. Ela será bem cuidada.
— Eu sei.
— Te vejo lá.
Não era preciso ser inteligente para saber o porquê Eliza havia
tentado tirar a própria vida. Era claro que o motivo era Victor. Deus... Isso é
triste. Ela precisa de ajuda mais do que imaginávamos.
Já era tarde da noite e eu estava sentada na sala de emergência com
Caleb. Desde que ele chegou, não disse uma palavra sequer. Ficou apenas
em silêncio. Tentei conversar com ele, mas não me deu assunto. Não
parecia estar em estado de choque, apenas me ignorando e com raiva.
Levantei e fui até a cafeteria. Estava impaciente, ainda não havíamos tido
nenhuma notícia sobre Eliza. Os médicos apenas disseram que iriam cuidar
dela quando chegamos e se foram.
— Maya! — Ouvi Victor me chamar.
Virei-me e caminhei apressada até ele, abraçando-o apertado.
— Que bom que você chegou.
Ele retribuiu o abraço e beijou o topo da minha cabeça.
— Estou aqui, meu amor. Onde está o Caleb?
— Na sala de espera. Não sei se ele está bem. — Soltei-o.
— O que aconteceu?
— Eu não sei. Ele está calado desde que chegou aqui. Parece estar
com raiva de algo ou alguém.
— Como está a Eliza?
— Desde que a levaram não me disseram nada, porque não sou da
família e Caleb é menor de idade.
— Vou falar com eles. Para mim devem dizer alguma coisa.
— Espero que sim e já veja com eles um tratamento adequado para
a situação dela. Eliza precisa de ajuda, Victor. Tenho certeza de que irá
tentar de novo. Ela não fez isso só para chamar a atenção. Ela queria
morrer. E você sabe o motivo disso melhor do que eu.
— Eu sei.
— Faça o que for preciso. Tome todas as medidas e precauções
necessárias. Com a tentativa de suicídio, ela comprova ser mentalmente
incapaz de responder por si mesma. Não pode mais impedir que você a
ajude.
— Cuidarei dela.
— Pai! — chamou Caleb vindo a passos lentos em nossa direção.
— Caleb... Como você está, meu filho? — perguntou com imensa
preocupação, indo até ele.
— Primeiro você explica isso! — disse rude entregando ao pai uma
folha de papel dobrada ao meio. Victor a pegou e abriu.
— O que é isso? — perguntei me juntando a eles.
— É a carta de suicídio da minha mãe.
— Carta de suicídio? E por que não me disse nada a respeito? —
interroguei-o.
— Você é um filho da puta! — gritou Caleb apontando o dedo para
o pai.
— Caleb! — repreendi-o.
— Ela foi até você. Ela te procurou. Você viu que ela não estava
bem, mas, ao invés de ajudá-la, humilhou-a e mandou que a arrastassem de
lá como se ela nunca tivesse sido nada na sua vida! — gritou chamando a
atenção de todos à nossa volta. — Mas ela foi, pai! Ela foi a mulher que deu
a você seu único filho e satisfez seus desejos doentios por anos. Tudo bem
se você nunca a amou. Tudo bem se a odeia por causa do que ela fez a
Maya, com a imprensa, mas nada... nada justifica tratá-la como lixo! Ela é
um ser humano. Ela é minha mãe! — Havia tanta mágoa e ressentimento
em sua voz e nas lágrimas que derramava, que cheguei a sentir sua dor.
— Deixe-me ler isso, Victor. — Estendi minha mão pedindo a carta.
— Maya, eu posso explicar...
— Eu pedi a carta e não uma explicação. Me dê! — exigi e ele a
entregou-me.
— Se ela morrer... eu nunca irei perdoá-lo, pai.
Caleb nos deu as costas e saiu.
— Eu lhe avisei. Disse inúmeras vezes para tomar providências. Era
exatamente isso que eu temia... Que Eliza tentasse tirar a própria vida e que
Caleb o odiasse por isso. Seu maior terror acabou de acontecer: seu filho
está contra você.
— Não leia a carta. Deixe antes eu contar tudo o que aconteceu.
— O que tem nesta carta?
— Me ouça antes de ler. Por favor, Maya! — implorou tocando
minha mão, que segurava a carta dobrada ao meio.
CAPÍTULO 5

Uma semana atrás...

Eram três da tarde e já estava na quinta reunião do dia. Estava


contando as horas para embarcar com destino a Tulsa. Passar a semana
longe da Maya estava sendo um enorme sacrifício. Como podia um ser
humano tão pequeno fazer um efeito tão grande em mim?
— Senhor White? — chamou minha secretária ao entrar na sala de
reunião, afobada. — O senhor precisa vir comigo — disse séria e
apreensiva.
— Continuem sem mim. — Levantei-me e deixei a sala. — O que
houve? — perguntei preocupado.
— É a sua ex-esposa. Ela está aqui e se trancou em seu escritório.
— Mas que merda! Quem deixou essa louca entrar?
— A entrada dela é permitida, senhor. Os seguranças já tentaram
fazer com que ela abra a porta ou se afaste para que possam arrombar, mas
ela não colabora. Pelos barulhos, está destruindo sua sala.
Aproximei da porta do meu escritório e chamei por ela.
— Vic... é você? — perguntou ela com a voz embargada.
— Sim, sou eu! Agora abra a porta! Não é um pedido, Eliza.
Escutei a tranca se desfazer. Abri a porta e fiz um sinal para que
meus seguranças aguardassem lá fora. Entrei e vi toda a decoração
destruída, quadros quebrados e almofadas rasgadas. Ela estava descalça,
com a maquiagem toda borrada pelas lágrimas e os cabelos, que sempre
estiveram em ordem, estavam completamente despenteados.
— Eliza... — chamei-a me aproximando.
— Não chegue perto! — gritou e parei.
— O que está fazendo aqui? Onde está o nosso filho?
— Em Nova Iorque. Ele sabe se cuidar sozinho — respondeu com
desprezo.
— Não, ele não sabe! Caleb só tem dezesseis anos e é um jovem em
reabilitação. Você devia estar cuidando dele, agora! — exaltei-me.
— Você acha isso justo? Acha justo eu ter que sacrificar minha vida
para cuidar dele sozinha, enquanto você vive uma historinha encantada de
amor com a Maya? — gritou.
— É seu dever estar com ele! Foi você quem nos levou para o
tribunal porque queria possuir a guarda do nosso filho. Você se lembra
disso? Também se recorda de que há seis meses, quando ele voltou do
acampamento, eu quis levá-lo para morar comigo, mas você não permitiu?
— perguntei aos berros, sem a menor paciência com sua irresponsabilidade.
— Você não tem que tirá-lo de mim, Victor. Você tem que voltar
para mim! Voltar para a nossa família! Você nos trocou por ela! — disse em
meio ao choro.
— Não troquei nada pela Maya, Eliza. Estamos separados há quase
sete anos. Você precisa aceitar isso. Aceitar que nosso casamento sem amor
acabou há muito tempo. Entender que estou com outra mulher agora e que a
amo! Aceite que a vida seguiu, porque você precisa acompanhá-la!
— Não... por favor, não. — Ela aproximou-se a passos rápidos e
parou diante de mim, segurando meu rosto entre suas mãos. — Por que
você nunca me amou, Victor? O que há de errado em mim? O que ela tem
que eu não tenho? — Soluçou em meio ao choro, que ficava a cada segundo
mais desesperado e alto.
— Não há nada de errado com você, Eliza. Você é uma mulher linda
e afetuosa. Foi minha mais fiel submissa. — Ela sorriu e, inesperadamente,
beijou-me.
Seus lábios ainda eram como eu recordava: macios e carnudos.
Tinham o mesmo sabor da última vez que os beijei. Seu perfume ainda era
o mesmo que eu costumava gostar. Apesar de tudo isso, não retribuí e nada
senti como já era esperado. Afastei meu corpo um pouco para trás,
segurando-a firme pelos braços e a encarei.
— Eu tentei... Tentei muito amar você antes mesmo de nos
casarmos, mas não consegui. Eu ia encerrar nosso caso naquele mesmo dia
quando me procurou para contar que estava grávida. E mesmo depois das
suas ameaças para nos casarmos, eu ainda tentei, mas falhei de novo. Você
precisa de alguém que possa te dar o que você merece e quer. Eu não sou
esse alguém e nunca fui.
— Mas eu amo tanto você! — Acariciou meu rosto.
— Eu sei. Mas você precisa se curar desse amor que está te
deixando doente e infeliz. Precisa seguir em frente! Viver em paz
finalmente.
— Por quê?
— Porque vou me casar com a Maya e você precisa nos deixar viver
a nossa paz.
Ela ficou séria e encarou-me com ódio, acertando em seguida minha
face com um forte tapa estalado causando uma grande ardência na pele.
— Eu odeio você! — disse com desprezo, entredentes. — Eu...
odeio... você! — berrou e cuspiu em meu rosto antes de afastar-se de costas.
Peguei o lenço no bolso interno do paletó e limpei meu nariz e
bochecha.
— Tem que parar de provocar e tentar arruinar a vida dela. Você foi
longe demais, Eliza. Você subornou a polícia para prendê-la, atacou-a em
um banheiro, enviou fotos nossas para o pai dela, encrencou uma garota que
quase foi morta pelas mãos de um cafetão e traficante desgraçado. Levou
drogas para dentro do apartamento que vive com nosso filho, um jovem e
ex-viciado em cocaína! — comecei a falar manso forçando uma calma
inexistente, mas terminei em um grito. — Você sabia que sumiram pinos
daquele pacote? E se foi Caleb que os achou? E se ele tiver quebrado seu
ciclo de sobriedade por culpa sua?
— Não foi ele. Fui eu quem peguei. Eu tirei os pinos de cocaína e
joguei fora descarga abaixo.
Encarei-a confuso, imaginando por que diabos faria isso.
— Por que fez isso?
— Porque queria que matassem aquela puta barata! Sei como isso
funciona. Se eles acharem que você os roubou, o farão pagar com a vida.
Assim eu não teria alguém para testemunhar o que fiz com sua futura
mulherzinha. Sem dores de cabeça — falou com desdenho e sorriu. Um
sorriso frio que denunciava sua insanidade mental.
— Meu Deus! Você é um ser humano pior do que imaginava. Uma
mulher doente que precisa de ajuda antes que machuque mais alguém
indiretamente ou diretamente. Você representa perigo para a sociedade.
Aceite que precisa de ajuda, Eliza! Eu posso ajudá-la a se curar dessa
obsessão que está te matando aos poucos. Isso que você sente não é amor.
— Eu não preciso de ajuda! Eu não preciso da sua ajuda! — berrou.
— Quero que você morra! — Varreu com as mãos tudo o que estava sobre
minha mesa, jogando no chão.
— Já chega! Chega de me atormentar, chega de quebrar minhas
coisas, chega de tentar me separar da Maya, chega de tentar machucá-la! —
Caminhei até ela a passos largos e peguei-a pelos ombros segurando-a com
força. — Eu não aguento mais isso. Se você não quer a minha ajuda, então
a expulsarei daqui. Me esqueça! Nos deixe em paz, Eliza! Seguranças!
— Não! Não, não, não, não... Não me expulse daqui. Deixe-me
ficar. Deixe-me ficar com você, meu amor!
— Se tentar mais alguma coisa contra a Maya outra vez, farei você
apodrecer na prisão! — ameacei-a e, por sua feição, percebi que ela notou
que não eram somente palavras cuspidas pela boca. — Fui claro? — Pude
ver o medo em seu olhar espantado.
— Senhor... — chamou os seguranças ao entrar.
— Tirem-na daqui e avise que sua entrada é proibida a partir de
hoje.
Eles a pegaram pelos braços e a arrastaram da minha sala enquanto
ela se debatia, chutava-os, cuspia e gritava. Honestamente, senti pena dela.
Mas, se não queria minha ajuda, como poderia fazer algo se não éramos
mais casados? O que me restava a fazer agora era somente agir para
proteger Maya das suas armações.
— Por favor... Não faz isso. Eu amo você! Não quero viver sem
você! Vic... Victor, por favor! — gritou com desespero e, aos poucos, seus
gritos começaram a ficar cada vez mais distantes.
— Senhor White? — chamou minha secretária da porta. — Já
mandei que a equipe de limpeza subisse para colocar tudo em ordem
novamente. Também já liguei para o seu decorador, ele vem amanhã às
nove. O pessoal da informática já foi avisado para que venham instalar um
novo computador.
— Obrigado, Anete. Cancele minha agenda para o resto do dia. Eu
vou para casa.
— Sim, senhor.
Ela se retirou e eu dei uma boa olhada ao meu redor avaliando o
estrago causado por Eliza antes de deixar a sala. A caminho de casa, meu
celular tocou e era ela quem me ligava pela quinta vez seguida. Respirando
fundo e contrariado, atendi.
— Vou bloquear o seu número, Eliza.
— Nos dê mais uma chance. Não quero viver sem você — disse com
a voz embargada.
— Então não viva! — Encerrei a ligação, cortando mais uma das
suas chantagens emocionais que recebia desde o divórcio.

Hoje...

— Por que não me contou sobre tudo isso quando foi me ver em
Tulsa? Principalmente a respeito do beijo.
Envergonhado, levantei minha cabeça e olhei para Maya, que tinha
os olhos marejados.
— Não queria estragar nossas poucas horas juntos com essa história.
Tive medo de você se chatear com o beijo.
— Victor... Você devia ter prestado queixa quando ela apareceu e
quebrou seu escritório. A polícia teria visto o quanto estava transtornada e a
levariam para um hospital onde cuidariam do resto. E a essa hora... nada
disso estaria acontecendo. Quando uma pessoa demonstra ser propensa ao
suicídio você não a encoraja a fazer. Percebe que foi isso que fez?
— Eu sei que errei. Desculpe.
— Não é para mim que você deve pedir desculpas, é para o seu
filho, que por pouco não perdeu a mãe hoje.
Abaixei minha cabeça reconhecendo meu erro terrível. Estava tão
cego pela raiva que não percebi o que de fato estava fazendo. Devia ter
dado mais atenção a sua ligação, mas não dei. Falhei. Errei.
— Vou procurar notícias sobre ela e depois tentar falar com Caleb.
— Tudo bem. Vou ficar aqui mais um pouco. Preciso de um
tempinho — respondeu encarando a carta que ainda segurava nas mãos.
Afastei-me e segui até o balcão de informação onde me disseram
que logo mais o médico viria falar comigo. Olhei para o lado e vi Caleb
sentado de cabeça baixa, com os cotovelos apoiados sobre os joelhos,
esfregando as mãos freneticamente. Vê-lo daquele jeito me doeu. Tão
jovem, tão preocupado, tão angustiado. Caminhei até ele e parei à sua
frente.
— Perdoe-me. Não acreditei que ela faria.
Ele ergueu sua cabeça e encarou-me com os olhos cheios de
lágrimas.
— Ela quase se foi, pai. Minha mãe pode ser a pior pessoa nesse
mundo para você, mas ela ainda é a minha mãe e eu a amo!
— Eu sei. Juntos iremos cuidar dela, eu prometo! Perdoe-me, Caleb.
Perdoe-me, meu filho.
Ele se levantou e encarou-me com imensa tristeza. Havia tanto
mágoa em seu olhar, que faltava pouco para transbordar. Aquilo me
dilacerou por dentro e uma enorme vontade de chorar junto com ele e por
ele, entalou em minha garganta.
— Eu quero ver a minha mãe, pai. Já faz horas que não tenho
notícias dela.
— O médico já está vindo falar conosco.
Caleb me abraçou e eu retribuí aconchegando-o em meus braços,
acalentando-o como um bebê. Para mim, não importava a sua idade ou que
já tivesse a mesma altura que a minha, ele sempre seria meu pequeno
menino de coração ingênuo. Meu garotinho que esperava por mim todas as
noites acordado, só para dizer: “boa noite, papai”.
— Vocês são os familiares de Eliza Holt?
— Sim — respondi rompendo nosso abraço.
— Eliza está sedada agora no CTI em observação. Fizemos uma
lavagem estomacal e ministramos medicamentos para cortar o efeito dos
calmantes e antidepressivos ingeridos. Também realizamos exames e ela
está bem. Mas foi por pouco. Agradeça a quem prestou o primeiro
atendimento antes dos paramédicos chegarem ao local. Se não fosse por
esta pessoa, a senhorita Holt não estaria mais entre nós. O horário de visita
começa às dez da manhã e se encerra às quatro.
— Quando a minha mãe vai receber alta?
— Honestamente, não temos uma previsão para alta hospitalar. Sua
mãe atentou contra a própria vida. Assim que ela estiver estabilizada e com
condições de falar com um terapeuta, ela será encaminhada para a ala
psiquiatra, onde receberá ajuda especializada.
— Ala psiquiatra? E quanto tempo minha mãe ficará nesse lugar?
— Será só por alguns dias. Se o médico a analisar e achar que ela
tem condições de voltar para casa e seguir com sessões diárias, ele dará alta
a ela. Caso contrário... indicará a vocês uma clínica para internação.
— Internação? Mas... — ele interrompeu e encarou-me com
espanto.
Acho que ele não considerava que a mãe pudesse vir a ficar
internada em uma clínica psiquiátrica.
— Obrigado, doutor — agradeci.
— Não me agradeça por isso, é apenas o meu trabalho. Aconselho-
os a irem para casa, não há por que passarem a noite aqui sentados nestas
cadeiras desconfortáveis. Se algo acontecer, o hospital entrará em contato
direto com você, Sr. White.
— Tudo bem. Boa noite.
O médico se retirou e Caleb se sentou.
— Não quero voltar para casa.
— Você não vai. Ficará comigo e a Maya no hotel. Vamos?
Ele assentiu e saímos juntos.
CAPÍTULO 6

Victor se afastou e eu fiquei ali com a carta na mão. Caminhei até


alguns bancos mais adiante e me sentei na dúvida se queria ou não ler uma
carta de adeus de uma suicida que me odiava. Senti que estava invadindo a
privacidade da Eliza, afinal, aquela carta não era destinada a mim e sim ao
filho e o ex-marido. Em um ímpeto de curiosidade, desdobrei a carta
esticando o papel meio amarrotado.

Antes de qualquer coisa, não quero que pensem que desisti da


minha vida. Apenas desisti de vivê-la sem o meu grande amor. Não me
julguem!

Para o meu filho...


Eu sinto muito, Caleb. Mas sei que você consegue sem mim. Afinal,
desde que me separei do seu pai, invertemos os papéis. Você se criou
sozinho e cuidou de mim quando deveria ter sido ao contrário. Perdoe-me
por todas as vezes que desmaiei no sofá após três ou mais garrafas de
vinho e deixei você sem o jantar. Ou pelos dias que me dopei com remédios
para dormir e me esqueci de cumprir com minhas promessas de levá-lo ao
museu ou para patinar. Em nossa casa, o adulto sempre foi você. Saiba que
não o culpo por sua dependência química. Eu te entendo. Foi um jeito que
achou para escapar da nossa louca realidade. Você era só uma criança e
usei-o para atingir alguém que nunca me amou e jamais amará. Perdoe-me
pela minha fraqueza, querido, mas peço que entenda. Acredito que estará
melhor agora.

Para o homem que mais amei no mundo...


Victor... Apesar de não me amar, saiba que sou grata pelo prazer e
momentos bons que me proporcionou. Fui feliz por ter conseguido dar a
você o que tanto desejou na vida: um filho. Peço que não se culpe pelo que
eu fiz, apesar de acreditar que isso não acontecerá, afinal, foi você quem
disse em outras palavras para que eu desse fim ao meu sofrimento, quando
nos falamos pela última vez ao telefone. Mas, por mais mórbido que isso
seja, saiba que morri contente... realizada. Tive a chance de ter nosso
derradeiro beijo. Sentir seus lábios nos meus. Sentir seu cheiro, seu gosto,
seu calor... foi maravilhoso! Foi incrível! Tocar sua pele quente e sedosa
com minhas mãos foi inexplicável! Só lamento não ter tido mais tempo com
você naquela tarde ou a chance de me submeter uma última vez. Ter meu
Dominador era o que eu procurava naquele dia. Eu te amo, querido. Te
amarei para todo o sempre!

Com carinho,
Eliza Holt.

Sequei a única lágrima que escorreu por minha face, sentindo muito
por ela. Sua situação era triste, não conseguia imaginar o que era viver dia
após dia nesse buraco negro sufocante, até chegar ao ponto de achar que sua
vida não valia mais nada. O amor não correspondido a levou à loucura e
depois à tentativa de suicídio. Ler sua carta me fez sentir um pouco da sua
dor e ter um mínimo de percepção do seu sofrimento. Porém, ainda não
consegui sentir remorso por odiá-la e desejar vingança em um momento. Eu
ainda sentia a minha dor por tudo o que ela me fez.
— Maya? — escutei Victor me chamar.
Levantei guardando a carta no bolso da calça e passei as mãos pelos
cabelos jogando-os para trás, antes de me virar para ele.
— Já teve notícias?
— Sim. Ela está em observação no CTI. Fizeram lavagem estomacal
e deram alguns remédios para cortar o efeito dos que ela ingeriu. Mas ela
passa bem.
— Isso é bom.
— Sim. Caleb me contou que foi você quem prestou os primeiros
socorros a ela. O médico nos disse que se não tivesse sido este primeiro
atendimento, ela não teria resistido.
— Só fiz o que tinha que ser feito.
— Independente disso... Obrigado, querida. — Colocou uma mecha
do meu cabelo atrás da minha orelha. — Você salvou a vida de alguém hoje.
— Faria de novo e por qualquer pessoa.
— Eu sei, mas me deixe agradecer.
Não estava achando o que fiz por ela fantástico ou grande coisa. Eu
realmente faria de novo e por qualquer pessoa. Se eu sabia o que fazer
naquela situação, então, por que não fazer? Que tipo de futura médica eu
seria se negasse socorro?
— Você está bem? Está me encarando de um jeito que não estou
sabendo decifrar. — Deu-me um pequeno sorriso.
Eu estava me sentindo aérea. Dormente. Cansada. Magoada. Só
conseguia pensar no bendito beijo dos dois e isso estava me incomodando
muito, por mais que eu estivesse ciente de que não teve o menor significado
para ele e que não tenha correspondido. Na verdade, acho que boa parte da
mágoa vinha de tudo isso ter acontecido há poucos dias e ele não ter me
contado nada.
— Maya... — chamou trazendo-me à realidade.
— Estou bem.
— Não está, eu sei. Vamos voltar para o hotel. Caleb já está nos
esperando no carro. Ele vai ficar conosco na suíte esta noite.
— Okay.
Ele estendeu sua mão para mim e eu a peguei. Saímos de mãos
dadas e dedos entrelaçados. Agarrei seu braço sem soltar sua mão e
caminhamos até o carro. Ao entrar, Caleb já estava lá. Sério. Com um olhar
perdido janela afora. Senti vontade de abraçá-lo, mas não sabia se ele estava
aberto para isso. Recostei-me em Victor e ele me abraçou passando o braço
por trás de mim.
Ao chegarmos ao hotel, Caleb passou direto para o pequeno quarto
com duas camas de solteiro enquanto eu fui para o nosso. Victor ficou na
sala falando com Noberto. Depois de um banho, vesti roupas quentes e
confortáveis. Estava secando os cabelos no banheiro quando Victor entrou
abraçando-me pela cintura.
— Vou pedir nosso jantar. Quer algo em especial?
— Não. O que pedir para mim está ótimo. — Liguei novamente o
secador de cabelo.
— Vamos conversar. — Puxou o plugue da tomada desligando-o
novamente.
Respirei fundo e encarei-o pelo reflexo do espelho.
— Está chateada pelo beijo? Já disse que não foi correspondido e
que não significou nada para mim.
Abaixei minha cabeça.
— Isso me incomoda muito. É torturante saber que os lábios dela
tocaram os seus quando já eram meus. Mas... — Tornei a olhá-lo pelo
reflexo. — o que me magoa mesmo, é não entender por que não me falou
sobre nada disso.
— Porque sabia que ficaria assim, chateada. Triste... Não falei
justamente porque não queria esse clima entre a gente. Desculpe-me por
isso.
Virei-me para ele.
— Agora que ela receberá a ajuda da qual precisa, essa tortura vai
passar, não é?
— Espero que sim. — Abraçou-me. — Estou preocupado com
Caleb. Ele não disse mais nenhuma palavra desde que saímos do hospital.
— Eu vou até lá falar com ele. Saber se está bem e o que quer para o
jantar.
— Certo. Obrigado, querida.
— De nada.
Ergui minha cabeça e olhei-o. Ele sorriu com carinho e, lentamente,
aproximou seu rosto do meu para um beijo. Retribuí sem demora. O beijo
foi longo, quente, carinhoso e saudoso. Findei selando seus lábios e sorri.
— Quando tudo isso passar... faremos uma viagem. Nada de
trabalho ou outros problemas. Eu prometo — disse ele.
— Irei cobrar.
Afastei-me e deixei o banheiro indo até o quarto do Caleb. Bati de
leve na porta e o ouvi dizer que eu podia entrar.
— Oi. Vim ver se está tudo bem por aqui.
Encontrei-o revirando sua mala aberta sobre uma das camas de
solteiro.
— Estou procurando algo para vestir nesta mala que o Noberto
preparou para mim. Ele se esqueceu de colocar cuecas. — Deu um riso
curto, meio sem humor.
— Posso pedi-lo para providenciar uma para hoje, até que volte em
casa para pegar mais. — Aproximei-me dele, sentando na outra cama de
solteiro.
— Não precisa, basta eu não vestir nenhuma calça com furo entre as
pernas — brincou fazendo-me rir.
— Você está com fome? Seu pai vai pedir o jantar. Quer comer o
quê?
— Eu não estou com fome.
Sabia que ele iria dizer isso e precisava achar um jeito de fazê-lo
comer, sem ter que bancar a namorada chata do pai dele.
— Vou pedir um hambúrguer com fritas e refrigerante. Victor com
certeza vai pedir algum prato chique com quase nada de comida, que custa
duzentos dólares e tem um nome difícil de pronunciar. — Ele sorriu. —
Você me acompanha no hambúrguer com fritas?
Caleb pensou um pouco por alguns segundos, ainda fuçando sua
mala.
— Okay. Tudo bem. Eu te acompanho sim.
— Está bem. Vou lá fazer os pedidos. — Levantei-me caminhando
em direção à porta aberta.
— Maya?
Parei e me virei para ele.
— Sim.
— Acha que a minha mãe vai ficar bem?
Encarei-o sem saber o que lhe dizer. Não esperava que ele viesse
falar sobre a mãe comigo. Aproximei-me e sentei na cama novamente.
— Eu acredito que sim. Mas isso irá demorar. Você vai precisar ser
paciente com ela. Eliza não está no seu juízo mais perfeito. Ela precisa de
ajuda e seu pai irá proporcionar o melhor a ela. Mesmo separados, Victor
irá assumir a responsabilidade de ajudá-la.
— Ele já devia tê-la ajudado antes.
— Victor não tinha como forçá-la a nada. Antes desse
acontecimento, as coisas teriam que acontecer de modo consentido da parte
da sua mãe e você a conhece bem. Sabe que ela não aceitaria.
— Eu sei. — Abaixou a cabeça.
— Caleb... — Atraí sua atenção novamente. — Vai ficar tudo bem!
— garanti com firmeza para acalmá-lo.
— Posso ficar com você e o papai até que ela fique bem?
— É claro que pode! Victor trabalha bastante e está sempre
viajando, mas se quiser ficar comigo no recesso de inverno em Tulsa, será
mais do que bem-vindo. — Sorri com afeto.
— Você não é só um anjo na vida do meu pai. Foi um anjo na vida
da minha mãe hoje e agora... será para mim.
— Nós já somos uma família, Caleb. É isso que uma família faz.
Eles cuidam um dos outros. Zelam pelo próximo.
Ele caminhou em minha direção com braços abertos e eu me
levantei para recebê-lo. Caleb era bem mais alto do que eu; faltava poucos
centímetros para atingir a altura do pai e, provavelmente, ficaria um pouco
mais alto do que Victor logo mais. Nós nos abraçamos apertado, enquanto
eu me firmava na ponta dos pés.
— Eu te amo, Maya. Você já é parte da minha vida.
— Eu também amo você, querido. Não se esqueça disso e nem do
quanto o amor do seu pai é incondicional por você.
Dois dias haviam se passado. Eliza estava bem e fora de perigo. Na
manhã seguinte a confusão, depois que me despedi da Sasha, Maggie e Kim
no aeroporto, fomos até o hospital. Lá, recebemos a notícia de que Eliza
havia se recusado a falar com o psicólogo. Caleb entrou no horário de visita
para tentar convencê-la a falar com um terapeuta, mas ela o ignorou com
maestria como se ele nem estivesse lá. O menino saiu cabisbaixo do quarto
e eu confortei-o dizendo que ela talvez estivesse envergonhada pela sua
tentativa falha de ceifar a própria vida.
O psicólogo informou a Victor que ela só seria liberada do hospital,
mediante uma transferência para uma clínica psiquiátrica onde pudesse
receber ajuda especializada. Mas esta notícia já era esperada por todos nós.
Ela jamais estaria apta para sair e se cuidar sozinha naquele momento. O
médico nos levou até uma sala de reunião e nos deu privacidade para
conversarmos e Victor fazer suas ligações para conseguir o quanto antes a
transferência. Entre uma ligação e outra, foi decidido que Caleb iria morar
com o pai em Houston até ir para faculdade. Ele então pediu ao pai que
internasse a mãe em uma clínica Houston, assim poderia ir vê-la todos os
dias e ela não se sentiria sozinha ou abandonada pelo seu único filho. Achei
lindo da sua parte tomar esta atitude tão madura. Victor não pensou duas
vezes e logo arranjou uma transferência para a melhor clínica psiquiátrica
em Houston.
Na manhã seguinte, fui com Caleb até a cobertura de mais alto luxo,
encaixotar todos os seus pertences. Victor chegou mais tarde, quando
estávamos terminando de arrumar a mudança, com a notícia de que Eliza
estava naquele momento indo para Houston. Quando enfim trouxe a última
caixa do quarto, encontrei Victor de pé diante das enormes portas de vidro
encarando a vista com um olhar nostálgico. Devia estar se recordando dos
anos que viveu naquela cobertura com a ex-esposa e o filho. Senti uma
pontada de ciúmes, mas eu devia respeitar. Afinal, era parte da sua vida... da
sua história.
Uma equipe contratada por ele chegou para levar as coisas do filho e
retirar com todo cuidado tudo o que era de valor do apartamento, como:
joias, quadros, vasos, tapetes e esculturas, para levar até um cofre especial
em um banco. Pela primeira vez nos últimos três dias, Caleb me pareceu
animado. Ele estava sorridente e dizia o tempo todo que estava muito feliz
de ir morar com o pai.
— Maya, você devia vir morar com a gente — falou entusiasmado,
quando entrou na sala arrastando uma mala.
— Se você conseguir fazer isso acontecer, eu te dou um carro —
disse Victor com os olhos ainda parados na vasta vista para o Central Park.
— Tento fazer Maya vir morar comigo há meses.
— Quando é que você se muda, Maya? — perguntou todo
sorridente, com os olhos brilhantes e humorado.
— Desculpe, mas seu carro vai demorar um pouquinho a chegar.
Agora não posso. Preciso ficar mais um tempo em Tulsa para ajeitar
algumas coisas e colocar outras no lugar.
Ele desfez seu sorriso ficando sério. Victor finalmente tirou os olhos
do vidro e olhou para o filho por cima do ombro com um sorrisinho cínico.
— Mas em breve a resposta será outra. Não é? — perguntou Victor
para mim e eu sorri.
— Sim.
— Caleb... — Virou-se para ele descruzando os braços e puxou-me
pela cintura para mais junto dele. — Maya e eu estamos noivos.
Caleb bateu as palmas das mãos e nos encarou com surpresa com a
boca aberta em um “O” e olhar de espanto.
— Mas isso é incrível! — falou quase em um grito. — Quando
aconteceu?
— Há pouco mais de um mês, logo após o sequestro — contei.
— Como fez o pedido, pai?
— Eu não fiz o pedido.
— Ué? Como assim? — Substituiu a feição de surpresa por uma
confusa, arqueando a sobrancelha.
— Fui eu quem o pediu — revelei.
— Isso é o que eu chamo de uma mulher de ação. — Riu. — E
quando será o casamento? Adoro comida de casamento! — Esfregou
sutilmente a mão no estômago.
— Ainda não temos uma data — respondi.
— Mas eu pretendo que seja logo — anunciou Victor depressa.
— Vamos falar com meus pais primeiro. Aí a gente decide isso.
Combinado? — Encarei Victor.
Ele assentiu com a cabeça, mas era visível a ponta de decepção em
seu rosto. Victor queria que as coisas acontecessem logo, mas ainda não
podia.
— Que tal acelerarmos isso para embarcarmos mais cedo? — sugeri
para quebrar um pouco da tensão que começava a pairar entre nós. —
Amanhã é véspera de Natal e já quero estar em Tulsa.
Voltamos para o hotel e Victor deixou Elliot responsável pela equipe
que cuidava da mudança. Ao chegarmos, fui ao closet e comecei a fazer
nossas malas. Às sete da noite embarcamos para Tulsa, mas Victor nem
mesmo desceu do jatinho. Ele recebeu inúmeras ligações e e-mails
preocupantes do trabalho e foi para Houston prometendo voltar no dia
seguinte a tempo de jantarmos com minha família e irmos à igreja. Caleb
ficou comigo e Elliot nos levou para casa. Quando chegamos, o levei até
seu quarto e fui para meu. Enquanto enchia a banheira para um banho
quente, liguei para o meu pai. Nós havíamos trocado duas mensagens mais
cedo e eu prometi ligar quando chegasse.
— Oi, querida! Como foi Nova Iorque? Fez boa viagem de volta?
— Oi, pai. Foi tudo bem. — Achei melhor poupá-lo do caso da
Eliza. Falar sobre isso com ele, só daria mais motivos para criticar Victor.
— Como estão as coisas por aqui?
— Está tudo bem. Você não vai acreditar na notícia que tenho!
— Que notícia? — perguntei apreensiva, apesar de notar o
entusiasmo em sua voz.
— Sua mãe irá receber alta para o Natal!
— Ai, meu Deus! Isso é ótimo, pai! É o melhor presente de Natal
que eu poderia ganhar! — disse com a mais pura felicidade explodindo
dentro de mim.
— Ela irá sair amanhã à tarde. Pode ir buscá-la?
— Mas é claro que sim. E quando ela tem que voltar? — Houve um
breve silêncio estranho do outro lado da linha.
— Ela volta depois do Natal — respondeu depressa.
Franzi o cenho com estranheza.
— Ótimo! Estou muito empolgada para o nosso Natal. Amanhã
vocês conhecerão o Caleb, filho do Victor. E, por favor, pai... ele é só um
menino. Nada de piadas ou de alfinetar o Victor.
— Prometo tentar me comportar.
— Okay. A gente se fala amanhã para acertamos os detalhes da
nossa ceia?
— Claro! Podemos fazer durante o almoço na casa da sua tia
Jenna.
— Combinado. Eu te amo, pai. Boa noite.
— Boa noite, filha.
Após meu banho, desci para a cozinha em busca de alguma coisa
para comer, não havia conseguido jantar no avião.
— Maya? — chamou Caleb atrás de mim, assustando-me.
— Achei que já estivesse dormindo. — Sorri sem graça, com a mão
espalmada sobre o coração.
— Eu tentei, mas não consegui. Não paro de pensar na minha mãe.
— Ela vai ficar bem. Tenha fé. Depois do Natal, você irá para
Houston e poderá ir vê-la todos os dias.
— Maya... Ela já fez alguma coisa para separar você e o papai? —
Sentou-se à mesa redonda.
— Sim — respondi sem olhá-lo, colocando o sanduíche que havia
feito no prato.
— O que ela fez?
Encarei-o sem saber o que lhe dizer. Será que contá-lo a verdade de
suas armações não o deixará ainda mais triste com a mãe ou com raiva do
pai por não ajudá-la muito antes?
— Não sei se é assunto para essa hora.
— Por favor... Se ela foi capaz de fazer aquilo com os jornalistas em
Nova Iorque e depois ir atrás do meu pai para destruir seu escritório, sei que
foi capaz de muito mais.
— Ele contou para você sobre a confusão no escritório?
— Contou sim.
Caminhei até ele e sentei-me ao seu lado.
— Caleb... Sua mãe fez coisas que feriram internamente a mim e
outras pessoas. Ela agiu por loucura. Tudo o que fez, não quer dizer que ela
seja uma pessoa ruim... só uma que está doente.
— O que ela fez? — interrogou tenso.
— Inúmeras coisas. Mandou pessoas me seguirem. Subornou a
polícia para irem até a universidade e me prender sob a acusação de
prostituição. Mandou que bisbilhotassem eu e Victor em momentos íntimos
durante uma viagem a Seattle e depois enviou as fotos ao meu pai. Ele ficou
por meses sem falar comigo, porque acreditou que eu realmente fosse uma
prostituta de luxo e seu pai fosse meu cliente. Devido às acusações fui
afastada da universidade pela banca. Ela... — interrompi-me e engoli em
seco, desviando o olhar para o copo com suco sobre a mesa.
— Ela...? — cobrou-me a continuar.
— Ela pagou para dois garotos da faculdade doparem eu e uma
amiga em uma festa na fraternidade e mandou que alguém tirasse fotos no
momento em que o cara com quem conversava tentava me agarrar. As fotos
foram enviadas ao Victor e ele achou que eu tivesse o traído. Mas nada
aconteceu. Eu acreditei ter sido abusada sexualmente, mas o babaca que me
drogou só havia feito uma “simulação” de uma noite de sexo. — Fiz aspas
com os dedos.
— E quanto a sua amiga?
— Ela era cúmplice disso em partes. Eliza a chantageou para me
levar até a festa. Daí em diante, tudo o que aconteceu ela não sabia de nada!
O que aconteceu comigo foi apenas uma mentira, mas com ela foi muito
real.
— Meu Deus! — exclamou boquiaberto. — Eu sinto muito, Maya.
— Eu estou bem. Foi difícil me reerguer, mas estou bem agora.
Victor e eu estamos noivos, meu pai voltou a falar comigo, retorno aos
estudos no próximo semestre...
— Quando ela esteve em Vegas há alguns meses... Ela foi atrás de
vocês, não é? Sei que meu pai estava lá em um evento. — Nada disse,
apenas assenti em resposta. — Desculpe... Desculpe por todo mal que
minha mãe fez a vocês. — Abaixou a cabeça, envergonhado.
— Você não tem pelo que se desculpar. — Segurei sua mão. — Está
com fome? — Negou com a cabeça. — Então vá dormir, já está bem tarde e
amanhã vamos sair para comprar nossa árvore de Natal. Estou pensando em
dar o jantar aqui para reunir minha família, assim você conhecerá a todos; e,
à noite, vamos à igreja.
Um sorriso gigante iluminou seu rosto.
— Eu nunca tive um Natal assim, Maya. Nem quando criança. Meu
pai sempre estava trabalhando na véspera e nunca passava o dia vinte e
cinco todo comigo, porque tinha que trabalhar mais. Já minha mãe... ela é
parente do Grinch. O Natal perdeu ainda mais o significado para mim
depois do divórcio deles.
Ri alto da comparação que fez do personagem do filme, que odeia o
Natal, com sua mãe.
— As coisas, a partir deste ano, serão muito diferentes. Ação de
Graças, Natal, Dia dos Pais, aniversários... tudo será comemorado em
família agora!
— Fico feliz em finalmente ter uma família de verdade.
CAPÍTULO 7

Na manhã seguinte, após o café, liguei para o meu pai e pedi para
ele vir até a casa do Victor. Não demorou muito e logo ele chegou.
— Pai... este é Caleb, filho do Victor. Caleb... este é meu pai —
apresentei-os sorridente.
— É um prazer conhecê-lo, Sr. Valentine.
— O prazer é meu, garoto. E me chame de Teddy.
Fiquei surpresa com sua simpatia.
— Então... o que faço aqui tão cedo? — perguntou ele.
— Estou pensando em fazer um jantar aqui esta noite, para reunir
todos antes de irmos à igreja. O que me diz?
— Aqui? — Apontou para o chão.
— É! Aqui!
Ele parou por alguns segundos e encarou-me.
— Eu não sei, querida.
— Por favor, pai. Quero todo mundo junto esta noite — insisti.
Meu pai respirou fundo e deu-se por derrotado.
— Tudo bem. Eu concordo, desde que Victor se comporte.
— E ele irá, desde que você se comporte também!
— Quando iremos comprar a árvore de Natal? — perguntou Caleb
ansioso.
— Agora.
Saímos e fomos até o parque Green Pine, onde todos os anos
vendiam os mais diversos pinheiros. Caleb parecia uma criança se perdendo
entre as inúmeras árvores tentando escolher a nossa.
— Onde está a mãe do garoto?
— Em uma clínica psiquiátrica.
— Pobre menino... — lamentou meu pai, observando-o rodear uma
árvore um pouco mais adiante.
— Ele está bem. É um garoto de sorte por ter um pai amoroso.
— Maya? Olha? Esta árvore vai ficar incrível na sala de estar! —
disse alto, parado ao lado do pinheiro.
— É grande demais, Caleb. Tem uns dois metros de altura!
— Ela só é trinta centímetros maior do que eu! Vamos levar esta! —
insistiu, olhando para árvore novamente.
— Leva a árvore. O garoto está explodindo de alegria, até parece
um menino de seis anos — falou meu pai ao seu favor.
— Tudo bem. Vamos levar esta.
Meu pai e Elliot arrastaram a árvore para dentro de casa. Caleb
estava tão empolgado para decorá-la, que ao invés de irmos à casa da tia
Jenna almoçar, foi ela quem veio comer conosco.
— Me ajuda — pediu ele entregando-me a outra ponta do festão
prateado.
Decoramos a árvore com o cuidado de espalharmos bem todos os
enfeites. Meu pai pegou uma pequena escada de uso doméstico e subiu para
colocar a estrela no topo do pinheiro. Caleb ligou as luzes e sentou-se na
poltrona diante dela, admirando-a com olhos brilhantes e um sorriso bobo.
Depois do almoço fomos buscar minha mãe no hospital e a
trouxemos direto para a casa do Victor, assim ela se cansaria menos do que
ir para casa da vovó e mais tarde vir para o jantar. Ela adorou a árvore e
conversou por horas com Caleb, que lhe deu toda sua atenção. Mais tarde,
Clarice juntamente com Sammy e Grace, chegaram. Logo depois deles,
minha avó chegou com uma companhia que ainda não conhecíamos. Seu
nome era Will, um “amigo” que, segundo ela, não tinha com quem jantar
naquela noite. Estávamos todos ali, menos Victor. Entrei em seu escritório e
liguei para ele, que me atendeu alguns toques depois.
— Oi, meu anjo. Como estão as coisas por aí?
— Já estão todos aqui. São sete e meia, Victor. Cadê você?
Prometeu que chegaria até as seis!
— Sinto muito, querida. O mau tempo em Seattle não está
ajudando. Não podemos levantar voo enquanto o tempo não melhorar.
— Seattle? Quando nos falamos hoje de manhã você estava em
Houston!
— Eu precisei vir, era uma emergência. Eu tinha a intenção de
chegar antes do jantar, mas acho que isso não irá acontecer.
— Sabe quando fomos a Las Vegas e você disse algo sobre viver
mais por mim e pelo Caleb?
— Sim, eu me lembro — respondeu com um tom de derrota e
cansaço.
— Acho que agora é a hora de você começar a fazer isso. Não quero
me casar com alguém que passa mais tempo voando a trabalho do que
dormindo ao meu lado!
— Já disse que sinto muito, Maya. Por favor... não vamos brigar na
véspera do Natal! — disse um pouco rude.
Respirei fundo e frustrada.
— Eu tenho que desligar. Estão todos esperando por mim.
— Tudo bem. Peça desculpas por mim a todos.
Encerrei a chamada e voltei para a sala de estar onde todo mundo
estava. No jantar, me esforcei ao máximo para ficar bem. O lugar vazio à
cabeceira da mesa atraía meu olhar a todo instante lembrando-me de que,
apesar de estar tudo perfeito, faltava alguém ali. Faltava o meu amor
comigo. Após o jantar, nos dirigimos todos à igreja. Durante todo tempo
minha mãe se manteve triste e pensativa. Meu pai, que esteve sentado todo
instante ao seu lado, não soltou sua mão nem por um minuto sequer. Ele a
agarrava com tamanha força, como se tivesse medo de soltá-la. Senti uma
fina e aguda pontada ir perfurando meu peito. Eu não sabia o porquê sentia
aquilo e isso me apavorava.
Ao sairmos da igreja, às onze e meia, minha avó nos convidou para
irmos até a sua casa tomar um chá e comer biscoitos de açúcar. Caleb foi o
primeiro a se manifestar a favor, ele já estava se sentindo à vontade e parte
da família, e eu achei isso maravilhoso. Fomos todos para lá, menos Clarice
e sua família.
Sentada em uma poltrona, em frente à televisão, encontrei minha
mãe sozinha olhando pela janela com um olhar perdido. Da porta da sala, de
onde a observava, podia ouvir minha avó oferecer mais comida ao Caleb e
meu pai rir do menino dizendo-o que ele estava ferrado se fosse comer tudo
o que ela lhe oferecesse. Olhei para o corredor certificando-me de que não
vinha ninguém e me aproximei dela em passos silenciosos, ajoelhando-me
ao seu lado.
— Por que está tão triste, mãe?
Ela direcionou-me seu olhar e sorriu, mas seu sorriso não alcançou
seus olhos escuros.
— Só estou pensando no futuro.
— O que está pensando?
Ela agarrou minhas mãos que seguravam o apoio do braço da
poltrona, e as apertou trazendo-as para seu colo.
— Tenho algo para contar a você, querida.
Aquela dor aguda que sentia minutos atrás, agora se tornava mais
forte. Antes mesmo que dissesse o que tinha para contar, meu coração já
doía, meu corpo latejava de tensão e meus olhos ardiam ao ficar marejados.
— Depois do Natal, não vou mais voltar para o hospital.
— O quê? Por quê? — questionei-a ficando de pé em um pulo,
sentindo o desespero tomar conta de mim como uma avalanche.
— Por favor, querida... Me compreenda. Eu não aguento mais viver
naquele hospital. Os médicos dizem que não, mas eu sinto que não tenho
mais cura. O câncer que estava estagnado voltou a se espalhar. Em alguns
dias estarei com metástase e aí meu ciclo chegará ao fim. Eu desejo
encerrar esta vida com quem mais amo neste mundo: minha família.
Solucei alto em meio ao choro.
— Perdoe-me, Maya. Mas entenda que não estou desistindo de você
e do seu pai. Estou apenas desistindo de viver para alimentar esta doença
maldita.
— Mas, mãe... Talvez... Talvez a gente possa ir para outro lugar e
tentar um novo tratamento, eu posso...
— Ela não quer, Maya — disse meu pai parado na porta. — Deixe-a
viver seus últimos dias como desejar vivê-los. Não podemos mais obrigá-la
a mais tratamentos por puro egoísmo da nossa parte... por medo de perdê-la.
Sua mãe está sofrendo. Eu estou sofrendo junto a ela. Se for isso que ela
quer, temos de respeitá-la.
Outro soluço. Meu choro ficava cada vez mais desesperado e alto.
Olhei para minha mãe e ela me olhava com o rosto banhado em lágrimas e
uma tristeza profunda que arrebentava meu coração. Eu tinha consciência
de que ela havia aceitado o tratamento alternativo por nós... para satisfazer
nossa esperança. Seu cansaço era visível a quilômetros de distância.
Estávamos perdendo minha mãe e não adiantava mais negar isso. Meredith
estava morrendo. Como a realidade doía! Mas precisávamos encará-la de
frente e sermos firmes. Aceitar o fato de que já não havia mais nada que
pudesse ser feito contra a doença que a consumia por inteira.
— Tudo bem... — concordei. Essas palavras sussurradas saíram
rasgando minha garganta como espinhos.
Abaixei-me à sua frente e segurei suas mãos magras, mornas e de
cor amarelada. No dorso da sua mão esquerda havia um enorme hematoma
roxo com nuances azuladas, onde o soro corria constantemente.
— Tudo bem se não quiser mais voltar, mãe. Você não tem que fazer
isso por nós. Entendo que já está cansada. Se quer ficar e ter seus últimos
dias com sua família e em paz, daremos isso a você. — Sequei minhas
lágrimas grossas, que escorriam sem parar.
— Obrigada, minha menina. — Ela se curvou para frente e deu-me
um beijo demorado na testa. — Eu te amo!
— Também te amo, mamãe. — Abracei-a forte.
Fiquei por mais alguns minutos abraçada a ela e ao meu pai,
chorando, sentindo medo e uma dor de perda imensurável. Todos sabem
que um dia perderão seus pais para morte. Mas assistir um deles indo pouco
a pouco e você não ter o que fazer, é doloroso e difícil demais.
Ela adormeceu com a cabeça deitada no ombro do meu pai.
Levantei-me da cadeira, que coloquei ao seu lado, e deixei a sala a passos
silenciosos, indo até a sala de estar. Sentei-me no sofá diante da lareira,
sentindo uma imensa exaustão misturada a uma chata dor de cabeça. Eu
sentia meu rosto inchado de tanto chorar. De olhos fechados, deitei a cabeça
para trás no encosto do estofado. Por isso meu pai havia ficado tão
estranho na ligação, quando o perguntei a respeito do retorno dela ao
hospital. Ela não iria mais voltar e ele não quis me contar. Onde está Victor
para me abraçar nesse momento e me dizer que ficará tudo bem?
Minha avó nos convidou para dormir em sua casa e preparou o
quarto de visita para Caleb, que subiu em seguida para se deitar. Minha mãe
e meu pai foram para o seu quarto da época de solteira. Já tia Jenna foi para
sua casa, que ficava a algumas ruas dali. Vovó e eu estávamos sem sono e
ficamos na sala assistindo à programação de Natal que passava na TV.
Enquanto ela acalentava-me acariciando meus cabelos, eu ainda derramava
mais lágrimas silenciosamente com a cabeça deitada em seu colo, até que
adormeci. Acordei com leves carícias no rosto e ao abrir os olhos
preguiçosamente encontrei meu pai sentado à beirada do sofá.
— Feliz Natal, querida.
— Feliz Natal, pai.
Empurrei a manta que me cobria para os pés e sentei-me
espreguiçando e bocejando.
— O café da manhã já está à mesa. Comprei uma escova de dente
para você e Caleb, está no banheiro social lá em cima.
— Onde ele está agora?
— Na cozinha com sua avó. E está chamando-a de vovó Abbi —
falou de um jeito engraçado.
— Deixe-o. Não teve a chance de conhecer os avós.
— Não estou implicando, gosto do garoto. Ele é um bom menino.
— É sim. Bom... — Levantei-me. — Vou subir rapidinho e logo
desço para o café da manhã.
— Okay.
Fui ao banheiro e assustei-me ao ver minha imagem no espelho. Eu
estava horrível! Levemente abatida, com olhos inchados, olheiras... E os
cabelos? Meu Deus! Estavam parecendo que algum bicho dormiu aninhado
neles. Penteei os cabelos embaraçados, lavei o rosto e escovei os dentes.
Não estava exatamente uma princesa, mas minha aparência estava melhor.
Desci e encontrei todos em volta da mesa na cozinha. Depois de desejar
Feliz Natal a todos, caminhei até a ilha de mármore e me servi de uma
caneca bem cheia de café. Escorada a ela, olhei pela janela ampla da sala e
vi o Rolls-Royce preto estacionar em frente à casa. Com um sorriso imenso
no rosto, coloquei a caneca sobre a bancada e saí apressada até a porta da
frente, abrindo-a depressa. Victor parou no topo da escada, que levava a
casa, e abriu seus braços para mim. Corri de encontro a ele e me joguei em
seu abraço, apertando-o com força.
— Por que demorou tanto? Senti muito a sua falta! Estou precisando
tanto de você, amor.
— Estou aqui agora, meu anjo. Também senti muita saudade.
Soltei-o e o vi sorrir para mim, colocando uma mecha do meu
cabelo atrás da orelha.
— Desculpe por perder a noite de ontem. Só tivemos autorização
para levantar voo às quatro da manhã.
— Tudo bem. Mas vamos deixar combinado desde agora, que no
próximo Natal você não irá trabalhar nem no dia ou na véspera.
— Prometido. — Riu acariciando meu rosto.
— Café? — Ofereci a ele.
— Sim, por favor.
Entramos e Victor cumprimentou a todos. Servi uma caneca cheia
de café puro fumegante, sem açúcar e entreguei-a a ele.
— Obrigado. — Sorriu e selou meus lábios. — Feliz Natal —
sussurrou.
— Feliz Natal, amor. — Sorri abertamente.
Depois do desjejum, nos sentamos na sala e logo Clarice chegou
com Sammy e Grace. Minutos depois, Will, o “amigo” da vovó, apareceu se
juntando a nós. Meu pai conversava com Sammy em um canto próximo a
escada. Eu estava sentada ao lado da minha mãe e Victor ouvia atentamente
o filho contar como havia sido o seu dia anterior. Distraída em uma
conversa, não vi quando Victor saiu da sala. Olhei para os lados procurando
por ele e notei que meu pai também havia sumido.
— Mãe... onde está o papai?
— Eu não sei. Estava com Sammy há pouco. — Apontou para
escada.
Levantei-me e caminhei até Caleb, que estava sentado nos primeiros
degraus da escada, teclando desesperadamente no celular.
— Onde está o seu pai?
— Ele foi para lá com o seu pai — respondeu apontando para a
cozinha, sem nem mesmo me dirigir o olhar.
Caminhei tensa até lá, imaginando que algo de ruim já devia estar
acontecendo. Ao chegar à cozinha, encontrei os dois conversando na
varanda dos fundos e, por mais assustador ou estranho que isso se
parecesse, eles se falavam com normalidade e paz. Nada de troca de socos,
gritos ou insultos. Isso só pode ser um milagre de Natal! Eu não consegui
ouvir o que eles conversavam, mas foi algo que fez Victor sorrir. Meu pai
estava com uma feição séria e braços cruzados, tentando ser o homem
implacável de sempre. Escorei-me no batente e sorri contente em ver que ali
estava tudo bem. Os dois apertaram as mãos e se viraram rumo à cozinha.
Saí apressada dali para não ser vista e chamada de bisbilhoteira. O que será
que os dois conversavam? Será que estavam selando a paz entre eles?
Voltei para a sala e os dois chegaram logo depois. Victor parou ao meu lado
e lançou-me uma piscada com um sorriso maroto, abraçando-me pela
cintura. Meu pai passou por nós e sentou-se ao lado de sua esposa,
entrelaçando seus dedos aos dela.
— Acho que esse é o momento — sussurrou Victor ao meu ouvido.
— Momento? — perguntei confusa, encarando-o com estranheza.
Do que ele fala?
— Já que estamos todos reunidos aqui, quero aproveitar a ocasião
para realizar algo — comunicou ele alto, atraindo a atenção de todos ali
presentes.
Victor pegou do bolso interno do seu casaco, uma pequena caixinha
preta.
— Ah, meu Deus! — exclamou minha mãe com euforia, cobrindo a
boca com as mãos.
— Eu sei que você já me fez este pedido, mas sinto a necessidade de
fazer isso para sua família — sussurrou para mim e colocou-se de joelhos à
minha frente, abrindo a caixinha que segurava nas mãos.
— Maya... Quer se casar comigo?
Ai, meu Deus! Ai... meu... Deus! Nervosa, sem ar, afoita e tensa. Era
como eu estava. Minhas mãos e rosto pareciam estar adormecendo. Meu
estômago parecia dar piruetas causando-me enjoo. Minha testa suava frio.
Não esperava por este pedido, nem em meus sonhos. Não depois de eu ter
lhe feito esta mesma pergunta quase dois meses atrás. Imediatamente meu
olhar foi atraído para o meu pai, que aparentava estar apreensivo, mas não
bravo.
— Vamos, amor... Me dê sua resposta. Tenho sessenta anos. Não
tenho mais idade para ficar tanto tempo de joelhos — brincou, fazendo-me
rir.
— Sim! — Ele se levantou. — Sim! Sim! Sim! — Pulei em seus
braços, passando os meus em seu pescoço e o beijando com amor. — Sim,
eu me caso com você! — Emocionada, reforcei minha resposta após
interromper nosso beijo.
Victor tinha um sorriso que não cabia em seu rosto. Ele me soltou e
eu me afastei em um passo para trás. Ele retirou o anel reluzente e colocou-
o em meu dedo anelar esquerdo. Aquele era o anel mais lindo que já havia
visto em toda a minha vida. A pedra em seu centro reluzia rodeada por
pequenos diamantes. Ele levou minha mão até seus lábios e beijou a joia
com delicadeza, antes de puxar-me para seus braços colando minha testa na
sua.
— Agora todos sabem. Nada mais de segredo.
— Nada mais de segredo — concordei.
Recebemos felicitações e abraços de todos. Minha avó já fazia
planos para o casamento na primavera e Victor atiçava ainda mais suas
ideias concordando que o casamento devia acontecer logo. Minha mãe
sorria emocionada admirando meu anel e desejando ainda estar conosco
para prestigiar esse momento. O pensamento de não tê-la comigo nesse
grande dia me deixou à beira de uma crise de pânico. Como seria meu
casamento sem ela comigo? Como seria minha vida depois de casada, sem
ela aqui para me aconselhar na nossa primeira discussão? Como será a
minha vida sem ela aqui? O ar faltou em meus pulmões. De repente, não
escutava o que as pessoas conversavam ao meu redor. Eu as olhava, mas
elas só mexiam a boca e os braços com entusiasmo, gesticulando suas
frases. Duas mãos firmes puxaram-me pelos braços levando-me para fora
da casa, até a varanda da frente.
— Maya... Maya... Olhe para mim, querida. — Olhei para frente. —
O que houve? Você ficou pálida de um instante para o outro.
— Estou com medo — sussurrei para Victor.
— Medo de quê, amor? De nos casarmos?
Neguei com a cabeça.
— De perder a minha mãe.
— Não tenha medo, amor. Ela está bem. Está aqui e feliz.
— Ela não vai voltar... não vai voltar para o hospital. Ela não quer
mais o tratamento. O câncer voltou a desenvolver.
— Eu sei.
Encarei-o com o cenho franzido.
— Sabe?
— Ela me ligou há três dias e me contou sobre a decisão dela. Ela só
queria dizer que confiava você a mim. Pediu-me para cuidar de você até o
fim. Fez-me jurar nunca te abandonar ou te magoar. Como se para fazer
isso, fosse preciso prometer a alguém. — Sorriu deprimido.
— Quando ela se for... vai doer muito? — Lágrimas começaram a
escorrer em abundância pelo meu rosto.
— Sim. Irá doer muito. Você vai achar essa dor insuportável e
pensar que pode conviver com ela, mas terá de ser forte. Vai haver dias em
que você se pegará esperando o telefone tocar e ser ela a te ligar, mas aí se
lembrará de que isso não pode mais acontecer. E nesse momento... a dor vai
voltar e você irá se culpar. Se culpar por aquele fim de semana que decidiu
sair com os amigos ao invés de ficar em casa com ela ou por aquela ligação
que prometeu retornar, mas se esqueceu. — Secou minhas lágrimas. —
Mas, apesar de ela não estar mais em carne com você, ela estará aqui —
apontou para o meu coração — para todo o sempre. Não tema a morte, meu
amor. Ela só é o fim de um novo começo. O encerramento de mais um
ciclo.
— Não me deixe...
— Não vou. Nunca! — Abraçou-me apertado em seu peito e beijou
o topo da minha cabeça.
Minutos depois, mais calma, voltamos para dentro da casa. Victor
me distraiu contando como havia sido pedir minha mão em casamento ao
meu pai na varanda do fundo. Eu ri dele dizer que ficou tão nervoso que
gaguejou. Achei admirável sua atitude e mais ainda a atitude do meu pai em
lhe dizer sim e se comportar decentemente. Depois do almoço, fomos para
casa com a promessa de que à noite iríamos nos encontrar no centro da
cidade para assistirmos à apresentação do coral de Natal local.
Em casa, assim que entramos, Caleb avistou debaixo da árvore seu
presente. Ele correu até lá e pegou a caixa abrindo-a rasgando a embalagem
em pedaços. Dentro, havia um videogame novinho em folha de última
geração.
— Uau! Valeu, pai. Obrigado! — agradeceu impressionado. —
Maya... tem um presente aqui para você.
— Para mim?
— Sim. Tem seu nome escrito na etiqueta.
Ele me trouxe uma pequena caixa vermelha com um laço dourado
na tampa e uma pequena etiqueta com meu nome escrito à mão. Aquela
letra eu reconhecia bem. Olhei para Victor, que estava atrás de mim com as
mãos repousadas em minha cintura e ele sorriu.
— Abra — mandou com sutileza.
Abri a pequena caixa e dentro havia a chave de um carro.
— O que é isso? — perguntei pegando-a na mão.
— Seu presente de Natal. Mas isso não significa que você estará
livre do Elliot.
— Pai! Acho que você trocou os presentes! — falou Caleb com
indignação, nos fazendo rir.
— Não troquei, garoto. Você ainda não tem responsabilidade para
ter um carro. Quem sabe daqui a alguns meses. Venha, querida. Vamos ver
seu presente, ele está na garagem.
Caminhamos até lá e Noberto abriu a garagem.
— Fala sério! Está de sacanagem? É uma BMW!
— Bem observado! — brincou Victor.
— Esse carro é meu? — perguntei impressionada.
— É sim.
— Nossa! Ele é lindo, Victor. Obrigada. — Abracei-o pelo pescoço
e beijei-o.
— Vai me deixar dar uma voltinha nela, não é, Maya? — Caleb
indagou-me.
— Vou pensar. Talvez outra hora.
Ele fez uma feição engraçada de desapontamento e entrou no carro
fuçando tudo lá dentro. Virei-me para Victor e ele estava sorrindo
observando a inocência do filho. Colei meu corpo no seu e observei-o com
fascínio, desejando ter para sempre momentos como esse. Descontraídos e
felizes.
— Obrigada.
— Eu estava em dúvida entre este e um Aston Martin, mas achei
esse mais ao seu gosto.
— Não estou falando do carro. Estou falando de tudo. Tudo o que já
fez por mim, tudo o que faz e aquilo que sei que fará. Obrigada por me
fazer tão feliz e por estar aqui comigo. Sou imensamente grata por tê-lo na
minha vida. Não consigo imaginar como as coisas seriam se nosso caminho
jamais tivesse sido cruzado. Você é tudo que tenho de mais firme para me
agarrar... para me guardar e proteger. Eu preciso de você, tanto quanto
preciso de ar para respirar. Você é minha base, Victor. Sem você, eu sinto
que irei desmoronar — declarei-me com urgência e com a emoção
encharcando meus olhos.
— Estou aqui, querida. Vou zelar por você até o fim do nosso para
sempre e mesmo depois disso, acredite, ainda estarei aqui olhando por
você! Não tenha medo. Se agarre a mim quando quiser.
CAPÍTULO 8

A semana até o Ano Novo passou muito rápido. Victor precisou


viajar a trabalho na manhã seguinte ao Natal, mas permitiu que Caleb
ficasse comigo. Meus pais se mudaram para a casa da minha avó, que, a
propósito, fez um jantar em família para contar que ela e Will estavam
começando um relacionamento amoroso com calma. Achei isso incrível,
afinal, para amar e viver o amor não se tem idade.
Sentada na varanda da frente da casa, terminei de ler para a minha
mãe as últimas páginas do livro: A culpa é das Estrelas. Ela estava toda
emocionada com a história e eu também. Eu quase conseguia sentir a dor
dos pais da Hazel e Augustus, por saber que logo mais os perderia. Era
sufocante essa sensação e desesperador esse pensamento.
— Você tem um desejo, mãe? Um sonho que gostaria de realizar
antes de ir, como a Hazel tinha de conhecer Peter Van Houten ou ir à
Disney?
— Tenho. — Sorriu. — Mas o meu é algo bem mais simples.
— O que é?
— Viajar com a família para o Havaí. Esse sempre foi o meu plano
de férias perfeitas, mas nunca deu certo. Ou o problema era a falta de
dinheiro ou a de tempo. E depois... bom... depois veio o câncer.
— Serei seu gênio. Vou realizar o seu desejo.
Ela olhou-me surpresa.
— Não tem que fazer isso, querida.
— Mas eu quero. E vou!
— Isso é sério?
— É sim, mãe. Nós iremos para o Havaí em breve.
— Ah... minha filha! — Abraçou-me. — Não sabe o quanto fico
feliz em poder fazer isso com você e seu pai.
Um sentimento de satisfação explodiu dentro de mim. Minha mãe
nunca mediu esforços para realizar meus desejos e sonhos. Agora era a hora
de retribuir.
Mais tarde, era a última noite do ano e estávamos todos reunidos na
casa da Clarice, na sala de estar. Todos estavam muito felizes, gratos e
animados. Até vi meu pai rir de uma piada que Victor fez, acho que as
coisas entre eles estavam começando a evoluir. Após o jantar, saímos todos
para a varanda dos fundos para assistir à queima de fogos no lago Green
Pine. Eu e Caleb abraçamos Victor, cada um de um lado, e ele passou seus
braços por trás de nós apoiando suas mãos em nossos ombros e nos
puxando mais para ele. Aqueles minutos foram perfeitos! Senti que estava
com a minha família, aqueles com quem em breve não dividiria somente
uma casa, mas uma vida.

Os planos para o meu casamento estavam a todo vapor. Ainda não


havia contratado nenhum profissional, apesar de Victor insistir muito para
que eu fizesse. Mas a verdade é que eu sabia que se fizesse isso, não teria
voz ativa em nada e queria fazer tudo ao meu gosto. Então comecei a
montar um scrapbook. Nele tinha de tudo, desde as mostras de tecido para
os guardanapos até um esboço do convite que fiz com a ajuda da Grace. Na
semana passada, quando contei a Kim e Sasha durante nossa chamada
semanal no Skype, elas piraram por completo. Gritaram e começaram a falar
sem parar expondo suas ideias para a minha cerimônia. Kim logo sugeriu
que fôssemos novamente para Nova Iorque escolher meu vestido, mas as
informei que usaria o mesmo vestido que minha mãe se casou. Ao contrário
dela, que teve aquele probleminha com a questão do vestido da família do
Jack, eu sonhava em usar o da minha mãe desde menina. Não só pelo fato
de ela ter me pedido, mas porque eu realmente queria fazer isso. O vestido
era lindo e romântico. Quando criança, eu adorava vesti-lo e desfilar pela
casa arrastando-o pelo chão e sentindo-me uma verdadeira princesa dos
contos de fada.
— Margot está vindo para os Estados Unidos, vamos nos encontrar
em Houston daqui a dois dias — anunciou Victor ao entrar na cozinha.
— Isso é bom. Finalmente vou conhecê-la.
— Vai enlouquecer na primeira hora. — Veio até mim, que estava
sentada na ilha. — Como vão os planos para o nosso casamento?
— Está indo bem. Ainda estou em dúvida quanto aos guardanapos.
Creme ou pérola? — Mostrei a ele as duas amostras do tecido.
— Amor... para mim são iguais.
— Não são iguais! Olha o quanto são diferentes. — Estendi-os
sobre o mármore.
— Ah... Agora estou vendo... — Senti a falsidade e o cinismo em
sua voz e isso me fez rir.
— Ah, é? Então qual deles é o pérola?
Ele olhou-me e riu um pouco constrangido.
— Você me pegou. — Beijou meu pescoço e me enlaçou com seus
braços.
— Victor... temos que conversar sobre algo.
— Algum problema?
— Não.
Soltou-me e sentou-se ao meu lado.
— Quero pedir algo a você... Depois do casamento da Kim, quero ir
para o Havaí com a minha família. Esse é o último desejo da minha mãe e
quero dar isso a ela.
— Com o maior prazer. Cuidarei de tudo para que vocês façam uma
viagem tranquila.
— Vocês? Eu disse minha família! — enfatizei. — Você e Caleb
fazem parte dela, portanto, vocês vêm com a gente.
Ele fez um minuto de silêncio, encarando-me sério.
— Vou me programar.
— Por que tem tanta dificuldade de se ausentar e deixar outra
pessoa comandar?
— A última vez que eu me ausentei, um filho da puta fez minha
empresa de sede para um esquema de lavagem de dinheiro! — respondeu-
me ríspido.
— Mas esse filho da puta não está lá mais.
— Mas o filho dele está! Filho de peixe...
— Eu sei. Então por que não compra as ações do Evan?
— Não vai ser assim tão simples. Ele não vai me vender. Aquele
garoto acha que sou o culpado pelo suicídio do pai. Vejo o desejo de
vingança em seus olhos.
— Talvez isso passe.
— Não tenho tanta certeza assim.
Respirou fundo, cansado.
— Vamos falar um pouco da cerimônia?
Ele assentiu.
— Faz questão de nos casarmos na igreja?
— Faço questão de que você seja a noiva e que compareça no dia —
brincou e eu gargalhei.
— Tem medo de que eu seja uma noiva em fuga? — Abracei-o.
— Não. Eu me garanto — disse convencido.
— Eu quero uma cerimônia pequena. Algo íntimo. Amigos mais
próximos, família...
— Tudo bem. Podemos fazer a cerimônia na nossa casa de praia, em
Orlando.
— Temos uma casa de praia em Orlando?
— Temos sim. — Riu e beijou-me.
Sua mão direita desceu pelas minhas costas até minha bunda,
apertando-a de leve. Nosso beijo começou a ficar cada segundo mais voraz
e quente. Sua outra mão subiu para a minha nuca e agarrou meus cabelos
com força, mantendo-me imóvel. Seus lábios deixaram os meus e trilharam
beijos pescoço abaixo até meu ombro onde deixou uma leve mordida que
me fez gemer baixinho de olhos fechados e mordendo o lábio. Sua boca
voltou à minha com um beijo guloso e possessivo. A mão que estava em
minha bunda agora agarrava meu seio apertando-o com cuidado por baixo
da blusa. Gemi novamente implorando para ser fodida ali mesmo. Já senti a
excitação umedecer minha calcinha e estremecer meu ventre. Como era
possível? Como era possível ele mal me tocar e eu logo me desmanchar de
desejo por ele? Esse homem tinha um imenso poder sobre mim, era fato!
— Pai! — Caleb chamou-o em grito, entrando na cozinha.
Assustada, desprendi-me dele, mas Victor me puxou de volta para
os seus braços.
— Dá o fora, moleque! — ordenou ao filho, em um tom rude e alto.
— Opa! Foi mal. — Saiu rindo.
Aquela já era a segunda vez na semana que ele nos pegava em
“flagrante”. Da primeira vez, eu já estava sentada sobre a mesa do seu
escritório e com o vestido na altura da minha cintura e Victor prestes a se
abaixar entre minhas pernas.
— Ai, meu Deus! Que vergonha! — Escondi meu rosto no pescoço
do Victor e abracei-o desejando desaparecer dentro dele, que ria alto de
mim.
— Pelo menos, desta vez, você não estava seminua — ironizou. —
Venha. Vamos para o nosso quarto.
Subimos e lá, no nosso canto com vedação acústica e de porta
trancada, nos despimos e nos amamos do nosso jeito. Dominante, rude e
adorável. Exaustos, dormimos suados, agarrados ao corpo um do outro.
Essa necessidade de senti-lo junto a mim e respirar seu cheiro ao
adormecer, se tornava cada vez mais urgente. Acordar e dormir sem ele
comigo, fazia com que eu me sentisse vazia. Esse sentimento era
desesperador! Isso fez com que eu me apressasse com os planos do
casamento e concordasse com a vovó de realizá-lo na primavera. Precisava
que fôssemos um do outro de papel passado. Precisava que minha mãe
pudesse presenciar esse momento nosso de pura felicidade.

Margot desembarcou em Houston e nós fomos para lá. Ela não era
exatamente a pessoa que esperava conhecer. Victor tinha razão, me cansei
dela na primeira hora. Se eu achava meu futuro marido mandão e rude, ela
era ainda mais. Caleb também descobriu não ser muito fã da tia, que não
conhecia muito bem.
— Ela era mais legal, quando só me ligava nas datas comemorativas
e mandava presentes caros — sussurrou para mim na cozinha, enquanto me
ajudava com a louça suja.
— Ela está falando de uma cerimônia com sete mil pessoas. Estou
pirando com isso!
— O papai sempre cedeu aos desejos dela. Cuidado!
— Ele não é nem louco! — sussurrei brava com a ideia dele ceder a
isso. — Aliás... cadê ele que não chegou a tempo do jantar?
— Eu liguei, mas ele não atendeu. Deve ter tido alguma reunião de
negócios.
— Margot já está aqui há três dias, e até agora ele ainda não
compareceu a nenhum jantar!
Escutei a porta da frente ser fechada em um baque.
— Acho que foi ele quem chegou — falou Caleb ao passar por mim,
deixando a cozinha.
— Boa noite! — desejou Victor com um enorme sorriso forçado, ao
entrar na sala de estar onde a irmã encerrava uma ligação.
— Irmão! Até que enfim. Achei que ficaria sozinha esta noite —
alfinetou com provocação.
— Você não passou a noite sozinha, tia. Eu e a Maya jantamos com
você, se lembra?
— É! Mas parecia que a menina nem estava lá, ela não disse nada
durante toda a noite.
Essa vaca está mesmo me chamando de menina e falando como se
eu não estivesse aqui? Eu cozinhei para ela! Lavei sua louça suja e busquei
seu casaco na lavanderia! Filha da...
— Querida? Está tudo bem? — perguntou Victor parando à minha
frente. Será que percebeu que eu estava a ponto de explodir?
— Não! — disse entredentes.
— A gente conversa mais tarde. Okay? — Nada respondi, apenas o
encarei com olhos estreitos.
— Victor? Está com problemas financeiros, meu irmão?
— Não. — Olhou-a com estranheza.
— Então por que ainda não contratou um cerimonialista para cuidar
do seu casamento?
— Maya está cuidando disso pessoalmente.
— É, eu sei. Encontrei isso no seu escritório. — Retirou de trás de
uma das almofadas do sofá, meu scrapbook. — Olha só para isso. É
ridículo! — Riu com deboche. — Tem uma lista aqui de trinta convidados.
Trinta convidados!
— Maya e o papai querem uma cerimônia privada.
— Cerimônia privada? Nem sei que diabos é isso! Menina, você
devia contratar um cerimonialista. Isso aqui... — ergueu o scrapbook — é
coisa de adolescente de quinze anos. Você está se casando com um
bilionário.
— Eu sei com quem estou me casando. E por isso... — caminhei até
ela — planejo o MEU casamento como EU quiser! — Tomei o livro da sua
mão de maneira ríspida. — Quando você se casar, faça sua cerimônia com
sete mil convidados. A minha só terá trinta! Não preciso de mais seis mil,
novecentos e setenta pessoas nos julgando e apedrejando com olhares
críticos e comentários podres. Boa noite, Margot.
Deixei a sala sem pronunciar mais nem uma palavra sequer. Ao
entrar no quarto, sentei-me no sofá na antessala. A porta foi aberta em
seguida e Victor passou por ela.
— Desculpe-me por isso. Ela não está muito conformada com nosso
casamento.
— É, eu sei! Porque, assim como muitas outras pessoas, ela acha
nossa união esdrúxula e nojenta! — Coloquei-me de pé. — Eu sei que ela é
a sua irmã, mas se for para ela comparecer ao nosso casamento com essa
energia ruim e com as críticas... prefiro que não esteja presente!
Victor abaixou a cabeça e assentiu. Podia ver a vergonha que ele
sentia por ela.
— Tenho algo para você. — Tirou do bolso interno do seu paletó
uma caixinha retangular de veludo e a entregou-me. — Abra!
Abri-a e dentro havia uma linda pulseira de platina com diamantes
incrustados nela.
— É assim que vai ser?
— Vai ser... o quê?
— Você irá prometer estar presente, mas então aparecerá um
imprevisto no trabalho, o qual você vai julgar que todos são incapazes de
resolvê-lo. Fará a escolha de me deixar esperando por você a noite toda e,
quando finalmente chegar em casa, acha que pode consertar tudo com um
presente caro. Não me trate como sua amante, Victor. Trate-me como sua
esposa. Aquela que tem prioridade na sua vida depois do seu filho!
Fechei a caixa e joguei-a sobre o sofá, indo ao banheiro e trancando-
me lá dentro. Eu já estava há quatro dias em Houston e as coisas não
estavam muito legais. Era hora de voltar para casa. Para os meus pais. Após
o café da manhã, no dia seguinte, informei ao Victor que estava voltando
para Tulsa e que nos encontraríamos em uma semana em Chicago, para o
casamento da Kim. Ele não discordou, mas era visível seu
descontentamento. Os dias sem ele se passaram arrastando. Nós nos
falávamos toda noite por mensagens ou ligação, e no final de cada uma
delas declarávamos o amor que sentíamos um pelo outro. Voei para Chicago
um dia antes do casamento e Victor chegou com Caleb logo pela noite, no
horário prometido. Na manhã seguinte, nos arrumamos e fomos à igreja.
Estava em uma sala com Kim, Maggie, Sasha e mais duas outras
amigas da noiva, com quem ela se formou no colegial, ajudando-a a se
aprontar.
— Com licença. Cinco minutos para a cerimônia começar —
avisou-nos a cerimonialista.
— É melhor descermos. Eles cobram por cada minuto de atraso —
falou Maggie.
No térreo, diante das portas da igreja, nos organizávamos em pares
para entrar.
— Maya...
Olhei para trás e vi o Allan.
— Oi. Como vai?
— Bem. E você?
— Bem. — Sorri.
— Eu quero pedir desculpas pelo modo como as coisas acabaram
entre nós. Fui um babaca, eu sei.
— Acho que já conversamos sobre isso, Allan...
— É, mas... eu sinto que ainda devo desculpas. Você não merecia
aquilo... Não merecia que eu a decepcionasse com aquela traição. Eu tenho
medo que você me odeie. Não quero que sinta isso por mim, Maya, porque
eu guardo você em meu coração.
— Allan... — Sorri e toquei seu rosto. — Eu não odeio você. Jamais
odiaria! Senti mágoa e fiquei decepcionada, mas isso passou. Você foi
alguém importante na minha vida, ajudou a me reerguer e recomeçar. Então
como eu poderia odiá-lo? Eu espero que você seja muito feliz. Que tenha o
que eu tenho; uma pessoa incrível ao seu lado. Alguém que não o troque
por uma promoção no trabalho. Você é um homem bom, eu sei. — Afastei
minha mão do seu rosto.
— Obrigado. Soube que está noiva.
— Sim! Eu me caso na primavera.
— Desejo toda felicidade para vocês. Ele parece gostar muito de
você.
— Ele não gosta. Ele me ama! Gostar de alguém não é suficiente
para desejar uma vida juntos. Se fosse, ainda estaríamos namorando.
— É verdade. — Sorriu.
— Vocês dois precisam entrar na fila, as portas já vão se abrir —
avisou a cerimonialista.
— Claro, desculpe — pedi e fui para o meu lugar, ao lado do primo
do Jack.
A cerimônia foi linda. Eu me emocionei e a todo instante meu olhar
se dirigia involuntariamente até Victor, sentado na quarta fileira à minha
frente. Ele também tinha um sorriso encantador que iluminava seu rosto.
Assim como eu, sem dúvida estava pensando no nosso grande dia. Depois
da igreja, fomos para o local da festa. Dancei algumas músicas com Caleb,
até que ele desapareceu com uma garota da mesma idade. Victor se
enturmou bem com os convidados. De longe, eu o observava conversar e rir
descontraído, em uma roda de homens.
— Dança comigo? — convidou Jack.
— Claro! — Sorri e coloquei minha mão sobre a sua.
— Como estão as coisas em Tulsa?
— Estão indo bem. E por aqui?
— Agitadas, como sempre. Soube do noivado. Meus parabéns, eu
espero ser convidado.
— Mas é claro que será! Também desejo felicidades para o seu
casamento. Vocês dois formam um par perfeito — disse com admiração.
— Obrigado. — Ele desfez seu sorriso e desviou seu olhar do meu
ficando sério. — Maya... tem algo que quero te contar há alguns dias, mas
Kim não deixa. Ela disse que não era para eu estragar sua alegria. Não que
o que eu tenho para falar vá estragar a felicidade com o noivado, mas eu
sinto que preciso dizer para que você se cuide.
— Jack... fale logo! — Senti meus ombros enrijecerem tensos.
— Durante a confissão do Sean e Tyrone, eles disseram não ter sido
eles quem perseguiu você naquela madrugada em que voltava da Wilcox.
— Co-como assim? — gaguejei assustada. — Se não foi um deles,
quem foi?
— Eu não sei. Não há ninguém que possa ter motivos para te
perseguir?
Não havia. Ao menos não em Chicago. Só podia ser uma pessoa a
ter me perseguido naquela noite e também naquela manhã em quem saí para
correr no bosque em Tulsa. Seu nome era Higor. Não tinha outra pessoa
para ser! Ele estava de volta. Tê-lo visto na frente do hospital naquele outro
dia, não foi apenas uma miragem ou alguém muito semelhante a ele: era
ele!
— Está se sentindo bem? Ficou pálida de repente.
— Preciso me sentar.
— Claro. — Ele me acompanhou até minha mesa. — Vou pedir para
que tragam uma água para você.
— Obrigada.
— Querida... O que houve? — interrogou Victor com preocupação,
puxando uma cadeira e sentando-se à minha frente.
— Estou bem. — Sorri. — Só senti uma tontura de repente.
— Sua água, senhorita. — O garçom estendeu-me o copo.
— Obrigada. — Tomei toda a água e recostei-me na cadeira.
Victor me observava em silêncio com um olhar preocupado.
— Você devia ir ao médico. Sempre tão preocupada com todos e
cuidando de tudo, menos de si mesma.
— Eu preciso é de férias. — Coloquei o copo sobre a mesa e curvei-
me em sua direção, segurando suas mãos em meu colo.
— Vou agilizar nossa viagem ao Havaí. Que tal?
— Ah... Isso seria ótimo! — dramatizei.
— Okay. A gente viaja no fim do mês. Uma semana inteirinha para
descansar e curtir nossa família.
— Perfeito! — Beijei-o.
CAPÍTULO 9

Os dias foram passando e a nossa tão esperada viagem chegou.


Victor havia providenciado tudo. Desde uma casa com privacidade para nós
e acessibilidade para minha mãe em sua cadeira de rodas, até uma
enfermeira preparada de prontidão, que havia ficado hospedada em uma
cabana separada da casa. Ele havia contratado também um cozinheiro, mas
minha avó e tia Jenna não permitiram e disseram que elas mesmas
cuidariam de tudo, até da limpeza. Particularmente, eu achei ótimo! Assim
seríamos apenas nós e ninguém mais de estranho na casa.
— Minha... nossa! Olha só esse lugar, mãe! É perfeito!
Parada de pé ao seu lado na varanda dos fundos, segurei-a pelo
ombro. Sua mão se apoiou sobre a minha e deu leves batidinhas em forma
de carinho.
— Moraria aqui se pudesse — disse minha mãe.
— E você pode! — respondeu Victor entrando na varanda, parando
ao meu lado. Olhei-o e sorri. — Podemos resolver isso.
— Agradeço, mas não. Não quero abusar da sua boa ação.
— Ter trazido todos aqui não foi uma boa ação, Meredith. Foram
férias com a família.
Ela lhe deu um enorme sorriso de satisfação e olhou novamente para
frente namorando a praia e as ondas que arrebentavam na areia. Mais tarde,
durante o jantar, sentamos todos à mesa e tivemos uma noite muito
agradável regada de boa conversa, altas risadas e o ar fresco que entrava
pelas portas francesas abertas, trazendo com ele a brisa e o cheiro do mar.
Depois da sobremesa preferida da minha mãe, feita por mim, fomos cada
um para o seu quarto. A casa era térrea e imensa. Havia seis quartos
espalhados por toda ela. Eu e Victor ficamos com o mais distante de todos,
próximo à cozinha.
Deitada de barriga para baixo na cama, eu brincava com minhas
pernas balançando-as para trás, enquanto assistia através das portas abertas
as ondas virem perto da nossa varanda. Escutei o chuveiro ser desligado e
segundos depois senti a presença do Victor e seu cheiro se aproximarem por
trás de mim e me cobrir com seu corpo fresco pelo banho.
— Você fica tão linda assim, descontraída... relaxada... feliz —
sussurrou em meu ouvido.
Virei meu rosto para olhá-lo e abri um enorme sorriso para ele.
— Você faz parte da minha felicidade. E saiba que estou
descontraída e relaxada porque você me proporcionou isso.
Sorriu lindamente e deitou-se ao meu lado.
— Eu trouxe cordas, querida.
— Que bom. — Aproximei meu rosto do seu. — Porque serei eu
quem irá amarrar você esta noite.
Ele gargalhou alto e negou com sua cabeça.
— Nem por cima do meu cadáver. — Deitou de barriga para cima e
eu me sentei nua sobre seu quadril também nu.
— Que pena... Já estava tão excitada pensando no que fazer com
você. — Coloquei suas mãos sobre meus seios e esfreguei minha
intimidade em seu pênis, deixando-o ereto em um segundo.
Ele sorriu travesso e apertou meus seios.
— Tudo bem.
Olhei-o surpresa. Eu não havia pensado em nada, estava blefando,
mas aquilo que fiz no último momento com ele o fez mudar de ideia. Talvez
eu devesse continuar com as provocações. Saí de cima dele sorrindo
maliciosamente e caminhei até a poltrona perto das portas, sentando-me
nela de pernas abertas. Escorei-me para trás jogando todo o meu cabelo
solto para o lado direito do pescoço e firmei minhas pernas delicadamente
nas pontas dos meus pés. Victor se sentou na quina da cama de frente para
mim e apoiou suas mãos nos joelhos com um sorrisinho safado estampado
no rosto.
Deslizei minhas mãos lentamente acariciando meu corpo, apertando
de leve meus seios e indo até entre minhas pernas. Meu ventre pulsava forte
junto ao meu clitóris, deixando-me molhada. Olho no olho, deixei uma mão
no seio esquerdo, massageando-o, e com a outra friccionei o dedo médio e o
indicador em meu pontinho sensível e flamejante. Deslizei-os até minha
estrada e penetrei-me vagarosamente soltando um gemido manhoso,
fechando os olhos. Ouvi Victor rosnar baixinho, contido. Continuei
investindo os movimentos contra mim, gemendo de tesão cada vez mais
alto, tentando abafá-lo mordendo o lábio inferior. Tirei os dedos
encharcados e subi até o clitóris, pressionando-o com força fazendo
movimentos circulares. Abri meus olhos e encarei-o. Victor contraía sua
mandíbula e cerrava os punhos sobre as coxas, deixando as mãos pálidas
sem circulação.
Tirei a mão do meu seio e agarrei o apoio de braço da poltrona,
sentindo estar perto de um orgasmo. Penetrei-me novamente com os dedos
uma única vez coletando minha umidade e levei-os até a boca, chupando-os
de jeito sensual e provocante, gemendo ofegante. Victor fechou os olhos e
os apertou, grunhindo alto. Percebi que ele fazia o maior esforço para
permanecer sentado ali apenas olhando-me longe, impedido de me tocar.
— Vem... — sussurrei.
Ele imediatamente se colocou de pé e caminhou apressado até mim
com sua postura rígida e passos pesados.
— Pare! — mandei alto e ele parou, encarando-me sério com um
olhar que me dizia: cuidado. — De joelhos. — Sorri com cinismo.
— Não abusa, Maya, ou eu...
— Não mandei você falar! — interrompi-o ríspida, mas incapaz de
esconder meu divertimento. — Quero que me chupe... Agora!
Rangendo os dentes, ele se aproximou e ficou de joelhos, agarrando
minhas coxas. O toque das suas mãos fez-me estremecer. Victor puxou-me
para a beirada do estofado e afundou seu rosto entre minhas pernas,
começando a sugar-me lentamente. Ao sentir sua língua quente beijar
minha boceta, que clamava por ele, agarrei seus cabelos e tentei curvar-me
um pouco para frente fechando as pernas, mas ele me impediu. Gemi alto
tentando controlar meu desespero por ele e por mais, mas não tinha forças
para interrompê-lo empurrando-o para longe, assim como faz comigo
quando me domina e percebe minha gula por ele. Bela Dominatrix de
merda eu seria.
— Ah... Victor! — gemi com desespero deitando-me para trás na
poltrona, sentindo a explosão do orgasmo me pegar em cheio quando seus
dedos me penetraram. — Deus! Ah...
Victor mordeu meu clitóris e depois a parte interior da minha coxa
direita, provocando-me dor, antes de se levantar.
— Já chega de brincar!
Agarrou minhas mãos e forçou-me a ficar de pé. Ele segurou-me em
seus braços e beijou-me vorazmente, fazendo-me provar meu próprio gosto.
Isso era excitante demais! Pegou-me em seu colo e me jogou sobre a cama
sem o menor cuidado.
— Você já me provocou o bastante por hoje, Sra. White.
— Ainda não estamos casados — provoquei-o.
— Não mandei você falar! Fique aqui como está. Já volto.
Ele entrou no closet e voltou logo depois com cordas, mordaça, um
chicote de quitação, óleo corporal, um vibrador e o meu plug anal. Olhei-o
assustada. Será mesmo que pretende usar tudo isso em mim esta noite?
— Se assustou, querida? — perguntou com sarcasmo.
Engoli em seco.
— Quer... usar tudo isso esta noite?
— Sim. Só vamos parar quando eu tiver usado cada um destes
objetos em você.
— E se fizermos barulho?
— Há outro motivo para eu ter escolhido este quarto para nós, além
de ele ser o mais longe possível dos outros. — Caminhou até as portas
abertas. — Ele tem isolamento acústico. — Fechou-as e virou-se para mim
encarando-me com um olhar faminto. Um olhar que um leão daria à sua
caça. — Se preciso for, use sua palavra.
Sorri contente e com medo ao mesmo tempo.
— De quatro! — ordenou sério e rude.
Posicionei-me para ele. Primeiramente, Victor me colocou a
mordaça. Em seguida, inseriu o plug em meu ânus. Depois, sem o menor
aviso, estalou o chicote em minha pele causando dor e ardência. Gemi alto e
abafado na esfera enorme que mantinha minha boca aberta, cansando meu
maxilar.
— Sabe por que está apanhando? — Neguei com minha cabeça. —
Para aprender que me provocar é gostoso, mas tem suas consequências! —
Bateu novamente, dando início a uma sessão de chicotadas em minhas
nádegas.
Sua força era tanta, que lágrimas empoçavam meus olhos. Agarrei o
lençol sob mim quase os rasgando com minhas mãos, fazendo um grande
esforço para não gemer alto de dor. Mesmo sabendo que no quarto havia
isolamento, temia que alguém nos ouvisse. Ele parou e jogou o chicote
sobre o colchão. Retirou o plug lentamente e começou a penetrar minha
bunda com ele, entrando e saindo. Confesso que isso não era exatamente
gostoso, a pressão ao entrar era um pouco incômoda. Ele o introduziu
novamente e acertou minhas nádegas com as duas mãos ao mesmo tempo,
estalando dois tapas dolorosos.
— Deite corretamente na cama! Mãos para cima e pernas abertas!
Obedeci-o. Ele pegou as cordas e atou meus punhos e tornozelos na
cama. Montado sobre mim, espalhou o óleo por todo meu corpo e pegou o
vibrador ligando-o em seu volume médio de vibração, pressionando-o em
meu mamilo direito. Aquilo foi absurdamente gostoso. Sua outra mão
ocupou-se de me masturbar penetrando-me com os dedos.
— Se gozar, apanhará ainda mais! — Como eu odiava quando me
dizia isso. Tinha vontade de xingá-lo! — Olhe para mim, Maya! — Olhei,
mas meus olhos foram puxados para sua ereção rochosa, que pulsava forte
dependurada entre suas pernas.
Ele passou o vibrador de um seio para o outro e depois o desceu por
minha barriga até meu clitóris, aumentando sua velocidade de vibração.
Seus dedos ainda estavam dentro de mim, mas não me penetravam mais, ao
invés disso ele massageava com as pontas o meu “ponto G”. Queria berrar
pedindo que me fodesse, mas não podia. Quando sentiu que eu estava
prestes a me derreter em um orgasmo, que já causava tremores em meu
corpo pequeno sob o seu, Victor parou com tudo o que fazia e se levantou
da cama desatando as cordas.
— Vem! — mandou alto, puxando-me pelos cabelos para fora da
cama. — Ajoelhe-se! — Obedeci e, então, ele retirou a mordaça.
Sentada em meus calcanhares, com as mãos espalmadas para cima
sobre as coxas, assisti-o se masturbar apertando seu membro com força em
uma mão, enquanto segurava o cabo do chicote com a outra. Ele se
aproximou e mandou que eu ficasse imóvel. Segurando seu pau, passou sua
glande em meus lábios umedecendo-os com sua pré-ejaculação. Respirei
fundo seu cheiro tão másculo, que me levava ao delírio. Toquei-o com a
ponta da minha língua e fui punida com uma chicotada nas costas. Fechei
meus olhos apertando-os forte, sentindo a dor e o queimor na pele.
— Menina gulosa! — repreendeu-me. — Deseja ele na sua boca? —
perguntou e eu assenti.
Desejava sim, desejava isso mais do que tudo! Queria sua carne
quente e pulsante na minha garganta, queria ouvir seus gemidos controlados
para não denunciar seu desespero por mim, ecoando entre as paredes.
Queria tomar do seu sêmen tão sagrado. Victor penetrou minha boca indo
fundo, pouco a pouco. Fechei meus olhos e prendi minha respiração para
conter a ânsia de vômito que sempre vinha com tudo. Ele apoiou sua mão
livre em minha nuca e puxou minha cabeça contra sua virilha. Os
movimentos começaram a serem comandados, aumentando gradativamente
sua velocidade que descia pela minha garganta. Uma vez ou outra, eu
respirava para me manter consciente. Seus gemidos foram tomando o
espaço e ecoando pelos quatro cantos do cômodo vasto. Entre minhas
pernas, algo dentro de mim se retorcia pedindo para ser penetrada com
força bruta. Tinha certeza de que toda minha excitação se empoçava no
chão, podia sentir escorrer.
Victor chegou ao seu ápice depois de longos e torturantes minutos.
Apoiei minhas mãos em suas coxas e senti seu orgasmo quente ser
derramado. Não consegui engolir tudo que me foi dado e um pouco
transbordou pelo canto, escorrendo em meu queixo, caindo parte no meu
seio e o restante no chão. Isso o deixou furioso. A decepção foi visível em
seus olhos por desperdiçar seu gozo. Pode parecer besteira, mas senti que
ficou ofendido.
— Você devia ser grata por receber meu orgasmo! Já não lhe ensinei
a NUNCA desperdiçar? — bradou afastando-se e acertando um tapa leve
em meu rosto para me punir. Não teve força o suficiente para me machucar,
somente para causar ardência e me ensinar a lição de nunca desperdiçar seu
orgasmo!
Coletei com o dedo o que havia caído em meu queixo e no seio,
levando-o à boca e chupando-o até que ficasse limpo outra vez.
— Lamba o chão!
Olhei-o para saber se ele falava sério e, para minha surpresa, a
resposta era: sim. Ele falava muito sério. Seu peito, que arfava alto, e os
dentes, que rangiam forte, comprovaram isto.
— Não me ouviu? — questionou entredentes. — Lamba... a
PORRA DO CHÃO! — gritou.
Engoli em seco e curvei-me para frente apoiando os antebraços no
chão. Esticando a língua para fora, lambi seu gozo ali derramado. Ao
terminar olhei-o esperando pela próxima ordem e temendo mais uma
punição. Ele estava sério, mas tinha um ar de triunfo no rosto. Victor
abaixou-se à minha frente e segurou meu queixo com firmeza.
— Devia deixá-la dormir no chão por desperdiçar o que seu Dono
lhe dá de tão bom grado!
— Perdoe-me, Senhor. Não foi por mal. — E não havia sido.
— Levante-se! — Levantou-se puxando-me pelos cabelos. — Apoie
as mãos na cama. Vou foder você agora — anunciou com seus lábios
próximos aos meus, com seu braço enlaçando minha cintura, apertando-me
contra ele.
— Sim, Senhor — sussurrei.
Ele me soltou e eu caminhei até a cama, apoiando as mãos
espalmadas sobre o colchão. Senti seu corpo se aproximar e suas mãos
acariciarem minha pele. Fechei os olhos apreciando este momento. Victor
juntou meus cabelos e os segurou firme em uma mão, enquanto agarrava
minha cintura com a outra. Lentamente seu pênis penetrou-me, fazendo
estremecer. Senti-lo assim era tudo o que eu queria desde o início da noite.
Ele fodeu-me até que gozasse novamente, permitindo que eu me libertasse
também, tendo um merecido orgasmo que me deixou de pernas bambas.
Victor deitou-me na cama e aconchegou-se entre minhas pernas. Já me
sentia cansada, mas nunca demais para ele, para lhe dar e receber prazer.
Para agradar quem tão bem cuidava de mim.
CAPÍTULO 10

Na manhã seguinte, acordei com uma leve dor no corpo. Atribuí isso
à noite tão gostosa que tivemos. Victor dormia relaxado ao meu lado,
completamente nu. Vagarosamente, levantei-me e fui ao banheiro tomar um
banho antes de deixar o quarto fechando a porta atrás de mim. Ao sair para
o corredor, vi a enfermeira cruzar a sala de estar correndo rumo ao quarto
dos meus pais. Corri até lá, e ao me aproximar, escutei minha mãe ter mais
uma crise respiratória, como a de alguém com asma. Meu coração palpitou
e o desespero tomou conta de mim por completo. A cada crise que vinha, a
atual parecia ser pior que a última. Ao tentar entrar, fui barrada na porta
pelo meu pai, que me arrastou para longe.
— Por favor, pai! Deixe-me entrar! — pedi afoita.
— Se acalme, Maya! Deixe a enfermeira fazer seu trabalho. É só
mais uma daquelas crises respiratórias, ela ficará bem. — Abraçou-me,
tentando me segurar longe do quarto.
— Não! Me solte! — gritei debatendo-me. — Preciso ficar perto
dela! Por favor! — Lágrimas lavaram meu rosto.
— Está tudo bem, Maya! Ela já está bem. Foi só uma crise
respiratória, querida! — falou minha avó, tentando acalmar-me e segurando
meu rosto entre suas mãos, obrigando-me a olhá-la. — Respire fundo. Se
você ficar nervosa aqui fora, sua mãe também ficará nervosa lá dentro em
vê-la desesperada. Okay? Está tudo bem, já passou. — Ela puxou-me dos
braços do meu pai para os seus.
— Me deixe ver ela.
— Depois que se acalmar. Está bem?
Assenti, deitando minha cabeça em seu ombro.
Minutos depois, mais calma, permitiram que eu entrasse no quarto.
Sentei-me na poltrona ao lado da cama e observei-a dormir com uma feição
rígida de dor, utilizando o cateter nasal ligado direto no cilindro de oxigênio
ao meu lado. Peguei suas mãos entre as minhas e senti que já não estavam
mais tão quentes como antes. Olhando-a deitada sobre a cama enorme,
percebi o quanto estava ainda mais magra do que na semana passada. Uma
dor imensa misturada a desespero, medo e uma angústia lacerante, partiu
meu coração jorrando sofrimento dentro de mim. Ali... naquele instante...
dei-me conta de que seu último dia estava mais perto do que eu imaginava
ou queria ver. Um soluço do meu choro preencheu o quarto silencioso.
Perdê-la jamais seria fácil, não importava o quanto me esforçasse para estar
preparada para este momento.
Depois de observá-la dormir por quase uma hora, dei lugar ao meu
pai e saí para dá-los um pouco de privacidade. Caminhei para a praia e parei
na faixa úmida, sentindo a água vir em uma fraca marola fria, varrendo os
grãos da areia branca sob meus pés.
— Está bem? — Escutei Victor perguntar atrás de mim.
— Não. Ela está partindo, Victor, eu sinto. E-eu... me sentei do lado
dela e... senti que ela estava indo. Sinto sua vida ir pouco a pouco entre
meus dedos e eu não posso agarrá-la. Essa sensação de impotência é
terrível!
Seus braços me apertaram por trás, aconchegando-me em seu corpo.
— O que é possível fazermos por ela agora, é tornar este momento
menos doloroso e o mais confortável possível.
— Precisamos nos casar logo. — Virei-me para ele. — Temos que
fazer isso o quanto antes. Vamos fazer isso amanhã! — anunciei com
desespero.
— Maya...
— Não me diga que é impossível ou que não podemos —
interrompi-o brava. — Você sabe, ela te disse! Disse que um dos seus
sonhos era me ver casar. Eu já tenho tudo pronto, é só adiantarmos a
cerimônia. — Encarei-o com esperança.
Ele respirou fundo, olhou para o oceano e depois para mim
novamente.
— Tudo bem. Faremos nossa cerimônia, mas amanhã está muito em
cima para cuidarmos de tudo.
— Em dois dias, então.
— Certo. O que tenho que fazer para ajudá-la?
Sorri feliz e satisfeita.
— Preciso ir até a cidade depois do almoço. Vou ligar para Tulsa e
Chicago. Preciso de dois jatinhos prontos para trazer nossos convidados
para cá, amanhã.
— Certo, vou cuidar disso. — Sorriu e beijou carinhosamente minha
testa.
— Eu te amo, Victor!
— Eu também amo você!
Enquanto Victor reservava dois dos seus jatinhos ao telefone na
varanda, eu falava com Clarice. Ela ficou imensamente preocupada com
minha mãe quando contei sobre o que houve mais cedo e ao falar sobre a
cerimônia, ela tomou outro susto. Perguntou se tinha certeza do que eu
estava fazendo e eu disse que sim. Então, expliquei a ela o porquê dessa
mudança de data tão repentina e, após um minuto de silêncio, ela concordou
e aceitou comparecer. Pedi a ela que celebrasse nossa união e, emocionada,
ela disse que faria com o maior prazer. Antes de encerrarmos a chamada,
pedi a ela um favor importantíssimo. Que fosse até a casa da minha avó e,
usando a chave reserva debaixo do vaso de orquídeas na varanda, ela
trouxesse o vestido de noiva da minha mãe que estava em seu armário no
quarto. Em seguida, liguei para Grace, que concordou em vir. Depois fiz
uma chamada de vídeo com Sasha e Kim, que se assustaram quando contei
sobre a decisão de uma cerimônia repentina no Havaí, mas logo aceitaram o
convite.
— Quero que vocês sejam minhas damas de honra.
— Isso é sério? — perguntou Sasha.
— Sim. Eu já ia pedir isso a vocês, mas já que os planos mudaram
tão depressa, estou pedindo agora e espero que não recusem.
— Claro que não, Maya. Não seja boba — falou Kim.
— Ótimo! Fico feliz por aceitarem. A madrinha será Grace, minha
melhor amiga de infância. — Na verdade, deveria ser quatro garotas ao meu
lado no altar e não apenas três, mas ter Penny presente nesse dia seria mais
do que impossível.
— E o que devemos usar?
— Vestidos com os quais se sintam confortáveis. Qualquer modelo
ou tom, não me importo. O casamento será na praia, então não tem que se
preocuparem com calçados. Depois da cerimônia, vocês podem calçar
chinelos e ficarem à vontade.
— Certo — concordou Sasha.
— Preciso ir, tenho que resolver muitas outras coisas. Vejo vocês
amanhã e não se atrasem! O voo chegará aí às sete e meia e sairá às nove.
— Combinado. Qualquer coisa que precisar, é só ligar — avisou
Kim.
— Obrigada, meninas. Obrigada mesmo por estarem nessa comigo,
por entenderem esse momento.
— Amigas são para isso! — disseram as duas em uníssono.
— Kim... Diga a sua mãe que entendo ela não poder vir.
— Ela sente muito, mas é temporada de férias. O hotel fica cheio.
— Eu imagino.

Mais tarde, depois do almoço, fui à cidade com minha avó, Victor e
tia Jenna. Victor conseguiu com que um restaurante local atendesse nosso
buffet e disponibilizasse alguns dos seus garçons para nos servir. Minha avó
foi até uma floricultura e encomendou pequenos arranjos de mesa, uma
coroa de flores – que eu usaria no cabelo – e meu buquê. Tia Jenna e eu
fomos até uma lojinha que havia de tudo por um preço único de dois
dólares e compramos várias coisinhas fofas para decorar. Depois fomos até
uma confeitaria para encomendar um bolo simples e pequeno de dois
andares, além de alguns poucos doces. Segundo Caleb, não existe
casamento sem doces.
Um senhor viu nossa movimentação na pequena cidade e se
aproximou para dizer que conhecia um homem que vendia arcos florais
para casamentos na cidade. Fomos até lá e havia centenas deles, um mais
lindo do que o outro. Escolhemos um pequeno, mas o suficiente para nossa
minúscula cerimônia.
Quando voltamos para casa, já era final de tarde e estávamos todos
exaustos. Caleb ficou responsável pela música. Ele disse que colocaria a
caixa de som na varanda e criaria uma playlist para comandar tudo a
distância pelo celular, mesmo quando estivesse ao lado do pai no altar.
— Onde estão meus pais? — perguntei para ele, que estava sentado
sobre a ilha da cozinha, devorando um pote de sorvete.
— Na praia. — Apontou com a colher.
Caminhei até a varanda e os encontrei sentados na areia sobre uma
manta. Minha mãe estava sentada entre as pernas do meu pai e escorada a
ele, que a aconchegava em seus braços enquanto assistiam juntos ao pôr do
sol. Achei aquela cena tão maravilhosa... tão perfeita! Peguei o celular no
bolso do short jeans e tirei uma foto deles. Essa eu guardaria para sempre e,
sem dúvidas, teria um lugar especial na sala.
— Elliot irá trazer nossas alianças — informou Victor abraçando-me
por trás. — Passei a ele a senha do cofre onde estão guardadas.
— Nós já temos as alianças? — perguntei surpresa.
— Temos sim. Estão prontas há duas semanas.
Rimos.
— Que loucura! Nosso casamento estava marcado para a primavera
e, de repente, ele acontecerá depois de amanhã! — Sorri.
— Não teremos todos os convidados que havíamos planejado
chamar, mas teremos os principais conosco.
— Sim. Você falou com a Margot?
— Não e nem irei. Ela supera isso. — Riu e beijou minha cabeça.
— Acha que ela não ficará chateada?
— Quando voltarmos, ainda podemos fazer a cerimônia na
primavera. É só deixar que ela acrescente mais uns mil convidados na lista,
que estaremos perdoados — disse, fazendo-me rir.
— Se está dizendo, tudo bem.
Depois do jantar, antes de irmos dormir, fui com Victor até as
cabanas para certificar de que tudo estava realmente pronto para
recebermos nossos poucos convidados. A noite passou e não consegui
dormir. Fiquei andando de um lado para o outro na casa com um misto de
preocupação com minha mãe e ansiedade com o casamento. Assistindo ao
nascer espetacular do sol na varanda dos fundos, esperei que o relógio
marcasse sete da manhã para ir preparar o desjejum.
— Bom dia, querida — desejou meu pai ao entrar na cozinha.
— Bom dia, pai. Como a mamãe está?
— Bem. Ela está se arrumando com a ajuda da sua avó.
— Poderiam ter me chamado, eu teria ido cuidar dela.
— Imaginamos que ainda estaria dormindo. Ansiosa para o
casamento?
— Estou. — Sorri para ele, lhe estendendo uma caneca com café. —
E você? Como está se sentindo? Falta poucas horas para casar sua única
filha. — Escorei-me na bancada e dei um gole no meu café.
— Eu não sei direito como estou me sentindo. Acho que um misto
de alegria, raiva e ciúmes, eu não sei explicar. — Riu.
— Fique tranquilo, pai. Não estou abandonando vocês, na verdade,
não vou a lugar algum. Irei continuar morando em Tulsa por enquanto.
— Eu sei que não vai nos deixar, é só que sinto que estou perdendo
minha garotinha.
— Sua garotinha já não está aqui há muito tempo. Mas a mulher que
ela se tornou estará para sempre com vocês! — Caminhei até ele e o
abracei.
— Eu sei, filha. Eu sei. — Retribuiu o abraço.
— Bom dia — desejou minha mãe ao entrar na cozinha com minha
avó empurrando sua cadeira.
— Bom dia, mãe! — desejei feliz em vê-la bem e sorridente.
Aproximei-me dela e a abracei com cuidado, deixando um beijo
demorado em seu rosto.
— Animada? — perguntou.
— Se estou animada? Nem consegui dormir esta noite de tamanha
empolgação! — Fingi entusiasmo e torci para que ela não percebesse isso.
— Também estou ansiosa. — Sorriu com os olhos brilhantes.
Quando eu e Victor voltamos para dentro da casa depois da nossa
decisão de adiantar o casamento, reunimos todos na sala enquanto minha
mãe ainda dormia e comunicamos que iríamos adiantar a cerimônia.
Pegamos a todos de surpresa, mas depois de ouvirem nosso motivo
ninguém discordou e assim todos ficaram sabendo o porquê dessa decisão.
Todos, menos minha mãe. Para ela, Victor explicou uma mentira dizendo
que simplesmente sentia que ali era o lugar e aquele era o momento para
uma cerimônia íntima e familiar como desejava e que, com muito custo,
conseguiu me convencer a fazer. Ela acreditou. Ou... ao menos fingiu
acreditar muito bem.
Às seis e meia, todos chegaram. Jantamos na grande sala de jantar,
após acomodar cada convidado em sua cabana. Foi ótimo estar com todos
ali naquele momento de boa comida e conversa cheia de descontração.
Após a sobremesa, as mulheres seguiram para a varanda e os homens
ficaram na sala de estar. Minha mãe sorria o tempo todo, poderia dizer que
ela era a pessoa mais feliz ali. Às dez, todos se despediram e seguiram para
seus aposentos. Logo Victor dormiu, mas eu ainda fiquei fitando o teto. Não
conseguia adormecer, apenas pensava no dia seguinte.

Depois do café da manhã, o pessoal que cuidaria da comida chegou


com os garçons apossando totalmente da cozinha. Lá fora, na varanda dos
fundos, meu pai, tia Jenna e Caleb arrumavam uma longa mesa onde todos
sentariam juntos para o jantar. Às três, o homem de quem compramos o
arco de flores chegou para entregá-lo. Às quatro, a florista apareceu com os
arranjos e a confeitaria entregou o bolo e os doces. Guardei na adega os
arranjos, a coroa de flores e meu buquê. Ajudei tia Jenna a decorar a mesa e
o parapeito de madeira da varanda, com as velas e tecidos finos de cor
branca e lilás que compramos. Victor e Caleb colocaram as poucas cadeiras
que usaríamos para os convidados na areia, enquanto eu terminava meu
banho. Grace me ajudou a secar meus cabelos e a fazer a maquiagem. Tia
Jenna fez um coque baixo e frouxo, soltando duas finas mechas nas
têmporas. Clarice abriu o saco onde estava o vestido e tirou-o de dentro.
Sorri emocionada quando o vi.
— Usei meu poder de persuasão na lavanderia para conseguir uma
lavagem a seco de urgência — brincou.
— Obrigada!
— Só estou te ajudando a realizar seu sonho, querida.
— Por isso mesmo... Obrigada, Clarice. — Abracei-a.
— Não chore, meu bem. Não chore. Agora vamos vestir o vestido.
O vestido era perfeito. Branco, longo, feito de um tecido maleável e
bordado a mão. Na cintura, uma faixa drapeada. O decote em “V” nos seios
atraía bastante a atenção. O busto era todo trabalhado em renda. Havia
também duas curtas manguinhas que se apoiavam com delicadeza sobre os
ombros, dando um “ar” romântico ao vestido. A porta foi aberta e minha
mãe passou por ela acompanhada por tia Jenna, Grace, vovó, Kim e Sasha.
— Você está linda, filha — elogiou com os olhos marejados e a voz
embargada.
— Obrigada, mãe. Você também está linda! — E de fato estava. Ela
usava um vestido azul-claro e sandálias rasteiras prata.
— Bom... Estamos aqui para dizer que se você quiser desistir, agora
é a hora — disse Sasha séria, atraindo o olhar nervoso de todas.
— Não, eu recuso essa oferta. — Ri.
— Neste caso, eu e Sasha temos algo para você — falou Kim
estendendo-me uma caixa fina e quadrada de cor azul. — Este é seu algo
novo.
— Não precisava. Eu nem sequer pensei nisso.
— Mas nós sim! — afirmou Sasha. — Abre, Maya. Anda! Sabe que
sou agoniada.
Abri e dentro havia um lindo colar de ouro branco. Pendurado na
fina corrente tinha um pingente delicado em formato de coração.
— Atrás tem nossas iniciais: K, M e S. Assim você nunca vai
esquecer da gente — falou Kim.
— Eu nunca me esquecerei de vocês!
— Agora sou eu! — manifestou Grace. — Este é seu algo velho. —
Entregou-me uma caixinha de presente cor-de-rosa. Dentro, havia algo
muito especial.
— Ai, meu Deus! Grace! — Peguei nas mãos a tornozeleira da
amizade, que dei a ela quando éramos pequenas.
Era uma bijuteria de latão com borboletinhas minúsculas de todas as
cores distribuídas por toda a corrente. Devíamos ter uns oito anos quando a
presenteei com ela. Infelizmente perdi a minha em uma tarde que
brincávamos em um parquinho e nunca mais a encontrei.
— Deixe-me colocar — pediu pegando-a das minhas mãos e
abaixando-se à minha frente. — Pronto.
— Agora, finalmente, é a minha vez! — disse minha mãe com um
sorriso que não cabia em seu rosto. — Este é teu algo azul e emprestado.
— São os brincos que usou no seu casamento! — eu disse ao
reconhecer o saquinho aveludado de cor amarela.
— São sim. A sua avó também os usou e antes dela a sua bisavó e
assim sucessivamente. Mas, um dia, será sua filha, ou nora, quem os usará e
dará continuidade a essa tradição.
Os brincos eram pequenos, feitos de prata com pedras redondas de
topázio azul, mas eram a joia mais linda que tive a oportunidade de usar.
— Tenho que terminar de arrumar você, querida. Já estão todos na
praia — avisou tia Jenna.
— Claro — disse com a voz embargada, segurando firme o choro.
— Obrigada, mãe. Esse presente é lindo. Com toda certeza darei
continuidade a esse momento de emoção. — Com Victor eu jamais teria
filhos, mas não estragaria o momento dizendo isso a ela. Quem sabe, um
dia Caleb se casaria e eu os daria a sua mulher, para que ela desse
continuidade a isso.
Todas se foram e ficou apenas eu e tia Jenna. Ela colocou a coroa de
pequenas flores brancas em minha cabeça e eu os brincos em seguida,
depois do colar. Dei os últimos retoques na maquiagem e caminhei para as
portas que davam para a varanda, onde meu pai esperava por mim
segurando meu buquê feito com tulipas brancas e lilás.
— Uau! Você está perfeita, querida. Tão perfeita quanto o pôr do sol
lá fora — elogiou com a voz embargada.
Abracei-o e beijei seu rosto. Ao soltá-lo, vi que estava com os olhos
marejados.
— Não chore, pai, por favor. Se fizer isso, vou chorar também.
— O que está fazendo pela sua mãe é lindo! Eu desejo a você toda a
felicidade do mundo. Desejo a vocês toda felicidade do mundo — corrigiu-
se. — Victor me fez a promessa de que cuidaria de você e lhe daria tudo
aquilo que não pude dar. Espero que cumpra, porque senão eu o mato.
Deixei isso bem claro para ele — brincou, fazendo-me rir.
— Ele já está fazendo isso, pai. Não tenha medo ou dúvidas de que
ele falhará comigo. Isso não vai acontecer! O que ele promete, sempre
cumpre.
— Temos que ir agora.
— Sim.
Peguei o buquê da sua mão e, de braços dados, saímos para a
varanda. Lá de cima, admirei como tudo estava perfeito. A forma como o
sol beijava o mar. O jeito calmo como as ondas batiam na areia. As pessoas
que mais amava no mundo presentes. Meu noivo esperando por mim no
arco de flores, usando uma calça cáqui e camisa branca para fora, com as
mangas dobradas até os cotovelos e pés descalços na areia. Minhas amigas
– menos uma – estavam todas ali na frente, esperando para me verem entrar.
Cada uma delas usava um vestido de cor clara e modelos diferentes, mas
isso não fazia a menor diferença para tudo estar bonito e elas estarem
lindas. Minha avó estava sentada entre o Will e minha mãe, a qual não
parou de sorrir desde o momento em que me viu no quarto. Sammy e tia
Jenna estavam sentados juntos do outro lado, diante das damas de honra.
Caleb, Jack e Noberto estavam ao lado do Victor. A musica All of me, de
John Legend, começou a tocar na caixa de som atrás de mim. Desci a
escada de madeira e ao pisar na areia, senti o quanto ela estava quente e
macia. Olhando para frente, vi o homem da minha vida sorrir à minha
espera. O homem que amava com todo meu coração e alma. Aquele que
sabia que seria único, verdadeiro e para sempre. Com as pernas bambas de
emoção, dei meu primeiro passo em sua direção.
CAPÍTULO 11

Ela estava incrivelmente perfeita! Enfim, esse momento havia


chegado. Eu soube desde a primeira vez que a vi, sentada naquela varanda
de olhos fechados usando um vestido vermelho, que Maya seria o meu novo
amor. Eu senti. Senti que naquele instante meu mundo havia ganhado luz e
cor novamente. Meu coração sorriu quando a tive pela primeira vez em
meus braços, como sorria à sua espera no arco de flores. A música que a
embalava até mim dizia muito sobre nós.

“Porque tudo de mim


Ama tudo de você
Ama suas curvas e todas as suas bordas
Todas as suas imperfeições perfeitas
Dê o seu tudo para mim
Eu vou dar meu tudo para você
Você é o meu fim e meu começo
Mesmo quando eu perder, estou ganhando
Porque eu te dou tudo de mim
E você me dá tudo de você”

Ela se aproximou com olhos emocionados e um sorriso vivo e


brilhante, como nunca havia visto antes. Ela já era minha. Não precisava de
um sim para tê-la, ou para que eu me tornasse seu. Teddy a entregou para
mim e ao tocar sua mão, senti meu corpo todo se aquecer em chamas.
— Oi — ela sussurrou.
— Oi — sussurrei de volta.
A música parou e Clarice pediu a todos que se sentassem.
— Estamos aqui para celebrar a união, alegria, amor e confiança
deste casal. Vocês foram escolhidos para testemunhar e partilhar deste
momento único de celebração dos noivos Maya e Victor. Somos
privilegiados por isso, pois somos uma parte insubstituível da vida deles.
Assim como eles são partes insubstituíveis da vida um do outro. Eles
escolheram um ao outro como seu lar, sua família e seu porto seguro. Os
noivos enfrentaram terríveis dificuldades e cruzaram com grandes pedras no
caminho para estarem aqui hoje, exaltando o seu amor puro e cheio de vida.
Victor... cuide da Maya como se ela fosse a joia mais rara e valiosa que um
dia você colocou nas mãos. Maya... zele por Victor como se ele fosse o seu
último pilar inteiro a sustentar suas paredes de pé. A partir de agora, vocês
são tudo de mais sólido e valioso que o outro tem.
Olhei para Maya ao mesmo tempo que ela me olhou. Lágrimas
grossas escorriam por seu rosto delicado. Seus olhos marejados cintilavam
ainda mais à luz do pôr do sol.
— As alianças, por favor.
— Aqui. — Caleb as entregou a Clarice.
— Vocês fizeram seus votos?
— Eu fiz — respondeu Maya virando-se de frente para mim,
segurando firme minhas duas mãos. Olho no olho, ela começou a
pronunciar seu voto: — Você é quem eu mais confio na vida. Por isso, a
você eu me entrego. Dedico-me de corpo e alma. De você eu aceito tudo,
desde que seja com amor.
— Querida... Você só terá amor até meu último suspiro, porque é
somente isso que tenho para lhe dar... Amor, respeito e tudo o que há de
melhor em mim. Você é o que tenho de mais delicado, é o que tenho de
mais valioso na vida! Por você pararia o tempo se eu pudesse. — Meus
olhos foram atraídos para Meredith, que sorriu. — Preciso de você, Maya,
tanto quanto preciso do ar para respirar! Sem você, tudo voltará a ser cinza
e nublado. — Sorri com amor, vendo-a soluçar em meio ao choro de mais
pura emoção.
— Ah, meu Deus... Eu te amo tanto! — declarou alto, sorrindo.
— Eu te amo muito!
— Maya... — Clarice chamou nossa atenção. — Você aceita Victor
White como seu legítimo marido, para amá-lo e respeitá-lo na saúde e na
doença, até que a morte os separe?
— Sim! — respondeu rápido e eufórica, colocando a aliança em
meu dedo.
— Victor... Você aceita Maya Valentine como sua legítima esposa,
para amá-la e respeitá-la na saúde e na doença, até que a morte os separe?
— Sim! — Coloquei a aliança em seu dedo, depois levei-a até meus
lábios para beijá-la em sinal de carinho.
— Eu vos declaro marido e mulher. Pode beijar a noiva!
Maya entregou o buquê a Grace e aproximou-se para me beijar. Eu a
enlacei pela cintura e deitei-a para o lado, fazendo uma cena épica de beijo.
Os assobios e palmas chamaram-nos de volta para a realidade. Maya riu e
passou seus braços por meu pescoço, beijando-me outra vez.
— Juntos, até o fim do nosso tempo — sussurrei em seus lábios.
— Okay! Você já pode soltar minha filha! — brincou Teddy,
fingindo irritação.
No caminho para a pequena escada que levava à varanda, recebemos
uma chuva de arroz. Do topo da escada, Maya contou até três e arremessou
o buquê para Sasha, Jenna e Abbi, mas o buquê foi um pouco mais para trás
caindo nos braços do Caleb, que o arremessou de volta para frente como se
ele flamejasse em fogo e, desta vez, foi Abbi quem o pegou.
— Ah, meu Deus, vovó! Will e vovó são próximos a se casarem —
brincou Maya com empolgação batendo palmas.
— Por mim, aproveitaríamos a cerimônia — declarou ele,
recebendo um cutucão da Abbi nas costelas.
Estourei uma champanhe e brindamos a nossa união. Em seguida,
foi a vez de partirmos o bolo. Caleb colocou músicas mais animadas e todos
foram dançar. No jantar, Kim e Jack nos ofereceram um brinde cheio de
carinho e consideração. A todo instante, Maya dava uma boa olhada nas
pessoas à mesa e ficava séria por alguns segundos até que alguém falasse
algo com ela e ela voltasse a sorrir. Eu sabia do que ela estava sentindo
falta. Sentia falta da Penny. Mal ela sabia o que tinha para lhe contar. A
música The Way Look Tonight, de Frank Sinatra, na voz de Adam Levine,
começou a tocar.
— Senhora White? — chamei-a.
— Sim.
— Dança comigo?
— Com o maior prazer, Sr. White.
Ela colocou sua mão sobre a minha e levantou-se indo comigo até o
canto na vasta varanda, onde havia sido preparado para dançarmos.
Abraçados, começamos a nos balançar em um ritmo lento com nossos
rostos colados.
— Enfim casados — falou com um enorme sorriso.
— Enfim casados, meu amor. — Beijei-a. — Você está linda, meu
anjo.
— Você está perfeito. Nosso casamento foi perfeito. Não faltou
absolutamente nada, com exceção da Penny, é claro.
— Podemos nos casar quantas vezes você quiser.
Ela sorriu e passou seus braços por meu pescoço, deitando sua
cabeça em meu peito.
— Yes you're lovely... with your smile so warm and your cheeks so
soft. There is nothing for me but to love you... and the way you look...
tonight — cantei baixinho parte da música, somente para ela próximo ao
seu ouvido. Ela riu e selou meus lábios. — Lovely... Never ever change.
Keep that breathless charm. Won't you please arrange it... Cause I love
you... Just the way you look... Tonight. — Girei-a e puxei-a de volta para os
meus braços.
Dançamos mais algumas músicas e depois ela dançou com o pai,
Caleb, Will, Jack, a avó, com as amigas... Eu fiquei apenas observando-a
sentado ao lado da Meredith à mesa. Já estava ficando com “ciúme” e
queria minha esposa de volta. Levantei-me e fui até ela.
— Já passam das duas da manhã — sussurrei para ela. — Quando
vamos para o nosso quarto?
— Por que a pressa? — perguntou humorada.
— Para tirar sua roupa, beijar seu corpo inteiro e fazer você
desmaiar sob mim depois de inúmeros orgasmos e de amar você por horas
— falei em seu ouvido e afastei-me, vendo-a abrir os olhos lentamente. Sua
respiração saia levemente ofegante pela boca entreaberta.
— Vamos nos despedir — disse com um sorriso cheio de malícia.
Despedimos de todos e fomos para o quarto. Fui ao banheiro e
coloquei a banheira para encher. Ao voltar, encontrei Maya soltando os
cabelos diante do imenso espelho de corpo inteiro. Aproximei-me por
detrás dela e puxei o zíper do seu vestido.
— Que sorte a sua não precisar fazer ajustes no vestido.
— Eu e minha mãe sempre tivemos o mesmo corpo desde que atingi
os dezesseis anos. E ela, impressionantemente desde que se casou manteve
o peso, antes da doença, é claro.
— Vamos deixar esse assunto para amanhã... — Puxei seu vestido
pelos ombros. — Hoje eu quero só falar da gente, no idioma sexo.
Conhece?
Ela riu.
— Um pouco. Mas você me ensina.
— Com o maior prazer.
Soltei seu vestido, vendo-o deslizar por seu corpo e amontoar-se no
chão em seus pés. Toquei seus seios apertando-os de leve e desci uma de
minhas mãos por seu corpo contemplando suas curvas, enquanto assistia
tudo pelo nosso reflexo no espelho. Maya fechou os olhos e deitou sua
cabeça para trás. Sua pele estava toda arrepiada. Era lindo vê-la assim... tão
vulnerável a mim.
— A banheira já está prestes a transbordar.
Abriu seus olhos vagarosamente.
— Não quero entrar na água agora. — Virou-se para mim.
Seu corpo era tão lindo por trás quanto pela frente. Ela olhou por
cima do ombro, encarando nosso reflexo. Seu olhar era intenso e sexy!
Deslizei minha mão por suas costas até suas nádegas. Ela sorriu e encolheu
os ombros.
— Quero transar com você sentado na poltrona, diante do espelho
— disse.
Ela virou seu rosto e olhou-me nos olhos.
— Sim, Senhor.
— Não, querida... Hoje não serei seu Senhor. Hoje seremos apenas
eu e você. Victor e Maya White... se amando pela primeira vez depois de
casados. — Acariciei seu rosto.
Maya se firmou nas pontas dos pés e beijou-me. Aquele foi o beijo
mais doce que dera. Como eu queria que esse momento fosse eterno. Havia
tanto amor e paixão no ar, que parecia estarmos flutuando. Ela me despediu
tirando peça por peça. Depois de desligar a água da banheira, puxei a
poltrona diante do espelho e sentei-me. Estendi minha mão para ela e a
trouxe para o meu colo. Ela se sentou de frente para mim deixando as
pernas uma para cada lado das minhas coxas. Senti um choque quando meu
membro tocou sua intimidade úmida. Relaxei no estofado e agarrei sua
cintura.
Ela tomou meu pau em sua mão macia e começou a massageá-lo de
leve. Seus olhos ainda estavam em contato direto com os meus. Um gemido
baixo escapou. Maya sorriu e ergueu-se um pouco firmando o peso do seu
corpo sobre o joelho, posicionando meu pênis em sua entrada. Então,
vagarosamente, ela desceu deslizando por meu comprimento até a base. Por
entre seus lábios desenhados, saiu um suspiro cheio de tesão que me fez
pulsar forte. Ela começou a cavalgar sobre mim, sem pressa, com suas
mãozinhas apoiadas em meus ombros rígidos. Nossos gemidos ecoavam
pelo quarto em uma sonoridade sensual.
Eu puxei-a mais para mim e beijei sua boca. Nosso beijo
rapidamente se tornou faminto, exigente e desesperado. Acho que ambos
desejávamos fundir um dentro do outro. Ela começou a se mexer mais
rápido. Nossos corpos já estavam suados, pregando um no outro. Suas
unhas arranhavam com força minhas costas. Eu beijava seu pescoço,
mordia seu ombro e apertava seu corpo contra o meu. Uma vez ou outra
encarava o espelho e era lindo de ver Maya quicando em meu colo abraçada
a mim gemendo loucamente. Seus cabelos já estavam enormes de novo.
Quando ela jogava sua cabeça para trás, as pontas roçavam em meus braços
fazendo cócegas de leve.
Suas mãos puxaram meus cabelos da nuca fazendo-me olhar para
ela, que tinha uma expressão de êxtase total no rosto. Isso fez meu pau
pulsar forte dentro dela. Ela beijou-me mordendo meu lábio inferior e
cravou as unhas nas costas causando-me dor. Sua musculatura interna
apertou meu membro, então, senti que ela estava a segundos de um orgasmo
libertador. Ao senti-la banhar-me com seu néctar quente, não houve como
resistir. Gozei puxando seus cabelos e apertando sua cintura, gemendo alto
junto a ela. Maya desacelerou até que parou, escondendo seu rosto em meu
pescoço. Seus pulmões arfavam alto pressionando seus seios contra meu
tórax. Abracei-a achegando seu corpo pequeno em meus braços e deitei
minha cabeça sobre a sua. Dei-lhe carinho até que sua respiração ficasse
controlada novamente. A todo instante seus dedinhos adularam meu peito
vagarosamente. Ela estava tão quietinha e de olhos fechados, que se não
fosse por esse carinho teria achado que tivesse adormecido.
— Vamos tomar um banho agora? — perguntei tirando seu cabelo
do rosto. Ela apenas assentiu.
Tomamos nosso banho e depois nos deitamos. Fizemos amor mais
uma vez, lento e demorado. Maya dormiu com sua cabeça deitada em meu
peito, agarrada a mim. Definitivamente, ela era o que eu sempre quis. O que
eu sempre precisei para ser honestamente feliz.

Acordei primeiro que a Maya. Ela dormia de lado tranquila, coberta


somente com um lençol branco da cintura até os joelhos. Os cabelos
estavam esparramados no travesseiro, como uma cobertura. Sentei-me à
beirada da cama de frente para ela e acariciei seu rosto. Ela suspirou fundo
e remexeu-se virando de barriga para cima, abrindo os olhos
preguiçosamente.
— Bom dia, esposa.
— Bom dia, marido.
— Levante-se. Hoje iremos caminhar na praia e tomar banho no
mar.
Ela sorriu e tocou de leve meu rosto.
— Só mais cinco minutinhos.
— Não, nem mais um. Levante, Maya. — Puxei o lençol que a
cobria. — Venha. Vamos sair e curtir nossa primeira manhã como Sr. e Sra.
White.
— Tudo bem.
Enrolada no lençol, ela foi ao banheiro. Depois do café da manhã,
ela colocou seu biquíni e fomos todos para a praia. Maya deitou na areia ao
lado da mãe esperando pelas ondas que vinham cobri-las.
— Está gelada! — gritou cobrindo o rosto com as mãos, quando
mais uma marola fraca as molhou até a cabeça.
Era bonito de vê-las rirem alto e se divertindo juntas. Eu pude ver a
criança interior da Maya sair para tentar agradar a mãe.
— Quando voltarmos, preciso que fique em Tulsa. Não vá para
longe, não deixe a Maya — pediu Teddy parando ao meu lado. Olhei-o com
estranheza. Seu pedido pareceu-me urgente.
— O que está acontecendo?
— Ontem à noite, Meredith teve outra crise respiratória. Chegamos
a pensar em chamar a emergência, mas ela melhorou minutos depois. As
crises estão ficando mais frequentes. Minha esposa não aguentará muito
mais tempo, a mesma sente isso. Você precisa estar com a Maya quando
acontecer. Não serei forte o bastante para dar o amparo que ela precisa, mas
você sim será.
Olhei para Maya, ainda deitada na areia. Ela gargalhava alto
reclamando da água fria. Senti-me devastado por ela, porque aquele
momento com sua mãe seria único e o último.
— Eu não vou a lugar algum.
— Ótimo!
Teddy se afastou e foi até elas.
— Deite aqui, querido! — pediu Meredith.
— Mas é claro! — Deitou-se ainda vestido ao lado da mulher.
Maya ficou por mais alguns segundos com eles e depois se levantou
vindo correndo até mim e pulando em meus braços.
— Venha, vamos entrar no mar! — Puxou-me pela mão, arrastando-
me até lá.
Ela estava feliz. Muito feliz. Seus olhos brilhavam e seu sorriso ia
de orelha a orelha. Ela ria sem parar. Dizia me amar a todo instante. A noite
chegou e fizemos uma fogueira na praia. Nossos últimos dias no Havaí se
foram. Ao voltarmos para Tulsa, Meredith precisou ser levada às pressas
para o hospital, depois de uma crise respiratória que não passou em três
minutos. Ela precisou de uma traqueostomia de emergência e ser levada
para o CTI. Maya moveu os céus para levar a mãe para a nossa casa, porque
seu desejo era passar seus últimos minutos em família e fora do hospital.
Contratei uma equipe médica para ficarem vinte e quatro horas ao dispor. O
médico pediu para que nos retirássemos e deixássemos Meredith descansar.
Maya se sentou no corredor diante da porta do quarto e ficou ali por horas.
O pai tentou tirá-la de lá para se alimentar, mas falhou. Eu tentei tirá-la de
lá e falhei também. Não havia nada que a tirasse dali. Nada!
— Amor... você tem que comer alguma coisa, está aí o dia todo.
Deve estar sentindo dor nas costas, cansada e com fome.
— Estou bem — disse com os olhos pregados na mãe sobre a cama.
— Tudo bem. Estarei na sala se precisar de alguma coisa.
— Do que eu preciso nem mesmo você pode me dar — falou com
angústia.
— Você quer entrar?
Ela olhou-me e assentiu depressa.
— Então entre.
Ajudei-a se levantar e entrei com ela. Maya caminhou até a cama e
pegou a mão da mãe que dormia sedada, entre as suas. Teddy entrou em
seguida com a Abbi e pararam do outro lado da cama. A mãe segurou sua
outra mão e Teddy acariciou sua cabeça desnuda do lenço costumeiro.
Lágrimas e mais lágrimas lavavam o rosto da Maya.
— Tudo bem se quiser ir, mãe. Você não tem mais que ficar por nós.
Você lutou e já chegou até aqui e somos gratos por isso. Mesmo que não
esteja presente em carne, estará para sempre em nossos corações celebrando
todos os momentos bons e nos dando sua força nos ruins. Você já pode ir.
Você merece esse descanso. Ficaremos bem. E não se preocupe... irei
cumprir tudo o que te prometi.
Ficamos mais um pouco ali e depois saímos deixando somente
Teddy. Maya se alimentou, tomou banho e se deitou no sofá da sala de estar
com a cabeça no colo da avó e logo adormeceu em lágrimas.
CAPÍTULO 12

— Você precisa levantar. Maya... — Victor acariciou meus cabelos.


— Querida... Temos que sair em meia hora.
— Eu não quero ir.
— Você tem que ir! É a sua mãe. Precisa dizer o último adeus.
— Não posso... — Mais lágrimas continuaram a escorrer.
— Vamos, meu amor... Reaja. O funeral começa às nove. —
Levantou-se da beirada da cama, puxando o cobertor que me cobria.
Minha mãe havia partido durante a madrugada, após minha
despedida. Ao acordar na sala escura e sozinha, caminhei até o quarto no
térreo, ao lado da biblioteca, para vê-la. Ao chegar à porta, encontrei seu
corpo completamente coberto por um lençol branco. Uma dor insuportável,
a pior já sentida na minha vida, martelou dentro de mim sufocando-me.
Tudo por dentro doeu como se eu estivesse sendo rasgada viva. Não
conseguia gritar ou falar. Eu tentava e tentava, mas nenhum som saía. Era
como se eu estivesse presa em um daqueles pesadelos onde não
conseguimos nos mexer ou pedir por ajuda. Minha garganta chegava a doer
de desespero. Caí de joelhos no chão apertando as mãos contra o peito e
clamando por um alívio para aquilo que sentia. Um par de braços fortes
envolveu-me de lado, puxando-me contra seu corpo grande.
— Vai ficar tudo bem... Vai ficar tudo bem... — Reconheci a voz do
Victor. — Me abrace. Estou aqui, querida. Estou com você.
Agarrei-me a ele e, finalmente, consegui me desentalar e gritar
apavorada. Ele dizia-me a todo instante que estava ali para mim, que jamais
me deixaria e que tudo ficaria bem. Também dizia que um dia a dor
diminuiria, mas naquele instante eu duvidava disso.
— Já está pronta? — perguntou ele ao voltar para o quarto.
— Estou — respondi abotoando o último botão do vestido preto que
usava.
Encarei meu reflexo abatido no espelho e passei as mãos pelo rosto
respirando fundo, tomando coragem para dar o primeiro passo para fora do
quarto nas últimas trinta e seis horas.
— Está se sentindo bem? — interrogou preocupado, apoiando suas
mãos em meus ombros.
— Não sei.
— Estarei lá com você. Se agarre em mim quando precisar.
Deixamos o quarto e descemos. No carro, Caleb já esperava por nós.
Entramos em silêncio e Noberto dirigiu para a igreja. Minha avó estava
péssima. Se o luto doía para mim, imagina para ela que estava prestes a
enterrar sua única filha. Meu pai parecia viver anestesiado ou fora de órbita.
Não comia, bebia ou conversava com alguém. Ele se sentou sozinho no
primeiro banco diante do caixão. Eu me sentei logo atrás entre meu marido
e Caleb, no mesmo banco em que Clarice e sua família. Após o velório, no
qual não consegui dizer uma palavra sequer aos que ali estavam para seu
último adeus, fomos para o cemitério onde fizemos o mais difícil. Colocá-la
sob a terra. Aquilo sim doeu de verdade. O desespero em saber que nunca
mais tocaria seu rosto, tomou conta de mim levando-me a uma crise de
pânico. Victor arrastou-me de lá para o carro e me deu todo seu apoio e
calma.
Após o sepultamento, todos foram para a casa da minha avó, exceto
eu. Não estava com espírito ou ânimo para receber condolências e abraços
frios. Eu estava incompleta, sentia que um pedaço grande de mim havia
sido enterrado também, e isso não me faria melhorar. O luto estava sendo
insuportável demais e o sentimento de estar quebrada não diminuía com o
passar dos dias. Pelo contrário, parecia aumentar. Um buraco negro me
engolia de dentro para fora e eu temia que esse vazio escuro e frio dentro de
mim nunca desaparecesse, ou que ele desaparecesse levando-me com ele.
Victor estava sendo o melhor marido possível na última semana. Ele
tentava me animar com jantares em casa feitos por ele, filmes e conversas
bobas, mas aquilo só funcionava momentaneamente e logo a angústia e
infelicidade voltava pegando-me em cheio. Eu ainda não conseguia crer que
o luto um dia sumiria. Eu estava convencida de que a verdade, era que nós
nos acostumamos com ele e aprendemos a lidar com a perda.
Terminei de lavar as louças e saí à procura do Victor. Entrei no
corredor que levava ao seu escritório e escutei-o conversar ao telefone lá
dentro. Caminhei até a porta entreaberta e parei diante dela.
— E como foi seu encontro com ela esta semana? — Com quem ele
falava? Quem era ela? O ciúme me atacou. — Você fez a oferta? Como ele
reagiu? Isso é bom. Se ele demonstrou interesse, tem em mente negociar
logo mais. Diga a ela para ser mais paciente, tenho estado ocupado. Maya
não está em um bom momento agora. Certo. Mantenha-me informado. —
Encerrou a chamada.
Ele estava falando com alguém sobre outra mulher? Quem era essa
pessoa com quem conversava? Estou cansada demais para questioná-lo.
Subi para o quarto e troquei-me para dormir. Estava me ajeitando sob o
cobertor quando Victor entrou vindo até mim.
— Está tudo bem, meu anjo?
— Sim — menti e sorri.
Há dias ele me fazia a mesma pergunta e eu lhe dava a mesma
resposta dizendo que estava bem, mas não estava. Acho que ele sabia disso
e aceitava mesmo assim. Eu não conseguia estar bem, por mais que me
esforçasse para isso. Era impossível!
— Vou me trocar. Já volto.
Entrou no closet e logo voltou deitando-se ao meu lado. Virei-me de
costas para ele e seu braço agarrou-me por trás pela cintura.
— Estou com saudades do seu corpo... — Beijou minha nuca. —
Das suas mãos em mim... — Beijou atrás de minha orelha. — De amar você
entre gemidos — sussurrou em meu ouvido.
— Hoje não. Okay?
— Tudo bem. — Ele beijou minha cabeça e ajeitou-se sob o
cobertor aconchegando seu corpo no meu.
Fechei meus olhos e o cansaço emocional e físico logo me colocou
para dormir. Minhas noites de sono não eram mais tão tranquilas como
antes. Sempre eram atordoadas com pesadelos e sonhos saudosos que me
despertavam em meio às lágrimas várias vezes na noite. Às vezes, eu não
conseguia dormir novamente e via o dia nascer. Mas, desta vez, o que me
fez despertar tão cedo e perder o sono, foi minha agonia por não saber o que
Victor escondia de mim e nem de quem falava ao telefone.
— Acordou cedo. Não conseguiu dormir outra vez? — perguntou
Caleb ao entrar na cozinha.
— Perdi o sono de novo.
— Vai voltar para Tulsa amanhã?
— Sim. Preciso saber como meu pai está. Ele não me atendeu
quando liguei ontem, fico preocupada.
— Entendi. Você está certa.
— Bom dia, meus queridos! — desejou Victor com grande
empolgação ao entrar na cozinha.
Encarei-o com olhos estreitos e estranheza.
— Por que tanta animação a essa hora da manhã? — questionei-o
sentindo-me irritada, às sete e meia da manhã.
— É, pai... Por quê? Você nunca é tão bem-humorado assim pela
manhã.
— Só estou feliz por vocês dois estarem aqui. — Sorriu e piscou
para mim. — Vamos, Caleb. Vou te deixar na escola antes de ir para o
trabalho.
— Ainda não tomei o café da manhã. Maya preparou tudo.
— A gente para no caminho e você compra alguma coisa. Vamos!
— Por que tanta pressa? — interroguei-o, sem fazer a menor
questão de esconder minha irritação.
— Vou encontrar com um sócio agora pela manhã. Precisa de
alguma coisa? Pode pedir ao Elliot, ele providenciará.
Uma desconfiança gritava na minha cabeça. Poderia ser bobagem e
sem motivos, mas ela estava lá. Não parava de me perguntar quem era a
mulher sobre a qual ela perguntava na ligação.
— Caleb... Pode esperar pelo seu pai na sala?
— Tudo bem. — Levantou desconfiado e saiu.
Encarei Victor de braços cruzados.
— O que realmente vai fazer agora? — perguntei com um pouco de
arrogância.
— Algum problema, querida? — perguntou encarando-me sério,
apoiando as mãos no balcão.
— É... Tem sim! Eu sei que não devia, mas escutei sua ligação
ontem à noite. Do que estava falando e com quem estava falando? Quem é
ela, Victor? — Um ciúme maluco falava por mim, prestes a berrar.
— Algum dia lhe dei motivos para desconfiar de mim?
— Não, mas... por que o segredo? Isso é angustiante, sabia? Achei
que havíamos prometido, sem mais segredos! — falei alterada.
— Se segredos são angustiantes para você, por que ainda não me
contou sobre o que Jack lhe disse na festa de casamento dele, quando
dançaram juntos?
Fiquei tensa.
— Ele não me disse nada de mais.
— Não minta, Maya, por favor! — pediu alto, batendo as mãos
sobre a bancada. — Ele me contou depois o mesmo que contou a você! Que
a pessoa que a perseguiu em Chicago naquela madrugada não era Sean ou
Tyrone!
Minha tensão triplicou e a respiração pesou no peito. Merda!
— Não falei nada, porque o que aconteceu em Chicago ficou no
passado. Não quis preocupá-lo.
— Me preocupar? — Riu sarcástico. — Maya, Higor ainda está à
solta! Ele, assim como eu fiz, pode ter seguido você até o aeroporto para
saber para onde você estava indo! Pode ter sido ele! Não pensou nisso? —
Abaixei minha cabeça. Eu havia pensado e acreditava que poderia sim ter
sido ele. — Você também sentiu que foi ele, não é? — Assenti. — Por que
não me falou nada sobre isso?
— Porque Eliza havia acabado de sair do nosso caminho. —
Encarei-o. — Eu só queria que a paz durasse mais um pouco, mas eu ia...
juro que ia te contar! Já devia ter feito isso, mas aí tanta coisa aconteceu...
— Agora sou eu quem digo... Achei que tivéssemos prometido um
ao outro sem mais segredos quando a pedi em casamento. Não estou
escondendo nada de você, Maya! Só ainda não havia achado o momento
certo para falar com você sobre a Penny! Ainda está de luto, preocupada
com seu pai e sua avó. Entenda... Não estou guardando um segredo. Só
achei que já tivesse preocupações o suficiente por ora e que isso fosse algo
que eu pudesse cuidar sozinho.
— O que está acontecendo? — perguntei preocupada.
— Tenho um segurança que tem se encontrado com Penny
regularmente para saber como ela está e para que não ficasse estranho para
o seu cafetão quando eu fizesse uma oferta. O que aconteceu, foi que eu a
fiz. Ele disse que minha proposta era indecente, mas que iria pensar. Se ele
vai pensar, isso significa que tem o interesse de comercializá-la. Eu soube
disso na manhã do nosso casamento. Eu ia contar no outro dia, mas resolvi
esperarmos voltar da viagem. Então, tudo aconteceu.
— Meu Deus! Victor... Desculpe — pedi envergonhada. — Não sei
o que está acontecendo comigo, eu ando com meus sentimentos à flor da
pele. Sua conversa me soou tão estranha... Eu ataquei você. Desconfiei de
você e fui grosseira. Desculpe-me.
— Está tudo bem, meu anjo. — Deu a volta na ilha, vindo até mim.
— Vem aqui. — Abriu seus braços.
Abracei-o cheia de culpa. Não devia tê-lo abordado desta forma. Foi
ridículo! Não é com ignorância ou com tom de voz alterado que se resolve
problemas e questões em um casamento. Fui infantil e estúpida.
— Eu te entendo, querida. Talvez eu devesse ter contado na manhã
após o casamento, tudo isso teria sido evitado. Ela deseja ver você, tem
pedido isso insistentemente.
— Eu quero vê-la. — Soltei-o.
— Irei providenciar, mas seja paciente. Primeiro, vamos voltar para
Tulsa e procurar saber como está tudo por lá. Tudo bem?
— Sim. — Sorri e abracei-o novamente.

À volta para casa nunca mais seria a mesma. Não teria mais uma
parada no hospital para ver minha mãe ou aquela empolgação de encontrá-
la. Fazia dez minutos que eu havia chegado e ainda não tinha encontrado
meu pai. Ele não atendia ao telefone e não estava na casa da minha avó ou
tia Jenna. Eu já estava superpreocupada, tinha medo de que algo ruim
tivesse lhe acontecido. Não poderia perder meu pai também, quando ainda
nem sequer havia superado a morte da minha mãe.
— Você vai furar o chão. Sente-se, meu anjo.
— Eu não sei mais por onde começar a procurá-lo. Por que ele não
me atende? — perguntei impaciente, andando de um lado para o outro na
sala de estar.
— Não tem nenhum amigo com quem ele possa estar?
— Ele se afastou de todos depois que minha mãe ficou doente pela
segunda vez. Fechou-se para o mundo e perdeu a fé na vida.
— Quer ir ao hospital?
— Eu não sei... Só temos um hospital na cidade, todos já o
conhecem por lá. Teriam me ligado se algo tivesse acontecido.
— Delegacia?
— Já teriam ligado para Clarice e nós já estaríamos sabendo.
— Meu amor... — Levantou-se e veio até mim, segurando-me
delicadamente pelos ombros. — E se ele tiver quebrado sua sobriedade.
Isso é possível. Em momento de dor, tem pessoas que costumam acreditar
que o álcool ajuda a melhorar.
— Tem um bar... Ele fica na rodovia. A gente pode ir procurá-lo, ele
sempre ia até lá.
— Então vamos. Pegue seu casaco.
Peguei meu casaco, saímos de casa e fomos até o bar. Victor não
deixou que eu entrasse, disse que o lugar tinha homens mal-encarados
demais. Ele desceu e foi só. De dentro do carro, gritos e xingamentos
chamaram minha atenção, assustando-me. Virei para trás depressa e vi dois
homens chutarem outro caído no chão do beco, na lateral do bar.
— Ai, meu Deus! — gritei com desespero ao ver que o homem que
apanhava era o meu pai.
Abri a porta e desci correndo em sua direção.
— Maya! — Noberto gritou-me vindo atrás de mim.
— O que estão fazendo? Parem! — berrei empurrando um dos
homens e ajoelhando ao lado do meu pai. Ele estava sujo, molhado e com o
rosto todo ensanguentado.
— Qual é a sua, menina? Quer apanhar também? — perguntou um
dos homens, puxando-me pelo cabelo e colocando-me de pé.
— É melhor se afastarem! — ameaçou Noberto puxando-me pelo
braço para trás dele e apontando uma arma para os homens, segurando-a em
uma só mão. — Saiam daqui! — mandou entredentes e destravou a arma.
Sua postura rígida, o maxilar contraído e o tom de voz grosso e rude
davam medo. Eu nunca tinha visto-o daquele jeito.
— Estamos de boa, cara. Nosso problema era só com esse merda aí.
— Apontou para o meu pai. — Já estamos indo. — Foram afastando-se
devagar.
Aproximei-me novamente do meu pai, que gemia ainda caído no
chão.
— Pai... Você me ouve? — Coloquei sua cabeça em meu colo.
— Nunca mais faça isso, Maya! Está me ouvindo? Nunca mais! —
gritou Noberto comigo, abaixando-se ao meu lado e segurando-me firme
pelos ombros.
— Desculpe. Fiquei apavorada. Não pensei direito.
— Mas o que está acontecendo aqui? — perguntou Victor.
— Tinha dois homens batendo nele — respondi-o em lágrimas.
— Tire-a daqui, Noberto!
— Não! Eu não vou sair de perto do meu pai! — gritei com ele.
— Olha para este lugar, Maya! Não é um ambiente seguro para
você! Vai e eu fico aqui.
— A ajuda já está a caminho — informou Noberto, guardando seu
celular no bolso interno do paletó.
Encarei Victor com resistência. Não queria deixar meu pai. Ele não
entendia isso?
— Maya! Não é um pedido! — rosnou entredentes, olhando-me
firme nos olhos. — Vai! — mandou duro e eu neguei com a cabeça. —
Tire-a daqui, Noberto!
— Por favor, Sra. White. Venha! — Ele puxou-me pelo braço e
levou-me para o carro. Não lutei contra ele, não resolveria. Isso apenas me
faria cansar.
Noberto trancou as portas e ficou parado do lado de fora. A ajuda
chegou minutos depois e levaram meu pai para o hospital. Victor o
acompanhou e nós fomos logo atrás. Ao chegarmos, passei correndo pelas
portas da emergência. Meu pai foi levado desacordado para uma sala de
atendimento especializado, a qual fui impedida de entrar. Ele estava
machucado demais e os médicos temiam uma hemorragia interna ou uma
concussão encefálica, devido aos vários chutes que levou nas costas, barriga
e cabeça.
— Não posso perdê-lo! — disse em desespero para Victor.
— E você não irá, meu amor. Seu pai é um homem forte, verá. Não
terá acontecido nada a ele, talvez algumas costelas quebradas, um olho roxo
e um lábio inchado por alguns dias, mas nada grave que a faça correr o
risco de perdê-lo! Se acalme, Maya. — Abraçou-me.
Após uma rápida examinada, o levaram para exames detalhados.
Meu pai estava bem, entre aspas. Ele havia quebrado o nariz, duas costelas,
trincado o antebraço esquerdo e estava com o rosto desfigurado. Eles o
sedaram e ministraram medicamentos para tratar a dor e os ferimentos. Meu
pai não teria que fazer nenhuma cirurgia, mas ficaria um bom tempo de
molho acamado. Infelizmente, o exame de sangue comprovou que ele havia
ingerido bebida alcoólica.
Victor foi para casa ficar com Caleb e eu fiquei no hospital com meu
pai sob a guarda do Elliot. Adormeci sentada em uma poltrona reclinável ao
lado de sua cama. Acordei com seu resmungo de dor e desconforto.
— Papai... Graças a Deus que acordou. Estava tão preocupada com
você. Como se sente?
— Tudo dói — sussurrou.
— Por que, pai? Por que foi até aquele lugar? Você bebeu, eu sei!
Exames comprovaram isso.
— Eu não sei... Só precisava de algo para aliviar o que eu sentia.
— O álcool jamais terá esse poder, pai. Quebrou seu ciclo de
sobriedade de meses, por nada! Olha só aonde você veio parar! O que
houve para brigar?
— Eu não me lembro.
Lágrimas grossas escorreram por suas têmporas, enquanto ele fitava
o teto branco.
— Não faça mais isso, por favor. — Segurei sua mão, apertando-a
de leve. — Fiquei imensamente preocupada! Não posso perder você
também, não irei suportar. Acho que se não tivesse ido procurá-lo lá, você
teria morrido nas mãos daqueles crápulas.
— Desculpe, minha filha — pediu com a voz embargada.
— Eu te desculpo, pai. Mas tem que me prometer que não haverá
recaídas.
— Eu prometo. — Olhou-me.
— Ótimo! Eu e Victor conversamos antes dele ir para casa. Quando
receber alta, você virá morar conosco aqui em Tulsa. Vou ficar para cuidar
de você.
— Não, querida. Não quero atrapalhar seu casamento. Vocês
acabaram de se casar, não precisam de um intruso na casa de vocês, muito
menos que vivam em cidades separadas.
— Não! Eu insisto. Você vem morar conosco. Eu e Victor somos
acostumados a lidar com um relacionamento a distância. Não se preocupe
com nosso casamento. Se preocupe em ficar bem!
CAPÍTULO 13

Encontrar Penny depois de alguns meses sem vê-la, deixou-me


ansiosa. As duas noites anteriores ao nosso encontro, perdi o sono pensando
no quanto era urgente a necessidade de ajudá-la. Eu havia lhe prometido
isso, mas com tanta coisa que aconteceu nos últimos meses perdi o foco em
lutar pela sua liberdade.
— Está pronta? — perguntou Victor ao entrar no quarto.
— Sim, já entreguei minha mala ao Noberto.
— Falou com a Jenna?
— Liguei para ela há pouco. Tia Jenna disse que está tudo bem e
meu pai já tem previsão de alta para daqui dois dias.
— Isso é bom. Agora temos que ir. — Beijou minha testa.
O voo para Dallas foi rápido. Ao chegarmos à cobertura, Caleb logo
se trancou em seu quarto e Victor foi para o escritório cuidar de negócios
por teleconferência, enquanto eu preparava o nosso almoço. Após terminar,
bati na porta do Caleb e avisei-o de que a comida já estava pronta. Entrei no
escritório e encontrei meu marido ao telefone. Devia estar tratando de
assuntos sérios, tinha o cenho franzido e mordia o lábio inferior com tensão.
Aquilo era sexy. Meu poderoso CEO. Aproximei-me dele e parei às suas
costas, abraçando-o por trás, depositei um beijo em seu pescoço e sussurrei
em seu ouvido que nosso almoço já estava servido. Ele assentiu brevemente
com a cabeça e continuou a falar em um tom firme, com quem quer que
fosse do outro lado da linha. Sobre a mesa, avistei um envelope preto
endereçado a nós.

Senhor & Senhora White

Peguei-o e me afastei sentando na poltrona à sua frente,


perguntando-me quem teria mandado aquele convite. Além das pessoas
presentes em nosso casamento, ninguém mais sabia que eu já era a Sra.
White, nem mesmo os empregados. Será que alguém havia vazado a
notícia? Optamos por nos preservar, ao menos enquanto eu superava o luto.
Seria demais para lidar com a perda da minha mãe e com a imprensa em
cima de nós. Abri o envelope e tirei de dentro um cartão vermelho cintilante
com letras douradas.

O Sr. & a Sra. Lenting tem a honra de anunciar a primeira festa


fetiche do ano, a realizar-se em sua mansão na cidade de Veneza, no
próximo dia vinte e seis. Os senhores estão convidados para uma noite de
prazer.
Reservas serão feitas em seu nome no hotel Stella Italiana. Favor
confirme sua presença!
Atenciosamente,
Sr. & Sra. Lenting.

— Mas o que é isso? — perguntei e olhei para Victor. Ele sorriu e


encerrou a chamada.
— É um evento para o qual fomos convidados por um casal de
velhos amigos.
— O que acontece nessa festa?
— Tudo o que quiser que aconteça. Tudo que sua mente permitir
imaginar.
— Ai, meu Deus! — falei um pouco horrorizada, acho que minha
mente me permitiu imaginar demais.
Ele gargalhou.
— Não se preocupe. Nós não iremos.
— Por que não?
Ele encarou-me surpreso.
— Porque ficarei louco se alguém tentar tocar você ou te olhar
demais.
— Mas você não precisa deixar ninguém me tocar. Sempre tive
curiosidade de ir a um lugar assim. Não pode ser pior do que o baile de
máscaras que fomos àquela vez em Seattle.
— Aquilo era completamente diferente, Maya. Todos sabiam que
você pertencia a mim e ninguém jamais a tocaria ou olharia com desejo. Há
respeito naquele tipo de ambiente, que não terá nesta festa. — Apontou para
o convite.
— Você já foi?
Ele respirou fundo e hesitou por alguns segundos.
— Sim.
— E por que não quer me levar?
— Porque você não é um aperitivo sexual que quero compartilhar.
— Podemos ir só para olhar?
— Não dá para ir e apenas olhar. É preciso participar.

— Okay. Pensei que seria desta vez que conheceria a Itália.


— Quer conhecer a Itália? Eu te levo. Mas nós não iremos a esta
festa.
— Sim, Senhor — disse com sarcasmo e levantei-me desapontada.
Caminhei em direção à porta e parei ao me aproximar. — Venha antes que a
comida esfrie.
— Já estou indo.
Depois que almoçamos, deitamos os três juntos no sofá assistindo a
um filme. Eu, Victor e Caleb. Exatamente nesta ordem. Caleb gargalhava
alto do filme bobo de comédia americana, enquanto nós ríamos dele. O
momento incrível que tivemos me fez perguntar para mim mesma como
seriam nossos dias em família, se tivéssemos filhos. Esta dúvida me
assombrava e estava cada vez mais frequente. Jantares, passeios, momentos
tolos como quando jogávamos cartas e entre outros.
— No que está pensando? — sussurrou Victor, acariciando meus
cabelos.
— Nada.
Aconcheguei-me mais nele e concentrei-me no filme.

A noite na qual iríamos encontrar Penny havia chegado. Estava tão


nervosa, que mal conseguia me equilibrar sobre o salto que calçava. Eu
tinha tanto para contar a ela.
Fomos para o hotel e aguardamos por sua chegada. A porta foi
aberta e eu me levantei do sofá em um pulo. Um dos seguranças do Victor
entrou e ela surgiu vindo logo atrás, usando um vestido curto e justo de cor
azul e bijuterias reluzentes.
— Maya! — Correu ao meu encontro e abraçou-me forte. — Meu
Deus... Como você está?
— Bem. — Apertei os olhos tentando conter minha emoção. — Mas
me diga, como você está? — Soltei-a e notei um pequeno roxo abaixo do
olho sobre a maçã de seu rosto, que nem mesmo a maquiagem que usava
conseguiu esconder. — Penny... — Toquei sua face sentindo meu coração
se apertar. — Quem a machucou?
— Foi o Marcel. — Abaixou seu olhar para suas mãos. — Ele me
deu um soco quando me recusei a ficar com um cliente. — Mordeu o canto
do lábio e olhou-me. Lágrimas empoçavam seus olhos verdes.
— Eu vou tirar você disso, confie em mim. — Apertei seus ombros
com sutileza e ela assentiu.
— Eu confio. A única pessoa no mundo em que confio é em você,
Maya. — Abraçou-me outra vez. — Me conte como andam as coisas. —
Puxou-me pela mão para o sofá.
Respirei fundo olhando para o teto antes de começar a falar.
— Minha mãe faleceu.
— Eu sinto muito. — Segurou firme minhas mãos.
— Ela aguentou firme até onde pôde. No Natal, ela... — Fiz uma
breve pausa respirando fundo mais uma vez e sequei minhas lágrimas que
derramava. — Ela veio para casa e disse que não queria mais voltar ao
hospital. Estava cansada demais.
— Lamento tanto não poder estar com você neste momento. Mas eu
estou aqui agora. Se tudo o que quiser fazer é chorar e devorar um pote de
sorvete de chocolate, a gente faz — disse fazendo-me sorrir em meio ao
choro silencioso. — Como o seu pai está?
— Destruído, mas eu e Victor vamos cuidar dele. Não vou deixar
que caia em um abismo profundo. Já perdi minha mãe, não posso perdê-lo
também.
— Não vai perdê-lo. Tenha fé. — Sorriu e acariciou meus dedos
com seu polegar, passando-o sobre meu anel de noivado e a aliança, que
atraiu seu olhar imediatamente. — Mas o que é isso? — Aumentou seu
sorriso.
— É uma novidade. Victor e eu nos casamos no Havaí. Desculpe
por fazer isso sem você ao meu lado. Mas foi uma decisão rápida que tomei
quando senti que estava perdendo minha mãe mais cedo do que imaginava.
Não fique chateada, por favor.
— Jamais ficaria. A culpa não é sua por eu não poder estar presente.
A estrada pela qual estou caminhando fui eu mesma quem construiu.
Ninguém além de mim é culpada pelo que eu passo.
— Isso vai acabar logo, logo.
Penny desviou seu olhar do meu para o segurança parado na porta,
com quem havia chegado, e depois olhou-me novamente.
— Você não tem noção do quanto quero que isso acabe.
Olhei para o segurança atrás de mim.
— Está rolando alguma coisa?
— Eu ainda não sei. Mas ele é um gostoso!
— Não vou discordar — disse baixinho.
Victor forçou um pigarreio sentado à mesa de jantar. Olhei-o e ele
encarava-me sério, mas com um olhar risonho. Após o jantar, que já havia
pedido antes dela chegar, nós nos sentamos à varanda da suíte para
conversarmos por mais algumas horas. À meia-noite, Penny foi embora
depois de combinarmos que, a cada encontro seu com o segurança, nós nos
falaríamos por telefone ou pelo Skype. Foi difícil vê-la ir e não poder
impedir. Minha vontade era de não deixar que partisse e ajudá-la a fugir,
mas viver assim não era viver. Penny jamais teria paz.
— Aquele segurança que a trouxe é quem você manda toda semana
para ver como ela está? — perguntei aproximando-me do Victor, que estava
de costas para mim se servindo de um drinque.
— Está falando do segurança gostosão? — Virou-se para mim e deu
um gole no conhaque que tinha no copo.
— Dele mesmo. — Ri. Ele havia nos escutado, era óbvio!
— É ele sim. Por quê?
— Acho que está rolando algo entre eles. Ele a encarou o tempo
todo, vai dizer que não notou?
— Eu notei sim. Pelo menos, alguém está tirando proveito do que
estou pagando pelos encontros semanais de uma hora e meia.
Gargalhei, abraçando-o pela cintura.
— Vamos para casa.
Ele negou com um aceno de cabeça.
— Já olhou a vista que tem do quarto desta suíte?
— Não. Você quer me mostrar? — Deslizei meus dedos pela lapela
da sua camisa.
— Com o maior prazer.
Ele colocou o copo sobre a bancada do bar e pegou-me em seu colo.
Lacei sua cintura com minhas pernas e beijei-o. Victor nos levou para o
quarto e fechou a porta com o pé, antes de deitar-me sobre a cama com
cuidado cobrindo-me com seu corpo.
— Me foda com força... — pedi excitada.
Ele se afastou e saiu da cama, começando a se despir lentamente.
Sorri. Victor era o homem mais gostoso e sexy que havia conhecido. Não
tinha como não o amar ou desejá-lo todos os dias. Depois de arrancar do
meu corpo o vestido e calcinha minúscula que usava, ele me fez ter
orgasmos múltiplos gritando por ele. Em minha bunda havia marcas das
suas mãos e em meu ombro o registro de uma mordida sua. Nas suas costas
tinham arranhões e nos seus mamilos, chupões.
Voltamos para o apartamento e depois de um banho juntos e
demorado, adormeci profundo agarrada a ele, acordando somente na manhã
seguinte. Voei com Caleb e Victor até Houston e depois segui para Tulsa.
Eu mal havia pisado meus pés no aeroporto quando Clarice me ligou
pedindo que eu fosse até seu escritório com certa urgência. Preocupei-me.
Elliot me levou até lá e subiu comigo esperando por mim na recepção.
— Clarice. — Sorri ao me aproximar.
— Maya! Que bom ver você, querida. Senti saudade. — Abraçou-
me apertado, quase me sufocando. — Como tem passado? — Soltou-me.
— Bem, na medida do possível. E você?
— Não muito diferente de você. Venha. Vamos para o meu
escritório. Onde está Victor, que não veio?
— Em Houston com Caleb, mas ele vem no fim de semana.
— Sente-se, Maya. Vamos conversar. O que tenho para tratar é
sério.
Sentei sentindo meus membros inferiores esquentar e meu rosto
formigar. Algo em mim pediu-me para me preparar para o que viria a
seguir.
— Finalmente a investigação do hospital foi concluída com a
autópsia da sua mãe.
Coloquei a mão sobre o peito e escorei-me para trás da poltrona.
— Maya... O tratamento que sua mãe estava recebendo não era o
mesmo que os outros voluntários. A polícia encontrou no apartamento do
Dr. Larry Collins e em seu arquivo no hospital, documentos que mostram
que ele estava usando um tratamento clandestino desenvolvido por ele
mesmo para tratar sua mãe. A autópsia comprovou que o vírus usado no
tratamento estagnou o câncer por certo período como ele previa, porém,
causou aumento da glicose no sangue levando-a a ter diabetes alta, que
provocou o infarto que Meredith sofreu.
— Meu Deus... — Lágrimas começaram a escorrer.
— Como você sabe, o Dr. Collins havia sido afastado juntamente
com outras duas enfermeiras, mas agora estão sob custódia da justiça. O
primeiro julgamento está agendado para daqui duas semanas. Acredito eu,
que o juiz irá abrir um julgamento do réu contra o povo.
— Eu quero essas pessoas na cadeia o quanto antes. Eles mataram a
minha mãe aos poucos. Talvez, se ela tivesse recebido o tratamento correto,
ainda estaria aqui e bem. — Um imenso desespero apertava meu peito.
— Eu sei o quanto isso é difícil. Mas preciso que você e Teddy
estejam presentes em todas as audiências. Irei convocar vocês como
testemunhas. Eu sei que posso confiar em você, mas quanto ao seu pai eu
terei que prepará-lo para passar por isso. Teddy é explosivo e tudo o que
menos precisamos é que ele perca a razão de frente ao juiz ou ao júri.
— Você já contou a ele?
— Não. Vou esperar que receba alta do hospital.
— Amanhã ele já estará em casa comigo.
— Certo. Você me avisa quando ele já estiver instalado.
— Tudo bem.
— Agora vá para casa, Maya. Descanse. Confie que eu cuidarei de
tudo.
Saí do escritório completamente abalada. Saber que minha mãe
ainda poderia estar viva era um sentimento desesperador que me corroía por
dentro. Decidi não contar nada ao Victor, ao menos por ora. Sabia que ele
iria querer voltar para Tulsa e não havia a menor possibilidade de ele fazer
isso. Caleb não poderia faltar às aulas e muito menos ficar sozinho em
Houston.
Levei meu pai para casa no dia seguinte e à noite Clarice nos fez
uma visita. Ele se revoltou, jurou o médico de morte e depois chorou como
uma criança abraçado a mim. Minha dor que já era grande tornou-se ainda
maior ao vê-lo naquele estado. Mais calmo, Clarice lhe explicou que não
poderia perder a razão no julgamento e ele pareceu entender.
No fim de semana fui com Elliot buscar Victor e Caleb no
aeroporto. Abracei-o e beijei cheia de saudade. Eu e Deus sabíamos o
quanto estava precisando dele. Ao chegarmos em casa, após o jantar, contei
a ele sobre a investigação e o julgamento que aconteceria na próxima
semana. Primeiro, ele ficou irritado por eu não ter dito nada em nenhuma
das vezes que nos falamos. Depois entendeu meu motivo e percebeu que eu
estava certa.
O dia julgamento chegou. A caminho para o tribunal, paramos na
floricultura e comprei um buquê de girassóis. Somente meu pai e eu
descemos do carro e fomos de mãos dadas até lápide sobre a grama. Lá,
deixamos nosso pesar, lágrimas e os girassóis. Enfrentar o julgamento foi
mais difícil do que pensávamos. Olhar para a cara do maldito médico
maluco que usou minha mãe como seu ratinho de laboratório, foi doloroso e
nos deixou ainda mais revoltados. Para minha sorte, eu tinha Victor. E para
sorte do meu pai, ele tinha a mim. As enfermeiras alegaram não saber que
estavam ministrando um falso tratamento e conseguiram comprovar isso
com imagens de câmeras que mostravam que o Dr. Collins entregava a elas
a medicação pronta, somente para ser aplicada. E assim, foram absolvidas
das acusações. Como previsto por Clarice, o Juiz decidiu abrir o caso,
iniciando o povo contra Larry Collins. Um segundo julgamento aconteceria
em mais algumas semanas.
Os dias passaram como vento. Vinte dias se foram levando com eles
noites maldormidas e a falta de apetite que me habitava. O segundo
julgamento aconteceu. Foi terrível. Levaram três dias para o júri popular
decidir se Larry Collins era um criminoso ou não. Mas enfim... o momento
havia chegado. Uma mulher do júri se levantou com um papel na mão. Meu
coração gelou. Apertei a mão do Victor com tensão.
— O júri decidiu que Larry Collins Junior é culpado pela morte de
Meredith Rose Valentine.
Uma sensação reconfortante encheu-me por dentro. Enfim o culpado
pela perda da mulher mais importante na minha vida pagaria pelo seu ato
impensável e totalmente irresponsável. Larry encarou o advogado nervoso,
que apenas assentiu a ele negativamente. O juiz determinou o confisco do
CRM de Larry e trinta e sete anos de prisão no presidio federal, além do
confisco de todos os bens e uma multa simbólica a pagar no valor de dois
milhões de reais, que foram designados ao meu pai. Foi ordenado também
que o Estado abrisse uma investigação para apurar em quantos mais
pacientes ele aplicou a droga não autorizada e se houve mais alguém
envolvido no crime, incluindo o hospital.
— Dinheiro nenhum paga a minha perda — disse meu pai
entredentes para mim.
— Mas ele irá te ajudar a seguir adiante. Quem sabe, até salvar
vidas de pessoas que passam pelo que a mamãe passou. Pense
positivamente, pai. Você pode fazer o bem com este dinheiro.
Depois do julgamento, fomos todos almoçar no lago Green Pine
onde Victor havia feito reservas. Ao entrar em casa, meu pai disse que se
deitaria um pouco, precisava ficar sozinho e eu o entendia. Ele subiu a
escada e Caleb foi direto para a sala de TV onde ligou o videogame,
colocou os fones de ouvido e se desligou do mundo. Victor puxou-me para
um abraço aconchegante.
— Não sei como eu passaria por tudo isso sem você ao meu lado,
dando-me todo seu apoio.
— Tiraria de letra. Você é a mulher mais forte que já conheci na
vida, Maya.
Afrouxei meus braços que o apertavam e olhei-o.
— Mas você é parte de mim. Sem você, sou incompleta. E uma
pessoa incompleta é incapaz de se sustentar sozinha.
— Eu te amo, Maya!
— Eu também amo você, querido. — Acariciei seu rosto.
— Tenho que lhe contar algo. Mas preciso que seja compreensiva.
— O que houve?
— Eliza se recusa a fazer a terapia há dois dias. Pediu para me ver e
ameaçou não dar mais continuidade às sessões, caso eu não vá até lá.
Honestamente, eu iria ignorá-la, mas Caleb pediu-me que fizesse isso por
ele.
— Não gosto disso nem um pouco e acho que você sabe. Mas não
posso impedir que você vá. Se é a pedido do Caleb, tudo bem. Porém, eu
peço para que não comece a ceder às chantagens dessa mulher ou estará
dando brechas para que ela atrapalhe nossa vida mais uma vez. Ela já o teve
em suas mãos como um refém, Victor. Mas isso acabou! Lembre-se disso.
— Eu só irei até lá para saber o que ela quer. Já deixei claro ao
Caleb que esta será a minha primeira e última visita.
— Eu vou com você.
— Tudo bem. — Deu-me um pequeno sorriso e beijou-me.
CAPÍTULO 14

Acordei sozinha na cama. Chamei por Victor, mas nenhuma resposta


veio. Levantei-me e vesti o roupão de seda para descer e ir à sua procura.
Encontrei-o na cozinha preparando um verdadeiro banquete de café da
manhã.
— Uau! Que marido prendado eu tenho. — Abracei-o por trás e
beijei suas costas.
— Bom dia, querida.
— Onde estão as outras pessoas desta família?
— Caleb ainda não acordou e seu pai saiu cedo. Disse que precisava
agir para a vida.
— Ele disse isso?
— Com essas palavras.
— O que será que ele vai aprontar?
— Eu não sei. Mas já faz quatro meses que sua mãe faleceu. Em
algum momento, ele terá que sair da escuridão e caminhar para a luz no fim
do túnel.
Victor sabia bem do que estava falando. Ele já havia passado
exatamente por aquilo e estava certo. Meu pai precisava seguir adiante e eu
estava feliz por ele estar conseguindo dar o passo mais importante nesta
direção. O primeiro passo.
— Pode chamar o Caleb? Vou terminar de colocar a mesa.
— Claro. — Selei seus lábios e deixei a cozinha.
Bati na porta do quarto do Caleb e ouvi um resmungo vir lá de
dentro.
— Hora do café! Você tem cinco minutos para descer! — gritei do
corredor.
— Tudo bem — respondeu.
Escutei algo bater contra um móvel e ele murmurar um palavrão.
Sorri, pois isso devia ser ele esbarrando em algum móvel no quarto. Voltei
para a cozinha e encontrei Victor com uma mão apoiada sobre a mesa e a
outra esfregando seu peito. Os olhos estavam fechados com força e uma
expressão de dor estampava seu rosto.
— Amor! — Corri até ele. — Sente-se. — Puxei uma cadeira e o
ajudei a se sentar. — Victor... querido... Diga-me o que está sentindo?
Ele escorou-se para trás e respirou fundo.
— É só uma dorzinha no peito. Já está passando.
Eu estava morta de preocupação. Dores no peito não são normais,
ainda mais quando se acontece com frequência, o que era exatamente o que
vinha acontecendo.
— Amor... Olhe para mim! — Abaixei-me à sua esquerda, pegando
suas mãos. Ele abriu os olhos e virou seu rosto em minha direção. — Vou
pedir mais uma vez para irmos ao hospital. Você tem sentido essas
dorzinhas com bastante frequência no último mês. Por favor... Estou muito
preocupada com você.
— Já disse que estou bem, amor. Já passou. — Forçou um sorriso.
— Victor, com saúde a gente não se brinca! — repreendi-o séria.
— Estou bem. Vou pegar o café. — Levantou-se rápido e cambaleou
para o lado, caindo no chão desacordado.
— Victor! — gritei. Corri ao seu encontro e ajoelhei-me ao seu lado.
— Pai? — Caleb o chamou ao entrar na cozinha. — Pai! — gritou
cheio de preocupação e veio até nós, ao vê-lo caído no chão.
— Amor... — Dei leves tapinhas em seu rosto, mas ele não me
respondeu. — Caleb, ligue para a emergência. Rápido!
— Está bem. — Levantou-se e foi até o telefone.
— Victor... Amor, acorda. — Chequei seus sinais vitais e estavam
fracos, isso preocupou-me ainda mais.
A emergência chegou e prestou atendimento. Colocaram Victor na
ambulância e o levaram para o hospital. Noberto apareceu e o acompanhou.
Eu corri para me trocar indo logo atrás com Caleb e Elliot. Durante todo o
caminho, eu pedia a Deus para que não o deixasse morrer e nem para que
fosse algo grave. Meu coração estava pequeno no peito. Eu chorava com
imenso desespero. Por Deus... Eu havia perdido há pouco minha mãe, não
podia perder meu marido também. A gente ainda tinha muito para viver
juntos. Não sei se aguentaria mais esta rasteira da vida.
— Fique calma, Maya. Eu entendo que é difícil, mas você precisa se
acalmar. Ele vai ficar bem. Meu pai é forte. — Caleb segurou minha mão.
— Não posso ficar sem ele. Se eu o perder, Caleb... não sei por onde
ou como recomeçar.
— Vai ficar tudo bem. Acredite! Não vamos perdê-lo.
O carro estacionou logo atrás da ambulância. Desci correndo e
acompanhei a maca para dentro do hospital, Victor ainda estava
desacordado com uma máscara de oxigênio. Levaram-no à sala de
emergência e me impediram de lhe acompanhar. A enfermeira pediu que eu
aguardasse por notícias na sala de espera. Levaram mais quatro horas para
que alguém aparecesse. Eu já estava prestes a arranjar uma confusão na
recepção.
— Senhora White? — o médico chamou por mim.
— Sou eu. — Coloquei-me de pé.
— O Sr. White passa bem. Ele teve um princípio de ataque cardíaco.
— Meu Deus! — Coloquei a mão sobre o peito. — Co-como isso
foi acontecer? Ele é um homem saudável.
— Nem tão saudável assim. Fizemos exames laboratoriais e um
eletrocardiograma. O Sr. White está com o LDL alterado e com uma
obstrução na artéria coronária.
— Ele vai precisar de cirurgia? — perguntei com imensa
preocupação.
— A princípio vamos fazer uma angioplastia, é um procedimento
menos invasivo. Porém, o Sr. White terá que fazer uma mudança radical em
sua vida. Exercícios moderados, uma alimentação regrada e absolutamente
nada de estresse. O coração dele está fraco devido à doença e a idade
também.
— Certo.
— Ele precisa estar ciente de que se não se cuidar e, principalmente,
diminuir o ritmo do trabalho, terá um infarto e talvez não irá resistir.
Um nó se formou em meu peito e na garganta.
— Vamos cuidar dele — disse Caleb aproximando-se de mim.
Ainda absorvia tudo o que me foi dito. Senti uma leve tontura e
sentei-me na cadeira atrás de mim. Muita coisa teria de mudar. A começar
pelo modo que estávamos vivendo nosso casamento, nos vendo somente
aos finais de semana, isso era ridículo! Victor teria que enfim confiar parte
do trabalho as mãos de seus associados. Eu teria que mudar ou ele se
mudaria. Tinha que receber meus cuidados agora.
— Quando será realizada a angioplastia?
— Amanhã, pela manhã.
— Okay. Eu posso vê-lo agora?
— Sim, mas sejam breves.
Entrei no quarto com Caleb e encontrei Victor repousando de olhos
fechados, com um cateter nasal. Aproximamo-nos da cama e eu acariciei
seus cabelos, despertando-o.
— Você nos assustou. — Lágrimas lavavam meu rosto.
— Eu sinto muito — sussurrou.
— Não se esforce para falar.
— Pai... Está sentindo dor? — Caleb tocou sua mão.
— Não. Estou medicado, não sinto nada. Não se preocupe, filho.
— Vai ficar tudo bem. O médico falou comigo e com a Maya. Ele
disse que amanhã cedo você vai fazer um procedimento simples, mas que
irá te ajudar a melhorar.
— Sim, ele esteve aqui há pouco e me explicou. Vai dar tudo certo.
— Sorriu para o filho e apertou sua mão.
— Eu vou estar aqui quando você acordar.
— Tudo bem. Agora, será que pode nos dar um minutinho a sós?
— Claro. — Caleb beijou a mão do pai e saiu.
— Não chore, amor. — Acariciou meu braço.
— Você não tem noção do medo que senti de te perder. Foi horrível
e terrível. Tive um enorme susto quando o médico apareceu e contou que
você teve um princípio de ataque cardíaco.
— Eu vou melhorar.
— Eu sei, porque se você morrer... eu te mato. — Sorri, fazendo-o
sorrir também.
— Não vou deixar você tão cedo.
— Acho bom! — Beijei sua testa. — Querido... temos que nos
resolver. Não podemos mais ficar vivendo essa distância, eu preciso cuidar
de você.
— Vamos resolver isso assim que eu sair deste hospital. Mas agora
preciso que faça algo por mim.
— O que quiser.
— Pare de chorar, vá para casa e leve Caleb com você. Eu ficarei
bem. Durmam e descansem. Voltem amanhã antes que eu vá para o
procedimento.
— Tudo bem.
Curvei-me sobre ele e selei seus lábios com demora, enquanto sua
mão acariciava os cabelos em minha nuca.
— Eu te amo, meu anjo.
— Também amo você.
Deixei o quarto e fomos para casa. Atendi a quase todos os seus
pedidos, menos o de dormir e descansar. A preocupação não deixava. Eu vi
o dia amanhecer sentada em nossa cama. Quando o relógio marcou oito
horas, nós já estávamos no hospital entrando no quarto para vê-lo. Victor já
estava sendo preparado para o procedimento de angioplastia e em minutos
seria levado à sala de cirurgia. O procedimento durou mais de duas horas
até que o médico apareceu com boas notícias avisando-nos de que em breve
poderíamos ir vê-lo, assim que voltasse para o quarto. Fiquei um pouco
mais aliviada, mas não totalmente. Ele ainda estava dentro de um hospital e
se recuperando de um ataque no coração.
Assim que a enfermeira nos avisou que ele já havia retornado da
sala de cirurgia, corri para vê-lo.
— Oi, querido. Como se sente?
— Bem, na medida do possível. E vocês? Como passaram a noite?
— Em claro — respondeu Caleb.
— Olá — cumprimentou o médico ao entrar. — Como se sente,
Victor?
— Ótimo! — Sorriu. — Quando vou para casa?
O médico riu e parou aos pés da cama.
— Vai com calma aí. Você receberá alta em dois dias, mas ainda
deverá ficar de repouso pelas próximas duas semanas. Evitar exercícios
vigorosos e levantamento de peso acima de dez quilos. Lembre-se, este é
um procedimento menos invasivo, mas isso não quer dizer que você já
possa sair daqui assumindo o ritmo normal do seu dia a dia.
— Entendido.
— Alguma outra recomendação? — perguntei.
— Sim. Sexo somente em quatro dias e de modo moderado. Nada
de extravagâncias.
Caleb fez uma careta e Victor gargalhou parando ao sentir uma
pontadinha de dor nos pontos do procedimento.
— Pode parecer engraçado, mas estou falando sério. Qualquer
dúvida ou mal-estar, vocês podem me ligar. Este é meu número pessoal. —
Entregou-me um cartão de visita com um número anotado à caneta no
verso.
— Okay. Pode deixar, eu cuidarei deste homem aqui. — Acariciei
seu rosto e ele apanhou minha mão beijando a palma.

Os dias se passaram rápido. Victor recebeu alta e fomos para casa.


Foi difícil segurá-lo longe do trabalho, mas consegui com a ajuda de
Ferdinando e outros acionistas, que assumiram a presidência de alguns
negócios temporariamente. Recebemos algumas visitas no decorrer da
semana. Meu pai e ele estavam se dando bem cada dia mais. Enfim,
descobriram algo em comum: o black jack.
Victor e eu conversamos e decidimos que nos mudaríamos logo para
Oklahoma. Assim faria meu retorno para a faculdade, ficaria perto do meu
pai e estaríamos entre a minha cidade e a sua. Quando seu repouso passou,
fomos até lá em busca de uma casa que seria nosso novo lar. Visitamos
centenas de casas, mas nenhuma delas se parecia com o nosso cantinho
onde seríamos felizes para todo o sempre.
— Esta já é a quarta casa que vamos visitar hoje, Victor. Estamos
aqui há cinco dias e ainda não achamos nada que nos agrade. Já considerou
trocar de corretora? — perguntei impaciente, a caminho da próxima casa.
— Você quer rever a primeira? Tinha gostado dela.
— Querido... eu gostei de todas. Mas não amei nenhuma.
Victor estacionou o carro em frente à casa e virou-se para mim,
segurando minhas mãos.
— Amor... Mantenha a mente aberta. Talvez, nenhuma casa que
olhemos chegue aos pés da nossa em Tulsa e Houston. Dê uma chance para
aquela mulher desesperada pela comissão. — Olhou para a corretora, que
nos esperava do lado de fora do carro.
— E se eu não gostar dessa?
— Trocaremos de corretor, mas não iremos desistir de encontrar
nosso lar.
— Tudo bem. — Sorri e lhe dei um beijo rápido, antes de descer do
carro.
— Bom... Esta será nossa última casa do dia, eu prometo — falou a
corretora. — Venham, vamos entrar.
Encarei a casa por fora. Ela era linda, assim como todas as últimas
dezenove que olhamos anteriormente. Eu não queria nada que fosse tão
grande como nossa casa em Houston ou em Tulsa. Queria algo espaçoso,
com quartos suficientes para nossa família, uma piscina e um lindo jardim
que eu pudesse plantar girassóis, mas que também fosse uma casa que eu
pudesse cuidar sozinha ou com a ajuda de poucos empregados.
Ela abriu a porta e nós entramos. O hall de entrada era lindo. Na
parede da sala, alguns rabiscos denunciavam que ali moravam crianças.
Havia um sol sorridente, uma árvore cheia de maçãs, duas nuvens e o
desenho da família. Dois pais e duas crianças. Um menino e uma menina.
Eles devem ter achado aquilo precioso o suficiente para não apagarem, pois
a tinta usada para desenhar já estava gasta mostrando que aquela obra de
arte havia sido feita há bastante tempo.
— Como eu disse, a casa precisa de pequenos reparos como uma
boa pintura. — Riu sem graça. — Vamos dar uma olhada lá em cima.
— Claro — respondeu Victor, pegando minha mão para subirmos a
escada.
Lá em cima não havia nada de surpreendente, a não ser pela vista da
suíte principal para piscina em formato de feijão. Descemos e fomos até a
cozinha em conceito aberto para a sala de jantar. Isso eu achei fantástico.
Victor saiu para o jardim com a corretora e eu segui pelo corredor que
levava a sala de TV. No final do mesmo havia uma porta branca. Girei a
maçaneta e entrei. Meu coração disparou indo a mil no peito. As paredes
era todas pintadas de azul-claro e havia belas nuvens brancas pintadas à
mão. No teto, ao centro do quarto, um mobile de estrelas e ursinhos
dependurado. Ao meio havia uma cordinha amarela. Puxei-a e as notas de
uma canção de ninar começaram a tocar. Ali, sem a menor dúvida, era o
quarto de um bebê. Senti a presença do Victor e virei-me para trás.
— Descobriu um novo cômodo? — Caminhou em minha direção.
— Não é lindo? Era o quarto de um bebê.
— Dá para perceber. Vem. Você tem que ver o jardim. É lindo e
você terá um lugar especial para plantar seus girassóis.
— Tudo bem.
Caminhamos até lá e fiquei impressionada com o lugar. Era
realmente lindo. O jardim mais lindo de todos que já havíamos visto até
aquele momento.
— Está vendo ali, à direita? — Abraçou-me por trás. — O lugar
perfeito para os seus girassóis.
— Eu amei!
— Como é? — perguntou surpreso, virando-me para ele. — Eu
acabei de ouvir que você amou?
— Sim. — Ri.
— Não acredito... Encontramos a nossa casa?
— Encontramos. A não ser que você não tenha gostado.
— Eu adorei. Só precisa de alguns reparos, uma nova pintura e o um
novo deck. Aí sim ela estará pronta para morarmos.
— Quantas semanas?
— Três, no máximo.
— Ótimo. Estou ansiosa. Só tenho um pedido.
— Claro. O que deseja?
— Não pinte as paredes do quarto no térreo. Gostei delas assim.
Victor encarou-me sério. Eu havia sentido algo por aquele quarto.
Talvez, eu tenha amado a casa somente por ele fazer parte dela. Eu podia
sentir o quanto de felicidade e amor existiram ali. De repente, um aperto se
formou em meu peito. Será que nunca provaria daquela alegria? Eu queria...
Queria muito provar dessa alegria e do amor incondicional que minha mãe
dizia sentir por mim. Acho que chegava além de ser somente isto. Eu
precisava ter um pedaço do Victor comigo. Nós não seríamos eternos, mas
as minhas lembranças de nós dois juntos e os nossos filhos seriam. Victor
teria de entender que essa necessidade estava nascendo em mim. Mas algo
no meu coração dizia-me que seria uma luta e tanto para enfrentar pela
frente. Porém, eu estava pronta.
CAPÍTULO 15

A volta para o hotel foi feita em absoluto silêncio. Eu estava tensa e


amargurada. Por que ele não quer um filho comigo? Preciso de motivos! Ao
entrarmos na suíte, fui direto para o quarto, precisava de um banho e de um
tempo sozinha. Estava enrolada na toalha com cabelos molhados e sentada
à beirada da cama olhando para o nada, quando Victor entrou vindo até
mim e dando um beijo em meu rosto.
— Ferdinando e Aurora estão na cidade. Vamos jantar com eles.
— Okay. — Levantei-me e segui para o closet.
Victor veio atrás de mim e parou na porta.
— O que tem de errado? Era para você estar feliz, achamos nossa
casa.
— Não tem nada de errado. — Não estava bem para confrontá-lo
naquele momento. Aquela conversa geraria uma discussão e isso era tudo o
que menos precisávamos naquela hora.
— Não minta para mim. Eu conheço você, Maya. Fala o que te
incomoda.
Virei-me para ele.
— Podemos falar sobre isso amanhã. Mas não hoje, está bem?
— Claro.
Ele deixou o closet e foi ao banheiro, enquanto eu me vestia
tentando achar ânimo para a noite com os amigos. Victor apareceu na sala
onde eu o esperava, lindo e bem-vestido em um terno preto de duas peças,
camisa branca e gravata com listras transversais azul-marinho, vermelho e
prata. Ele sorriu e veio até mim. Por que ele tem que ser tão bonito? Esse
sorriso me desarma. Como eu odeio isso!
— Está linda, querida. — Selou meus lábios.
— Obrigada. Vamos? — Sorri ao seu elogio.
— Sim. Vamos!
Ele me estendeu seu braço e saímos juntos do hotel. Elliot esperava
por nós ao lado do carro, em frente à entrada principal. Foi ele quem tinha
viajado conosco, enquanto Noberto havia ficado em Houston de olho em
Caleb, que não quis deixar a mãe em plena crise de ansiedade. Achei justo.
Se fosse a minha mãe a passar por isso, também não sairia do seu lado. Por
isso saí em sua defesa quando Victor insistiu e tentou obrigá-lo a nos
acompanhar.
Ao chegarmos no restaurante, fomos levados até a mesa. Ferdinando
e Aurora se levantaram para nos cumprimentar.
— Senti saudade de você, Maya. — Abraçou-me. — Soube de sua
mãe, eu lamento. — Soltou-me e sorriu com compaixão.
— Obrigada. Uma fase difícil, mas estou superando.
— Então... Agora é Sra. White? — perguntou Ferdinando vindo até
mim.
— Lamento que não puderam ir. — Apertei sua mão.
— Mas nós faremos outra cerimônia em breve — disse Victor
repousando sua mão em minha cintura, apertando-a de leve.
— Maravilha! Posso te ajudar, se precisar — falou Aurora com
empolgação.
— Obrigada.
Nós nos sentamos e Victor logo fez nossos pedidos. Depois de quase
uma garrafa de vinho tinto e muita conversa jogada fora, Ferdinando disse
que havia um propósito para o jantar.
— Então, diga logo de uma vez, homem. Pare de rodeios — disse
Victor sorridente.
Aurora tinha um sorriso imenso no rosto. Seus olhos brilhavam de
ansiedade e as bochechas estavam coradas.
— Aurora e eu...
— Estamos grávidos! — anunciou ela quase aos berros,
interrompendo-o.
Fiquei em estado de choque. Um sentimento conturbador encheu
meu peito. Em minha garganta um nó se formou e em minha cabeça
martelava a seguinte questão: Aurora e Ferdinando têm uma grande
diferença de idade entre eles, assim como eu e Victor. Por que Victor não
quer um filho? Ou não quer um filho comigo?
— Maya... — Aurora tocou minha mão trazendo-me de volta a
realidade. — Não gostou da notícia?
— Eu amei! — Sorri cheia de emoção e felicidade por eles. —
Desejo tudo de bom para vocês e essa criança. Fico verdadeiramente feliz
por vocês.
— Obrigada! Estou tão feliz. Você não imagina minha alegria de
saber que tem uma vida dentro de mim. Isso parece surreal! Quer dizer...
Ah, eu não sei expressar, acho que minha ficha ainda não caiu.
— Eu posso imaginar. — Dei um gole no vinho.
— E vocês? Quando terão um filho? — perguntou Ferdinando.
— Maya e eu não queremos filhos — anunciou Victor, agarrando
minha mão esquerda sobre a mesa.
— Diga isso por você mesmo! — Puxei minha mão e levantei-me
da mesa. — Com licença. — Caminhei rumo ao banheiro.
Entrei e, para minha sorte, não havia ninguém. Encarei meu reflexo
no espelho. Meus olhos estavam marejados e meu peito arfava alto. Estava
nervosa e sentia raiva.
— Maya? — Aurora chamou-me da porta. — O que houve?
— Nada. — Abaixei minha cabeça.
— Não... Eu sei que há algo de errado. Diga-me o quê?
— É cedo demais para desejar um filho? Estou prestes a fazer vinte
e dois anos, tenho meses de casada, sequer terminei minha faculdade... É
normal desejar isso agora?
— Sim. Eu sempre sonhei com a casinha de cerca branca, filhos
correndo pela casa, um balanço na árvore... É normal, Maya. Não é cedo
demais para desejar isso. Você não ter uma faculdade, meses de casada e a
sua idade, não influenciam na mãe que será agora ou futuramente. É só isso
que te aflige?
Neguei com a cabeça.
— Por que ele não quer filhos comigo? O que tenho de errado?
— Nada. Não há nada de errado com você! Talvez ele não queira
agora, mas mudará de ideia. Ferdinando se achava velho demais para ser
pai novamente, mas depois de tanta discussão e insistência, ele atendeu ao
meu pedido entendendo que nunca é velho demais para amar ou ser amado,
seja por uma mulher ou uma criança. Olha só para ele agora... Está todo
feliz. — Colocou a mão sobre o ventre ainda reto. — Victor pode mudar de
ideia. Mas você terá que ser chata, às vezes, e persistir sempre!
— Acha que consigo dobrá-lo?
— Acho sim. — Sorriu abrindo os braços. — Vem aqui. —
Abraçou-me.
— Obrigada, Aurora.
— Que isso, Maya. Amigas são para isso. — Soltou-me.
Voltamos para a mesa e a sobremesa já havia sido servida. Depois
que comemos, voltamos para casa. Victor e eu não trocamos uma palavra
sequer no caminho todo. O clima estava pesado e tenso entre nós. Entramos
na suíte e ele seguiu direto até o bar servindo-se de uma dose dupla de
conhaque.
— Você não vem dormir agora? — perguntei parada no meio da
sala.
— O que foi aquilo na mesa? — questionou em um supetão,
virando-se para mim.
— Quer mesmo saber o que foi aquilo? Estou puta da vida com
você. Como pode dizer aquilo?
— Sobre ter filhos? Mas é a verdade, Maya!
— Não! É o seu desejo e não o meu. Victor... Eu quero ter filhos.
Qual o problema de querer isso comigo?
— Tenho sessenta anos, Maya! — gritou. — É difícil entender que
não tenho mais idade para ser pai novamente?
— Tem idade para namorar uma mulher de vinte e um anos, transar
todos os dias, dominá-la, mas não tem idade para ser pai de um filho que
terá comigo? A mulher que você diz todos os dias amar? Que amor é esse
que você não quer que gere frutos, Victor? — questionei-o exaltada.
Ele encarou-me sério e tomou um gole do seu drinque.
— Talvez esse assunto deveria ter sido pautado antes de nos
casarmos.
Aquilo quebrou meu coração. Meus olhos se encheram de lágrimas
e meu peito se apertou. Quer dizer que, se ele soubesse desse meu desejo
antes de nos casarmos, nossa união não teria acontecido?
— Divórcio existe para isso! — Dei-lhe as costas e segui para o
quarto, batendo a porta.
Sentei-me aos pés da cama para tirar os sapatos quando ele entrou.
— Desculpe, Maya... Falei sem pensar.
— Não peça desculpa. Você não está arrependido pelo que disse e
muito menos falou sem pensar. Só está com medo de que eu o deixe. Então,
não peça desculpa! — disse rude.
— Não quero magoá-la.
— Tarde demais. — Fui ao banheiro e ele me seguiu.
— Amor... Olhe para mim. — Aproximou-se tocando meu rosto,
fazendo-me olhá-lo. — Entenda... Só me entenda. Não tenho mais esse
desejo.
Brigas ultimamente me desgastavam mais que o normal de uma
discussão entre um casal. Então, decidi que, por ora, o deixaria acreditar
que me venceu.
— Okay.
Tirei sua mão do meu rosto e comecei a escovar meus dentes.

No dia seguinte, voltamos para Tulsa. Reuni toda minha família para
um almoço em nossa casa e contei a eles que estávamos de mudança para
Oklahoma. Meu pai pareceu não gostar tanto, mas nada disse. Minha avó
resmungou, disse que sentiria muita saudade minha. Tia Jenna nos desejou
felicidade e boa sorte na nova empreitada. Clarice e Sam fizeram um brinde
à nova fase das nossas vidas e disseram que iriam nos visitar sempre que
possível.
— Talvez você devesse vir com a gente, pai. Comprar uma casa por
lá. Victor e eu vimos casas ótimas em lugares lindos. Você iria gostar.
— Não, já perturbei vocês por muito tempo. Precisam viver a vida
de vocês.
— Não vamos nos desfazer desta casa. Pode ficar aqui por quanto
tempo quiser — disse Victor.
— Eu agradeço, mas está na hora de achar meu canto. Agora, com o
novo emprego, arranjarei um lugar para mim.
— Ainda não pensou no que fazer com o dinheiro? — perguntou
Sam.
Meu pai negou com a cabeça.
— Maya e eu andamos falando sobre isso. Enquanto não decide o
que fazer, se quiser, pode investi-lo com segurança. Assim, até que saiba
qual destino dar a ele, o dinheiro estará rendendo uma boa porcentagem.
— Pense nisso, pai. É uma coisa boa.
— Vou pensar.
O restante do dia transcorreu bem. Victor e eu estávamos bem na
medida do possível. Havíamos superado a discussão no hotel. E assim se
passaram alguns dias. Duas semanas para ser mais exata. A rotina era a
mesma. Meu pai saía cedo para o trabalho e eu ficava só cuidando das
coisas de casa e me dedicando à carta de aceitação para a universidade de
Oklahoma. Victor sempre vinha aos fins de semana trazendo Caleb consigo.
Minha avó lamuriava todos os dias sobre eu ir embora. Por fim, a
convidamos para morar conosco e ela aceitou, já que o relacionamento com
Will não ia lá muito bem.
Estava deitada em minha cama lendo uma revista, quando o celular
tocou. Era Victor quem ligava.
— Oi, amor.
— Oi, querida. Sentindo minha falta?
— Sempre. Como estão as coisas por aí?
— Não muito bem. Tivemos imprevistos e só chegarei amanhã pela
noite.
— Mas o encontro com a arquiteta e a decoradora é amanhã de
manhã.
— Eu sei, querida. Mas, infelizmente, não poderei comparecer.
Pode ir até lá amanhã? Convide seu pai para ir com você. Elliot os levará.
— Tudo bem. Vou falar com ele.
— Ótimo. Te ligo pela manhã. Tenho um jantar de negócios agora.
— Você está começando a exagerar no trabalho novamente.
Lembre-se do que o médico lhe disse, querido.
— Eu prometo que será somente até eu fechar esse novo contrato.
— Okay. Boa noite, amor.
— Boa noite, meu anjo.
Desliguei o telefone e fui até o quarto do meu pai, convidando-o
para ir comigo até Oklahoma na manhã seguinte e ele aceitou. Embarcamos
para lá às sete horas. O caminho foi rápido, graças à estrada boa.
— É sábado. Por que Victor não está com você?
— Ele teve imprevistos no trabalho, não pôde vir ontem à noite.
— Entendi. Não acha que ele está se esforçando demais para quem
teve um infarto há menos de dois meses?
— Acho sim. Mas vai dizer isso para ele.
— Homem teimoso.
— E como é.
O carro estacionou em frente à casa e a arquiteta já nos esperava na
calçada.
— Oi, Janet. Como vai? — Estendi minha mão para cumprimentá-
la.
— Bem, obrigada. E você?
— Ótima. Este é meu pai, Theodoro.
Eles se cumprimentaram e depois ela nos convidou para entrar na
casa.
— A equipe da limpeza deve estar chegando a qualquer minuto.
Venha, eu quero lhe mostrar como ficou a reforma no deck.
Acompanhamo-la até a parte dos fundos.
— Uau! Esse lugar é fantástico. Sua mãe teria adorado. É bem
arborizado.
— Sinto paz nesse lugar. Ainda há trezentos metros de área verde
depois da cerca viva. Está vendo aquele canteiro ali? — Apontei à direita.
— Vou plantar girassóis nele. — Olhei-o e ele sorriu com carinho para
mim.
— Então... O que acharam da reforma no deck? — perguntou Janet.
— Ficou maravilhoso. Gostei da madeira mais clara.
— Que bom. Fico contente. Venham. Vamos olhar dentro da casa.
— Entramos. — Troquei toda a bancada da cozinha por mármore branco.
Os elétricos da torre quente serão todos cromados. Charlotte está cuidando
disse hoje, por isso ela não pôde vir. Agora quero mostrar a vocês o quarto
de hóspedes aqui em baixo. — Caminhou à nossa frente em direção ao
corredor.
— Quarto de hóspedes aqui em baixo? — perguntei confusa. Aquele
seria o único cômodo a não ser reformado.
Ela andou até a última porta no corredor e abriu-a.
— Entrem.
Entrei e fiquei em pleno estado de choque. Três das quatro paredes
estavam pintadas de marfim e a outra de camurça.
— Por que pintaram o quarto? — perguntei quase em um surto.
— Estava no projeto do Sr. White. Transformar este cômodo em um
quarto de hóspedes térreo. Abrimos portas francesas para o jardim.
Eu queria matar o Victor. Não opinei sobre nada na reforma da casa.
A única coisa que pedi foi para que não mexesse no bendito cômodo, onde
antes era um quarto de bebê.
— Você está bem, querida? — perguntou meu pai com preocupação.
— Está pálida.
— Acho melhor ela se sentar um pouco.
Janet retirou o plástico de cima de uma poltrona e eu me sentei.
Estava mesmo abalada. Ver aquelas paredes pintadas de outra cor atingiu-
me como uma flecha.
— Tenho água em um cooler no carro. Vou pegar para você. — Ela
deixou o quarto.
— O que sente, querida? — perguntou meu pai se abaixando à
minha frente.
— Me sinto apunhalada pelas costas. Não pintar este quarto foi a
única coisa que pedi. A única!
— O que tinha este quarto?
— As paredes eram pintadas como o céu e eu gostava delas. —
Comecei a chorar.
— Ah... Eu entendi. Filhos. Já falaram sobre isso?
— Ele não quer.
— Ele irá mudar de ideia. Seja firme nesse propósito. Quando ama
uma mulher, um homem quer filhos com ela.
— Obrigada, pai. — Abracei-o. — Será que podemos ir para o
hotel?
— Claro.
Depois de remarcar nosso encontro com a arquiteta, fomos para o
hotel. Acompanhei meu pai até seu quarto e depois segui para a minha
suíte. Após um banho, fui para o closet me vestir quando escutei a porta do
quarto ser fechada. Pelo reflexo do espelho vi quando Victor entrou no
closet com um largo sorriso.
— Oi, meu anjo. — Aproximou e beijou minha testa. — Como foi o
tour pela nossa casa hoje?
— Remarquei.
— E por quê?
— Imagine a surpresa desagradável que tive hoje quando entrei no
quarto do térreo e vi as paredes pintadas de camurça e marfim.
Suspirou frustrado, esfregando os dedos com exaustão nos olhos.
— De novo esse assunto não, Maya. Achei que já tivéssemos nos
entendido a respeito disso.
— Foi a única coisa que pedi para você não mexer, Victor! — disse
nervosa.
— Por que teríamos um quarto de bebê, quando um bebê é algo que
não teremos? — gritou. — Pare de insistir com isso. Que droga de assunto
chato! — Deixou o closet e bateu a porta do quarto.
Não sei para onde ele foi. Só sei que não atendeu as minhas ligações
ou sequer deu sinal de vida naquela noite. Passei o dia com meu pai
caminhando pela cidade e quase o convencendo de se mudar para lá. No
domingo, estávamos sentados para o café dá manhã no restaurante do hotel,
quando Victor apareceu de cabelos molhados e sentou-se à mesa nos
desejando um bom-dia.
— Depois de pensar muito ontem à noite, decidi que me mudarei
para Oklahoma. Você me convenceu, querida. — Meu pai sorriu para mim e
meu coração se encheu de alegria.
— Fico feliz, pai. Vou amar tê-lo por perto. — Segurei sua mão
sobre a mesa. — Já sabe onde quer a casa?
— Ainda não, quero fazer uma busca por bairros na internet.
Victor... também resolvi que irei aceitar sua ajuda para investir o dinheiro.
Estava orgulhosa do meu pai. Ele parecia finalmente estar se
libertando do luto.
— Ótimo. Vou entrar em contato com a Clarice esta semana para a
negociação de um contrato.
— Certo. Obrigado.
— E quanto ao seu emprego em Tulsa? Pretende deixá-lo ou pedir
uma transferência para a concessionária daqui?
— Vou tentar uma transferência. Se não conseguir, eu arranjo outra
coisa por aqui.
— Estou gostando de ver, pai.
— É, eu também. — Victor respirou fundo. — Bom... preciso voar
para Seattle. É uma emergência, mas volto na terça. Pode me acompanhar
até a suíte, querida?
Coloquei o guardanapo que estava em meu colo sobre a mesa e
levantei-me. Acompanhei-o, pois precisávamos ter uma conversinha antes
dele viajar em pleno domingo a trabalho. O elevador estava vazio e, quando
as portas se fecharam, encarei-o.
— Onde passou a noite?
— Em outro quarto.
— Por que não me atendeu quando liguei? Sabe o quanto fiquei
preocupada com você?
— Não queria que discutíssemos mais, por isso desliguei o celular.
Você poderia parar de insistir com isso sobre bebês. Estou ficando
estressado com esse assunto. Chega, Maya!
Ele não olhou em meus olhos uma vez sequer, enquanto cravava
uma adaga no meu peito. As portas se abriram e ele saiu. Apertei o botão do
térreo e as portas se fecharam, antes mesmo que ele pudesse dar falta de
mim seguindo-o pelo corredor como um cachorrinho. Meu casamento mal
havia começado e tudo estava desmoronando. Talvez não devêssemos ter
sido tão intensos e ligeiros demais com nosso relacionamento. Ou... talvez
não devesse existir um relacionamento. Achei que ele queria o mundo
comigo, mas me enganei.
CAPÍTULO 16

Depois que Victor seguiu para Seattle, meu pai e eu voltamos para
Tulsa. Os dias se passaram e Victor não voltou para casa, ele estava em
Houston com Caleb. Nós nos falávamos pouco. A relação entre nós estava
horrível. Frios um com o outro e isso estava acabando comigo. A separação
não parava de ser cogitada em minha cabeça. A cada dia que passava, mais
razão eu dava às implicâncias passadas do meu pai. Quem sabe, ele
estivesse certo sobre os problemas de se namorar um homem muito mais
velho. Estava vivendo uma batalha constante entre o amor e a razão. O
amor gritava por socorro dizendo não conseguir viver sem ele. A razão
dizia que, se eu quisesse uma família completa, teria que deixá-lo ir.
Entrei em seu escritório e sentei-me em sua cadeira. Sobre a mesa,
um porta-retratos com uma das milhares de fotos que tiramos no dia do
nosso casamento. Nela estava eu em uma ponta, Victor ao meio e Caleb do
outro lado. Nós sorríamos juntos para a câmera. Ele estava abraçando-me
pela cintura e o filho pelo ombro. Onde estava aquele homem? Esse que
sorria com amor e era tão parceiro? Eu tinha fé de que em algum lugar eu
o encontraria e o traria de volta. Porque foi com este homem com quem me
casei e por quem me apaixonei tão perdidamente, e não com o cara babaca
com quem troco poucas palavras há dias.
— Chega... Está mais do que na hora de eu lutar pelo meu
casamento e por minha família!
Peguei o telefone sobre a mesa e liguei para ele.
— Oi, amor.
Derreti-me inteira. Ele não me tratava por amor há dias. Lágrimas
empoçaram meus olhos e meu coração disparou ansioso.
— Eu não quero mais essa distância. Sinto sua falta, Victor.
— Também sinto sua falta, querida — disse surgindo na porta do
escritório.
Sorri soluçando em meio ao choro que se iniciava.
— Perdoe-me, amor. Fui um estúpido. — Abriu seus braços para
mim.
Devolvi o telefone ao gancho e levantei rápido, caminhando
apressada até ele. Abracei-o apertado escondendo meu rosto em seu peito,
sentindo seus braços me aconchegarem a ele.
— Estou aqui, meu anjo.
Ergui minha cabeça e encarei-o. Seus olhos estavam marejados.
— Eu te amo. Nós precisamos nos acertar.
— Também te amo, minha garota. E concordo com você... Temos
que nos acertar.
— Eu estava à beira de pedir o divórcio... — Ele ficou sério,
desfazendo o olhar carinhoso que me dava. — Mas aí eu vi a nossa foto
sobre sua mesa e me lembrei de que já somos uma família. E tudo bem,
amor... entendo que não queira filhos, eu entendo de verdade, mas, por
favor... por favor, me compreenda também. Sei que nunca conversamos
sobre isso, mas achei que talvez quisesse isso comigo. Por isso nunca
perguntei. Eu quero o mundo com você e quero que queira isso comigo
também. — Mais lágrimas lavavam meu rosto. — Não tem que ser agora.
Mas pense sobre isso. Amadureça essa ideia em sua cabeça. É só o que eu
peço a você.
— Então não vai me deixar?
— Não! Claro que não. Porque eu sei que o babaca que foi comigo
no último mês é só sua camada de defesa.
— Desculpe-me por ter sido um idiota.
— Desculpo sim. Mas se me tratar assim de novo, farei você se
arrepender.
— Entendido! — Sorriu e abraçou-me. — Como senti saudade do
seu cheiro...
— Também senti saudade do seu. — Olhei-o. — Quando vamos nos
mudar?
— Em duas semanas.
— Ferdinando já chegou da viagem?
— Sim.
— Isso significa que você irá ficar mais em casa?
— Prometo tentar.
— Tenho medo de que a única coisa que vá fazê-lo parar seja a
morte.
— Este é o destino de todos nós, querida. Não me peça para me
aposentar. Não consigo ficar longe do trabalho, amo o que faço. Temo que
se eu deixar meu império nas mãos de outros, tudo desmorone. Não se deve
confiar em todos os homens.
— Eu sei. Mas tente ficar mais comigo e com o Caleb. Passa mais
tempo trabalhando do que ao meu lado na cama.
— Desculpe, querida. — Selou meus lábios.
— Por que não vem tomar banho comigo? — Sorri com malícia.
— Acho que não estava com saudade só de mim.
— Seu pau faz parte de você, querido. Já lhe disse isso. Não há
como sentir saudade de um e não sentir do outro.
Ele riu.
— Então venha. — Pegou minha mão. — Vamos subir.
Entramos no quarto e ele trancou a porta. Na porta do closet estava
sua mala do chão.
— Trouxe um presente para você, amor.
Caminhou até ela e abaixou-se pegando uma caixa branca, envolta
com fita rosa e um belo laço em cima da tampa.
— Meu aniversário é somente daqui dois dias.
— Eu sei bem disso. — Aproximou-se e estendeu-me a caixa.
Peguei-a e desfiz o laço. Retirei sua tampa e dentro havia uma
calcinha com detalhes em renda preta. Curiosa, peguei-a e embaixo da
mesma havia um pequeno controle remoto.
— Isto é... uma calcinha vibratória? — Olhei-o incrédula. Não
acredito que eu ainda me surpreendia com seus presentes.
— Muito bem observado. — Riu.
— Onde quer que eu use isso?
— Na sua festa de vinte e dois anos.
— Não quero festa, Victor. Esse será meu primeiro aniversário sem
minha mãe.
— Amor... Você quer sim. Sua avó e Jenna são quem estão
organizando. Elas devem ligar para você amanhã. Será bom reunir os
amigos e a família em uma celebração para variar.
— Certo. Você já me convenceu.
— Já? Dessa vez foi rápido. — Segurou minha cintura e beijou
meus lábios. — Por que você não vai preparar um banho para nós. Te
encontro em alguns minutos no banheiro.
— Tudo bem. — Coloquei a caixa sobre a cama e fui ao banheiro.
Liguei a torneira para encher a banheira e comecei a me despir.
Prendi os cabelos em um coque alto e debrucei-me sobre a banheira
apoiando uma mão na sua beirada. Com a outra joguei sais de banho na
água morna e algumas pétalas brancas secas e perfumadas pela superfície.
— Uau! Que visão mais bela. Nunca vi bunda mais linda. —
Apertou-a.
— Que bom que gosta do que vê.
— Eu não gosto. Eu adoro. — Laçou minha cintura por trás e beijou
meu pescoço fazendo-me arrepiar.
Recostei-me nele e deitei a cabeça em seu peito nu. Sua mão
esquerda apalpou meu seio apertando-o de leve e a outra escorregou
lentamente por minha barriga, deixando-me ansiosa por seu toque. Meu
clitóris deu seu primeiro sinal de vida pulsando forte. Seu dedo o tocou com
cuidado e leveza, começando uma massagem gostosa. Fechei os olhos e
sorri excitada. Suas mãos em mim foram tudo o que desejei na última
semana. Havia muito tesão acumulado em mim. Mordi o lábio inferior e
gemi contido.
— Tire minha calça! — sussurrou em meu ouvido.
Abri meus olhos e afastei-me dele. Virei-me de frente para ele e
desfiz o botão de sua calça, encarando-o nos olhos. Ajoelhei-me à sua
frente e puxei-a para baixo junto à cueca, libertando seu membro semiereto.
Passei as peças de roupa por seus pés e coloquei-as do lado no chão. Victor
sorriu minimamente e afagou meus cabelos.
— Você é uma boa menina, sabia?
— Mesmo com nossas discussões?
— São elas que nos deixa mais fortes, querida. Tudo bem não
concordarmos o tempo todo.
Concordava com ele até certo ponto. A vida é assim, nem todo
mundo pensa como você ou tem os mesmos propósitos de futuro. No
entanto, por mais que eu tenha erguido bandeira branca – por ora –, isso não
significava que eu houvesse desistido de ter um filho com ele.
Os dias que se passaram sem ele comigo, eu pensei muito sobre o
assunto. Eu teria um bebê com a ajuda do Victor, ou não. Mas isso era
planos futuros. No momento eu precisava escolher. Ou continuava com
minha guerra cravada contra ele ou salvava meu casamento que estava à
beira de um abismo. Por mais que eu tenha cogitado o divórcio, perdê-lo me
pareceu doloroso e insuportável. Então dividi meu problema em dois
passos. O primeiro era reaver nosso relacionamento, que ia de mal a pior. O
segundo, mostrar que teria um filho e que não precisava da sua permissão.
E se neste caso ele desejar ir embora, eu não o impedirei de partir. Afinal, a
vida é livre, feita de escolhas e prioridades.
Toquei suas coxas e deslizei minhas mãos até seu quadril. Victor
estendeu-me as suas mãos para me ajudar a levantar. Ele entrou na banheira
primeiro e eu fui logo depois sentando-me em seu colo, de frente para ele.
— Nada de exageros. Lembra-se do que o médico disse, não é?
Ele riu.
— Lembro sim.
Apoiou uma mão nas minhas costas e outra em minha nuca,
puxando-me para um beijo longo e calmo, que me tirou o fôlego. Separei
nossos lábios em busca de ar e sua boca desceu por meu pescoço passando
pela clavícula até meu seio esquerdo, abocanhando-o com fome. Victor
sugou um depois o outro me arrancando gemidos altos.
— Preciso sentir você em mim — pedi manhosa.
Ele se recostou na banheira e sorriu cheio de malícia.
— Seu pedido é uma ordem, Sra. White.
Sorri. Amava quando me chamava assim. Sentia-me tão sua, tão
parte dele e de sua vida...
— Erga-se um pouco.
Ergui-me e sentei novamente preenchendo meu ventre com seu
membro rígido. Gememos juntos em plena sintonia. Comecei a cavalgar em
seu colo jogando água para fora da banheira, apoiando minhas mãos em seu
ombro, enquanto as suas apertavam minha cintura com força.
— Maya... — chamou-me entre gemidos, com os olhos fechados.
Desacelerei o ritmo preocupando-me.
— Você está bem?
— Não pare... — Agarrou minha nuca outra vez e puxou-me para
outro beijo. — Por que é tão gostosa? — perguntou em meus lábios.
— Aproveita. Sou toda sua. — Sorri sentindo o orgasmo se
aproximar.
Agarrei seus cabelos e, olho no olho, gozei assistindo-o explodir em
um orgasmo de contrair toda a musculatura. E era assim que seguia nossas
noites e manhãs de sexo. Sem muito exagero ou proezas. Victor ainda
estava se recuperando de um ataque cardíaco sofrido há pouco mais de um
mês. Tudo ainda era muito recente para mim e eu precisava zelar por ele. Se
dependesse do Victor, estaríamos em meio a uma boa cena de Bondage. Eu
sentia falta do domínio, não vou negar. Mas ele sempre achava outro jeito
de satisfazer esse meu lado sem necessariamente estarmos na cama. E
preciso assumir... submeter-me ao psicológico era muito mais gostoso do
que o ato físico.

Meu aniversário chegou e eu não estava empolgada como todos os


anos. A única coisa que conseguia pensar era na minha mãe e nos meus
dezesseis anos. Não tive um baile ou fui a Disney como a maioria das
meninas em minha escola. Comemoramos em casa com churrasco e um
bolo feito pela minha mãe. Não havia muita gente, além de mim e meus
pais, estavam presentes minha avó, tia Jenna, Clarice, Sam, Grace e mais
duas amigas da escola. Não tinha decoração ou uma roupa especial para a
ocasião, mas aquele foi o melhor aniversário de todos.
— Pensando em quê?
— Nos meus dezesseis anos. Parece que faz tanto tempo, mas só
tem seis anos.
— O que fez de especial neste dia?
— Nada de mais. Comemorei em casa com a família e amigos. Mas
aquela festa foi a melhor de todas. — Sorri com a lembrança.
— O que faz uma data ou comemoração especial não é o lugar ou
quão caro custou o buffet, mas sim as pessoas presentes. Aposto que esse
dia foi como nosso casamento.
— Sim. Somente o essencial. — Abracei-o passando meus braços
em volta de sua cintura.
— Por que não vai se vestir e colocar a peça de renda preta que lhe
dei?
— Tenha juízo, Victor. Use o controle remoto com sabedoria e
lembre-se... estaremos em frente à minha família e amigos. Não me faça
gemer ou ficar vermelha na frente deles.
— Jamais faria isso. — Sorriu com cinismo, fazendo-me rir da sua
expressão.
— Certo. Vou me arrumar. Você devia fazer o mesmo. — Selei seus
lábios e passei por ele deixando a varanda e entrando no quarto.
— Já vou indo.
Vesti a pequena peça e depois o vestido que eu havia comprado para
a ocasião. A festa aconteceria no jardim dos fundos da casa de Clarice e eu
estava ansiosa, não sabia de nada que estava acontecendo, minha avó fez
mistério até o último minuto e me fez prometer que compareceria.
— Uma linda mulher — disse Victor ao entrar no closet e me
observar passando o batom.
— Obrigada. — Sorri encantada. — Agora se vista, lhe espero na
sala. Vou apressar o Caleb, senão iremos nos atrasar.
— Tudo bem. Mas antes quero lhe dar seu presente de aniversário.
— Caminhou até o cofre e digitou sua senha, retirando de lá uma caixinha
quadrada de couro preto. — É uma peça única, assim como você. Mandei
que fizessem. — Parou diante de mim e abriu-a.
— Nossa... É lindo! — Peguei o colar que repousava dentro dela:
uma fina corrente retorcida de ouro rosé com um pingente de coração
cravejado de diamantes translúcidos.
— Olhe atrás.
Virei o coração e atrás tinha nossos nomes e uma data especial.

Victor
&
Maya

Jun/01/2017

— Eu iria lhe dar somente daqui duas semanas, mas não consegui
conter minha ansiedade.
— Esta data é...
— A noite em que nos conhecemos. Talvez aquele dia para você não
tenha sido seu melhor dia, mas para mim foi.
— E por quê? — Encarei-o.
— Porque foi a noite em que nossos caminhos se cruzaram. A noite
em que conheci o centro do meu mundo. Eu te amei desde aquela fatídica
noite, querida. No instante que coloquei meus olhos em você, soube que
seria a mulher que me faria amar novamente e devolveria cor para a minha
vida.
Eu estava cheia de emoção. E naquele instante, aquela noite
marcada até então pelo mais puro desapontamento, começou a ser a mais
bela de todas. Há males que vem para o bem, não é? Victor era o meu bem.
— Eu também te amo, querido — declarei-me com os olhos
marejados.
Aproximei-me e beijei seus lábios com ternura e carinho. Nosso
beijo se findou e colamos nossas testas de olhos fechados em silêncio por
alguns segundos.
— Coloque-o em mim. Usarei esta noite.
— Claro, querida.
Separamo-nos e lhe entreguei o colar, virando-me de costas para ele.
Ergui meu cabelo e Victor o colocou em meu pescoço. Ele pegou os cabelos
das minhas mãos e os ajeitou em minhas costas.
— Vá chamar o Caleb. Eu me arrumo em um instante.
— Okay.
Deixei o quarto e caminhei até a porta entreaberta mais adiante. Bati
contra a madeira e o escutei gritar que eu podia entrar.
— Oi. Onde você está?
— No closet.
Andei até lá e parei no batente.
— Uau! Como está bonito.
Ele vestia calça jeans escura e camisa xadrez azul-marinho e branco,
posta fora da calça. Nos pés, tênis preto. Os cabelos como sempre meio
bagunçados, mas eu gostava. Achava aquilo um charme adolescente.
— Você também está muito bonita. Gostei do vestido.
— Obrigada. Comprei especialmente para hoje.
Passei as mãos pelo vestido.
— Meu pai já está pronto?
— Não. Ele ainda está se vestindo.
— Certo. Vamos esperá-lo lá embaixo?
— Claro.
Descemos e logo Victor apareceu. Assim que o carro parou em
frente à casa da Clarice, a porta da frente se abriu e minha avó surgiu com
um largo sorriso. Descemos e fomos de encontro a ela.
— Vovó... — Abracei-a apertado.
— Minha menina. Estão todos aguardando por você. Venham.
Entrem.
Entramos e ela fechou a porta, nos guiando em seguida até os
fundos da casa. Ao entrar no jardim, que dava para uma cascata de água
mineral e uma piscina redonda, vi pessoas importantes da minha vida ali.
— Feliz aniversário! — gritaram todos em uníssono.
— Ai, meu Deus! — Olhei para a minha avó boquiaberta. —
Como... — interrompi-me.
— Não olhe para mim. Eu planejei a festa, mas foi Victor quem
trouxe cada um dos seus amigos até aqui esta noite.
Estavam todos os meus amigos presentes, incluindo Penny, Grace e,
não menos importante, os de Chicago.
— Feliz aniversário, filha. — Meu pai abraçou-me.
— Obrigada, papai.
— Sua mãe não está aqui em corpo, mas acredite... o espírito dela
está sempre conosco. Eu posso sentir. Estou aqui representando ambos.
— Eu sei — disse contendo minha emoção.
Ele soltou-me. Eu também podia sentir minha mãe o tempo todo.
Pode parecer loucura, eu entendo. Mas era a pura verdade.
— Divirta-se, querida — desejou ele antes de se afastar.
Finalmente pude apresentar meus amigos de Chicago para Penny. A
festa estava linda. Luzes para todo lado e velas flutuando sobre as águas da
piscina. Eu nunca me diverti e me senti tão acolhida como naquela noite.
Infelizmente o tempo da Penny era como o da Cinderela. Quando o relógio
marcou meia-noite, ela se despediu com pesar e se foi voltando para Dallas.
Antes que partisse, Victor lhe prometeu que esse tormento estava prestes a
acabar. Era triste vê-la ir.
A festa durou até três da manhã. Foi inesquecível.

O verão se foi e aqueles foram os meses mais intensos da minha


vida. Muita coisa havia acontecido. Eu havia conseguido retomar a
faculdade, me mudado para Houston com minha família e conseguido um
estágio no maior e melhor hospital escola da cidade, graças a um professor
que muito estava me ajudando. Victor passava mais tempo em casa, havia
desacelerado seu ritmo de trabalho e diminuído a frequência com a qual
viajava. Nosso relacionamento não podia estar melhor. Estávamos felizes e
vivendo com nossa família em nossa casa dos sonhos.
— Você vem almoçar em casa, querida? — perguntou minha avó
enquanto passava o café.
— Não. Vou aproveitar meu horário de almoço para ir ao
ginecologista. Já faz um tempinho que estou adiando esta consulta.
— Com quem vai se consultar?
— Eu não a conheço. Ela é uma velha amiga do Victor, foi ele
mesmo quem marcou para mim.
— Ele é muito atencioso. Café?
— Sim, obrigada.
Ela encheu um copo e tampou entregando-me.
— Já vou indo. Nos vemos no jantar. — Beijei seu rosto.
— Se for atrasar, avise.
— Pode deixar, prometo avisar. E não deixe o Caleb faltar à aula,
por favor. É o último ano dele, não quero que tenha problemas na escola ou
com as notas.
— Deixe comigo. Boa aula e bom trabalho.
— Obrigada! — gritei chegando ao pequeno hall. Peguei meu
casaco sobre o sofá, minha bolsa e a chave do carro, quando Victor
apareceu à minha frente e a arrancou da minha mão.
— Qual é, amor...
— Já conversamos sobre você sair sozinha.
— Que adianta eu ter um carro se não posso dirigir?
— Maya... Higor foi visto faz menos de duas semanas em Tulsa, ele
poderia estar procurando por você. Amor... sei que quer ser independente,
eu adoro ver isso, mas a sua segurança em primeiro lugar. Elliot irá levá-la
para onde precisar ir. Tudo bem?
Eu entendia sua preocupação e não tirava sua razão, mas eu queria
minha liberdade.
— Fazer o quê, não é?! — disse frustrada.
— Te vejo mais tarde. — Selou meus lábios. — Tem certeza de que
não quer que eu vá na consulta com você?
— Tenho sim. — Passei por ele e deixei a casa.
Elliot me levou até a faculdade, e assim que entrei no campus, logo
avistei Débora, uma nova amiga.
— Oi.
— Maya... Oi. Pronta para apresentar o seminário?
— Não sei se pronta é a palavra certa, mas vamos lá.
Ela riu.
A caminho para o auditório cruzei com o professor o qual estava me
ajudado.
— Bom dia, meninas — desejou ele.
— Bom dia, Sr. Malone — retribuímos em uníssono.
Richard Malone era um homem alto, de meia-idade, alguns fios
grisalhos nas têmporas, sorriso encantador e uma ótima pessoa além de um
exímio professor de cardiologia.
— Indo para o auditório?
— Sim e você? — perguntei.
— Indo para a minha primeira aula do dia.
— Temos que ir, Maya — falou Débora olhando as horas no seu
relógio de pulso.
— Claro. Tenha um bom-dia, professor.
— Vocês também. — Sorriu simpaticamente e passou por nós.
— Professor... — chamei-o. Ele parou e virou-se para mim.
— Sim?
— Só quero agradecer novamente por ter me indicado ao estágio.
Não sabe o quanto sou grata por isso.
Ele riu e aproximou-se novamente.
— Se toda vez que nos encontrarmos você me agradecer, vou
começar a ficar constrangido. O que fiz não foi um favor, Maya. Você é
uma aluna dedicada e muito esforçada. Tem um histórico de notas
impecáveis e uma boa carta de referência da Universidade de Houston. Não
haveria porque não a indicar ao estágio. Se o conseguiu foi por puro mérito
seu!
— Entendo, mas não custa agradecer.
Sorriu sem graça.
— Certo. Não tem de quê.
— Maya! Vamos chegar atrasadas para o seminário!
— Nos vemos depois. Até mais e boa aula.
— Até mais.
— Quer ir almoçar comigo depois da aula? — perguntou Débora.
— Não vai dar, eu tenho uma consulta.
— Está tudo bem?
— Sim, é só uma consulta de prevenção com o ginecologista. Nada
de mais.
— Se cuidar é fundamental, ainda mais nos países baixos. — Riu.
Após a aula, Elliot esperava no mesmo lugar onde me deixou pela
manhã. Entrei no carro e seguimos para a consulta. Quando cheguei à
clínica, a médica estava em um parto de emergência e eu tive que esperá-la
pacientemente.
— Senhora White? — chamou a recepcionista. — A Dra. Lins
espera por você em seu consultório.
— Ah, certo. Obrigada.
Coloquei a revista que folheava na cadeira ao lado e levantei-me
seguindo para o consultório. Bati na porta entreaberta e entrei.
— Olá. Sou Maya White.
— Então é você a mulher que fisgou o coração daquele velho
rabugento, hein?! — Riu levantando-se. — Fiquei surpresa quando ele me
ligou para marcar uma consulta para a sua esposa. Nem mesmo sabia que
ele tinha se casado novamente, vocês estão fazendo um ótimo trabalho
escondendo esse matrimônio da mídia.
Sorri e apertei sua mão estendida para mim.
— É um prazer conhecê-la. Victor falou muito bem de você.
— Coitado dele se não falasse! — brincou, fazendo-me rir. — Pode
entrar por aquela porta, tirar toda a roupa e vestir o avental com a abertura
para frente.
— Claro.
Coloquei minha bolsa sobre a cadeira em frente à sua mesa e entrei
na porta à direita. Fiz exatamente o que ela mandou e voltei.
— Deite-se na maca, querida. Vamos dar uma olhadinha em você.
Primeiro ela pressionou minha bexiga e um pouco mais acima.
Depois fizemos a ecografia transvaginal e ela disse estar tudo perfeitamente
em ordem. Por último colheu o material para fazer os exames básicos.
— Prontinho, querida. Pode ir se trocar. Está tudo perfeito lá
embaixo. Pronta para receber um bebezinho. Avise ao Victor que se ele
quiser fazer o descongelamento do material genético para uma inseminação,
é preciso que venha até aqui para assinar alguns papéis.
Espere... eu havia mesmo ouvido aquelas palavras?
— Material genético? — perguntei com um fio de voz que me
sobrara.
— Sim. Falo de esperma.
Eu sabia o que material genético queria dizer. Só precisava
confirmar se havia mesmo ouvido aquilo.
— Há quanto tempo?
— Está querendo perguntar há quanto tempo o material está
congelado? — Assenti. — Há uns dez anos.
Como ele pôde esconder isso de mim? Se não quer filhos, por que
congelou seu esperma, então? Estava sentindo-me completamente traída e
em estado de choque.
CAPÍTULO 17

Desde cedo estava sentindo meu coração apertado. Não sabia ao


certo se estava passando mal ou se era um pressentimento ruim. As coisas
entre mim e Maya estavam indo bem. Nossa mudança para casa nova nos
fez bem e em breve Teddy estaria mais perto da filha. Estava feliz por isso.
Ela havia esquecido o assunto sobre filhos, mas eu sabia que era somente
por ora. Era difícil negar aquilo a ela, mas eu tinha meus motivos. Poderia
estar parecendo ser egoísta dizendo sempre não para Maya, mas no fim
aquilo era o certo a se fazer. Egoísta mesmo seria se eu a deixasse criando
filhos sozinha e tão jovem.
A porta do meu novo escritório foi aberta em um estrondo e Maya
mandou que minha secretária parada à minha frente, do outro lado da mesa,
saísse nos deixando a sós. Ela a olhou com olhos arregalados e deixou a
sala. Maya aproximou-se a passos firmes e jogou a bolsa sobre o sofá.
Levantei-me e fui até ela preocupado. Sua mão direita se chocou forte
contra o meu rosto. Encarei-a confuso.
— Como você pôde? — berrou e socou meu peito.
— O que aconteceu, querida?
— Como pôde esconder de mim que há embriões seus congelados?
Não quer filhos, então por que aquilo existe? Ou não quer filhos comigo?
— Seus olhos transbordavam lágrimas.
Merda!
— Maya... Isso foi feito há mais de dez anos, quando fiz minha
vasectomia. Guardei porque tinha esperança de encontrar alguém logo mais,
mas o tempo passou e isso demorou a acontecer. Eu sequer lembrava que
isso ainda existia. Havia uma cláusula no contrato que dizia que os
embriões só podiam ficar congelados por cento e vinte meses. Pensei que já
tivessem sido descartados. Acha mesmo que esconderia isso de você?
Ela encarou-me cheia de tristeza. Os olhos que só me deram amor e
excitação, naquele instante estavam cheios de mágoa e decepção.
— Amor... Por que quer tanto brigar por filhos agora? Você ainda é
jovem demais.
— O fato de eu não querer engravidar neste exato momento, não me
impede de lutar por algo que desejo no meu futuro próximo!
— Maya...
— Não! — interrompeu-me. — Você é um egoísta! Eu não entendo
o porquê de não querer, quando disse uma vez que desejava tudo comigo.
Por que quer tirar isso de mim, Victor? Não entende que quero ter algo de
você comigo para sempre? Que quero gerar dentro de mim um pedaço de
você, o fruto do nosso amor que tanto lutamos para ter? Não me ama o
suficiente para abrir mão desse seu pensamento retraído, para satisfazer
meu desejo? Não estou pedindo o carro do ano que não preciso e nem a
mansão na praia que nunca irei visitar. Estou pedindo uma lembrança sua...
alguém que não me deixe esquecer de você, mesmo quando eu não souber
nem mesmo quem eu sou. — Ela respirou fundo e tentou se acalmar. — Eu
tentei deixar isso de lado. Mas não consegui.
— Eu lamento... — Abaixei meu olhar, desviando-se do seu. — Mas
não vou fazer isso. Maya... um dia eu não estarei mais aqui e você será uma
mulher linda e ainda jovem, então, encontrará alguém mais novo do que sou
agora e terá filhos com ele.
— Por que faz isso? — Andou para trás. — Por que trata nosso
relacionamento como algo passageiro, quando sabe que somos fortes e que
você me marcou de maneira que nunca mais alguém irá marcar? Victor...
não vê que o amor que sinto por você nunca mais irei sentir por outro
quando se for? Você está me destruindo... Me quebrando por inteira. —
Havia desespero em seu rosto. Aquilo me matou por dentro... Será que o
que estou fazendo não é tão certo quanto pensei que seria? — Eu odeio
você! Não quero mais isso... Não quero mais sofrer. Você só me magoa.
Sempre faço tudo em sua função. Sempre tentando acatar seus desejos e
ordens, satisfazê-lo de todas as maneiras, mas você parece não dar o
mínimo de valor a isso! Não quero mais ceder, sou somente eu quem faz
isso nesse relacionamento. Você estava certo... talvez esse assunto deveria
ter sido colocado em pauta antes de assinarmos aqueles papéis.
Uma fina ponta atravessou meu coração. Senti a veia em meu
pescoço se estalar e estremecer sob a minha pele. Estou perdendo-a. Ela se
virou e abriu a porta da sala. Então... tudo ficou escuro e senti meu corpo se
chocar com o chão.

Acordei sentindo-me um pouco tonto. Ao abrir os olhos, demorei a


enxergar e entender onde eu estava. Um bipe apitou ao meu lado atraindo
minha atenção.
— Droga! — murmurei baixo.
A porta foi aberta e o médico entrou.
— Como vai, Victor?
— Bem, eu acho. Infartei de novo?
— Não. Você teve uma crise de ansiedade e isso fez com que seu
coração fraco não conseguisse bombear sangue para o seu cérebro, então
desmaiou.
— Quem me trouxe para cá?
— A emergência. Sua esposa estava com você quando aconteceu,
ela contou que estavam tendo uma discussão. Eu liguei para o seu médico
em Houston. Ele me enviou seu histórico por e-mail e contou-me seu
segredo.
Encarei-o tenso.
— Não se preocupe. Não falei nada a ela, ele alertou-me sobre isso
também. Mas aqui, entre nós... acho que devia contar. Você não sabe o mal
que estava fazendo àquela mulher escondendo isso dela. Ela chorou litros lá
fora. Ficou aqui do seu lado a noite toda segurando sua mão. Não a
conheço, mas ela mais do merece saber que você está morrendo.
— Não sei como contar isso a ela.
— Quando tenho que dar uma notícia ruim a minha esposa, começo
me sentando com ela, segurando sua mão e dizendo o quanto a amo. Depois
solto a bomba.
— E isso funciona?
— Às vezes, sim. Outras vezes, a Terceira Guerra Mundial se instala
dentro de casa.
Ri do seu bom humor.
— A enfermeira virá logo mais levá-lo para um novo
eletrocardiograma. Mais tarde, eu volto para saber como você está. —
Caminhou em direção à porta e parou antes de abri-la, virando-se para mim.
— Victor... conte a ela antes que descubra sozinha. Isso é pior, acredite.
— Eu sei bem disso.
— Nada de se exaltar novamente. Pode morrer da próxima.
— Obrigado pelo aviso, doutor.
— De nada. — Deixou o quarto.
Ele estava certo. Era precisava abrir o jogo que há seis meses
escondia da Maya. Mas eu tinha medo... medo de lhe dizer que nosso tempo
era menor do que pensávamos que fosse. A porta foi aberta novamente e
Maya passou por ela. Seus olhinhos estavam um pouco inchados e
vermelhos. Ela se aproximou da cama sentando-se à beirada e pegou minha
mão entre as suas.
— Oi... Como está se sentindo?
— Oi, amor. — Sorri. — Bem. Apavorei você?
— Sim. — Começou a chorar e abaixou sua cabeça. — Me desculpe
pela briga. Foi culpa minha...
— Ei... — Peguei seu queixo entre meus dedos e levantei seu rosto,
para que ela me olhasse nos olhos. — Não foi culpa sua, meu anjo. —
Sequei suas lágrimas. — Preciso contar algo a você e espero que me
perdoe. Mas antes preciso que entenda que não escondi isso de você.
Apenas estava sem coragem para lhe dizer. Assumo... fui um covarde.
— O que aconteceu?
— Depois do infarto, tornei a sentir dores no peito e falta de ar.
Procurei meu cardiologista em Houston e ele me submeteu a centenas de
exames. Maya... meu coração está fraco. Ele está se cansando muito rápido.
Talvez um dia eu durma e não acorde. Você sabe que o problema coronário
não tem cura e que sua tendência é piorar.
As lágrimas lavavam seu rosto.
— Está dizendo que vou perdê-lo logo mais?
— Estou. — Um bolo se formou em minha garganta.
— Por isso não quer filhos?
— Sim. Como deixá-la sozinha para cuidar de uma criança? Me dói
saber que não verei Caleb se casar. Me dói mais ainda saber que não verei
nosso filho sequer se formar na escola.
Ela tocou meu rosto, onde mais cedo havia acertado um tapa, e o
acariciou.
— Victor... Eu não estarei sozinha. Tenho minha família e sempre
terei você comigo aqui dentro. — Apontou para o seu coração. — E mesmo
que você não o veja se formar ou que ele ou ela seja pequeno demais para
ter lembranças de você, eu farei com que nosso filho saiba quem foi seu pai
e o quanto amou sua mãe. Não me deixe sem nada de você. Por favor...
Preciso disso tanto quanto você precisa de mim ao seu lado. Quero ter para
quem olhar e ver estes lindos olhos verdes. — Selou meus lábios e encostou
sua testa na minha. — Eu te amo, querido. Estarei aqui até nosso último
minuto.
— Também amo você. — Beijei-a.
CAPÍTULO 18

A porta foi aberta interrompendo nosso beijo e Margot passou por


ela com Caleb.
— Oi, pai.
— Oi, filho.
— Olá, querido irmão.
— Margot... não precisava ter vindo. Sei que está de férias.
— Bobagem. — Fez um sinal de desdém com a mão e sorriu para
ele.
Caleb aproximou-se da cama e abraçou o pai apertando-o em seus
braços. Ele soluçou, então percebemos que chorava. Victor apertou ainda
mais o filho e alisou com mão em suas costas.
— Já é grande demais para chorar, garoto.
Ele riu e afastou-se sentando à beirada da cama, do outro lado.
— Eu sei, mas é que sempre quando você vem parar no hospital,
tenho medo de perder você.
Victor olhou-me e respirou fundo.
— Acho que vamos ter que aturar seu pai mais alguns anos. —
Sorri.
— Posso ficar com você essa noite, pai?
— Se eu não for para casa, é claro que pode.
— Bom... Eu tenho que trabalhar, já é uma hora. Logo mais devem
trazer alguma coisa para você comer, amor.
— E você já comeu alguma coisa hoje? — perguntou preocupado.
— Já sim. — Levantei e beijei sua testa. — Eu passo aqui mais
tarde.
— Tudo bem.
Caminhei até a porta e Margot acompanhou-me até o corredor.
— O médico disse que vocês discutiam quando ele passou mal.
— Sim.
— Meu irmão não tem mais idade para os chiliques de uma jovem
mimada.
— Olha só, Margot... Você não estava lá. Não sabe o porquê
brigávamos e muito menos da nossa relação. Por que não fecha a boca?
Está perdendo a chance de ficar calada.
— Não gosto de você! — disse com desprezo.
— Você não gosta de mim e eu não gosto de você. Estamos quites.
— Sorri e lhe dei as costas.
Elliot esperava por mim na saída do hospital. Acompanhou-me até o
carro e dirigiu para casa antes de me levar ao hospital, onde estava fazendo
o estágio. Depois de me preparar, juntei-me a turma de estagiários do Sr.
Richard Malone, meu professor na universidade. Já estavam todos na sala
de ressonância quando cheguei atrasada.
— Está atrasada — sussurrou Débora.
— Eu sei. Desculpe.
— Por que não foi à aula hoje e nem veio ao estágio ontem?
— É que o Victor...
— Se eu estiver atrapalhando vocês duas, é só dizer que me
interrompo — disse o Sr. Malone.
— Desculpe — pedi envergonhada.
— Posso continuar?
— Sim, claro.
Ele prosseguiu com a explicação. Às quatro era hora do nosso
intervalo. Fomos todos os sete alunos para o refeitório do hospital e nos
sentamos ao canto. Estávamos conversando quando Richard chegou e se
juntou a nós.
— Por que não veio ontem?
— Era isso que eu queria saber quando você brigou com a gente —
falou Débora.
— Meu marido passou mal ontem. Fiquei no hospital com ele até
esta manhã.
— Ele está bem? — perguntou Malone.
— Sim. Agora está. Obrigada por perguntar.
— Você ainda vai à exposição comigo, não é? É hoje à noite.
— Droga! Eu me esqueci disso completamente, Débora.
— Não tem outra pessoa para ficar com ele no hospital? É só por
umas três horas.
— Tem sim, mas não posso ficar até tarde na rua.
— Onde é essa exposição? — perguntou nosso professor.
— No Garden Lux. É a exposição de fotos do meu namorado. Você
devia vir com a gente. Ele é um fotógrafo e tanto, sabe? — suspirou
exagerada.
Rimos.
Depois do intervalo voltamos ao estágio. Às seis horas deixei o
hospital e fui direto para onde Victor estava.
— Olá.
— Olá, Dra. White — cumprimentou Victor sorrindo.
— Ainda não sou doutora, mas falta pouco. — Beijei-o.
— Onde está Caleb? — perguntei olhando em volta e dando por sua
falta.
— Foi comer e já deve estar voltando.
— Você já comeu? Está sentindo alguma coisa estranha?
Ele riu.
— Sim, acabei de jantar. E não, estou bem.
— Eu me preocupo.
— Eu sei. — Segurou minha mão.
— Se importa se eu for à exposição sozinha?
— Ah, é mesmo. Tínhamos uma exposição de fotos hoje.
— Tínhamos.
— Vou pedir ao Noberto que cuide de você pessoalmente. Mas, por
favor, amor... tome cuidado, okay? Não se esqueça de que aquele louco
ainda está à solta.
— Não se preocupe. Devo chegar até as dez em casa.
— Me liga?
— Ligo sim.
— Já estou com saudade de você, querida.
— Também estou. Previsão para a alta?
— Amanhã, pela manhã.
— Eu venho buscar você.
— Vou estar aqui te esperando. — Sorriu.
Caleb entrou no quarto e me cumprimentou.
— Eu já vou indo.
Fui para casa e depois de um banho rápido, me encontrei com
Débora em frente à galeria. Entramos e logo nos serviram champanhe. O
lugar estava lindo, bem iluminado. Nas paredes, quadros com fotos
incríveis tiradas na África.
— Uau! Ele tem o dom da fotografia.
— Sim. Não é incrível?
— Oi, meninas.
Virei-me e vi nosso professor.
— Oi, Sr. Malone. Que bom que veio. — Débora beijou seu rosto.
— Obrigado pelo convite. Vocês estão lindas.
— Você também, professor — disse ela, sorridente.
— Obrigada, é gentileza sua — agradeci.
Richard era um homem atraente, não podia negar.
— Maya... se importa de fazer companhia ao Sr. Malone, enquanto
procuro pelo meu namorado? Quero muito apresentá-los.
— Claro que não. — Sorri para ela, que saiu em seguida.
— Já viu toda a exposição? — perguntou ele.
— Não, cheguei há uns quinze minutos.
— Então, por favor. Vamos começar por ali. — Apontou com a mão
à esquerda.
Eu o segui por um corredor formado por painéis brancos, onde as
fotos estavam expostas, admirando as fotografias em silêncio. Algumas
vezes pude sentir seu olhar sobre mim. Ele era um tanto intimidador. Não
sabia por que me sentia assim na sua presença.
— Como vai seu marido?
— Bem. Ele recebe alta médica amanhã.
— O que houve com ele?
— Victor tem a doença arterial coronária. Sofreu um ataque
cardíaco há pouco tempo.
— E o que foi que aconteceu desta vez?
— Ele teve uma crise de ansiedade e desmaiou. O coração dele está
fraco. Não conseguiu bombear o sangue direito para cérebro quando se
exaltou.
— O médico disse se ele tem a possibilidade de um transplante?
— Não. Como médico... acha que ele conseguiria passar por um
transplante?
— Eu teria que examiná-lo, mas talvez tenha sim. Quantos anos ele
tem?
— Sessenta e um.
Richard parou de andar e eu me virei para ele, que tinha um olhar
assustado.
— Assustei você? — Sorri.
— É casada com o empresário Victor White?
— Sim.
— Quando li o sobrenome na ficha achei que fosse casada com
algum parente ou o filho dele.
— Victor não tem família, além da irmã, e seu filho ainda é um
adolescente.
— Não me leve a mal, é só que fiquei um pouco surpreso.
Ri e continuamos a andar.
— Já estou acostumada com essa reação.
— Há quanto tempo estão juntos?
— Pouco mais de um ano.
— São felizes juntos?
Estranhei sua pergunta.
— Sim. É claro que temos nossas desavenças como qualquer outro
casal, mas sim! Somos muitos felizes.
— Ele é um homem de sorte. Você é muito bonita, Maya. É uma
garota incrível.
Olhei-o. Em seus lábios avermelhados tinha um pequeno sorriso
envergonhado. Senti-me mal por admirar sua boca tão beijável.
— Sr. Malone! Este é a estrela da noite — falou Débora parando à
nossa frente, com seu namorado ao lado.
— Muito prazer, sou Joshua Bell.
— Richard Malone.
Os dois apertaram as mãos um do outro e Richard começou a
parabenizá-lo pela noite e elogiar seu trabalho. Sem perceberem, afastei-me
desaparecendo entre os painéis. Meu celular vibrou na bolsa e eu o peguei.
Era uma mensagem do Victor, apenas desejando-me uma boa-noite.
Suspirei com o telefone colado no peito.
— Maya... — Débora chamou aproximando-se com o namorado e
nosso professor. — Vamos sair para jantar depois da exposição e você vem
com a gente. Joshua fez reservas em um restaurante francês maravilhoso,
fica perto daqui.
— Não vai rolar, eu tenho que ir para casa logo mais.
— Qual é, Maya?! Já havíamos combinado que depois da exposição
iríamos sair para jantar. Joshua fez reservas há dois dias, não podemos
perder. O Sr. Malone pode vir conosco.
— É, eu reservei quatro lugares, achei que seu marido viria — disse
Joshua.
— Ele está no hospital. Não é legal sair para uma noite de diversão
quando Victor está doente.
— Noite de diversão é balada, Maya. Só vamos comer em um bom
restaurante e depois você vai embora. Por favor. — Juntou as mãos à frente
do peito.
Respirei fundo dando-me por vencida.
— Tudo bem. Mas não podemos enrolar muito, tenho que acordar
cedo amanhã.
— Certo. — Sorriu ela contente.
As horas passaram e a exposição chegou ao fim após o leilão das
fotos, que arrecadaria fundos para uma fundação não governamental na
África. O jantar foi ótimo. Boa conversa e não enrolamos para comer ou
pedir nossos pratos.
— A conta, senhores — anunciou o garçom ao colocá-la sobre a
mesa.
— Eu pago. Um presente ao Joshua pela sua exposição de sucesso
esta noite — disse Richard pegando a conta e entregando-a ao garçom junto
ao seu cartão de crédito.
— Não, que isso... não precisa, Sr. Malone. Eu pago meu consumo
— falei estendendo meu cartão ao garçom.
— Por favor, Maya. Eu insisto. — Ele segurou minha mão,
impedindo o garçom de pegar meu cartão de crédito. — E vou pedir a você
o mesmo que já pedi a Débora esta noite. Fora do hospital e da
universidade, sou apenas Richard.
— Desculpe. — Puxei minha mão da sua.
— Não precisa se desculpar por isso.
Sorri envergonhada. Deixamos o restaurante e Débora se despediu
de nós, logo após seu namorado. Eles se foram e Richard ficou comigo na
calçada esperando por Noberto, que vinha com o carro. Ele teve que
estacionar longe depois que desembarquei. O restaurante não tinha
estacionamento e era proibido parar à sua frente.
— A noite foi ótima — falou Richard tentando puxar assunto.
— Foi sim. — Sorri para ele e olhei novamente para frente.
— Maya... — Aproximou-se mais.
Olhei-o dando um passo para o lado.
— Me desculpe por isso — pediu ressentido.
— Desculpar pelo quê? — perguntei com ingenuidade.
Sem esperar por aquilo, ele beijou-me. Empurrei-o pelos ombros
com força e estalei minha mão em sua face.
— Sou casada! — gritei.
— Eu sei, mas precisava fazer isso. Perdoe-me... — pediu sem graça
e afastou-se indo embora.
Noberto estacionou o carro à minha frente e eu entrei sem esperar
pelo manobrista abrir a porta.
— Está tudo bem, Maya? — perguntou Noberto.
— Está. — Forcei um sorriso.
Ele colocou o carro em movimento e seguiu para a nossa casa.

Na manhã seguinte, acordei às sete e meia sentindo exaustão. Quase


não consegui dormir à noite, pensando no quanto errado foi aquele beijo de
um segundo. Uma culpa me corroía por dentro, mesmo eu ciente de que não
tinha culpa sobre o que houve na noite anterior. Será que fiz algo para ele
crer que o deixaria me beijar? Demonstrei algo errado? Por que ele fez
aquilo?
— Maya? — Noberto chamou-me ao entrar na cozinha. — O carro
já lhe espera parado na porta.
— Já estou indo.
Virei o último gole de café, despedi-me da minha avó e no caminho
peguei minha bolsa sobre o sofá na sala de estar. Fomos para o hospital e,
ao chegarmos, tomei o elevador para o sétimo andar. Caminhei apressada
pelo corredor e logo avistei o quarto onde Victor estava. Abri a porta e
entrei encontrando-o de pé arrumando sua pequena mala.
— Bom dia, amor.
— Bom dia, meu anjo.
Caminhei até ele e o abracei antes de beijá-lo.
— Pronto para irmos?
— Prontíssimo! — Sorriu.
— Então vamos.
Peguei sua mão, Noberto sua mala e deixamos o hospital. Ao
entrarmos pela porta da sala, minha avó logo apareceu lhe desejando boas-
vindas de volta ao lar. Victor agradeceu e nós subimos para o nosso quarto.
— Você está bem mesmo? — perguntei.
— Pela milésima vez... Sim, amor! Estou bem.
— Certo. — Caminhei até ele. — Nesse caso... Vou para o hospital
após o almoço. O Sr. Malone conseguiu autorização para nós assistirmos a
um ressecamento de um tumor cerebral pela galeria — falei com
entusiasmo.
Ele riu.
— Você fala com tanta ansiedade, que parece que está indo ver a
Ópera mais esperada do ano.
— Para mim é melhor que isso. O estágio só vai durar mais dez
semanas, estou tentando tirar o máximo de proveito disso.
— Eu sei. Quando esse acabar, posso fazer alguns telefonemas para
conseguir outro para você.
— Prometeu que não ia se intrometer na minha carreira. Lembra
sobre aquela conversa de eu conseguir as coisas por mérito próprio e não
por nenhum tipo de ajuda sua? Você já está pagando pela faculdade, isso é o
suficiente.
— Não se esqueça de que meu dinheiro também é seu agora.
— Como se você deixasse eu me esquecer. — Sorri. — Mas tem
algo que você pode fazer por mim agora. — Apoiei minhas mãos em seus
ombros e juntei nossos corpos.
— O que é?
— Me beija.
— Não precisa sequer pedir. — Juntou nossos lábios.

Após o almoço me despedi do Victor e fui para o hospital. Depois


de me preparar segui com Débora para a galeria da sala de cirurgia quatro.
Sentamo-nos junto à outra turma de estagiários e logo os primeiros
procedimentos da cirurgia começou. A porta à minha direita foi aberta e por
ela passou Naomi, uma das minhas colegas de estágio e do curso. Ela
ingressou exatamente ao mesmo tempo que eu na universidade de
Oklahoma, veio transferida de Dallas, no Texas.
— Oi, Maya — cumprimentou-me e eu estranhei. Aquela era a
segunda vez que falava comigo em três meses que estudávamos juntas.
— Oi, Naomi.
— Como foi o jantar com o professor Malone ontem?
Encarei-a com o cenho franzido.
— Como você soube disso?
— Acho que todo mundo já sabe. — Entregou-me seu celular.
Merda! Havia uma notícia em um site de fofocas acusando-me de
traição e mais abaixo uma foto minha beijando o Richard na porta do
restaurante.
— Mas que droga!
Devolvi seu celular e deixei a galeria. Não havia paparazzi ali, ao
menos não que eu tenha visto. Quem teria tirado aquela maldita foto? Acho
que isso não importa agora. Victor logo verá e irá querer me matar por
aquilo. Espero que ao menos me permita explicar o que houve. Deus... Que
o que tenha acontecido em Houston ano passado, não se repita!
CAPÍTULO 19

Depois que Maya saiu para o estágio, fui para uma reunião em meu
novo escritório no centro da cidade. Ainda estava lá assinando alguns
documentos antes de me reunir com alguns sócios em dez minutos, quando
minha secretária passou afoita pela porta segurando nas mãos um tablet.
— Senhor White...
— Sim. Algum problema?
— Acho melhor o senhor ver isso?
— Estendeu-me o aparelho.
Peguei-o e fiquei confuso com a foto que vi. Que porra era aquela?

Será que o romance mais clicado do momento chegou ao fim depois


de boatos de que Victor White e sua namorada, Maya Valentine, de
apenas 22 anos, teriam se casado em uma cerimônia íntima no Havaí?
A Srta. Valentine (ou Sra. White, não sabemos) foi vista aos beijos
com um homem lindo, identificado como como Dr. Richard Malone,
cardiologista do Hospital Memorial Hallie Corel e professor da
universidade de medicina de Oklahoma, onde por acaso a mocinha
envolvida na história estuda atualmente. Segundo uma fonte, após um
jantar no restaurante francês Plaque D'or, o Dr. Malone teria
acompanhado a moça até seu carro e se despediu dela com um beijo de
tirar o fôlego.
Mas o que verdadeiramente aconteceu após um jantar? Beijo
roubado de primeiro encontro ou traição? Fica a dúvida no ar.

Louco e enraivecido era como eu estava. Dou a ela minha confiança


e é isso que faz? Por que não me contou nada sobre isso? Por que me
esconde? Joguei o tablet sobre a mesa e levantei-me pegando meu paletó.
— Mande que Farhel prossiga com a reunião sem mim.
Deixei meu escritório sem esperar por sua resposta. Tomei o
elevador e desci para o estacionamento.
— Para onde vamos? — perguntou Noberto com estranheza ao me
ver deixar o prédio tão cedo.
— Para casa! — Abri eu mesmo a porta e entrei no carro. Noberto
rapidamente assumiu a direção e deu partida no motor. — Quero saber onde
Maya está!
— Sim, senhor.
Pelo bluetooth integrado ao som carro, ele ligou para Elliot.
— Onde estão? — perguntou.
— Indo para casa. Tem um carro atrás de nós nos seguindo desde a
universidade, mas não acho que seja ameaça, acredito ser somente
paparazzo — escutei Elliot o responder.
Ótimo! Era disso que precisávamos agora! Bufei irado. Logo
chegamos em casa e Maya já havia chegado. Desci do carro sem esperar
por Noberto e entrei na casa batendo a porta com força.
— Maya! — gritei.
Ela logo apareceu no hall. Minha respiração pesava no peito
acelerando meu coração, que parecia que iria explodir a qualquer momento.
— Acho que você já viu... — disse apreensiva parando a uns dois
metros de mim.
— Tem alguma coisa para me contar? — perguntei entredentes,
caminhando até ela que me olhava com olhos amedrontados.
— O que leu não é verdade. Eu jamais trairia você, sabe disso, não
é? Eu te amo e respeito nosso casamento.
— Por que ele estava no jantar? Ou jantou apenas com ele?
— O quê? Claro que não, Victor. Débora e o namorado dela o
convidaram, quando você não pôde ir. Eles estavam conosco, mas aí se
foram e Richard ficou comigo, enquanto...
— O trata pelo primeiro nome? — interrompi-a nervoso, estava me
controlando para não berrar. — O quanto são íntimos?
— Não somos íntimos! Ele não é nada meu, além do meu orientador
no estágio e professor na universidade! — gritou. — Ele me beijou, Victor.
Sem mais e nem menos, ele simplesmente me beijou depois de pedir
desculpas antecipadas por aquilo! — Seus olhos se encheram de lágrimas.
— Não entendi por que fez, sempre me tratou com respeito.
— Você o beijou? O beijou de volta, Maya? Correspondeu aos
lábios dele? — perguntei com um aperto no coração. Tive medo da sua
resposta.
— Não! Pelo amor de Deus, claro que não! Aquilo não durou três
segundos, Victor. Parecia até que quem tirou aquela foto estava do outro
lado da rua esperando aquilo acontecer.
O que ela disse causou um estalo em minha cabeça. E se quem tirou
a maldita foto estivesse de fato esperando acontecer? Aquilo começou a
cheirar mal para mim.
— Vou matar esse homem! — Passei as mãos com agonia pelos
cabelos e depois pelo rosto. — Arrume suas coisas, a gente vai para um
hotel esta noite. — Dei-lhe as costas e caminhei em direção à porta.
— Por quê?
Parei e olhei para ela, que vinha atrás de mim.
— Só faz o que estou mandando! — Meu tom de voz imponente
respondeu sua pergunta. Ela se calou e olhou-me diferente.
— Aonde vai?
— Atrás do homem que se atreveu a tocar em sua boca.
— Victor, olha lá o que vai fazer!
— Não vou matá-lo. Não se preocupe!
Bati a porta e entrei no carro antes que ela viesse atrás de mim
tentando fazer-me mudar de ideia. Ao chegarmos à universidade, atravessei
o estacionamento a passos largos e adentrei o prédio que abrigava as salas
dos professores.
— Victor White. Que prazer recebê-lo em nosso campus. — O reitor
parou-me no caminho e estendeu-me sua mão, que apertei rapidamente.
— Onde encontro o professor Richard Malone?
— No segundo piso. Corredor à direita, quinta porta à esquerda. —
Sorriu.
— Obrigado. — Andei em direção ao elevador.
— Quando puder, caso não seja incômodo, passe em minha sala.
Adoraria conversar.
Olhei-o e sorri falsamente tremendo de raiva com a mandíbula
contraída. As portas se abriram e eu entrei, saindo segundos depois no
segundo andar. Atravessei o corredor contando as portas e parei diante da
quinta. Na madeira escura envernizada, havia uma plaquinha dourada com
o nome "Dr. Richard Malone" escrito em preto. Não bati. Simplesmente
abri e adentrei. Ele olhou-me assustado e confuso, mas logo me reconheceu
e colocou-se de pé rapidamente, saindo de trás da mesa.
— Sabe o que vim fazer aqui, não é?
— Não fiz por mal. — Sua respiração pesou.
Sorri e aproximei-me cerrando o punho.
— Vou te ensinar a manter-se longe da minha mulher! — Desferi
um soco com toda a minha força contra seu rosto, que o fez cair para trás
sobre a mesa.
— Tudo bem... — Colocou-se de pé com dificuldades, limpando
com a mão o sangue no canto dos lábios. — Eu mereci isso. Agora você já
pode ir antes que eu chame a segurança.
— Acho melhor chamar a segurança.
Atingi-lhe com outro soco na mandíbula, seguido de mais um contra
seu nariz fazendo o sangue jorrar. Ele revidou e atingiu-me na maçã do
rosto, fazendo-me afastar dele. Peguei-o pela gola da camisa e joguei-o
contra a mesinha de centro à minha esquerda, fazendo-o cair sobre ela e o
vidro estilhaçar. Parti para cima dele apoiando meu joelho direito sobre seu
tórax para mantê-lo no chão. Com a mão esquerda agarrei seu pescoço,
enquanto que com a outra o soquei duas vezes seguidas na face. Um grito
estridente, quase ensurdecedor, interrompeu o terceiro soco que viria a
seguir. Olhei para a porta e havia uma mulher parada ali, olhando-nos com
olhos arregalados e a mão cobrindo a boca aberta com espanto. Richard
empurrou-me de cima dele e eu me coloquei de pé observando sua figura
com olho roxo, nariz quebrado e hematomas na mandíbula.
— Se chegar perto da minha mulher outra vez... eu mato você!
Entendeu? Eu mato você! — berrei e deixei a sala passando pela moça
assustada.
Voltei para casa e encontrei Maya em nosso quarto andando de um
lado para o outro.
— Pelo amor de Deus, me diga que não fez uma besteira?
— Ele está vivo. — Passei por ela e entrei no closet.
— Isso em seu rosto é um soco? — perguntou preocupada vindo
atrás de mim.
Olhei-a de cara feia e vi o desespero estampado em sua face.
— Já arrumou suas coisas?
— Sim. As suas também.
Peguei a bolsa de couro preto com nossos brinquedinhos sexuais e
voltei para o quarto, jogando-a perto da porta onde havia outras duas malas
pequenas. Virei-me para ela e percebi o quanto estava tensa, olhando para a
bolsa no chão. Fiz um sinal com o dedo para que viesse até mim e assim ela
fez, parando à minha frente. Apertei levemente seu pescoço com minha
mão direita e agarrei sua cintura com meu outro braço.
— Sabe por que estou te levando para um hotel?
Ela assentiu negativamente com a cabeça.
— Porque vou fazer você gritar muito esta noite. Tanto que essas
paredes não irão conter seus gemidos.
Os finos pelinhos de sua face se arrepiaram, assim como os de seus
braços. Selei seus lábios e soltei-a caminhando até as malas, apanhando as
duas e mandando que ela pegasse a bolsa. Descemos e entregamos nossos
pertences ao Noberto, antes de entrarmos no carro. Durante o caminho,
Maya mandou uma mensagem para a avó e outra ao pai, que não estavam
em casa quando saímos, avisando-os de que passaríamos a noite fora
inventando qualquer desculpa esfarrapada para eles. Liguei para o Caleb e
avisei-o também, deixando Elliot em seu encalço.
Ao entrarmos na suíte presidencial, Noberto deixou as malas no
quarto e eu pedi a ele que fizesse reservas no restaurante italiano do hotel.
Ele saiu assentindo.
— Vá tomar um banho. — Caminhei em direção as portas que
davam para a varanda, retirando minha gravata. — Depois venha até mim...
— olhei-a — de joelhos.
Em silêncio ela foi para o quarto. Enquanto Maya se preparava para
mim, servi-me de uma dose de uísque e apanhei a bolsa no quarto jogando-
a sobre o sofá. Retirei dela sua coleira de titânio, a guia, braceletes de
couro, chicote e uma vela. Não demorou muito para que ela voltasse com os
cabelos presos em um coque e nua. Liguei o som integrado no teto e me
servi de mais uma dose. Mandei que se levantasse e viesse para mais perto.
Maya se aproximou lentamente e parou a um metro de mim. Enquanto
degustava da minha bebida, observei seu corpo lindo de cintura fina, seios
fartos na medida certa para minhas mãos grandes. Seu quadril... Ah, seu
quadril, era tão lindo e seu bumbum nem tão grande era delicioso. Amava
acertá-lo, beijar e morder. Ela era minha. Totalmente... inteiramente...
minha!
Terminei minha bebida e me aproximei dela. Acariciei seu rosto e
desci minhas mãos para os seus seios, apertando-os. Maya suspirou e
fechou os olhos. Sexo era algo que estávamos evitando devido ao meu
estado de saúde. Cenas como aquela, já nem me lembrava mais quando
havia sido a última vez. Sorri ao ver o quanto de desejo havia em seus olhos
quando os abriu. Sua respiração acelerou e seu coração também, eu podia
sentir. Desci um pouco mais minha mão direita entre suas pernas. Maya
mordeu o lábio inferior quando toquei seu clitóris com leveza. Mal tinha
posto minhas mãos nela e sua intimidade estava ensopada. Que delícia!
Introduzi meus dedos em sua entrada apertada e retirei em seguida levando-
os até minha boca e os chupando com tesão. Ela suspirou vendo-me fazer
aquilo. Afastei-me dela e caminhei até a coleira sobre a mesa de centro.
— Vire-se!
Ela fez. Passei a coleira por seu pescoço e a prendi na nuca. Virei-a
de frente para mim.
— Punhos!
Ela os estendeu e eu passei os braceletes em seus pulsos, mas não os
uni.
— De joelhos!
Maya abaixou a cabeça e se colocou de joelhos à minha frente,
deixando as palmas das mãos para cima sobre as coxas. Um sinal de
servidão. Como eu amava aquilo! Peguei o chicote e dei a volta parando
atrás dela, lhe acertando a primeira chicotada nas costas arrancando um
gemido de dor e surpresa. Uma marca vermelha se levantou no ato. Eu
havia pesado a mão, mas ela não me interviu, então, eu podia continuar.
Acertei-lhe outra e ela se emborcou um pouco para frente.
— Sentiu falta disso, querida? — Não houve resposta. — Eu senti!
— Bati outra vez. — Por que demorou tanto para me contar, Maya? Contar
que outro homem se atreveu a tocar você quando é somente minha? Julgou
que seu Dono e marido não precisaria saber? — Parei à sua frente e segurei
seu queixo entre meus dedos, levantando seu olhar para mim. — Responda-
me!
— Você estava dentro de um hospital. Havia acabado de passar mal
e eu sabia que, quando eu contasse, teria uma reação explosiva como a que
teve.
— Vou falar e essa será a última vez! Não me esconda nada! Não
importa onde ou como eu esteja, conte-me logo tudo, sem enrolação. Você
me deve isso! Faz parte do respeito para com seu Dono e marido! Fui claro?
— perguntei alto, olhando-a duro.
Se havia algo que odiava e que me dava vontade castigá-la
dolorosamente, era quando alguma coisa acontecia a Maya e eu era o último
a saber. Não entendia por que me esconder um acontecimento grave,
sabendo que, no fim, quem poderia ajudá-la seria apenas eu. Mas eu não
conseguia ser um dominante severo com ela. Não entendia o que me
acontecia, apenas não conseguia. Acho que o problema era que a amava
demais, até mais do que eu mesmo. O amor sempre atrapalha a dominância
de um homem. Não que isso seja uma reclamação, mas é por esse motivo
que muitos dominadores e mestres não se deixam envolver demais ou têm
contratos que estipulam o tempo que a relação irá durar.
Passei o polegar por seus lábios e os contemplei em silêncio.
Arrastei a ponta do chicote suavemente por seu corpo assistindo a sua pele
se arrepiar. Maya fechou os olhos e respirou fundo soltando o ar
vagarosamente pela boca entreaberta. Afastei-me e sentei no sofá depois de
me servir de mais uma dose de uísque.
— Vem até aqui. Venha saciar seu Dono.
Sedutoramente, olho no olho, Maya engatinhou como uma gatinha
manhosa até mim. Sem precisar mandar, ela abriu minha calça e eu ajudei-a
puxar para baixo junto à cueca. Meu pau pulsou livre pulando para fora das
peças que o prendiam. Gemi contido ao toque de sua mão em minhas bolas
desejosas por alívio. Com a outra mão, ela iniciou uma massagem
maravilhosa que me deixou ainda mais louco por ela.
— Quero gozar na sua boca!
Ela sorriu com os olhos cheios de tesão. Encarando-me fundo,
estendeu sua língua para fora e lambeu minha glande inchada. Gemi
agarrando seus cabelos. Deitei minha cabeça para trás e comecei a
comandar sua chupada. Como ela sabia bem como fazer aquilo. Sua boca
era tão macia. Não demorou muito para que eu gozasse nela.
— Por favor... Por favor, me foda com força! — implorou ofegante.
— Ah, minha querida... Seu pedido será atendido. — Acariciei seu
rosto.
Agarrando seus cabelos da nuca, levantei-me colocando-a de pé.
Arrastei-a até a poltrona de madeira e a coloquei sentada, prendendo os
ganchos dos braceletes para trás. Com o chicote na mão me aproximei.
— Pernas abertas! — Bati com o chicote em sua coxa branca
deixando uma marca vermelha.
Ela gemeu baixinho de ansiedade. Entre suas pernas, pude ver sua
boceta lisinha brilhar de excitação. Que vontade me deu de cair de boca,
mas daria a ela um pouco mais de excitação e a foderia com força, do jeito
que me implorou. Acendi a vela e esperei que perto do pavio se juntasse um
pouco do seu líquido quente. Andei em sua direção e a vi respirar fundo.
Ela sabia o que eu faria com ela a seguir. Sorri ao ver que tentava ao
máximo manter as pernas abertas. Ela queria alívio, mas só quem o daria
seria eu.
— Você é linda! Pura excitação.
Ela sorriu com malícia mordendo o lábio inferior. O primeiro lugar
onde derramei a cera oleosa foi em seu clitóris inchado, fazendo-a gritar
levando a cabeça para trás de olhos fechados. Depois derramei em seus
mamilos entumecidos, fazendo-a gemer ainda mais alto.
— Terei um orgasmo com sua tortura, meu Senhor — sussurrou
com um fio de voz.
— Você vai gozar no meu pau.
Depositei a vela sobre o aparador ao lado do sofá maior e dei a volta
na poltrona, soltando seus punhos.
— De quatro na poltrona!
Rapidamente ela fez. Posicionei-me atrás dela observando um visgo
da sua lubrificação escorrer até a beirada do assento, onde seus joelhos
estavam apoiados. Nu e sem esperar mais, agarrei todo o seu cabelo em
minha mão e invadi sua boceta escorregadia em uma só estocada sem o
menor cuidado. Maya gritou agarrando o encosto, cravando as unhas da
madeira desenhada. Comecei a me mexer com movimentos bruscos, indo
fundo e atingindo com força seu ponto estratégico, que a levava ao delírio.
— Com mais força, meu Senhor! Me bata!
Minha menina estava sedenta por mim, assim como eu estava por
ela. Por trás, bati com minha mão em seu rosto, nem tão forte, mas o
suficiente para causar uma leve ardência na pele e fazê-la sorrir. Fodi-a com
mais força e espanquei suas nádegas e laterais das coxas. Se era assim que
ela queria, então teria! Não foram muitos mais tapas, puxões de cabelo ou
estocadas brutas, e ela gozou com maestria estrangulando meu membro.
Suas pernas tremeram com o orgasmo. Ela se atreveu a me olhar por cima
do ombro e em seus olhos havia tanto amor e devoção, que fez meu peito se
apertar. Eu amava aquela mulher e amaria até o meu último segundo de
vida. Não importa se ela tirava de mim parte da minha virilidade como um
dominador e me desse grandes dores de cabeça. Eu a amava e ponto.
Amava até mais do que amei minha primeira esposa. Maya era minha
metade. Se eu acreditasse em alma gêmea, diria que ela e eu vivemos juntos
em vidas passadas. Isso até explicaria o fascínio e a alegria que senti
quando a vi pela primeira vez. Era como se meu coração gritasse: ela é sua!
Toda sua!
Gozei chamando por seu nome. Beijei suas costas e acariciei seu
corpo.
— Venha, querida.
Saí de dentro dela e peguei-a em meus braços, nos levando para o
quarto. Depositei-a na cama e cobri seu corpo trêmulo e vermelho com o
meu, ajeitando-me entre suas pernas. Maya sorriu e acariciou meu rosto
com delicadeza e amor.
— Eu te amo, meu Senhor... meu marido, homem da minha vida.
— Eu também amo você, Maya. — Beijei-a com ternura.
CAPÍTULO 20

Na manhã seguinte, voltamos para casa. O clima de romance entre


nós dois ainda estava forte. Victor abriu a porta da entrada e deu-me
passagem vindo logo depois de mim. Vovó apareceu no hall com um
sorrisinho enigmático e nos desejou um bom-dia.
— Vocês perderam o café da manhã.
— Desculpe, vovó. Acordamos um pouco tarde.
— Pensei até que tivesse ido direto para a faculdade.
— Eu não vou hoje.
— Tem faltado bastante nesta semana, não acha? — Olhou-me com
uma das sobrancelhas arqueadas e um olhar repreensivo.
— É que essa semana tem sido meio difícil.
— Vou subir para tomar um banho. Você vem? — perguntou Victor.
— Eu já vou.
Ele pegou nossas malas e subiu.
— Eu vi na internet... você e o professor. Quer conversar?
— Meu pai viu?
— Acho que não. Ao menos não comentou nada. Ele é desligado
com essas coisas, você o conhece.
— Onde ele está agora?
— Saiu bem cedo. Disse que tinha coisas para fazer.
— Não falou para onde ia?
— Não.
— Caleb já foi para a escola?
— Saiu há dez minutos com Elliot.
— Ótimo. — Respirei fundo. — E sobre a internet... não é verdade.
Não sei por que o Sr. Malone fez aquilo.
— Victor deve ter ficado furioso.
— Sim, bastante. Mas ele está bem agora.
— Sei... — Lançou-me uma piscada.
— Vovó! — repreendi-a.
Ela riu e se aproximou colocando as mãos em meus ombros.
— Não se envergonhe. Eu sabia bem como acalmar seu avô e...
— Ai, meu Deus! Realmente não quero saber disso — interrompi-a
e ela gargalhou.
— Certo. Agora suba, seu marido está lhe esperando para um banho
a dois.
Sorri envergonhada. Rindo, ela se foi em direção à cozinha. Subi a
escada e entrei no quarto encontrando Victor nu ao telefone. Passei direto
por ele indo ao banheiro e me despi.
— Achei que não subiria — falou ao entrar no banheiro.
— Pensou mesmo que tomaria banho sozinho? — Virei-me para ele.
— Não... Você não seria malvada a esse ponto. — Sorriu travesso e
laçou minha cintura.
Admirei sua beleza pela qual era fascinada e acariciei seu rosto.
Estávamos nos tornando um casal muito forte a cada acontecimento e isso
era bom. É como diz aquele velho ditado: o que não te mata lhe deixa mais
forte.
— Se o vir hoje no hospital... fique longe.
— Sabe que isso é impossível, não é? Ele é meu mentor do estágio.
— Você não pode trocar?
— Posso tentar.
— É bem provável que ele tente falar com você para se desculpar. E
é bem provável que tente lhe beijar de novo.
— Não vai acontecer.
— Para o bem dele, eu espero que não.
— Vem... vamos para o banho.
Puxei-o pela mão e o levei para o boxe. Depois de um banho cheio
de beijos e mãos bobas, Victor se vestiu e se foi para o trabalho com a
promessa de que chegaria até as sete da noite para jantarmos juntos. Desci e
ao chegar no térreo, encontrei minha avó na sala de jantar passando a lista
de compras à empregada que meu marido insistiu que precisávamos.
— O Sr. Valentine ainda não voltou? — perguntei a minha avó,
sentando-me à mesa.
— Não. Por que não liga para ele?
— Vou fazer isso.
— Quer um bolo de laranja, formiguinha? Foi feito hoje.
Sorri com o modo que me chamou.
— Eu aceito sim, vovó. Obrigada.
Sorridente, ela foi para a cozinha. Escutei a campainha tocar e a
empregada se retirou pedindo licença.
— Aqui está seu bolo. Trouxe café também.
— Ah, nossa... está cheirando tão bem.
— É claro que está, fui eu quem fez. — Riu sentando-se à minha
frente.
A empregada voltou e apanhou a lista sobre a mesa.
— Quem estava na porta? — perguntei a ela.
— Dois detetives. Estão falando com Elliot agora.
— Detetives? — questionou minha avó confusa.
— Eu já volto. — Levantei-me da mesa e segui para o hall.
— Já disse, o Sr. White saiu de casa há vinte minutos.
— E onde está sua esposa?
— Estou aqui. — Aproximei-me deles. Elliot se virou e olhou-me
de cara feia. — Do que se trata.
— Não precisa responder a estes homens, Sra. White. Eles procuram
pelo seu marido.
— Pelo Victor? — Encarei os detetives confusa. — Mas o que
aconteceu? Por que querem falar com ele?
— Eu sou o detetive Washington e este é meu parceiro, o detetive
Garcia.
— Maya White. — Estendi minha mão, cumprimentando-os.
— Sabemos quem é, Sra. White. A senhora é aluna do Sr. Richard
Malone, estou certo? — perguntou um deles.
— Sim.
— Ele foi encontrado morto em sua sala na Universidade esta
manhã. Se importa de nos responder algumas perguntas?
— Meu Deus... Co-como assim, ele está morto? Mas o que foi que
houve? — Um nervoso imenso percorria meu corpo deixando tenso cada
músculo.
— Isso é o que queremos descobrir. A senhora pode falar conosco?
— perguntou o outro detetive.
Apenas assenti, não tinha palavras. Segui para a sala de estar e
sentei em uma das poltronas.
— Por favor, sentem-se.
Eles se sentaram no sofá à minha frente e Elliot se instalou de pé ao
meu lado.
— Bem... Sabe nos dizer onde estava seu marido ontem à noite? —
perguntou o detetive Garcia.
— Claro. Comigo no hotel Gleen Palace.
— A noite toda? — questionou o outro.
— A noite toda.
— O que faziam lá?
— Acho que não preciso descrever o que eu e meu marido fizemos
em um quarto de hotel — disse um tanto rude.
— Desculpe. Mas preciso saber se estavam sozinhos.
— Sim, estávamos.
— A que horas deram entrada? — perguntou o detetive Washington.
— Eu não sei ao certo. Acho que umas cinco da tarde.
— A que horas deixaram o hotel?
— Hoje de manhã, uma hora atrás.
— Deixaram o hotel durante a noite em algum momento?
— Não.
— Nem seu marido sozinho? Entre as onze e meia-noite e meia?
— Posso garantir que entre as onze e meia-noite e meia Victor
estava comigo.
— Certo — disse Garcia e respirou fundo. — Segundo um tabloide
na internet, a senhora teria tido um breve caso com o Sr. Malone. Confirma
isso?
— Claro que não! Francamente, os senhores não deveriam acreditar
em tudo que lê na internet! Isso é fofoca. Ele me beijou sim na saída de um
restaurante no qual não jantamos sozinhos, só para deixar claro, mas não foi
correspondido. Honestamente, não sei o porquê ele fez aquilo. O homem
nunca me olhou ou me tratou com segundas intenções. Foi uma grande
surpresa sua atitude — falei irritada.
— Sabemos que, após a notícia, o seu marido procurou o Sr. Malone
na tarde de ontem na universidade, onde o Sr. White agrediu a vítima e o
ameaçou de morte. Temos uma testemunha — disse Garcia.
— Então, horas mais tarde Richard Malone é morto em sua sala.
Coincidência, não?
— Victor não fez isso, se é o que insinuam. — Levantei-me. —
Sugiro que antes de entrar na casa de alguém o acusando de assassinato,
primeiro tenham certeza de sua acusação! Vou pedir que se retirem da
minha casa. Saiam! — mandei alto e firme, apontando para o hall.
Eles se entreolharam e se levantaram.
— Agradecemos por ter conversado conosco. Com licença.
Elliot os acompanhou até a porta e logo retornou.
— A senhora está bem?
— Ache o Victor. — Caminhei para a cozinha.
— Está tudo bem, querida? — perguntou minha avó preocupada.
— Não. Meu professor apareceu morto e a polícia acha que foi o
Victor quem o matou.
— O quê? — perguntou com espanto.
— Meu Deus, vovó! Preciso ir para a empresa. Tenho que falar com
ele.
— Você está muito nervosa. É melhor que fique aqui. Ligue para o
Noberto, diga o que acabou de acontecer e conte que os detetives devem
estar a caminho de lá.
— Sua avó está certa, Sra. White — falou Elliot entrando na
cozinha. — Vou ligar para o Noberto. Tente se acalmar.
Meus olhos estavam marejados e meu coração disparado. Elliot se
afastou com seu celular na mão e eu o persegui. Ele tentou uma, duas, três,
quatro vezes e enfim Noberto atendeu. Elliot contou a ele o que houve, mas
depois disso apenas ouviu e concordou com tudo que Noberto dizia do
outro lado da linha. Quando encerrou a chamada, ele não quis me dizer
nada do que conversaram, apenas informou que Noberto lhe pediu para que
não me deixasse sair de casa. Corri até a sala de jantar e peguei meu celular
sobre a mesa ligando para Victor, mas ele não me atendeu. Algo me dizia
que coisas ruins estavam prestes a acontecer.
— Me leve até o escritório — pedi para o Elliot ao passarmos por
ele indo em direção a porta.
— Não posso permitir que a senhora saia. Desculpe.
Parei e virei-me encarando-o com fúria.
— Quem é você para me dizer o que eu devo ou não fazer? Não me
importa o que Noberto lhe disse! Me leve até a droga do escritório ou eu
irei sozinha! — gritei e abri a porta saindo.
Elliot respirou fundo e impaciente e acompanhou-me até o carro
assumindo a direção. O caminho foi feito rápido e em silêncio. Tentei
novamente falar com Victor, mas ele não atendeu. O carro estacionou na
frente do prédio e logo avistei dois carros da polícia parados ali. Entrei e
tomei o elevador como um furacão. Quando as portas de aço escovado se
abriram no último andar do edifício, saí apressada com Elliot em meu
encalço. Ao me aproximar da sala do Victor, a porta foi aberta e dois
policiais saíram de lá acompanhando-o. Meu coração que batia acelerado
parou por alguns segundos voltando a bater depois de embolar no peito
causando desconforto.
— Victor... — Aproximei-me a passos largos.
— Está tudo bem, amor. — Abraçou-me. — Estou sendo levado
para depoimento. Sou considerado um principal suspeito, mas não se
preocupe. Já liguei para os meus advogados e vai ficar tudo bem.
— Mas você não fez isso e podemos provar.
— E iremos. Fique calma e volte para casa.
— Me deixe acompanhá-lo.
— Não. Por favor, Maya... Preciso que me obedeça agora — disse
baixo e firme, encarando-me nos olhos.
— Okay.
— Ótimo. — Beijou minha testa e soltou-me pedindo a Elliot que
cuidasse de mim.
Noberto o acompanhou e eu voltei para casa. Logo um dos seus
advogados apareceu e seguimos a sós para o seu escritório.
— E então... Onde está o meu marido?
— Ainda em depoimento.
— Meu Deus... Já faz mais de uma hora que o levaram. — Sentei-
me no sofá à sua frente.
— Preciso que seja sincera. Victor esteve a noite toda com você no
hotel?
— Ele esteve a noite toda comigo no hotel!
— Ótimo! Mas eu não tenho boas notícias. O sistema de segurança
do hotel está em manutenção. Por tanto, não temos imagens das câmeras de
monitoramento que prove que estiveram lá a noite toda, apenas o registro de
entrada e saída.
— Como assim?
— O hotel está substituindo o sistema antigo por um novo e
refazendo instalações de algumas câmeras. Vocês deram muito azar.
— Mas e as câmeras da universidade? Elas não gravaram o
assassino deixando o local?
— Alguém invadiu o sistema da universidade, acessou e desligou
todas as câmeras temporariamente. Ninguém soube explicar o que
aconteceu. Temos motivos para pensar que alguém possa estar armando
contra Victor. Mas não se preocupe. Vamos à procura de funcionários do
hotel para testemunhar a favor dele. Do mesmo modo que não podemos
provar que Victor não tenha deixado o hotel durante a noite, eles também
não podem provar que ele esteve na faculdade na hora da morte.
— Mesmo assim a justiça irá prendê-lo — disse com desespero. —
O que podemos fazer para provar que meu marido é inocente e que, talvez,
exista alguém armando para ele?
— Será bastante difícil, mas não impossível. Se eles o prenderem,
vamos conseguir um habeas corpus. Quem é Naomi Flinn?
— É uma colega da universidade e com quem faço estágio. Mas o
que ela tem a ver com tudo isso?
— Ela é a testemunha que viu Victor agredir e jurar Richard Malone
de morte.
— O quê?
— Senhora White... Existe alguma possibilidade remota de você
conversar amigavelmente com esta moça e convencê-la a retirar seu
depoimento?
— Eu posso tentar.
— Faça isso com todo cuidado, ou podemos piorar a situação.
— Eu irei tomar cuidado.
— Certo... — Levantou-se. — Este é meu número. — Entregou-me
seu cartão. — Qualquer coisa, você pode me ligar.
Acompanhei-o até porta.
— E Sra. White... — Virou-se para mim. — Tome cuidado. Se tudo
isso for uma armação para incriminar seu marido, você pode estar em
perigo. Não saia sozinha.
Assenti e levei-o até a saída.
— Não acho que deva ir atrás da testemunha — disse Elliot atrás de
mim, assustando-me. — Se alguém lhe vir fazendo isso, podem dizer que
você tentou coagir a testemunha e isso não será nada bom para o Sr. White.
— Eu preciso tentar. Irei ser cautelosa. — Respirei fundo. — Ele vai
ser preso, não vai?
Ele assentiu.
— Assassinato em primeiro grau. Mas o Sr. White tem bons
advogados.
— A imprensa logo cairá matando em cima de nós.
— Precisa ser firme, Sra. White. A imprensa ficará em cima de
vocês como abutres na carcaça. Prepare-se!
— Eu sei. Precisamos pensar no que fazer agora. Por onde devemos
começar a agir para provar a inocência do Victor? Tenho que procurar por
Naomi, antes que eu comece a ser cercada pela imprensa.
— Tudo bem. Vou ligar para o Noberto e procurar saber se eles
conseguiram falar com os funcionários do hotel.
— Certo.
Ele saiu e eu fui até a sala, indo direto ao bar e servindo-me de uma
dose de uísque.
— Está tudo bem, minha neta?
— Não. — Comecei a chorar. — Ele será preso, vovó. — Virei-me
para ela. — Quem poderia estar fazendo isso conosco?
— Eu não sei dizer. Victor é um homem visado e invejado. Pode ser
qualquer um.
— Por que nossa felicidade nunca dura mais do que algumas horas?
Por que não nos deixam em paz?
Ela caminhou até mim e abraçou-me.
— Tente acalmar seu coração, querida. A angústia e o desespero nos
cegam. Pense... Quem poderia querer Victor preso? Ou... quem poderia
querer vocês separados?
Apenas um nome veio à minha mente como um estalo. Soltei-a e a
encarei.
— Eu acho que sei quem, vovó. Preciso ligar para o Noberto.
Deixei a casa e caminhei em direção a Elliot, que falava ao telefone
escorado ao carro estacionado à frente da garagem. Parei à sua frente e
estendi minha mão, pedindo o telefone.
— Deixe-me falar com ele.
Sem questionar, Elliot entregou-me o celular.
— Noberto... Eu sei quem pode estar fazendo isso.
— Deixa eu adivinhar... Higor? Já tinha minhas suspeitas. Em
breve levarei Victor para casa, mas saiba que logo mais a polícia
aparecerá para prendê-lo. Agora não é hora para desespero, Maya. Mais
do que nunca precisamos ser cuidadosos e procurar manter o controle da
situação.
— Qual é o primeiro passo?
— Provar que Victor não esteve na faculdade na hora do
assassinato.
— Mas como? As câmeras estavam desligadas.
— Há duas saídas na faculdade. Não há câmeras de trânsito, mas
podemos tentar nos estabelecimentos. Algumas das câmeras podem ter
pegado o assassino deixando o local.
— Tem um café em frente à saída um da faculdade. Pode começar
por lá.
— Certo. Nos falamos depois.
— Okay.
CAPÍTULO 21

Eu tinha que pará-lo. De algum modo precisava fazer isso e sentia


que somente eu poderia. Mas a questão era: como? Como parar o Higor,
para que Victor e eu pudéssemos ter paz de verdade? Já havíamos nos
livrado de tantas pedras, mas ainda havia aquela. Como eu pude ser ingênua
de pensar que ele desistiria e desapareceria?
— Agora é apenas questão de tempo. Logo todos estarão sabendo
sobre a prisão do Victor — disse o advogado ao encerrar uma ligação.
— Então é isso? Meu marido acaba de ser preso por algo que ele
não fez?
— Victor é um homem rico. A prisão de um homem como ele trará
à polícia uma boa visibilidade de que estão fazendo justiça sem olhar a
quem. E não vamos esquecer que os políticos também adoram isso.
— Eu quero vê-lo.
— É preciso esperar um pouco.
— Um pouco quanto? — perguntei impaciente.
— Se acalme, querida — pediu meu pai sentado ao meu lado.
— Estou tentando, pai. Mas não dá! — Levantei-me. — Onde está
Noberto?
— Ainda na delegacia — respondeu Elliot.
— Eu vou subir. Quando ele chegar, alguém me avise.
— Sim, senhora.
Deixei a sala de estar.
— Senhora White... — chamou o advogado.
Parei próximo à escada e virei-me para trás.
— Não fale com a imprensa.
— Não irei.
— Eles irão provocá-la para que diga algo, mas é preciso manter-se
calma neste momento.
— Certo. Mais alguma coisa?
— Tenha fé de que tudo se resolverá rápido.
Assenti e subi a escada. Trancada no quarto, só me restava chorar.
Chorar era algo que andava fazendo bastante no último ano. Que bagunça
estava se tornando minha vida novamente. Em um instante, eu estava
vivendo algo perto da perfeição. Recuperada de uma perda difícil, lidando
com um casamento, um enteado adolescente, trabalho, faculdade, minha
família, os planos de um futuro não tão distante, mas, de repente, tudo
parecia estar desmoronando. O que estava havendo? Castigo de Deus?

Depois de um banho demorado, minha avó apareceu com uma


xícara de chá quente.
— Noberto acaba de chegar. Servi chá para ele também.
— Vou me vestir e descer para falar com ele. Peça para que me
aguarde no escritório, por favor, vovó.
— Tudo bem.
Ela se retirou e tomei todo o chá. Vestida, penteei os cabelos depois
de secá-los e desci encontrando Noberto no escritório.
— Como ele está?
— Bem, na medida do possível. Ele ainda está na delegacia. O
advogado já pediu um habeas corpus.
— Me leve para vê-lo.
— Alguns tabloides e jornais já sabem.
— Eu não estou nem aí se serei cercada na rua por fofoqueiros de
plantão, ou tampouco ligarei para as atrocidades que devem estar falando
sobre este caso, o que eu quero é ver o meu marido, que neste momento está
pagando por um crime que não cometeu.
— Maya... Eu chequei as câmeras da cafeteria em frente à
universidade. Na hora da morte apenas um veículo deixou o local. Uma
moto. Sobre ela, havia apenas uma pessoa grande e robusta. Diria ser um
homem.
— E a outra saída do campus?
— Uma câmera de rua focava o local. Verificamos e na hora da
morte nada e nem ninguém adentrou ou deixou o campus por ali. Tudo
quieto e escuro.
— Está tudo tão estranho. Será que ninguém vê que isso tem cheiro
de armação? O que o Sr. Malone fazia na faculdade tão tarde da noite? Por
que ou o que teria o feito sair de casa e ir até lá?
— Ele chegou às dez da noite. A moto chegou poucos minutos
antes. Já pedi que verifiquem o antepassado dele. Talvez ele tenha alguma
ligação com o Higor.
— Com essas imagens, nós não podemos inocentar o Victor?
— Infelizmente não. As imagens são escuras e a pessoa usava um
capacete. Estamos tentando achar onde está a moto, quem sabe consigamos
rastrear quem a pilotava.
— Certo. Seria possível vocês conseguirem ter acesso ao telefone do
Sr. Malone? Talvez as últimas ligações possam nos dizer quem armou para
ele. Certamente a pessoa que o matou ligou minutos antes intimando ao
encontro.
— Posso cobrar alguns favores e tentar uma quebra de sigilo.
Infelizmente acesso ao aparelho será impossível, a polícia já o tem.
— Okay. Agora podemos ir até a delegacia?
— Claro. Vamos.
Entramos no carro e ele dirigiu com Elliot ao seu lado até lá. Ao
chegarmos, já havia centenas de jornalistas em frente à delegacia. Eu sequer
queria saber o que estavam escrevendo sobre mim e meu marido. Entramos
pela garagem nos fundos, onde a imprensa não tinha acesso, e fomos
levados para dentro. Depois de preencher uma enorme ficha, fui levada para
ver o Victor. Ao me aproximar da cela, meu coração afundou. Victor estava
sentado de cabeça baixa com os cotovelos apoiados sobre os joelhos.
— Amor...
Ele ergueu a cabeça colocando-se de pé.
— O que faz aqui, Maya?
— Não me peça para ficar longe de você.
— Querida... Não estou pedindo para que fique longe de mim. Estou
pedindo para que fique em segurança em casa. Sabemos quem pode estar
fazendo isso e você é o objetivo dele.
— Eu sei. Mas precisava ver você. — Lágrimas inundaram meus
olhos.
Ele estendeu a mão passando-a entre as grades e tocou meu rosto,
acariciando-o.
— Queria poder te colocar no meu colo agora.
— Você vai poder. Logo mais fará isso.
— Não quero que tente fazer nada, Maya. Noberto tem
investigadores trabalhando para nós, eles irão provar minha inocência.
Fique segura, por favor.
— Okay.
— Fim da visita — anunciou o policial.
— Eu te amo, querida. — Roçou seu polegar levemente por meus
lábios.
— Também te amo. — Segurei sua mão e beijei sua palma. — Eu
volto amanhã.
Afastei-me da cela com um enorme peso de culpa. Se eu não fosse
metida a me aventurar com qualquer um, isso não teria acontecido. Ao me
aproximar da saída, vi Noberto falar com nosso advogado. Parei um pouco
distante para escutar sua conversa.
— Se não fosse a denúncia da testemunha, Victor estaria livre. Foi
essa garota quem ferrou com tudo — disse o advogado para Noberto.
Lentamente, afastei-me deles sem que percebessem minha presença
e caminhei para os fundos. Saí pela garagem da polícia e chamei por um
táxi rumo ao hospital. Se a denúncia era o que estava ferrando com tudo,
talvez se ela fosse removida Victor seria solto. O carro parou em frente à
entrada de emergência e desci ao pagar pela corrida. Sabia que estava
desafiando uma ordem do Victor e que isso teria consequências mais tarde,
além de que poderia dar tudo errado, mas eu precisava tentar.
Entrei e recebi olhares de recriminação e espanto. Alguns deviam
estar se perguntando o que eu fazia ali. Segui até o vestiário e peguei meu
crachá no armário, que me daria acesso a alguns lugares no hospital. Saí à
procura da Naomi e a encontrei saindo da maternidade. Ao me ver pelo
vidro, desfez seu sorriso imediatamente. Uma ligeira tensão pesou sobre
seus ombros. Sem eu precisar chamá-la, ela saiu de lá e veio até mim com
um olhar superior e debochado.
— Olha só quem apareceu. Como vai o marido presidiário?
— Não ouse falar do meu marido assim. — Aproximei-me. — Você
não tem noção da desgraça que causou em nossas vidas. O seu depoimento
o colocou atrás de grades.
— Que bom. Porque é lá o lugar de um assassino!
— Victor não é um assassino! Ele jamais faria aquilo. Naomi... O
que você ouviu foram palavras cuspidas na hora da raiva. Eu conheço o
homem com quem me casei e ele não é assim! Não faria isso!
— Se veio até aqui para me implorar que eu retire meu depoimento,
não farei! — falou alto, chamando a atenção de quem passava por nós.
— Por favor, Naomi. Você sabe que aquilo foram palavras de ódio e
não uma jura de morte real.
— Vai para o inferno, Maya! — disse baixo e entredentes. — Você e
o seu marido assassino!
Deu-me as costas e se foi. Juro por Deus que quem estava a fim de
cometer um assassinato naquele momento era eu. Como eu queria poder
estrangulá-la. Deixei o hospital pela saída de emergência e tomei um táxi
para casa. Ao entrar, meu pai veio correndo em minha direção e abraçou-me
forte.
— Graças a Deus, querida! — falou aliviado e soltou-me. — Onde
você estava?
— Precisava de um tempo. Onde Noberto está?
— Aqui — respondeu ele parando atrás do meu pai.
— No escritório, por favor. — Passei por eles e segui para lá.
— Onde você estava, Maya? — interrogou ele ao entrar.
— No hospital.
— Não me diga que foi até lá falar com a testemunha? — perguntou
apreensivo.
— Eu fui sim. Tentei fazê-la entender que Victor jamais faria aquilo
e que o que ela ouviu não foram juras reais de morte, foi só a ira falando
por si, mas ela está irredutível.
— Não devia ter feito isso. Se ela for à polícia, irá complicar as
coisas.
— Ela ficou tensa quando me viu. Acho que já estava esperando que
eu fosse atrás dela. Sabe... Eu esperava que ficasse mais emotiva de falar do
assassinato, já que ela e o professor às vezes pareciam meio... íntimos
demais. Mas não vi nada disso.
— Eles tinham um caso?
— As más-línguas dizem que sim. E eu não duvidava. — Respirei
fundo e me sentei. — Alguma novidade sobre o caso?
— Não. Ainda nada.
— A polícia não está fazendo o mínimo de esforço para resolver
isso. Temos que ser rápidos. Se o juiz não aceitar o habeas corpus temos
que investigar tudo por nossa conta e risco, antes que o transfiram para a
penitenciária.
— Eu sei. Tudo que sabemos é que o professor foi atraído por
alguém até a universidade cerca de uma hora antes de ser assassinado e que
um homem em uma moto deixou o local à meia-noite e meia.
— Sabemos pouco demais.
— Maya... É preciso que você fique em casa e só saia comigo ou
com Elliot. Isso pode ser perigoso para você. Se for de fato o Higor...
— É o Higor! — interrompi-o.
— Enfim... Se for ele, tentará chegar até você com Victor fora do
caminho.
— E talvez seja disso que a gente precise para provar a inocência
dele.
— Nem pense nisso! — falou duro e rude, como quem fazia uma
ameaça silenciosa de castigo ao filho.
— Certo.
— Agora vou procurar saber se já encontraram a bendita moto.
Achar o piloto pode ser a carta de soltura do Victor.
Assenti e ele se retirou.
A noite foi passada em claro. Dormir foi tudo o que eu não consegui
fazer. Estava ansiosa e preocupada demais. Tinha medo de que negassem o
habeas corpus, de que Victor fosse levado para a penitenciária e de que
Noberto não conseguisse encontrar a maldita moto. Estava andando de um
lado para o outro em meu quarto, quando uma leve batida soou na porta e
ela foi aberta.
— Maya? — Escutei Caleb.
— Entre.
— Você está bem? Está com uma cara péssima.
— Não consegui dormir.
— Alguma novidade do meu pai?
— Não. Lamento.
— Posso ficar em casa até isso se resolver?
— Claro que pode. Aconteceu algo na escola?
— Ontem picharam meu armário. Escreveram a frase: “filho de
assassino". As pessoas estão me olhando estranho. Não me sinto mais
confortável.
— Tudo bem. Sei como é ser julgado por algo que não fez ou não
tem culpa alguma. — Sentei-me nos pés na cama. — Lamento que seu
último ano na escola esteja sendo assim.
— Você não tem culpa. — Sentou-se ao meu lado e segurou minha
mão. — Tudo vai se resolver. Meu pai não fez aquilo. E quando a polícia
descobrir terão que pedir perdão publicamente a ele.
— Com toda certeza irão fazer isso.
Descemos e fomos para a sala jantar, onde estava sendo servido o
café da manhã. Todos sentados à mesa, comemos em silêncio. A campainha
tocou e a empregada saiu para atender.
— Senhora White. São os advogados.
Levantei-me em um pulo e corri para a sala de estar.
— E então? — perguntei ansiosa parando à frente deles.
Um deles negou com a cabeça baixa.
— O habeas corpus foi negado. Segundo o juiz há provas
contundentes contra Victor — disse o outro.
— Provas contundentes? Fala sério! O que eles têm, afinal? A porra
de uma testemunha que o viu ameaçar Malone horas antes do assassinato?
— exaltei-me.
— Você precisa entender que Victor é o principal suspeito e até o
momento não conseguimos provar sua inocência. Já fazem mais de vinte e
quatro horas.
— Meu Deus! — Sentei-me com as mãos na cabeça.
— Vamos tentar novamente. Se tivermos novas informações,
voltaremos — disse o outro e então saíram.
— Filha... — chamou meu pai sentando-se ao meu lado.
— Preciso ficar um pouco sozinha.
Segui para o escritório e me sentei à mesa de carvalho. Sobre ela,
uma foto nossa no dia do nosso casamento. Aquele sem dúvidas foi o dia
mais feliz da minha vida. Fiquei ali, fechada e sozinha por um tempo, até
que Noberto apareceu.
— Encontramos.
— A moto? — Coloquei-me de pé em um pulo.
— Sim. A moto foi roubada há dois dias em um estacionamento de
um parque.
— É possível rastrear a placa?
— Para a polícia, sim. Meu investigador só consegue vir até aqui.
— Então temos que levar isso até a polícia agora mesmo. Quem
roubou a moto, certamente matou Malone!
— Acabei de falar com os advogados, eles irão encaminhar tudo à
polícia. Agora o que temos que fazer é esperar.
— Essa espera é angustiante.
— Eu sei. Mas não há mais nada que possamos fazer agora.
CAPÍTULO 22

— Prometo que isso vai acabar logo. — Victor segurou minha mão
sobre a mesa na sala de interrogatório.
— Eu sei. Noberto entregou a polícia as filmagens das saídas do
campus e o registro de roubo da moto.
— Agora é questão de tempo até eles acharam a moto e prenderem o
culpado por tudo isso. Só peço que fique em casa. Como Caleb está lidando
com tudo isso?
— Ele está se saindo bem. É um menino forte. Porém, não está
frequentando a escola. Digamos que os idiotas estão sendo uns babacas com
ele.
— Eu lamento por isso.
— Ele está com saudade. Pediu para que eu dissesse que ele ama
você.
Victor sorriu.
— Eu o amo também.
Apertei sua mão com as minhas e encarei seu dedo anelar vazio.
Quando foi detido, até isso tiraram dele.
— Quando tudo isso acabar... quero que me leve para o Havaí
novamente.
— Com o maior prazer. Só eu e você.
Sorri.
A porta foi aberta em um rompante e os detetives Washington e
Garcia entraram acompanhados de um policial.
— Será que a senhora pode nos dar licença por um minuto? —
pediu Garcia.
— Por quê? — interroguei-o com um aperto no peito.
— Queremos falar um minutinho a sós com seu marido.
— O que tem de tão grave que não pode ser dito diante da minha
esposa? — perguntou Victor.
Os detetives nos encararam e depois se entreolharam.
— Está bem — cedeu por fim, jogando uma pasta sobre a mesa.
— O que é isso? — perguntei.
— Isso é a ocorrência de roubo da moto usada para fuga do
assassinato e a atual localização dela.
— Vocês a encontraram? — perguntei esperançosa.
— Sim. Em um ferro velho. Ela estava prestes a ser desmanchada.
— A boa notícia que temos é que funcionários do hotel confirmaram
em depoimento que vocês estiveram a noite toda por lá. Porém, diante do
depoimento da pessoa que testemunhou as ameaças de morte a vítima, o
senhor neste momento está passando de assassino para mandante de
assassinato — falou Washington.
— Isso é ridículo! — Levantei-me.
— Maya! — Victor repreendeu-me.
— Não! Isso está parecendo perseguição! Vocês não percebem?
Alguém está armando para ele! Alguém invadiu o sistema de segurança a
fim de atrapalhar e vocês sequer tentaram descobrir quem fez isso. Vocês
parecem não se preocupar ou importar em saber o porquê ou o que meu
professor fazia na faculdade tão tarde da noite. A pessoa que o matou, já
estava o esperando lá, quando Malone chegou.
— É isso que vocês planejaram para parecer? Uma armação contra
Victor White? Pois eu vou dizer o que eu acho, Sra. White. Seu marido
descobriu o caso entre você e o professor, contratou alguém para matá-lo e
fez da senhora o álibi dele com uma noite de sexo em um hotel de luxo. Só
que nós iremos pegar este homem e vamos prendê-lo também!
— Ótimo! Façam isso e descobrirão que Victor é inocente. Eu não
estava tendo caso algum com aquele homem. Ele me beijou na frente do
restaurante depois de um jantar com amigos da faculdade, mas,
honestamente, não sei por que ele fez aquilo. Foi um beijo estranho, não foi
algo afetivo. Parecia obrigado. Richard Malone não estava apaixonado por
mim. Não foi um beijo roubado como tentativa de conquista.
— E se fosse armação? Quem estaria fazendo tudo isso? —
perguntou o policial.
— Tem uma pessoa. O nome dele é Higor Blackwood. Nós nos
envolvemos no passado, mas não foi nada sério. Ao menos não para mim.
Há um tempinho, a gente se reencontrou no bairro onde eu morava em
Tulsa e desde então, ele tem ficado no meu pé. Às vezes some, às vezes
aparece... Em uma das últimas visitas que fiz a minha mãe no hospital, eu o
vi do outro lado da rua me observando. Ele estava lá... parado olhando para
mim de maneira despreocupada. Ele é um homem agressivo e nunca aceitou
muito bem meu relacionamento com o Victor. Higor tentou matá-lo uma
vez. Atirou contra meu marido em meio a uma multidão. É procurado em
vários estados.
— Já machucou a senhora alguma vez? — perguntou Garcia.
— Não. Mas coisas estranhas acontecem.
— Do tipo? — perguntou o policial.
— Às vezes, sinto estar sendo observada. Em Tulsa, houve uma vez
que saí para correr em uma trilha e alguém grande, um homem, me
perseguiu. — Olhei para Victor de relance vendo a fúria tomar sua face.
Nunca havia contado nada disso para ele. — Eu corri e ele correu também.
Saí do bosque em desespero, atravessei a rua correndo e, quando olhei para
trás, ele tinha sumido.
— Você viu o rosto do seu perseguidor?
— Não. Tinha um capuz e boné que encobriam o rosto.
— Essa foi a primeira vez?
Neguei com minha cabeça sentindo um bolo se formar em minha
garganta.
— Por que não me contou sobre isso? — perguntou Victor
desapontado.
— Não estávamos juntos quando aconteceu.
— E quando houve outra perseguição? — questionou Garcia.
— Em Chicago, quando eu estava morando lá.
— Pode nos dar as características desse homem que a perseguiu?
— Posso, mas também não vi seu rosto.
— Eu vou tomar nota de tudo — disse o policial saindo da sala.
— Vamos fazer uma busca pelo sistema de trânsito da cidade com
reconhecimento facial em busca de Higor Blackwood. Se o acharmos
recentemente nesta cidade, vamos reconsiderar as acusações.
— Agora vocês estão me ouvindo? — perguntei com deboche.
— Não abusa, moça.
Saíram nos deixando a sós.
— Por que você ainda me esconde coisas, Maya?
— É que... sempre tem uma desgraça acontecendo atrás da outra em
nossas vidas, que acabei me esquecendo.
— Quando eu sair daqui... — começou ameaçador.
— Já sei! — interrompi-o. — Vai me punir, estou ciente.
Ele respirou fundo e pesado.
O policial entrou e pediu que eu me sentasse. Em seguida se sentou
à cabeceira da mesa de ferro e tomou nota das características dos
perseguidores.
— Ótimo. Os detetives já estão fazendo a busca facial pelas câmeras
da cidade. São mais de cinco mil, é basicamente impossível ele ter andado
por aí sem ter sido capturado por alguma delas.
— Vocês irão encontrá-lo. Porque é ele quem está fazendo isso. Esse
homem é um lunático. Precisa ser apanhado, representa perigo para a
sociedade.
— Nós iremos. Eu acredito em você, Sra. White — falou baixo e
levantou-se. — Mas... enquanto não apanharmos esse sociopata, o senhor
ainda está sob custódia. Lamento, mas preciso levar o senhor de volta para a
cela.
— Certo. — Colocou-se de pé.
Levantei e abracei-o.
— Eu te amo — sussurrei em seu ouvido.
— Amo você, querida — sussurrou de volta.
Saímos juntos e ele foi levado para a cela. Noberto se aproximou e
chamou para irmos embora. Ao sairmos da delegacia pelos fundos, havia
centenas de repórteres cercando o local. De dentro do carro, os flashes me
ofuscavam. Em casa, a cena se repetia. Estacionado ao meio-fio e na
calçada, havia muitos repórteres esperando pelo momento perfeito de me
cercarem. Entramos pela garagem e minha avó foi nos recepcionar na porta
lateral.
— O telefone não para de tocar. Gente de toda parte pedindo para
falar com você.
— A coisa pode ficar ainda pior, vovó. A polícia resolveu nos ouvir
e deram uma chance. Vão investigar para saber quem supostamente pode
estar armando todo esse circo. Mas, se conseguirem, Victor passará de
assassino a mandante de assassinato.
— Tudo ficará bem, minha neta. Victor é inocente e todos verão
isso. Essa gente na televisão que o difama, ainda irá pedir perdão.
— Sim. A justiça de Deus tarda, mas nunca falha.
— Está com fome? Fiz torta de maçã com canela. Você quer? Lhe
dou um pedacinho antes do jantar. Já faz quarenta e oito horas que você
quase não come.
Respirei fundo tomando-me conta disso. Há dois dias não comia
direito e tudo o que não precisávamos no momento era que eu fosse parar
em um hospital.
— Aceito sim.
Seguimos juntas para a cozinha. Depois de comer, subi para um
banho e desci para ajudá-la com o jantar. Estávamos todos à mesa comendo,
incluindo Noberto, quando a campainha tocou.
— Deixem que eu atendo. — Noberto se levantou e seguiu até a
porta, voltando segundos depois. — Maya?
— Sim.
— Me acompanhe, por favor.
— Eu já volto — anunciei aos que estavam à mesa e me retirei da
sala de jantar.
— O FBI está aqui — falou Noberto baixo em meu ouvido,
enquanto seguíamos para a sala de estar.
— O quê?
— Mantenha a calma.
— Senhora White... Como vai? Sou a agente Marshall e este é o
meu parceiro, o agente Brown. Somos do FBI. — Apertou minha mão.
— Gostaria de dizer que estou bem, mas... acredito que vocês
saibam que não.
Marshall era uma mulher alta, pele morena e cabelos pretos
cacheados na altura dos ombros. Seu parceiro era ainda mais alto que ela,
olhos claros e sustentava um black power de muito estilo.
— Imaginamos pelo que deva estar passando. Será que tem um
lugar onde seja mais reservado para conversarmos? O assunto é de seu
sumo interesse.
— Claro. Temos um escritório. Me acompanhem.
Seguimos até lá e Noberto entrou logo depois de nós fechando a
porta.
— Espero que não se importem, mas gostaria que Noberto ficasse.
— Não, de maneira nenhuma — disse o agente Brown. — Como se
sentir mais à vontade.
— Agradeço. — Sorri gentilmente. — Mas então... O que os traz
aqui?
— Em primeiro lugar, quero que saiba que, a partir de agora, quem
está no caso de seu marido, somos nós. A polícia local não fará mais parte
das investigações — falou Marshall.
— E por quê? — Uma imensa preocupação pesou em meu peito e
ombros.
— Acalme-se. Também acreditamos que seu marido seja a vítima
em toda esta história. Temos um programa legal associado aos sistemas das
polícias em todo país. Assim, quando alguém procura por um suspeito o
qual estamos atrás, ficamos sabendo e isso pode nos ajudar a pegá-lo.
— Não estou entendendo.
— Eu explico — disse Brown. — Higor Blackwood é nosso
procurado. Estamos atrás dele há meses e sempre que chegamos perto, ele
foge.
— O que mais ele fez de tão grave para o FBI estar atrás dele?
— Ele é acusado de oito assassinatos, três tentativas e dois abusos
sexuais. Além de outros delitos como: roubo à mão armada, espancamentos,
assalto a uma joalheria e suspeita de terrorismo. Este homem representa
risco eminente a nossa sociedade, Sra. White. Precisamos pegá-lo o quanto
antes — disse Marshall.
— Eu concordo. Acho que esse homem tem me perseguido desde
que tentou matar meu marido com um tiro há alguns meses em Tulsa.
Tenho medo de que eu seja sua próxima vítima.
— E nós também, por isso estamos aqui. Se não pode ser dele, não
será de mais ninguém. Pode ter certeza de que ele tentará ferir não só você,
mas também os que ama. Nos ajude, Sra. White, que ajudaremos você a
provar a inocência de seu marido.
— E como posso fazer isso?
— Maya... — Noberto começou a dizer e o interrompi com um
gesto de mão, dispensando seu comentário. Aquela conversa estava
começando a me interessar.
— Seja nossa isca.
— Não vou permitir! — disse Noberto alto.
— Você não tem que permitir nada, Noberto. Eles estão certos, não
é só mais a liberdade do Victor que está em risco aqui. A minha vida, a sua,
da minha avó, meu pai, Caleb, todos que amo. Higor tem conhecimento da
existência de cada uma dessas pessoas. Quem melhor do que eu para atraí-
lo para uma armadilha?
— Victor não irá permitir isso!
— Não é uma opção dele. Também posso ter voz ativa na minha
vida! — Encarei os agentes. — Tudo bem. Farei o que for preciso. O que
quero é me livrar dessa pedra no meu caminho.
— Ótimo! Era isso mesmo que queríamos ouvir. — Marshall sorriu.
CAPÍTULO 23

— O que é isso? — perguntei a Marshall.


— Tem um rastreador nesse colar. Assim, se ele a levar para algum
lugar, vamos achar você.
— Certo.
— Vinte e quatro horas foram o suficiente para você entender como
deve fazer tudo? Se precisar de mais tempo para se preparar, diga agora.
Essa é uma chance única de pegarmos ele.
— Estou pronta! — assegurei.
— Ótimo. Gosto de mulheres decididas. Repasse comigo o que você
vai fazer.
— Vou até a delegacia. Espero que a polícia anuncie a falsa prisão
preventiva do Victor e fujo pelos fundos. Pego um táxi e sigo até uma
locadora de carros e dirijo até Tulsa com destino ao cemitério.
— Isso mesmo. — Sorriu. — Já tenho agentes espalhados por toda
parte. Temos atiradores no cemitério. Se ele tentar algo, será alvejado antes
que chegue a um passo de você.
— Okay.
— Você vai se sair bem, tenho certeza.
— E se ele não for atrás de mim? E se suspeitar de algo?
— Ele não vai. Este homem é cego por você. Nas últimas vinte
horas um mesmo carro passou em frente a sua casa por três vezes. Poderia
ser ele ou um olheiro, ainda não sabemos. Mas o que temos certeza é de que
este homem está vigiando você de perto. Ele não vai perder a chance de se
aproximar de você quando estiver tão vulnerável. Ainda mais depois que a
prisão do Victor sair na TV.
— Tudo bem.
— Preparada?
— Estou!
— Então agora siga para a delegacia e não se esqueça. Não comente
sobre nada disso com Victor. É melhor que ainda não saiba. Paredes têm
ouvidos e você ficaria surpresa com a quantidade de policiais que vendem
informações a imprensa em troca de uma mixaria de dinheiro. Não
podemos arriscar colocar tudo a perder.
— Eu sei. Já entendi.
— Ligarei para você quando estiver a caminho de Tulsa.
Assenti.
Entrei no carro e seguimos rumo à delegacia.
— Maya? Você não tem que fazer isso. O FBI pode prendê-lo sem
você. Não vê que estão a usando como um pedaço de carne.
— Sim, Noberto. Eu vejo. Mas tenho sede e pressa de apanhar
Higor. Por favor... Sei que é perigoso, mas preciso que esteja comigo nessa.
— Não me peça isso.
— Só tenho a você para pedir isso. — Olhei para a janela.
Cheguei à delegacia e fui logo ao encontro do Victor. Ao entrar na
sala do interrogatório, abracei-o forte e beijei seu pescoço.
— O que está havendo?
— Nada. — Soltei-o e o olhei.
— Ainda não acharam nada sobre o Higor. Nem rastro dele na
cidade. Talvez não seja ele.
— Tem que ser ele.
— Maya... — Segurou minhas mãos firmes e encarou-me com
carinho. — Em minutos vão anunciar minha prisão preventiva. Serei levado
em vinte e quatro horas para a prisão.
Não consegui encenar surpresa ou espanto.
— Estou sabendo. — Abaixei meu olhar do seu. — Noberto já
conversou comigo, mas não se preocupe. Você ficará em uma ala especial e
sozinho em uma cela. Ainda poderei ir ver você até que esse pesadelo
acabe. — Lágrimas transbordaram dos meus olhos. O plano tinha que dar
certo.
— Amor... — Segurou meu rosto entre suas mãos e me fez olhar
para ele. — Prometa! Prometa ficar segura e longe do perigo até que eu
volte para cuidar de você.
Como prometer?
— Maya! — repreendeu-me. — Prometa! Prometa agora!
— Prometo — menti. Não havia outro jeito.
— Estou mais aliviado. — Puxou-me para outro abraço, apertando-
me contra o seu peito.
A porta foi aberta e dois policiais entraram.
— Victor White? — Um deles o chamou. — O senhor está sendo
levado para a prisão municipal de Oklahoma, onde cumprirá sua prisão
preventiva e aguardará pelo seu julgamento. Não tente nada. O senhor tem
direito de reservar o silêncio e da presença de um advogado para
acompanhá-lo na transferência. Alguma dúvida?
— Não!
— Algemem-no.
Não consegui conter meu choro. Aquilo era triste de se ver. Doía.
Sentia-me eternamente culpada.
— Fique calma, querida.
— Eu vou tentar.
— Vai dar tudo certo. Confie.
Então, o levaram. A porta foi fechada e eu fiquei só. Respirei fundo
e lento por algumas vezes. Precisava me centrar na missão para que nada,
absolutamente nada, desse errado. Era hora de colocar o plano em ação.
Sequei minhas lágrimas e deixei a sala de interrogatório.
Sem chamar a atenção de ninguém, caminhei para a garagem cheia
de viaturas e saí seguindo a passos largos pela calçada. Ao chegar à
esquina, um táxi passou e eu assobiei para que ele parasse. Entrei e pedi que
me levasse até a locadora de veículos mais próxima, e assim ele fez. Depois
de pagar a corrida, desci e entrei na loja.
— Bom dia. Como posso ajudá-la? — perguntou a atendente atrás
do balcão de madeira.
— Um carro, por favor?
— Que carro a senhora quer? Pode escolher por tipo, marca ou
modelo. Temos disponíveis carros sedan e SUV.
— Uma SUV.
— Temos um C4 Cactus.
— Está ótimo.
— Branca ou azul?
— Azul. — Sorri impaciente.
— Carteira de motorista e um cartão de crédito, por favor.
Abri minha bolsa e retirei minha carteira juntamente do cartão.
— Aqui estão.
— Certo. — Ela os pegou e digitou avidamente algo no computador.
— Um número de telefone?
— Quatro, zero, cinco. Cinco, cinco, cinco. Oito, dois, sete, seis.
— Quantas diárias serão?
— Apenas uma.
— Prontinho. Aqui está seu cartão e documento. O valor do aluguel
é de duzentos e cinquenta dólares por dia. Lembrando que o valor da
franquia do seguro fica bloqueado no seu cartão de crédito. Vou pegar as
chaves.
Ela saiu e demorou por alguns segundos que se pareceram horas.
Senti meus pelos do braço se arrepiarem em um calafrio e minhas costas
queimarem. Eu estava sendo observada. Algo me dizia que o plano estava
começando a funcionar.
— Aqui está. — Estendeu-me a chave.
— Obrigada. — Caminhei em direção à porta.
— Dirija com cuidado.
— Pode deixar — falei alto ao passar pela porta.
Mais à frente, havia um carrinho de flores. Não poderia dirigir por
quarenta minutos para ver o túmulo da minha mãe e não levar flores. Isso
não seria convincente para quem me observava. Caminhei até o homem que
atendia no carrinho e pedi a ele um buquê de girassóis. Ele o embalou e
entregou após pagar. Com as flores na mão, segui para o carro parado em
um estacionamento ao lado da loja. Depois de me acomodar e passar o cinto
de segurança, dei partida e segui pela rua com destino a Tulsa. Após alguns
minutos na estrada, o celular no suporte tocou e atendi a chamada através
do viva-voz integrado ao som do carro.
— Maya? Agente Marshall. Está tudo bem? Fui informada que você
já está seguindo para Tulsa.
— Sim, já estou a caminho. Não sei se estou bem, mas... irei dar
conta do serviço. Confie em mim.
— Confiar em você é tudo o que estou fazendo, Maya.
Olhei pelo retrovisor de fora do carro e vi outro veículo se
aproximar em alta velocidade e depois reduzir ficando alguns metros da
minha traseira.
— Marshall...
— Estou aqui, Maya.
— Um carro se aproximou em alta velocidade, mas não me
ultrapassou. Está a uns seis metros de mim.
— Isso é bom. Pode ser uma pessoa prudente, ou o nosso peixe
mordeu a isca. Continue na sua velocidade constante e mantenha a calma.
Tudo bem?
— Sim.
— Vou ficar aqui na ligação com você. Falta muito para chegar?
— Não. Já estou quase na entrada da cidade. O cemitério fica a uns
vinte minutos de onde estou agora.
— Perfeito. Você está fazendo um bom trabalho.
— Como Victor está?
— Bem. Ainda não contamos a ele o plano. Mas garanto que ele
está recebendo o melhor tratamento.
— Obrigada. — Respirei fundo e um pouco aliviada. — Vou dar
seta para entrar na cidade.
— Observe se ele ainda irá lhe seguir.
Dei seta e entrei à direita. O carro que agora estava mais perto me
acompanhou.
— Ele ainda está atrás de mim.
— Tudo bem, Maya. Tenho seis policiais, dois agentes e quatro
atiradores bem posicionados para proteger você.
— Okay. Estou a cinco minutos do cemitério.
— O carro ainda está atrás de você?
— Está.
Parei no semáforo e o carro fez o mesmo parando atrás de mim,
ficando a centímetros de distância da minha traseira. Meu coração batia
acelerado a ponto de explodir e minhas mãos suavam frio apertando o
volante. O sinal abriu e segui em frente dando seta novamente e entrando à
direita.
— Marshall...
— Ainda estou aqui.
— Ele ainda está atrás de mim. Está muito perto. Vou entrar no
cemitério agora.
— Certo. Se ele descer do carro primeiro que você, não desça. O
pegaremos.
— Tudo bem.
Entrei no cemitério e o carro parou na entrada por milésimos de
segundos e depois seguiu adiante.
— E então?
— Ele não entrou — falei com estranheza.
— Talvez ele ainda não queira que você o veja.
— Eu vou descer do carro.
— Okay. Agora estou vendo você. Siga com o plano.
— Vou seguir. Até mais. — Encerrei a chamada.
Lentamente, tirei o cinto e respirei calma inúmeras vezes na
tentativa vã de desacelerar meu coração. Peguei o buquê e meu celular no
suporte do painel, e desci do carro. Sem pressa, cruzei o cemitério e
caminhei até o túmulo da minha mãe. Desde que eu havia me mudado para
Oklahoma, nunca mais havia ido vê-la, ainda era doloroso demais para
mim. Abaixei-me e depositei as flores sobre o túmulo.
— Oi, mãe. Desculpe vir vê-la nessa situação. Eu sei que devia ter
vindo antes, mas é que... ainda não conseguia. É difícil saber que está aqui
— toquei a grama verde e úmida —, mas não poder tocá-la. Eu sinto tanto a
sua falta. Todos nós sentimos a sua falta. Trouxe girassóis, espero que ainda
sejam suas preferidas. — Sorri triste e com os olhos cheios de lágrimas.
Levantei-me e fechei meus olhos respirando fundo. Precisava
controlar minhas emoções, não era hora para eu desabar.
— Ao menos não agora — sussurrei para mim mesma.
Meu celular começou a tocar no bolso de trás da calça e eu o peguei
vendo um número desconhecido na tela. Na dúvida se devia ou não, atendi.
— Alô.
— Que bom ouvir sua voz.
Era ele! Higor!
— Quem é? — Fiz-me de desentendida.
— Você sabe quem está falando. Está tão linda hoje, Maya. — Riu.
Olhei espantada para os lados, mas não vi nada e nem ninguém. Onde ele
estaria? — Amor... agora podemos ficar juntos. Ele não está mais em nosso
caminho. Eu consegui! Tenho muito dinheiro para cuidar de você como
merece. Não precisa mais daquele velho.
— Foi você, não foi? Você matou Malone e culpou Victor.
— Você é inteligente. Adoro isso em você. Sabe... por tantas vezes
cheguei bem pertinho e não pude te tocar, mas ao menos senti seu cheiro.
Me desculpe pelas vezes que te assustei a perseguindo.
— Chicago?
— Sim, era eu. Em Tulsa também. Me perdoe. Foi um susto terrível,
eu sei.
— Onde você está, Higor?
— Perto. Mas não o suficiente para tocar você, amor. Vai ficar na
cidade? Preciso te ver. Fuja comigo, Maya!
Um medo imenso habitava em mim, fazendo minhas pernas e mãos
tremerem.
— Não posso.
— Você pode. Venha me ver. Rua Grey London, casa trezentos e
dois. Earth Town. Hoje, às dez da noite. Eu amo você. Não se esqueça.
Encerrou a ligação sem esperar por minha resposta. Encarei a tela
do celular afoita e corri para o carro, trancando-me lá dentro. Disquei o
número da Marshall e ela atendeu ao primeiro toque.
— Conseguimos captar as ondas da sua ligação, ouvimos e
gravamos tudo. Ele é mais esperto do que julgamos.
— Ele confessou, não é? Aquilo é o suficiente para inocentar o
Victor? — Coloquei o celular no suporte e dei partida no motor, saindo do
cemitério.
— É sim. Mas, para manter nossa mentira, Victor ainda precisa
ficar preso. Isso também é pela segurança dele. Não sabemos se Higor agia
sozinho.
Soquei o volante.
— Merda!
— Se acalme, Maya. Vamos pegá-lo. Siga para o hotel Babel
Palace. Peça um quarto no quinto andar e espere o meu contato. Se ele
ligar novamente, atenda. Estamos grampeando seu telefone.
— Okay.
— Até breve.
Dirigi até o hotel e entreguei o carro para o manobrista. Entrei e
segui até a recepção.
— Bom dia. Você teria algum quarto disponível no quinto andar? —
Entreguei-lhe minha carteira de motorista e meu cartão de crédito.
— Deixe-me ver. — Digitou no computador. — Temos sim. Para
uma ou duas pessoas?
— Uma. Apenas eu.
— Bagagem?
— Não. Vou apenas encontrar um amigo.
— Ah, okay. Entendi. — Sorriu e piscou para mim. — Aqui. Quarto
cinco mil e doze. Boa estadia.
— Obrigada.
Peguei o cartão magnético, meus pertences e subi. As portas se
abriram no quinto andar e eu caminhei até o quarto abrindo a porta e
entrando rapidamente. Ao fechá-la, meu celular tocou dentro da bolsa e eu
atendi.
— Em qual quarto você está? — perguntou Marshall.
— Cinco mil e doze.
A ligação foi encerrada e uma batida forte soou na porta. Caminhei
até ela e espiei pelo olho mágico quem batia. Era Marshall, seu parceiro e
mais dois homens. Abri a porta e os dei passagem fechando-a em seguida.
— Você foi bem, Maya. Fez tudo de acordo, mas acontece que
subestimamos Higor Blackwood. Achamos que ele agiria com um pouco de
desespero. Você está bem? Está pálida. — Aproximou-se.
— Não sei. Ele quer que eu vá encontrá-lo em uma casa do outro
lado da cidade. De que jeito isso pode acabar bem? Estou começando a
ficar com medo.
— Maya... — Ela segurou firme em meus ombros e olhou em meus
olhos. — Confie em mim. Vamos pegá-lo e tudo que tem que fazer é ir até
essa casa às dez da noite. E, em um momento de distração dele, vamos
invadir a casa e prendê-lo. Você precisa ser forte. Dependemos de você para
livrar o mundo deste homem. Por favor... Nos ajude, Maya.
Abaixei minha cabeça e respirei fundo e lento. Inocentar Victor não
seria o suficiente para termos paz. Seria preciso nos livrarmos do Higor, e
isso só aconteceria se ele morresse ou fosse preso. E morrer, era uma opção
bem distante.
— Okay. — Olhei-a. — Como vamos fazer isso?
Ela sorriu.
— Você vai entrar lá e seguir o jogo dele. Fique atenta as janelas.
Em algum momento oportuno, quando a casa já estiver cercada, vamos
pedir que você corra, se afaste, ou se jogue no chão. Lembre-se de ser
discreta. Ele não pode se sentir ameaçado. Se isso acontecer, você passa
rapidamente de isca para refém. E não queremos isso. Certo?
— Certo. Mas e agora?
— Agora descanse. Ligue para casa. Fale com Noberto. O jeito é
esperar até as dez da noite.
Assenti.
Eles se retiraram e eu segui para o banheiro. Tirei o colar, toda
minha roupa, a dobrei e coloquei sobre a bancada de mármore da pia.
Debaixo do chuveiro, tomei um banho de água quente lavando-me da
cabeça aos pés. Enquanto a água descia por meu corpo, eu pedia para que
Deus me guiasse e cuidasse de mim. Em horas eu estaria na toca do lobo.
Saí do boxe, sequei meus cabelos e me enrolei em um roupão de banho do
hotel. Deitei na cama e liguei a TV. Decidi não entrar em contato com
ninguém. Somente mandei uma única mensagem padrão que copiei e colei
para todos. Meu pai, minha avó, Noberto e Caleb. Nela, eu apenas dizia que
estava bem e que os planos mudaram um pouco, mas que estava tudo sob
controle e que logo mais chegaria em casa.
Foi angustiante a espera pelo relógio marcar nove horas. Quando
enfim os ponteiros chegaram ao número nove, levantei-me e fui ao banheiro
para me vestir. Coloquei o colar com rastreador no pescoço, voltei para o
quarto e apanhei minha bolsa, descendo para o estacionamento onde o
manobrista me trouxe o carro. Entrei, coloquei o celular no suporte do
painel e digitei o endereço no GPS. Eu sabia onde ficava o bairro, mas
desconhecia a rua. Dirigi até lá calmamente, andando sempre na velocidade
permitida e parando em todos os sinais e placas, queria adiar o inevitável ao
máximo. O GPS anunciou minha chegada, quando parei em frente a uma
casa de dois andares. A rua estava escura, quieta e silenciosa. Não havia
uma alma viva sequer pairando por lá. Aquilo me deixou ainda mais
nervosa.
Desci do carro e parei diante da casa na calçada. Ela era nova e
bonita, notava-se que era recém-construída. Cerca branca, um jardim
impecável e um passeio de pedras que levava até a varanda cheia de vasos
de flores e um balanço de madeira. Uma típica casa dos sonhos suburbana.
Algo parecido com a qual sonhei ter quando menina.
Caminhei a passos vacilantes até a varanda e subi os seis degraus.
Parei diante da porta e notei que havia um cartão colado na madeira
vermelha. Peguei-o e abri. Dentro dizia: “Entre”. Girei a maçaneta redonda
e entrei com o coração batendo fraco de medo. Uma música tocava baixo
no som da sala de estar. As luzes estavam todas acesas. O ar cheirava a
chocolate. Entrando pé por pé, cheguei à sala de estar. A lareira estava
acesa e sobre a mesa de centro, uma tigela de vidro com morangos
perfeitos. Ao lado, um fondue de chocolate preto, uma garrafa de
champanhe dentro de um balde com gelo e duas taças.
Meu celular tocou no bolso de trás da minha calça e eu o peguei
rapidamente vendo um número desconhecido chamar. Era ele quem ligava,
sem a menor dúvida.
— Alô.
— Uma noite perfeita para a minha garota perfeita.
— Onde você está, Higor?
— Aqui — disse atrás de mim.
Um calafrio subiu por minha espinha. Engoli em seco e afastei
lentamente o celular da minha orelha. Vagarosamente, olhei para trás sobre
o ombro. Meu corpo inteiro estremecia.
— Senti sua falta. Foram meses. — Caminhou em minha direção.
— Está assustada? Não precisa. Não vou machucar você. — Sorriu e tocou
meu rosto. Retraí-me instintivamente. Ele abaixou sua cabeça e cheirou
meu pescoço. — Senti falta do seu cheiro... Do seu corpo... — Apertou
minha cintura. — Vou abrir a champanhe. — Afastou-se e caminhou até a
mesa de centro.
Respirei aliviada e olhei para as janelas a minha volta. Quanto
tempo iria demorar a aparecer alguém sinalizando para eu correr? Ele
estourou o champanhe e eu me assustei com o barulho. Higor serviu duas
taças e entregou-me uma.
— Beba! Custou três mil dólares a garrafa. Espero que goste.
Levei a taça até minha boca e tomei um gole, com receio de que ele
tivesse drogado a bebida.
— Quer dançar? — Caminhou até o som e pegou o controle sobre
ele, aumentando o volume da música. — Vem. — Pegou a taça da minha
mão e a colocou sobre a mesa de centro junto a sua. — Vamos dançar.
Adoro John Mayer. — Puxou-me pela cintura e colou-me ao seu corpo. —
Acho que essa pode ser a nossa música. — Riu.
Meus músculos do corpo inteiro doíam de tensão e nervoso.
— Me abrace, Maya! — pediu rude.
Levantei meus braços e passei-os por seu pescoço. Ele segurou
minha nuca e forçou minha cabeça a se deitar em seu peito. Seus braços me
apertaram forte. Um sentimento horrível se apossou em meu coração. Meus
olhos se encheram de lágrimas e um desespero me encheu por dentro. Eu
estava à beira de surtar, gritar e sair correndo colocando tudo a perder.
— Eu comprei passagens para nós dois. Cancún. Juntos por tempo
indeterminado no paraíso. Você se chamará Kiera Charles por um tempo,
amor. Espero que tenha gostado do nome.
Lentamente, ergui minha cabeça e olhei por cima do seu ombro.
Pela janela da sala, avistei um policial tático. Ele fez sinal para que eu
saísse pelos fundos. Fechei meus olhos e soltei o ar dos pulmões, que eu
nem sabia que estava segurando.
— Preciso ir ao banheiro. — Afastei-me e o olhei. — Onde fica?
Ele encarou-me sério e de olhos estreitos.
— No final do corredor, à direita.
— Eu já volto. Quero fondue quando voltar. — Olhei-o nos olhos e
sorri, tentando não demonstrar meu nervosismo.
Ele sorriu e acariciou meu rosto. Afastei-me vagarosamente e andei
em direção ao corredor.
— Por aqui? — Apontei para a esquerda e ele assentiu.
Deixei a sala e caminhei para o banheiro, parando e olhando para
trás. De longe avistei a porta dos fundos na cozinha. Pé ante pé, fui até lá
com medo de cruzar com ele no caminho. Segurei a maçaneta e a virei
vagarosamente tentando não fazer barulho. Abri a porta e saí encontrando
uma equipe tática posicionada ali, pronta para invadir a casa. Assim que saí,
três policiais entraram com armas em punho.
— Vá para a lateral da casa, um policial a levará até a Marshall.
Assenti e corri para a lateral da casa. Um policial me guiou até um
pouco mais à frente pela calçada, onde havia uma van preta estacionada.
— Bom trabalho, Maya. Eles acabaram de apanhá-lo — ela disse e
sorriu para mim quando parei diante dos fundos da van aberta.
Nada consegui dizer. Minha respiração acelerou e um choro
convulsivo começou.
— Ei... Maya? — Ela desceu da van e segurou meus ombros. —
Acabou. O pegamos. Victor está livre. Você está livre.
De repente, um estouro alto e ensurdecedor foi ouvido. Marshall me
abraçou nos jogando no chão, protegendo-me.
— Você está bem?
— Estou. O que foi isso?
— Um tiro. — Ela se levantou e ajudou-me a ficar de pé. Marshall
contornou a van e parou. — Aí, meu Deus! — Correu para a frente da casa.
Curiosa e confusa, a segui. Higor estava jogado no jardim da frente
e dois policiais o imobilizavam. Na calçada, um paramédico prestava
atendimento a uma pessoa caída ali. Corri até lá e, ao me aproximar, não
acreditei no que vi. Naomi era quem estava caída com o peito
ensanguentado.
— Naomi?
— Você a conhece?
— Sim. Ela faz faculdade comigo. Ela é a testemunha que depôs
contra meu marido. Mas o que ela fazia aqui?
— Isso é o que vamos descobrir. Higor tomou a arma da cintura de
um dos nossos policiais e atirou nela. Um único tiro certeiro em sua
direção. Acho que ele queria matá-la — disse Marshall.
— E conseguiu. Sem sinais vitais — anunciou o paramédico. —
Lamento — disse para mim.
Olhei para trás e vi Higor ser levado para o camburão. Seu olhar era
de puro ódio. Respiração pesada e tensão muscular. Ele parecia ter o dobro
do seu tamanho. Tive ainda mais medo.
— Isso não acabou — pronunciou baixo, porém, consegui ler seus
lábios. Aquilo claramente foi uma ameaça.
As portas do camburão foram fechadas e o carro seguiu pela rua
escoltado por mais duas viaturas da polícia.
— Ele vai apodrecer na prisão, não é?
— Vai sim. Terá sorte se não pegar pena de morte ou prisão perpétua
— falou Marshall.
Respirei fundo com um pouco de alívio. No entanto, ainda me
perguntava o que Naomi havia ido fazer ali, tão longe do campus.
CAPÍTULO 24

— Obrigada mais uma vez — disse Marshall.


Segurei seus braços e ri.
— Já é a sexta vez em uma hora. Sou eu quem agradeço, Marshall.
Ela sorriu.
— Logo ele vai sair por aquela porta — apontou — e será um
homem livre novamente. O tenente fará uma retratação à mídia. Pedirá
desculpas pelas acusações iniciais e explicará o que aconteceu depois.
— Alguma chance de ele ser solto?
— Higor? Não. Nenhuma.
— Isso é bom. — Sorri com imenso alívio.
O celular dela tocou e ela o retirou do bolso interno de seu casaco
atendendo em seguida
— Marshall. — Fez uma pausa e encarou-me. — Okay. Estamos
indo. — Encerrou a ligação e guardou o celular. — Temos que ir a um
lugar. Victor ainda vai demorar cerca de uma hora até ser liberado. É
preciso um exame de corpo de delito para que não haja processos futuros
contra o Estado por danos corporais.
— Onde vamos?
— Ao covil de Blackwood.
Uma enorme tensão chegou se apossando de mim por completo.
— Tudo bem.
Saímos e entramos em seu carro. Ela dirigiu para o centro da cidade
até um prédio próximo a subestação de metrô. Descemos e entramos. Ao
chegarmos no terceiro andar, o corredor estava tomado por policiais e a
porta do último apartamento, arrombada. Adentramos e tudo era
completamente assustador. Haviam fotos minhas por toda parte pregadas
nas paredes. Fotos de mim na faculdade, no trabalho, em jantares com
Victor...
— Meu Deus! Isso parece um filme de terror.
— Agente Marshall? — chamou um policial.
— Sim.
— Acho que irá querer ver isso. — Nos aproximamos e ele virou o
laptop para nós, que estava sobre uma mesa de estudos. — É um vídeo. —
Ele apertou um botão no teclado e o vídeo de sexo começou a passar.
— É... a Naomi e Richard Malone? — perguntei.
— Sim, e na sala dele no campus.
— E não é só isso. Haviam e-mails de Naomi para Richard,
ameaçando-o a expor o vídeo que prejudicaria sua carreira, caso ele não
causasse um flagrante entre ele e a Maya — informou o policial.
— Então realmente foi tudo premeditado — falei.
— Sim. Vejam. — O policial mostrou a foto que estampou inúmeras
páginas na internet e revistas, salva no laptop. — A própria foi quem
mandou para as revistas. Os e-mails provam isso.
— Então Higor atirou nela para fazer uma queima de arquivo. Os
dois estavam juntos nessa. Isso responde o que ela fazia na casa.
— Naquela noite no restaurante, mais cedo estávamos em uma
exposição de fotos. Malone estava estranho. Talvez quem registrou a foto,
estivesse lá o tempo todo esperando pelo momento do “flagrante”. — Fiz
aspas com os dedos. — Quem sabe não lhe faltou coragem para fazer no
meio de tanta gente, por isso aceitou tão rapidamente o convite da Débora
para o jantar.
— Sim, tudo é uma possibilidade. Bom... Já sabemos que Malone
estava sendo chantageado por Naomi com um vídeo de sexo entre eles, que
poderia arruinar sua vida. Acredito que depois que Victor lhe fez uma visita
no campus, ele pensou em entregar a verdade, então Higor o calou.
— E Naomi teria sido quem o atraiu até a faculdade tarde da noite?
— perguntei.
— Talvez.
— Agora quero entender a ligação de Naomi com Higor. Seriam
amantes? Amigos? Ou... parentes? Ela se transferiu na mesma época que eu
para a universidade de Oklahoma. Acho que agora sei o porquê da sua
transferência.
— Era um jeito de ficar de olho em você.
— Temos que voltar, logo Victor será liberado.
— Agente Marshall? O contrato de aluguel do apartamento estava
no nome de Naomi Scofield. Vizinhos e o porteiro disse que ela morava
com um homem e todos reconheceram Higor sendo seu suposto namorado
— informou um policial.
— Obrigada.
Ele assentiu e se retirou.
— Vamos. Vou levá-la de volta para a delegacia.
Voltamos a tempo de encontrar Victor sendo liberado. Ao vê-lo,
sorri e corri em sua direção.
— Victor... — Abracei-o forte. — Acabou. É um homem livre e
inocente agora. — Afastei-me um pouco e beijei-o.
— Você tem uma mulher de coragem ao seu lado, Sr. White — disse
Marshall atrás de mim.
— Eu sei. — Encarou-me e sorriu. Mas seu sorriso não chegou aos
olhos.
— Estou muito encrencada? — perguntei aos sussurros.
— Talvez. Não sei se eu te venero ou te dou umas boas palmadas.
— Abraçou-me novamente.
Ri baixo no pé do seu ouvido.
— Vamos para casa?
— Vamos, por favor. Preciso de um banho decente e da nossa cama.
Despedimos da agente Marshall e deixamos a delegacia sob
milhares de perguntas da imprensa e flashes dos paparazzi. O tenente
responsável pela investigação do homicídio havia feito seu pronunciamento
minutos atrás se desculpando em público pelas acusações e explicando o
que de fato ocorreu. Um milionário preso injustamente por um assassinato
era um prato cheio para a mídia.
Seguimos para casa e, ao passar pela porta, Caleb veio correndo em
direção do pai e o abraçou. Um enorme banquete estava servido na mesa de
jantar. Após comermos, Victor e eu subimos. Ele estava exausto e tudo o
que desejou era se deitar em nossa cama, comigo ao seu lado, é claro.
— Esse tempo atrás das grades, preso em uma cela, me serviu para
pensar em muita coisa.
— Tipo o quê? — perguntei com a cabeça deitada em seu peito.
— Em mim. Você. Nossa família. Nosso futuro.
Ergui minha cabeça e o olhei. Seu olhar estava distante.
— Do que de fato está falando?
— Não quero morrer agora, Maya. Sabemos que meu problema
coronário pode me levar a qualquer momento.
— Também não quero que morra agora, amor. — Acariciei seu
rosto.
— Por isso decidi que vamos para o Canadá. Lá tem um
cardiologista excepcional. Só li maravilhas dele. Vou ligar para o médico e
ver o que ele me diz.
— O que tem em mente?
— Não sei, querida. Não sei o que o médico dirá. Talvez algum
procedimento novo, ou... um transplante, quem sabe.
— Isso seria incrível! — Sorri contente com a possibilidade.
— Não sei se a minha idade ou atual condição de saúde permitirá
isso, mas o que custa tentar?
— Estou feliz por isso.
— É... Também estou. — Sorriu. — Mas não foi somente nisso que
pensei, Maya. Eu... Eu quero filhos com você e não quero que isso demore.
Se o que o médico no Canadá tiver para me dizer não for coisa boa, quero
ter a oportunidade de ver meu filho crescer.
Meu coração disparou e os olhos marejaram. Sentei-me na cama e o
encarei completamente emocionada.
— Está mesmo falando sério?
— Estou. — Sentou-se escorando à cabeceira.
— Amor... Isso é... Isso é maravilhoso, não sei o que dizer.
Sentei em seu colo, de frente para ele, e beijei-o.
— Sei que já temos nossa família, mas quero fazê-la crescer.
— Meu Deus... Eu te amo tanto, Victor. — Lágrimas escorreram por
minha face. — Tive medo que fosse irredutível sobre esse assunto. Tive
medo que não quisesse isso comigo.
— Antes eu não queria, mas não porque não queria filhos com você.
Mas sim porque estava amedrontado. Não parava de imaginar o quanto
seria doloroso ver você e nosso filho todos os dias e saber que não faria
parte daquilo por muito tempo. Sejamos honestos, Maya. Não estou sendo
fúnebre ou precipitado. Sabemos que irei partir e você ficará aqui. Tenho
sessenta e um anos. A média em que um homem americano vive é de
setenta e cinco anos. Mas aí pensei... Muito antes viver com você e nossos
filhos feliz o tempo que tenho, do que viver em angústia me perguntando a
cada dia que amanhecer, como teria sido se eu tivesse tido filhos com você.
Não importa o tempo que tenhamos juntos. O que importa é que eu esteja
ao seu lado, junto da nossa família, fruto do nosso amor.
— Eu te amo, Victor White.
— Também amo você, querida.
Sorri em meio às lágrimas e beijei-o novamente.

Semanas depois...

O Natal havia chegado. O julgamento do Higor ainda estava


transcorrendo. Ele tinha muitos crimes a responder, no entanto, ainda se
encontrava preso na prisão municipal para o nosso alívio e proteção na
comunidade.
A data não estava sendo fácil. Aquele era o primeiro Natal sem
minha mãe. Meu pai estava abalado, eu sabia, mas não deixava
transparecer. Ele havia comprado uma casa em uma área de campo próximo
a um lago lindo e extenso, onde moraria sozinho após o Ano Novo. Lá, em
um canto especial, ele já tinha projetos de fazer um jardim de girassóis em
homenagem a minha mãe. Achei isso incrível.
Já minha avó, estava de malas prontas para voltar para Tulsa. Ela
decidiu que precisava voltar para o seu canto e espaço. Mas desconfiava
que o motivo de sua decisão de voltar para sua casa era o Will. Eles
estavam conversando bastante por telefone e ele até veio visitá-la algumas
semanas atrás. Eu desejava toda sua felicidade, independente que fosse com
ele, outro homem ou sozinha.
Então, em breve, na enorme casa no condomínio de Sta. Cruz,
restaria apenas eu, Victor e Caleb, até que eu pudesse povoar a casa com
mais filhos. Segundo a médica, não poderíamos esperar muito mais tempo,
pois quanto mais tempo os embriões ficassem congelados, menos chances
teríamos de que fecundassem. Por isso, os planos de esperar o internato
começar ficou para trás. Teríamos que antecipar isso se realmente
quiséssemos ter filhos. Mas, se caso os embriões não funcionassem, Victor
estava disposto a tentar a reversão na vasectomia, mesmo que a chance de
eu engravidar de um homem de quase sessenta e dois anos fossem de trinta
por cento.
Caleb estava animado com a ideia de ter um irmão ou irmã. O Natal
para ele nunca foi uma época fácil, sempre viveu dividido entre a mãe e o
pai, mas ele optou por ir para Houston passar a data com a mãe na clínica
psiquiátrica. Segundo ele, na última vez que nos falamos ao telefone, ela
apresentava claras melhoras e mencionou até mesmo pedir desculpas ao
Victor pela tentativa de tirar a própria vida. Isso já era um começo.
— Querida? — Victor chamou ao entrar no quarto.
— No closet.
— Uau! Está linda! — Caminhou até mim e abraçou-me por trás.
— Pode prender o colar para mim?
— Claro. — Pegou-o da minha mão e o prendeu em minha nuca.
— Acha que o vestido está bom?
— Está perfeito. Clarice acabou de chegar com a família.
— Certo. O voo da Sasha ainda não aterrissou, está com três horas
de atraso.
— Ainda não entendo por que ela não aceitou o jatinho.
— Segundo ela, não quer dar trabalho.
— Bobagem.
— Foi o que eu disse.
— Pronta?
— Sim.
— Vamos.
Deixamos o quarto juntos. O Natal não era o mesmo sem a presença
ilustre de Meredith em corpo, mas eu posso jurar que sentia a presença do
seu espírito ali. Essa sensação era fantástica. O jantar estava maravilhoso e
rever Clarice, Sammy, Grace e Sasha foi incrível. Depois da sobremesa,
todos tomavam vinho sentados na sala perto da lareira acesa.
— Maya... Querida?
— Sim. — Olhei para Victor de pé ao meu lado.
— Venha. É hora do seu presente de Natal.
— Tudo bem.
Levantei-me e o acompanhei até o corredor no térreo.
— Espere. — Segurou meu braço. — Vou vendar você.
— Me vendar? Por quê?
— Porque é uma surpresa. — Sorriu e tirou a gravata do bolso da
frente da calça. — Vire-se.
Virei-me de costas e ele me vendou.
— Confie em mim. Venha.
Segurou minha mão e seguiu em frente pelo corredor até o final.
Ouvi o barulho da maçaneta sendo girada e uma porta sendo aberta.
Andamos mais alguns passos e paramos novamente.
— Preparada?
— Sim. — Eu não conseguia parar de sorrir e de me perguntar o que
ele estava aprontando.
A venda foi retirada e o que vi era lindo. Fiquei sem palavras
admirando tudo ao meu redor.
— Você gostou?
— Meu Deus, Victor. Você... Você quem fez tudo isso?
Estávamos no último quarto do corredor. O quarto que uma vez
havia paredes com nuvens e um tom suave de azul. O quarto que uma vez
fora de um bebê e que um dia imaginei o meu ali. Ele estava de volta. O
quartinho de céu estava de volta na casa.
— Caleb ajudou a pintar as paredes.
— É lindo! Não acredito que fez isso. — Abracei-o emocionada.
— Você reparou no teto?
Afastei-me e olhei para o teto marfim. Nele, havia um mobile
perfeito com estrelas, lua e cometas.
— O antigo foi jogado fora, então, pedi que fizessem um com
detalhes mais próximos do que me lembrava do anterior.
Lágrimas derramaram por meus olhos.
— Obrigada por isso.
— Sou eu quem agradeço. Também devo desculpas a você por ter
sido tão estúpido quando nos mudamos para cá.
— Isso passou. O que importa é o agora. E agora, você mudou suas
ideias. Deseja o mesmo que eu. Uma família maior.
— E se nada der certo?
— A culpa não será sua. E depois... A adoção é sempre uma opção,
querido. Ainda será fruto do nosso amor. Se não nasceu de mim, nasceu
para mim.
— Você é incrível, Maya. É uma mulher e tanto. — Acariciou meu
rosto.
— Me tornei incrível ao seu lado. — Beijei-o.

— Meu Deus! Isso, amor!


Sua língua me sugava com avidez, quando dois dedos da mão direita
me penetraram em uma lenta tortura. O orgasmo se aproximava levando-me
à loucura. Eu gemia alto deitada sobre sua mesa, agarrando seus cabelos
com uma mão e a beirada da madeira de mogno com a outra. Aquilo era
delicioso. Estávamos há uma semana sozinhos em casa. Meu pai já havia se
mudado e minha avó voltado para Tulsa. Nós mal esperávamos Caleb sair
para a escola que nos atracávamos fazendo sexo feito desesperados por
todos os cômodos.
— Ah! Querido... Eu não consigo mais me segurar. Vou gozar!
— Então goze, amor — permitiu-me com seu hálito quente contra
minha intimidade.
Desmanchei-me em sua boca, aos gemidos e gritos exasperados.
Victor se colocou de pé e abaixou sua calça, penetrando-me em seguida.
— Mãos para cima! — ordenou.
Levantei minhas mãos e agarrei a beirada da mesa acima da minha
cabeça. Victor agarrou meu quadril firme com suas duas mãos e investiu
sua pele contra a minha com força total, chegando a chacoalhar meu corpo.
Ele debruçou sobre mim e selou meus lábios.
— Porra! Por que tem que ser tão gostosa? — perguntou ofegante.
— Estou louco para colocar a coleira no pescoço do meu bicho e levá-lo à
lua enquanto a fodo.
— Faça o que quiser. Sabe que sou sua. Sua para o seu prazer.
Sua mão apertou meu pescoço e seu corpo se afastou do meu. Ele
fodeu-me mais rápido e gozou segundos depois de mim, gemendo rouco.
Aquilo foi delicioso.
Victor pegou-me em seu colo e nos levou para o sofá. Deitados e
abraçados ali, tentávamos recuperar o fôlego enquanto seu celular tocava
pela terceira vez seguida.
— Acho melhor atender. Pode ser o Caleb.
Ele resmungou infeliz e levantou-se indo em direção à mesa de
centro. Ele pegou o celular e o encarou sério.
— Preciso atender.
— Quem é? — Sentei-me apreensiva.
— Alô. Sim. — Ele suspirou aliviado e fechou os olhos. — Isso é
bom. É muito bom. Quando? Ótimo. Estaremos aí assim que possível.
Obrigado. Continue atento e me mantenha informado. — Encerrou a
chamada e virou-se para mim encarando-me tenso.
— O que está acontecendo?
— É a Penny. Ela...
— O que houve com ela? — Levantei-me em um pulo,
interrompendo-o. — Aconteceu algo ruim? Ai, meu Deus... Eu já podia
saber, faz três semanas que não a vejo e...
— Maya, por favor, se acalme! — Segurou-me firme pelos ombros.
— Não aconteceu nada a Penny, ao menos não ainda.
— O que quer dizer com “ainda”?
— Eu não queria dizer nada para não lhe preocupar, mas há três
semanas todos os encontros com a Penny foram suspensos. Ela estava
exilada. Acredite, Brice ficou muito preocupado. Então investigou e hoje
descobriu que ela foi selecionada para algo grande, chamado Círculo
Dourado.
— O que é isso?
— É um leilão. Um leilão de prostitutas para servirem como
escravas sexuais. A maioria delas são arrematadas por Sheiks e levadas para
a Arábia.
— Meu Deus! — Cobri a boca com espanto. — Temos que tirá-la de
lá o quanto antes, Victor.
— Infelizmente eu tentei de tudo, você sabe. O único jeito de fazer
isso agora é indo ao leilão. Preciso arrematá-la.
— Isso será difícil.
— Mas não impossível. Confie em mim, Maya. Tirarei Penny desse
mundo sombrio. Eu e você, juntos, iremos ajudá-la.
— Estou com medo.
— Mas não tenha. Sou um homem de negócios e tenho dinheiro.
Muito dinheiro. Posso entrar nesse jogo e vencer.
— Eu confio em você.
CAPÍTULO 25

Na semana seguinte embarcamos cedo para Dallas. Eu estava


ansiosa e com medo. Tudo poderia dar certo ou errado. Victor estava tenso,
mas tentava não demonstrar para não me afetar.
Com muito custo conseguimos entrar em contato com Penny através
de uma mulher que trabalhava como diarista na casa onde ela e mais quatro
garotas estavam trancafiadas. Penny estava bem, mas preocupada com seu
futuro.
Entramos na cobertura e tudo estava arrumado para nós. Noberto
levou nossas malas para o quarto e Victor foi direto ao bar no canto da sala.
Sentei-me no sofá e retirei minhas sandálias. Victor veio até mim e
estendeu-me um copo com gim e tônica.
— Álcool às dez da manhã?
— E por que não? Ele costuma sair por aí a essa hora? — Sorriu
cínico e eu lhe estreitei os olhos.
— Beba comigo, amor. Vamos relaxar um pouco.
— Só você mesmo para dizer que precisa relaxar às dez da manhã
com álcool.
— Você não está tensa com amanhã?
— Estou. — Dei um gole em minha bebida.
Victor pegou minhas pernas e as colocou sobre as suas,
massageando meu pé esquerdo com sua mão livre. Dei mais um gole na
bebida e recostei-me no braço do sofá colocando uma almofada nas costas.
— Isso é bom.
— É? E isso? — Escorregou a mão para baixo da minha saia e
apertou minha coxa.
— Isso é maravilhoso.
Fechei os olhos jogando a cabeça para trás e suspirando com o toque
dos seus dedos que invadia minha calcinha. Quando seus dedos foram tocar
meu clitóris, seu celular tocou sobre a mesa de centro. Ele colocou o copo
que tinha na outra mão sobre a mesa e apanhou o celular.
— É de Shangai. Preciso atender.
Tirou minhas pernas de cima de seu colo e levantando-se as
depositou sobre o sofá. Ele atendeu sua ligação e saiu para a varanda
fechando as portas atrás de si.
— Que frustração.
Levantei-me um pouco irritada e segui até o quarto para tomar um
banho. Estava começando a achar que algumas pessoas estavam certas
quando diziam que a vida sexual decaía após o casamento. Isso estava
sendo deprimente. Não sabia mais se estava gostando de ser esposa. Era
bem melhor quando eu era sua namorada e submissa, mesmo que não por
tempo integral.
Tudo bem, eu entendia que Victor teve seus problemas de saúde e o
médico lhe restringiu sexo por alguns dias e depois disse que tudo poderia
voltar a acontecer, mas desde que fosse tudo moderado. O problema era que
nós não tínhamos nada de moderado.
Fazer amor com ele era gostoso, mas nunca, jamais, se igualaria às
nossas sessões. Não sabia se Victor estava se privando das cenas para evitar
um ataque no coração ou se era ainda para me castigar por ter me posto em
risco com Higor. Só sabia que aquilo não estava bom. Eu precisava ser
dominada. Precisava de uma cena bem-feita e, honestamente, não me
importaria se não houvesse romantismo ou cuidados nela. Eu só queria me
sentir dele de um modo que não fosse apenas como a esposa cuidadosa.
Depois do banho, saí do banheiro e fui até o closet onde estavam as
malas. Peguei a minha, deitei-a no chão e a abri. Por baixo das roupas, eu
havia trazido alguns brinquedinhos quando vi Victor ignorar a bolsa de
couro preto. Tirei todas as peças fazendo uma bagunça e apanhei os objetos,
guardando-os em uma gaveta. Depois arrumei nossas roupas no closet,
havíamos ido preparados para no máximo quatro dias. Caso algo desse
errado no tal leilão, nós teríamos que arranjar outro jeito de resgatar Penny.
Terminei de arrumar as roupas e senti a fome bater. Liguei para Noberto e
pedi para que ele trouxesse nosso almoço.
Depois de comermos, Victor passou a tarde trancado no escritório
em videoconferências e telefonemas. Irritada e sentindo-me largada, pulei
todos os canais da TV em busca de qualquer coisa que me chamasse a
atenção, mas foi sem sucesso.
À noite, o jantar chegou e eu fui até o escritório dando uma leve
batida na porta antes de entrar. Victor falava em espanhol ao telefone e fez
um sinal com o dedo para que eu permanecesse em silêncio. Sentei-me à
sua frente e cruzei as pernas o encarando com provocação. Victor desceu
seus olhos para minhas coxas expostas pela saia e respirou fundo
concordando em um resmungo com algo que a outra pessoa falava ao
telefone. Seus olhos voltaram para os meus e ele sorriu. Victor se despediu
da pessoa do outro lado da linha e encerrou a chamada.
— O jantar já chegou.
— O que pediu para a sobremesa? — perguntou recostando-se na
cadeira.
Sorri pervertida e levantei-me segurando a beirada da mesa e me
inclinando até ele.
— A sobremesa sou eu, meu bem.
Sorri e deixei seu escritório.
Após o jantar feito cheio de trocas de provocações, como: olhares,
piscadas, sorrisos – eu amava aquele flerte –, terminamos e eu levei toda a
louça para a cozinha. Enquanto limpava tudo, ele se sentou na varanda
observando a vista noturna de Dallas com uma dose de Bourbon.
Saí da cozinha e fui para a sala. Parei e fiquei observando Victor.
Mesmo depois das provocações no jantar e no escritório, ele não agiu.
Antes teria me deitado sobre a mesa e me chupado entre as pernas. Droga!
Ele estava mesmo me castigando. E que castigo mais terrível era ficar sem
seu dominador. Caminhei para o quarto e tirei toda a roupa ficando somente
com a calcinha de renda preta. Vesti um robe de seda roxo e fui ao closet.
Entrei e peguei na gaveta uma palmatória de couro com tachinhas, cordas
finas, óleo quente de amêndoas e um plug anal que ainda não havia usado
de tamanho grande.
Com tudo em mãos, voltei para a sala e depositei os itens sobre o
sofá. Caminhei para a varanda e toquei Victor nas costas, que estava de pé
próximo ao parapeito finalizando sua dose.
— O que foi, querida?
— Preciso que me amarre e me bata. Que faça de mim o que quiser,
mas que depois me foda duro.
Ele olhou-me por cima do ombro e me analisou por alguns
segundos.
— Está dizendo que precisa se submeter a mim?
— Estou.
Ele virou-se e tocou meu rosto com suavidade, fazendo carinho com
seu polegar em minha bochecha e sorriu.
— Tudo bem.
Ficou sério de repente e agarrou meus cabelos da nuca arrastando-
me para a sala.
— Tire o robe!
Fiz imediatamente.
— Agora fique de joelhos sobre a poltrona e curva-se para o
encosto.
Obedeci. Caminhei até a poltrona, fiquei de joelhos na beirada do
assento e me curvei para a frente apoiando as mãos no encosto.
Sem olhar para trás, o ouvi caminhar até o sofá e depois até mim.
Suas mãos tocaram minhas nádegas e começaram a espalhar o óleo, que
rapidamente esquentou em minha pele. Puxando minha calcinha para o
lado, ele penetrou um dedo lentamente em meu ânus e o movimentou
algumas vezes antes de tirar e colocou em seguida o plug que entrou
apertado demais causando dor. Gemi alto sentindo um grande ardor.
— Não tenho culpa se doeu. — Agarrou meus cabelos puxando
minha cabeça para trás. — Foi você quem o pegou — sussurrou em meu
ouvido.
Sorri com o toque do seu hálito quente em minha orelha e pescoço.
Victor me soltou e se afastou voltando em seguida ficando à minha
frente.
— Una os antebraços!
Assim fiz. Ele amarrou meus antebraços com a corda, os mantendo
presos um ao outro, bem apertado, e depois laçou a fina corda em meu
pescoço passando por baixo dos seios e cruzando nas costas, mantendo os
braços junto ao peito.
Victor foi para trás de mim e eu me curvei mais para frente,
arrebitando bem minha bunda para ele. Sem o menor aviso, ele bateu com a
palmatória em minha nádega com uma força tão grande, que nunca o vi
usar antes. Ele bateu outra vez na outra nádega e eu o escutei gemer em
satisfação. Ele continuou a bater e bater, respirando com alívio enquanto eu
gemia de dor e prazer. Estava sendo submetida para aquele que amava
servir. Victor bateu em minha bunda e coxas, as fazendo queimar como
brasa.
— Era isso que queria? Ou você sabe que era isso que merecia? —
perguntou em um intervalo entre uma chibatada e outra.
Gemi alto fechando os olhos com força.
— Eu sei que mereço. E se mereço, é o que eu quero — disse
ofegante.
Victor bateu mais duas vezes com mais força e parou. De cabeça
baixa escutei seus passos e senti sua presença parando novamente à minha
frente. Ele agarrou meu rosto apertando minha mandíbula e me fez o olhar.
— Da próxima vez que me desobedecer, ficará por um dia presa na
cruz! Apenas sendo torturada — disse sério e rude, encarando-me nos
olhos.
Soltou meu rosto e agarrou meu cabelo puxando minha cabeça para
trás.
— Não será fodida esta noite.
Encarei-o incrédula. Como não?
— Preciso sentir você — sussurrei.
— Terá que fazer mais para merecer que eu lhe proporcione prazer.
Aquilo havia sido um banho de água fria. Eu estava excitada, pronta
para ele.
Victor caminhou até o sofá e sentou descendo a calça junto da
cueca, expondo seu pau duro como pedra.
— Venha até aqui!
Caminhei até ele e me ajoelhei à sua frente.
— Boa garota. — Acariciou meus cabelos, como se alisasse a
cabeça de um cão. Mas era isso que eu era naquele momento. Uma cadela
sendo castigada.
Agarrado aos meus cabelos, ele puxou minha cabeça até seu
membro, fazendo-me engoli-lo por inteiro. Que delícia era sentir sua carne
em minha boca e seu cheiro tão másculo. Victor grunhiu contido e ergueu
seu quadril fazendo com que eu engolisse mais dele. Aquilo chegou a me
sufocar. Ele não largou minha cabeça, a pressionando para baixo, e nem
abaixou seu quadril. Já estava sentindo ânsia de vômito. Meus olhos
lacrimejavam e meu corpo se arrepiava. Até que, por fim, ele desceu seu
quadril e soltou minha cabeça.
Enquanto recuperava meu fôlego, ele ria baixo. Aquilo para ele
devia estar sendo divertido. Mas para mim estava sendo uma tortura e tanto.
Meu clitóris pulsava clamando por um alívio. Meus seios doíam chamando
por sua boca.
Victor agarrou meus cabelos outra vez e trouxe minha cabeça de
volta ao seu pau. Abocanhei-o com desejo e vontade, e o chupei. Ele gemeu
alto e soltou meus cabelos agarrando minha nuca.
— Que maravilha de boca! — disse rouco.
Continuei o chupando enquanto um calor crescia dentro de mim
flamejando minhas partes íntimas. Eu poderia gozar a qualquer momento
apenas em vê-lo gozar.
Ele apertou mais minha nuca e gemeu. Seu pau estremeceu em
minha boca e, de repente, ele puxou minha cabeça para trás, afastando-me
dele. Com a mão direita, ele se punhetou gozando em minha face. Era tanto
gozo que chegou a escorrer por meu queixo caindo nos seios. Há muito
tempo não o via gozar assim.
— Que linda! — Sorriu.
Passei a língua em torno dos lábios e apanhei o que consegui. Seu
sabor era indescritível e único.
— Gostoso, querida?
— O sabor mais afrodisíaco que já provei.
Ele se inclinou e chegou bem perto dos meus lábios, mas não me
beijou como eu desejava tanto.
— Quando tudo isso passar, quero levar você a um lugar especial
em Nova Iorque.
Sorri ansiosa.
— Vou enlouquecer você — sussurrou e mordeu meu lábio inferior.
Victor se levantou e vestiu a roupa, indo em seguida até o bar.
— Fique aqui como está e de cabeça baixa até eu mandar que você
saia. — Serviu-se de mais uma dose de Bourbon e virou-se para mim. —
Não quero ouvir a sua voz, ou um resmungo que seja — disse rude e sério.
— Sim, meu Senhor.
Abaixei minha cabeça e fiquei em absoluto silêncio, apenas
escutando seus passos ecoarem pelo espaço da sala, sumindo pelo corredor.
Fiquei assim por horas. Enquanto trabalhava em seu laptop, Victor
passou por mim diversas vezes indo da poltrona a minha esquerda para o
bar e tratou-me como se eu nem ali estivesse. Ser ignorada me irritou. Eu
queria estar fodendo loucamente com meu Dono e marido.
Respirei fundo, cansada, e ele ouviu, vindo até mim. Cheguei a
estremecer imaginando o que ele faria a seguir, mas nada fez. Ele sentou-se
no sofá à minha frente e ergueu meu queixo fazendo-me olhá-lo.
— Está cansada? Está aqui há três horas.
Assenti.
Ele desatou as cordas e estendeu-me suas mãos, ajudando-me a
levantar, e puxou-me em seguida para o seu colo. Cansada e com braços e
pernas meio dormentes, aninhei-me nele.
— Você se saiu bem. Talvez mereça uma recompensa.
Olhei-o.
Ele sorriu minimamente e desceu sua mão direita invadindo minha
calcinha. Só o calor de sua mão me fez estremecer e suspirar. Seus dedos
tocaram meu clitóris e começaram a massageá-lo em movimentos lentos e
circulares. Eu gemi baixinho, contido e agarrei sua camiseta branca com
minhas duas mãos. Seus dedos tomaram mais agilidade, espalhando um
calor dentro do meu ventre. Senti que o orgasmo estava se aproximando.
Gemi alto e ele notou isso.
— Goze! Goze na mão do seu Dono... Na mão do seu marido!
Abri meus olhos que estavam fechados e encarei-o. Victor
continuou com os movimentos e eu gozei gritando loucamente desejando
mais e mais.
Ele se levantou comigo em seu colo e nos levou para o quarto
deitando-me na cama.
— Durma. — Beijou minha testa e me cobriu.
— Você não vem?
— Logo mais.
Deixou o quarto e eu fechei meus olhos exausta, dormindo sem
demora.

Na manhã seguinte, acordei primeiro que Victor. Levantei e segui


direto para o banheiro, precisava de um bom banho da cabeça aos pés.
Quando saí, ele já não estava mais na cama. Vesti-me e deixei o quarto indo
para a sala.
Atravessando o corredor, o cheiro de café entrou por minhas narinas
embriagando-me. Ao me aproximar da sala, escutei Victor falar baixo com
o segurança que estava tendo encontros regulares com Penny.
Voltei um passo para trás me escondendo no corredor e comecei a
ouvir a conversa deles. Eles falavam sobre o leilão.
— Noberto é quem irá comigo, você ficará com a Maya.
— Com todo respeito, senhor. Mas o correto seria eu lhe
acompanhar. Já procurei saber tudo sobre esse leilão. Talvez Noberto seja
quem deva ficar com sua esposa.
— Eu sei o tamanho e motivo de sua preocupação com Penny,
Brice. Eu não nasci ontem, rapaz. Mas eu prefiro que Noberto vá comigo.
Você também terá de confiar em mim.
O segurança respirou fundo e assentiu.
— Agora, por favor... Busque meu smoking.
— Com licença, senhor. — Saiu fechando a porta.
Victor suspirou cansado e passou as mãos pelo rosto.
— Quando iria me contar que estava pensando em ir sozinho? —
perguntei entrando na sala.
— Essa mania de ouvir conversa dos outros é bem feia.
— Se a conversa envolve a mim, ela não é somente dos outros!
— Maya, por favor... Pare!
— Eu vou com você.
— Não! Você não vai! Aquele lugar não é ambiente para você! —
gritou.
— Não grite comigo! E não tente me impedir. Ela é minha amiga e
eu quero estar lá com você. Penny precisa de mim, mesmo que longe.
— Não vou deixar que me acompanhe. Trancarei você aqui, se
preciso for. Esse lugar é um ambiente do submundo, Maya. Você não
entende que pode ser perigoso. Eu tenho planos para sequestrar Penny esta
noite caso tudo dê fora do planejado. Não irei expor você ao perigo.
— Não importa o que diga ou qual seja seus planos, eu vou!
— Por que tem que ser tão teimosa?
Não respondi sua pergunta. Dei-lhe as costas e voltei para o quarto.
Caminhei até o closet e tirei o vestido leve que usava.
— O que está fazendo?
— Vou sair.
— Onde pensa que vai?
— Comprar um vestido para esta noite.
Vesti uma calça jeans e uma blusa de alças finas.
— Maya... — pronunciou meu nome em tom ameaçador. — Estou
por um triz de dar uma surra em você.
— Pode fazer isso mais tarde quando voltarmos com Penny para
casa.
Calcei as sandálias e deixei o closet passando por ele. Victor gritou
por mim vindo logo atrás a passos apressados. Ao chegar na sala, a porta foi
aberta e o segurança entrou segurando o smoking do Victor. Passei rápido
por ele e saí pela porta ouvindo Victor o mandar ir comigo.
— A senhora não devia fazer isso — disse ele quando estávamos no
elevador. — É perigoso. As mulheres que acompanham os homens a esse
leilão são escravas sexuais e não esposas.
— Como é mesmo o seu nome?
— Brice.
— Brice, eu não pedi a sua opinião. E se meu marido não conseguiu
mudar minha ideia, não será você a fazer. — As portas se abriram eu saí na
frente.
O que mais eu teria de fazer para Victor perceber que não era mais
uma menina frágil e sim uma mulher capaz de lutar contra um mundo.
Apesar de sempre ter gostado de sua proteção, eu havia crescido e me
tornado alguém capaz de me cuidar sozinha.
CAPÍTULO 26

Andei por muitas lojas até que encontrei uma, na qual comprei o
vestido. Voltei para o apartamento e quando entrei, Victor estava com cara
de poucos amigos sentado no sofá da sala tomando uma dose dupla de
uísque.
— Cheguei.
— Você não vai!
— É claro que eu vou. Não sei se percebeu, mas isso não está em
discussão.
— Por que tem que ser tão teimosa? — gritou levantando-se.
— Pode gritar o quanto quiser! Penny é minha amiga e eu vou! Será
possível que, depois de tudo que passamos no último um ano e meio, você
não percebeu que não sou mais a menina frágil que todos costumavam
passar por cima? Victor, eu posso fazer isso e eu vou! Pode chamar de
burrice, teimosia, ou do que mais você quiser. Para mim, o que estou
fazendo é uma ação após uma decisão.
— Você só toma decisões erradas.
— Não diga isso. Voltar para você me exigiu uma decisão. Casar
com você também. Não considero nenhuma delas errada.
Joguei o vestido sobre o sofá e caminhei até o bar ao canto,
servindo-me de uma dose de rum com passas.
— Eu te amo. E amo me submeter a você. — Virei-me para ele. —
Mas não espere que eu faça isso agora, porque não vou. Pare de me
enxergar como uma incapaz. Sou sua esposa e posso mais do que imagina.
A dura que a vida me deu quando estávamos longe me ensinou muita coisa.
E uma delas foi ser uma mulher capaz de fazer o que eu quiser.
Caminhei até meu vestido e o peguei indo para o quarto. Victor não
disse mais nem uma palavra sequer.

Depois do almoço, no qual comi sozinha enquanto ele se trancava


no escritório, segui de volta até o quarto para me arrumar para o leilão. Já
passavam das oito quando ele entrou no quarto. Eu estava parada diante de
um imenso espelho próximo as portas francesas, colocando os brincos
quando o vi entrar pelo reflexo. Victor caminhou até mim e parou a um
passo de distância.
— Você está linda.
— Obrigada. — Sorri.
O vestido escolhido às pressas era um modelo tomara que caia,
longo, dourado e com algumas aplicações de cristais translúcidos entre os
seios. O tecido era fino e sedoso. Na perna esquerda subia uma fenda até
pouco acima do joelho. Meus cabelos estavam presos em um coque baixo e
alguns fios soltos contornando o rosto. Nas orelhas coloquei brincos longos
de diamantes e ouro branco. Nos pés calcei sandálias prata de tiras finas. É,
eu estava realmente muito bonita.
Victor seguiu para o banheiro e, pronta, fui para a sala. Demorou
menos de uma hora e ele já estava pronto usando uma camisa, smoking
preto com lapela de seda azul-marinho e gravata borboleta de mesma cor.
Ele prendeu as abotoaduras nos punhos e olhou-me com uma feição dura.
— Vamos? — chamou-me.
— Vamos.
Caminhamos para o elevador e descemos. O caminho até o salão o
qual sediaria o leilão era longe. O trajeto foi feito todo em silêncio. Victor
sequer olhou-me.
Quando chegamos, Noberto anunciou e uma enorme tensão
percorreu meu corpo deixando meus músculos duros. Só Deus sabia o que
aconteceria dali para frente. Victor segurou meu braço chamando minha
atenção para ele. De dentro do bolso interno em seu paletó, ele retirou
minha coleira de ouro e pedras preciosas.
— Preciso que use isso.
Respirei fundo e olhei pela janela. Nem todos os homens que
chegavam estavam acompanhados, mas aqueles que estavam era bem nítido
que aquelas mulheres não eram suas esposas ou namoradas. A maioria delas
estavam com seus punhos algemados aos do homem com quem estavam.
Claramente estávamos na porta do submundo.
— Tudo bem.
Virei-me de costas e ele colocou a coleira em meu pescoço.
— Não importa o que aconteça, ou o que alguém lhe diga, não abra
a boca, Maya. Isso não é os eventos da alta sociedade que frequentamos.
Isso aqui é escravidão em pleno século vinte e um. Por favor... Fique por
perto o tempo todo ou eu algemarei seu punho ao meu como aquelas
mulheres lá fora.
— Certo. Ficarei de boca fechada e ao seu lado. — Olhei-o por cima
do ombro.
Victor estava tão nervoso quanto eu. Sua respiração estava pesada e
seus ombros estavam rígidos como pedras.
A porta foi aberta e um homem estendeu sua mão para mim. Aceitei
sua cortesia e desci da limusine. Victor veio logo depois de mim e seguimos
de braços dados escadaria acima forrada por um tapete vermelho.
Não houve uma pessoa ao nosso redor que não tenha nos encarado
de cima a baixo. Aquilo era assustador. A forma como os homens me
olhavam, avaliando meu corpo como se eu fosse um objeto à venda ou em
exposição, era de se enojar.
Entramos e logo serviram champanhe ao Victor. Por nós passou um
homem arrastando uma mulher pelos cabelos, a empurrando.
Victor apanhou sobre uma mesa um álbum onde continha fotos de
rostos das mulheres a serem leiloadas, o valor do lance inicial e o número
do seu lote. Se tudo acontecesse na ordem das numerações, Penny seria a
décima primeira mulher a entrar no palco. Seu valor inicial era de trinta mil
dólares. Ver sua foto me causou uma tremenda angústia e aperto no peito.
Queria poder sair correndo procurando por ela e levando-a dali.
— Fique calma — sussurrou Victor para mim.
Respirei fundo e permaneci de cabeça baixa.
— Belas garotas, não? — perguntou um senhor se aproximando de
Victor.
— Lotes incríveis — respondeu ele e forçou um sorriso para o
homem.
— O leilão de Madison foi muito bom, teve belas virgens. — Riu.
— Consegui levar para casa uma cadela de dezoito aninhos.
Aquilo era repugnante de se ouvir. Como isso podia estar
acontecendo? Onde estão as autoridades que não fazem nada? A vontade
que eu tinha era de socar e cuspir na cara daquele velho babaca dos
infernos. Victor me olhou com um olhar tenso. Acho que temeu eu ter uma
reação naquele momento.
— E então.... Você esteve lá?
— Infelizmente não pude comparecer — respondeu Victor ao velho.
— Mas acredito que tenha sido um bom lote.
— E como foi! — Riu o velho gordo de bigode grisalho e gravata
cowboy de estrela, que não combinava em nada com o smoking cinza-
escuro que usava.
Ele virou o restante do seu champanhe e me encarou dos pés à
cabeça. Quando seus olhos chegaram ao meu, ele fez um bico com os lábios
como quem estava jogando um beijo no ar para mim.
— Me diga, amigo... Onde conseguiu essa belezinha. Ela tem um ar
de égua selvagem. Preciso de uma dessas.
— A encontrei aqui mesmo no Texas.
— Custou caro?
— Muito.
— Muito quanto? — O velho encarou Victor com olhos estreitos.
— Sete milhões.
O velho assobiou e arregalou os olhos.
— Deve ter uma boceta gostosa, não é?! — Estendeu a mão para
tocar minha parte íntima e eu dei um passo para trás assustada.
Victor segurou o braço do homem com força e tomou minha frente.
— Não ouse tocar nela — disse entredentes.
— Pago o dobro.
— Ela não está à venda.
— Vinte milhões.
— Já disse, amigo — pronunciou sua última palavra com sarcasmo.
— Ela... não... está... à venda — falou pausadamente.
O velhote riu alto e assentiu.
— Se apaixonar pela mercadoria é um erro. Vejo isso em seus olhos.
Livre-se dela enquanto ela não lhe aplique um golpe e fuja. Ouça a voz da
experiência. Se mudar de ideia... — tirou de dentro do paletó um cartão de
visitas — é só me ligar. — O entregou a Victor, que o pegou e descartou
jogando para o lado no chão.
— Não mudarei de ideia.
O velho o encarou imensamente ofendido. Sua respiração pesou e
sua mandíbula se contraiu. Um sorriso sarcástico e perigoso surgiu em seus
lábios. Sem dizer nada, ele se afastou.
Eu estava tão tensa e nervosa, que mal conseguia respirar. O clima
ali era pesado demais. Victor virou-se para mim e me encarou nos olhos.
Ele não precisava abrir a boca para eu saber o que queria me falar naquele
instante. Seu olhar repreensivo era puramente de quem dizia: “Era por isso
que eu não queria que viesse”. Respirei fundo pela milésima vez tentando
me manter calma. Ele pegou minha mão e caminhamos para longe dali.
Logo um homem apareceu e agradeceu a presença de todos em um
microfone. As portas atrás dele foram abertas e todos começaram a
caminhar para dentro do outro salão onde havia um enorme palco e uma
cortina vermelha ainda fechada.
Todos entraram, as portas se fecharam e as cortinas foram abertas.
Um homem e uma mulher surgiram e desejaram uma boa-noite antes de
começarem a falar as regras do leilão: sem brigas ou desavenças, celulares
desligados e etc.. Atrás deles, outra grande cortina dourada. Uma plaquinha
de número sessenta e dois foi entregue a Victor.
O leilão começou e as cortinas douradas se abriram revelando uma
garota que não devia ter mais que dezoito anos. A menina chorava
silenciosamente e tinha um olhar imenso de desespero. Eu precisava fazer
alguma coisa por aquelas mulheres. Aquilo ali tinha que acabar!
A garota de lance inicial de cinquenta mil dólares foi arrematada por
dois milhões e meio. Ela era virgem e norueguesa. A segunda mulher era
uma brasileira, morena, de vinte e dois anos. Seu lance inicial era de trinta
mil dólares e seu arremate foi de um milhão e duzentos mil dólares. Assim
seguiu o leilão. A cada mulher naquele palco, uma no salão sentia por ela e
meu coração se despedaçava. Para aqueles homens, elas não passavam de
um pedaço de carne ambulante para o seu prazer.
Enfim, as cortinas se abriram e Penny apareceu. Meu coração
despedaçado bateu tão acelerado que meus seios chegavam a tremer. Ela
estava bem mais magra e, mesmo maquiada, percebia-se que ela estava
abatida.
— Esta linda loira tem vinte e dois anos, um metro e setenta de
altura, pesa quarenta e nove quilos e tem um lance inicial de trinta mil
dólares. A garota é experiente, tem uma excelente referência e um corpo
fabuloso. Os lances estão abertos.
Segurei a mão de Victor entrelaçando nossos dedos com força.
— Aqui. — Ele levantou a placa.
— Cinquenta mil aqui. — O velho de momentos atrás, o qual tentou
me tocar, ergueu sua placa e encarou Victor com um sorrisinho vingativo.
— Merda — murmurei em um sussurro.
— Oitenta mil aqui — ofereceu outro homem.
— Duzentos mil — ofereceu Victor.
— Trezentos mil! — gritou o velho e começou a andar em nossa
direção.
— Trezentos e cinquenta — ofertou outro homem.
— Quinhentos mil — ofereceu Victor.
— Seiscentos mil aqui! — gritou o velho chegando mais próximo.
— Um milhão — ofertou Victor apertando minha mão.
— Um milhão e meio — ofereceu o velho parando ao lado do
Victor.
— Dois milhões! — gritou Victor encarando o velho com uma fúria
imensa.
Olhei para o palco e vi que Penny já havia nos notado. Ela respirava
ofegante e parecia não estar dando conta de se sustentar de pé. Uma vez ou
outra, ela cambaleava para o lado e era amparada por um homem que ali
estava.
— Dois milhões e meio — ofertou o velho. — Sou muito rico.
Posso brincar disso a noite toda. — Ele demonstrava estar se sentindo
despeitado.
— Também sei brincar de gastar dinheiro — disse Victor. — Cinco
milhões aqui. — Levantou alto sua placa.
— Sete milhões aqui! — gritou o velho.
Olhei novamente para o palco e vi Penny desmaiar, mas antes que
ela pudesse atingir o chão, um homem a segurou.
— Eca! A mercadoria está estragada. Ela é toda sua — disse o velho
enojado.
— Sete milhões e cem — ofertou Victor.
— Mais alguém? — perguntou a mulher, enquanto Penny era
retirada do palco. — Não? Vendida para o senhor de número sessenta e
dois. — Bateu o martelo e sorriu constrangida para o público. — Não se
preocupem, está tudo bem com as meninas. É apenas um desmaio por
ansiedade. — Forçou um riso.
Penny não estava bem, o que a levou a um desmaio não havia sido
ansiedade.
— Com licença — pediu um homem parando ao lado de Victor. —
Pode me acompanhar, por favor, senhor.
Ele assentiu e nós o seguimos.
— Sei que é inconveniente da nossa parte retirá-lo do leilão, mas a
garota, a partir desse momento, passa a não ser mais nossa
responsabilidade. Pedimos gentilmente que a retire do recinto, o que ela tem
pode ser contagioso ou não para as nossas outras garotas. Espero que
compreenda.
— Claro. E onde ela está?
— Por ali, senhor. Segunda porta à esquerda.
— Obrigado.
Seguimos pelo corredor e Victor abriu a porta entrando primeiro.
Assim que entrei e vi Penny desacordada deitada em um sofá, senti um
misto de alívio e preocupação. Era ela. Ela não estava bem, mas estava ali e
viva. Finalmente Penny estava livre. Depois de meses conseguimos livrá-la
daquilo tudo. Corri ao seu encontro e me ajoelhei ao seu lado. Ela estava
quente e suava frio.
— Penny... — chamei-a acariciando seu rosto. — Penny, por favor,
acorde. — Comecei a chorar incapaz de conter minha emoção.
Victor se aproximou de uma bancada e pegou um lenço de pano
sobre ela, uma garrafa de uísque e despejou a bebida no pano azul. Ele veio
até nós e colocou o pano encharcado próximo ao nariz de Penny.
— Isso pode ajudar.
— Vamos, Penny. Por favor, acorde.
Ela resmungou e virou a cabeça para o outro lado.
— Ela está fraca, acho que talvez não acorde. Precisamos levá-la
daqui agora! Fique com ela. Eu já volto. Tranque a porta quando eu sair.
Assenti.
Victor saiu e eu corri para trancar a porta. Voltei até Penny e me
ajoelhei novamente ao seu lado.
— Me desculpe por ter demorado tanto. Nós tentamos tudo o que foi
possível, mas aquele maldito estava irredutível. Desculpe você ter chegado
a isso.
— Não foi culpa sua — sussurrou fraca de olhos fechados. — Nada
disso é culpa sua.
— Você vai ficar bem agora. Vou cuidar de você. Ouviu? Você está
livre!
Ela não mais respondeu. Chequei seus batimentos e eles estavam
fracos. Ela precisava de atendimento médico imediatamente.
Uma batida na porta foi ouvida e eu sabia que era Victor. Corri até lá
e abri a porta. Brice foi o primeiro a entrar. Ele caminhou a passos largos
até Penny e a pegou em seus braços. Seu semblante era triste. Era ele quem
tinha todos os encontros semanais com ela e levava todos os meus recados e
trazia os seus. A primeira vez que o vi próximo a ela, eu desconfiei que algo
poderia estar acontecendo, mas não imaginava que tudo tinha tomado uma
proporção de sentimentos maior. Isso era visível em seu rosto. Ele tinha
medo de perdê-la tanto quanto eu.
— Precisamos ir para um hospital agora, os batimentos dela estão
fracos.
Brice olhou-me com pesar.
— Vamos — chamou Victor.
Um homem nos levou até uma saída nos fundos e nos desejou sorte
com a “mercadoria”, assim ele tratou Penny. Brice o olhou com o maxilar
contraído e ombros tensos.
— Ignore isso — pedi a ele. — Temos que cuidar dela agora.
Ele assentiu.
Entramos na limusine e seguimos para o hospital. Brice entrou com
Penny nos braços pedindo por ajuda e logo duas enfermeiras surgiram com
uma maca. Levaram ela para a sala de emergência e disseram que logo mais
voltariam com informações. Vê-la naquele estado me matava por dentro.
— Vai ficar tudo bem, querida. — Victor abraçou-me.
— Eu sei. Mas é de partir o coração vê-la nesse estado.
— Vamos cuidar dela. Se bem que... acho que Brice é quem fará
isso.
Afastei-me um pouco e olhei para ele. Brice ainda estava parado
próximo à porta da sala por onde levaram Penny. Ele sequer parecia piscar.
— Tomara que ele seja bom com ela. Penny merece alguém assim
em sua vida, ainda mais depois de tudo o que passou.
— Sim, ela merece.
Mais de uma hora passou até que uma médica surgiu.
— Vocês são da família?
— Sim — respondi rapidamente.
— Penélope está com anemia e desidratação severa. Isso foi causado
por uma má alimentação e falta de água no organismo, é claro. Fora isso,
ela está com uma gripe forte causada pela deficiência de nutrientes.
Fizemos uma radiografia no peito para descartarmos uma pneumonia e está
tudo bem. Solicitamos alguns exames de sangue que ficarão prontos pela
manhã. Ela foi levada para um quarto e está recebendo medicamentos junto
ao soro, que está correndo direto na veia.
— Podemos vê-la?
— Claro.
Seguimos até o quarto e somente eu entrei. Penny estava acordada e
olhava com um semblante vago o céu pela janela.
— Como está se sentindo?
Ela virou seu rosto para mim.
— Com muita dor no corpo e cansaço.
— Isso vai passar. — Sorri e peguei sua mão.
— Onde está Brice?
— Lá fora. Ele vai entrar daqui a pouco. Quer me falar sobre vocês?
— Ele disse que está apaixonado por mim em nosso último
encontro, Maya. Eu não tive a melhor reação. Senti medo de ser amada por
alguém, sabe? Isso é pavoroso, nunca aconteceu. Ele ficou chateado e
depois coisas aconteceram e eu não pude vê-lo mais. Sequer tive a chance
de me redimir com ele. De dizer que também estou apaixonada por ele.
— Fico feliz por isso.
— Ele é um amor. Um homem bom. Acha que temos chance de ser
feliz, mesmo com o meu passado conturbado?
— Acho sim. Quando a gente ama, tudo é possível. Olha só para
mim e Victor. Quem diria que depois de tudo o que passamos, estaríamos
casados hoje e pensando em ter filhos. — Sorri.
— Filhos?
— É uma longa história. Vamos poder falar sobre isso depois. —
Acariciei seu braço. — Agora vou sair e deixar Brice entrar. Ele está morto
de preocupação. Você tinha que ver a carinha dele quando pegou você
desacordada nos braços.
Ela sorriu.
— Também quero ver ele.
— Boa noite, Penny. Eu volto amanhã cedo. Não vou dizer que irei
ficar, porque sei que Brice é quem está louco para fazer isso.
Rimos.
— Até amanhã.
Beijei sua testa e deixei o quarto encontrando Brice parado no
corredor, escorado a uma parede com as mãos no bolso e cabeça baixa.
— Ela está esperando por você.
Ele assentiu e andou em direção à porta do quarto.
— Brice?
Ele parou e olhou para mim.
— Ela só precisa de alguém que cuide dela agora e a faça feliz. Seja
essa pessoa.
— Não irei decepcioná-la, Sra. White.
Sorri e ele entrou fechando a porta logo atrás de si. Caminhei pelo
corredor à procura de Victor e o encontrei falando ao telefone. Ao me ver
aproximar, ele encerrou a ligação e abraçou-me.
— Vamos? Estou cansada.
— Vamos. Brice irá ficar?
— Vai sim.
— Ela estará segura com ele.
— Não tenho dúvidas disso. — Ri.
CAPÍTULO 27

A semana havia passado muito rápido. Penny havia recebido alta do


hospital e iria se tratar em casa e consultar o médico em Oklahoma. Insisti
para que ela viesse ficar comigo e Victor, mas Brice havia feito um convite
irrecusável a ela para ficar com ele em seu apartamento.
Eu já estava de volta a faculdade e na última semana do meu
estágio. Ainda faltavam longos anos de estudo pela frente, mas eu não
conseguia parar de sonhar em ter um bebê, a cada vez que entrava naquele
quartinho lindo. Victor e eu não sabíamos se queríamos esperar eu terminar
a faculdade para tentarmos a inseminação. E se ela não desse certo?
Teríamos que partir para a adoção e sabíamos que a fila era imensa e a
espera demorada.
— Pensando em quê? — perguntou Victor ao sair do banheiro.
— Não sei se quero esperar. — De imediato ele entendeu do que eu
estava falando. — São mais dois anos de faculdade, o internato, a
residência... É tempo demais, Victor. Talvez devêssemos tentar logo.
Ele se deitou ao meu lado na cama.
— E se engravidar agora, o que fará com a faculdade? É disso que
tenho receio. Também quero que as coisas aconteçam logo, mas tenho medo
de que você decida abandonar os estudos.
— Irei continuar. Muitas garotas fazem isso, eu também posso. Se
formos esperar eu terminar meus estudos para termos um bebê, você já terá
quase setenta anos.
— Eu sei. Mas penso no seu futuro em primeiro lugar.
— Eu posso fazer isso. Posso ser mãe e uma estudante de medicina.
Tenho você, Caleb, minha avó, meu pai e podemos contratar uma babá para
ajudar.
— Certo. — Sorriu. — Marquei a consulta com o cardiologista no
Canadá. Será em duas semanas.
— Ótimo. E se ele disser que você está apto para um novo coração,
estará preparado para passar por isso?
— Sim. Também estou ansioso para saber o que ele dirá sobre o
problema coronário.
— Vai dar tudo certo, amor. Tenha fé. — Beijei-o.
— Acha que poderíamos ir a Nova Iorque na semana que vem? —
Acariciou meu braço.
— Acho que podemos. Na próxima semana já não terei mais o
estágio. Podemos ir na sexta à tarde e voltar no domingo, o que acha?
— Estou louco para dar umas boas chibatadas em você. — Sorriu e
deitou sobre mim.
— Vai doer?
— Com toda certeza. — Beijou-me.

A sexta chegou e embarcamos para Nova Iorque no final da tarde,


chegamos já era noite. Victor havia feito reserva em uma suíte de luxo em
um hotel em Manhattan. Entramos e um banquete à luz de velas esperava
por nós na varanda.
— Uau! — Olhei para ele, que sorria.
— Venha. Vamos comer e depois iremos para o quarto — disse
Victor pegando minha mão e levando-me até a mesa.
Sentamos um de frente para o outro e um garçom nos serviu,
pedindo licença em seguida e deixando a suíte. Victor brindou sua taça na
minha em nome da paz que, finalmente, se instalava em nossas vidas e eu
brindei a nossa família. Comemos e depois da sobremesa nos sentamos na
sala em frente à lareira elétrica ligada, tomando o restante do vinho e
conversando sobre inúmeros assuntos.
— Temos um lugar especial para ir amanhã.
— Vai me dizer onde?
— Não adiantaria, você não saberia onde é. — Riu.
— Posso pesquisar no Google, sabia?!
— Garanto a você que não encontraria.
— Estou curiosa agora. Para onde vamos preciso usar calcinha? —
Sorri maliciosa.
— Irá usar algo especial para mim.
Deitei minha cabeça em seu ombro e ele acariciou meus cabelos.
Ficamos mais um tempo ali sentados juntos, até que senti o sono chegar e
seguimos para o quarto.
Depois de me trocar, fui para a cama onde Victor já se encontrava
deitado. Ao me aproximar, meu celular, que estava sobre o criado-mudo ao
lado, vibrou. Peguei-o e era Marshall quem ligava. Estava um pouco tarde,
mas eu precisava falar com ela, esperei por seu retorno a semana toda.
— Quem está ligando?
— É a Marshall.
— A detetive? — perguntou Victor confuso. — O que ela quer? —
Fiquei em silêncio. Seu semblante mudou e ele ficou sério. — O que
aprontou, Maya?
— Preciso atender. — O celular voltou a tocar em minhas mãos e eu
atendi. — Oi, Marshall.
Eu havia ligado para ela assim que voltamos para Oklahoma.
Precisava fazer alguma coisa sobre o que vi em Dallas. Não poderia fazer
de conta que não vi nada daquilo depois de resgatar Penny. Marshall
prometeu que iria investigar e resguardar Penny de transtornos, como ter
que depor contra alguém.
— Maya. Oi. Sei que demorei a entrar em contato e que já é tarde,
mas é que estávamos ocupados com a investigação sobre o leilão de
mulheres. Só quero dizer que já encontramos alguns canalhas donos de
casas de prostituição. Sua amiga Penny nos ajudou bastante.
— Quando falou com ela?
— Há dois dias. Nos falamos pelo Skype. A investigação está em
andamento e já temos uma lista de supostos arrematadores. Um deles está
sendo investigado por lavagem de dinheiro. Obrigada, Maya. Você está
salvando vidas e ajudando mulheres desesperadas. Saiba que seguiremos
adiante agora e que tudo será sigiloso. Você não precisa mais se preocupar
com nada. Logo ouvirá falar da nossa operação de sucesso na TV. — Riu.
— Certo. Fico bem em saber que elas serão ajudadas.
— Farei o possível para cada uma delas retornar para casa. Tenho
notícias sobre Higor. Ele em breve deverá ser transferido para a prisão
estadual de segurança máxima.
— Quando?
— Não sei precisar, mas em um mês ou menos.
— Isso é bom. Quanto mais longe, melhor. — Respirei fundo com
alívio.
— Sim. Bom, tenho que ir. Lembre-se de que, quando precisar de
qualquer coisa, é só entrar em contato.
— Certo. Até mais. Boa noite.
Ela se despediu e eu encerrei a ligação. Victor encarava-me sério
sentado na cama.
— Você ligou para ela, não é? Falou sobre o leilão.
Assenti.
— Alguém precisava fazer alguma coisa, Victor, aquilo era cruel
demais.
— O que disse a ela?
— A verdade. Tudo o que aconteceu. Tudo o que vi.
Ele bufou e recostou na cabeceira.
— Você é impossível, Maya.
— O que eu fiz foi uma coisa boa. Ela já encontrou algumas pessoas
e já tem nomes de outras. Mas eu estou fora disso agora. Ela só ligou para
me agradecer e dizer que Penny a ajudou muito. — Deitei-me na cama. —
Não fique bravo. Não falei nada antes, porque tive medo da sua reação.
— Vamos dormir.
Ele deitou-se de barriga para cima e puxou as cobertas para cobri-lo.
— Nós estamos resguardados, ela disse que o que fizemos foi algo
arriscado, mas ela entende nosso desespero. Seu nome provavelmente irá
aparecer na lista de compradores, mas nada vai acontecer porque Marshall
sabe da verdade.
— Não quero mais falar sobre isso. Tudo o que aconteceu já se deu
por encerrado para mim. Faça o mesmo! Marshall já disse que está
cuidando de tudo, então esqueça isso!
— Certo.
Ele se virou de costas para mim. Não estava acreditando que
dormiríamos daquele jeito.
— Você está com raiva? — Toquei seu braço.
— Espere para saber a resposta amanhã!
Nossa! O medo me assolou. Afastei-me e deitei no meu canto, me
preparando para dormir.

Acordei sozinha na cama e me levantei. Depois de um banho para


despertar, segui para a sala da suíte. Sobre a mesa redonda ao canto,
próxima a porta de vidro que levava à varanda, um banquete estava servido
para o café da manhã. Eu estava morta de fome, já se passavam das nove.
Servi-me de uma caneca de café, peguei um dos croissants
recheados e saí andando pela suíte. Na sala onde havia um bar extenso, uma
TV enorme e uma mesa de bilhar, encontrei Victor jogando sozinho com
uma xícara de chá apoiada sobre a beirada da mesa onde se debruçava para
acertar a bola de número dezoito com o taco.
— Oi. Acordou cedo. — Fui até ele.
— Costume. Parecia estar no sono mais profundo, por isso deixei
você dormir. — Acertou a bola, a encaçapando no buraco à direita.
— Que horas vamos sair? Pensei em procurar um salão para fazer as
unhas.
— Às oito horas. Esteja pronta! — disse severo e acertou mais uma
bola.
— Ainda com raiva de mim.
— Nunca senti raiva de você, Maya, e jamais sentirei. —
Aproximou-se ficando à minha frente. — Só não quero você se metendo no
que não é da sua conta ou onde não foi chamada.
— Okay. Só passei as informações a ela. Não pode me julgar por
isso. O que fiz, enfim, foi uma coisa boa, não é?
— Sem dúvidas, amor, mas foi perigoso. Já pensou se alguém
descobre quem os entregou? Essa gente não tem escrúpulo algum, você viu
isso com seus olhos.
— Eu sei. Mas a Marshall não deixaria ninguém descobrir. Além
dela, ninguém sabe que fui eu quem contou tudo. Estamos seguros. —
Sorri.
Ele pegou minha mão que segurava o croissant, levou-a até sua boca
e deu uma mordida no pãozinho de massa folhada. Victor beijou minha
testa e se afastou voltando sua atenção ao jogo que fazia sozinho.
Voltei para a sala e terminei meu café da manhã. Depois de uma
videochamada com Sasha e Kim, achei um salão próximo pela internet e
marquei um horário para o período da tarde.
Nosso almoço chegou e eu fui até a varanda onde Victor falava ao
telefone com a irmã, e o chamei para comer. Ele logo apareceu e sentou-se
ao meu lado. Nos servimos e ele começou a contar que em breve Margot
estaria na cidade e ficaria conosco. Respirei fundo e sorri. Disse que seria
ótimo tê-la em casa, mas por dentro eu já estava me preparando para o
inferno que seria passar alguns dias com aquela mulher por perto.
— Sasha está pensando em se mudar de Chicago. Disse a ela que
Oklahoma seria um bom lugar para ela morar, não estaria sozinha. Ela está
à procura de um lugar onde possa estabelecer raízes para poder ficar com a
guarda dos irmãos. Eles foram colocados para a adoção. Infelizmente, a
justiça não considerou a condição financeira atual dela, favorável para
cuidar deles e não há mais ninguém na família. Que situação horrível!
— Diga para que ela venha, darei emprego a ela. Meus funcionários
transferidos têm uma ajuda de custo para moradia em cinquenta por cento.
Posso dar um jeito para que ela se beneficie disso também. Tenho certeza de
que conseguirá arrumar um lugar decente para morar.
— Está falando sério?
— Estou. — Olhou-me.
— Victor... Isso seria incrível. Vou ligar para ela mais tarde e contar
a novidade. — Sorri muito feliz. — Eu te amo! — Levantei-me e sentei em
seu colo, o abraçando pelo pescoço. — Obrigada! — Beijei-o.
Victor riu abafado em meus lábios e abraçou-me.
Mais tarde, segui para o salão de beleza e fiz as unhas, pintando-as
em um tom vermelho vibrante. Quando voltei para o hotel, com Noberto em
meu encalço, já passavam das seis e meia.
Victor não estava, ele havia dito que sairia com Elliot para resolver
algumas coisas antes de voltar para se arrumar para a nossa noite tão
ansiada. Segui para o banheiro e enchi a banheira com água quente. Antes
de entrar, acrescentei sais de banho e pétalas de rosas à água. Entrei e liguei
uma música no som integrado no teto do banheiro, usando meu celular.
Estava cantando a música Pocketful of Sunshine, de Natasha Bendingfield,
e relaxando no banho enquanto trocava mensagens com Grace, quando a
porta do banheiro foi aberta e Victor surgiu. Ele sorriu e encostou-se ao
batente da porta de braços cruzados.
— Quer se juntar a mim?
— Não, desta vez. Se apresse, não quero me atrasar. Já são sete
horas. A roupa que usará esta noite está sobre a cama. Estarei na sala de
jogos. — Saiu fechando a porta atrás de si.
Apressei-me no banho, e depois de secar os cabelos e arrumá-lo
com o babyliss, voltei para o quarto. Sobre a cama havia uma sacola preta,
com as iniciais “V&S” timbradas em vermelho. Ao lado, uma caixa
retangular grande. Estava curiosa para saber o que ele havia comprado para
mim, mas fui para o closet me maquiar primeiro.
Pronta para me vestir, caminhei até a cama e parei aos pés.
Primeiramente, olhei o conteúdo da sacola. Virei-a de abertura para baixo
sobre o colchão e várias coisas caíram dali de dentro. Havia uma roupa, se é
que eu poderia chamar assim, que se parecia um corpete de couro preto. Ele
tinha alças largas, amarração nas costas que afinaria ainda mais minha
cintura quando puxadas e dois enormes buracos à frente que deixariam
meus seios totalmente expostos e vazados através deles.
Também caiu da sacola uma meia-calça arrastão preta, uma calcinha
fio dental de couro preto e luvas de látex que cobririam o antebraço e o
dorso das mãos, deixando a palma e os dedos à mostra. Abri a caixa e
dentro tinha um par de botas envernizadas pretas, de cano bem longo. Olhei
aquilo tudo admirada e envergonhada. Não estava acreditando que sairia do
hotel vestida com aquelas peças.
Olhei as horas no celular e faltava alguns minutos para as oito da
noite. Victor entrou no quarto enrolado em um roupão de banho e passou
por mim indo para o closet. Ele cheirava a pós-banho e estava com os
cabelos molhados. Com certeza havia tomado banho no outro quarto da
suíte.
Caminhei até lá e parei na porta, o encarando se vestir
tranquilamente. Ele parou diante do espelho e olhou-me pelo reflexo.
— Algum problema? Já são quase oito. Achei que quando entrasse
aqui, você já estaria pronta, Maya.
— Quer mesmo que eu vista aquilo? — Apontei para a cama.
— Sim.
— Mas eu ficarei com o corpo à mostra. Aquilo sequer cobre os
seios!
— Vista um sobretudo. — Virou-se para mim abotoando sua
camisa. — Vamos! Se apresse!
Voltei para o quarto e encarei as peças antes de me vestir. Comecei
pela meia-calça arrastão, depois pelo corselete e em seguida a calcinha.
Sentei-me na cama e calcei as botas que cobriam minhas pernas até os
joelhos. Victor saiu do closet e se aproximou enquanto eu colocava as
luvas.
— Pegue. Vista isso. Entregou-me um sobretudo dele, caramelo.
Peguei-o de sua mão e o vesti. Antes que eu atasse a frente com a
fita, fechando-o, Victor segurou minhas mãos impedindo-me. Ele afastou
um passo para trás e respirou fundo observando-me.
— Você está linda. Pode fechar o casaco.
Fechei-o e puxei os cabelos para fora do sobretudo. Victor caminhou
até a cômoda e apanhou uma caixa cinza que estava sobre ela, que eu
sequer havia visto. Ele voltou até mim e a deu para que eu segurasse.
Segurei-a com as duas mãos e ele a abriu. Dentro havia uma coleira larga de
couro branco e uma guia feita de aço. Ele a pegou, tomou a caixa das
minhas mãos e jogou-a sobre a cama.
— Segure os cabelos.
Levantei meus cabelos e ele veio para trás de mim, colocando a
coleira em meu pescoço e afivelando-a na nuca. Soltei os cabelos e ele os
arrumou nas costas.
— Estamos prontos. — Guardou a guia enrolada, no bolso interno
do seu paletó. — Vamos! — Pegou-me pela mão e saímos do quarto.
Tomamos o elevador e descemos para o térreo. Nosso carro já nos
aguardava em frente ao hotel. Entramos e seguimos viagem. O lugar era
longe e demoramos mais de uma hora para chegar. Já não estava mais me
aguentando de curiosidade. Perguntei por várias vezes para onde íamos,
mas Victor me ignorou.
Já estávamos fora da cidade, andando por uma pista extensa onde só
se via árvores dos dois lados. Enfim chegamos a uma entrada cheia de
roseiras vermelhas e bem iluminada. Seguimos pela estrada de cascalho até
chegarmos a uma mansão. Era maior do que todas as casas de Victor.
Aquilo era impressionante.
As portas traseiras foram abertas para nós, então desci com a ajuda
de um homem, que sorriu ao desejar uma boa-noite. Victor deu a volta no
carro por trás e veio até mim, oferecendo-me seu braço. Caminhamos para a
mansão e paramos na porta onde tinha dois seguranças.
Victor entregou a eles um cartão todo vermelho, sem nada escrito.
Um dos seguranças pegou uma lanterna pequena de luz negra e iluminou o
cartão onde apareceu a figura de um chicote estalando nas costas de uma
mulher.
— Podem entrar. Mas ela tem que tirar o casaco, assim que passar
pela porta — disse um dos seguranças olhando para mim.
— Claro — respondeu Victor.
Entramos e assim que passamos pela porta, uma mulher veio até nós
desejando-nos boas-vindas e pedindo meu casaco. Olhei para Victor
apreensiva e ele deu-me um sorriso cheio de segurança.
— Tudo bem, querida. Tire.
Olhei novamente para a mulher e engoli em seco. Desatei o nó que
fechava o sobretudo e o retirei entregando-o a ela.
— Obrigada. Basta seguir em frente — disse ela nos dando
passagem pelo corredor após o pequeno hall.
Seguimos pelo corredor e a cada passo a música ficava mais alta.
— Estou nervosa. — Parei e Victor se virou para mim.
— Não fique, amor. É uma noite de prazer. Aqui todos são
acostumados a isso. Você confia em mim?
Assenti tensa.
— Então, venha. Vamos entrar.
Ele pegou minha mão e guiou-me pelo restante da extensão do
corredor até a longa cortina feita de correntes finas e douradas.
— Relaxe! — pediu e ultrapassamos a porta.
CAPÍTULO 28

Aquele lugar era diferente de tudo que imaginei que seria ou de


onde já estivemos em Seattle. Era grande, escuro e envolvente. Acho que as
luzes e a música era o que trabalhava para provocar sensações estranhas em
nossos corpos, como uma leve excitação.
As pessoas pareciam não ligar, ou sequer enxergar meus seios de
fora. Para elas era tudo natural. E depois, posso dizer que eu era a mulher
mais coberta ali. Era uma casa de dominação exclusiva para homens
dominantes.
Victor tirou a guia do bolso interno do paletó e a prendeu em minha
coleira. Ele saiu andando à frente, puxando-me. Eu o seguia sempre dois
passos logo atrás dele, observando a minha volta atentamente. Havia de
tudo ali. Desde mulheres nuas, a mulheres fantasiadas dos mais exóticos
animais. Alguns homens submissos usavam com roupas feitas de látex, que
as cobriam da cabeça aos pés, deixando somente as narinas, olhos, bocas e
genitálias descobertos. Tudo aquilo era muito estranho e novo para mim.
Quando eu achava que não poderia mais me surpreender com este estilo de
vida, eis que eu me enganava. Caminhamos entre essas pessoas e paramos
no bar. Victor se sentou e pediu uma dose de Bourbon.
— De joelhos! — ordenou a mim.
Coloquei-me de joelhos para ele e abaixei minha cabeça como sinal
do meu respeito e servidão por aquele, que era Dono de mim. Um homem
se aproximou e começou a conversar com Victor. Pela conversa e a maneira
como se cumprimentaram, se percebia que eram conhecidos de longa data.
— Vamos fazer uma sessão de Spanking mais tarde, Otávio e suas
gêmeas estarão conosco. Junte-se a nós — convidou o homem de nome
Bruce.
— Agradeço, mas eu e minha menina temos outros planos — Victor
respondeu acariciando meus cabelos. Eu queria mais dos seus toques.
Sentia-me carente deles.
— Tudo bem. — Riu. — Você aceita água, minha gatinha?
Olhei pelos cantos dos olhos em direção a ele e vi que perguntava a
sua submissa. Ela, assim como eu, estava de joelhos e cabeça baixa. A
mulher de cabelos curtos e ruivos estava completamente nua. Tudo o que
usava em seu corpo era uma tiara com orelhinhas de gato e um plug anal
com rabo de pelúcia preto e rosa. As unhas de suas mãos eram pontudas e
afiadas como garras de um gato de verdade.
— Sim, meu Senhor — respondeu ela baixinho.
Ele pediu ao barman um copo de água e o levou até sua boca, dando
o líquido a ela. A mulher se engasgou e cuspiu involuntariamente um pouco
da água molhando sua mão. Bruce se exaltou e acertou um forte tapa em
seu rosto, fazendo-a cair de lado no chão.
— Sua inútil! Não é capaz sequer de receber um cuidado de seu
Dono?
Olhei para Victor e ele assistia a cena sem surpresa ou espanto,
bebendo seu drinque tranquilamente. Eu estava assustada.
— Até mais, Victor — Bruce se despediu levantando-se e saiu
arrastando pela coleira sua submissa que andava de quatro pelo lugar.
— Até mais.
Victor virou o restante do Bourbon e levantou-se. Ele mandou que
eu o acompanhasse, andando sempre dois passos atrás. Entramos em um
corredor e seguimos por ele saindo em uma vasta sala onde pessoas bebiam
sentadas à mesa, assistindo outras masturbarem mulheres amarradas e
suspensas no teto sobre pequenos palcos. Aquilo parecia louco demais.
Subimos os dois lances de escada e caminhamos rumo aos quartos,
seguindo por um corredor à esquerda. As portas estavam todas trancadas,
mas era possível se ouvir gritos, gemidos e outros barulhos mais
assustadores. Tinha dúvida de que algum dia eu me acostumaria com tudo
aquilo e tinha mais medo ainda de me acostumar e vir a gostar.
O corredor pelo qual caminhávamos era iluminado por uma luz
vermelha, que deixava o lugar sombrio. A música abafada que saía do som
integrado ao teto, tinha uma batida sensual e lenta. Victor parou diante de
uma porta e a abriu usando um cartão magnético que estava guardado no
bolso interno do seu paletó. Ele entrou primeiro e deu-me passagem para
entrar em seguida. Não era uma suíte como eu imaginava que seria. Não
havia banheiro, cama, janela ou decoração com flores, como no quarto da
festa que fomos em Seattle.
As paredes eram pintadas todas de vermelho. Ao centro do teto,
pendia um lustre grande de cristais reluzentes e correntes finas douradas.
Ao meio do vasto cômodo havia uma Cruz de Saint Andrew de ferro com
algumas partes revestidas em couro branco. Diante dela, uma poltrona a uns
dois metros. Ao canto esquerdo havia uma poltrona tantra preta, e ao lado
direito, uma mesa de madeira mogno com amarras de couro vermelho nas
laterais e cabeceiras. Na parede do fundo, inúmeros brinquedos eróticos
organizados sobre prateleiras de vidro, além de um pequeno bar ao canto.
Olhei para Victor imaginando o que ele faria comigo naquela noite.
Ao mesmo tempo que o suspense me deixava tensa, também era excitante.
Ele tirou seu paletó e jogou-o sobre a poltrona tantra, antes de se aproximar
de mim.
— Eu disse que prenderia você na cruz.
Engoli em seco.
Victor agarrou meus cabelos e puxou-me para ele com força. Seus
olhos passearam por meu rosto lentamente e pararam nos meus.
Entreolhamo-nos com fogo e paixão. Sua boca se aproximou da minha,
ficando a centímetros de distância. Queria tanto seus lábios junto aos meus.
Fechei meus olhos esperando um beijo seu, mas isso não aconteceu. Sua
outra mão tocou minha face com cuidado, acariciando-a.
— Você é linda! — sussurrou e afastou-se.
Victor levou-me até a cruz e posicionou-me de frente para ela. Ele
mandou que eu tirasse a parte de cima da roupa e assim eu fiz. Depois pediu
que elevasse os braços e abrisse bem minhas pernas. Obedeci-o sem
demora. Primeiro algemou um punho e depois o outro. Em seguida, ele
prendeu meus tornozelos e depois um cinto de couro fixando minha cintura
ao eixo da cruz.
Ele juntou meus cabelos nas mãos e os prendeu em um coque feito
de qualquer jeito no alto da cabeça. Ele caminhou até as prateleiras à minha
frente e voltou com um vidro de cor âmbar e um chicote de montaria,
colocando-o sob a mesinha redonda de apoio ao meu lado esquerdo, antes
de se aproximar com o vidro. Primeiro ele espalhou por minhas costas um
óleo de aroma amendoado, que se aqueceu levemente quando esparramado
sobre a superfície de minha pele. Com leveza, ele massageou meus ombros
e beijou minha nuca deixando-me arrepiada.
— Aprecio que seja uma mulher de coragem, mas me aborrece que
você seja tão imprudente e desobediente, às vezes. Sabe o porquê será
castigada, não é? Sabe que merece isso — falou ao meu ouvido.
Respirei fundo e cheia de tensão. Victor mordeu meu ombro com
certa força e se afastou apanhando o chicote ao lado. Ele deslizou por
minhas costas a ponta de couro com tachinhas, até minha bunda. Sem aviso
prévio, acertou-me uma chicotada forte em minhas nádegas, fazendo-me
gemer assustada. Escutei sua risada baixa e diabólica. Victor deslizou
novamente a ponta do chicote subindo por minhas costas e desferiu-o duas
vezes seguidas acertando-a em cheio, causando dor e ardência. Curvei
minhas costas e joguei minha cabeça para trás. Sem esperar que eu me
recuperasse, ele continuou a bater acertando minha bunda, enquanto me
ouvia gemer de dor. Não satisfeito, ele jogou o chicote no chão e caminhou
até as prateleiras apanhando outro maior com um cabo rígido revestido de
couro vermelho e uma corda na ponta com comprimento de dois metros.
Ele caminhou para trás de mim e eu me atrevi a olhá-lo por cima do ombro.
— Olhe para frente! — gritou e desferiu o chicote de longe,
acertando minhas costas.
Gritei cerrando meus punhos, sentindo um ardor intenso e olhei para
frente imediatamente. Victor se aproximou e passou por mim enrolando o
chicote na mão, a caminho do bar. Ele serviu-se de uma dose dupla de
uísque e virou-se para mim.
— Preciso te punir e você sabe que precisa ser punida. — Parou à
minha frente.
— Ainda assim, não acho que o que eu tenha feito seja errado, meu
Senhor. Foi perigoso e estúpido, eu sei. Mas não foi errado — disse baixo.
Ele sorriu.
— Está de castigo. — Beijou minha testa e voltou para trás de mim
bebendo seu drinque.
Escutei ele arrastar a poltrona. Amarrada a cruz fiquei por longos
minutos enquanto Victor se servia de novo e de novo de mais uísque. Em
um determinado momento, ele se cansou de se levantar para se servir e,
então, pegou a garrafa no bar e a levou consigo. Ele ligou o som através do
bluetooth do seu celular e cantou uma música dos anos oitenta com
descontração. Ele não parecia estar nem um pouco preocupado comigo ou
com meu cansaço que já se tornava presente. Eu já estava com as pernas
cansadas e meus braços levemente dormentes. Queria poder me sentar, mas
não faria tão cedo. Ele já havia dito e prometido. Eu seria castigada na cruz.
Não havíamos ido ali para encenar algo ou transar loucamente como eu
tinha imaginado que faríamos depois de algumas chibatadas e minutos de
tortura. Havíamos ido até ali somente para que ele pudesse me punir do seu
jeito por eu ter “desobedecido” às suas ordens expressas, mesmo que
tivesse sido para o nosso bem.
Não precisava olhá-lo para saber que ele se divertia e saboreava a
minha situação. A questão era que, além do meu cansaço, estava louca me
perguntando quando ele me tomaria para si. Fechei meus olhos e respirei
fundo. De repente, senti sua aproximação e seu toque em meu quadril,
apertando-o de leve. Suspirei lentamente com o calor de suas mãos em
mim. Ele roçou seu nariz em meu pescoço deixando-me arrepiada e mordeu
o lóbulo de minha orelha.
— Faz uma hora e vinte minutos que está presa aqui. Acho que, no
final das contas, o castigo acaba sendo comigo por ter que manter minhas
mãos e o resto do meu corpo longe de você. — Agarrou meu pescoço com
sua mão esquerda. — Se implorar com jeitinho, eu te fodo aqui e agora.
Sorri excitada. Sua voz grossa e sussurrada ao pé do meu ouvido me
deixava louca.
— Por favor, meu Senhor. Foda-me! — sussurrei levemente
ofegante.
Suas mãos começaram a passear por meu corpo, fazendo-me
carícias leves. Ele apalpou meus seios e os apertou com um pouco de força,
puxando meus mamilos. Sua mão direita desceu deslizando a ponta dos
dedos por minha barriga, até minha intimidade que começava a latejar de
tesão. Ela adentrou em minha calcinha e a meia arrastão e tocou meu
clitóris fazendo pressão. Gemi abafado mordendo meu lábio inferior.
— Não sabe o quanto sou louco por você! Sou o seu Senhor, mas
quem me tens nas mãos... é você, Maya.
— Me prenda na mesa. Quero que me foda com força e sem
piedade.
— Seu pedido é uma ordem! — Mordeu meu pescoço.
Victor me desamarrou e levou até a mesa, posicionando-me de pé à
cabeceira e me debruçando sobre ela. Ele desceu a calcinha e a retirou do
meu corpo. Depois desceu a meia-calça até os joelhos. Em seguida prendeu
meus tornozelos e depois meus braços atrás, nas costas. Victor caminhou
até a prateleira e pegou uma palmatória de couro em formato de mão e veio
até mim. Ele beijou minha nádega esquerda e nua, e acariciou a outra. De
olhos fechados e cabeça deitada sobre a mesa, senti sua glande tocar minha
intimidade e roçar na abertura dos meus lábios vaginais, abrindo-os. Ele
pressionou-a em minha entrada e forçou deslizando facilmente e
lentamente. Gemi cravando as unhas nas palmas das mãos.
Sem pressa, agarrando meu quadril com a mão esquerda, ele
começou a estocar-me com força bruta. Gradativamente, ele tomou
velocidade e começou a foder-me com vontade e sem cautela alguma,
enquanto batia na lateral e parte posterior das minhas coxas e em minhas
nádegas. Victor fez exatamente aquilo que eu desejava. Comeu-me sem
piedade. Nossos gemidos ecoavam pelo quarto, se misturando à música
agitada que tocava, ainda comandada pelo seu celular.
Sua mão direita agarrou meus cabelos e com a esquerda ele
continuou a bater do outro lado. Era excitante a mistura de dor e prazer.
Meu clitóris pulsava louco por uma atenção especial nele. Victor grunhiu de
forma animalesca e puxou meus cabelos para trás. Não demorou muito e
gozei amolecendo as pernas. Victor segurou-me firme com as duas mãos,
jogando a palmatória no chão, e gozou gemendo louco e alto. Ele debruçou
sobre mim, ainda com seu pênis pulsando dentro de minha boceta e beijou
meu rosto.
— Você é perfeita.
Sorri.
— Não quero que a noite acabe agora.
— Não irá. — Acertou-me mais um tapa na bunda.
Voltamos para casa na tarde do dia seguinte. A semana fluiu normal,
tudo conforme a rotina de cada um. Na quinta-feira, Victor chegou em casa
avisando que iríamos na segunda-feira para a consulta no Canadá, em
Toronto, com o cardiologista. Partimos para lá logo pela manhã. Caleb
havia ido conosco, não ficaríamos muito, mas Victor não estava confiante
de deixá-lo só.
Victor foi submetido a centenas de exames. O médico disse que meu
marido estava com a saúde estável. Quanto ao problema coronário, não se
tinha muito o que fazer, não havia cura. Infelizmente, pela idade, Victor não
era um candidato apto ao transplante de coração. Foi um banho de água fria.
Ouvir aquilo foi horrível. Ele aconselhou Victor a viver bem sua vida, da
forma mais saudável e sem esforços físicos exagerados, já que a qualquer
momento seu quadro de saúde poderia agravar e lhe causar um infarto fatal.
Voltamos para casa na quarta-feira pela manhã. Victor se trancou em
seu escritório. Ele disse que precisava resolver uma questão do trabalho,
mas eu sabia que estava mentindo. Ele queria um tempo sozinho e em paz,
e eu respeitaria isso.
Segui para a cozinha e comecei a preparar nosso almoço. Coloquei a
mesa e caminhei até o forno para tirar o frango que assava com batatas e
aspargos. Caminhei até a mesa e assustei-me quando um par de braços me
abraçou por trás. Logo senti o perfume do homem que eu amava e um beijo
seu em meu pescoço.
— Eu quero.
— O frango? — perguntei confusa, colocando-o sobre a mesa.
— Não. — Riu. — Que tenhamos filhos logo. Estava com medo,
mas não estou mais. Realmente não quero ter que esperar muito.
Virei-me para ele e segurei seu rosto entre minhas mãos, olhando
em seus olhos.
— Então é isso... Vamos ter filhos, amor. — Emocionada, beijei-o.
Victor abraçou-me mais apertado e me puxou para mais junto do seu
corpo.
— Vou cuidar para que tudo aconteça.
— Certo. — Colei minha testa na sua e sorri.
Uma felicidade imensa explodia dentro de mim naquele momento.
Mesmo que para alguns fosse “cedo” para termos um filho, para nós e
nosso tempo, estava na hora.
Victor subiu até o piso de cima e chamou Caleb para almoçar. Logo
os dois desceram juntos e todos comemos à mesa da cozinha. Depois de
comermos, Victor ajudou-me com a louça e Caleb tirou o lixo para fora.
A tarde passou rápida e logo a noite chegou. Victor estava deitado
pensativo, olhando para o teto. Aproximei-me dele e beijei seu peito
aninhando-me ao seu corpo, pronta para dormir. Acariciei sua barriga e
depois seu braço que estava repousado sobre ela.
— Vai ficar tudo bem, amor. Você está bem e se cuidando. Ainda
teremos anos juntos. Sei que é o que te aflige.
Ele apertou-me em seus braços.
— Não me interessa quanto tempo eu tenho. Apenas me interessa
que eu viva ele da melhor forma possível com vocês.
Sorri para ele com ternura e carinho, e beijei seu rosto.

Os dias foram se passando e Victor havia marcado uma consulta em


uma renomada clínica de fertilização in vitro em Houston. Eu estava uma
pilha de nervos e ansiosa. Contava os dias para irmos até lá.
Já era um pouco tarde da noite, próximo das oito e meia, quando os
advogados ligaram e pediram para irem até nossa casa. Victor disse que
tudo bem e logo eles chegaram. Ambos entraram, desejaram uma boa-noite
e se sentaram na sala de estar.
— Então, o que houve? — perguntei.
— Estamos aqui oficialmente para dizer que Higor Blackwood teve
os julgamentos dos seus processos encerrados. O total das condenações
deram oitenta e cinco anos de prisão a ele. Higor será transferido para uma
prisão de segurança máxima em alguns dias — falou um deles.
— Já sabíamos disso, a Marshall nos informou — disse e me sentei
ao lado do Victor no sofá.
— Agentezinha enxerida — resmungou entredentes e baixo, depois
forçou um sorriso para mim.
— Espero que compreenda que é nosso trabalho mantê-los
informados sobre tudo que está ocorrendo. Afinal, vocês, em particular,
moveram quatro tipos de processo contra o réu — retrucou o outro.
— Quando acontece a transferência? — perguntei curiosa.
— A transferência acontecerá em nove dias.
— Okay — falou Victor.
— Certo. Senhor White, sua empresa já acertou todos os honorários
conosco. Queremos agradecer e dizer que nossos serviços estão às ordens.
Eles se levantaram e nós os acompanhamos até a porta. Despedimos
e agradecemos pelos serviços de ambos com um cordial aperto de mão. Eles
se foram e Victor fechou a porta virando-se para mim.
— O pesadelo finalmente teve seu ponto final. Tomara que ele
apodreça na prisão.
— Eu rezarei por isso — disse e abracei-o pelo pescoço.
— Está tarde. Acho melhor nós subirmos e arrumarmos as malas.
Afinal, ficaremos três dias em Houston.
— Estou tão ansiosa, amor. — Sorri nervosa. — Já falei com meu
pai e ele vem amanhã cedo para ficar aqui e manter os olhos em Caleb.
— Os dois se dão bem, vão gostar desses dias juntos. Contou ao seu
pai?
— Ainda não contei a ninguém. Disse que apenas vou acompanhar
você em um evento de negócios.
— Tudo bem. — Beijou minha testa.
— Estou com medo — revelei aos sussurros.
— Não tenha.
— E se não der certo? — Olhei-o já entristecida.
— Não fique assim. Não tenha medo ou fique preocupada. Tudo
dará certo, no fim.
Abracei-o forte deitando minha cabeça em seu peito.
— Querido...
— Sim.
— Com o monstro atrás das grades e longe de nós, não precisamos
mais ser sufocados pelos homens de preto — falei em tom de humor para
descontrair o pedido tenso.
— Vou pensar nisso. — Beijou o topo da minha cabeça.
CAPÍTULO 29

Embarcamos no dia seguinte logo pela manhã. Estava tão ansiosa,


que não consegui conter o café da manhã em meu estômago.
— Ainda nem está grávida e já está enjoando — brincou Victor,
segurando meus cabelos enquanto eu vomitava os ovos mexidos com bacon
que comi pela manhã antes de pegarmos o voo.
A consulta estava marcada para as dez e nós estávamos alguns
minutinhos atrasados. Depois de me recuperar e me recompor, seguimos
para a clínica de mãos dadas. Lá encontramos alguns especialistas que me
explicaram meticulosamente como tudo aconteceria. Eles perguntaram
centenas de vezes se estava certa sobre a fertilização e em todas elas
precisei certificá-los de que sim. Eles colheram meu sangue e a
ginecologista me chamou para uma conversa em particular, somente eu e
ela. Entramos em sua sala e sentamos uma de frente para outra na pequena
salinha de estar ao canto do seu consultório.
— Acho muito bonito a ligação entre você e Victor White. É visível
a parceria e o amor de vocês. Isso é raro. — Sorriu com simpatia.
— Obrigada. — Sorri de volta.
— Senhora White...
— Pode me chamar de Maya, por favor — interrompi-a.
— Certo, tudo bem. Bom, Maya... preciso dizer que mesmo que seja
jovem e que os exames comprovem que é uma mulher saudável, você corre
o risco que a fertilização não dê certo. Ela pode falhar ou você vir a ter um
aborto espontâneo no primeiro trimestre. Algumas mulheres que passaram
por isso não reagiram muito bem. É uma fase da vida em que elas querem
acrescentar à família e não perder alguém que já amam antes mesmo de
existir. Sinto e sei que querem isso. Sinto também que está preparada, mas,
querida... também precisa estar preparada para notícias e acontecimentos
ruins. E se acontecer, não desista. Em dois meses podemos tentar outra vez.
Respirei fundo olhando para a janela e depois para ela.
— Eu entendo. Conheço os riscos. E se vier a acontecer... Não se
preocupe, ficarei bem.
— Eu acredito. Mas ainda assim, quero que converse com um
psicólogo amanhã, antes de marcamos o procedimento. Tudo bem?
— Claro. Sem problemas.
Saí do seu consultório depois de mais alguns minutos de conversa e
encontrei Victor sentado na recepção. Ele estava com os cotovelos apoiados
sobre os joelhos e esfregava as mãos com agonia, enquanto encarava o chão
com um olhar perdido. Parei diante dele, que se ergueu e levantou-se
rapidamente.
— E então? — perguntou preocupado.
— Ela só queria bater um papo de mulher para mulher. Pediu que eu
converse com um psicólogo amanhã após sua consulta. Faremos isso
individualmente e depois em casal.
— Isso é sério?
— É sim. — Sorri. — Por hoje é só. Estou morrendo de fome.
Vamos almoçar?
— Vamos.
De mãos dadas deixamos a clínica. Mais tarde, naquela noite, não
consegui dormir. Victor acordou às cinco e meia da manhã e encontrou-me
acordada na antessala do seu quarto na mansão. Ele caminhou até mim e
sentou-se ao meu lado, abraçando-me.
— Tenha fé — sussurrou para mim.
— Fé é tudo o que eu tenho. É nela que estou agarrada. — Encostei
minha cabeça na sua.
Assistimos da varanda o sol nascer. Após o café, seguimos para a
clínica. Teríamos um dia cheio. Faria minha consulta com a ginecologista
pela manhã e mais alguns exames. À tarde falaria com o psicólogo e depois
teria mais alguns exames, antes de pegar o resultado de todos eles e me
encontrar com os médicos no final do dia. E assim tudo se transcorreu. Ter
acesso à saúde com tecnologia de ponta e gente eficiente era outro nível de
situação.
Eram cinco horas quando uma secretária surgiu e nos pediu para
entrar na sala de reunião. Ao sentarmos, os médicos leram os resultados dos
exames para nós e explicou tudo, detalhes por detalhes. Eu estava perfeita e
pronta para gerar um bebê. O nosso bebê. O psicólogo, no entanto, pediu
que eu continuasse o acompanhamento durante todo o processo de
inseminação em alguma clínica psicológica de minha confiança em minha
cidade. Garantimos que eu continuaria com consultas regulares em minha
cidade, ao menos uma vez por semana.
— Então é isso, Sr. e Sra. White. Vocês estão aptos para esse
procedimento. Podemos marcar para o quanto antes e quando quiserem —
disse um dos médicos.
— Amanhã? — perguntei ansiosa, os fazendo rir.
— Amanhã para mim está ótimo — disse a ginecologista e sorriu
piscando para mim.
Victor e eu saímos para jantar naquela noite e brindarmos ao que
estava prestes a acontecer em nossas vidas. Se na noite anterior eu não
consegui pregar os olhos, imagina na noite que antecedia a minha
inseminação.

Chegamos à clínica meia hora antes da hora marcada. Depois de me


preparar, entrei em uma sala acompanhada pelo Victor e logo a médica
entrou nos desejando um bom-dia com entusiasmo.
— Deite-se, por favor, e firma os pés aqui. — Mostrou-me onde.
Deitei e fiz o que foi instruído. Estava tão nervosa que minhas mãos
e pés suavam frio. Minha garganta estava seca e minha respiração ofegante.
Victor posicionou-se ao meu lado e segurou minha mão direita com
firmeza. A médica sentou-se aos meus pés e puxou uma mesinha em sua
direção, com algumas coisas sobre ela.
— Relaxe, querida. Será rápido — disse a ginecologista.
Relaxei o máximo que pude fechando os olhos e respirei fundo.
Senti um pequenino incômodo, como aquele que sentimos quando estamos
fazendo a prevenção.
— Prontinho — disse a médica colocando algo sobre a bandeja de
alumínio e levantando-se em seguida.
— É só isso? — perguntei.
— É sim. Agora fique aqui por quinze minutos e depois pode ir para
casa seguir com sua vida e rotina, normalmente.
— Quando posso fazer o teste de gravidez?
— Em duas semanas. Se sentir qualquer coisa, me ligue. Rajas de
sangue são normais, mas sangramento intenso ou contínuo, não. Dores
muito menos. Tenha fé e seja firme, tudo correrá bem. — Ela sorriu e
deixou a sala.
Olhei para Victor e vi o quanto ele estava apreensivo.
— Então é isso. Agora só nos resta esperar — disse para ele.

Voltamos para casa no dia seguinte. Os dias passaram e o fim de


semana chegou. Minha avó veio nos visitar com Will e eu fiquei feliz com
sua surpresa. Ainda não havíamos contado nada para ninguém. Queríamos
guardar esse momento somente de apreensão para nós. Na segunda-feira,
Victor precisou viajar. Era indispensável a presença dele em alguns eventos
e reuniões. Como estava com visitas em casa e com as aulas ficando cada
dia mais complicadas na faculdade, não pude acompanhá-lo.
Já havia se passado uma semana e meia desde a inseminação. Senti
umas pontadas no útero que se pareceram com os primeiros sinais de uma
indesejada cólica menstrual. Corri para o banheiro em meu quarto e me
sentei no sanitário. Peguei um pedaço de papel higiênico e passei em minha
entrada. No papel saiu algumas rajas de sangue, mas a médica havia dito
que isso era normal.
À noite, enquanto lavava as louças e conversava com minha avó,
que preparava um chá, senti novamente as pontadas, um pouco mais
intensas. Pedi licença a ela e segui novamente para o banheiro do meu
quarto. Ao sentar-me no sanitário, vi em minha calcinha uma quantidade
boa de sangue, como se minha menstruação estivesse começando a descer.
— Por favor, Deus! Que isso não esteja acontecendo — clamei de
olhos fechados e voz embargada.
Levantei-me, troquei minha roupa, coloquei um absorvente e desci.
Na área externa nos fundos, encontrei Elliot e Brice. Depois da prisão quase
que perpétua do Higor, não havia mais necessidade de andarmos cercados e
termos a privacidade roubada por centenas de seguranças. Além do
Noberto, que estava sempre acompanhando Victor, era somente os dois que
ficavam na casa ou cuidando da minha proteção e a do Caleb na rua.
Chamei Brice e pedi gentilmente e discretamente a ele um favor.
Que fosse até a farmácia mais próxima e trouxesse para mim dois testes de
gravidez. Ainda era cedo, eu sabia. Faltavam alguns dias para que eu
pudesse fazer o teste e o correto era um teste sanguíneo, mas eu estava
completamente angustiada e à beira de uma crise de ansiedade e nervoso.
Ele assentiu e saiu. Não demorou muito e logo voltou chamando por
mim no corredor que levava ao escritório do Victor. Ele entregou-me a
pequena sacola de papel e eu subi sem chamar a atenção de ninguém. Lá em
cima, me tranquei no quarto e fui ao banheiro. Depois de fazer xixi nas duas
canetas digitais, sentei-me sobre a tampa da privada, orando para que eles
não dessem um resultado negativo. E que se acontecesse, fosse porque
ainda era cedo demais.
Esperei por cinco minutos e então estiquei a mão e peguei-as. Meus
olhos se encheram de lágrimas e um aperto comprimiu meu peito. Ambos
haviam dado negativo. Chorei silenciosamente, tentando não me deixar
abater. Precisava ser forte, talvez os testes não tivessem funcionado direito.
Saí do banheiro, peguei meu celular sobre a cama e liguei para a médica. Já
eram quase nove da noite, mas não liguei para isso e esperava que ela
também não ligasse.
— Maya... Que surpresa. Como vai?
— Doutora Gilbert... Estou sangrando. Parece que minha
menstruação está descendo. Sinto indícios de cólicas menstruais. Fiz dois
testes de farmácia há pouco e ambos deram negativos — expliquei
contendo o choro.
— Consegue vir para Houston amanhã?
— Talvez. Mas Victor está viajando a trabalho e eu não quero
preocupá-lo. É uma semana importante para ele nos negócios.
— Tudo bem. Tenho um amigo que é ginecologista aí em Oklahoma.
Vou ligar para ele amanhã bem cedo e pedir que atenda você com urgência.
Vou pedir uma ultrassonografia transvaginal. Ela nos mostrará o que está
havendo. Assim que ele me mandar os resultados, nós falaremos por
videochamada.
— Certo.
— Até lá, querida... Fique calma. Ficar nervosa é pior.
— Tudo bem. — Respirei fundo.
Encerramos a chamada e eu fiquei mais alguns minutos trancada no
quarto, contendo-me. Desci novamente para o andar de baixo e fui até a sala
de TV, onde minha avó, Will e Caleb estavam assistindo a uma novela
mexicana.
— Está tudo bem, querida? — perguntou minha avó.
— Está. — Sorri falsamente. — Vim me despedir, já vou deitar. E
quanto a você, Caleb... Já está tarde.
— Já estou indo, é a última parte da novela. Eu prometo. — Piscou
para mim.
— Tudo bem. Boa noite — desejei a todos e voltei para o quarto.
Já na cama, pronta para dormir, liguei para Victor. Ele estava saindo
de um jantar de negócios e contava-me como era ruim estar longe de casa e,
principalmente, de mim. Não contei nada a ele sobre as leves dores, o
sangramento ou os testes negativos. Não queria preocupá-lo. Depois de
quase uma hora ao telefone, desligamos e adormeci depois de horas
insistindo que o sono viesse.

No dia seguinte, a médica mandou uma mensagem com o endereço


do hospital, nome do médico e horário da consulta. Saí de casa dizendo que
iria à faculdade, mas pedi a Brice que me levasse até o hospital. Implorei a
ele e o fiz prometer em nome da Penny, que ele não diria nada ao Victor.
Desci do carro e entrei no hospital. Segui para o sétimo andar e me
identifiquei na recepção. Logo o médico surgiu na sala de espera e chamou
por meu nome.
— É um prazer conhecê-la. Recebi sentenças de recomendação da
Dra. Gilbert.
— O prazer é meu. Obrigada por me atender, sem eu ao menos ter
um horário marcado. — Sorri com simpatia.
— Gilbert foi minha orientadora na faculdade. Não há nada que eu
não faça por ela.
Ele pediu que eu me trocasse e deitasse na maca. Assim eu fiz. Ele
introduziu a cânula em mim e iniciou o ultrassom. Meu coração batia
acelerado e eu tinha medo do que estava por vir. O médico estava sério e
encarava a tela em completo silêncio. Ele finalizou sem dizer nada e retirou
a cânula da minha vagina. Naquele momento, eu soube. Victor e eu não
havíamos conseguido. Fechei meus olhos e cobri minha boca com minha
mão esquerda, tentando conter o choro e engolindo a dor que estava
entalada em minha garganta.
— Eu sinto muito, Sra. White. Mas não foi desta vez. A senhora não
está grávida. Mas saiba que tudo acontece em nossas vidas por um motivo.
Você ainda é jovem e saudável, pode tentar outras vezes, não há limites de
tentativas para a inseminação. Uma hora irá conseguir. E essa hora será o
momento certo que a vida escolher e não nós, meros mortais. Entende?
Assenti chorando silenciosamente.
— Pode se trocar e ficar na sala ao lado, leve o tempo que precisar.
Respirei fundo, sequei minhas lágrimas e sentei-me.
— Obrigada.
Levantei-me e segui para o banheiro. Depois de me trocar, voltei ao
consultório. O médico colocou-se de pé e acompanhou-me até a porta
dizendo que enviaria todo o material das imagens a Dra. Gilbert logo mais.
Agradeci a ele e segui para casa. Ao entrar, minha avó espantou-se por eu
estar ali tão cedo. Ela parou diante de mim na sala e sorriu fraco.
— Esteve chorando. Quer me contar por quê?
Caminhei até ela e a abracei forte.
— Tentamos uma inseminação há alguns dias, vovó. Ela falhou. —
Chorei alto e em desespero. Meu peito doía muito.
— Oh, minha neta... — Acalentou-me. — Se não aconteceu agora, é
porque Deus tem outros planos para você. Talvez, não tenha acontecido
porque não é a hora, por mais que vocês queiram e acreditam que seja o
momento certo. Espere em Deus, que ele fará dar certo no momento exato.
— Beijou minha cabeça.
Ela acalentou-me um pouco mais e eu agradeci por ela estar ali
naquele momento. Decidi que somente contaria ao Victor quando ele
voltasse de sua viagem. Aquilo que estava acontecendo era algo para ser
dito pessoalmente.
CAPÍTULO 30

Sábado, final da tarde, e eu estava trabalhando. Era preciso, estava


ficando bastante tempo afastado do trabalho e, às vezes, precisava de
esforços para manter tudo em ordem. Esses esforços incluíam desde deixar
minha mulher em um momento delicado de nossas vidas, a ter que trabalhar
aos sábados. Eu tentava deixar tudo nas mãos dos funcionários de maior
confiança, mas ainda assim, uma vez ou outra, minha presença em reunião e
coquetéis era indispensável. Para minha sorte, Maya entendia isso bem.
Estava superconcentrado lendo alguns contratos, quando minha
secretária entrou em minha sala pedindo licença, com um envelope de papel
pardo nas mãos.
— Chegou isso para o senhor. Foi entregue por um correspondente.
A segurança já escaneou o pacote e não há nada além do que parece ser
papel — informou ela, antes de colocá-lo sobre minha mesa e sair fechando
a porta atrás de si.
Peguei o envelope e olhei sua frente e verso. Havia somente meu
nome escrito a mão no verso. Abri o envelope e virei sua abertura para
baixo, deixando cair seu conteúdo sobre a mesa. Fiquei um tanto surpreso e
confuso ao ver fotos. Pegando-as, percebi que eram fotografias da Maya.
Algumas dela andando pelas ruas, outras na faculdade, na cafeteria próxima
ao campus com algumas colegas de medicina, saindo do estágio no hospital,
chegando em casa e muito mais. Porém, todas foram registradas de longe. A
única que foi tirada de perto era uma foto dela sentada sozinha na biblioteca
estudando. Aquela havia sido registrada a uns três metros de distância.
Atrás desta, havia a seguinte frase escrita à mão:

Enquanto você estiver longe, eu cuidarei dela.

— Que merda é essa? — perguntei baixo para mim mesmo.


Quem era a pessoa que dizia estar "cuidando" dela? Higor estava
preso em um lugar, de onde nem sonhando sairia. Meu coração palpitou e
um desespero cresceu dentro de mim. Peguei meu celular sobre a mesa e
liguei para Noberto, pedi que ele subisse até minha sala. Assim que ele
chegou, mostrei as fotos e o “recado” atrás de uma delas. Ele ficou tão
preocupado quanto eu.
— Isso ainda pode ser Higor. Ele pode ter pago alguém para ficar de
olho nela. Isso é preocupante, já que não estamos lá e a segurança foi
reduzida — disse ele.
— Temos que voltar agora. — Levantei-me da mesa em um pulo.
— Vou ligar para o Elliot e Brice, colocá-los a par de tudo e pedir
que dobrem a segurança da casa.
— Faça isso discretamente. Não preciso que Maya fique alarmada.
Ela não pode passar por situações de estresse.
— Claro, senhor. Eu entendo.
— Vamos. Mande que preparem o jatinho.
Ele assentiu e pegou seu celular no bolso interno no paletó. Peguei
minhas coisas e as fotos sobre a mesa, e seguimos para o aeroporto. Sequer
me dei o trabalho de ir até o hotel buscar minhas coisas, apenas pedi que
despachassem tudo para Oklahoma depois. O voo de Seattle para casa
durou cerca de três horas. Quando cheguei em casa, já passava das nove da
noite. Estava tudo em silêncio, escuro e calmo. Subi a escada depressa e
entrei no quarto. Maya estava sentada sozinha na varanda. Ao me
aproximar, ela olhou-me por cima do ombro. Então, vi que chorava.
— O que aconteceu? — perguntei preocupado indo até ela.
— Você chegou! — Levantou-se rapidamente e veio ao meu
encontro, abraçando-me apertado.
— Por favor... Fale o que está havendo? — Maya choramingava
baixinho com o rosto enterrado em meu peito. Aquilo estava deixando-me
angustiado. — Amor... Maya... Diga o que houve! — falei duro e alto.
Ela afastou-se e me olhou com os olhos cheios de tristeza.
— Desculpe-me — sussurrou. Lágrimas não paravam de banhar seu
rosto.
— Pelo quê? Querida... estou preocupado.
— Não conseguimos. — Havia tanta dor em sua voz baixa.
— Do que você... — interrompi-me, ao entender do que ela falava.
Maya se referia a inseminação. — Eu sinto muito, amor. — Puxei-a para
um abraço apertado.
— Eu quem sinto muito!
— Está tudo bem, meu anjo. Podemos tentar outra vez em alguns
meses. Eu te amo ainda mais. Te amo pelo simples fato de querer ter filhos
comigo. Pelo simples fato de ainda estar comigo, depois de tudo de ruim
que já lhe causei no passado não tão distante. Você me fez crescer como
homem e ser humano, Maya. Seu amor por mim fez isso, quando eu já
achava que não era mais capaz de mudar. Você me fez alguém melhor. Eu
sou grato por isso. Ainda teremos frutos do nosso amor. — Soltei-a e
segurei seu rosto entre minhas mãos, olhando em seus olhos. — Vamos ser
pais, Maya. No momento certo tudo acontece. Por favor, querida... Não se
culpe por não ter dado certo.
Ela assentiu cessando o choro. Sorri com ternura para ela e beijei-a
com todo meu amor. Mais calma, tomamos um banho juntos na banheira e
depois descemos para a cozinha. Lá, coloquei-a sentada na banqueta ao
redor do balcão e preparei dois sanduíches.
— Caleb já não deveria estar em casa? São onze da noite.
— Desculpe, eu me esqueci de avisar. Ele foi ao cinema e depois
dormiria na casa de um amigo, o filho do banqueiro.
— Aquele que jantou aqui há algumas noites?
— Sim. Elliot ficou encarregado de cuidar deles.
— Tudo bem.
— Por que voltou antes?
— Terminei tudo o que tinha para fazer e resolvi voltar logo para
casa. Estava com saudade. — Sorri para ela, que estreitou os olhos para
mim.
— Mas hoje você ainda tinha um jantar, eu sei.
— Foi desmarcado. Quando sua avó e Will foram?
— Hoje pela manhã. Foi bom tê-la comigo esses dias. Will é uma
pessoa ótima e faz muito bem a ela.
Comemos à mesa e depois fomos para a sala de TV. Maya
adormeceu em meu colo assistindo ao filme que a própria escolheu. Fiquei
por longos minutos depois que o filme acabou, acariciando seus cabelos e
velando o seu sono. Ainda me perguntava: “Como pode uma menina
provocar tantas sensações boas em mim?”.
Coloquei minha mão sobre sua barriga plana e fechei meus olhos,
fazendo algo que não fazia há anos: rezei. Rezei pedindo a Deus que fizesse
tudo no seu tempo e do seu jeito, mas que não a fizesse sofrer. Ao abrir
meus olhos, a vi se remexer e suspirar fundo sorrindo, enquanto ainda
dormia.
Peguei-a no colo e levei-a para o nosso quarto. Deitei-a
cuidadosamente na cama e cobri-a antes de me deitar. Abraçado a ela,
sentindo o perfume dos seus cabelos, adormeci.

Acordei às sete da manhã com a terrível sensação de estar sendo


observado. Ainda com as vistas embaçadas pelo sono, ergui a cabeça e olhei
no rumo da porta a tempo de vê-la ser fechada. Assustado, levantei-me em
um pulo. Olhei para a cama e Maya ainda dormia, ressonando fundo.
Caminhei silenciosamente até a poltrona mais à frente e apanhei meu robe
de algodão e seda, vestindo-o antes de sair do quarto. Caminhei pelo
corredor até o quarto do Caleb. Só poderia ter sido ele a entrar no quarto.
Quem mais seria? Abri a porta e tudo estava em perfeita ordem. Com
certeza se havia chegado, ainda não tinha entrado ali. Desci as escadas e
tudo era somente silêncio. De repente, ouvi um barulho vir da cozinha.
— Caleb? — Tinha que ser ele. A única empregada a qual tínhamos,
só trabalhava no meio de semana e meus homens não entravam em casa se
não fossem convidados.
Entrei na cozinha e nada vi. A porta dos fundos rangeu e caminhei
até lá. Quando me aproximei, vi Theo – um dos meus mais antigos
seguranças – caído no gramado. Quando dei um passo em sua direção, fui
fortemente atingido na nuca e, então, tudo se apagou.
CAPÍTULO 31

Acordei e virei-me para o lado, mas não encontrei Victor.


Espreguicei-me e levantei vestindo meu robe, antes de descer. Ao chegar à
sala de estar, escutei barulhos vindos da cozinha. Sorri. Era sempre bom ter
Victor em casa e receber seus cuidados. Não havia como não amar aquele
homem. Pode não ter sido o cara perfeito no nosso começo, mas ele
aprendeu a ser ao menos perfeito para mim.
Caminhei até a cozinha e, ao me aproximar, logo senti o cheiro
maravilhoso de ovos e bacon. Ao entrar, olhei em direção ao fogão e
assustei-me paralisando. Não era Victor quem estava ali, era uma figura de
cabelos raspados, alto, que vestia o seu robe. A figura preparava o café da
manhã com calma, cantarolando em assobios. Olhei para a minha esquerda
e à mesa estava Victor sentado com a cabeça caída para o lado,
desacordado. Gritei com desespero. O sangue escorria da sua nuca melando
o pescoço e encharcando a gola da camiseta de malha.
— Veja só, você acordou — disse o homem.
Sua voz era bastante familiar. Virei-me para ele lentamente, sem
acreditar que aquilo estava acontecendo. Era um pesadelo. Tinha que ser.
— Higor... — sussurrei seu nome.
— Surpresa em me ver, amor? — Sorriu com maldade. — Sente-se
à mesa. Estou fazendo nosso café da manhã.
— Você o matou? — perguntei com a voz trêmula, temendo que a
resposta fosse: “sim”.
— Ainda não. Mas irei senão se sentar e comportar.
Olhei para ele chorando em silêncio e obriguei-me a caminhar até a
mesa. Sentei-me ao lado do Victor e toquei seu pescoço em cima da jugular
para sentir seus sinais vitais. Seu pulso estava fraco. Ele precisava ser
levado para o hospital com urgência, ou morreria logo mais.
Higor desligou o fogão e veio até a mesa, servindo o café da manhã
para mim e para ele. Sentou-se à minha frente e sorriu.
— Temos muito o que conversar, querida. Você me traiu, enganou e
mentiu. Temos que nos acertar para que possamos seguir em frente. Coma,
amor — pediu gentilmente. — Fiz com todo carinho para você.
— O que você quer, Higor?
— Não é óbvio? Eu quero você. Só vou descansar quando eu a tiver
ou morrer. — Riu diabólico.
— Como você conseguiu fugir? Pensei que estivesse em uma prisão
de segurança máxima.
— Tive ajuda. Fugi a caminho daquele inferno.
— Como?
— Ofereci dois milhões para quem me soltasse. Então me soltaram.
— Sorriu e colocou uma garfada de ovos mexidos na boca.
— Você é doente. Precisa de ajuda. — Lágrimas continuavam a
lavar meu rosto.
— Por que todos ficam me dizendo isso? — berrou batendo as mãos
na mesa, assustando-me. — Chega! Cale a boca. Não quero ouvir mais
nada!
Engoli em seco.
Higor se levantou nervoso e caminhou até a geladeira, procurando
por algo. Eu estava em desespero completo sem saber o que fazer.
— Fuja — disse Victor com a voz fraca e sussurrada. Olhei para ele
e o vi tentar erguer a cabeça e abrir os olhos. — Fuja.
Olhei rumo à porta dos fundos. Seria mais fácil eu correr por ali, já
que Higor estava no lado oposto. Chegaria mais rápido na rua e pediria
ajuda. Higor fechou a geladeira em um baque, assustando-me e virou-se
para mim.
— Nem pense nisso! — falou ameaçador. — Se passar por aquela
porta, mato você, seu maridinho e o filho dele quando chegar.
Higor sentou-se novamente à mesa, colocou o jarro de suco sobre
ele e voltou a comer colocando a arma que estava em sua cintura ao lado do
seu prato, para me intimidar. Sua mão esquerda repousou sobre a mesa,
quase que espalmada. Então, tive uma ideia de fuga. Pelas portas do fundo
não poderia correr, teria que passar por ele e ele me pegaria. Então teria que
correr para a frente. Peguei o garfo com qual comia e aproveitei seu
momento de distração, fincando-o em sua mão e o fazendo berrar de dor.
— Sua vadia! — esgoelou.
Peguei sua arma e levantei-me rápido da mesa correndo para a porta
da frente da casa. Ao chegar lá, a mesma estava trancada. As chaves que
sempre ficavam acima do aparador próximo a ela, não estavam mais ali.
Ele, sem dúvida, havia pegado. Escutei-o gritar por mim e se aproximar.
Corri escada acima, mas antes que conseguisse me salvar chegando ao
terceiro andar, ele me alcançou e puxou-me pela perna, fazendo-me cair.
Higor agarrou minhas coxas prendendo-me sob ele e tentou tomar a arma
de mim.
— Eu vou matar você, sua desgraçada! — berrou louco, babando de
ira.
Um tiro foi disparado e ele berrou ainda mais alto, se afastando e
segurando sua coxa esquerda. Então, pude ver onde o tiro havia o acertado.
A arma caiu entre as artes do corrimão de ferro, no piso do primeiro andar.
Levantei-me depressa e corri rumo à biblioteca. As portas eram grandes,
duplas e de pura madeira. Ele não conseguiria arrombar. Mas, antes que eu
conseguisse fechá-las, ele me impediu segurando-a e a empurrando para
trás. Eu usei de toda a minha força, mas ainda assim ele era mais forte do
que eu.
— Eu vou pegar você, vadia! — gritou e empurrou a porta, fazendo-
me cair no chão para trás.
Higor entrou e sorriu vindo mancando em minha direção. Levantei-
me depressa e peguei um abajur sobre uma mesinha ao lado de uma
poltrona, acertando-o na cabeça e causando um corte grande que lavou seu
rosto em sangue, mas ele não parou. Parecia que eu estava vivendo dentro
de um filme de terror.
Ele partiu para cima de mim e lutei contra ele tentando me livrar dos
seus apertos. Higor xingava e urrava cheio de raiva como um animal. Ele
me empurrou com força jogando-me em direção as janelas de vidro e
madeira que iam do teto ao chão. Levantei-me rapidamente e corri para trás
da mesa. Ele tentou vir em minha direção, mas consegui detê-lo
empurrando-a em sua direção. A quina da mesa acertou sua coxa pegando
exatamente onde ele havia sido ferido pelo tiro, causando dor a ele. Higor
curvou-se para a frente gritando e eu aproveitei o momento correndo em
sua direção, usando de toda força e peso do meu corpo, para empurrá-lo
contra as janelas de vidro. Ele cambaleou para trás e bateu de costas contra
a janela, quebrando-a. Ele tentou se segurar nos beirais, mas não conseguiu.
Escorregou com as mãos sujas de sangue, caindo lá embaixo.
Aproximei-me da janela e olhei para baixo. Não acreditei no que vi.
Eu havia matado um homem. Higor caiu do terceiro andar em cima de um
chafariz de bronze que havia no jardim dos fundos, sendo empalado pela
ponta comprida e pontiaguda do mesmo. Fiquei estática. Cobri minha boca
com as mãos e chorei alto, afastando-me lentamente da janela.
— Victor... — Lembrei-me dele e seu estado grave.
Desci a escada correndo e segui para a cozinha. Ao chegar lá,
encontrei Victor caído no chão ao lado da cadeira onde estava. Corri até ele
e ajoelhei-me ao seu lado. Chequei seus sinais vitais e eles estavam ainda
mais fracos.
— Amor... Por favor... Não morra!
Olhei em direção a porta ao ver uma movimentação e vi Theo se
levantar do gramado com dificuldade.
— Theo! — gritei por ele, que olhou para dentro de casa em minha
direção e veio até nós. — Temos que levá-lo para o hospital agora. Onde
estão os outros?
— Creio que mortos ou feridos. Vou chamar a emergência, é melhor.
Assenti.
— Chame a polícia também — pedi.
Não demorou cinco minutos e os bombeiros, juntamente com a
polícia, chegaram.
— A senhora está bem? — perguntou um dos socorristas.
— Sim. Mas meu marido não.
— Vamos cuidar dele agora. Nos dê espaço, por favor.
Assenti e me levantei afastando-me.
— Maya! — gritou Caleb ao entrar na cozinha, correndo em minha
direção.
Abracei-o apertado e chorei ainda mais.
— O que aconteceu? O que aconteceu com meu pai? — perguntou
preocupado.
— Foi o Higor.
— O quê? — Soltou-me e encarou-me desnorteado.
— Vai ficar tudo bem agora. Acabou. Os bombeiros e médicos vão
cuidar do seu pai.
— Onde está esse monstro?
— No jardim dos fundos.
— Senhora White? — chamou o policial, aproximando-se.
— Sim.
— Queremos fazer algumas perguntas. A senhora pode falar
conosco agora?
Assenti.
Deixamos a cozinha e caminhamos até a sala de estar. Contei a eles
tudo o que aconteceu, sem deixar passar nenhum detalhe. Foi preciso ser
firme e conter o choro. Um dos paramédicos se aproximou e disse que
Victor estava estável, porém, iriam levá-lo ao hospital, pois ele havia
perdido bastante sangue.
Noberto entrou na casa e veio até mim. Ele tinha uma feição de
preocupação e um curativo na cabeça.
— Noberto. Que bom que está bem. — Fui até ele e o abracei. —
Onde está Brice?
— Ele foi alvejado com dois tiros, um no ombro e outro na barriga.
Os bombeiros o levaram com urgência para o hospital.
— Meu Deus! Preciso contar a Penny.
— Já mandei que a avisassem. Havia outros dois seguranças em um
carro parado à frente da casa. Esses foram mortos, infelizmente.
— Dois seguranças? Achei que somente Brice e Théo estavam
cuidando de nós.
Ele respirou fundo e olhou para os lados.
— Noberto...
— Victor recebeu ontem à tarde um envelope contendo imagens
suas. Em uma delas havia uma frase que soou como ameaça.
— O que dizia?
— Dizia que, enquanto ele estivesse longe, alguém estaria cuidando
de você. Não havia assinatura ou remetente.
— Por isso ele voltou antes do previsto. Victor mentiu e omitiu isso
de mim. — Senti-me chateada. — Eu preciso ir para o hospital ficar com
ele. Vou me trocar.
— Vou lhe aguardar aqui.
Assenti e subi a escada. Depois de me trocar, seguimos para o
hospital. Ao chegar lá na companhia de Noberto e Caleb, encontrei Penny
chorando em desespero na recepção.
— Penny... — chamei-a baixo ao me aproximar.
— Maya! — Ela levantou-se da cadeira e veio em minha direção,
abraçando.
Chorei junto a ela, pedindo-lhe desculpas. Aquilo tudo era culpa
minha.
— Não. Pare com isso. Não é culpa sua. — Soltou-me e me olhou.
— Soube que ele morreu.
Assenti.
— Se não fosse assim, ele talvez nunca pararia. Não se culpe.
— Senhora White — chamou um homem atrás de mim.
— Sim. — Virei-me para ele.
— Me chamo David Rossi. Sou o médico que atendeu seu marido.
— Como meu pai está, doutor? — perguntou Caleb apressado.
— Bem, apesar de tudo. Ele perdeu uma quantidade significativa de
sangue e por isso foi preciso repor. Fizemos uma tomografia, que não
apresentou nada. Do que ele precisa agora, é somente de repouso e
remédios para a dor.
— Graças a Deus! — Respirei aliviada, sentindo meu coração
desacelerar. — Obrigada, doutor. Podemos vê-lo?
— Sim, claro. Uma enfermeira virá para levá-los até ele.
— E quanto ao meu namorado, doutor.
— Eu o atendi quando chegou, mas ele precisava de cirurgia de
emergência para conter a hemorragia e remover as balas. Por muita sorte,
ela não afetou nenhum órgão. O que resta agora é somente esperar pelo fim
do procedimento e mais informações. Com licença. — Ele se retirou.
— Vai ficar tudo bem, Penny. Brice é um homem forte. Ele vai
conseguir sair dessa.
— Eu sei que vai. Meu homem é durão. — Sorriu triste em meio às
lágrimas.
Logo uma enfermeira apareceu e eu e Caleb seguimos até o quarto
onde ele estava. Não muito mais tarde, enquanto Victor ainda dormia, a
polícia apareceu junto a um dos nossos advogados para conversarem
comigo novamente. Nós saímos e seguimos até uma parte ao ar livre dentro
do prédio, próximo à capela. Os policiais pediram desculpas e disseram ter
falhado em não nos comunicar quando Higor fugiu a caminho da prisão.
— Já contestei legítima defesa — informou meu advogado.
— E não vamos contestar — disse o detetive da polícia. — No
entanto, será preciso que vá até a delegacia e preste depoimento.
— Tudo bem, eu farei isso pela manhã. Hoje não.
— Nós entendemos — disse o outro detetive.
— Se me dão licença, eu vou voltar. Acertem tudo com meu
advogado.
— Claro, Sra. White.
Saí e voltei para o quarto. Ao entrar, encontrei Victor acordado
conversando baixo com Caleb.
— Amor... — Aproximei-me dele e beijei com cuidado seu rosto. —
Você está bem?
Ele olhou-me sério e franziu o cenho, encarando-me com
estranheza.
— Quem é você? — perguntou.
Meu sangue gelou e meu corpo adormeceu. Encarei-o incrédula,
sem acreditar que aquilo estava acontecendo. Higor não poderia ter tirado
mais isso de mim. Senti que iria ao chão.
— O quê? — perguntei aos sussurros.
Caleb e Victor explodiram em uma gargalhada. Logo Victor parou
de rir e levou a mão à cabeça fazendo uma feição de dor.
— É brincadeira, Maya — disse Caleb. — Estávamos só brincando
com você.
Fiquei enfurecida e encarei os dois.
— Não brinquem com coisa séria. Não estou com o menor humor!
— Encarei Victor. — Pelo visto, você já está ótimo!
Saí do quarto batendo a porta e indo ver como Penny estava. Ela
também precisava de mim naquele momento. Até mais do que Victor, pelo
jeito.
— Oi. Como você está? — Sentei-me ao seu lado na recepção, em
frente a ala cirúrgica.
— Ele ainda está na cirurgia. — Fungou e secou as lágrimas. — Ele
é a melhor coisa que me aconteceu na vida, Maya. Ele é o único no mundo,
além de você, é claro, que me amou como eu sou. Que me ama aceitando
todo meu passado. Ele me apresentou a família dele, como: “A mulher da
sua vida”. Não posso perdê-lo.
— Você não vai. — Acariciei seus cabelos.
— Olha. — Estendeu-me sua mão esquerda. — Ele me pediu em
casamento há dois dias.
— É lindo, Penny. Vocês ainda serão muito felizes juntos, irão
construir uma história de amor juntos. Não perca a fé.
Ela me abraçou e chorou ainda mais. Depois de alguns minutos, os
médicos apareceram e disseram que a cirurgia havia sido um sucesso e que
estava tudo bem. Logo mais ele seria levado ao quarto e ela poderia ir vê-lo.
Mais calma, levei-a para comer alguma coisa. Sentadas na
lanchonete do hospital, comemos com pouca conversa. Logo anoiteceu, e
depois de visitar Brice, eu voltei para Victor. Ao entrar no quarto, Caleb não
estava. Victor pulava de canal em canal de TV.
— Oi, amor.
— Oi. — Caminhei até uma poltrona e me sentei.
— Quero te pedir desculpas. Eu ou Caleb não sabíamos o que tinha
acontecido. Noberto nos contou tudo. Foi uma brincadeira de péssimo gosto
e na hora errada. Eu sinto muito não ter tido condições de proteger você.
Perdoe-me, querida. Lamento com todo meu coração, que você tenha lidado
com Higor e seu fim trágico. Como você está? — perguntou preocupado.
— A verdade? — perguntei cruzando as pernas e recostando na
poltrona.
Ele assentiu.
— Eu estou bem. Bem, de verdade. Na hora, eu fiquei catatônica,
mas aí me lembrei de que você precisava de mim e fui ao seu encontro.
Depois... Eu esperava que a culpa caísse sobre mim deixando-me apavorada
por ter o jogado para a morte, mas... não. Isso não aconteceu e eu sinto que
não vai acontecer. Talvez, eu esteja errada ou isso seja uma coisa horrível
de se dizer, mas é a verdade. Não me sinto culpada ou arrependida do que
fiz. Ele mereceu aquilo. Ele feriu e matou gente inocente sem ao menos
pensar duas vezes. Era o destino dele, e tudo bem que tenha sido por
minhas mãos. Nunca imaginei que eu teria forças para empurrar um homem
daquele tamanho pela janela. Então... Quanto a isso, eu estou bem. Àquela
hora, eu estava muito preocupada com você e por isso não gostei da
brincadeira. Se fosse em outro momento teria sido engraçado. Desculpe se
surtei. — Levantei-me e fui até ele sentando à beirada de sua cama.
— Você é a Mulher-Maravilha. E é toda minha. — Sorriu e beijou-
me.

Na manhã seguinte, deixei Victor aos cuidados de Caleb e Théo, e


segui para a delegacia junto aos advogados e Noberto. Lá, passei por um
meticuloso exame de corpo de delito e depois prestei meu depoimento
mediante uma câmera e os detetives com quem conversei na tarde anterior.
Depois de tudo resolvido, segui para a saída.
— Maya!
Olhei para o lado e vi Marshall.
— Oi, Marshall. — Caminhamos em direção uma da outra.
— Você está bem? — perguntou preocupada.
— Estou. Agora está tudo bem. — Respirei fundo.
— Eles falharam em não comunicar a vocês. Eu sinto muito.
Também fui a última a saber. Estava em Nova Iorque trabalhando em um
caso novo.
— Tudo bem. Eu sei que, se você soubesse, teria dado um jeito de
evitar tudo o que aconteceu.
— Aquele filho da mãe. Bom... Pelo menos, agora ele está no
inferno. De lá não pode mais machucar você ou qualquer outra pessoa.
— Como ele conseguiu fugir? Os policias não falaram. Higor disse
que ofereceu uma recompensa de dois milhões para quem o soltasse. Mas
de onde ele tiraria tanto dinheiro?
— O moto clube do qual ele fazia parte é uma gangue. Foi selado
um acordo. Se eles pagassem a fuga dele, ele jamais abriria o bico. A
questão é que já estávamos de olho investigando tudo há muito tempo.
Prendemos todos agora.
— E aqueles que o soltaram?
— Eram seis homens. Já conseguimos prender quatro deles. Eles
causaram um acidente no ônibus que transportava Higor e mais nove
detentos. Quatro deles estão foragidos, mas vamos pegá-los. Infelizmente, o
motorista e um dos três policiais a bordo, veio a óbito.
— Eu lamento. Se pudermos fazer alguma coisa pelas famílias, me
avise. Agora tenho que voltar para o hospital.
— Claro. Até mais, Maya. Fique bem. Enfim, seu pesadelo acabou.
Sorri e lhe dei um breve abraço.
Voltei para o hospital e passei o dia com Victor. Na tarde seguinte,
ele recebeu alta e seguimos para casa. As semanas se passaram e Sasha se
mudou para Oklahoma. Ela ficou alguns dias hospedada em nossa casa, até
que achássemos um lugar bom para ele morar.
Vinte dias depois do ocorrido, tudo parecia estar normal. Não
falávamos mais do assunto e Victor já havia voltado a trabalhar. Sasha
estava empolgada com o novo trabalho. Ela tinha um sorriso que ia de
orelha a orelha no rosto.
Victor falava de uma nova inseminação, mas eu coloquei meus dois
pés no freio. Certa noite, sonhei com minha mãe. No sonho, nós estávamos
em uma casa no campo, admirando uma bela plantação de girassóis. Então
ela se virava para mim e dizia: “Vá com calma, querida. A vida ainda tem
muitas surpresas para você. Estou cuidando para que tudo aconteça no
momento exato que tiver de acontecer”. Aquilo foi real demais. Eu acordei
na manhã seguinte e percebi que se não deu certo na primeira vez em que
tentamos, era porque simplesmente não era para acontecer e ponto. Victor
entendeu. Ele disse que, talvez, o certo fosse esperarmos passar o momento
de loucura que andava minha vida com os estudos, para podermos envolver
pessoas inocentes em nossa história. Eu concordei.
CAPÍTULO 32

Alguns anos depois...

Formar-me na faculdade foi o melhor momento da minha vida. Era a


realização do meu maior sonho. Semanas antes do grande dia, Victor
chamou-me em seu escritório no prédio comercial no centro da cidade e
mostrou-me uma maquete. Confusa, olhei para ele e perguntei o que era
aquilo. Ele riu e disse: “É sua clínica, amor. Uma clínica filantrópica”.
Fiquei extasiada. Aquilo era incrível. Nos últimos semestres, trabalhei em
um hospital onde acompanhei centenas de casos tristes de pessoas que não
tinham condições de pagar por cirurgias e tratamentos, e as filas no
atendimento filantrópico eram enormes. Victor acompanhou de perto minha
angústia e doou milhares de dólares ao hospital, para que assim muitos
tivessem a chance de viver.
A clínica estava em construção e já tinha até nome: Memorial
Meredith Valentine. Ali trataríamos de tudo e todos. Uma equipe incrível
estava sendo formada por veteranos e recém-formados em busca do seu
primeiro emprego como médicos, finalmente. Uma parceria paga foi
fechada com o centro cirúrgico de um grande hospital da cidade.
Eu me formei com honra e tive o prazer de ser convidada para ser a
oradora da nossa turma. Foi lindo e incrível. Era uma sensação que não
sabia explicar.
— Parabéns, querida! — desejou meu pai abraçando-me apertado.
— Obrigada, pai. Você faz parte disso.
Ele beijou meu rosto com carinho.
— Saiba que onde sua mãe estiver, ela está feliz por você.
— Ela está aqui, pai. Você não sente? Ela está em nossos corações.
À noite reunimos todos os amigos e familiares em nossa casa para
um jantar em comemoração à minha formatura. Montamos uma tenda no
jardim e colocamos uma extensa mesa para todos sentarmos juntos. E
quando digo todos, estou falando de todos! Brice estava à mesa junto a
Penny e Noberto também com sua família.
— Ah, opa! Alerta de bebê sujo. Se me dão licença, eu vou até a
casa cuidar desse gorduchinho aqui — disse Penny, levantando-se com
Daniel nos braços.
— Eu vou com você. — Levantei-me e seguimos juntas até a casa.
— Pode ficar à vontade para tocar ele, assim já vai treinando para
quando tiver os seus. — Penny riu.
— Está bem. Venha, meu amor. A titia vai trocar você. — Peguei-o
do seu colo e beijei seu rosto.
Daniel era fruto do amor de Penny e Brice. Eles mal esperaram que
ele se recuperasse e se casaram em uma cerimônia simples em uma
igrejinha local. Daniel nasceu um ano depois. Ele era um bebê de seis
meses, muito bonzinho e fofo. Foi uma felicidade imensa quando Victor e
eu fomos convidados para sermos os padrinhos do menino gorduchinho.
— E então... Vocês já estão se programando outra vez para uma
nova tentativa de inseminação? — perguntou ela enquanto eu vestia Daniel.
— Na verdade, sim. — Sorri para ele e entreguei seu bebê a ela. —
Victor e eu vamos semana que vem para Houston fazer uma nova tentativa.
— Ah, meu Deus, Maya! Isso é maravilhoso!
Voltamos à festa e sentei ao lado do meu marido. Dali, observei
todos à mesa. Meu pai, que ria e brincava com Daniel. Minha avó, que
estava em uma conversa superengajada com Maggie. Minhas quatro
melhores amigas – Grace, Penny, Kim e Sasha – conversavam uma mais
alto que a outra. Brice e Ian, namorado da Sasha, e Dick, falavam e riam
sobre algo que eu não entendia. Caleb sussurrava algo no ouvido de Maria
Fé, sua namorada, e fazia carinho nos seus cabelos. Noberto conversava
com Victor e Will, e sua esposa, Norah, estava em uma conversa alto-astral
com Clarice e Sammy. Margot não estava conosco naquela noite. Ela
prezava mais o trabalho e os lucros do que momentos como aquele. Graças
a Deus, meu marido havia aprendido que nem somente de trabalho e
dinheiro vive o homem.

Semanas passaram e eu estava uma pilha de nervos. Victor tentava


me acalmar fingindo estar tranquilo. Depois da inseminação, arrumamos a
mala e seguimos para o Havaí. Precisávamos de uns dias de paz e lazer
somente para nós dois. Os dias naquele paraíso passaram voando. Quinze
dias após a inseminação, voltamos para casa. Victor seguiu para o escritório
e disse que precisava fazer uma ligação para a irmã. Eu avisei-o que ia até a
casa da Penny visitá-los e, principalmente, matar a saudade do nosso
afilhado.
Dirigindo meu próprio carro, fui até lá. Passei a tarde com ela, até
que Brice chegasse no final do dia. Depois de despedir-me deles, segui o
caminho de casa fazendo uma parada em um supermercado. Entrei e andei
até a sessão de produtos de higiene feminina. Era ali que ficavam os testes
de gravidez. Peguei dois de uma marca confiável e voltei para o meu carro e
dirigi para casa.
Ao chegar, Victor estava preparando nosso jantar. Beijei seu rosto e
subi para o nosso quarto. Entrei e fui logo para o banheiro acompanhada
dos testes. Sentada no sanitário, fiz xixi em ambas as canetas. Deixei que
elas agissem no seu tempo e enquanto isso fui tomar meu banho. Ao sair do
boxe, depois de uns vinte minutos, aproximei-me da bancada da pia e
peguei um dos testes digitais nas mãos. Ele estava positivo. Rapidamente
peguei o outro e olhei seu resultado. Também era positivo. Comecei a rir
alto e chorar ao mesmo tempo. Apoiei minha mão na barriga e olhei para
ela. Enfim estava grávida. A porta do banheiro foi aberta e Victor entrou.
— O que houve? Está tudo bem? — perguntou com preocupação.
Olhei para ele e sorri abertamente, lhe entregando o teste. Ele o
pegou de minhas mãos e olhou-o incrédulo.
— Amor... Isso... Isso quer dizer... — interrompeu-se e olhou para
mim com os olhos marejados.
Assenti em meio às lágrimas.
— Vamos ter um bebê. Ou talvez dois ou três.
Victor gargalhou e se aproximou, abraçando-me apertado.
— Conseguimos. Conseguimos!
— Sim, conseguimos, amor — disse e beijei-o.
Victor levou-me em seu colo para a cama e deitou-me
cuidadosamente sobre o colchão. Lá, ele beijou meu corpo inteiro e fez
amor comigo, lentamente e apaixonado. Mal podia acreditar que,
finalmente, nosso amor estava dando frutos.
Uma semana se passou e era hora de voltar para Houston e fazer a
primeira ecografia. Estava tão ansiosa que minha boca secou e minhas mãos
tremiam. Victor sentou-se ao meu lado e a segurou firme.
— Você está vendo alguma coisa, doutora? — perguntei apreensiva.
— Estou sim. — Sorriu para mim. — Vocês querem escutar o
coração?
— Mas é claro que sim! — disse Victor apressado.
— Certo. Bom... Esse som que vão escutar agora é o coração do
bebê número um.
— Número um? — eu e Victor perguntamos em uníssono.
Ela riu e, em seguida, um som frequente e forte invadiu meus
ouvidos, nos deixando completamente emocionados, chorando sem querer
ou perceber.
— Agora esse é o som do bebê número dois. — O som parou e
outro, tão forte quanto, se iniciou. — Agora os dois juntos.
Os dois corações batiam ritmados e fortes. Aquele era o som mais
lindo que ouvi na vida. Olhei para Victor e o vi chorar de verdade, pela
primeira vez. Não era somente olhos emocionados como vi muitas vezes.
Era um choro alto e de pura alegria. Ele se debruçou sobre mim e me
abraçou apertado.
— Obrigado por isso.
— Não. Sou eu quem agradeço, amor. — Beijei-o.
A médica disse que só poderíamos ver o sexo dos bebês em quinze
semanas. Até lá, eu devia maneirar nos exercícios físicos e na alimentação,
para que eu tivesse uma gestação mais tranquila possível durante os
próximos sete meses.
Voltamos para casa e reunimos a família na casa da minha avó, em
Tulsa, para um almoço típico de domingo. Não aguentamos a ansiedade e
contamos a todos que estávamos grávidos e esperando dois bebês. Fomos
abraçados e nos desejaram felicitações. Meu pai chorou de emoção e disse
que não acreditava que estava ali, vivendo aquele momento. Nem mesmo
nós, eu e Victor, acreditávamos que estávamos vivendo aquela realização de
um sonho nosso.
CAPÍTULO 33

Ver a barriga da Maya crescer, pouco a pouco, cada dia mais, foi a
coisa mais incrível que já me aconteceu na vida, após o nascimento do meu
filho, é claro. Caleb estava muito feliz com os bebês que estavam prestes a
nascer. Maya havia conseguido segurar sua gravidez com todos os devidos
cuidados, até o oitavo mês. Sua barriga já estava imensa, ela não dormia há
dias, andava muito irritada, com falta de ar e havia engordado doze quilos,
o que a deixava ainda mais chateada nos momentos sensíveis e,
principalmente, quando uma roupa de gestante não lhe cabia mais. Às
vezes, ela ficava tão nervosa que brigava com todo mundo sem motivos,
mas nós entendíamos. Seus hormônios estavam à flor da pele.
Entrei no closet e a vi passar hidratante pelo corpo. Aproximei-me
dela e a abracei por trás, segurando sua barriga com as duas mãos.
— Você é a mulher mais bonita desse mundo.
Ela sorriu e aconchegou-se em meus braços.
— As gêmeas não se mexem há dois dias. Estão apertadas aqui
dentro.
— Elas querem sair. Estão loucas para ver o mundo aqui fora, não é
mesmo, meninas? — Em resposta senti apenas um tremor sob a palma da
minha mão esquerda.
— Sentiu isso? — perguntou surpresa.
— Senti sim. Essas são as garotas do papai — disse com orgulho,
fazendo Maya rir.
Dois dias depois, em meio à madrugada de uma quarta-feira, nasceu
Mary e Louize. Ambas saudáveis e lindas. Mary, a primeira a nascer, tinha
trinta e três centímetros e dois quilos e duzentos gramas. Louize veio ao
mundo com trinta e cinco centímetros e pesando dois quilos e quatrocentos
gramas. O parto seguiu sem complicações. Eu tive a chance de pegá-las
ainda sujas em meus braços e olhar o rostinho de cada uma delas.
Minhas meninas foram levadas para a incubadora, durante as
primeiras quarenta e oito horas. Cinco dias depois estávamos em casa. As
primeiras noites não foram as melhores. Mary e Louize acordavam a cada
três horas para mamar e demorava mais de uma hora para dormir
novamente. E com o passar dos anos, isso não mudou. Tivemos noites de
febre, dores de garganta, gripe, catapora e muito mais. As dificuldades
existiam dia após dia, mas o amor e as alegrias apenas cresciam.
Todos os dias pela manhã, antes de acordá-las, e no final da noite,
depois de colocá-las para dormir, eu as admirava agradecendo por mais um
dia ao lado dos meus filhos e Maya. Eu era feliz por ter todos eles comigo.
Os amava demais e dava tudo de mim para fazê-los felizes também.
— Olha, papai. Uma fada — disse Mary, mostrando-me seu
desenho.
Estávamos os três sentados no tapete da sala de estar, desenhando.
Maya ainda não havia chegado do hospital e a babá já havia ido embora,
passavam um pouco mais das sete da noite.
— Uau! Ficou lindo, querida.
— E o meu, papai? — perguntou Louize, mostrando o carro que
pintava.
— Está incrível. Tenho duas artistas em casa.
— A mamãe vai passar a noite no hospital de novo? — perguntou
Mary.
— Não, amor. Ela já deve estar quase chegando.
— Estou com fome — disse Louize.
— Podemos pedir pizza? — perguntou Mary.
— Vamos esperar a mamãe chegar. Okay?
— Okay — disseram juntas e voltaram a desenhar.
A porta da frente foi aberta e depois fechada.
— Papai, o que está desenhando? — perguntou Mary.
— Um cavalo.
— Parece um cachorro atropelado — falou Louize e as duas riram
alto.
— Olá! — cumprimentou Maya ao entrar na sala.
— Mamãe! — As duas gritaram e correram de encontro a ela.
— Oi, minhas meninas.
Ela abaixou-se à frente delas e as abraçou, enchendo-as de beijos.
As meninas riam e diziam estar com saudade da mãe. Levantei-me e fui até
elas. Maya se ergueu e eu me aproximei mais.
— Oi, amor. — Ela sorriu e beijou-me.
— Como foi o dia, querida?
— Longo e cansativo. E o seu?
— Papai desenhou um cachorro atropelado — falou Louize se
dependurando na mãe.
— O quê? — Maya olhou-me com humor nos olhos.
— Eu fiz uma fada. Vem ver.
As duas pegaram a mãe pelas mãos e as levaram até o tapete onde
desenhávamos. Maya se sentou no chão e elas se sentaram em seu colo,
mostrando seus desenhos. Sentei-me no sofá ao lado e fiquei as vendo rirem
e conversar animadamente. Pedimos pizza e às nove as crianças tomaram
banho e foram para a cama. Depois que elas dormiram, Maya entrou no
quarto e tirou toda a roupa.
— Venha. — Estendeu-me sua mão.
Levantei-me da poltrona em que estava sentado, depositando o copo
vazio no aparador ao lado, e coloquei minha mão sobre a sua. Seguimos
para o banheiro e ela me despiu lentamente acariciando e beijando meu
corpo. Seus beijos subiram do meu peitoral, passando por meu pescoço,
indo até minha mandíbula. Seus lábios tocaram os meus e nós nos beijamos
com carinho e lentidão.
— Vamos para o chuveiro.
Entramos no boxe e ligamos o chuveiro. Ali, debaixo da água
quente, amei minha mulher mais uma vez antes que ela se submetesse a
mim de joelhos por amor e devoção. Eu amava Maya incondicionalmente.
Ela era tudo para mim. Mostrou-me que eu poderia sentir amor verdadeiro
outra vez e como aceitá-lo. Maya era meu pilar. Deu-me momentos
especiais e incríveis. Ensinou-me muito. Se eu partisse agora, faria com o
coração tranquilo, sabendo que dei a ela filhos e o melhor de mim. Só me
arrependo de ter começado a aproveitar tão tarde minha vida com aqueles
que amava. Mas, talvez, fosse porque ela ainda não havia sequer nascido.
Eu estava destinado a ela, assim como ela estava destinada a mim.
Tínhamos certeza disso. Passamos por tanto, que muitos casais não teriam
suportado, mas nós ainda estávamos ali, juntos e firmes um ao lado do
outro, até quando Deus ou qualquer outra força maior quisesse e permitisse.
Nossa relação nunca foi perfeita, longe disso. Eu maltratei e tratei-a de
forma injusta, suja. Persisti no erro, mas ainda assim ela me abriu seus
braços e pacientemente mostrou-me com amor, o quanto eu estava errado e
deu-me mais uma chance. Eu aprendi com os meus erros, com os seus e
com os quais cometemos juntos. Eu acreditava em destino. E o meu se
chamava Maya Valentine.
EPÍLOGO

Acordei às quatro da manhã e, mais uma vez, assisti ao dia


amanhecer. Era essa minha rotina há cinco anos. Levantei-me quando o
celular despertou às sete e meia da manhã. Tomei meu banho, arrumei-me e
desci para o andar de baixo. Na cozinha, liguei a cafeteira e quebrei os ovos
na tigela, adicionando temperos e preparei a omelete, enquanto as torradas
ficavam prontas.
Olhei a hora no relógio de pulso e vi que já passavam das oito e
meia. A qualquer momento, Mary e Louize desceriam a escada correndo,
animadas para o Quatro de Julho na casa do avô. A campainha tocou e eu já
sabia quem era. Caminhei até a porta da frente e abri-a.
— Bom dia! — desejou Caleb sorridente, estendendo-me uma caixa
de cupcakes.
— Bom dia. Entre.
Dei-lhe passagem e ele entrou.
— Acabei de passar um café e fazer omeletes. Vem.
Segui para a cozinha e ele me acompanhou. Caleb sentou-se à ilha e
colocou a caixa com os bolinhos sobre a mesma. Servi uma caneca de café
e lhe entreguei.
— Como está a Maria Fé?
— Você já esteve grávida, sabe como é o final da gestação.
Sorri.
— É uma tortura, mas a melhor tortura do mundo.
— As meninas ainda estão dormindo?
No instante que ele se calou, escutamos elas descerem a escada
correndo.
— Caleb! — As duas gritaram juntas e correram em direção a ele.
Ele se levantou e pegou a duas, segurando uma em cada braço, e
rodopiou com elas no ar. As meninas amavam o irmão, assim como ele as
amava.
— Onde está a Maria Fé? — perguntou Mary.
— É. Por que ela não veio? — questionou Louize.
— Ela ficou em casa, a mãe dela veio nos visitar. Mas eu vim ver
vocês e... — pegou a caixa com os cupcakes e a abriu, mostrando-lhes os
doces — trazer isso aqui.
As meninas gritaram pulando. Elas eram loucas por doces e
gostavam mais ainda quando o irmão trazia para elas.
— Podemos comer agora, mãe? — pediu Louize.
— Por favor, por favor... — suplicou Mary.
— Cada uma pode comer um, mas só depois de tomarem o café da
manhã. Sentem-se à mesa — mandei e elas foram correndo.
— Já se organizou para levá-las à Disney no aniversário de onze
anos? — perguntou baixo e tomou um gole do café. — Elas querem muito
isso.
— Ainda tem alguns meses pela frente, estou analisando.
Ele sorriu.
— Certo. Se quiser vir ficar conosco hoje, são bem-vindas. Sabe
disso, não é?
— Eu sei sim e agradeço, mas meu pai e Clear estão esperando por
nós.
— Tudo bem. Eu venho no fim de semana ver como vocês estão.
Bom... — Levantou-se e caminhou em direção às meninas. — Eu já vou
indo. Se comportem, garotas. — Beijou a cabeça de cada uma delas.
— Não esquece que tem jogo de futebol no sábado de manhã —
cobrou Louize.
— E nem do meu recital de balé na sexta-feira à noite — falou
Mary.
— Eu não vou me esquecer, já está na minha agenda. — Ele
caminhou até mim. — E você... — apontou-me — fique bem. Sabe que
pode me ligar quando precisar, não é?
— Eu sei. — Sorri com gratidão e carinho.
— Eu te amo. — Beijou minha testa.
— Também te amo, querido.
— Tchau! — gritou ele saindo da cozinha e logo em seguida escutei
a porta bater.
— Vocês têm meia hora para estarem prontas no carro — alertei-as.
— Vamos visitar o papai no caminho? — perguntou Louize e Mary
me encarou, esperando a resposta.
— Podemos. Mas não me enrolem. Temos que sair em trinta
minutos.
Elas terminaram de comer e subiram para se vestir, enquanto eu
colocava a louça suja na lavadora. Já fazia um mês que elas não visitavam o
pai e era natural que sentissem saudade de ir até ele.
Seguimos viagem para a casa do meu pai, enquanto elas comiam
seus bolinhos no caminho. O som estava ligado em uma música irritante de
alguma adolescente famosinha da Disney. Aproximei-me dos portões pretos
de ferro abertos e dirigi no limite de vinte quilômetros por hora, até o
estacionamento. Parei, desliguei o carro e virei-me para elas.
— Sejam rápidas. Temos que estar na casa do vovô em vinte
minutos e ainda temos quinze de estrada.
Elas assentiram e desceram do carro correndo. Eu saí em seguida e
fui caminhando vagarosamente logo atrás. De longe, fiquei as observando
conversar com o pai. Bom... Ao menos onde seu corpo descansava há cinco
míseros anos. Mesmo depois de tanto tempo ainda era difícil e doloroso
para mim estar ali. Não ter Victor mais ao meu lado era terrível. Mas ainda
tinha nossas meninas lindas, frutos do nosso amor.
Perdi o homem da minha vida, após uma noite em que tínhamos
saído sozinhos para jantar. Entramos em casa e Victor foi até o bar na sala
de estar, servindo-se de uma dose de conhaque. Sentei-me no sofá e tirei as
sandálias. De cabeça ainda baixa, escutei seu copo cair no chão. Olhei para
ele e o vi me encarar com a mão esquerda espalmada sobre o peito. Chamei
por ele e corri em sua direção, mas antes que eu o alcançasse, ele caiu no
chão. Reconheci de imediato que ele estava tendo um infarto. Comecei a
gritar por ajuda e os seguranças entraram correndo. Gritei tão alto que
acordei nossas filhas, que dormiam no piso de cima. Enquanto o socorro
não chegava, tentei de todas as maneiras reanimá-lo. Fiz tudo o que eu pude
e que estava ao meu alcance. Victor chegou sem vida ao hospital. Aquela
noite ainda era viva em minha memória e doía me recordar. Eu vivia aquele
instante todos os dias da minha vida em forma de pesadelo. Sempre
acordava às quatro da manhã e não conseguia mais dormir.
Victor partiu levando com ele meu coração que tanto o amava
incondicionalmente. Ainda era nova, tinha apenas trinta e cinco anos, mas
sabia que jamais encontraria alguém como ele, e talvez eu nem quisesse ter
outro alguém algum dia. Eu sentia que viveria em luto para o resto da
minha vida. Mas fazia meu maior esforço para ficar bem e seguir adiante,
afinal, tinha duas crianças para criar sozinha.
Sabíamos que um dia isso aconteceria e sempre falávamos disso.
Victor havia me feito jurar de joelhos para ele, que não deixaria minha vida
parar ou morrer quando ele partisse. Mas estava sendo difícil. Muito difícil.
Eu tentava a todo custo e instante cumprir minha promessa e iria.
As meninas trocaram as flores do túmulo e deixaram desenhos para
o pai. Depois elas seguraram uma na mão da outra e vieram correndo em
minha direção, abraçando-me pela cintura.
— A gente te ama, mamãe — disse Louize.
— Eu também amo muito vocês, minhas meninas.
— Não fica triste, mãe. Se você ficar assim, o papai também fica —
disse Mary.
— É só saudade, amor. Não estou triste.
— Está sim, a gente sabe. Mas eu e a Mary estamos aqui com você.
Abracei as duas e seguimos para dentro do carro. Voltei à estrada e
dirigi em direção ao lago, onde meu pai morava com a atual esposa: Clear,
uma mulher incrível.
Parei o carro à frente da casa e a porta da frente foi aberta. Lá de
dentro saíram meu pai e Clear. As meninas desceram e correram em direção
a eles.
— Vovô! — gritaram em uníssono.
Clear entrou na vida do meu pai há sete anos. Eu fiquei muito feliz
em vê-lo seguir em frente. No começo ele ficou receoso, mas logo entendeu
que ela apenas somaria a sua vida e jamais ocuparia o lugar de minha mãe.
E Clear nem queria isso. Ela apenas queria amar e ser amada. As gêmeas as
adorava e as chamavam de vovó.
Aproximei-me deles e cumprimentei-os. As meninas logo foram
entrando correndo acompanhadas por Clear e eu e meu pai ficamos para
trás.
— Então, querida... Como andam as coisas?
— Estão indo bem. As meninas passaram de ano, a abertura da nova
filial filantrópica da clínica será inaugurada em dois meses.
— Não estou falando disso. Estou falando do seu coração. Como ele
está?
— Em frangalhos.
Paramos no hall de entrada.
— Querida... Não vou mentir e dizer que essa dor passa, porque ela
não passa. Ele vai apenas diminuir e você irá aprender muito com ela. O
amor que você sente por ele nunca vai morrer. Mas no momento certo, você
encontrará alguém com quem viver novas histórias e talvez crescer a
família. E quando isso acontecer, não se feche como eu fiz com a Clear.
Deixe as coisas acontecerem naturalmente e não se prive de nada. A vida
continua, minha filha.
— Mamãe! Você tem que vir ver como os girassóis do jardim estão
lindos hoje — disse Mary com pura animação.
— Já estou indo, meu amor.
— Não. Vem agora! Vem, vovô. — Ela saiu correndo e nós a
seguimos.
Lá fora, nos fundos da casa, havia um lindo jardim. Nele, tinha um
invejável canteiro de girassóis que já estava ali quando meu pai comprou a
nova casa. Na verdade, foi exatamente eles que o fizeram fechar o negócio.
Quando entrei ali pela primeira vez, me arrepiei. Era a casa de campo
exatamente igual àquela do sonho que tive com minha mãe anos atrás.
Clear apareceu com Louize e nos chamou para tomar um chá. Todos
entraram e eu fiquei ali um pouco mais, admirando as flores. Respirando
fundo, pensei em tudo que meu pai havia dito minutos atrás. Será que em
algum momento eu amaria outra vez? Será? Só de pensar, um sentimento de
traição me invadia e era horrível.
No final da tarde, voltamos para casa e saí deixando as meninas com
a babá. Eu havia combinado de ir encontrar Penny e Sasha para um vinho
em um bistrô não muito longe de casa. Ao chegar lá, assim que entrei, logo
avistei minhas amigas em uma mesa próxima ao bar. Caminhei em direção
a elas e, sem querer, esbarrei em um paletó que estava sobre o encosto de
uma banqueta no bar, fazendo-o cair no chão. Parei e o peguei rapidamente.
— Desculpe — pedi ao dono do paletó ao apanhá-lo do chão.
— Tudo bem, não tem problema — disse uma voz grave e suave ao
mesmo tempo.
Ergui-me e olhei para o homem sentado no bar à minha frente. Ele
sorriu com simpatia e eu lhe entreguei seu paletó.
— Obrigado.
— Não tem de quê. Desculpe mais uma vez — pedi sem graça e saí.
— Oi, garota. O que foi aquilo? — perguntou Penny curiosa, com
um sorrisinho cínico.
— Derrubei o paletó do homem sem querer. — Sentei-me à mesa.
— Não estou perguntando do incidente, estou falando da troca de
olhares.
— Você está louca, não teve nenhuma troca de olhares.
— Ah, teve sim — contestou Sasha.
O garçom apareceu e serviu-me uma taça de vinho tinto.
Começamos a beber e conversar sobre o dia a dia. De repente, o garçom
retornou a nossa mesa sem ser chamado e com uma garrafa de vinho na
mão.
— A gente não pediu — disse Sasha a ele.
Não estávamos entornando uma garrafa, estávamos bebendo de taça
em taça com o limite de quatro cada uma.
— Eu sei, senhoritas. Foi o cavalheiro no bar que mandou a garrafa
com seus cumprimentos a senhorita — disse olhando para mim.
Olhei para Penny e Sasha, sem saber o que dizer ou fazer.
— Posso servi-las? — perguntou o garçom.
— Mas é claro que pode — disse Penny. — Diz ao homem que ela
agradece.
— Claro. Com licença. — Retirou-se depois de nos servir.
Peguei minha taça e olhei em direção ao bar. O homem o qual eu
havia derrubado seu paletó olhava para nós e sorria como um galanteador.
Levantei minha taça em sua direção em forma de agradecimento e fiz um
breve e cordial cumprimento de cabeça. Ele ampliou ainda mais seu sorriso
e fez o mesmo, dando um gole em seu uísque.
Era bonito, alto, de cabelos pretos e olhos castanhos. Não devia ter
mais do que quarenta anos.
— Ai, meu Deus! Não se feche, Maya. Deixa fluir — disse Sasha.
— Victor estará sempre com você. Mas a vida continua.
Respirei fundo e sorri com carinho para as minhas amigas. Então
ergui a taça novamente e fizemos um brinde silencioso antes de dar o
primeiro gole no vinho italiano. Repousei a taça sobre a mesa e olhei
novamente para ele e sorri receptiva. Acho que tudo acontece quando
menos queremos ou esperamos. Não mandamos no destino. É ele quem nos
tem e manda em nosso tempo.
NOTA DA AUTORA

Querido leitor,

Foi uma jornada e tanto até aqui, não é mesmo?! Dois anos e meio
me dedicando a essa história linda, que tanto me ensinou. Espero que possa
ter aprendido algo também, sentido com o coração as mensagens
escondidas entre as linhas. Desculpe se o final não lhe agradou, mas é que
tinha que ser assim. É o ciclo da vida. Nascemos, amamos e morremos para
viver no coração de quem nos ama.
Não vou mentir e dizer que foi fácil me despedir da Maya e do
Victor, porque não foi. Doeu, chorei um pouquinho e já estou com imensa
saudade. Mas tudo precisa ter um fim.

Até breve,
Larissa Braz.

XOXO
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2. Reconstruindo Sonhos
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BIOGRAFIA
Sou escritora profissional desde 2017 com oito livros publicados.
Primeiro romance foi desenvolvido no Wattpad, onde ainda escrevo
histórias recheados de muita paixão, drama e mistério. Convido você a
mergulhar nestas leituras, explorando lugares e vivendo momentos com
personagens incríveis.

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