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Título Original: O AMIGO DO MEU IRMÃO.

Copyright ©Taty Aguiar


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Todos os direitos reservados.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos


descritos, são produtos de imaginação do autor. Qualquer semelhança
com nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.

Revisão: Rita Flores


Diagramação: Priscila Maciel
Capa: Taty Aguiar
Selo: Fraternidade de escritores.
Comédia Romântica
Classificação +18./ contém cenas íntimas entre casal.
Coleção: Amamos clichês
Sumário
Sumário
Dedicatória
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Epílogo
AGRADECIMENTOS
Dedicatória

Dedico essa história a todas as mães solos, que se viram nos trinta
para dar o melhor aos seus filhos.
Capítulo 1

GABRIELA

Eu nem acreditava que, finalmente, tinha encontrado o meu príncipe


encantado. E lá estava ele, surfando nas águas revoltas do mar com uma
energia contagiante.
Deitada em minha espreguiçadeira disposta sobre a extensa faixa de
areia, de biquíni sob um sol escaldante, fechei os olhos e deixei que o
cheiro da maresia envolvesse minhas narinas e os meus sentidos. Amava o
mar, a natureza, e estava eufórica por estar ali, desfrutando daquela
maravilha na companhia do meu amor.
Eu havia bebido alguns drinques de gim e frutas, e preferi não entrar
na água. Não demorou para o excesso de bebida provocar um relaxamento
que fora muito bem-vindo. Precisava descansar. Ô, se precisava.
A noite de prazer que meu amor me proporcionou foi incrível, gozei
como nunca, das mais diversas formas e nos locais mais inusitados do
apartamento.
Um sentimento de paz tomou conta de mim e, feliz, dei um sorriso
satisfeito. Contudo, o cansaço falou mais alto e foi impossível resistir à
sonolência. Acabei cochilando.
Só que a calmaria durou pouco tempo, o sono tornou-se agitado e
tudo virou um grande borrão. Comecei a sentir o chão se movimentando,
como se um terremoto o abalasse e passei a ouvir uma voz fina me
chamando, distante.
Até que meus olhos abriram de repente, tirando-me do meu sonho e
do estado de felicidade em um milésimo de segundo, para descobrir que
tudo não passara de uma fantasia da minha mente frustrada.
Não existia praia, mar, nenhuma beleza paradisíaca para admirar,
muito menos um príncipe encantado para chamar de meu. Pior, nem o rosto
do dito cujo lembrava. Eu continuava morando de favor no apartamento do
Alê e o terremoto que me sacudia nada mais era do que Isabela, minha
amada filha, que me chacoalhava desesperada em plena madrugada,
querendo atenção por causa de um pesadelo.
— Mãezinha, acorda! — pediu, deitando junto de mim, e colocando
a cabeça em meu ombro.
— Oi, filha, por que acordou a essa hora?
— Sei não, mãe. Acordei com um barulhão, mas depois não ouvi
mais nada. — Ela bocejou, e em seguida resmungou mais algumas coisas
incompreensíveis.
— Você deve ter sonhado, meu amor. Dorme com a mamãe.
Isabela fechou os olhos e aproveitei de sua letargia para fazê-la
dormir novamente, antes que despertasse de vez. Abracei minha pequena e
beijei sua cabeça, acalentando-a do jeitinho que sabia que gostava.

— Isa, por que você ainda não colocou o uniforme? — perguntei,


assim que abri a porta do quarto.
Minha filha estava deitada na cama, na certa brincando com um
joguinho no celular e ainda vestia seu pijama de bolinhas coloridas.
Respirei fundo, coloquei minha bolsa sobre a cômoda, tentando não perder
a pouca paciência que me restava.
— Não quero ir pra a escola, mãe! — Como costumava fazer
quando estava emburrada, enfiou-se debaixo do cobertor e me ignorou.
— Nós estamos atrasadas, Isabela. — Bati palmas assustando-a, e a
pestinha colocou a cabeça para fora do amontoado de pano.
— Mãe, me deixa faltar, por favorzinho. Aquilo lá é chato demais.
— Ah, senhor, eu mereço! — resmunguei, sentando-me ao seu
lado. — Filhinha querida da mamãe — continuei, sem conseguir conter o
tom irônico, depois a encarei, séria: — Vá trocar de roupa, agora!
— Mas mamãe...
— Nada de “mas mamãe”, Isabela! — falei, firme. Ela saiu
resmungando em direção ao seu armário, enquanto a observava se
movimentando pelo quarto.
Eu sabia que não seria fácil a missão de criar uma criança sozinha.
Tanto, que nem reclamei quando minha vida sofreu uma mudança radical há
sete anos. Passei de patricinha superprotegida à mãe solo superprotetora,
contudo, eu era feliz demais por ter Isabela em minha vida.
Não vou dizer que foi fácil ser mãe solo, descobrir aos dezoito anos
que estava grávida de um irresponsável que, mesmo sabendo que eu seria
expulsa de casa, não se importou nem um pouco em me abandonar ao
receber a notícia de que seria pai.
Passei por momentos bem difíceis.
Mário, meu pai, é aquele tipo de homem machista, cheio de
preceitos religiosos ridículos, onde o mais importante sempre foi a moral e
os bons costumes, ao invés do bem estar e felicidade dos filhos. Da filha,
quero dizer. Porque meu irmão podia fazer tudo que quisesse, simplesmente
por ser homem. Minha mãe havia falecido um ano antes de tudo acontecer,
vítima de um infarto, e nem ela eu tive para me apoiar.
— Mãe, se eu ficar bonitinha na escola a senhora deixa eu ligar pro
dindo?
Ela não disse isso. Disse? Pior que sim.
Isa estava tentando me subornar para falar com o padrinho que
viajava pela Europa com o namorado há uma semana. Cansei de explicar
que Alê estava em outro país, onde o fuso horário era diferente e precisava
esperá-lo ligar, mas Isa sentia falta dele e vivia pedindo.
— Olha, ligar não prometo. Podemos mandar uma mensagem para
ele e dizer o quanto você está com saudades.
Fiquei com pena da carinha triste da minha pequena, porém, meu
primo planejou essa viagem dos sonhos por tantos meses e não queria
incomodá-lo.
Alê foi um anjo colocado por Deus em minha vida. Meu amado
primo morava sozinho em um apartamento pomposo no centro da cidade e
me deu abrigo quando meu pai me colocou para fora de casa.
Além do apoio financeiro, recebi todo o suporte psicológico para
criar minha filha, e, ainda hoje, com condições para morar em outro lugar,
eu não conseguia sair debaixo de suas asas. Toda vez que decidia me mudar,
o safado chorava e fazia o maior drama dizendo não querer ficar longe de
Isa.
— Já chega, filha. — Com pressa, abri a porta e indiquei a saída. —
Precisamos ir.
O trajeto até a escola foi curto. Essa era uma das vantagens de morar
em uma cidade pequena. Tudo ficava próximo.
Nasci e fui criada em Mococa, um município do interior do estado
de São Paulo. Foi maravilhoso crescer na tranquilidade de uma cidade
pequena, poder brincar livre na rua, na praça. Uma das primeiras
lembranças que tinha da minha infância, era de mim, brincando no coreto
da praça da Igreja Matriz de São Sebastião, cercada de cuidados por minha
mãe e Júnior, meu irmão mais velho. Embora muitos preferirem viver em
grandes centros urbanos, eu amava e me sentia extremamente feliz aqui.
— Mãezinha, jura juradinho que vai mandar mensagem pro dindo?
— perguntou, ainda de mãos dadas comigo.
Estávamos paradas na frente da escolinha e a professora a aguardava
na entrada. Sorri, tentando acalmá-la e confirmei que conversaria com Alê.
— Prometo, prometido. Agora vai. Sua professora está esperando.
— Abaixei-me para abraçá-la, entreguei a mochila e me despedi com um
aceno rápido.
Com a primeira missão do meu dia cumprido, segui para o trabalho.
Hoje em dia precisava me desdobrar em duas para dar conta de tudo.
Em horário comercial eu era a Gabriela Mendes Porto, enfermeira
responsável e muito bem qualificada, que cuidava de seus pacientes com
carinho e dedicação. Fora dos turnos da clínica, eu era a Gaby mãe, a
mulher que se desdobrava para cuidar da filha pequena, do trabalho, dos
serviços de casa, e que sempre arrumava um tempinho no final do dia para
relaxar lendo um dos seus adorados livros de romance.
Mesmo com todos os percalços e adversidades, não houve um
segundo nesses últimos sete anos que eu me arrependesse da decisão de não
interromper a gravidez, coisa que meu pai queria que eu fizesse. Engraçado
como algumas pessoas manipulam a religião a seu bel prazer. O doutor
Mário era um exemplo. Ele usava sua crença como desculpa para não
aceitar uma filha mãe solteira, mas teria lidado facilmente com a ideia de
ter uma filha que fizera um aborto.
Isso não entrava em minha cabeça.
Isabela era minha vida, o alicerce que me sustentava e meu peito
doía só de imaginar não tê-la ao meu lado.
Forcei a esconder as mágoas no fundo do meu coração, disposta a
mantê-las por lá, trancafiadas, para não cobrir minha vida de
ressentimentos.
Capítulo 2

GABRIELA

Barulhos de música alta, batidas ocas, como marretadas em uma


parede me fizeram acordar.
Merda!
— Isabela… de novo não — resmunguei, ainda de olhos fechados.
A resposta não veio como na noite anterior e o barulho continuou.
Cheguei a sentar, assustada, sem saber o que acontecia e o que me
fizera acordar. Meu sono era leve, e não precisou de muito para descobrir
que o barulho vinha do outro lado da parede do meu quarto, justamente a
que ficava atrás da cabeceira da minha cama. Segundos depois, o som foi
aumentando, comecei a ouvir vozes no apartamento vizinho e logo entendi
o que acontecia: alguém estava transando.
— Vai, delicia, mete rápido. Me come gostoso — disse a mulher,
alucinada.
— Ah, gostosa, você não tem noção do que tá pedindo.
Levei um susto imenso. Morava ali há seis anos e nunca tinha
acontecido uma coisa daquelas. Tudo bem que os antigos proprietários, dois
idosos, estavam incapacitados para aquele tipo de atividade há tempos, mas
eu nem sabia que a família Assunção tinha vendido o apartamento.
Fiquei irada.
Não que tivesse preconceito ou pensasse mal de quem fazia orgias
dentro de casa. Estava pouco me importando com as atividades sexuais do
vizinho. Não era porque minha vida sexual era uma merda, que ficaria
horrorizada com a meterola alheia.
Mas porra, eram três horas da manhã!
— Ah! Fode, gostoso, fode com força.
Caralho, que mulher fogosa.
Os barulhos continuaram, mais intensos, e quase grudei os ouvidos
na parede, curiosa. Ouvir a putaria do vizinho serviu para me deixar ainda
mais irada.
E nem podia dizer que o problema foi o medo que Isa ouvisse
alguma coisa. A desgraceira toda era porque há muito tempo eu não
transava, e, para falar a verdade, minha vida sexual fora tão sem graça que
me peguei imaginando como seria ter uma transa intensa como aquela.
Porque umas tinham tanto e outras tão pouco?
O pai de Isa, um ex-namorado da época da faculdade, era um idiota
arrogante que importava apenas consigo mesmo. Nunca se preocupou se o
sexo estava sendo prazeroso para os dois, queria atingir seu próprio prazer e
fim. Engraçado como a paixão manipula nossa mente e nos cega. Só
entendi que não devia aceitar um relacionamento merda como aquele
quando fui abandonada grávida.
Minhas experiências sexuais depois do nascimento de Isa foram
desastrosas. Como mãe solteira não sobrava tempo para me divertir, e, nas
poucas vezes em que cedi a insistência de Alê e Ana, para que saísse e
aproveitasse a vida, só conheci malucos que fizeram eu ter certeza de que
seria melhor ficar sozinha. Colecionava histórias bizarras e hilárias de
encontros fracassados.
Durante quinze minutos eu revirei de um lado para o outro da cama,
ouvindo os gemidos, e acabei sendo envolvida em um clima de excitação
que me deixou com um tesão dos infernos.
— Chega, Gabriela! Tá feia coisa, hein, minha filha… credo! —
ralhei comigo mesma e me levantei depressa.
Não tinha cabimento ficar ali, ouvindo a transa do vizinho. Agarrei
meu travesseiro e fui para o quarto de Isa. Era melhor dormir encolhida em
uma cama de solteiro do que passar vontade.

Parei no estacionamento da Clínica Geriátrica Pró Vita e puxei o


freio de mão do meu carro. O espaço era grande e possuía médicos de
muitas especialidades. Os atendimentos iam desde consulta e exames de
rotina, a tratamento de doenças, reabilitação e cuidados de fim de vida. Era
um trabalho cansativo, eu passava nove horas em pé correndo de um lado
para o outro.
Ser enfermeira não foi a minha primeira opção de profissão. Por
causa da gravidez, alguns sonhos ficaram para trás, e perder a oportunidade
de cursar a faculdade de fisioterapia foi o que mais doeu. Sem condições
para arcar com as mensalidades, troquei o curso superior em Fisioterapia
pelo de técnico em Enfermagem, que era gratuito e me garantiria um salário
fixo no final do mês para cuidar da minha menina.
Foi uma luta conciliar gravidez, maternidade e estudos. Felizmente
venci e amava o meu trabalho, poder cuidar dos meus velhinhos.
Consegui um estágio na Pró Vita ainda na faculdade e, ao término
do curso, fui contratada. Com um bom salário, enfim, pude me sentir uma
mãe responsável de verdade. Mesmo morando de favor na casa de Alê, eu
arcava com as minhas despesas e de minha filha. E, quando conseguia fazer
plantões extras, até o condomínio do prédio dava para pagar.
Alê sempre ficava possesso quando isso acontecia. Dizia que não
precisava ajudá-lo financeiramente e que era para eu gastar meu dinheiro
suado com coisas para Isa. Ele realmente não precisava, dinheiro nunca foi
um problema para ele. Tanto a minha família quanto a de meu primo eram
abastadas. Ambas herdeiras de um império cafeeiro da região, que contava
com uma fazenda produtora de café tipo exportação e uma usina de
beneficiamento. A diferença ficava por conta dos pais de Alê, que eram
maravilhosos e o apoiavam em tudo.
Encarei o espelho retrovisor do veículo para conferir se meu rabo de
cavalo ainda permanecia intacto, já que Isa o havia puxado
“acidentalmente” enquanto choramingava para não ficar na escola. Mais
uma vez a pestinha deu o maior trabalho, fazendo manha para ir com a
professora.
Respirei fundo para ver se recuperava um pouquinho da minha
sanidade. Eram apenas 7h30 da manhã e eu estava à beira de um ataque de
nervos.
Aquele plantão ia ser difícil. Irritadiça como estava, tive medo de
surtar com o primeiro desavisado que cruzasse o meu caminho e eu não
gostava nem um pouco quando isso acontecia.
Pior que nem podia culpar Isa por todo o descontrole, boa parcela da
culpa devia ser atribuída ao meu novo vizinho. Por causa do safado, há uma
semana eu não conseguia ter uma noite tranquila de sono no meu quarto e
acabava indo dormir encolhida na cama apertada da minha filha.
Agora estava ali, lutando contra o sono e o mau humor.
Deus, não me deixe esbarrar com nenhuma fifi-fofoqueira ou com
as falsianes da fisioterapia, por favor — pedi, baixinho, assim que passei
pelos portões da clínica.
Adorava uma frase de Buda: "Um amigo falso e maldoso é mais
temível que um animal selvagem; o animal pode ferir seu corpo, mas um
falso amigo irá ferir sua alma."
Peguei minha bolsa, desci do veículo e logo de cara encontrei
Clarice, encostada em seu carro. Ela encarava um Sedan importado parado
na vaga ao lado da sua, boquiaberta com o luxo do veículo.
— Nossa, Cla, tá com uma cara de quem tá botando olho gordo nas
coisas dos outros — provoquei, parando na sua frente. Adorava a garota de
cabelo cor de fogo e alma livre, que pouco se importava com a opinião
alheia. Não podia dizer que éramos amigas, mas às vezes, batíamos altos
papos.
— Se soubesse o que estou pensando — disse, encarando-me com
um sorriso debochado. — Nos romances hot que nós duas amamos, sempre
tem um gostosão que dirige esses carros fodões. Por causa disso, confesso
que sempre que passo perto de um desses, eu paro e olho para o motorista,
na esperança de encontrar um gostosão. Pena que até hoje não tive a sorte
de encontrar um deus grego atrás do volante.
— É, não tá fácil. Nós duas precisamos parar de sonhar com o
príncipe encantado dos livros — comentei, lembrando do meu sonho da
semana passada, e encolhi os ombros, frustrada.
— Ah, eu já desisti do príncipe encantado faz tempo. Se for boa
pinta, gostoso, pauzudo e um cara de bem com a vida, pra mim tá ótimo.
— Nossa, você quase não faz exigências, não é mesmo?
— Prioridades, querida, prioridades. Bom, vamos entrar, senão
daqui a pouco batemos o ponto atrasado — respondeu, ao mesmo tempo em
que agarrava a alça da mochila e começava a andar para a entrada da
clínica.
Embora Clarice tenha me distraído com sua alegria, meu mau humor
voltou assim que nos despedimos e cruzei com Marina, a recepcionista.
Respirei fundo duas vezes e entrei no vestiário de cara fechada.
Olhei ao meu redor, notando o cômodo cheio, onde os funcionários se
preparavam para iniciar um novo plantão. Nem precisei procurar Ana, a
loira lindíssima estava sentada em um banco à minha direita e se levantou
assim que me viu. Éramos amigas desde a época do estágio e fiquei
imensamente feliz quando nós duas fomos contratadas.
— Oi, amiga — Ana me encarou com o cenho franzido e perguntou:
— Credo, Gaby, que cara de bosta é essa?
— Isso, faz graça mesmo, tira sarro da desgraça alheia. Quero estar
aqui para te zoar no dia em que se casar com o Bruno e tiver um filho
engraçadinho que reclama que a escola é chata — esbravejei, abrindo meu
armário.
— Ninguém pode culpar Isa por ter um intelecto mais desenvolvido
do que o das crianças da idade dela. Vamos combinar que é mesmo um saco
aprender aquilo que se sabe. — Ana soltou uma gargalhada alta, atraindo o
olhar curioso de algumas pessoas.
— Eu sei, Ana, mas o que eu posso fazer? Ela tem que ir para a
escola.
— Amiga, olha para mim — pediu, diminuindo o sorriso, e segurou
meu braço. — Te conheço muito bem e sei que não se estressa mais pelas
traquinagens da Isa. Algo me diz que não é esse o motivo de você estar
azeda desse jeito. O que houve? Seu pai está te atormentando de novo? —
perguntou preocupada, com seu jeito protetor de sempre.
Lembrei da minha última discussão com ele e me arrepiei. Em pleno
século 21, meu excelentíssimo progenitor estava tentando me casar com um
amigo advogado. A milésima tentativa de me fazer voltar à razão e ao seio
da família. O problema era que o homem tinha idade para ser meu pai, e eu
jamais aceitaria um casamento arranjado.
— Não, faz tempo que nem o vejo. Você tem razão, tô assim não é
só por causa da Isa. Não ando dormindo direito por culpa do meu novo
vizinho que há uma semana vem dando show de putaria durante a
madrugada. Tô irritada pela privação de sono e com tesão recolhido.
Pronto, falei.
Eu ainda não tinha contado a Ana sobre a meterola no apartamento
vizinho. Como também não contara a Alê, que ainda viajava com o
namorado.
— Eita, como assim? Quero saber todos os detalhes dessa história.
— Prometo que na hora do almoço te conto tudo. Agora vamos,
senão a Cora virá atrás de nós com o chicote na mão. — Nossa chefe
parecia uma dominatrix. Tinha uma pose durona, usava sempre uns
terninhos justos, salto alto, faltava mesmo aquele acessório.
— Verdade, vamos que não quero arrumar encrenca com a chefa.
Ainda mais agora que o doutor Nelson se aposentou. — Ela se curvou,
aproximando-se da minha orelha e sussurrou: — A megera está
insuportável.
— Ai, Deus, ainda tem mais essa. Já arrumaram um substituto para
ele?
— Dizem que não. O Bruno está desconfiado que sim.
— Espero que arrumem um diretor legal e que o dito cujo não
implique com os meus horários. Gosto tanto de trabalhar aqui, tomara que
não me obrigue a fazer turnos doidos, senão terei que pedir demissão.
— Sabe o que eu não consigo entender, Gabi? Porque o Diogo não
assume a direção da clínica do pai. Bruno me contou que o sonho do doutor
Nelson é ter os dois filhos no comando da Pró Vita, só que Diogo se recusa
a voltar para Mococa.
— Sei lá, Ana. Pelo que me lembro, Diogo era um playboyzinho
irritante, que se achava a última bolacha do pacote. Nós vivíamos trocando
farpas quando ele era amigo do Júnior — esclareci, sem conseguir encará-
la, o que fez atiçar ainda mais a curiosidade da minha amiga.
— Tá aí, outra coisa que me deixa confusa. Você sempre fala da
chatice do Diogo, mas seu irmão me disse que você também era muito
implicante. Nunca entendi o motivo dessa raiva. Ele te fez alguma coisa? —
Ana parou, fixando seus lindos olhos azuis em mim.
Era óbvio que eu tinha um motivo, contudo, apenas Alê o conhecia.
E isso porque acabei o soltando sem querer em uma noite de bebedeira. Ana
que me perdoasse, mas eu não compartilharia isso com ela.
— Chega de conversa, Ana. Vamos trabalhar — respondi, revirando
meus olhos, dando aquele assunto por encerrado.
Capítulo 3

GABRIELA

— Mãe, o que é gemidão do WhatsApp? — Isabela perguntou,


enquanto entrávamos em nosso apartamento depois de um dia exaustivo,
dando-me um tremendo susto.
— Onde você ouviu isso, Isa? — perguntei desconfiada, apesar de
saber a resposta.
Ana pediu uma carona depois do trabalho, pois seu carro estava na
revisão. Durante o trajeto em que pensamos que minha filha dormia, minha
amiga desbocada acabou fazendo piadinhas sobre o vizinho. Eu ia esfolar a
mulher viva quando a encontrasse. Ela conhecia muito bem a afilhada para
saber que não podia tocar naquele assunto perto dela.
— Uai, mãe, escutei você e a Dinda conversando no carro.
Não disse? Encarei minha filha sem acreditar que ela falava aquilo
na maior naturalidade. A pestinha fingiu que dormia para ouvir minha
conversa com sua madrinha.
— Mas a senhorita não estava dormindo, Isabela?
— Eu tava, mãe, mas a Dinda soltou uma risada e eu acordei. —
Meu semblante fechado deveria servir como um aviso de que estava
possessa por sua bisbilhotice, no entanto, Isa era impossível, apenas me
lançou um sorrisinho sapeca, e continuou: — A culpa não foi minha.
— Sei. Tô de olho em você — adverti, de cara feia, pegando sua
mochila para guardar em seu quarto.
— Mãezinha, você não respondeu a minha pergunta.
— É um meme da Internet com a voz de uma pessoa gemendo —
cedi, vencida. Sabia que ela não ia desistir enquanto não saciasse sua
curiosidade.
— Como assim, mãe? Gemendo de que jeito?
— Chega, Isabela! Já para o banho — decretei, sem dar-lhe brecha
para argumentar. Dei um tapa de leve em seu bumbum e ela resmungou
contrariada, e saiu correndo na direção do seu quarto.
Não resisti e acabei rindo.
Isa era terrível. Além de inteligente, sempre foi muito esperta,
observadora. Seu desenvolvimento estava à frente do das crianças da sua
idade e eu não me espantava mais com seu raciocínio rápido ou com suas
atitudes de gente grande. O problema era que, como mãe, eu precisava
educá-la e colocar um freio em suas peraltices.
Aproveitei o tempo em que ela tomava banho para adiantar o jantar.
Se existisse uma vantagem em ter uma filha astuta e metida a adulta, seria
essa. Isa gostava de ser independente. Tomava banho sozinha, escovava os
dentes sem que precisasse mandar e arrumava sua própria cama.
De banho tomado, Isa me ajudou a arrumar a mesa do jantar, e
enquanto me contava sobre uma coleguinha da escola que vinha implicando
com ela, meu celular tocou.
— É o dindo, posso atender? — perguntou, ansiosa, se mexendo na
cadeira.
— Pode. — Como sabia mexer no aparelho, ela facilmente aceitou a
ligação de vídeo do Alê.
— Oi, dindo, estou morrendo de saudades — saudou manhosa,
fazendo um biquinho lindo.
Parei, observando sua expressão manhosa, mas logo o rosto dela
iluminou, e abriu um sorriso feliz. Esses dois eram um grude. Alê a tratava
sempre com muita atenção e amor, e a pequena o tinha em suas mãos.
— Eu também estou morrendo de saudades, amorzinho. Nunca mais
vou ficar tanto tempo longe de você.
— Alê, Alê, não faça promessas a essa pestinha quando sabe que
não poderá cumprir — alertei, preocupada. Quem aguentaria depois a
chateação seria eu.
— Quem disse que não vou? Estava conversando agora há pouco
com o Mateus sobre o quanto essa lindeza está me fazendo falta.
— Dindo, sabia que tem um tio novo morando do nosso lado?
Mamãe e a Dinda chamam ele de gemidão do WhatsApp.
— Ah, é, dona Gaby? Por que não tô sabendo disso?
Gemi, frustrada. Assim que contasse a Alê tudo o que vinha
acontecendo por trás daquelas paredes, minha paz acabaria. Não sei o que
faria para aguentar esse ser curioso e intrometido na minha orelha.
— Como eu ia te contar se o senhor deu um chá de sumiço? Faz
quase uma semana que não liga e quase morri de preocupação.
— Desculpa, prima. Mateus me levou para conhecer uma vinícola
no meio do nada, nosso carro quebrou e ficamos ilhados, esperando o
conserto do veículo. Felizmente encontramos uma pousada pequenininha e
charmosa.
Ficamos no telefone por quase uma hora. Despedimo-nos de Alê
com a notícia de que ele voltaria para casa em uma semana.
Nós duas jantamos, depois lavei a louça e fui colocar Isa na cama.
Ela sempre me enrolava um pouco, fazendo com que eu me deitasse e
contasse uma história, até, enfim, dormir, mas naquele dia ela apagou antes
mesmo que eu escolhesse um livro.
A casa estava um silêncio delicioso quando entrei em meu quarto.
Deitei na cama e peguei o Kindle para continuar a leitura do livro que
comecei na semana passada e, por causa da correria do dia a dia, não
conseguia terminar. O livro era de uma autora nacional maravilhosa e tinha
um enredo muito bem elaborado que não saía da minha cabeça. Ele contava
a história de um ator pornô americano, extremamente gostoso e safado, e
uma garota virgem que viaja para a Califórnia em busca do irmão
desaparecido. Senhorrr… as cenas hot dos dois era puro fogo no
parquinho.
O engraçado foi que, no início do livro, aconteceu uma cena um
pouco parecida com a que vivenciei há poucos dias. A protagonista foi
envolvida em uma situação onde escutou uma transa animada do tal ator
pornô e, como eu, acabou com o corpo em chamas. Me identifiquei com a
situação na hora.
Por falar no vizinho, havia passado uma semana e eu não ouvi mais
nenhum barulho de putaria em seu apartamento. Parecia até que o 414
voltara a ser um imóvel desabitado, e eu agradeceria aos céus eternamente
se fosse verdade.

O cansaço me venceu e apaguei enquanto lia. Coisa que acontecia


direto, tanto que o dispositivo de leitura digital possuía uma capa resistente
a quedas que já o havia salvado diversas vezes.
O que não era normal, era minha filha me acordar no meio da noite
por causa de um pesadelo.
— Manhê, tem um monstro tentando derrubar a parede do meu
quarto. Tô com medo — Isa choramingou e pulou na minha cama.
— Que monstro, Isa? Esquece isso, foi só outro sonho ruim. Deita
aqui com a mamãe.
— Não foi sonho, mãe, eu ouvi com esse ouvidinho perfeitinho que
a senhora disse que eu tenho. E se ele vier pegar a gente?
— Não tem nada no seu quarto, filha, vamos dormir. A mamãe tem
que trabalhar amanhã cedo. — Tentei puxá-la para debaixo do edredom, e
ela se afastou para acender o abajur.
— Não consigo.
— Tudo bem. Se eu for lá verificar você sossega e dorme? —
perguntei, mudando de tática. Precisava provar que não tinha nada em seu
quarto.
— Eu não vou lá, não — respondeu, assustada.
— Você não precisa ir. Me espera no corredor.
Ela concordou com um aceno de cabeça e limpou os olhinhos cheios
de lágrimas. Tadinha, toda vez que tinha um pesadelo ficava apavorada. Dei
um beijinho em sua bochecha e saí caminhando meio sonolenta. Seu quarto
ficava ao lado do meu e quase tive um treco ao abrir a porta e descobrir que
o maldito barulho do monstro nada mais era que a meterola do vizinho.
Ah, agora ele tinha ultrapassado todos os limites e ia se ver comigo.
Onde se viu? Ele podia continuar com a putaria na casa dele o
quanto quisesse, contanto que aquilo não atingisse minha filha.
— Merda de homem safado e essa porra de gemidão do WhatsApp
— praguejei, irritada, saindo do quarto feito um foguete.
— Mãe? Onde a senhora vai? — perguntou Isa, com os olhinhos
arregalados.
— Como eu falei, não tem monstro nenhum. É a barulheira do
folgado do nosso novo vizinho. Vai para o meu quarto e me espera lá.
Passei por ela e saí do apartamento cheia de ódio. Encarei a porta
branca ao lado da minha e toquei a campainha uma, duas, três vezes, na
quarta comecei a esmurrar a madeira, parecendo uma maluca.
— Já vai — gritou o ser do outro lado, girando a chave na
fechadura.
Quando ele abriu a porta, perdi o ar por um momento. O vizinho
vestia apenas uma boxer branca, e, caralho, que homem bonito!
Foi inevitável não deixar o pensamento voar para a putaria que ouvi
do meu quarto, algumas noites atrás.
Pela barulheira que ele fazia do outro lado da parede, eu esperava
encontrar um jovem de vinte e pouco anos, cheio da energia da juventude.
Contudo, meu queixo caiu ao dar de cara com um homem maduro, os
cabelos castanhos com alguns fios brancos, e uma barba grisalha bem feita,
que emoldurava um sorriso safado direcionado a mim.
Puta que pariu!
Além de lindo e gostoso, o homem era tatuado e eu tinha um fraco
pelo tipo.
Ele parecia ter saído de uma revista de celebridades, uma imagem
insuperável da perfeição. Senti como se o conhecesse de algum lugar, mas
era impossível. Eu me lembraria se o tivesse visto. Não lembraria?
O homem era a coisa mais deliciosa da vida e me vi passando os
olhos por cada parte dele, sem esconder a admiração. Os braços eram fortes
e com tatuagens, o peitoral ostentava um tanquinho cheio de gomos, que me
fez querer virar lavadeira.
Merda, minha mente voou, e pelo jeito como sorriu sacana, ele
estava adorando me ver o comendo com os olhos.
Foco Gabriela!
— Quem é você e ao que devo a honra da visita uma hora dessas?
— perguntou, debochado. Em questão de segundos a atração foi esquecida
e eu estava novamente a ponto de o mandar à merda.
— Para mim não é nenhuma honra. Eu sou sua nova vizinha e fui
acordada a essa hora da madrugada por uma criança chorando, assustada
com o barulho da sua putaria — respondi em um fôlego só, e quase sorri de
satisfação ao vê-lo arregalar os olhos.
— Mãe? Esse tio é o homem do gemidão do WhatsApp? Posso
pedir pra ele me mostrar como é? — perguntou Isa, parando ao meu lado.
Fechei os olhos, sem acreditar que Isa falou aquilo, e, quando
encarei o vizinho novamente, a porta estava vazia.
— Para com isso, Isabela. Não disse que era para esperar em casa?
— ralhei, quase tendo um troço e tapei a boca da menina para que não
falasse mais besteiras.
Eu nem tinha percebido que ela havia me seguido. Como sou idiota,
devia ter previsto que a criança não me obedeceria.
— Aiii, me solta, mãe — resmungou, soltando-se do meu aperto. —
Eu tava com medo de ficar sozinha. E se o monstro me pegasse?
— Que monstro, Isabela? O barulho era o vizinho arrastando os
móveis da casa dele — esbravejei, encontrando o homem, que nos
observava com um sorriso de canto.
Vi que havia vestido um short e uma camiseta, ganhando um ponto
favorável comigo por respeitar a presença da minha filha, mas ganhara
também um desfavorável, já que me privava de apreciar seu peitoral sarado.
— Então, foi você, tio, que fez aquela barulheira? Isso não é hora de
limpar a casa! Sabia que me deu o maior susto? — Isa parou na frente do
homem, como se ele tivesse a sua idade, e colocou as duas mãos na cintura.
Agora pronto. A espertinha mal conheceu o vizinho safado e foi o
promovendo a tio.
— Eu sinto muito, lindinha. O tio promete que não faz mais barulho
quando for limpar a casa. — Essa última parte da frase foi dita com os
olhos fixos no meu.
— Você tá me devendo um sorvete como pedido de desculpas —
anunciou, sem vergonha.
— É mesmo? — Ele riu da malandragem da minha filha e passou a
mão nos cabelos dela. Depois, voltou a atenção para mim e continuou: —
Tem certeza que ela é uma criança e não uma anãzinha?
— Tenho sim. E fica esperto que ela dá nó até em pingo d'água. Não
precisa de sorvete nenhum. Não é dona Isabela?
— Precisa sim.
— Isabela, Isabela…
— Tudo bem. Eu esqueço o sorvete se ele me mostrar como é o
gemidão do WhatsApp.
Merda, merda, merda. Essa menina não ia esquecer isso nunca.
Virei, encarando-a, o vizinho riu do meu desespero.
— Chega, Isabela! Vai para casa!
— Ah, mãe, ele ainda não me contou como é esse tal… —
resmungou, cruzando os braços, ainda tentando insistir na a história, porém
a cortei, firme.
— Maria Isabela! — gritei, só assim ela entenderia que minha
paciência acabou. — Pelo amor de Deus, fica quieta e entra agora na nossa
casa.
Minha filha me encarou com os olhinhos arregalados, afinal, eu
falava seu nome inteiro quando estava muito brava.
— Não preciso nem explicar mais nada, não é? Por favor, tome
cuidado com seus barulhos. Já deu para perceber que essa criança é terrível
e não estou a fim de ficar explicando a razão dos sons que acontecem atrás
da sua parede.
— Tudo bem, vizinha, vou me policiar a partir de agora. — O
maldito homem tentou me tranquilizar com um sorrisinho, exibindo os
dentes perfeitos e encostou no batente da porta de um jeito sedutor. — Mas
fiquei curioso com uma coisa. Por que sua filha insistiu tanto nessa história
de gemidão do WhatsApp?
— Não te interessa — respondi, mal-humorada. Virei-me, sentindo
que ele continuava com os olhos grudados em mim, mas não olhei para
trás.
Capítulo 4

GABRIELA

Cheguei à clínica e não me espantei com a quantidade de carros no


estacionamento.
Por ser véspera de feriado, eu sabia que o dia seria de muito
trabalho, pois os pacientes que não podiam ficar sem atendimento até a
segunda-feira teriam que ser encaixados para aquele dia.
Nossa, como eu precisava desse feriado prolongado. Como não fazia
plantões nos finais de semana, usei uma folga extra que eu tinha guardada
para emendar num dia como aquele. Meu plano era curtir a folga em casa,
na companhia de Isa e suas bonecas. Se a danadinha desse trabalho para
ficar quieta, o máximo de atividade que me dispunha a fazer era descer até a
praça que ficava em frente ao nosso prédio para ela brincar com as
amiguinhas.
Terminei de aplicar a medicação injetável na minha primeira
paciente e me despedi da senhorinha de 75 anos que havia sofrido um AVC
recentemente e estava na Pró Vita para tratamento especializado para o seu
problema. Ela passou um longo tempo internada e, agora, trabalhávamos as
funções básicas de mobilidade, lutando para evitar que as contraturas
musculares aumentassem e o arco de movimento ficasse cada vez menor,
deixando-a acamada e totalmente dependente do cuidado de outras pessoas.
Segui para atender à próxima paciente, e antes de pegar sua ficha,
uma batida na porta chamou minha atenção.
― Gabriela! ― Levantei o rosto e vi Cora, a filha do proprietário da
clínica, olhando-me séria. ― O doutor Nelson quer falar com você.
Conversei com a Clarice e ela virá cobrir seus atendimentos. Assim que ela
chegar, o encontre na sala dele ― comunicou, e saiu após eu acenar
positivo.
O doutor Nelson a que ela se referia era seu próprio pai. Então, para
que ela esperaria uma resposta. Não é mesmo? Todos os funcionários da
Pró Vita tinham medo de Cora Ferreira Libardi e seus pedidos eram
recebidos como ordens.
Já ouviu a frase: Manda quem pode e obedece quem tem juízo? Eu
sim, e a levava ao pé da letra.
Não que Cora fosse o tipo de patroa cruel. Ela era sim, uma mulher
autoritária, gerenciava a clínica com mãos de ferro e queria que as coisas
sempre funcionassem do seu jeito. Mas também tinha um coração bom,
estava sempre disposta a ouvir e ajudar seus funcionários quando
precisavam. Assim, fiz o que pediu e segui direto para a sala do seu pai.
Eu não via o doutor Nelson desde o seu afastamento há um mês. A
própria Cora havia nos contado que ele não ficara nada feliz em se afastar.
Contudo, um princípio de infarto o obrigou a acatar as ordens médicas que
só ele julgava serem desnecessárias. Nelson amava a clínica. Seu pai criou
o espaço do zero e dedicou toda a sua vida, trabalhando duro para
transformá-la no centro de referência que era.
Quando me aproximei da sala de descanso, um burburinho de
enfermeiras chamou minha atenção. Não era normal eu dar trela para esse
tipo de coisa, porém a fala de uma delas me deixou curiosa.
— Por que será que marcaram essa reunião de última hora? —
perguntou Vera, a enfermeira mais curiosa da clínica.
— Será que é pra anunciar o substituto do doutor Nelson? —
pontuou a outra, baixinho.
Franzi o cenho.
Que raio de reunião era essa que eu não estava sabendo? Será que o
meu chefe tinha me chamado para isso? Eram muitas perguntas em minha
cabeça e o bichinho da curiosidade me fez aumentar a velocidade do passo,
matutando as possibilidades.
Minha entrada foi liberada e, depois de bater à porta, recebi o aviso
que podia entrar. Encontrei Nelson sentado atrás de sua mesa, falando no
celular, e assim que me viu ele fez um gesto para que me sentasse.
— Eu não vou demorar, Francisca. Não, não vou trabalhar. — Ele
ficou um minuto em silêncio, o dedo indicador pressionando o nariz.
Parecia irritado. — Já disse, só vou apresentá-lo aos funcionários e volto
para casa.
Mexi no celular enquanto ele conversava com a esposa. Alguns
minutos se passaram, até que ouvi meu nome e me voltei para ele.
— Não estou suportando essa marcação cerrada. Estão me tratando
como se eu fosse um inválido — reclamou depois de desligar o aparelho e o
jogar sobre a mesa.
— Tenho certeza que sua família não pensa assim. Eles apenas o
conhecem o suficiente para saber que se bobearem o senhor volta para casa
à noite — repliquei, divertida.
Tínhamos um pouco de intimidade. Como meu irmão fora amigo de
seu filho Diogo na juventude, nossas famílias se conheciam e ele
praticamente me viu crescer.
— O pior é que eles têm razão. Minha cabeça sabe que eu preciso
ficar longe do estresse que é cuidar de uma clínica desse tamanho, mas meu
coração diz o contrário.
— Todos nós sabemos o carinho que tem por esse lugar e o quão
difícil é para o senhor delegar seu cargo a um desconhecido.
— Bom, Gabriela, mesmo contra minha vontade, reconheço que a
idade pesou e agora é definitivo — Ele fez uma pausa, um sorriso sincero
despontando dos seus lábios, e continuou. — A direção da clínica já tem um
substituto.
— Sério? Que maravilha! — respondi, sorrindo para ele. — Preciso
ser sincera e confessar que, apesar de ficar feliz, um ladinho meu está triste,
pois vou sentir muito a falta do senhor. Foram tantos anos trabalhando
juntos.
— Digo o mesmo, querida, inclusive, foi por isso que te chamei
aqui. Eu quero me despedir direito. Te conheço desde pequenininha, vi tudo
o que passou, como deu a volta por cima e foi um prazer imenso tê-la como
funcionária.
— O prazer foi todo meu, senhor. Eu amo trabalhar aqui, cuidar dos
nossos velhinhos.
— Você é uma profissional exemplar, Gabriela, e vou continuar
repetindo que devia retomar o seu sonho de cursar faculdade de
Fisioterapia.
Fomos interrompidos pelo ranger da porta sendo aberta, o que nos
fez calar. Desviei o olhar do Nelson para a direita, e vi meu vizinho, com
quem tive o incidente da meterola dias atrás, entrando todo majestoso.
Porra, o que ele estava fazendo ali?
Mesmo incrédula, foi impossível não deixar meu olhar vagar por
ele.
O vizinho, que eu ainda não sabia o nome, vestia uma calça Jeans,
camisa branca aberta nos primeiros botões, por baixo de um blazer na cor
marfim. Eu o tinha achado um deus grego ao vê-lo somente de cueca boxer,
mas o que era aquele homem de roupa social? Uma perfeição.
Duas coisas aconteceram a seguir. Primeiro, ele abriu um sorriso
enquanto caminhava na direção do meu chefe e o cumprimentou com um
abraço apertado. Em seguida, virou-se para mim e tentou direcionar o
mesmo cumprimento caloroso, contudo, ao me reconhecer, falhou
miseravelmente. Seu sorriso discreto desapareceu e uma ruga de expressão
se formou em sua testa. Ele parecia tão surpreso quanto eu.
— O que você está fazendo aqui? — perguntei, forçando a visão
para confirmar se não estava tendo uma alucinação.
E não estava. Era mesmo o vizinho gostoso à minha frente. Ai, ai,
aqueles olhos não deviam encarar ninguém tão profundamente.
— Mococa é pequena, mas não imaginei que fosse tanto — o
vizinho reagiu, parecendo insatisfeito, e passou a mão pelos cabelos de um
jeito sexy pra caramba. Se não fosse a raiva que senti por imaginar que o
desgraçado não tinha gostado de me ver ali, poderia até ter suspirado.
— Vocês já tinham se encontrado? — perguntou o senhor à nossa
frente, curioso, intercalando olhares entre mim e o vizinho.
— Somos vizinhos — respondemos juntos.
— Verdade. Esqueci que Gabriela morava no seu prédio.
— Não entendo, o que ele faz aqui?
— Devia ter esperado que não se reconhecessem, ele mudou muito
depois que mudou para São Paulo — disse, pensativo. — Gabriela, esse é o
Diogo, meu filho mais velho. Ele será o novo diretor clínico da Pró Vita.
O encarei, boquiaberta.
Não podia ser.
Pai amado, isso devia ser pegadinha.
Perdi a fala e meu coração pareceu uma escola de samba conforme
eu compreendia o que aquilo significava. Ele ia ser meu chefe e eu teria que
conviver com Diogo. Era muito azar para uma pessoa só.
— Com licença, doutor, está na hora da reunião com os funcionários
— Fernanda avisou, depois de bater à porta e entrar.
— Bom, Gabriela, tenho que ir. Mas antes, vou deixar um conselho
de quem viveu bastante. A vida é muito curta para não ser vivida. Permita-
se viver seus sonhos e ser feliz, sempre. Foi um prazer te rever, querida.
Nelson estava coberto de razão, só que não seria tão fácil voltar à
faculdade como ele falou. Havia tantos obstáculos que apenas de pensar me
desanimei. Nós nos despedimos e antes de sair da sala dei uma olhada
rápida em Diogo. Meu vizinho me encarava sério, seu olhar preso em mim
de um modo que me desestabilizou.
Droga, droga, o que eu ia fazer? Como eu iria trabalhar com esse
homem?
E o problema não estava no que aconteceu entre nós recentemente.
Digamos que o meu passado com Diogo era nebuloso.
Diogo foi o primeiro homem a partir meu coração. Tudo bem que eu
era uma adolescente quando isso aconteceu, e ele não fazia a mínima ideia
desse fato, mas foi algo que me marcou profundamente.
A minha família e a de Diogo eram vizinhas e isso em uma cidade
pequena significava muita coisa. Consequentemente, Diogo e meu irmão
Júnior desenvolveram uma amizade e a partir daí ele não saiu mais da
minha casa.
Quando criança eu o odiava, não podia vê-lo que arrumava encrenca
por qualquer motivo. Morria de ciúmes do meu irmão e achava que se eles
não fossem amigos, Júnior teria mais tempo para mim. Diogo também não
ajudava muito, era implicante, zombador, vivia tirando sarro do aparelho
que eu usava nos dentes e do meu sobrepeso.
Depois, na adolescência, em algum momento enquanto eu crescia e
os hormônios entravam em ebulição, Diogo foi tomando um espaço em
meu peito, despertando sentimentos que eu nem sabia que podiam existir.
Meu coração disparava ao vê-lo, comecei a enxergá-lo com outros olhos e
chegou ao ponto que nos finais de semana em que ele tinha folga do
trabalho em um hospital de São Paulo e vinha para Mococa, eu fazia de
tudo para ser notada.
O problema era que Diogo me considerava uma criança, e não podia
tirar sua razão. Nossa diferença de idade era grande, quinze anos. Eram os
meus dezessete anos contra os quase trinta e dois dele. Naquela época ele já
estava formado em medicina, tinha se mudado de Mococa e ido trabalhar
em uma cidade grande para ganhar espaço em sua profissão, e vinha a nossa
cidade esporadicamente.
Nossa, eu me achava muito mulher. Já não usava mais o aparelho
ortodôntico e nem possuía o sobrepeso da infância. Isso me deu uma
autoconfiança que me empoderou de um jeito equivocado. Porra, eu tinha
dezessete anos e queria ser uma mulher. Claro que daria merda.
Minha primeira desilusão amorosa veio na minha festa de
aniversário de dezessete anos. Coloquei um vestido lindo, fui ao salão
arrumar cabelo e maquiagem, para chegar na festa e encontrá-lo com uma
loira peituda. Para piorar, Júnior, que sabia da minha paixonite, fez uma
brincadeira com o amigo e Diogo desdenhou dos meus sentimentos,
desprezando-me na frente de várias pessoas. Claro que nem ele nem Júnior
sabiam que eu estava ouvindo atrás de uma porta, mas isso não mudou em
nada minha dor.
Fiquei em frangalhos, e, para piorar, ainda precisei ouvir piadinhas
de colegas de escola que ficaram sabendo do ocorrido na festa e
debocharam do meu delírio. Levou um bom tempo até recuperar a minha
autoestima, só melhorei quando compreendi que o único erro que cometi foi
me apaixonar por um homem mais velho. E um idiota. Porque, apesar da
situação ridícula de ter uma adolescente apaixonada por ele, Diogo não
precisava ter sido escroto como foi.
— Viu fantasma, Gabriela? — disse Paula, encarando-me
sorridente.
Ela estava parada na entrada do consultório de um dos médicos da
geriatria e não perdeu a oportunidade de me provocar. Nós duas não nos
dávamos bem, vivíamos às turras e a maldita não perdia uma oportunidade
de me irritar.
— Pior que vi. Essa sua fuça feia. — Retribuindo o sorriso forçado e
passei por ela de cabeça erguida.
Os funcionários da Pró Vita estavam agitados e eu nunca os tinha
visto daquele jeito. E não foi surpresa quando, mais à frente, encontrei outro
grupinho de enfermeiras caminhando animadas para o anfiteatro.
Cumprimentei uma delas no automático e passei como um foguete.
Eu não podia culpá-los, até pouco tempo eu também estava curiosa.
Seria engraçado ver a cara das safadas quando vissem a aparência gostosa
do novo diretor. Pena que eu não veria a cena. Precisava conversar com a
Ana urgente e era atrás dela que estava indo.
Encontrei minha amiga do lado de fora da sala de Ultrassonografia,
debruçada sobre o balcão da recepção do lugar.
— Bom dia, Graça, bom dia, Ana. Como vocês estão? —
cumprimentei rápido, direcionando meu olhar a minha amiga. — Ana, você
pode vir comigo agora?
— Eu estou indo para a reunião. É urgente?
— Muito. Esquece a reunião, Ana. Vem comigo.
Saí arrastando minha amiga no sentido contrário do que os
funcionários iam e entrei no primeiro banheiro livre que encontrei,
fechando a porta atrás de mim.
— O que foi, sua maluca? Viu fantasma?
— Não, pior — respondi, olhando dentro de uma cabine para ver se
não tinha ninguém que pudesse nos ouvir.
Comecei a andar de um lado para o outro, angustiada, e ela
finalmente pareceu notar meu desespero. Curiosa, Ana se sentou sobre a
tampa do sanitário, toda em alerta, e pronta para a fofoca.
― Vai, mulher, conta logo o que tá acontecendo, que estou
começando a ficar preocupada.
― Certo. Lembra do meu vizinho, o do gemidão do WhatsApp? —
Esperei ela concordar com um aceno de cabeça e continuei: — Eu acabei de
encontrá-lo aqui na clínica.
— Não? Jura? Onde?
— Na sala do doutor Nelson. Ana, você não vai acreditar. Ele é o
Diogo e vai assumir o lugar do pai. Inclusive, a reunião é para apresentá-lo
aos funcionários. Tem noção que ele agora será meu chefe?
― Fala devagar, mulher ― Ana zombou da minha aflição e em
seguida sorriu de orelha a orelha. ― Caralho! Como esse mundo é pequeno.
Agora eu quero ver você fugir do assunto Diogo. Há anos eu tento arrancar
qual é o seu lance com ele.
— Ana, essa é uma história para outra hora. Vamos focar no meu
problema?
— Que problema, mulher? Ele será seu chefe, apenas isso, vocês
nem vão trabalhar juntos. Relaxa, Gaby.
― Relaxar é o caramba, Ana. Você não entende… ― rosnei, sem
conter a frustração.
— Verdade, não entendo, quem manda me esconder as coisas. Tudo
bem, entendi que não queria trabalhar com o Diogo, mas qual o motivo
desse desespero todo.
— Você não vai me dar paz até eu contar essa história, não é?
— Não mesmo. Vai, desembucha.
Bom, eu não tinha mais para onde correr. E, mesmo contra a minha
vontade, pela primeira vez eu contaria minha história vergonhosa a alguém.
Capítulo 5

DIOGO

Gabriela saiu e precisei sentar no sofá, sentindo palpitações no meio


do peito. Ninguém havia me preparado para a surpresa de descobrir que a
irmã mais nova do Júnior seria minha colega de trabalho, ou pior, que ela
era a vizinha gostosa que havia me tirado do eixo.
Isso só podia ser algum castigo divino arquitetado por Deus para me
penalizar por todos os anos vividos na devassidão. Há muito tempo uma
mulher não mexia tanto comigo e essa era como se fosse proibida para
mim. Agora, além de precisar me penalizar por desejar uma mulher bem
mais nova que eu, ainda tinha o inconveniente de ela ser irmã do meu
amigo. Precisava enxergar isso como um sinal.
Enquanto meu pai conversava com sua secretária, parei, perdido
entre as lembranças do passado.
Tornei-me amigo de Mário — ou Júnior, como gostava de ser
chamado — na quinta série do ensino fundamental. Sua mãe estava grávida
de Gabriela e acabei acompanhando o nascimento da garota.
A partir de então, ela passou a ser presença constante na minha vida,
mas como nossa diferença de idade era grande e eu não tinha paciência com
crianças, nossa convivência não foi muito boa. Na adolescência, então,
piorou. Gaby era insuportável, geniosa, fazia birra por qualquer coisa, sem
contar que era um grude com o irmão e morria de ciúmes da nossa amizade.
Desde que fui embora de Mococa nunca mais tive notícias de Júnior
ou de sua família. Durante nossa infância ele foi como um segundo irmão
para mim. Eu era o nerd magricela, o cara recluso e antissocial que gostava
de estudar e Júnior o playboy boa pinta, descolado, que me carregava para
as festas. Formávamos uma boa dupla. Mas a gana por crescer na minha
profissão, tornar-me um médico reconhecido, respeitado no meio acabou
engolindo minha vida pessoal e me afastei de tudo, inclusive, da minha
cidade natal.
Pelo distanciamento, eu não fazia ideia de qual era a aparência de
Gabriela. Nunca passou pela minha cabeça que aquela pirralha irritante
pudesse se transformar em uma mulher linda e cheia de atrativos físicos.
Porra, parecia outra pessoa.
Ela ainda possuía o jeito de menina nerd, mas as semelhanças
paravam por aí. Gabriela era baixinha e a pele, antes muita pálida, ostentava
um bronzeado saudável. Os cabelos castanhos-claros agora eram de um
preto profundo, o que destacava seus lindos olhos verdes e tirava o ar
inocente. Algo me dizia que por trás do rostinho angelical havia uma diaba
bem devassa.
Embora usasse uma calça social branca e um jaleco folgado, que
não valorizava em nada seu corpo, eu tinha uma boa ideia do que existia ali
embaixo. A imagem do seu corpo curvilíneo, a bundinha empinada, os
peitos pequenos e gostosinhos por baixo de uma camisola minúscula
permaneciam em minha mente desde o dia em que a esquentadinha bateu
em minha porta para reclamar dos meus barulhos. Uma verdadeira ninfa
sedutora.
— Vamos, filho, estamos atrasados. — Meu pai parou diante de
mim, olhando-me de um jeito estranho.
— Por que não me contou que a irmã do Júnior trabalhava aqui? —
perguntei, curioso.
— E por que eu faria isso?
Fez-se silêncio por alguns segundos, seus olhos nos meus,
analisando-me com atenção, que logo foi quebrado por um suspiro alto do
meu pai, pois apesar de velho, era bem esperto e devia ter percebido minha
inquietação por causa da garota.
— Olha, filho, vi no seu olhar que ficou interessado pela Gabriela, e
não te recrimino por isso. Ela é mesmo muito bonita, mas além do fato de
ela ser nossa funcionária, a garota passou por poucas e boas nos últimos
anos e espero que você não lhe cause mais problemas. — O tom sério com
que falou serviu mais para instigar minha curiosidade do que para me
alertar.
— Não vou fazer nada, fique tranquilo. Até porque sou um homem
de quase quarenta anos, experiente, e não tenho intenção de me meter com
uma menina quinze anos mais nova que eu. Prefiro as que tenham uma
certa vivência, se é que o senhor me entende — respondi, piscando e sorri.
E não ia mesmo. Nunca me envolvi com mulheres que tivessem
uma diferença de idade tão grande e não seria agora que mudaria isso.
Preferia as maduras, livres, que gostavam de curtir a vida e queriam a
mesma coisa que eu, apenas uma boa foda e nada mais.
— Sua fama te precede, até aqui em Mococa. E espero que estenda
esse pensamento ao restante das nossas funcionárias.
— Tá doido, pai? Eu sou um profissional respeitado.
Tudo bem, talvez eu não tivesse nenhum controle perante colegas de
trabalho gostosas, o que me fazia sempre terminar enterrado dentro da
maioria delas, claro que esse detalhe o grande doutor Nelson Lima Libardi
não precisava saber.
A situação agora era outra. Eu não era um simples funcionário e
teria grandes responsabilidades em minhas costas. Precisava mudar para
conquistar o respeito de todos.

Aumentei o volume do som do meu carro enquanto dirigia para casa


naquele final de tarde.
Céus, não foi nada fácil me concentrar no trabalho extenuante de ser
o diretor de uma clínica. Enquanto era metralhado de informações
burocráticas no meu primeiro dia de trabalho, minha razão brigava comigo
mesmo, lutando para me convencer de que não fora uma boa ideia tomar
uma decisão agindo com o coração.
Assim que minha irmã Cora me deixou com aquele monte de
papéis, minha cabeça parecia um turbilhão de pensamentos conflitantes.
Quando resolvi voltar para Mococa e assumir a direção da clínica do meu
pai, sabia que não seria fácil me adaptar a esse novo trabalho. Minha
vocação era ser médico, salvar vidas, e não ficar preso atrás de uma mesa
de escritório. Contudo, minha família precisava de mim e eu faria o que
tivesse ao meu alcance para ajudá-los. Talvez a solução ideal para esse
impasse fosse arrumar um meio termo, só não sabia ainda como fazê-lo.
Estacionei na garagem e desci do Sedan carregando minha pasta,
distraído. Tudo aconteceu muito rápido, ouvi uma vozinha fina me chamar,
e antes de ter a chance de entender o que estava acontecendo, fui agarrado
por um serzinho, que envolveu minhas pernas com seus bracinhos
pequenos. Olhei para baixo e a primeira coisa que vi foi a cabeleira negra
de Isabela, idêntica à da mãe, e seus lindos olhos verdes que me encaravam
cheio de expectativas. Na verdade, a criança era a versão mirim de
Gabriela, com algumas pequenas diferenças que eu deduzi pertencer ao pai
dela.
— Oi, tio Di. Você trouxe o meu sorvete?
— Isabela, por favor, nós já conversamos. Pare com isso. —
Gabriela parou ao lado da filha, encarando-a de cara feia.
— Oi, lindinha, infelizmente não, mas prometo que vou pagar
minha dívida logo, logo. Está bem?
Encarei a garotinha muito astuta parada à minha frente e ela
murchou com minha resposta, desapontada, e me recriminei pelo
esquecimento. Com criança as coisas funcionavam diferente. Prometeu,
tinha que cumprir, e eu até sabia o que fazer.
— Doutor Diogo, não precisa se incomodar.
— Não tem necessidade de me chamar de doutor nem de senhor,
Gabriela. Estamos fora do nosso local de trabalho.
— Que seja — disse, incomodada. — Bom, como eu estava
dizendo, não dê ouvidos a essa menina folgada. Ela tomou sorvete não faz
nem dez dias, e eu não gosto que coma porcaria com frequência.
— O que é isso, Gabriela, sua filha é criança! Pelo que me lembro
na idade dela, você adorava sorvete.
— É engraçado o senhor, como médico, falar uma coisa dessas.
Provavelmente não se lembra, já que naquela época se preocupava apenas
com o próprio umbigo, mas os meus hábitos alimentares me trouxeram
alguns problemas de saúde, fora o bullying que sofri na escola por causa do
excesso de peso. Portanto, Diogo, não quero que ela passe pelo mesmo que
eu.
— Você pode até ter razão, só que não será proibindo a menina de
comer um alimento que vai educá-la. Agora, vamos a outro ponto. Você me
acusou de ser egoísta, mas quem brigava por comida não era eu. Lembra
que você, aos dez anos, causou o maior escândalo comigo e com Júnior
porque comemos o seu pudim?
— Mas o doce era meu! — respondeu, indignada.
— Ele não tinha seu nome escrito. — Pisquei um olho de forma
sacana para provocá-la. — Brincadeiras à parte, o Júnior perguntou para sua
mãe e ela nos deu permissão para comer. E isso prova o meu ponto. Você só
brigava por doce porque era proibida pela sua mãe de comê-lo. E vamos
combinar, não é Gabriela, o que é proibido é sempre mais gostoso. — Com
um sorrisinho travesso, dei um passo à frente, e um rastro de perfume floral
me deixou atordoado.
Merda! Por que essa menina mexia tanto comigo?
Gabriela me encarou, como se quisesse me esganar, os lindos olhos
verdes brilhando de raiva. Abri a boca para dizer mais alguma coisa, tentar
entender o porquê de tanta agressividade, porém, a filha da mãe foi mais
rápida. Pegou a mão da filha e disparou em direção ao elevador.
Capítulo 6

GABRIELA

— Você está prestando atenção? Ele teve a pachorra de falar assim:


Pelo que me lembro, na idade dela você também adorava sorvete — repeti
a frase que me deixou indignada, forçando a voz para que saísse fininha. —
Claro que ele falou isso porque eu era gordinha. Queria me provocar.
Arrogante! Imbecil! — A raiva ebulia de dentro de mim e nem o chá de
camomila parecia capaz de me ajudar a abrandá-la.
Era sexta-feira à noite, e desde a briga com Diogo no
estacionamento do nosso prédio, eu não tinha conseguido entrar em contato
com Alê, que ainda viajava com o namorado.
— Mas me conta, você brigou mesmo com o cara por causa do
sorvete? — perguntou, prendendo o riso.
— Quem esse desgraçado pensa que é pra querer me ensinar a criar
a minha filha? — gritei, irritada. Estava do outro lado do apartamento, lugar
onde o vizinho não teria como me ouvir, portanto, eu podia soltar a minha
revolta à vontade.
— Pelo amor de Deus, Gabriela! Por que tá sendo tão dramática?
— Alê riu da minha cara sem a menor compaixão. Emburrada, mostrei o
dedo do meio para a câmera do celular, que eu segurava sentada no sofá da
sala. — Você está fazendo uma tempestade em copo d’água, prima. Todo
final de semana nós discutimos pelo mesmo motivo.
— É diferente. Você, além de parente, é padrinho da Isa.
— Nem vem com essa desculpinha esfarrapada, Gaby. Você nunca
se estressou com as pessoas dando palpite na sua vida. E olha que isso
acontece desde que ficou grávida.
— Eu vou desligar, Alê, porque vi que essa conversa não vai dar em
nada. Você só tá conseguindo me irritar mais. Só falta dar razão para aquele
imbecil. — Balancei a cabeça de forma descrente, desistindo de desabafar
com ele.
— Sabe o que está parecendo isso, Gaby? Tensão sexual — opinou,
aproximando o rosto da tela do aparelho com uma sobrancelha erguida. —
Já ouviu falar que o ódio é um excelente tempero para se ter uma boa
transa? Aproveita, prima.
Ah não, agora era demais para mim.
— Desisto. Vou assistir desenho com a minha filha que eu ganho
mais. Tchau! — Cansada de sua insistência, levantei-me do sofá e encerrei a
ligação sem deixar que Alê se despedisse.
Eu estava prestes a me deitar no sofá com Isa para assistir pela
milésima um filme da Disney quando ouvi o barulho da campainha.
Estranhei, já que pouquíssimas pessoas subiam ao meu apartamento sem
que o porteiro interfonasse, e rezei para que não fosse uma notícia ruim que
pudesse estragar ainda mais o meu final de semana.
Abri a porta sem olhar no olho mágico. Isabela o havia acertado
com uma bolinha de tênis na última semana e o vidro espatifou. Como não
tive tempo para chamar alguém para consertá-lo, continuava quebrado.
Para meu espanto, encontrei Diogo do outro lado, encarando o chão
com um sorriso escancarado.
Ué, esse homem é doido, só pode.
Porém, não levou nem dois segundos para entender porque ele ria.
Ao abaixar a cabeça vi o tapete que Júnior tinha me dado no último Natal.
Um capacho com o desenho da Dona Florinda, do Chaves, e estava escrito
em letras bem grandes: não gostaria de entrar e tomar uma xícara de café?
Era uma piada interna entre meu irmão e eu. Ele me presenteou com
aquela coisa horrível apenas para me zoar, pois, sempre quando dona Rosa,
minha antiga vizinha vinha me visitar, eu lhe oferecia sua bebida favorita,
café. A brincadeira pegou e Júnior começou a me chamar de a dona
Florinda do Marmitão. Felizmente só aquele desnaturado conhecia o
apelido.
Puta que pariu! Diogo não podia descobrir esse apelido ridículo.
Não estava me referindo ao nome "Marmitão", Diogo devia
conhecer o apelido do nosso prédio, já que existia desde que éramos
crianças. O formato cilíndrico do edifício se assemelhava a marmitas tipo
torre, usadas anos atrás por restaurantes para entregar comida. O problema
seria se começasse a me chamar de dona Florinda.
Se a idade não tivesse mudado seu humor, o desgraçado era o maior
zombador das galáxias e ele perdia o amigo, mas não a piada.
— Sério, Gabriela? — perguntou, entre uma risada e outra.
Gente, como esse homem podia rir de uma coisa tão boba? Será que
estudar demais o deixou com uns parafusos a menos?
— O que foi doutor, tirou o dia para me azucrinar? — perguntei,
contrariada.
Diogo voltou a me encarar e o sorriso brincalhão cedeu lugar a um
mais intenso, devasso. Ele me lançou um olhar sedento dos pés à cabeça e
aí me toquei que usava uma roupa minúscula. Eu vestia uma das camisolas
mais curtas do meu armário, não era sexy nem nada, mesmo assim me senti
nua ao tê-lo me comendo com os olhos.
— Longe de mim, fazer uma coisa dessa, mas sabe como é, sempre
foi delicioso te irritar — defendeu-se, sem tirar o sorriso idiota da cara.
— Escuta aqui, seu… — Comecei a xingá-lo, doida para mandá-lo à
merda, infelizmente, Isa apareceu para estragar meu plano.
— Oi, tio Di — gritou minha filha, e parou ao meu lado. — O que
tem aí?
Isabela era terrível. Seus olhos brilharam ao notar a sacola na mão
do vizinho, coisa que nem eu havia percebido, e ela não só viu, como ainda
quis saber o que tinha dentro.
— Oi, lindinha. Trouxe para você — respondeu, esticando o braço.
Isabela abriu o sorriso imenso e o movimento remexeu o conteúdo
da sacola, deixando à mostra um pote com a marca de uma sorveteria do
centro da cidade. Antes que ela pudesse pegá-lo, o tomei da mão de Diogo
com raiva e mandei Isabela entrar.
— Que merda é essa, Diogo? Tá passando por cima da minha
autoridade? Eu disse que não queria que minha filha tomasse sorvete. —
Irada, quase joguei a embalagem de volta nele.
— Calma…
— Calma o caralho. Tô cansada de gente querendo mandar na
minha vida, dizendo o que devo ou não fazer.
— Gabriela, fica em silêncio e me escuta por um segundo. — Diogo
se aproximou e tocou uma mecha dos meus cabelos. — Não quis te
desrespeitar. Eu trouxe o sorvete porque é uma versão saudável, sem
lactose, sem glúten, feito com leite de coco, adoçante natural e sem um
pingo de gordura ruim. Eu o encomendei diretamente com o dono da
sorveteria, justamente porque você disse que não gostava que sua filha
comesse porcaria.
Pensei em retrucar, contudo, depois do saudável, minha mente
congelou. Ele havia arrumado um jeito inteligente de cumprir a promessa
que tinha feito a Isa. O homem foi esperto, precisava admitir.
Como toda mulher, mãe solo, não gostava de me sentir
desrespeitada, e a possibilidade de Diogo agir sem consideração e respeito
com minha decisão, deixou-me com sangue nos olhos. Só que não era
apenas isso. Eu também precisava ser honesta e confessar que o modo como
eu o vinha tratando tinha a ver com nossa relação ruim do passado.
— Tudo bem. Desculpa.
— Não precisa se desculpar, acho que ambos cometemos erros, não
é mesmo?
— Sim, e preciso admitir uma coisa — respondi, fazendo uma
careta. — Tá sendo muito difícil pra mim não deixar nossas rusgas do
passado interferir no presente. Você era o ser mais irritante e implicante da
face da terra.
— Concordo, eu gostava mesmo de provocar, mas você também não
ajudava. Nunca vi criança mais birrenta e mandona.
Pior que não tinha como negar. Fui uma criança insuporchata, como
mamãe costumava me chamar.
— O que acha de tentarmos esquecer nossas desavenças do passado
e focarmos no agora? Precisamos ter uma convivência pacífica, vamos
trabalhar juntos, somos vizinhos e eu gosto muito da sua filha.
— Você está certo. Prometo que vou tentar. — Torci para que nossa
trégua desse certo e eu, enfim, superasse o passado.
— Eu também. Agora, posso entrar, Gabriela? Quero entregar o
sorvete para sua filha — indagou, desviando o olhar para dentro do
apartamento. — E a propósito, ela está nos observando escondida no
corredor.
— Claro — afastei, deixando que entrasse no meu santuário. Só
esperava não me arrepender. — Pode vir, Isabela. Eu sei que está nos
observando escondida — chamei, prendendo o riso.
— Ebaaa… a senhora acalmou e deixou ele entrar — A criança
comemorou e correu até Diogo.
— Ainda bem, não é? Já imaginou eu ter que tomar todo esse
sorvete sozinho? — Sorrindo, ele se agachou para ficar na altura de Isa e
estendeu a sacola para ela.
A criança ficou eufórica e abriu desajeitadamente, apoiando a
embalagem no chão. Seu sorriso se alargou ao perceber que o vizinho
escolhera seu sabor favorito.
— Tio, sabia que esse é o meu sabor preferido do mundo todo?
Obrigada — Isa agradeceu e se jogou em seu colo, enchendo-o de beijos.
— Filha, você vai assustar o Diogo desse jeito. Tenha modos,
menina!
— Não vai, não. Sua mãe está com ciúmes, Isa. — Rindo, Diogo a
aconchegou entre os braços, carinhosamente, sem se importar comigo que
os olhava atentamente.
— Até parece — resmunguei, revirando os olhos e peguei o pote de
sorvete esquecido no chão.
Ele não estava de todo errado. Algo me incomodava. A
aproximação de Diogo e a facilidade como os dois pareciam se entender me
deixavam com um pouco de medo. Isa era amorosa, se apegava fácil às
pessoas e eu tinha receio desse vínculo afetivo.
Arrumei a mesa, enquanto os dois se entretinham em uma conversa
animada, em que Isabela era a principal interlocutora. Típico de uma
criança esperta como ela. Seria uma mentirosa se dissesse que sua atitude
não mexeu comigo, porque mexeu, e muito. E esse carinho com minha filha
o ajudou a subir uns pontinhos em meu conceito.
— Venham — chamei, pegando uma taça de plástico para servir Isa.
O vizinho se sentou ao lado da minha filha, rindo, e o olhar brilhante
de Isa para ele não passou despercebido. Agora era definitivo: ela estava
encantada pelo homem.
— Tio Di, você tem filhos? — Isa perguntou, séria, sem tirar os
olhos de Diogo.
— Não, por quê?
— Ah, se tivesse eu ia pedir pra deixar eles brincarem comigo.
— Isa, o que nós conversamos sobre você ser tão abelhuda? Que
falta de educação! — reclamei, chateada, e a garota pareceu me ignorar.
— Eu queria mesmo era um irmão, mas minha mãe fala que é pra
tirar isso da minha cabeça porque ela não tem condições psicológicas para
ter outro filho. Mas eu sei que o motivo é outro.
Arregalei os olhos e encarei Diogo.
— É mesmo, lindinha? Nossa, por que será que ela pensa assim?
Você parece ser uma filha calminha — comentou o safado, incentivando-a a
continuar, e prendeu o riso.
— Esses dias ouvi ela conversando com a Dinda — confessou ela
baixinho, e eu a olhei feio, prevendo que sairia uma pérola da sua boca —
e, quando a Dinda falou que era pra minha mãe deixar de ser besta e
aproveitar o delícia do gemidão do WhatsApp, mamãe respondeu assim: ele
pode ser gostoso o quanto for, mas não quero saber desse homem na minha
vida.
— Garota! — ralhei, perplexa com a audácia da menina.
— Delícia do gemidão do WhatsApp? Quem será esse gostoso? —
provocou, olhando-me de um jeito que parecia desnudar minha alma. —
Será que conheço esse homem, Gabriela?
— Ué, isso é uma pessoa, tio? — Isa soltou a colher e cruzou os
braços sobre a mesa, esperando por uma resposta de Diogo.
— Chega de cuidar da vida dos outros, Isabela. Vá escovar os
dentes e colocar o pijama. — Achei melhor interferir e cortar a conversa
antes que o vizinho dissesse alguma besteira, que no final seria eu a ter que
explicar.
— Ah, mãe, tá tão legal aqui — reclamou, apelando para um olhar
pidão. — Eu queria mostrar pro tio Di as minhas bonecas.
— Olha só, Isa, obedeça a mamãe, e prometo que volto outro dia
para que me mostre todas elas — argumentou carinhoso, segurando a mão
pequenina dela entre as suas. — Agora vá, a gente se vê em breve,
combinado?
Ele a abraçou apertado e acariciou seus cabelos, beijando o topo de
sua cabeça de um jeito tão afetuoso que me fez derreter. Isa obedeceu e
correu para o quarto.
— Agora que estamos sozinhos, mata a minha curiosidade. Quem é
o gostosão do gemidão do WhatsApp?
— Não vou contar nada — bufei, nervosa. — Olha, Diogo, sei que
sua rotina é corrida, por isso não se prenda aos caprichos da Isa. Ela está em
uma fase difícil e não tá nada fácil pra mim criá-la sozinha.
— Posso te fazer uma pergunta, íntima? — perguntou, ficando sério
de repente. Concordei com um aceno de cabeça e ele continuou: — E o pai
dela, onde está?
Victor não era um assunto que eu gostasse de falar, mas conseguia
fazê-lo perfeitamente. Apesar da canalhice que fez ao me abandonar, ele me
deu o presente mais valioso da minha vida, minha filha, e tentava focar
nessa parte boa.
— O pai dela me abandonou grávida quando ainda estávamos na
faculdade — resumi a história, sentindo um incômodo no peito.
— Ele nunca quis saber da menina?
— Não, e ainda abandonou o curso e mudou de cidade para eu não o
encontrar. Como se eu fosse correr atrás daquele traidor.
— Que covarde. Infelizmente, existem homens que simplesmente
não merecem ser chamados de homens — respondeu, visivelmente
indignado e se levantou.
Essa foi a minha deixa para encerrar a noite, no entanto, fui invadida
pelas palavras de Diogo, que me deixaram desconcertada.
— Quem perdeu foi ele, Gabriela. Perdeu uma mulher linda e
incrível como você, e nunca terá a felicidade de conviver com uma
pessoinha tão maravilhosa quanto a Isa.
Capítulo 7

GABRIELA

— Mãezinha, acorda! Já tá de dia. — Isabela me chacoalhou mais


uma vez e levou a mãozinha ao meu rosto.
Meu Deus, eu me sentia péssima.
Também, quem mandou entornar diversas taças de vinho na noite
anterior enquanto lia um romance hot. Usei o líquido gelado para diminuir o
fogo que sentia ferver dentro de mim, pena que esqueci que o bendito tinha
álcool e a ressaca no dia seguinte não seria agradável.
— Filha, deixa a mamãe dormir mais um pouquinho — resmunguei
ao erguer a cabeça do travesseiro e olhar o rosto de Isabela.
— Mais mãe, eu tô com fome. — Pronto, agora teria que levantar.
Como eu ia deixar a pequena madrugadora com fome?
Peguei meu celular na mesa de cabeceira e semicerrei os olhos ao
ver hora. Eram 6h15!
— Parabéns, Isabela, cada dia você acorda mais cedo nos dias de
folga.
— Obrigada!
Eu não estava fazendo um elogio de verdade, mas a pestinha tomou
minhas palavras como sinceras e agarrou meu pescoço animada.
— Isa, tô brincando. Sábado, domingo e feriados são dias de a gente
dormir até mais tarde, relaxar quietinha na cama — argumentei mais uma
vez, ou melhor, pela milésima vez. Eu sempre reclamava e ela continuava
acordando cedo. — Escovou os dentes?
Isabela saiu correndo e o telefone tocou enquanto me levantava.
Resgatei o aparelho que ficara perdido entre os lençóis e sorri assim que vi
o rosto do meu irmão na tela do celular.
— Oi, Júnior!
— Ei, mana, que cara de acabada é essa?
— Ressaca, Jú. Exagerei no vinho ontem à noite. — Recostei na
cabeceira da cama e soltei a cabeça para trás.
— Opa! Que milagre é esse? Foi pra farra com quem? — Voltei a
encará-lo e ele sorria, maliciosamente, evidenciando as covinhas do seu
rosto bonito.
— Com meu Kindle. Enchi a cara enquanto lia um romance hot.
— Credo, que chato. — Sua careta engraçada ajudou a desfazer a
minha expressão carregada de antes.
— Oi, tio Jú — Isabela gritou, tirando o celular da minha mão.
— Ei! — protestei, e claro que não adiantou de nada. Isa me ignorou
e iniciou a conversa com Júnior.
— Oi, meu amorzinho. Que novidade é essa de me chamar de tio
Jú? Eu não era o titio querido?
— É pra não misturar, sabe, porque agora eu tenho outro tio, o tio
Di. — Fechei os olhos assim que ela falou o nome de Diogo, sabendo que
viria um bombardeio de perguntas de Júnior.
— Sério? Que interessante. Posso saber quem é esse tio Di?
— Ah… é o novo vizinho. — Sua inocência era um perigo porque
sempre me entregava e me fazia passar vergonha, ao mesmo tempo que, às
vezes, como agora, eu precisava me segurar para não rir de sua esperteza.
— Nossa, Gabriela, tem alguma coisa que a senhorita queira me
contar? — Ele mexeu as sobrancelhas e eu revirei os olhos com a pergunta.
— Não, tô de boa. Só essa menina que já folgou no vizinho, mas
você vai se espantar quando eu contar quem ele é. — Fiz uma pausa
dramática por uns 15 segundos para vê-lo provando do próprio veneno, pois
o peste era mais curioso que muita mulher, e completei a frase com a
revelação que tinha certeza que o faria surtar: — É o Diogo…
— Não! Sério? — Ele, que estava deitado, levantou-se em um pulo
e aproximou o rosto da tela. — Caralho, não imaginei que Diogo voltasse a
morar em Mococa.
— Você bem que podia seguir o exemplo e também volta a morar
aqui, pertinho da gente.
— Não é simples como imagina. Tenho responsabilidades, jamais
encontraria um trabalho aí com o mesmo salário que ganho aqui e ainda
estou pagando meu apartamento. — Júnior desviou o olhar da tela do
celular por alguns segundos, coisa que sempre fazia quando mentia, e,
então, seus olhos voltaram para os meus, culpados.
— Sei que isso é um monte de desculpas vazias e elas não colam pra
mim. Você prefere morar onde Judas perdeu as botas do que voltar para cá.
— Eu tenho um remorso gigantesco por não a ter ajudado quando
mais precisou de mim, minha irmã. Se não fosse o Alê, qual o suporte você
teria para o nascimento da sua filha? Me sinto um bosta cada vez que
penso nisso — confessou, emocionado, e sua fragilidade me preocupou.
— Ei, pode parar com isso. Você estava doente, Jú, e não podia
fazer nada naquele estado.
— Você não entende…
— Quer apostar como entendo? — Júnior ficou calado e, como eu
tinha entrado no assunto proibido, resolvi ir a fundo e continuei: — Vou
dizer o que penso. Está se punindo ao não voltar a morar conosco. Acha que
não merece estar entre nós duas, já que não nos ajudou quando mais
precisamos.
— Não é nada disso. Você pode ter esquecido, mas minha casa é
aqui, em Ribeirão.
— Não esqueci. Queria apenas que lembrasse que casa é um monte
de tijolos, um ambiente frio, sem afeto. E que aqui, terá amor,
companheirismo e um lar cheio de vida para voltar depois do trabalho. —
Escutei um barulho vindo do quarto de Isabela e levantei num pulo. —
Pensa no que falei com carinho. Eu e Isa ficaríamos muito felizes se você
voltasse a morar pertinho de nós.
— Tenho um puta orgulho da mulher que você se tornou, minha
irmã.
— E eu de você. Não é fácil conviver com um vício fodido como o
seu, você precisa lutar diariamente contra os seus demônios e ser forte para
não cair na tentação e ter uma recaída. Você, meu irmão, é o homem mais
gente boa que eu conheço, é amoroso com os seus, é um homem
trabalhador, honesto, e merece muito ser feliz. — Parei de falar quando
entrei na cozinha e encontrei minha filha e tudo o que estava ao seu redor
sujo de farinha de trigo. A danada me olhou com os olhos arregalados de
quem sabia que havia feito merda.
— Gaby, o que houve — Júnior gritou, preocupado, fazendo-me sair
do estupor.
— Nada. Só tô em choque com o que a sua sobrinha fez. Dá uma
olhada. — Virei a câmera do aparelho e filmei a cena à minha frente. Meu
irmão começou a rir e voltei a encará-lo. — Tá vendo, não estou dando
conta, preciso de você aqui para me ajudar a botar juízo na cabeça dessa
criança.
— Seria mais fácil eu participar das bagunças de Isa.
— Pelo menos eu teria alguém para me ajudar a limpar a sujeira —
bufei, e quando Isabela ameaçou sair da cozinha, avisei que parasse, pois
iria me ajudar a limpar a sujeira.
Despedi do meu irmão com a promessa de que ele pensaria em tudo
o que conversamos. Não seria fácil convencê-lo a voltar para Mococa, mas
vi em seu olhar uma hesitação que nunca existiu, e, pela primeira vez, eu
estava confiante de que poderia conseguir.
Capítulo 8

DIOGO

Eu mal tinha desligado o motor do carro quando Fabi deslizou a mão


pela frente da minha calça e apertou meu pau com vontade. Passei a tarde
esperando pelo nosso encontro e sorri envaidecido quando ouvi o som do seu
gemido.
— Ah, Diogo, esse seu pau delicioso me deixa com água na boca.
— Porra, isso é golpe baixo — protestei, encostando a cabeça no
banco enquanto a sentia abrir o botão da minha calça.
Seus dedos desceram o zíper com habilidade e, mais rápido do que
previ, meu membro saltou livre para fora, ereto e duro feito rocha. Segurei o
volante do meu BMW com força e observei seus movimentos sensuais,
atento ao que a safada fazia.
Ela lambeu os lábios sedutora, a mão direita segurando meu membro
pela base e se abaixou, abocanhando toda a minha extensão para dentro de
sua boca quentinha.
— Isso, gostosa, engole tudo — disse, agarrando seus cabelos.
Fui envolvido por uma névoa de prazer, um tesão absurdo que me
deixou doido de vontade de gozar, contudo, o barulho do portão do meu
prédio sendo aberto me tirou do transe da luxúria e, enfim, percebi o risco
que corria. O edifício que morava era em sua maioria habitado por famílias
e, mesmo sendo tarde, podíamos ser flagrados transando e eu não queria
isso.
Bem, a quem eu queria enganar? Depois que descobri que a espoleta
da Isa ouviu minha trepada com Fabi, eu vivia em alerta.
— Loira, é melhor pararmos com essa pegação aqui no carro. Seu
Tobias quase nos flagrou da última vez e não quero ser pego como se fosse
um adolescente cheio de hormônios. — Puxei sua cabeça e a fiz parar o
boquete.
Ela sorriu, exibindo um sorriso sacana. Fabiana era delicada e
gostosa demais. Tinha olhos azuis e um cabelo loiro platinado que
combinava perfeitamente com sua pele branca, sedosa. Eu conhecia poucas
mulheres deslumbrantes como ela em Mococa, muito embora fosse mais
desbocada que um caminhoneiro.
Eu a conhecia desde sempre. Estudamos juntos e acabamos
namorando no final do ensino médio. Nossa relação durou pouco tempo,
pois logo me mudei para Ribeirão Preto para cursar a faculdade de medicina
e percebemos que o relacionamento a distância não ia funcionar. Ambos
éramos sexualizados e jovens demais para mantermos o celibato.
Há duas semanas nos reencontramos no centro da cidade e daquele
dia em diante passamos a transar ocasionalmente. Claro, com a regra
explícita de que nossos momentos juntos não passariam de sexo. Uma
decisão de comum acordo, já que, como eu, Fabi gostava da sua liberdade e
se declarava uma mulher independente, livre, que jamais se amarraria em um
homem só.
— Não se faz isso com uma mulher cheia de tesão, sabia? É muita
maldade não me deixar aproveitar dessa gostosura toda — resmungou,
depois de dar uma última chupada no meu pau.
Recebi um de seus olhares impacientes, mas fez o que eu pedi e
desceu do veículo, indo na direção do elevador. Segui seus passos e segurei a
linda mulher pela mão, acompanhando-a para dentro da caixa metálica.
— Vamos logo que não vejo a hora da nossa brincadeira começar —
disse, assim que o elevador parou no meu andar e enlaçou os braços em
minha cintura.
— Calma, loira. — Segurei-a pela mão e a fiz parar no meio da
ampla sala de estar. — Olha, recebi reclamação da minha vizinha por causa
dos barulhos das nossas trepadas, e por isso hoje teremos que ser discretos.
— Ah, que mulher chata — reclamou, manhosa, e enfiou suas mãos
por baixo da minha camiseta. — Não pretendo fazer escândalo nenhum,
Diogo. A não ser que seja bem malvadão comigo. O que não vou reclamar,
claro.
Revirei os olhos, rindo, e a peguei no colo, jogando seu corpo sobre
meu ombro. Como adorava seu traseiro redondo, dei um tapa estalado em
sua bunda durinha, que acabou fazendo com que a danada desse um gritinho.
— Quieta, diaba, ou quer que eu te coma em uma rapidinha sem
graça — avisei, autoritário, e segui para o único cômodo do apartamento que
eu sabia que a vizinha não escutaria minha transa: no banheiro.
— Nem adianta ameaçar. Eu sei que nunca se contentaria com uma
trepada básica. Você é um homem insaciável, Diogo.
Sabia que naquela altura do campeonato Fabi estava louca para
transar, pingando excitação e desesperada para gozar. Aproveitei que ainda
tinha sua bunda arrebitada em meu ombro e infiltrei um dedo por entre suas
dobras molhadas. Acariciei seu clitóris, apenas uma provocação para deixá-
la ainda mais alucinada, e mordi sua bunda exposta antes de colocá-la
sentada sobre a bancada da pia.
Como a boa safada que era, Fabi não perdeu tempo e logo foi
arrancando a calcinha. Entre nós não havia a necessidade de impressionar,
seduzir o outro, então, tirei minha roupa em tempo recorde, coloquei um
preservativo e me enterrei dentro dela.
Assim como eu, Fabi era insaciável, uma mulher quente e fogosa
sem qualquer pudor na hora do sexo. Uma garantia perfeita que minha noite
seria deliciosa e muito relaxante.

Acordei às seis e meia da manhã naquele domingo, com o toque


insistente do celular. Nem precisei olhar no visor para saber que era minha
mãe. Há dias a história se repetia. Desde que voltei para minha cidade natal e
precisei deixar Mel, minha cachorra da raça Golden Retriever, em sua casa
por não ter espaço em meu apartamento, dona Francisca estava me deixando
maluco com suas reclamações.
Espreguicei-me e, antes de atender a ligação, lancei um olhar para o
espaço vazio na cama, aliviado por ver que Fabi já tinha ido embora.
Gostava de sexo casual, principalmente por não precisar me preocupar com a
melação do dia seguinte.
Respirei fundo, encarando a foto da minha mãe e deslizei o dedo na
tela.
— Diogo, eu não aguento mais essa cachorra — esbravejou, sem ao
menos me cumprimentar.
— Oi, mãe, bom dia para senhora também.
— Nem venha com gracinhas, Diogo, sua cachorra está destruindo
minhas plantas — bufou, impaciente, e eu pude visualizar seu rosto
vermelho pela irritação. Fiquei com pena dos empregados da sua casa, que
teriam que aguentar seu mau humor.
— Desculpa, mãe, estou cansado e todo dia é a mesma história. Será
que não dava para me deixar dormir mais um pouco hoje?
— Eu sei filho, mas você precisa me entender. Se estou agindo
assim, é porque a Mel é completamente mal-educada. Estava pensando em
arrumar um adestrador para botá-la nos trilhos.
— Eu entendo, e a senhora também precisa compreender que a Mel
já é adestrada. Ela não faz as artes por mal comportamento, apenas está
estranhando, sentindo falta da rotina que tínhamos em São Paulo, da casa de
lá.
E realmente esse era o problema. Ela passara por mudança demais
em um curto espaço de tempo. Em São Paulo, eu tinha uma rotina de
trabalho organizada para não ter pacientes muito cedo. Gostava de usar esse
horário livre para correr com a Mel pelo parque e fazê-la gastar energia.
Aquilo aliviava o estresse do animal, que precisava de boas doses diárias de
exercício para não ficar muito agitada e fora de controle.
Agora, além de não morar comigo, a cachorra estava sem sua
atividade matinal que tanto gostava. Precisava dar um jeito na minha vida e
comprar logo uma casa.
— A corretora de imóveis me ligou sexta-feira para avisar que tem
duas propriedades disponíveis pra eu ver.
— Sei não. Você sempre encontra um monte de defeitos nessas casas.
— Bem, não posso fazer nada se não encontro nada decente. Olha,
preciso desligar. Vou tomar um banho para buscar a Mel para passar o dia
comigo.
Joguei o celular sobre o colchão e levantei da cama. Antes de seguir
para o banheiro, parei de frente a janela e abri as cortinas, observando o dia
ensolarado e quente do lado de fora. O tempo estava propício para um belo
passeio ao ar livre, só não sabia ainda onde ir com a Mel. Talvez Maria,
cozinheira da mamãe, pudesse me dar uma ideia.

Tomei um banho rápido e desci para a garagem, cruzando todo o


amplo estacionamento subterrâneo do prédio até chegar ao meu carro. A
vaga da Gabriela ficava ao lado da minha e acabei sorrindo quando a
encontrei com a filha, empurrando uma bicicleta cor de rosa. Quando a
pequena me viu, abriu um sorrisão e correu na minha direção.
— Oi, tio Di. Eu vou andar de bicicleta na praça — disse animada e
me agachei para conversarmos.
— Sério? Que demais, florzinha. Quando tinha sua idade também
adorava pedalar.
— Minha mãe não gosta. Eu sempre chamo e ela diz que não é
Robinho pra pedalar, que prefere ficar olhando. Não é, mamãe?
— Sim, Isa, verdade.
Sorri ao ouvir a resposta da criança, pela maneira graciosa como
entregava a mãe e me mostrava um outro lado de Gabriela que ainda não
conhecia.
Levantei-me para cumprimentá-la e levei um tranco quando a vi. A
garota usava um vestido preto comportado, mas com decote arredondado
que evidenciava a curva de seus seios. Uma delícia.
— Oi! — cumprimentou, evitando me encarar, e direcionou a
atenção à bicicleta. Contudo, o comedimento durou pouco tempo e logo seus
olhos encontraram os meus.
— Oi. — Não consegui dizer mais uma palavra, a atenção voltada
para a boca pintada com um batom nude brilhante, que fazia seus lábios
parecerem maiores e bastante apetitosos.
— Tio, você tem bicicleta pra brincar na praça comigo?
— Filha, hoje é domingo e o Diogo deve ter compromisso com a
família dele.
— É mesmo. Esqueci que só nós duas não temos família.
Nossa, aquela frase bateu fundo no meu coração e doeu
profundamente, fazendo uma ideia surgir imediatamente na minha cabeça.
— Isa, também não é assim. Não seja injusta.
— Eu sei, mãe, desculpa — sussurrou, e seus olhinhos se encheram
de lágrimas. — Nós temos uma, mas eles não gostam da gente.
— Olha, eu tenho uma ideia melhor. Eu não tenho bike, mas o que
acha de conhecer a minha cachorra Mel? — perguntei, desesperado para
mudar o foco do pensamento da criança.
— Você tem um cachorro? — perguntou, limpando os olhos, e
quando concordei, saiu saltitando na direção da mãe. — Você ouviu, mãe?
— Ouvi, sim — Gaby respondeu para a criança, forçando um sorriso.
— Não vamos atrapalhar seu domingo, Diogo?
— De jeito nenhum. Não tenho nada programado, só preciso passear
com a Mel para ver se aquela arteira para de comer as plantas da casa da
minha mãe.
— Podemos, mamãe? Diz que sim, por favorzinho — pediu, unindo
as mãozinhas em forma de oração.
— Ok. — Seu semblante estava sério, porém acabou não resistindo e
sorriu ao ver a filha animada.
— Obrigada, tio Di. O senhor é o melhor tio postiço das galáxias. —
Isa agradeceu, agarrando minhas pernas.
— Combinado, então. Vou buscá-la e encontro vocês no coreto daqui
a meia hora — despedi-me delas rapidamente, pois Isa correu na direção da
bicicleta e a mãe saiu cuidadosa atrás.
O olhar de ternura da pequena aqueceu meu coração. Por algum
motivo inexplicável, essa menininha serelepe e sem filtro, a cada dia que
passava, roubava mais um pedaço do meu coração. Sempre investi em minha
carreira e nunca me imaginei sendo pai, um homem responsável por uma
família, amando uma mulher e um serzinho que dependesse de mim. Isabela
me fazia questionar pela primeira vez as decisões que tomei ao longo da
vida, e uma delas era a de preferir ser sozinho. Há muitos anos tinha
decidido que essa vida não era para mim e esse sentimento novo me
assustava, bagunçando minha mente e o meu coração.
Contudo, precisava ser honesto comigo mesmo e confessar que não
era só o sentimento pela criança que me assustava. Gabriela mexia comigo
mais do que o normal, algo que ia além do tesão habitual, e nem mesmo o
fato da nossa diferença de idade, nem de ela ser irmã do meu melhor amigo,
me faziam querer afastar. Apenas aproximar cada vez mais para descobrir
que fascínio louco era aquele.
Capítulo 9

GABRIELA

O que foi isso?


Eu ainda não sabia qual era a do Diogo em se aproximar de mim e
da minha filha, contudo, mesmo com medo dessa aproximação fazer mal a
minha pequena, eu não conseguia afastá-lo. Era tão bom ver o sorriso de Isa
que eu simplesmente acabei optando por deixar rolar.
Como prometido, meia-hora depois Diogo estacionou seu carro de
frente a praça. Foi impossível não sorrir ao ver sua Golden Retriever toda
serelepe no banco de trás, com metade do corpo para fora da janela. A
cachorra era muito bonita: pelagem densa e dourada. Se Isa estava animada
sem conhecer o animal, quando o visse ficaria apaixonada. Mel era linda
demais!
— Mãe, eles chegaram! — Isa soltou a bicicleta de qualquer jeito no
chão e correu na direção do tio postiço.
Diogo, que acabara de descer do carro, recebeu minha filha de uma
forma tão carinhosa que balançou tudo dentro de mim. Ele abriu os braços e
se abaixou para pegá-la no colo, e, depois de beijar seu rostinho sorridente,
seguiu para a janela onde o cão latia sem parar. Embora parecesse animada
para conhecer o novo amigo, Isa acariciou a cabeça do animal, receosa, e
relaxou quando Diogo a encorajou dizendo que Mel era mansinha. As
gargalhadas romperam soltas no ar e Isa deixou que a cachorra cheirasse e
lambesse seu rosto.
Eu assistia a cena a poucos passos de distância, e nem percebi que
me emocionava até uma lágrima deslizar pela minha face. Limpei-a
rapidamente, temendo ser flagrada em um momento vulnerável. Minha filha
não teve uma figura paterna. Seu próprio pai a renegou e ver um
desconhecido a tratar tão bem, me causou uma sensação estranha.
Respirei fundo ao ver que eles se aproximavam e sorri. Diogo
carregava Isa no colo, segurando-a com apenas um braço, enquanto
mantinha a guia do cachorro presa na outra mão. Ele parecia contente, um
sorriso enorme não me deixava mentir e não parava de conversar com
minha filha.
Diogo estava muito bonito, vestia um moletom preto que quebrava
um pouco seu porte altivo e intimidador, sem contar o tanto que o deixava
gostoso. Os cabelos castanho-claros sempre ridiculamente penteados
estavam desalinhados, o que também acontecia com a barba, que parecia
não ter sido aparada nos últimos dias.
— Voltei — disse, descontraído e piscou charmoso para mim.
Movi a cabeça em um aceno, incapacitada de responder, pois no
momento meu coração idiota parecia uma escola de samba.
Credo, Gaby, foi só uma piscadela inocente. Deixa de ser carente.
— Briguei comigo mesma, e me aproximei, torcendo para não gaguejar.
— Meu Deus, Mel, você é linda. — Empolgada, me abaixei para
passar a mão na cabeça peluda e macia do animal.
— Eu falei a mesma coisa, mamãe. Podemos ter um também?
Ah, demorou. Desde que Diogo surgiu com essa história de mostrar
a Mel, previ que a espertinha falaria isso. Há anos Isa tentava ganhar um
cachorrinho, mas minha vida era tão corrida por causa do trabalho que a
enrolava como podia.
— Desculpa, filha, moramos em um apartamento e não temos
espaço. Veja o exemplo do Diogo, a Mel está morando na casa dos pais dele
— argumentei, rápido.
Diogo me olhou com um ar brincalhão, tipo: deixa de enrolar a
criança, e escolhe um cachorro de raça pequena, mas felizmente não se
intrometeu. Em agradecimento, abri o primeiro sorriso sincero do dia e
sussurrei um obrigado sem emitir nenhum som.
— E aí? Nós vamos ou não passear com a Mel? Preciso cansar essa
cachorra antes de levá-la de volta.
— Vamos! — gritou Isa, empolgada.
Deixamos a bicicleta no prédio e caminhamos lado a lado. Isa
implorou para segurar a guia da cachorra e Diogo permitiu, garantindo que
não teria perigo. Acabou me confidenciando que ela nem precisava ficar
presa, pois era adestrada e estava acostumada a passear solta em São Paulo.
O tempo passou rápido demais, com minha filha tagarelando e
Diogo ouvindo atento, demonstrando interesse em suas histórias
mirabolantes.
Eu tinha acabado de sentar em um banco com Isa, esperávamos
Diogo dar uma corrida com Mel em volta da praça, quando fui surpreendida
por Gouveia, o advogado de cinquenta anos que meu pai tanto insistia para
que eu me casasse.
— Bom dia, Gabriela.
— Bom dia, senhor — respondi, sem demonstrar empolgação.
— Me chame de Adalberto, querida, afinal, em breve nosso
compromisso será anunciado.
Encarei o homem à minha frente, processando aquela informação. A
situação era tão grotesca que não consegui fazer outra coisa a não ser rir. Ri
alto, uma gargalhada espalhafatosa que fez um casal de idosos que passava
ao nosso lado me olhar espantados.
— Você sabe que estamos no século 21, não sabe? Porque só posso
imaginar que o senhor está tendo algum tipo de alucinação para pensar que
aceitarei um casamento arranjado.
— Seu pai sabe o que é melhor para você. Devia aceitar o suporte
que ele está te dando. — Conforme falava, o rosto de Adalberto ganhou
uma coloração avermelhada e eu podia apostar que se pudesse, ele me
levaria arrastada ao altar. Só de raiva.
— Mãe, o que é um casamento arranjado? — perguntou Isa,
puxando meu vestido para que eu abaixasse.
— Depois a mamãe te explica, amorzinho. — Havia até esquecido
que Isa estava ao meu lado, e saber que minha filha presenciava aquela cena
ridícula fez meu sangue ferver.
— Senhor Adalberto, eu não sou mais criança e serei bem direta.
Não dou a mínima para o que meu pai vem planejando nas minhas costas.
Então, pare de me cercar e tentar impor sua presença, na esperança que em
algum momento eu vá aceitar a loucura de vocês dois. Eu não vou me casar
com o senhor. — Irada, não resisti e soltei o que estava entalado na minha
garganta.
O homem se agitou e me lançou um olhar de reprimenda. Eu nunca
havia respondido daquele jeito, achando que se o ignorasse esqueceria a
história do casamento, contudo, depois do que acabara de me dizer, percebi
que devia cortar o mal pela raiz.
— Você se diz muito adulta, mas parece uma criança birrenta, que
prefere continuar vivendo como uma mulher perdida do que aceitar a
decisão do pai — vociferou, sua voz saindo mais alto que o normal.
Tremi na base com seu tom ameaçador e pela primeira vez me senti
pequena perto dele. Adalberto não era um homem alto, mas em comparação
a mim, parecia um gigante. Eu estava prestes a agarrar minha filha e sair
dali, quando fui surpreendida pela voz grossa de Diogo ao meu lado, que
encarava o advogado alarmado.
— Algum problema, Gabriela?
Diogo agiu com cautela, embora desse para ver por uma veia saltada
em seu pescoço que parecia prestes a explodir. Eu não soube o quanto da
conversa ele tinha ouvido, mas, para falar a verdade, estava de saco cheio e
pouco me importando com isso. Só queria ir para minha casa.
— Nenhum, Diogo. Falei tudo o que tinha para falar para esse
senhor, que inclusive estava de saída.
Adalberto não pareceu nada contente com a intromissão, ainda mais
quando Diogo passou o braço por meu ombro. Como não era bobo, ele
avaliou o oponente dos pés à cabeça e entendeu que não seria uma boa ideia
enfrentar um adversário como ele: mais novo, mais ágil, com um corpo
atlético bem diferente do seu.
— Você vai se arrepender pelo que disse, Gabriela. Quando esse
playboyzinho te abandonar grávida como o outro fez, não adianta me
procurar. Não servirei de bote salva-vidas para você.
As palavras ofensivas deixaram Diogo tenso ao meu lado,
encarando o outro com uma expressão feroz. Temendo o que pudesse
acontecer, apertei sua mão sobre meu ombro e sussurrei:
— Deixa quieto, não vale a pena. Agredi-lo vai assustar a Isa ainda
mais.
Ouvir o nome da minha filha fez Diogo voltar a razão. Ele se voltou
para a pequena, que nos observava estranhamente calada e com os olhinhos
arregalados. Enquanto isso, Adalberto me lançou um último olhar
despeitado e saiu resmungando.
— Ei, princesinha, tá tudo bem, viu? — Diogo garantiu, agachando
entre Isa e a cachorra, que parara ao lado dela como uma defensora.
Precisava confessar que fiquei meio boba com seu jeito protetor.
— Mãe, você não vai casar com esse velhinho chato não, né?
— Não, filha. Fica tranquila. — Abaixei-me para ficar na sua altura
e abracei minha pequena.
— Promete, prometido? De dedinho cruzado e tudo? — insistiu,
cruzando seus dedinhos minúsculos na frente do meu rosto.
— Sim, senhorita. Veja! — Como ela fez, juntei o indicador e o
dedo médio e selei minha promessa com um beijinho em cima deles.
— Então, tá. — Satisfeita, Isa deu de ombros e, como sempre fazia,
mudou de assunto rapidinho. — A Carolzinha tá brincando lá no coreto
com a mãe dela. Posso ir lá um pouquinho?
— Pode — concordei e ela correu na direção da amiguinha.
— Sinto muito pelo que aconteceu. Você não tem nada a ver com a
bagunça da minha vida e teve que presenciar essa cena ridícula — me
desculpei, sem coragem de encará-lo.
Diogo tocou meu braço e fez um carinho de leve antes de descer até
minha mão e segurá-la. Eu sabia que o homem ao meu lado estava
preocupado, além de curioso por não ter pego a conversa toda.
— Você está bem? — perguntou, erguendo meu rosto, todo
atencioso.
— Estou sim e obrigada por me ajudar.
— Eu não fiz nada. Se quiser, eu posso ir atrás dele e dar uns socos
para garantir que fique longe de vocês — brincou, tentando aliviar o clima.
— Deixa pra lá. Adalberto age assim por culpa do meu pai.
— Eu sei que não é da minha conta, mas seu pai está querendo te
casar com aquele senhor? — perguntou, encarando-me sério, contudo, antes
que eu respondesse, continuou: — Olha, esquece a pergunta. Só se lembre
que independente do tipo de relação que existe entre você e esse homem,
ele não tinha o direito de falar contigo daquele jeito.
Droga, Diogo tinha entendido errado.
— A situação é mais complicada. Meu pai está me pressionando a
casar com Adalberto sem eu nunca ter tido nada com ele.
— Por que raios ele faria uma coisa dessas?
— Porque é um machista controlador, que não aceita até hoje que a
filha é uma mãe solteira.
— É inacreditável que isso ainda exista nos dias de hoje. — Diogo
não parecia apenas surpreso, sua expressão dura dizia que estava indignado.
— Sim. Há quanto tempo estava ouvindo?
— Eu o vi desde a sua gargalhada. Fiquei observando de longe e me
aproximei quando vi os ânimos se elevarem. Desculpa, não queria ser
invasivo. — Suas palavras pareciam sinceras e agradeci com um aceno.
— Você não foi, fica tranquilo. Além do mais, minha história não é
segredo para ninguém, acho que até o cachorrinho da esquina sabe o que
me aconteceu.
— Será que poderia me contar? Se não for problema para você,
claro. — Sua exasperação me surpreendeu, fazendo o meu coração idiota
ficar eufórico.
— Evoluímos aqui, hein? Passamos da implicância mútua para a
amizade, muito rápido — brinquei, tentando desesperadamente não chorar.
— Minha vida mudou bastante depois que engravidei. Meu pai me renegou
sem um tostão no bolso e se não fosse pelo meu primo Alê, eu nem sei o
que teria sido de mim e da minha filha. Ele me deu casa, comida e roupa
lavada, até eu me formar e arrumar um emprego na Pró Vita. Se bem que eu
ainda moro no apartamento dele, mas é por pura insistência daquele
teimoso.
— Nossa, que doideira. Sua mãe ou o Júnior, não te ajudaram?
— Minha mãe faleceu um ano antes de tudo acontecer. Já o Júnior,
talvez você não saiba, na época ele estava enfiado nas drogas, não cuidava
nem dele mesmo.
— Meu Deus, Gabriela, sinto muito. — Sorri fraco e agradeci. Suas
mãos se uniram à minha, só que num contato mais rápido dessa vez. Ele a
soltou e continuou: — E o Júnior, como está?
— Limpo há alguns anos e muito bem, graças a Deus. Ele mora em
Ribeirão Preto e trabalha em uma construtora.
— Pelo jeito eu perdi muita coisa nesses anos fora. Poderia ter
ajudado seu irmão, nós éramos tão amigos. Mas fico feliz de saber que o
Júnior está bem.
— Tá sim. E se o vir, por favor, não conte o que aconteceu hoje.
Júnior não se dá bem com o papai e não quero botar mais lenha na fogueira.
— Eu sinto muito pelo que você passou.
— Não sinta, aconteceu como tinha que ser. Embora existam
sentimentos contraditórios dentro de mim, eu não me arrependo de nada.
Ao mesmo tempo que perdi eu ganhei. Perdi meu pai, o convívio com uma
família, mas ganhei a minha filha. O amor imenso que sinto por aquela
menininha sapeca me basta e faz tudo ter valido a pena.
Parados de frente um para o outro, caímos em um silêncio
incômodo, um observando o outro. Diogo pareceu ponderar se falava ou
não o que passava em sua mente, então apertou os lábios em linha reta, e
desviou o olhar.
Queria poder dizer que eu estava indiferente ao que acontecia. Se
antes eu me sentia envolvida por sua volta, agora, depois de conhecer esse
outro lado de Diogo, todas as barreiras que foram construídas, ruíram.
Meu Deus, eu precisava me afastar desse homem ou corria um sério
risco de me apaixonar novamente pelo impossível. Balancei a cabeça, na
tentativa desesperada de espantar o pensamento e resolvi chamar Isabela
para encerrar aquele dia, que fora cheio de emoções.
Diogo nos acompanhou até o meu apartamento, conversando com
Isa, que não desgrudava dele e do cachorro.
— Vai, filha, já para o banho. Você tá bem fedidinha — provoquei, e
estranhei quando me obedeceu, sem retrucar, e saiu correndo na direção do
banheiro.
— Nossa… ela foi sem resmungar.
— Queria uns minutos a sós com você e talvez eu tenha comprado
sua filha com uma promessa de um picolé.
O homem lindo e mais cheiroso que conheci, se aproximou de mim,
devagar, revezando o olhar entre meu decote e minha boca. Senhor! Eu
seria beijada pelo deus grego e corria o sério risco de ter um infarto
fulminante.
Diogo arrumou uma mecha do meu cabelo que caíra sobre o rosto,
de um modo tão íntimo, que me deixou imóvel, sem ar. Fixei meus olhos
nos seus e, de pertinho, o homem parecia ainda mais perfeito, mais
cheiroso, mais tudo.
Rapidamente sua boca se aproximou da minha e como não ofereci
resistência, logo seus lábios roçaram nos meus, quentes, famintos. Sua
língua me invadiu cheia de pressa, sua mão desceu até quase perto da minha
bunda e ficamos entregues ao desejo até que Isa me chamou, quebrando o
clima.
— Tenho que entrar — disse, ofegante.
— Até mais, Gaby — sussurrou, sedutor, e saiu na direção do seu
apartamento.
Quase gemi em resposta, o corpo pegando fogo, inebriada por um
prazer que há tempos não sentia.
Capítulo 10

GABRIELA

Sábado era dia de faxina. Embora Alê fizesse questão que


tivéssemos uma faxineira para os serviços mais pesados, como lavar os
vidros, os azulejos dos banheiros e da cozinha, passar roupa, o restante dos
trabalhos ficava por minha conta.
Naquele dia, gastei um tempo maior na limpeza da cozinha,
organizando os armários e a geladeira. Era por volta das seis horas da tarde
quando deixei o balde na área de serviço e saí de lá com o saco de lixo para
levá-lo para fora.
Ao chegar à porta, fui atraída por vozes. Não resisti. Havia dois
apartamentos por andar naquele prédio, o meu e o de Diogo, então, só podia
ser ele do lado de fora. Eu não o via desde a semana passada. Curiosa, soltei
o lixo no chão e estiquei-me na ponta dos pés para espionar através do olho
mágico, que felizmente eu tinha mandado arrumar.
A imagem refletida pelo buraquinho de vidro era um pouco
retorcida, mas consegui identificar o meu vizinho com uma mulher loira.
O que ela fazia ali àquela hora da noite?
Despertei dos meus pensamentos quando a mulher o envolveu pelo
pescoço e o beijou.
Senti meu sangue gelar e meu estômago deu um nó. Diogo não
trazia companhia para casa há dias, e, mesmo sabendo que Diogo era
solteiro e podia se envolver com quantas mulheres quisesse, fui abatida por
uma sensação tão ruim, que me questionei por que me sentia tão chateada.
Provavelmente, a explicação vinha dos meus sentimentos do passado, da
paixonite de adolescente que nutri por ele. Saber disso não aliviou minha
tristeza, apenas aumentou meu medo. Era incomodo eu me importar tanto
se ele iria transar ou não com ela.
— Mãe? O que cê tá fazendo aí?
Isabela me chamou e vi quando Diogo puxou a loira para dentro de
seu apartamento. A diversão ia começar e rezei para que o prazer dos dois
não ultrapasse as paredes da minha casa.
— Nada não. Escutei um barulho e vim ver o que era.
— Deixa eu ver também? — pediu, e rindo, a levantei até o olho
mágico.
Segui com a minha rotina tentando não pensar no que acontecia no
apartamento ao lado. Tomei um banho, fiz o jantar e consegui me entreter
com Isa, com a organização da cozinha depois de comermos, assistimos um
filminho. Tudo correu bem, pelo menos até o final da noite, quando Isabela
dormiu e minha casa ficou imersa no silêncio. Não tive dificuldade para
ouvir os barulhos vindo do hall do elevador, risadas, principalmente.
Precisei de um autocontrole fodido para não espiar os dois
novamente. Eu podia ser idiota, mas não era masoquista. Decidida a
esquecer qualquer que fosse o sentimento que Diogo despertava em mim,
peguei meu Kindle sobre o sofá e fui para o meu quarto.

Isabela não saía dos meus pensamentos desde que levei para o
colégio naquela segunda-feira. Despedi-me da minha filha e senti um aperto
no peito ao deixá-la chorando. Ela não queria ficar, uma reação maior do
que uma simples manha. Minha filha vinha se comportando diferente nos
períodos que antecediam a ida para a escola, ficava pensativa, introspectiva,
sua felicidade contagiante sumia de um jeito que estava sendo impossível
não pensar besteira. Coração de mãe nunca se engana, algo vinha
acontecendo na escola e eu precisava agendar uma reunião com a diretora
urgente para descobrir o que era.
Anotei os dados de monitoramento do paciente em seu prontuário e
estava de saída quando Ana me encontrou. Sua expressão não parecia muito
boa, foi monossilábica quando lhe perguntei algo e pediu para ir com ela até
o banheiro, pois precisava conversar comigo. Concordei e seguimos lado a
lado, em um silêncio incômodo, e bastou fechar a porta para ela despejar o
que a aborrecia sobre mim.
— Por que eu não estou sabendo sobre a sua discussão com o
Adalberto na praça? — indagou, observando com atenção.
— Não quis atrapalhar a sua folga. Você estava tão contente por ir
visitar seus pais e sabia que estressaria quando contasse as palhaçadas
daquele homem
— Credo, Gaby! Eu sou sua amiga, não existe isso. Sabe que pode
me ligar a qualquer momento.
— Desculpa. Foi com a melhor das intenções. Já bastava eu me
fuzilando de ódio.
— Tenho vontade de dar uma surra nesse homem.
— Não dá ideia. — Encarei Ana com uma expressão divertida e
continuei: — Enfim, eu ia perguntar como ficou sabendo, mas tá na cara
que foi Isabela.
— Sim. Segundo a Isa, a mamãe dela discutiu com um velhinho
chato na praça porque ele queria um casamento arranjado com você. Ainda
tive que explicar o que era casamento arranjado.
— Imagino. Ela deve ter passado a ficha toda de como foi nosso
domingo.
— Claro, Isa foi muito bem treinada por mim para repassar o que se
passa na sua casa. E o que não soltou por livre e espontânea vontade, eu
perguntei e ela respondeu.
— Finalmente, você confessou. Eu sempre disse que a culpa da Isa
ter a língua solta era sua.
— Ei, nem vem.
— Contudo, entretanto, todavia… tem uma coisa que ela não contou
porque não sabe.
— Gabriela, deixa de palhaçada e desembucha.
— Eu e o Diogo nos beijamos.
— Caralho! Me conta como aconteceu.
Fazia tempo que não via Ana eufórica daquele jeito. Quando estava
prestes a contar tudo para ela, uma batida na porta do banheiro chamou
nossa atenção, lembrando que estávamos em horário de serviço, e
combinamos de continuar o papo à noite.
Cheguei na recepção e recebi o recado de que Felícia, chefe de
enfermagem, precisava falar comigo. Fui ao seu encontro, alarmada. Ela
nos chamava por dois motivos: chamar atenção ou passar trabalhos que não
nos era devido. E, no meu caso, era a segunda opção.
— A Márcia não veio hoje e preciso que você vá fazer os
atendimentos domiciliares agendados para ela — Felícia avisou,
entregando-me uma pasta. Concordei e segui para organizar tudo o que
precisava levar.
Ficar para lá e para cá a manhã toda não era uma coisa que eu
gostava de fazer, tanto que na época do estágio odiava fazer esse tipo de
serviço, mas trabalho era trabalho, independente dos meus gostos.
Voltei a atenção para os papéis que Felícia entregou e quase tive um
treco ao ver o itinerário das coletas. Além dos pacientes da cidade, eu teria
que visitar um senhor que morava em uma fazenda. A família era rica, o
casarão antigo em que moravam era bonito e bem cuidado, mas as estradas
de terra do município que levavam até lá, estavam uma porcaria.
Demoraria um tempão para atender todos os idosos daquela lista.
Fiz o meu trabalho, o aperto no peito persistiu por um bom tempo,
tanto que não via a hora de sair do trabalho para encontrar com minha
pequena.
Capítulo 11

DIOGO

Olhei para Cora sentada à minha frente, impaciente.


Desde o encontro com Gabriela na semana passada, fiquei com uma
maldita necessidade de saber se ela e a filha estavam bem. Tocou-me ver sua
tristeza ao contar o conflito com o pai, e ter presenciado a cena grotesca
daquele advogadozinho imbecil, colaborou para deixar a mulher em meus
pensamentos.
Gabi enfrentou uma barra para ter a filha. Não entrava na minha
cabeça como um pai poderia tratar uma filha com tanta indiferença e isso
aumentou ainda mais a antipatia que sentia por Mário. Bem verdade que
nunca gostei dele, o achava frio e severo demais, contudo, nunca imaginei
que pudesse rejeitar a filha no momento que mais precisava de apoio.
A quem eu queria enganar? Gabriela não saía do meu pensamento e
nem mesmo o sexo delicioso com Fabiana ajudava a aplacar o tesão que a
baixinha despertara em mim. Seu beijo tinha mexido comigo, fiquei de pau
duro naquela noite e nem mesmo um banho frio foi capaz de aliviar a ereção
monstruosa. Olhei para baixo e vi que meu membro se animara perante as
lembranças. Precisava mudar os rumos dos pensamentos, antes que Cora me
pegasse excitado.
O dia na clínica parecia se arrastar. Uma infinidade de reuniões
ocupava meu tempo, e, para piorar, Cora parecia não querer facilitar a minha
vida. Ela não saiu da minha cola nem me deu um minuto de paz.
Com uma ideia se formando em minha mente, peguei o celular e a
chave do carro sobre a mesa e me levantei.
— Ei! Aonde você pensa que vai? Nós temos trabalho aqui. — A voz
irritada de minha irmã, seguido por seu olhar feroz, deixou bem claro que eu
estava cutucando onça com vara curta, mas não aguentava mais ficar ali
dentro.
— Não interessa, Cora. Estou praticamente o dia todo te ouvindo
ladrar ordens. Não aguento mais, preciso de descanso — disse, encarando-a
impaciente.
Cora era uma mulher linda, na mesma proporção que era uma
megera. A sorte da minha irmã mais velha era que eu a amava e entendia seu
“modus operandi”. Solteira aos quarenta e três anos, não tinha vida social, e,
sem preocupações para lidar em casa, seu mundo girava em torno da Pró
Vita. Tudo bem que eu também não construí minha própria família, mas eu
vivia uma vida fora dos portões da clínica e me incomodava demais sua
mania de querer que fosse como ela.
— É mesmo, querido? Esqueceu que daqui meia hora temos uma
reunião com o pessoal da VP Med? — bradou, irada.
— Não esqueci. Como também não esqueci que você sempre lidou
com eles sozinha. — Ela me encarou, erguendo as sobrancelhas, sem esperar
por aquela resposta. Nos últimos dias eu tinha feito a lição de casa.
Investiguei e descobri que nem tudo que ela designava a mim, era da minha
responsabilidade. — Vou conversar com o papai. Olha, sei que esperam
muito de mim, mas minha paixão é a medicina e, se não arrumarem alguém
para dividir comigo o fardo dessa parte burocrática chata, não vai rolar
substituir o papai.
Não dei tempo para que respondesse e saí de lá. Nada me faria
desistir da ideia de resolver minha situação de uma vez e só tinha uma
pessoa que poderia me ajudar: meu pai.
Pelo menos foi isso que eu pensei que faria, até passar pela recepção
principal da clínica e ouvir a conversa da secretária com alguém no telefone.
— Calma, Catarina, infelizmente não tem ninguém para buscar a
Isabela. Como eu já falei, estou há uma hora tentando entrar em contato com
a Gabriela e não consegui contato ainda. Fique tranquila, os atendimentos
em domicílio não duram mais do que uma hora. Ela deve estar voltando. —
Maria parecia impaciente, batendo as unhas ultra compridas no balcão.
— Espera, Maria! O que aconteceu com a filha da Gabriela? —
interrompi, fazendo-a notar minha presença.
— Só um minuto, Catarina — disse ela para a mulher do outro lado
da linha, e depois de tapar o fone, voltou a atenção para mim. — Parece que
a menina brigou na escola e se machucou. Querem que a Gabriela vá buscá-
la, mas já informei que…
— Diga que um amigo vai buscá-la. Qual o nome da escola?
— É uma escolinha particular aqui na rua de trás. Eles não vão deixar
o senhor tirar a menina da escola. Existem regras.
— Pois então, avise que estou indo verificar o que está acontecendo e
fico com Isa até Gabriela chegar. — Virei-me de costas, e praticamente corri
até o estacionamento.
De cabeça quente, dirigi um pouco acima da velocidade permitida,
pensando nas mil possibilidades que fizeram Isa brigar na escola. Apesar de
espevitada, ela parecia ser uma criança tranquila, educada, não dava para
acreditar que perdera o controle assim.
Estacionei o carro defronte ao portão aberto e entrei no prédio de
pintura gasta, mobiliário antigo, ainda vestindo o jaleco branco. De cara, o
ambiente não me agradou. Parecia péssimo, sem uma estrutura física
adequada para receber crianças e torci para que pelo menos o ensino fosse de
boa qualidade.
Uma funcionária parecia me esperar, pois me recebeu com um
sorriso no rosto e uma cordialidade exagerada.
— Doutor, seja bem-vindo! A dona Fátima está te esperando na sala
da direção — A mulher me encarou, exultante.
No início não entendi a animação, mas bastou trocarmos algumas
palavras para compreender o motivo: dinheiro. Era normal eu e a minha
família recebermos esse tipo de abordagem. Papai sempre fez questão de
contribuir financeiramente com as obras assistenciais da cidade, e, mesmo
aquela escola sendo privada, nada a impedia de receber o apoio financeiro de
terceiros.
— Onde está a Isa? — questionei, olhando para os lados à procura da
menina.
— Então, ela se trancou no banheiro e estamos há meia hora tentando
tirá-la de lá. Vou te levar até a dona Fátima, nossa diretora, e ela irá lhe
explicar melhor.
— Eu prefiro ver a Isabela primeiro. Depois de me certificar que ela
está bem, podemos conversar — respondi, impaciente.
Meio a contragosto, a senhora me indicou um corredor longo, cheio
de portas, e parou em frente a uma abertura vermelha com o desenho de um
vestidinho multicolorido de menina.
— Isabela, querida, abre a porta para a titia — a mulher disse
melindrosa, tentando camuflar o tom de voz irritado.
O que se seguiu foi um silêncio absoluto. Se Isabela estivesse ali,
estava ignorando a mulher com maestria e, pelo modo como a senhora
apertava a barra do casaco com força, a criança devia estar agindo assim há
muito tempo.
Preocupado, resolvi agir. Aproximei-me da porta e chamei a criança
com uma voz carinhosa:
— Isa, lindinha, sou eu, o tio Diogo. Abre a porta pra mim.
O silêncio durou por mais alguns segundos. Logo uma vozinha
resmungou do outro lado da porta, aliviando um pouco o peso do meu
coração.
— Tio Di, é o senhor mesmo? Tem certeza, certezinha? — A voz
chorosa cortou meu coração e senti o aperto no peito intensificar novamente.
— Sou eu sim, meu amor, abre a porta para o tio.
— Tá, eu abro, mas só você pode entrar.
— Isabela, para de manha e sai daí! — A mulher elevou a voz,
batendo na madeira vermelha com uma força descabida.
Fiquei possesso pelo modo grosseiro como a mulher tratava a
criança, que parecia assustada, e intervi mais uma vez, ríspido.
— A senhora parece não ter muita habilidade com crianças. Acho
melhor a senhora me deixar sozinho com Isabela que a tiro daí de dentro.
Ela pareceu não gostar do meu pedido e saiu resmungando, dizendo
que avisaria a diretora do que estava acontecendo. Eu ignorei a sua má
vontade e voltei a falar com Isa.
— Lindinha, estamos a sós, abre a porta. Por favor.
Ouvi o barulho da fechadura sendo destrancada e a pequena apareceu
sentada ao lado da porta, o rostinho banhado de lágrimas e com um corte
pequeno na testa, por onde vazava um pouquinho de sangue.
— Ei, o que aconteceu, querida? — perguntei, entrando no cômodo e
me sentando ao seu lado.
A menina ficou em silêncio, apenas aconchegou a cabeça no meu
braço. Toquei seu queixo, erguendo seu rosto com cuidado, desesperado para
que conversasse comigo. O que não aconteceu, claro. Ela fungou e balançou
a cabeça em negativa.
— Isa, tem certeza que não quer conversar comigo? Eu sou seu
amigo, lembra? Pode me contar o que quiser.
Infelizmente, antes que Isabela tivesse a chance de me dizer qualquer
coisa, a senhora que me recebeu há pouco voltou, acompanhada de outra
mulher, e fui obrigado a deixar esperar.
— Olá, doutor, meu nome é Fátima e sou a diretora do colégio.
Gostaria de conversar com o senhor. Poderia me acompanhar, por favor? —
disse com uma voz serena e segura demais para o meu gosto.
Preparei-me para me levantar e fui surpreendido pelas mãozinhas
minúsculas de Isa, que seguraram a barra da minha calça parecendo suplicar
para que não a deixasse sozinha. Sua reação me intrigou. Teria que contar o
que vi a Gabriela, ela com certeza arrancaria alguma coisa da filha.
— Vem comigo, Isa. — Estendi minha mão para ajudá-la a se
levantar, contudo, a pequena se encolheu de dor ao apoiar o pé direito no
chão.
— Aí, tá doendo muito — choramingou, sentando-se novamente.
— Calma, lindinha, conta direito onde dói — pedi, subindo a barra
de sua calça, e tirei o tênis para inspecionar o tornozelo inchado.
— Meu pé — resmungou, tentando ficar de pé novamente. — Aí…
não consigo mexer.
— Eu queria entender o porquê de não a terem levado para a
emergência, se está visivelmente machucada — vociferei e encarei a
diretora, irado.
— Como faríamos isso, se Isabela se trancou dentro do banheiro?
Estávamos há meia hora tentando tirá-la daí.
Meia hora?
Processei aquela informação, que revelava que algo estava errado.
Pela ligação que ouvi da recepcionista da clínica, eles tentavam contato com
Gabriela há uma hora. Portanto, tiveram tempo de sobra para socorrê-la. Eu
não ia deixar essa história barato.
— Bom, se tivessem a socorrido imediatamente, ela nem teria a
oportunidade de fazer isso. Não vou perder tempo discutindo com vocês,
Isabela precisa de atendimento médico e só isso importa no momento.
Ignorei as mulheres à minha volta e direcionei minha atenção à
pequena. Com cuidado, tentei pegar Isa no colo, mas seu rostinho se
contorceu em uma careta de dor.
— Tio, tá doendo muitão. Eu quero a minha mãe. — Seu rosto estava
vermelho e os olhos cheios de lágrimas.
— Calma, lindinha. — Acariciei seu rosto com carinho, tentando
acalmá-la. — A mamãe está atendendo um paciente fora da clínica e ainda
não consegui falar com ela. Vou te levar para a clínica em que trabalhamos e
lá encontraremos com ela. Está bem?
Ela balançou a cabecinha e sem querer perder mais tempo, peguei-a
em meus braços e saí caminhando até a porta.
— Ei! O senhor não pode levá-la sem autorização da mãe —
reclamou a diretora, segurando meu braço.
— A senhora sabe quem eu sou e que não ofereço perigo a Isabela.
Vou apenas socorrer a menina, coisa que vocês deveriam ter feito. Tem
certeza que quer arrumar confusão comigo? — perguntei furioso, e segui até
meu carro.
Depois de acomodá-la delicadamente no banco de trás, afivelei o
cinto de segurança e tomei meu lugar no assento do motorista.
— Vai ficar tudo bem, Isa. Já já essa dor vai passar — garanti, firme,
e liguei o veículo.
Enquanto dirigia, encarei a garotinha pelo retrovisor, incomodado
com seu silêncio. Seu uniforme estava sujo de sangue, provavelmente do
corte na testa, o rabo de cavalo quase desfeito, deixando que o cabelo caísse
por sobre o ferimento.
Por sorte, a clínica ficava próxima ao colégio e não demoramos a
chegar. Estacionei o carro na minha vaga e assim que desliguei o motor meu
telefone tocou.
— O que aconteceu com a minha filha, Diogo? — perguntou
Gabriela, ofegante.
— Não sei o que aconteceu direito, só que ela brigou na escola e
machucou o pé. Achei melhor trazê-la para a clínica, quero eu mesmo
examiná-la para ver se quebrou ou se foi uma torção.
— Ai, meu Deus! — Gabriela soluçou, seu desespero era nítido, por
isso achei melhor tranquilizá-la.
— Gaby, fica calma. A Isa está bem, não é nada grave, eu tenho
certeza. Já cheguei, estou no estacionamento, me espere na ortopedia que
vou levá-la direto para lá.
— Obrigada, Diogo. — agradeceu, ainda chorando, e desligou.
— Vamos lá cuidar desse dodói, lindinha.
Capítulo 12

GABRIELA

Eu não sentia tanto medo desde que descobri a gravidez de Isa e fui
expulsa de casa. Mesmo Diogo garantindo que minha filha estava bem, só
conseguiria respirar aliviada quando a visse e confirmasse com meus
próprios olhos que nada de grave havia acontecido.
Diogo entrou na sala com minha filha cinco minutos depois de nos
falarmos por telefone. Ele a carregava em seus braços de forma protetora, e,
antes que eu pudesse fazer qualquer pergunta, ele a colocou sobre a maca e
passou a examiná-la com cuidado.
Fui até eles, respirando fundo para ver se me acalmava, afinal,
Isabela estava em boas mãos. Diogo havia se especializado em Ortopedia e
era um profissional respeitado em São Paulo. Daria conta tranquilamente de
cuidar do tornozelo de Isa.
Os questionamentos ainda ferviam na minha mente, queria entender
porque ela brigara, mas achei melhor deixá-los para mais tarde, para depois
que minha pequena fosse atendida e não sentisse mais dores.
— Tá doendo muito, mãe — choramingou, conversando comigo
pela primeira vez desde que chegou.
Beijei sua bochecha, seu olhar grudou no meu, triste, lacrimejante.
Queria poder transferir toda a sua dor para mim, porém, como aquilo seria
impossível, fiz a única coisa que me cabia, fiquei ao seu lado, acalentando-a
e rezando para que o osso não tivesse fraturado.
— Já vai melhorar, viu, meu amorzinho? O tio Diogo é um
excelente médico e vai fazer seu pé sarar rapidinho. — Ela concordou e
fechou os olhinhos.
Enquanto Diogo aplicava uma injeção para tirar a dor, ele me lançou
um sorriso de canto pôr o ter elogiado, e voltou a cuidar de Isa. Notei que
ainda vestia o jaleco branco, que fazia questão de usar mesmo trabalhando
na parte administrativa, e, tanto ele quanto a camisa que usava por baixo,
que devia ter custado os olhos da cara, estavam sujos do sangue que saíra da
testa da minha filha. E Diogo parecia nem se importar que a estranha em
sua frente destruira a roupa caríssima.
Diogo foi rápido, solicitou que o centro de diagnóstico por imagem
da clínica fizesse uma radiografia do tornozelo e cuidou da minha filha com
toda a atenção do mundo.
— Pronto, lindinha, sua bota nova está pronta — Diogo avisou em
um tom divertido, e não adiantou, Isa continuou emburrada.
— Gostei, não, tio, esse negócio é pesado — disse a garota e o
olhou de cara feia.
Diogo riu, beijou seus cabelos bagunçados e, ignorando o mau
humor da criança, se virou para mim.
— Bom, Gaby, como imaginei, foi só uma torção. A Isa precisará
ficar com o gesso por duas semanas, para não correr o risco de agravar a
lesão, já que a lindinha é espevitada.
— É melhor mesmo pecar pelo excesso do que pela falta. Conheço
minha filha, seria impossível mantê-la de repouso por tanto tempo.
— Vocês dois são muito malvados. Não quero ficar com isso. — Ela
continuou reclamando, a beira das lágrimas de novo. Dessa vez por pura
manha.
— Para de ser reclamona, filha. Deveria estar feliz por usar apenas o
gesso por duas semanas.
— Veja pelo lado positivo, Isa. Você não poderá ir para a escola por
alguns dias — Diogo anunciou, astuto, e se sentou ao seu lado.
— Sério? — questionou a criança, ficando animada de repente. —
Vou poder mesmo, mãe?
— Será por poucos dias, não se anime. Logo terá que voltar.
— Gaby, eu quero conversar uma coisa bastante séria com você
sobre esse colégio. — O médico parecia preocupado, como se fosse dizer
algo importante, contudo, balançou a cabeça e mudou de ideia. — Bom, a
paciente mais ilustre dessa clínica está de alta e pode ir para a casa.
— Ebaaa. Você me leva no colo? — Isa gritou e jogou os braços
para Diogo.
— Filha, o Diogo é muito ocupado. A mamãe te leva.
— Eu posso levá-la, se quiser. Encerrei meu expediente mais cedo e
não tenho nenhum compromisso.
— Tá bem, então — concordei, dando de ombros. — A propósito,
preciso agradecer pelo que fez pela Isa hoje. Obrigada.
— Não precisa agradecer. Eu fiz o que qualquer pessoa de caráter
faria. — Ele sorriu de leve e pegou Isa no colo.
Mas o que Diogo disse não era verdade. Quer dizer, nem tudo o que
fez pela minha filha, outra pessoa faria. Não era qualquer um que
abandonaria o trabalho e correria ao socorro de uma criança que não fosse
de sua família. A atitude de Diogo mexeu muito comigo e cada vez mais
esse homem subia no meu conceito e derrubava as barreiras que construí ao
longo dos anos.
Não deu tempo nem de chegar no carro e Isa dormiu no colo do
Diogo. Observei-o caminhar até um Sedan parado na antiga vaga do
Nelson, tendo a estranha sensação que já o tinha visto em algum lugar, e
arregalei os olhos quando a compreensão me atingiu. Aquele era o carro
importado que eu e Clarice admiramos dias atrás e que comparamos os
motoristas do mundo literário com os da realidade.
Acabei sorrindo com a besteira que passou pela minha cabeça.
Diogo era a personificação dos mocinhos dos livros de romance.
Bonito, gostoso, educado, gentil, rico, não podia esquecer isso. Só não
consegui confirmar se a pegada dele era boa como a dos protagonistas dos
meus livros hots.
Sacudi a cabeça e andei prestando atenção no jeito protetor como
carregava minha filha aconchegada em seu peito, a mão livre fazendo
carinho em suas costas. O homem parecia ter saído de um conto de fadas.
Todo bonito, atencioso comigo, carinhoso com Isa e parecia gostar de
verdade da minha filha. A garota foi colocada no banco detrás do carro e
depois Diogo abriu a porta do passageiro para mim.
Viu! Um verdadeiro príncipe, educado e gostoso.
Droga!
Será que se eu o beijasse de novo ele se transformaria em um sapo?
Merda, estava morrendo de vontade de pagar para ver.
Deixei escapar uma risadinha, imaginando a cena de Diogo virando
um sapo, e precisei disfarçar para não chamar a atenção do homem ao
volante.
— Ainda bem que a Isa dormiu — disse Diogo, sem tirar os olhos
da rua. — Acho que nesses anos todos de profissão, nunca fiquei tão
inseguro ao atender um paciente.
— Deixa de besteira, você foi maravilhoso, atencioso, mesmo a
pestinha não parando de resmungar. Obrigada.
— Não precisa agradecer, Isabela é incrível, Gaby. Eu tenho um
carinho enorme por ela — respondeu, carinhoso, e me olhou quando
paramos no sinal.
— Você tem jeito com crianças, é atencioso com minha filha, nunca
teve vontade de ser pai? — Arrependi-me da pergunta assim que ela saiu da
minha boca e, envergonhada, continuei: — Desculpa, fui enxerida igual a
Isa. Faz de conta que não ouviu a minha pergunta.
— Ei, calma — Sorri, colocando o automóvel em movimento. —
Não ligo de responder. Sabia que me questionam muito sobre isso?
— Agradeço por tentar me fazer sentir menos fuxiqueira, pena que
essa informação não ajudou em nada. — Fiz uma careta e Diogo balançou a
cabeça, rindo.
— A verdade é que eu sempre quis ser reconhecido na minha
profissão, não por ser filho do grande Nelson Lima Libardi, e sim por
merecimento, por ser um profissional tão bom quanto o meu pai é. Foi por
isso que fui embora daqui, queria crescer por minhas próprias pernas e não
ser acusado no futuro de nepotismo. Só que para conseguir alcançar esse
grau de excelência, eu precisei ralar muito, estudar, trabalhar dia e noite
dentro de hospitais. No final não me sobrou muito tempo para criar laços
com uma mulher, pelo menos não ao ponto de começar uma família.
— Bom, não teve filhos, mas deve treinar muito, não é? Lembro
bem da barulheira atrás da minha parede. Aquilo foi coisa de profissional
— provoquei, uma coragem repentina surgindo sei lá de onde, e senti meu
rosto esquentar.
Diogo apenas levantou uma sobrancelha e ficou calado. Observei a
expressão do seu rosto, achei que soltaria alguma gracinha, e, embora não
tenha encontrado nenhum sinal de que não gostou da minha brincadeira, ele
ficou em silêncio e entrou na garagem do nosso prédio.
A quietude durou até Diogo estacionar o carro na sua vaga. Ele
olhou para o banco detrás, conferiu se Isa ainda dormia, e avançou sobre
mim como um trem desgovernado.
— Gabriela, você é muito gostosa e estava tentando me controlar
para não parecer um tarado, mas a senhorita não tá facilitando a minha vida.
A respiração ofegante de Diogo tocou suavemente os meus lábios,
provando que ele estava tão mexido quanto eu. Meu coração bateu no peito
como uma escola de samba, a boca ficou seca, as mãos trêmulas e perdi
completamente a cabeça.
Ele inclinou a cabeça e tocou o meu pescoço com a ponta do nariz,
absorvendo o cheiro da minha pele. O toque ativou alguma coisa dentro de
mim, um calor insano que pareceu me transformar em outra mulher.
Caramba. Fui dominada por algo que nunca experimentei, como se
precisasse senti-lo nem que fosse por uma só vez.
— Talvez eu não queira que se controle, doutor.
Seus olhos arderam pelo tesão acumulado e gemi baixinho quando
encaixou a mão na minha nuca, segurando firme na base do cabelo.
Contornou meus lábios com o polegar, deixando-me ainda mais em brasa
pela iminência do beijo explosivo que viria.
O juntar de nossas bocas foi quente, desesperado, como se ambos
precisassem daquilo. Nada do que vivi podia ser comparado ao que Diogo
me fazia sentir. Como se seu gosto fosse uma droga capaz de tirar toda a
minha lucidez e um simples beijo não fosse o suficiente para aplacar toda a
paixão que existia dentro de mim. Teria que tê-lo por inteiro para me sentir
saciada.
Diogo chupou minha língua, mordiscou e sugou os lábios. Quando a
boca pareceu não ser mais o suficiente, ele desceu trilhando pequenos
beijos pelo meu colo, ao mesmo tempo que as mãos se fecharam em meus
seios, atiçando os mamilos sob o tecido fino da minha camisa. Meus lábios
inchados se entreabriram, emitindo sons que pareceu causar um efeito
imediato no seu pau.
— Me toca, veja como seu beijo me deixou — pediu, sem desgrudar
os lábios da minha pele.
— Delícia de homem gostoso — murmurei, a mão planando sobre o
volume imenso da sua calça.
— Diz pra mim que hoje podemos ir além. Não tenho mais idade
pra provocação, Gaby, e o beijo do outro dia já foi tentação suficiente. A
barulheira que ouviu no meu apartamento será fichinha perto de toda a
putaria que quero fazer com você — gemeu, esfregando os lábios em meu
ouvido.
Como tudo que é bom dura pouco, fomos tirados da nossa bolha de
desejo pelo barulho do portão eletrônico sendo aberto e, assustados, nos
separamos.
— Droga, você me fez perder o juízo. A Isa está no banco detrás —
disse, desconcertada, e fechei o botão da blusa correndo. O pior era que
nem o tinha visto desabotoá-la.
— Eu que te fiz perder o juízo? Você me fez agir como um
adolescente cheio de hormônios. — Riu, arrumando o membro duro dentro
da calça. — Fica tranquila que a injeção que ela tomou a fará dormir feito
uma pedra.
— Sim, dessa vez ela está dormindo de verdade, mas não conte com
isso sempre. Essa pestinha vive fingindo que dorme para ouvir minhas
conversas com Ana.
— Humm, gostei da sua frase. Isso quer dizer que teremos outras
oportunidades?
Sua mão direita foi de encontro à minha coxa e me arrepiei
novamente ao sentir o toque frio da sua pele sobre a minha.
— É melhor entrarmos. Ainda preciso descobrir como vou dar
banho nessa menina com o pé engessado — desconversei, abrindo a porta
do carro.
Capítulo 13

GABRIELA

Que maravilha! Atraquei-me com Diogo dentro do carro, enquanto


minha filha dormia no banco detrás e quase fui pega no flagra pelo Alê, que
entrou na garagem do prédio logo depois que desci do Sedan luxuoso.
Tinha tanta informação errada nessa frase que eu não conseguia
pensar em nada além disso.
— Ei, Gaby, você tá me ouvindo?
— Oi? Ouvi sim, filha — menti, descaradamente.
O engraçado era que mesmo impactada pela loucura cometida,
permanecia embriagada pelo gosto de Diogo na minha boca. Era como se
ele ainda estivesse sentado ao meu lado, eu com a mão no seu pau, a sua
sobre meus seios, amaldiçoando as roupas que nos atrapalhavam.
— Tem certeza? — Alê me deu um tapinha na cabeça, indignado. —
Não é a Isa que está conversando com você, sua desnaturada. A bichinha
dormiu faz tempo. Poxa, tô aqui contando da minha viagem bafônica e fui
ignorado com sucesso.
— Desculpa, primo, tô com a cabeça cheia por causa do que
aconteceu com a minha filha — menti outra vez. Não sei se conseguiria
botar para fora o que sentia.
— Sabe que não me engana, né? — O filho da mãe protestou, me
encarando desconfiado através dos seus óculos de grau. — Aconteceu
alguma coisa entre você e o bonitão do nosso vizinho. Tenho quase certeza.
Respirei fundo, tentando organizar meus pensamentos enquanto
tomava coragem para contar a história a ele. Pelo amor de Deus, Alê era
meu primo, meu amigo, uma das poucas pessoas que eu confiava.
— Eu... — Titubeei, como se confessar que beijar um homem fosse
um pecado mortal. Fiz uma pausa, sentindo o rosto esquentar ao lembrar da
cena no carro e soltei a informação de uma vez só, antes que perdesse a
coragem — Eu beijei o Diogo. Duas vezes.
— Eu sabia — comemorou, baixinho, pois Isa dormia entre nós. —
Quero saber tudo. Foi bom? Levantou o pezinho como nos filmes de
romance que vive assistindo?
— Para de palhaçada, seu bobo. — O atingi com um peteleco na
cabeça e continuei: — Foi o beijo mais quente e erótico que provei.
— Está se apaixonando por ele de novo?
— Não — respondi, rápido, e como Alê me conhecia, desconfiou.
— Seja sincera.
— Não tenho certeza do que sinto. Tá tudo bagunçado dentro da
minha cabeça, mas sinto bastante atração por ele. Quando me atacou no
carro…
— Ahhhh… deixa de ser chata e conta mais. Quero saber os
detalhes sórdidos.
— Nem a pau! — Fui categórica e peguei o celular que apitava no
bolso.
Diogo: Como a lindinha está? Ela dormiu? — A mensagem
inesperada surgiu em meu celular e encarei a tela com um sorriso bobo.
Nós tínhamos trocado de número antes dele se despedir e ir para seu
apartamento. Não que eu pensasse em ligar, não era tão cara de pau assim, o
homem me fez prometer que ligaria caso houvesse uma emergência.
Gabriela: Está bem, sim. Reclamou um pouco do gesso, mas
dormiu assistindo um desenho da Disney.
— Preciso me preocupar por você estar sorrindo para o celular? —
disse Alê, rindo, e, como fiquei calada, continuou: — É o nosso vizinho
gostosão?
— Sim. Ele quer saber se a Isa está bem.
— Você não gostava nem de ouvir o nome do Diogo e sempre o
pintou como um ser desprezível. Pelo jeito, ele ajudar a nossa menina a fez
mudar de ideia.
— É mais complicado que isso e você sabe muito bem. A minha
desilusão amorosa me fez julgá-lo sem nem o conhecer direito.
Diogo: E você, como está?
A pergunta me pegou desprevenida. Ter sua atenção direcionada a
Isa era uma coisa mais fácil de lidar, porém, tê-lo interessado nos meus
sentimentos causava um rebuliço no meu coração idiota.
Gaby: Estou tensa, como se fosse acontecer algo ruim a qualquer
momento e precisasse ficar em alerta. Preciso dormir e encerrar esse dia de
uma vez.
Diogo: Entendo. Se eu estivesse aí, faria uma massagem relaxante
que você esqueceria até seu próprio nome.
— Isso já é golpe baixo. — Virei a tela do aparelho para Alê ler a
mensagem e, como eu, suspirou. — Como que resiste a esse homem?
— Resistir pra quê? Vai, responde! — incentivou, animando-se de
imediato, e sentou mais perto para que pudesse observar nossa troca de
mensagens.
Gaby: Você é daqueles que gosta de fazer promessas ou sabe
cumpri-las também? Se não estou enganada, é a segunda que me faz hoje.
Diogo: Modéstia à parte, sou melhor ainda na hora de cumpri-las.
Sabe, sei fazer de um jeito que te deixará gritando, pedindo por mais. Bem,
isso você sabe, afinal, teve uma amostra grátis através da parede do seu
quarto. Se quiser conferir pessoalmente, é só vir aqui para o meu
apartamento.
Gaby: Queria ser esse tipo de garota, que se entrega fácil, sem
ressalvas. Infelizmente, não sou.
Engoli em seco, lembrando da barulheira da trepada em seu
apartamento e me peguei sonhando acordada. Será que se fosse eu do outro
lado da parede, seria tão escandalosa como aquela mulher? Desliguei-me
tanto do mundo real, que me assustei com a vibração do celular, anunciando
outra mensagem.
Diogo: O que me encanta em você, é realmente o fato de ser
diferente.
Gaby: O que está fazendo? — perguntei, mudando de assunto.
Mas como resposta, ao invés de receber uma mensagem de texto,
encontrei uma foto dele deitado de frente para a TV da sala, segurando uma
cerveja long neck sobre a cintura que ostentava uma ereção deliciosa sob a
cueca boxer branca.
— O cara é esperto! Até eu que tenho o meu homem e sou
apaixonado por ele, fiquei tentado.
— O que eu faço? — perguntei, confusa.
— Deixar de ser boba e ir viver? — respondeu, com outra pergunta,
e fiz uma careta — Ah, não me olha de cara feia. Você vive como se fosse
uma senhorinha de 90 anos. Se joga no gostosão, mulher.
Alê estava certo. Que mal teria me divertir um pouquinho?
Mordi o lábio inferior, decidida a entrar na brincadeira.
Gaby: Você joga baixo.
Diogo: Nunca disse que não jogaria. Sou bastante persistente
quando quero uma coisa. E eu quero muito experimentar você.
— Ai, senhor, não acredito que farei isso — sussurrei, e tirei uma
foto do meu colo. Eu usava uma camisola preta, com decote um pouco
transparente. Não demorou para que sua resposta chegasse em uma outra
foto. Só que dessa vez, com um aviso de que não era uma foto inocente.
— Eita, que a coisa tá esquentando — Alê comentou, animado.
Espiei meu primo e ele me observava rindo feito uma hiena, as
bochechas vermelhas. E eu? Estava eufórica para abrir aquela imagem.
— Hum… Eu vou para o quarto — decidi, num rompante e me
levantei.
— Sério que não vai me deixar ver? — perguntou, fingindo
indignação. — Brincadeira, sua boba, vai lá se divertir. Eu coloco a Isa na
cama.
Segui para meu quarto e abri a imagem que ele mandou.
A foto que encontrei não foi bem a que imaginei. Era sim um nude,
mas apenas parcial. Seu pau estava ereto e muito duro, porém, a cueca não
me deixava ter uma visão completa. A única parte totalmente exposta era a
cabeça robusta do seu membro e fiquei com água na boca ao perceber que
uma gota da sua lubrificação escapava daquela delícia.
Gaby: Isso não vale! — retruquei, desesperada para ver mais.
No mesmo instante meu celular começou a tocar e tremi na base ao
ver que Diogo fazia uma chamada de vídeo. Tranquei a porta do quarto e
deslizei o dedo trêmulo na tela para atender.
— Você joga sujo — acusei, deitando-me na minha cama.
— Impossível, meu pau está limpinho. Veja! — Diogo inclinou o
celular, mirando dessa vez no seu membro totalmente exposto. Para dar o
golpe final, ele o agarrou pela base e o movimentou para cima e para baixo,
duas vezes.
Meu pai amado!
Fiquei sem fala. Eu não via um homem nu há tempos, muito menos
um em que eu tivesse sonhado sentar na minha adolescência. Ah, como eu
queria fazer um sexo bem quente e sujo com Diogo. Com certeza esse pau
delicioso me levaria ao céu, ida e volta, muitas vezes.
— Está sozinha? — Não consegui responder e apenas acenei em
concordância. — Queria estar aí com você, fazê-la gozar e depois te
lambuzar com a minha porra.
— Você é realmente bom nisso, Diogo. Sabe como deixar uma
mulher desesperada, quase implorando para tê-lo — confessei, sem
vergonha alguma de dizer que estava caidinha na dele.
— Não precisa implorar é só vir para o meu apartamento. Estou te
esperando de pau duro.
— Não dá, a Isa está agitada. Pode me procurar a qualquer
momento.
— E se tentarmos algo diferente? — questionou, aproximando o
rosto da tela. — Já fez sexo por telefone?
— Não fiz direito nem presencial, quanto mais online. — Essa
informação sim, julguei desnecessária, mas já tinha dito. Foda-se.
— Vou adorar que essa primeira vez seja comigo — disse, sério, a
respiração mais rápida que o normal. — Tira a camisola, preciso te ver nua.
Eu o obedeci e me ajoelhei na cama para puxar o tecido delicado
pela cabeça. Logo eu estava sentada na cama novamente, com as costas
apoiadas nos travesseiros e nervosa por expor meu corpo a ele.
— Relaxa, Gaby, você é linda, gostosa e meu pau tá aqui, duro,
doidinho pra te comer.
Abaixei a câmera do celular e filmei meu corpo, passando pelo seio,
a barriga e parei sobre a calcinha de renda minúscula. Ouvi seus protestos
do outro lado da tela por eu não ter tirado aquela peça, e voltei a focar meu
rosto e provoquei.
— Acha que sou tão despudorada assim? Tem coisas que só ao vivo,
querido.
— Se toque, me mostre como você se dá prazer.
— Tem certeza que quer isso? Posso ser inexperiente, mas sou
muito boa em me dar prazer.
— Caralho, vou adorar assistir.
Desta vez, não permiti que a vergonha me dominasse. Peguei o
vibrador guardado na mesinha de cabeceira, em uma gaveta que ficava
sempre trancada, e mostrei para Diogo. Ele tinha sido um presente do meu
primo, que insistia que eu precisava gozar nem que fosse com um pau de
borracha.
— Puta que pariu. Me fodi.
— Com certeza. — Ri, enfiando-o na minha boca para lubrificá-lo
com minha saliva.
Diogo focou toda a sua atenção para a tela do celular, sem piscar,
vidrado no que eu fazia. Foi difícil filmar e penetrar o vibrador cor de rosa
dentro de mim. Acionei o botãozinho que ficava na base e o deslizei por
entre as minhas dobras, levando-o até o fundo do meu canal, e um gemido
escapou ao movimentá-lo pela primeira vez.
Eu ardia por aquele homem e não foi difícil me deixar levar. A mão
que segurava o aparelho amoleceu nos primeiros instantes, assim que a
excitação começou a tomar conta do meu corpo.
— Porra, Gaby, me deixa ver sua bocetinha gulosa. Só um
pouquinho.
Sorri, em êxtase por saber que deixava aquele homem lindo e
gostoso louco de tesão e, inebriada de prazer, não resisti, deixei que
assistisse por alguns segundos o entra e sai do objeto cor de rosa em minha
abertura molhada.
O modelo daquele vibrador era potente, possuía dupla estimulação,
o que significava que quando eu o parava dentro de mim, tanto o meu canal
quanto o meu clitóris recebiam uma massagem potente, levando-me a uma
excitação sexual maravilhosa. A descarga de tensão veio forte, fechei os
olhos e aumentei a velocidade dos movimentos, estocando-o
alucinadamente.
— Eu vou gozar — gemi, perdida em meio ao prazer.
— Levanta a tela, quero ver seu rosto enquanto goza.
Obedeci mais uma vez e nos olhamos intensamente, sendo tomada
por um tesão violento. O orgasmo mais foda da minha vida me atingiu e se
espalhou pelo meu ventre. Choraminguei, apertando o celular com força
para que não caísse e mantive os olhos em Diogo, até que ele saiu do transe
e tomou as rédeas da situação.
— Olha pra mim, veja o que fez comigo. — A imagem do seu pau
rígido e ereto tomou a tela do celular. Ele o segurou e movimentou para
cima e para baixo, gemendo, descontrolando e falando diversas putarias. —
Ah, sua safada, você me deixou maluco hoje. Vou esporrar muito na minha
mão, como se estivesse gozando dentro dessa sua boceta deliciosa. Não
quero nem ver quando te pegar de verdade. Gostosa do caralho.
Ouvi-lo gozar foi a cena mais excitante que já tive o prazer de
presenciar. Não resisti e voltei a movimentar o vibrador que ainda estava
ligado dentro de mim. Nem precisou de muito, meu corpo e minha boceta
estavam sensíveis e entraram em combustão rapidamente.
— Ah, que delícia — gemi, alcançando mais um orgasmo.
Capítulo 14

DIOGO

Meu cérebro demorou a desligar naquela noite.


Mesmo tendo me aliviado na minha mão, não foi a mesma coisa. A
diaba não saía da minha mente. Eu queria ter provado o corpo gostoso de
Gaby, gozado junto com ela e depois lambuzar aquela safada inteirinha com
a minha porra.
Passava das duas horas da manhã quando, enfim, meu corpo
entendeu que aquele gozo seria o único que teria, e, tomado pela exaustão,
dormi. O problema foi que as poucas horas de sono não foram suficientes
para recarregar as energias e cheguei à clínica na manhã seguinte parecendo
um zumbi.
Entrei em minha sala e meu pai me aguardava ali, sentado de costas
para a porta, analisando alguns papéis. Ele parecia concentrado, tanto que
nem me viu chegar.
— Caiu da cama, papai? — disse, acomodando-me em sua frente.
— Bom dia, filho. É como aquela velha frase de Mark Twain. “A
gente não se liberta de um hábito atirando-o pela janela: É preciso fazê-lo
descer a escada, degrau por degrau.” — Ele fechou a pasta com os
documentos que examinava, descartou os óculos sobre ela e se recostou na
cadeira de couro.
— Gostei da resposta, mas aposto que a mamãe não sabe que o
senhor está aqui — provoquei, em tom de brincadeira, realmente
preocupado por vê-lo ali.
Detestava fazer marcação cerrada, papai era médico, sabia o risco
que corria por não seguir as ordens médicas de se manter afastado do
trabalho. Sem contar que não dava para simplesmente ignorar o fato de que
ele passara a vida toda trabalhando na Pró Vita e amava demais o que fazia.
Só me restava ficar atento e cuidar para que ficasse bem.
— Não mesmo. Fugi durante sua aula de yoga. Espero que não me
entregue. — Ele sorriu. Apesar de chateado, papai se divertia com as
escapadelas que dava da minha mãe.
— Isso não será necessário. Mamãe mesma virá atrás do senhor
assim que vir que saiu — respondi, perdendo um pouco o ar de
divertimento e continuei: — Foi bom que veio. Preciso muito conversar
com o senhor.
— Pois, então, diga de uma vez. Logo Cora entrará por essa sala e
nos interromperá. — Sua postura mudou totalmente. A tranquilidade foi
substituída por preocupação, como se estivesse em alerta.
— É sobre o meu trabalho aqui na clínica. Achei que fosse me
adaptar ao trabalho burocrático, só que isto está me matando. Pai, eu amo a
minha profissão, passei anos estudando, dando duro para ser o melhor na
minha área, sinto falta de exercer a medicina. — Achei melhor dizer tudo
de uma vez, sem rodeios.
— Você quer voltar para São Paulo? — perguntou, sério. Embora
aparentasse calma, o conhecia bem o suficiente para saber que sua cabeça
fervia.
— Não, de jeito nenhum. Meu lugar é aqui, com vocês. Eu vou
continuar trabalhando na Pró Vita, mas preciso que aceite que eu arrume
alguém para me ajudar.
— Tem alguém em mente?
— Sim. Um amigo que perdeu a esposa há pouco tempo e está
querendo recomeçar a vida em um lugar mais calmo. O doutor Lucas
Moretti é um excelente profissional, além de um homem honesto e íntegro,
tenho certeza que formaremos uma dupla de gestores imbatíveis.
— Se ele é tão bom como diz, como tem certeza que aceitará o
convite? Minha preocupação é que aconteça com ele o mesmo que com
você: sinta falta de exercer a medicina e desista.
— Não tem como eu lhe dar garantias de nada. Contudo, Moretti já
trabalhou na direção de um hospital, sabe como funciona e onde está se
metendo. E mais, seremos dois, se trabalharmos juntos dará para ambos
exercer a medicina.
— Te dou carta branca para resolver esse assunto. Faço o que for
preciso para que não vá embora de novo, meu filho. — Papai ficou de pé e
se aproximou de onde eu estava.
— Obrigado, pai — agradeci, animado, e me levantei, abraçando-o
carinhosamente. — Está fazendo isso por mim, mas verá que será o melhor
para a clínica.
— Assim espero. Sua irmã me mata se algo der errado — disse,
voltando á sua versão leve e divertida.
— Falando nisso, Cora não ficará satisfeita com nosso arranjo. Ela
não gostou nada da ideia quando sugeri.
— Posso ser velho, mas quem manda aqui ainda sou eu. Deixa que
com ela eu me entendo.
Como se tivesse um timer perfeito, minha irmã entrou na sala,
esbaforida, olhando para os lados à procura do nosso pai.
— Achei o senhor. Mamãe está me deixando louca ao telefone por o
senhor ter sumido e não atender o telefone. — Cora nos encarou, de
sobrancelha erguida, atenta em como estávamos próximos.
— Ah, se estressou porque quis. Onde mais eu poderia estar? — Ele
revirou os olhos e pegou a pasta que deixara sobre a mesa. — Cora, vamos
terminar de conferir o relatório, antes que Francisca venha atrás de mim.
Terminamos nossa conversa depois, Diogo, siga com o que combinamos.
Concordei com um aceno de cabeça e o assisti sair com Cora em seu
encalço, na certa desesperada para descobrir o que papai fazia na minha
sala. Ela não era boba, sabia que não arrancaria nada de mim. O jeito era
tirar a informação dele.
Bom, agora, precisava ligar para o Lucas e fazer a proposta de
trabalho para ele. Procurei por seu nome na agenda do meu celular e liguei,
torcendo para dar certo.
Desde que perdeu a esposa há um ano, Lucas decidiu mudar da
capital para um lugar onde pudesse criar a filha sem medo da violência. Sua
esposa Martha foi assassinada em São Paulo, depois de se assustar durante
um sequestro relâmpago e tentar fugir.
— O bom filho à casa torna — provocou, do outro lado da linha. —
Quer dizer, você não voltou, mas pelo menos, se lembrou de ligar para o
velho amigo.
— Quanto drama, Moretti. Estava com saudades de mim, por acaso?
— Tínhamos um relacionamento de amizade muito forte. Ele e sua família
me acolheram quando cheguei à grande metrópole, perdido e cheio de
sonhos.
— Eu não, mas tem uma mulher na minha casa que está e pergunta
por você todo santo dia. Estou começando a ficar com ciúme.
— O que eu posso fazer se as mulheres me amam. — Ele bufou, e
consegui ouvir o som de sua risada abafada. — Diga a Dorinha que também
estou morrendo de saudades dela.
— Não digo mesmo, seu ladrão de filha. Arrume uma para você.
No mesmo instante a imagem de uma menininha sapeca veio à
minha mente, e sorri. Nunca pensei em ter filhos, contudo, desde que
conheci Isabela e me apaixonei por aquela pestinha, a ideia vinha se
formando na minha cabeça com mais força.
— Bom, meu amigo, liguei para termos uma conversa séria. Lembra
que me contou da vontade de se mudar para o interior? Tá pensando nisso
ainda?
— Você sabe que nada me fará desistir. Apenas não encontrei até
agora uma oportunidade que valha a pena.
— Então, sua busca acabou — disse, animado. — Surgiu uma vaga
de diretor clínico na clínica do meu pai. Não é um desses hospitais
imponentes em que está acostumado a trabalhar, mas a Pró Vita tem uma
infraestrutura maravilhosa, possui equipamentos de última geração, só não
está localizada em uma cidade grande.
— Calma, me conta essa história direito — pediu, e, pelo modo
como falou, percebi que consegui deixá-lo interessado.
Passei a meia hora seguinte explicando sobre o trabalho, a clínica, a
cidade e desliguei quando concordou em vir a Mococa para conhecer tudo
de perto. Sua dúvida não ficara em torno do trabalho, queria confirmar que
o lugar onde viveria seria seguro como desejava.
Desliguei o telefone aliviado. Porém, nem bem o descartei sobre a
mesa, o aparelho apitou indicando o recebimento de uma mensagem. Não
reconheci o número, ele não estava nos meus contatos e não possuía foto.
Mesmo estranhando achei melhor ver quem era.
"QUE MERDA É ESSA DE ESTAR DE ROLO COM A MINHA
IRMÃZINHA?"
Que raio de mensagem era aquela?
O texto tinha um ar intimidante e chegara em caixa alta. A pessoa
parecia irritada. Encarei a tela, confuso, tentando decifrar o remetente, e não
precisei pensar muito. Nos últimos tempos eu havia tido encontros
recorrentes com Fabi e Gabriela. A primeira não tinha irmãos, então, quem
enviara aquilo só podia ser Júnior, o irmão de Gaby.
Diogo: Júnior? — testei, e encarei a tela do celular, curioso.
Júnior: Claro, que sou eu! Por acaso você anda encostando essa
mão cheia de dedos em outras mulheres além dela?
Fiquei mudo, chocado pela surpresa de Júnior me procurar. Durante
longos minutos eu digitava, apagava, indeciso no que escrever. Será que
estava nervoso de verdade? Fiz isso umas quatro vezes. O desgraçado me
deixou em suspense, para em seguida me mandar um áudio idiota dele
gargalhando.
Júnior: Relaxa, tô de zueira, não me meto na vida da Gabriela. Ela
é bem grandinha para cuidar da própria vida.
Diogo: Brincadeira mais sem graça, idiota. Não sei o que andou
descobrindo, mas eu não transei com sua irmã. — Quase acrescentei a
palavra: ainda, visto que, muito em breve, pretendia fazer mais do que
encostar o dedo. Aquela justificativa era um pouco esfarrapada, contudo, foi
a única que encontrei que não me fizesse mentir tanto.
Júnior: Você é patético, Diogo, não tô sabendo de nada. Queria
estar aí para ver sua cara de paspalho.
Diogo: Pelo jeito você não mudou nada — foi minha vez de
provocar, lembrando-me de como era bom tê-lo como amigo. — Você está
na cidade?
Júnior: Não. Vou pra Mococa no final do mês. Não consigo uma
folga decente do trabalho há muito tempo.
Diogo: Quero muito te encontrar. Precisamos colocar o papo em dia.
Júnior: Combinado. Fiquei feliz de saber que voltou.
Diogo: Eu também. Pior que só entendi o quanto isso tudo fazia
falta quando voltei. E você, Gaby me contou que está morando em Ribeirão
Preto, não pensa em voltar?
Júnior: Até queria, mas além de não encontrar trabalho aí, não
aguento viver sob a marcação cerrada do meu pai.
Diogo: Entendo. Seu pai é um caso complicado.
Júnior: Não sei como Gaby aguenta.
Diogo: Nem eu. Quem te disse que eu estava de rolo com Gaby?
Júnior: Bom, a pessoa não falou com todas as letras, eu que te
testei. Joguei verde pra colher maduro. Adivinha? — Ele fez uma pausa,
dando tempo para que eu respondesse, como bufei impaciente, continuou:
— É pequena, linda, esperta, dá nó até em pingo d'água e tá com o pé
machucado.
Diogo: Ah, entendi tudo. Isa.
Isabela era impossível. Ri sozinho em minha sala, imaginando a
conversa que teve com o tio para que ele suspeitasse do meu envolvimento
com Gaby.
Júnior: Não, Diogo, você não entendeu. Falando sério, agora, meu
amigo. Minha sobrinha está encantada por você, eu nunca a vi desse jeito.
Sei que sou brincalhão, pareço despreocupado com todos ao meu redor, só
que isso não é verdade. Prefiro cuidar daqueles que amo de longe, sem me
intrometer. Mas confesso que fiquei preocupado com a pequena. Ela não
tem pai, tenho medo de se apegar a você e sofrer. Entende?
Diogo: Me apeguei muito a Isa, ela é muito importante pra mim.
Mesmo não sabendo o que acontecerá no futuro, prometo não a machucar,
Júnior.
Júnior: Obrigado. Eu confio e fico mais tranquilo agora. Bom,
preciso ir. Meu descanso acabou. Te vejo em breve, amigo.
O que Júnior contou me tocou. Eu sabia que não podia dar garantias
a ele. Vivíamos cercados por surpresas, às vezes, algumas podiam ser bem
desagradáveis, e eu faria o que estivesse ao meu alcance para nunca
decepcionar aquela doce menininha, e a mãe dela também.

Aproveitei que precisava entregar um documento para Cora, para


esperar Gaby perto do relógio de ponto, lugar onde tinha certeza que em
breve ela estaria. Queria vê-la um pouco, nem que fosse para dizer um olá,
rápido.
Era cada vez mais forte a vontade de tocar nela, sentir o perfume
inebriante de sua pele, beijar sua boca, ou apenas ficar um pouco em sua
companhia.
Como previa, ela apareceu cinco minutos depois do final do seu
expediente. Com a bolsa a tiracolo, caminhou na minha direção distraída
com o celular e não me notou parado de braços cruzados no final do
corredor.
Gaby me deixava louco. Ela era linda demais, mesmo dentro de um
legging simples e uma camiseta grande. O corpo mignon, cintura fina, seios
pequenos, porém, redondos e apetitosos. Lembrava bem de como quase
enlouqueci de tesão ao ver seus mamilos eriçados pela câmera, perdida em
meio ao orgasmo.
Divaguei, imaginando se durante o trabalho sua lingerie seria sóbria
ou sexy como na da noite passada.
Me espantei com o rumo dos pensamentos.
Será que em algum momento o fascínio por essa menina acabaria?
Essa pergunta martelava em minha cabeça desde a conversa com
Júnior e, mesmo parecendo precipitado, algo me dizia que quanto mais eu
tivesse de Gaby, mais eu a desejaria.
Estava me preparando para ir ao encontro de Gaby quando notei
Cora ao meu lado. Ela me olhou com o rosto sério, testa franzida, e seu
olhar duro me fez vacilar.
— Que cara de idiota é essa, olhando pra nossa enfermeira, Diogo.
Devo me preocupar?
— Não. Como também não devia se preocupar com a minha vida —
vociferei, temendo que percebesse meu real interesse pela Gaby.
— Impossível não fazer isso! Ela é nossa funcionária e você o dono
da clínica, esqueceu?
— Está doida, Cora? Desde quando tem o direito de se meter assim
na minha vida?
— Eu sou sua irmã mais velha. É minha obrigação me intrometer
quando vejo que está prestes a fazer uma merda gigantesca. Não vou deixar
isso acontecer.
— Você não tem que deixar nada, Cora. Não sou mais criança, da
minha vida cuido eu.
Com os ânimos exaltados, o melhor a fazer era ignorá-la. Saí e a
deixei falando sozinha. Fui embora antes que nossa discussão causasse um
escândalo.
Capítulo 15

GABRIELA

— Gaby, você precisa relaxar, serão só dois dias — disse Ana, quase
perdendo a paciência comigo.
Era sexta-feira e, diferente da minha amiga, não estava de folga.
Como Isa não iria à escola, Ana inventou de levá-la para o sítio dos pais e
fui voto vencido.
— Eu sei, mas ela está com gesso, vai dar trabalho. Talvez seja
melhor eu chamar a dona Nilza para cuidar dela aqui em casa mesmo —
argumentei, referindo a senhora que eu contratava para ser babá de Isa
quando a coisa apertava.
— Ah, mãe, deixa eu ir. Por favorzinho — Isa choramingou.
— Não inventa, Gabriela, fica tranquila que mamãe e eu vamos
cuidar da florzinha direitinho.
Eu devia ser a maior idiota de todas. Vivia reclamando que sentia
falta de uma rede de apoio para me ajudar com minha filha, e, quando
conseguia, o modo mãe superprotetora falava mais alto, quase me fazendo
surtar.
— Está bem, filha, obedeça a Dinda e nem pense em subir nas
árvores com o pé desse jeito.
— Ebaaaa. Posso levar a Lolô? Queria mostrar ela pra vó Júlia —
pediu, radiante. Concordei com um aceno de cabeça e ela saiu animada na
direção do quarto para pegar a boneca.
— A Júlia tá perdida. Vai ter que brincar de boneca — zombei. Júlia
era a mãe de Ana, que Isa havia pego como avó postiça.
— Ela ama a Isa. Diz que enquanto eu não lhe dou netos, vai treinar
com sua filha.
— Amiga, tenta tirar da Isa o porquê de ter brigado na escola. Já
tentei de tudo e a danada não abre o bico. Tô começando a ficar
preocupada. Minha filha nunca escondeu nada de mim.
— Farei melhor, Gaby. Vou pedir para o meu pai conversar. Ele é
psicólogo, saberá o que fazer.
— Obrigada, querida.
— Cheguei, dinda.
— Tchau, meu amor, se cuida. Mamãe te ama, não esquece. —
Beijei e abracei minha filha tão apertado que ela resmungou, mas não se
soltou.
— Eu também amo muitão.
— Até logo, Gaby — Ana me abraçou e sussurrou: — Aproveita
que tá sozinha pra dar para o vizinho gostosão. Libera essa perseguida logo,
mulher.
Acabei rindo do seu desespero. Parecia até que era ela que fazia
tempo que não transava. O elevador chegou e não pude responder como
gostaria. Talvez, fosse melhor assim, Isa vivia de orelha em pé. A criança
era mais esperta que muito adulto e eu não queria que soubesse do meu rolo
com Diogo.
— Se divirtam — respondi, mandando um beijo, e as portas da
caixa metálica se fecharam.
Diogo. Eu não tinha notícias dele desde o sexo por telefone, na
segunda-feira. Na verdade, desconfiava que fora ele que tocou minha
campainha na terça-feira à noite, mas, como me acovardei e não abri a
porta, não dava para ter certeza.

Virei a chave na porta e entrei, quase me arrastando. O cansaço era


tanto que sentia como se um caminhão tivesse me atropelado.
Fazia muito tempo que não via a clínica lotada daquele jeito. Um
mar de gente circulando pelos corredores, como se todos os pacientes
tivessem resolvido fazer check up ao mesmo tempo.
O silêncio no apartamento indicava que Alê não estava em casa,
provavelmente passaria a noite na casa do namorado e recebi a confirmação
ao passar pela cozinha e encontrar seu bilhete fixado na porta da geladeira.
Já passava das dez horas da noite, então, preferi pedir comida por
delivery do que pilotar o fogão. Procurei no aplicativo pela minha
lanchonete favorita e escolhi um lanche de hambúrguer artesanal com fritas.
Depois, segui para o quarto desesperada por um banho.
Tudo que queria era relaxar a canseira do longo dia de trabalho.
Havia substituído uma enfermeira que precisava sair mais cedo, e
praticamente dobrei minhas horas trabalhadas.
Livrei-me do uniforme e liguei o chuveiro. Com as costas inertes
sobre o jato de água, fechei os olhos e meu pensamento voou até um certo
doutor, que permaneceu nos meus pensamentos mesmo durante o dia
tumultuado. Nunca pensei que os sentimentos antigos daquela adolescente
sonhadora pudessem reviver, e o pior, tão depressa. Diogo voltou para a
minha vida como um furacão, derrubando todas as barreiras criadas ao
longo dos anos e em um piscar de olhos.
Assim que saí do banho o interfone tocou.
— Maravilha, meu lanche chegou — murmurei, animada, e tirei o
fone do gancho. — Boa noite, Tobias.
— Boa noite, dona Gabriela, sua entrega chegou. O motoboy não
pode subir, a senhora quer que eu leve?
— Se puder fazer essa gentileza, agradeço muito.
Ciente da pouca roupa que usava, vesti um roupão de seda branco
que tapou a camisola minúscula, e atendi a campainha.
— Boa noite, vizinha! — O sorriso safado de Diogo me recepcionou
ao abrir a porta e o encarei surpresa. — Parece decepcionada. Estava
esperando outra pessoa?
Ele vestia roupas de academia: short, camiseta preta e tênis. A barba
estava mais cheia, diferente da noite do sexo por telefone em que vira
aquele rosto lindo pela tela do celular.
— Sim, tô surpresa. Esperava encontrar o Tobias com meu lanche
ao abrir a porta. — Tentei sorrir, o que foi impossível, seu perfume invadiu
meus sentidos assim que inspirei o ar para cumprimentá-lo, e me
estremeceu inteira.
— Não sou o porteiro, mas trouxe sua comida. — Ele piscou,
erguendo a embalagem com o logo da lanchonete.
Se alguém de fora visse aquela cena veria apenas dois vizinhos em
um momento de cordialidade, mas a intensidade do olhar de Diogo fez meu
corpo arrepiar. Ele era intenso, sua masculinidade e o porte de homem mais
velho me atraíam deliciosamente, ao mesmo tempo que me assustava.
— Entra… — convidei, e ele seguiu para dentro da sala.
— A casa está silenciosa. A Isa dormiu?
— Ela não está. Foi para o sítio dos pais da minha amiga Ana.
Diogo processou a informação por uns quinze segundos, enquanto
me encarava, até que levantou a sobrancelha de forma sugestiva, o sorriso
sexy despontando de seus lábios.
— Você está sozinha, Gabriela? — perguntou, sua voz saiu um
pouco mais rouca que o normal e deu um passo à frente.
— Sim… — sussurrei, hipnotizada.
Achei que diria alguma coisa, ao invés disso, elevou a mão e
acariciou meu rosto. Fechei os olhos diante do toque inesperado, e, ao
reabri-los, encontrei duas írises negras encarando meus lábios com fome.
Nada precisou ser dito. Diogo terminou de fechar a distância que
existia entre nós, juntou as mãos em meu pescoço e me puxou para si. O
beijo veio com força, a língua exigente brincou com a minha, uma pegada
bruta, necessitada.
— Você não saiu dos meus pensamentos nem por um segundo essa
semana. Só não imaginei que meus desejos fossem se realizar assim, rápido.
Em um segundo eu estava de pé, no seguinte me vi deitada de costas
no sofá, com Diogo entre as minhas pernas. Ele esfregou o membro ereto
contra a minha intimidade, o tecido leve da camisola deixando o contato
quase direto, ao mesmo tempo em que sua boca se fartava da minha.
Foi quente demais. Erótico num nível que nunca tinha
experimentado. Senti o calor no meu ventre aumentar, parecendo um vulcão
prestes a entrar em erupção. Podia jurar que minha calcinha estava
ensopada, porque eu me sentia molhada, quente.
— Ah, minha doce e safada menina. Me sinto um ogro pervertido,
mas diz que posso continuar, por favor — implorou, ofegante.
— Ah, doutor, você não é nem louco de parar.
Mesmo temerosa, eu não ia recuar. Tê-lo ali era a realização das
minhas mais loucas fantasias e aproveitaria cada momento. Sem dar tempo
para meu lado temeroso assumir, uni nossas bocas mais uma vez e suas
mãos desceram pelo meu corpo.
— Você é linda, gostosa demais — disse, rouco, os dentes apertaram
em meu ombro de um jeito doloroso e estranhamente excitante.
Diogo não foi delicado nem gentil. Abriu o roupão que o impedia de
ter acesso ao meu corpo e encaixou suas mãos em meus seios, apertando-os,
testando o tamanho sob sua palma. Ele lambeu os lábios, provocante,
aproximou a boca do meu mamilo direito e mordeu a pontinha eriçada por
cima da camisola. Eu não sabia se fechava os olhos e aproveitava as
sensações do seu toque ou se os mantinha aberto e aproveitava a visão de
ter Diogo me devorando. Por fim, não escolhi nenhuma delas. Resolvi agir,
sair do modo menina recatada que não tinha nada a ver comigo e tocá-lo
como tanto ansiei.
— Tira — pedi, e desci minhas mãos até a barra de sua camiseta.
Puxei a peça pela cabeça com pressa. O peitoral largo apareceu
diante de mim e quase babei diante do que vi.
— Nossa, sua tatuagem é linda — exclamei, admirando os desenhos
em seu peitoral.
— Gostou, é?
Assenti e passei os dedos lentamente por elas, resvalando entre os
gomos do abdômen definido.
— Tão linda… mas tão apressada — sussurrou, quando enganchei o
dedo em seus shorts para tirá-lo, e me surpreendeu ao se afastar.
Seu corpo abaixou entre minhas pernas, parando na altura da minha
boceta e chamei por seu nome no momento exato em que ele afastou a
calcinha de renda para o lado e abocanhou meu centro que fervilhava de
desejo.
Diogo não perdeu tempo, cheirou, lambeu, chupou, fazendo-me
gritar. Com os sentidos e os sentimentos todos em alerta, não consegui fazer
mais nada, a não ser gemer e ansiar por tê-lo dentro de mim.
Reconhecendo as ondas de prazer que percorriam meu corpo sempre
antes de um orgasmo, agarrei seus cabelos, desesperada por um alívio, e
movimentei meus quadris contra sua boca sem o menor controle do que
fazia.
— Senhor! — soltei, sem querer, arqueando o corpo.
A pressão no meu ventre aumentou e explodi em mil pedaços,
sentindo como se minha alma tivesse saindo do corpo.
— Você é linda, Gaby, mas quando goza… — Diogo abriu um
sorriso satisfeito de quem sabia o que fazia.
Ele se inclinou sobre mim, ainda mole sobre o sofá, e capturou
minha boca em um beijo molhado e intenso. Voltei a me excitar ao sentir
meu gosto na sua língua, insaciável, como se nada do que fizesse com
aquele homem fosse suficiente para aplacar meu desejo.
— Quer ir para o meu quarto? — convidei. Ele aquiesceu e estendeu
a mão.
De pé, enlacei seu pescoço com os braços, sua mão entrou ousada
por baixo da camisola, e subiu o tecido passando-o pela minha cabeça. Seu
olhar transmitia aquela coisa plácida, de quem tinha controle da situação,
porém, sua respiração acelerada ao se deparar comigo nua, denunciava que
não era bem assim.
Um arremedo de sorriso brincou em seus lábios. Diogo avançou,
tocou meus seios com sua boca, explorando o mamilo intumescido, para,
enfim, o abocanhar, sugando a pontinha para dentro de seus lábios quente.
— Você é tão pequena que tenho medo de te machucar com meu
desespero. Preciso muito te comer. — Seus olhos se fixaram nos meus e
estremeci diante da intensidade.
— Quarto… primeira porta à direita — sussurrei, a voz entrecortada
e mordi o lábio inferior.
Sem dizer nada, Diogo me carregou na direção do corredor como se
o peso do meu corpo fosse insignificante. Seguimos, trocando beijos
quentes, e quando chegamos fui colocada de pé no chão, próxima a cama.
Fiquei parada à sua frente e assisti Diogo descer os shorts de
ginástica e a cueca pelo quadril, permitindo que ele escorregasse por suas
pernas quase que em câmera lenta. Seu membro ereto saltou livre,
majestoso e convidativo. Lambi os lábios. Ele era lindo, mas nu, tornava-se
a perfeição em pessoa, um deus grego digno de admiração.
Aproveitei que sua atenção estava voltada para minha face para
provocá-lo. Abaixei minha mão e circulei seu membro, testando sua
grossura, a quentura da pele aveludada, e ele gemeu em resposta.
— Tudo isso é por minha causa? — perguntou, manhosa,
movimento-o com delicadeza para cima e para baixo.
— Ah, Gabriela, ele anda assim 24 horas por dia, desde que a vi em
ação com aquele maldito vibrador. Lambe-lo daquele jeito foi golpe baixo.
— Quer que eu repita a cena, trocando o brinquedinho pelo seu pau?
— sugeri, a confiança crescendo dentro de mim ao ponto de perder a
vergonha.
— Gaby… Gaby… Não imaginei que pudesse ser tímida e safada ao
mesmo tempo. Você me deixa louco com essa boca suja.
— Isso é bom ou ruim?
— É perfeito, na medida certa para mim.
A voz rouca mexeu comigo. Fitei seus olhos e sorri ao ver tanto
desejo refletido nele. Decidida a me soltar e apreciar cada segundo, caí
ajoelhada aos seus pés. Diogo gemeu quando deslizei a língua pela sua
glande e o tomei na boca, levando-o o máximo que conseguia ao fundo da
garganta. Não foi um trabalho fácil, ele era grande, grosso, mas a excitação
me tomou e o chupei com vontade.
Não conseguia ver seu rosto, seus gemidos me mostraram que eu
estava fazendo certo, do jeito que lhe agradava. Ele rosnou a cada
arremetida bruta e funda, ou quando parei e apenas lambia a pontinha
devagar, numa leve e provocante carícia. Suas mãos se prenderam em meus
cabelos, ajudando-me com o movimento de vai e vem, e aquilo me deixou
mais doida.
— Porra, Gabriela, que boquinha deliciosa. Vai, me fode! — pedi,
projetando o quadril contra mim enquanto eu o chupava.
Diogo confessou que eu o havia surpreendido, eu também estava.
Muito. Ele tinha a postura de homem sério, daqueles certinhos que nem
falavam palavrão, mas na hora do sexo, quando o tesão lhe dominava,
transformava-se em um tremendo depravado boca suja.
— Ah, Gaby, preciso muito te comer. Diz que tem preservativo —
disse, afastando-se, antes que chegasse ao fim logo de primeira.
— Pior que não, que pena — respondi, segurando o riso, divertindo-
me com seu desespero. — Brincadeira… Tá na primeira gaveta, a chave
está escondida dentro do abajur.
— Você vai pagar por essa provocação. — Ele abriu um sorriso
lascivo, cheio de promessas, e caminhou afoito na direção da mesa de
cabeceira.
Seguindo minha instrução, ele pegou a chave da minha gaveta da
alegria no esconderijo e retirou o preservativo de lá de dentro. Achei que
fosse fazer alguma piada referente ao vibrador cor de rosa, mas o tesão
estampado em seu rosto não permitiu que visse mais nada diante dos seus
olhos. Focou em rasgar a embalagem metalizada e deslizar o preservativo
por sua extensão rígida.
Observei a cena hipnotizada. Diogo possuía um corpo lindo, viril, e
era surreal a ideia de que finalmente estava tendo aquele momento com ele.
Vi se aproximar de mim como um predador, seu olhar me encurralando ao
mesmo tempo que o toque de suas mãos me incendiava.
— Você é linda demais. — Seu polegar deslizou por meu lábio
inferior antes de ele grudar a boca na minha e me arrastar até a cama.
Seu corpo cobriu o meu com perfeição. O beijo que trocamos foi
quente, apressado, sua língua tomou a minha e seus dedos desceram para o
meu clitóris. Diogo parecia um polvo, tomou meu corpo com cada parte do
seu, trilhando beijos molhados por meu pescoço, seios, barriga. Fiquei
ansiando para que me tomasse de uma vez, desejosa por senti-lo dentro de
mim.
— Monta em mim — pediu, interrompendo o beijo, e se recostou na
cabeceira da cama.
— Com todo prazer, doutor.
Escalando seu corpo nu e montei sobre suas pernas. Toquei seu
peito, rebolando muito próxima do seu pau e ele imediatamente segurou
minha cintura.
— Para de provocação. Vem…
Eu o obedeci, um tanto ansiosa, afinal há muito tempo não tinha um
homem dentro de mim. O posicionei em minha abertura e desci, tomando
sua extensão devagar, ele era grande, o encontro do seu corpo com o meu
causou uma ardência inesperada, mas, à medida que o ia tomando, fui
acostumando com seu tamanho e o prazer voltou. Potente, delicioso.
— Vai, linda, cavalga no meu pau. — Sua boca buscou pela minha e
as mãos dele cravaram em minha bunda, estimulando-me a movimentar.
Esfreguei-me nele, embriagada pelo seu cheiro, pela massagem
deliciosa em meu clitóris que me levava ao céu e deixei que me guiasse.
Viramos uma massa de corpos suados, cada um perdido em seu próprio
prazer.
— Porra, apertadinha — disse, ao inverter nossas posições e me
penetrar novamente. — Ah, caralho, eu vou gozar muito dentro de você.
Diogo me levou ao ápice. Revezava entre morder o queixo e sugar
meus lábios, as mãos agora cravadas em meus cabelos. Gritei, desesperada,
quando começou a estocar forte e fundo, uma, duas, várias vezes, sem dó
nem delicadeza, até que não resisti e gozei, alcançando o orgasmo mais
incrível da minha vida. Com mais duas estocadas o senti latejar e então,
soube, que ele também gozava, se libertando dentro da camisinha.
— Deliciosa...
Ele me abraçou, ofegante, estávamos suados, exaustos, e sua boca
grudou na minha em um beijo calmo. Eu estava muito afetada pelo que
fizemos. Foi tudo delicioso, intenso e milhões de vezes melhor do que
imaginei que seria.
Diogo saiu de dentro de mim, retirou o preservativo e se deitou ao
meu lado, envolvendo meu corpo com o braço. Ficamos por um tempo
quietos, acompanhei seus olhos descerem pelo meu corpo, depois os ergueu
e me encarou. Inclinando a cabeça para o lado, ele usou a língua para
umedecer os lábios e perguntou, sorrindo:
— Quero passar a noite inteira enterrado em você. Posso?
Apesar da safadeza presente naquela frase, fui pega desprevenida
pela intensidade do seu olhar. Seus olhos pareciam dizer bem mais do que
sua boca.
— Diogo, sei que vou parecer uma maluca falando isso, acabamos
de transar pela primeira vez, mas preciso ser sincera. Não sei lidar com sexo
casual, tenho medo de continuarmos e algo maior vir — afirmei, girando
entre seu braço e ficamos nos encarando, um de frente para o outro.
— E se acontecesse, seria ruim para você?
— Claro que não! — respondi, rápido e continuei: — E para você?
— Não, minha linda. Eu estou tão envolvido quanto você e quero te
conhecer melhor.
— Me beije. — Minha voz saiu num tom de súplica e ele não
demorou a atender meu pedido.
Os olhos se fixaram nos meus e estremeci diante da intensidade.
Diogo segurou minha bunda com a mão livre e possuiu minha boca com
desespero.
Que Deus me ajudasse a não cair do cavalo outra vez, porque estava
me apaixonando por esse homem novamente, e se desse errado, o tombo
seria muito maior.
Capítulo 16

DIOGO

Eu acordei sem ter a mínima noção de que horas eram. Nem precisei
abrir os olhos para saber que não estava em minha cama. O cheiro de
Gabriela impregnado nos lençóis não me deixava enganar e na mesma hora
fui invadido pelas lembranças do que fizemos a bem pouco tempo atrás. A
noite tinha sido longa e bastante divertida.
Transar com ela foi incrível, diferente de tudo o que eu já tinha
provado. E algo me dizia que não aconteceu assim apenas porque a mulher
era gostosa e o sexo maravilhoso, mas porque foi com ela. A danada tinha
me pego pelas bolas, e eu suspeitava que ela nem tinha noção disso.
Busquei-a imediatamente com os olhos e sorri ao vê-la deitada de
bruços ao meu lado, completamente nua, seus cabelos longos espalhados
pelo travesseiro. O desejo voltou, e junto com ele vieram outros
sentimentos desconhecidos e nunca antes experimentados. Carinho, paixão,
não sabia dizer ao certo o que era.
Foi por causa deles que ontem à noite, quando Gaby começou com a
conversa de não saber lidar com sexo casual, eu não recuei. Eu a queria de
novo, isso era um fato, contudo, havia algo acima da necessidade de sexo.
Queria conhecê-la melhor, passar mais tempo com Isa, conhecer um pouco
mais da mulher que Gabriela havia se tornado. O que podia dizer, era que
cada segundo passado com ela e sua filha estava sendo muito especial.
Um aperto na bexiga me fez levantar devagar e seguir para o
banheiro. Precisava me afastar daquela cama antes que o desejo insano de
estar dentro dela de novo me fizesse acordar a garota. Ela havia dito antes
de adormecer que estava dolorida depois da nossa maratona de sexo.
Andei pelo quarto de Gaby sentindo como se estivesse em meu
próprio apartamento, afinal, morávamos no mesmo prédio. Porém, como os
cômodos ficavam na direção contrária, foi um pouco estranha a sensação de
caminhar pelo quarto invertido, a porta que era para estar do lado direito
estava do esquerdo, a janela o mesmo problema.
Imaginando que Gabriela não fosse se incomodar por eu usar seu
banheiro, aliviei a bexiga e entrei no chuveiro, agradecendo a água quente e
muito bem-vinda. Tomei um banho rápido, peguei a toalha estendida sobre
o box de vidro e, depois de me secar, enrolei-a no corpo para voltar ao
quarto.
Ao contrário do que eu imaginei, não encontrei Gaby dormindo. Ela
estava falando ao telefone, pálida, e visivelmente preocupada.
Imediatamente, fiquei em estado de alerta.
— Eu não acredito nisso, Ana. Como ela está? — questionou,
esfregando os olhos.
Não precisei ouvir muito para entender que, o que quer que
estivesse acontecendo, estava relacionado a Isabela. Achei melhor esperar
que encerrasse a ligação para me aproximar, enquanto isso, aproveitei para
vestir minha roupa que deixei jogada no chão da sala. Quando voltei, ela se
despedia de Ana.
— Eu estou indo. Chego aí em uma hora. No máximo. — Ela
encerrou a chamada e permaneceu olhando para a tela do celular até
perceber minha presença.
— Oi — Eu me aproximei e me sentei ao seu lado.
— Oi. Nem te vi levantar.
— Você dormia profundamente e não quis acordá-la. Tomei uma
ducha rápida, espero que não se importe por usar seu banheiro e sua toalha.
— Imagina. Não deve ser chique igual ao seu, já que a suíte
principal é no quarto do meu primo, mas é limpinho. — Ela tentou
descontrair, mas era nítido que algo a afligia.
— Vi que a ligação te deixou preocupada. Aconteceu alguma coisa
com a Isa? — Não resisti e soltei a pergunta, cauteloso.
— Sim. Terei que ir até o sítio dos pais da minha amiga para buscá-
la.
— O que aconteceu com a pequena, ela está bem?
— Tá sim…Bem, pelo menos fisicamente. — Ela parou, encarando-
me pensativa e continuou: — Desculpa, Diogo, tivemos uma noite
maravilhosa, não queria que acabasse assim. A minha filha é o que eu tenho
de mais importante na minha vida e preciso ir até lá.
— Calma, linda. Eu entendo e confesso que também fiquei
preocupado. Posso ajudar em algo? — Seus olhos se encheram de lágrimas
e, tentando tranquilizá-la, segurei sua mão.
— Não, obrigada. Você já nos socorreu demais.
— Conta pra mim o que está acontecendo, Gaby. Me deixa ajudar.
— A puxei para meus braços e ela se aninhou no meu peito.
— A Isa anda estranha desde a briga na escola e eu não consegui
fazer com que ela me contasse o motivo do desentendimento com a
coleguinha. Minha filha nunca agiu assim, Diogo. Nunca arrumou confusão
e sempre me contou tudo — desabafou, consternada, e soltou um suspiro.
— Quando você saiu do banheiro, minha amiga tinha acabado de ligar para
contar que o pai conseguiu arrancar a informação da Isa. Eu não entendi
muito bem, parece que a briga aconteceu por causa da festinha de dia dos
pais na escola.
— Ainda não consigo entender a razão para Isa brigar.
— Parece que uma coleguinha debochou da Isa por ela não ter pai e
ainda por cima falou que a minha filha não deveria nem ir nesse dia.
— Isso é um absurdo. Como a professora deixou isso acontecer?
— Estou me fazendo essa mesma pergunta.
Trinquei o maxilar, irritado, ao imaginar as inúmeras possibilidades
do que realmente havia acontecido. Minha intuição raramente falhava, e
desde que coloquei os pés naquele colégio e vi Isabela acuada no banheiro,
algo me disse para investigar.
— Não sei se você se lembra, naquele dia eu mencionei que queria
conversar com você, Contudo, infelizmente, aconteceram muitas coisas nos
dias seguintes e acabei esquecendo, me perdoe. O fato é que eu não gostei
nada daquela escola. Quando cheguei para buscar Isa, senti que tinha
alguma coisa errada, como se tivessem negligenciado o socorro da Isabela.
— Como assim?
— Naquele dia, só fiquei sabendo o que estava acontecendo com a
Isabela, porque passei pela recepção e ouvi a recepcionista falando ao
telefone com alguém da escola que tentavam há uma hora entrar em contato
com você e não conseguiam. Eu corri pra lá e ao chegar no colégio
encontrei sua filha machucada e trancada no banheiro. Fiquei furioso por
não a terem socorrido e confrontei uma funcionária. Deram-me a desculpa
que não puderam fazer nada, justamente porque estavam há meia hora
tentando fazê-la destrancar a porta. Percebe como o tempo não bate?
— Você acha que houve negligência?
— Não posso afirmar, mas ainda acho muito estranho. Sem contar
que não fui com a cara dos funcionários, menos ainda da professora da sua
filha. Sei lá, algo nela me soou falso.
— A coisa só piora — respondeu, tapando o rosto com as mãos. —
Minha filha não merecia vivenciar uma situação como essa. É tudo culpa
minha — afirmou, lutando contra as lágrimas que ameaçavam cair
novamente.
— Não diga uma coisa dessa, Gabriela! Você é uma ótima mãe, não
é culpada por nada.
— Eu sei disso, mas Isa não tem um pai por minha causa. — Ela
limpou o canto do olho e continuou: — Sabe, nunca me arrependi das
burradas que fiz, minha filha é o amor da minha vida, meu único
arrependimento foi ter me envolvido com o merda do pai dela. — A voz de
Gabriela falhou no fim da frase e não consegui dizer nada, somente abraçá-
la apertado.
Ficamos calados por um tempo, esperei que acalmasse, porém, antes
que o clima ficasse ainda mais pesado com lembranças do passado, puxei
Gabriela para meu colo e ofereci meu sorriso mais caloroso e sincero.
— O que acha da gente tomar o café da manhã na rua, antes de
irmos buscar a Isa?
— Espera! Você quer ir comigo?
— Claro! E a Mel também irá. Vamos fazer uma força tarefa para
alegrar a pequena.
— Você não existe, Diogo. Obrigada.
— Não tem nada que agradecer. Eu tenho um carinho muito grande
pela sua filha — disse, sincero, e deslizei o polegar por sua bochecha.
Nossos olhos se encontraram, os dedos se entrelaçaram em um
toque sem nenhum apelo sexual, cheio de significados subentendidos. Era
cedo para fazermos declarações e promessas, mas sabíamos que estávamos
começando um relacionamento.
— Você se incomoda se comermos por aqui mesmo? Tenho tudo
pronto, só farei um café.
— Humm… você é prendada, Gabriela, ou devo preparar meu
estômago?
— Espere e verá.

Diferente do que previ, tomamos um delicioso, porém rápido, café


da manhã no apartamento de Gabriela e, enquanto ela se preparava para a
viagem de pouco mais de meia hora, fui até a casa dos meus pais pegar a
Mel.
Meia hora depois, parei o carro em frente ao prédio em que
morávamos para buscá-la. Não demorou muito para que eu a visse saindo
pela porta de vidro. Desci do veículo e peguei a pequena bolsa que ela
carregava no ombro, acomodando-a no porta malas.
— E aí, preparado para se enfiar no meio do mato, moço da cidade
grande? — zombou, enquanto eu abria a porta do carona para que ela
entrasse.
— Vai depender do tanto do mato que está se referindo — respondi,
e fechei a porta, correndo em seguida para o outro lado.
— Oi, Mel, coisa fofa. — Virou-se sorrindo e ajoelhou no assento
do passageiro para acariciar a cabeça da cachorra, que estava no banco de
trás.
Seguimos conversando amenidades, vez ou outra meus olhos
desviavam da estrada para a mulher ao meu lado, atento às suas expressões,
seus olhares. Mudamos de ares quando pegamos a estrada de terra batida e
eu me vi imerso em uma realidade bem diferente da qual estava
acostumado, e que me era muito familiar, afinal, havia passado boa parte da
minha vida em Mococa, e esse tempo tinha sido bem aproveitado.
Principalmente na companhia de Júnior, o amigo que me carregava por
todos os lados de bicicleta.
Ainda havia bastante verde para todos os lados, fazendas com bois e
vacas pastando, ar puro e o cheiro de mato vindo com o vento. Também era
nítido como a modernidade destruía a natureza.
O sol estava alto quando estacionei em frente a porteira de madeira,
rodeada por uma cerca de arame farpado. Gabriela havia me contado o
nome do lugar, então, ao ver a grande placa escrito: Sítio Esperança, não
precisei questionar se estávamos no caminho certo.
— Meus Deus, há quanto tempo eu não via um negócio desses. —
Ele encarou surpreso o mata-burro sob a porteira. Esse era um dispositivo
antigo usado nas propriedades rurais para impedir a fuga do gado, mesmo
com a porteira aberta. Nada mais era que uma espécie de ponte de madeira,
de estrados vazados, onde o animal não conseguia caminhar por causa das
patas pequenas.
— O pai da Ana está doido pra tirá-lo. Hoje em dia os animais não
andam mais soltos pelo sítio, ficam num curral na parte dos fundos, só que
a mãe dela se recusa. Diz que a modernidade pode até entrar no sítio, mas
que alguma coisa tem que ficar pra se lembrar da infância.
— Errada ela não está — disse, olhando para os lados. — Ainda
bem que deixaram a porteira aberta.
— Tá com medo de pisar na bosta de vaca, doutor — provocou, e eu
ri, adorando vê-la mais relaxada.
Dirigi por mais uns bons metros, até parar junto a uma bela casa de
estilo rústico, parede revestida de tijolinho à vista e cercado branco. A
propriedade era grande, um tapete extenso de grama verde e bem-cuidada
se estendia sob os nossos pés, um jardim florido do lado esquerdo, e aos
fundos dava para ver o topo de um grande barracão, na certa o local onde
Gaby disse que os animais estavam.
— Oi, amiga, nem acredito que veio — Virei com a voz feminina
alegre, que sorria simpática, e pelo abraço caloroso que deu em Gabriela,
imaginei ser Ana.
— Eu também não — respondeu, soltando-se do abraço e parou ao
meu lado. — Diogo essa é a Ana, minha amiga e madrinha da Isa. Bom,
Ana, o Diogo eu não preciso apresentar, você o conhece da clínica.
— Prazer, doutor Diogo. — Ela estendeu a mão e fiz o mesmo,
retribuindo o cumprimento.
— Prazer, Ana, e por favor, esqueça as formalidades. Somos
amigos. — Ela limitou-se a sorrir e balançou a cabeça, parecendo
encabulada.
— E aí, amiga, como está a nossa menina?
— Amuada no quarto. Tomou café da manhã e agora está lá,
assistindo TV
— Aí, não sei o que fazer.
— Eu tenho uma ideia, mas precisarei da sua ajuda. Topa? — Gaby
concordou com um aceno de cabeça e continuei: — Então, vá ver a pequena
e não diga que eu vim. Entrega o celular para ela e diga que eu vou ligar —
pisquei rindo, e sorri, animado.
— Obrigada — Gaby se aproximou, deu um beijo suave nos meus
lábios e saiu caminhando ao lado da amiga para dentro da casa.
— Vem, amigona, agora é com você. — Soltei Mel do cinto de
segurança e caminhei com ela para debaixo de uma árvore.
Capítulo 17

GABRIELA

— Gaby do céu, que homem é esse? — Ana me puxou para um


abraço e sussurrou no meu ouvido.
— Então, Diogo tá sendo incrível e isso está me deixando apavorada
— confessei, parando no meio do corredor, o coração quase saindo pela
boca.
— Ei, pode parar de se boicotar. Você está tendo a oportunidade de
começar uma história linda e não deixe seus medos estragar sua felicidade.
— Ana se recostou na porta do quarto onde Isa ficava quando ia para o sítio
e me encarou, preocupada.
— Sinto como se estivesse dormindo e fosse acordar a qualquer
momento, descobrindo que tudo não passou de um sonho.
— Ah, é? Pode deixar que te dou uns tapas pra ver que está bem
acordada. Veja! — A desgramada me deu um peteleco na cabeça e acabei
gritando, mais de susto do que de dor.
— Credo, pra que tanta violência?
— Pra ver se você deixa de ser besta e acorda pra vida —
respondeu, olhando-me de cara feia. — Agora, vai lá ver a Isa. Se precisar
de mim estarei no meu quarto.
Abri a porta devagar e entrei. Havia o som da TV, mas fora isso, o
silêncio imperava no quarto, indicando que a situação era realmente
preocupante. Isa nunca foi quieta e nem mesmo o pé machucado a
impediria de fazer suas traquinagens.
— Oi, filha.
— Mãezinha, você veio — disse, sentando-se rapidamente.
— Claro que vim. A dinda contou que você estava tristinha, não
queria sair do quarto. Vim correndo saber o que houve.
— Não é nada, mãe.
— Bom, por enquanto não vou questionar, mas você sabe que uma
hora teremos que conversar sobre isso. Não é?
— Eu sei… — Seus olhinhos imediatamente brilharam por lágrimas
que cairiam a qualquer momento, e antes que isso acontecesse meu celular
tocou.
— Humm… tem um tio ligando. Quer atender?
— Quero. É o tio Diogo? — perguntou, animando-se de repente.
Confirmei e lhe entreguei o celular.
— Olá, princesa linda, tudo bem?
— Sim, tio Di.
— Não sei porque, mas não tô acreditando. — Isa desviou os
olhinhos da tela e me encarou, parecendo pedir por socorro. Eu apenas
sorri, dando de ombros.
— Minha mãe falou que eu tô triste, mas só tô a fim de ficar quieta,
assistindo TV.
— Sério? Que pena! Eu tinha pedido pra sua mãe levar uma
surpresa. Deixa pra outra hora, então, ela traz de volta.
— Surpresa? Cadê, mamãe? — perguntou, ficando de pé e olhando
para as minhas mãos.
— Calma, aí, mocinha, cuidado com o pé machucado — alertei,
indo para o seu lado.
— Isa, entrega o celular para a sua mãe. — Ela fez o que Diogo
pediu, e vi o rosto lindo dele me encarando. — Vem aqui pra fora —
sussurrou, acenando com a mão.
— Vamos dar uma volta lá fora, filha?
— A surpresa tá lá? — questionou, ansiosa.
Concordei e Isabela seguiu rápido na frente, mancando por causa da
bota de gesso, seus cabelos longos balançando nas costas. Controlei a
vontade de pedir para que andasse devagar, temendo que caísse e
machucasse, e a deixei ir, livre, sua tristeza cedendo lugar à alegria. Só
paramos quando ela viu Diogo e Mel a esperando encostado no carro.
— Tio Di, Mel, vocês também vieram!
Minha filha batia palma, gritava alegremente. Diante da euforia da
criança, Diogo veio até ela, segurando firme a coleira da cachorra que
parecia querer se soltar para correr de encontro à nova amiga. Ele pegou Isa
no colo, enchendo-a de beijos, os dois se abraçaram entre risos e latidos,
cheios de carinho e saudade.
— Que recepção deliciosa, lindinha.
Foi uma festa. Entramos, nos acomodamos nos sofás da grande área,
Isa brincou com Mel, Ana e seus pais se juntaram a nós, encantados em
como Diogo conseguiu com facilidade levantar o humor da minha filha. Até
eu me espantava em como os dois se apegaram depressa, fazia poucas
semanas que se conheciam e parecia uma vida.
Diogo era tão… carinhoso, atencioso.

O dia passou voando.


Estávamos no fim do inverno, e mesmo Mococa não sendo uma
cidade muito fria nessa estação, havia períodos onde parecíamos que íamos
congelar.
Para alegria de Isa, que estava doida para brincar com Mel pelo
gramado, o dia amanhecera lindo, com uma temperatura agradável e sem
vento. Sentamo-nos debaixo de uma enorme árvore de Ipê Rosa,
exuberantemente florido, e aproveitamos o sol na pele, enquanto eu e Diogo
observávamos a interação das duas.
— Ei, o que se passa nessa sua cabecinha linda? — Diogo disse,
puxando-me para sentar no meio de suas pernas.
Virei o rosto e seus olhos se perderam dentro dos meus, queimando-
me intensamente. Aquele tipo de olhar preocupado, que parecia enxergar
dentro da gente, desnudando seus sentimentos, sua alma, e o mais louco era
que gostei demais disso. Acariciei suas mãos sob as minhas, tocada pela sua
atenção comigo. Eu quis beijá-lo, contudo, achei melhor não o fazer na
frente de Isa.
— Só estava pensando na vida. — Sorri e continuei: — Sei que
estou ficando repetitiva, mas obrigada por estar ao meu lado e por ajudar
Isabela. Minha filha gosta muito de você e realmente não sei o que faria
sem sua ajuda.
— Mãe, tô com sede — Isa reclamou, chegando de supetão e me
afastei, depressa.
Ela se sentou ao nosso lado e entreguei a garrafinha de água que
levara a ela. Minha filha tomou o líquido, sem tirar os olhos de mim e
Diogo que estávamos sentados muito próximos, e, sem que eu esperasse
soltou a pergunta:
— Mãe, porque todos os meus amiguinhos têm pai e irmãos e eu
não?
Pigarreei, pegando a garrafinha de sua mão e foi minha vez de tomar
um longo gole da água. Além de sua pergunta rasgar meu coração, aquele
era o tipo de questão que eu sempre temi responder, pois, como explicar a
uma criança que ela tinha um pai, o desgraçado que nunca a quis conhecer?
— Meu amor, nós já conversamos sobre isso. Você tem um pai, ele
só precisou fazer uma viagem muito longa e ainda não pôde voltar. —
Procurei uma desculpa decente, pelo menos uma que não traumatizasse
minha pequena.
— Eles disseram que sou uma enjetada e que eu nem devia ir à
festinha. — Nem quis corrigir a pronúncia da palavra que estava errada,
queria que esquecesse o que aconteceu.
— Amorzinho, você não é isso aí que eles falaram, ouviu? Esqueça
essa besteira. — Acariciei seu rosto e trouxe para sentar em meu colo. —
Conta pra mamãe, esse foi o motivo da briga na escola?
Isabela ficou em silêncio, apenas concordou com um rápido aceno
de cabeça.
— Lindinha, a professora ouviu a discussão antes da briga começar?
— Diogo perguntou e Isa desviou o olhar para o chão. Aquela carinha não
me enganava, ela escondia algo.
— O que foi, filha? Nós somos amigas, lembra? Você pode me
contar qualquer coisa.
— Eu sei, mas a tia pediu pra não falar porque você ficaria triste —
sussurrou, e uma lágrima deslizou por sua bochecha. — Quando a Marcela
me chamou de enjetada, eu não sabia o que significava e a tia explicou.
Virou uma bagunça, todo mundo conversando ao mesmo tempo, aí a tia viu
que eu fiquei triste e falou que o melhor era eu não ir na festa. Quando a tia
saiu da sala, a discussão começou e nós brigamos.
— Eu vou acabar com aquela filha da… — Diogo apertou minha
mão, chamando minha atenção para que eu não falasse besteira na frente de
Isa. Agradeci com um sorriso que não chegou aos olhos e me levantei.
Minha ira atingiu um grau perigoso ao ouvir aquele absurdo.
Primeiro pela professora ter dito para que Isa me escondesse aquela
história, já que Marcela era filha dela. Segundo por ter ouvido minha filha
ser chamada de enjeitada e, ao invés de cortar o assunto, explicou o que
significava ser enjeitada. Para fechar com chave de ouro, sugeriu que ela
não participasse da comemoração. Por isso Isabela estava triste daquele
jeito.
Engoli o nó na garganta ao vê-la, contudo, a atitude de Diogo
aqueceu meu coração. Ele se aproximou da minha filha e a apertou contra
seu corpo, como se o gesto fosse capaz de a proteger de todas as tristezas e
perigos que a vida pudesse lhe causar.
— Lindinha, vamos combinar uma coisa? Esqueça o que aconteceu,
o que seus coleguinhas disseram, tudo bem? Eles não sabem de nada.
— Tá, mas eu não quero mais estudar naquela escola.
— Filha, tá no final do ano, faltam quatro meses para terminar as
aulas.
— Eu não gosto de lá — continuou reclamando, o que me deixou
sem saber como agir. A verdade era que eu também não me sentia segura
em deixá-la voltar para aquela escola.
— Isa, olha para o tio — Diogo pediu, segurando o rostinho
delicado entre as mãos. — Sua mãe vai conversar direitinho com você, mas,
olha, brigar ou mudar de escola não vai resolver o problema. Sempre que
algum amigo mexer com você, te chatear, o melhor a fazer é contar para a
sua mãe o que está acontecendo. Não tenha medo, ela é sua melhor amiga e
vai te ajudar. Está bem?
— Sim.
— Agora, acho melhor juntarmos as nossas coisas e entrar. Olha o
temporal que vem vindo
— Posso ir na frente com a Mel?
— Pode, mas vá devagar e não precisa segurar a coleira da Mel. Ela
não vai fugir.
— Bem que você disse que havia algo estranho nessa história da
briga.
— Você terá que agir com calma, Gaby. É inadmissível o que
aconteceu, o problema é que infelizmente você não tem como provar as
coisas que Isa contou.
— Sabe o que mais me revolta? A criança que a Isa brigou, que a
chamou de enjeitada, é filha da professora. Diogo, enjeitada não é uma
palavra que uma criança de seis anos conhece. Se a Marcela chamou a
minha filha disso, é porque ouviu a mãe falar.
— Você tem razão, as coisas só se complicam, vamos tentar
esquecer isso por hoje. Não vamos deixá-las estragar nosso final de semana.

Não teve jeito.


Um temporal desabou sem que tivéssemos tempo de voltar para a
cidade e, temendo atolar no lamaçal que virara a estrada de terra, achamos
melhor passar a noite no sítio.
Quem gostou da novidade foi Isabela. Depois da conversa que
tivemos, minha filha voltou a ser a alegre e espevitada criança de sempre.
Especialmente porque a dinda prometeu a ela uma festa do pijama, com
direito a cabaninha de lençol, sessão de cinema e pipoca em seu quarto.
Minha amiga era boa em ludibriar a afilhada e não seria eu quem iria
reclamar, afinal, teria o quarto livre para ter uma noite de sexo quente com
Diogo.
Enquanto eu divagava, o homem dos meus pensamentos saiu do
banheiro enrolado em uma toalha e seu rosto se iluminou ao me ver. Os
cabelos recém lavados pingavam por seu ombro, pelo abdômen arrepiado
pela baixa temperatura, e fitei seu membro que começava a criar forma por
baixo do tecido felpudo preso em sua cintura. Sabendo que não adiantava
mais fingir qualquer que fosse o sentimento, desci o olhar por ele, feliz,
excitada, encantada e sem vergonha.
Aproveitei que o desejo também transbordava por Diogo para
provocá-lo. Eu podia ser inexperiente, mas gostava de ver como seu corpo
reagia ao meu.
— Minha vez de tomar banho — disse, fazendo uma força danada
para me manter séria.
Ao me levantar da cama, deixei o vestido de alças finas que usava
descer pelos meus ombros e cair aos meus pés. Abaixei em câmera lenta e o
peguei, depositando-o sobre a cama. Pronto. Somente de lingerie, me
preparei para continuar com o plano de atiçar Diogo, mas não consegui ir
muito longe. Ele segurou minha mão, impedindo minha passagem e lambeu
o lábio inferior, a atenção voltada para os seios que escapavam pela renda
do sutiã.
— Gaby… Gaby, até parece que vou te deixar sair desse quarto
agora.
A boca na minha foi a perdição. Seus lábios tomaram os meus num
beijo molhado, possessivo, enquanto suas mãos tiravam minha lingerie. Fiz
o mesmo, livrei-o da toalha e seu pau saltou livre, ereto, delicioso.
Hipnotizada, acompanhei seu corpo másculo reagir pulsante, ao mesmo
tempo que meu sangue esquentava, latejava, desesperada para senti-lo
dentro de mim.
— Diogo… — Salivei e tudo se perdeu em meio ao cheiro, aos
nossos corpos nus, as mãos que encontraram um o corpo do outro, ávidas,
querendo mais e mais.
— Tem uma camisinha embaixo da minha carteira. Pega e coloca
em mim — pediu, rouco.
Peguei a embalagem, rasguei o plástico e desci o preservativo por
seu membro com uma habilidade que nem sabia que tinha.
Tudo esquentou, tornando-se puro instinto e tesão. Ele me puxou
para que montasse em seu colo, pernas em volta da sua cintura, as mãos
segurando em minha bunda, sem desgrudar a boca deliciosa da minha.
Diogo buscou apoio em uma parede e me penetrou, metendo duro,
em estocadas fundas, rápidas, e foi preciso que bebesse dos meus gemidos
para que o som do meu prazer não ultrapassasse as paredes do quarto.
— Meu Deus... que delícia... — Gemi, o abraçando forte,
esfregando-me nele.
Diogo não foi terno e me sacudi ao sentir como me devorava, pela
primeira vez me comendo com uma pegada mais bruta, e adorei esse seu
outro lado. Acabei me envolvendo, mordi seu ombro, ele chupou meu
pescoço, seios, gritei abafado. Foi um choque de ventres, de apertos,
chupões, beijos. De pura loucura e tesão.
Ele estocou uma, duas, e de novo, metendo, arfando. Agarrei sua
nuca e me segurei, choramingando por mais. E assim nos beijamos
luxuriosos, apaixonados.
— Aí, Diogo… — Gozei, delirando com seu nome em minha boca.
— Isso, minha linda, amo quando goza chamando por meu nome.
Ainda ondulando, o ventre quente pelo orgasmo, senti que Diogo
estava à beira do orgasmo. Contraí os músculos da minha boceta para
intensificar seu prazer e, como fez comigo, grudei sua boca na minha,
engolindo seus gemidos. O beijo foi uma explosão de sentidos, peles
quentes e suadas escorregando, até que mais uma estocada o senti relaxar.
Sorrindo, enchi minhas mãos em seus cabelos e mirei seu rosto, sem
poder conter a emoção da paixão que transbordava dentro de mim.
— Vou ter que tomar outro banho. Quer vir comigo? — disse,
arfante, e deu um selinho rápido em minha boca.
Era sempre assim entre nós, quente, luxurioso, porém, cheio de
carinho, atenção, uma explosão de sentimentos.
— Sim, mas minhas pernas estão moles. Você terá que me carregar.
— Vamos lá então, garota, e fica tranquila que vou lavar cada
pedacinho desse seu corpo gostoso.
Apoiei a cabeça em seu ombro e deixei que me levasse. Em seus
braços eu me sentia completa. Viva. Feliz. Satisfeita.
Capítulo 18

DIOGO

Era pouco mais de uma da tarde quando entrei na lanchonete da


clínica para almoçar. Tinha passado uma manhã atípica, com Cora fora da
Pró Vita, enrolada com trabalhos burocráticos, consegui um tempinho livre
para trabalhar na ortopedia fazendo aquilo que eu mais amava: ser médico.
Perdi totalmente a noção do tempo.
— Boa tarde, Margarida, minha mais bela flor — gracejei, e peguei
a mão da atendente para beijá-la.
Assim que me afastei, vi a senhorinha de cabelos vermelhos ficar
ruborizada e acabei rindo do seu acanhamento. Mas pensa que durou muito
tempo? Que nada! Um segundo depois ela passou a mão pelos cabelos,
arrumando os cachos revoltos e voltou a soltar suas gracinhas.
— Você foi embora um rapaz magrelo, olha só agora, um
homenzarrão todo forte. Comeu fermento?
— São seus olhos, minha flor — respondeu, debochado, e alisei
meu peito.
Margarida riu, e antes que pudesse continuar, a porta da lanchonete
se abriu e ela direcionou o olhar para o novo cliente.
— Olá, minha querida. Aguenta um pouquinho que já te atendo.
Para minha alegria, ao virar me deparei com Gabriela, a mulher que
não saía dos meus pensamentos.
— Conhece a Gabriela? — Margarida perguntou, a atenção
passando de mim para Gaby.
— Meu pai nos apresentou. Boa tarde, Gabriela. — A encarei,
sorrindo, e me aproximei para dar um beijo em sua face, o aroma do seu
perfume tornando sua presença ainda mais impactante.
— Boa tarde, doutor Diogo — Seu rosto avermelhou
instantaneamente, como se estivesse sob o sol escaldante.
— Não precisa dessa formalidade, me chame apenas de Diogo. —
Ela concordou, a expressão tensa relaxando um pouco.
— E sua filha, Gaby, se acostumou com o gesso? — Margarida foi
simpática e deu para perceber que se preocupava de verdade com Isabela.
— Que nada. A pestinha questiona de cinco em cinco minutos se
não podemos ir no tio pra tirar. — Gabriela se referiu ao tio olhando para
mim, lançando-me um olhar divertido.
— E aí, meus queridos, o que vão comer?
Fizemos os nossos pedidos e consegui convencer Gabriela a sentar
comigo. Escolhemos uma mesa mais afastada e ficamos um de frente para o
outro. Ela parecia preocupada e ansiei para saber o que se passava dentro da
sua linda cabecinha.
— Um beijo por seus pensamentos — provoquei, os braços
cruzados sobre a mesa redonda.
— Estou preocupada, nossa situação é complicada.
— Descomplica, então — pedi, mas precisamos pausar a conversa,
pois a atendente chegou com os nossos pedidos.
— Diogo, você é meu chefe. Tenho medo de perder o emprego se
Cora descobrir o que andamos fazendo.
— Ela não fará isso — garanti firme, contudo, tinha noção de como
minha irmã poderia nos atrapalhar, aliás, ela já vinha dando sinais que faria
isso.
— Ah, fará, sim. Sua irmã é uma boa pessoa, mas gerencia isso aqui
com mãos de ferro.
— Eu sou dono disso aqui tanto quanto ela e não vou permitir que
Cora faça algo contra você. Confie!
— Confesso que estou assustada. Tô me sentindo de volta à
adolescência e essa não é uma sensação muito boa. Não foi um período
fácil — revelou, fazendo uma careta desgostosa.
Estreitei os olhos, curioso e segurei sua mão livre. Ela tentou recuar,
olhando para os lados, porém segurei seus dedos gelados firme e disse:
— Você tem jeito que foi terrível na adolescência.
— Até parece! — Não resistiu e riu, um pouco mais relaxada. —
Tirando o fato de ser mãe solo, fui praticamente uma freira. O que fizemos
por telefone foi meu primeiro ato de rebeldia contra a minha vida chata.
— Então, quer dizer que nunca tinha feito aquilo? Você me deixou
maluco.
— Claro que não! Você que está me levando para o mau caminho.
— Essa é a desvantagem de sair com homens mais velhos. Temos
muita experiência para compartilhar.
— É mesmo, Diogo? Você tem o costume de pegar as novinhas por
telefone? — perguntou, séria de novo.
— Não falei isso — recuei, temendo que meu passado a afastasse de
mim.
— Então, você nunca tinha feito aquilo por telefone? — continuou,
largando os talheres sobre o prato.
— Bem… — Vacilei, desviando o olhar para a minha comida quase
intocada e só depois de respirar fundo, respondi: — Não sou nenhum santo,
Gaby, mas nunca me interessei por mulheres nenhuma desse jeito.
— Tô brincando, Diogo, passado é passado. Aprenda uma coisa
sobre mim, não sou o tipo ciumenta, a não ser que dê motivos, claro. —
Piscou e levou a comida à boca.
Meu celular apitou anunciando o recebimento de uma mensagem de
Cora. Meu sossego havia acabado, mas antes de voltar ao trabalho precisava
fazer uma coisa.
— Eu preciso ir. Tenho uma reunião em dez minutos. — Fiz uma
careta contrariada.
— Deu minha hora também — avisou, levantando-se e pegou a
bolsa no encosto da cadeira.
Gabriela me seguiu e a levei na direção oposta ao caminho dela, o
ambulatório, e ela nem percebeu. Ao virarmos para um lado mais vazio da
clínica, sem funcionários ou pacientes circulando, a surpreendi ao abrir a
porta de um depósito pouco usado e a guiei para dentro.
— Tá doido! E se alguém nos vir?
— Não vão — garanti, e girei a chave na fechadura.
— É sério, doutor, não vamos transar aqui — disse firme, apesar dos
olhos e de sua respiração pesada mostrar o contrário.
— Eu sei, linda. Só queria um beijo para matar um pouco da
saudade. — Peguei-a pela mão e mergulhei o nariz em seu pescoço.
Não nos víamos há quatro dias e necessitava estar com ela. Dentro
dela. Metendo fundo e gozando gostoso. Como não podia, ia me embriagar
do seu cheiro e ficar com ele na memória até poder tê-la por completo.
— Você é o mais velho aqui, precisa botar um pouco de juízo na
minha cabeça, não me instigar a fazer loucuras — provocou, rindo, e me
abraçou.
— Ei, você me chamou de velho? — Apertei sua bunda e ela riu. —
Quer experimentar a potência do velhote novamente?
Quis tornar a conversa mais divertida, mas o pior era que Gabriela
tinha razão. Ela mexia comigo de um jeito que me transformava em um
adolescente inconsequente. Mesmo tendo uma vida sexualmente ativa desde
muito jovem, pulei a fase de curtir os momentos imprudentes, e reencontrá-
la talvez tenha despertado algo em mim. E gostava disso, sentia-me vivo,
como há muito não sentia.
— Querer, eu quero — Aproximou o rosto do meu e uniu nossos
narizes. — Mas, infelizmente, nem tudo o que eu quero, eu posso ou me
convém.
Peguei-a pela nuca e puxei para lhe dar um beijo de língua,
demorado como eu desejava e ela também. A eminência de ser flagrado não
atrapalhou em nada o tesão descomunal, a ereção pressionando
incontrolável a calça.
— Pronto, agora posso trabalhar — Dei um passo para trás, animado
e me afastei.
Peguei uma das pastas com os documentos antigos dispostas na
prateleira atrás de nós. Precisava de uma justificativa para estar na sala do
arquivo e minha evidência seria perfeita. Estendi a mão para que Gabriela
me acompanhasse, e a vi congelada no lugar, imaginei que por medo de ser
flagrada saindo dali comigo.
— Vamos fazer assim: você sai sozinha e eu vou cinco minutos
depois.
— Obrigada. — Gaby se apressou em dizer e a puxei para ficar a
minha frente.
Não me importei com seu medo, eu a entendia. O que ela não sabia
era que eu não tinha intenção de continuar escondendo o que tínhamos por
muito tempo.

No fim do expediente, fechei a planilha que acabara de enviar para


Cora e desliguei o computador, assobiando com a música que tocava na
caixa de som. Antes de sair, conferi a agenda para o outro dia, tinha duas
reuniões e precisava organizar a estadia de Lucas, que viria no sábado para
conhecer a cidade e a clínica.
Eu estava num momento relaxado, havia combinado de encontrar
Gaby em seu apartamento quando saísse da clínica, mas, aquele minutinho
perdido em minha sala destruiu toda a aura de felicidade. Cora apareceu,
entrando sem pedir licença e parou, olhando para mim como um cão
raivoso.
— Algum problema, Cora? — perguntei, parando o que fazia e
encostei na cadeira.
— O que deu na sua cabeça para se envolver com uma funcionária?
Pior, ainda saiu desfilando pelas dependências da nossa clínica com ela.
Diogo, eu preciso lembrá-lo que temos uma reputação e um nome a zelar?
— Cora, não quero brigar, sei bem o que estou fazendo —
murmurei, decidido a não começar uma discussão, e me levantei. Pena que
ela não teve a mesma intenção.
— Ah, sabe? Do mesmo jeito que sabia quando se envolveu com
aquela desclassificada da Paola? Esqueceu daquela merda toda?
— O quê? — Era sério que ela estava evocando uma história do
passado para me atingir? — Quem você pensa que é para se meter na minha
vida desse jeito?
Não conseguia acreditar que ela trazia aquela história do meu
passado. Algo que nem eu me lembrava mais. Paola foi uma ex-namorada
da época que ainda morava em Mococa, por quem fui apaixonado, e que me
enganou com uma falsa gravidez. Uma garota que viu em mim apenas a
gorda conta bancária da minha família, um jeito fácil de sair da pobreza que
vivia.
Como Cora ousava tocar naquele assunto? Apesar da mágoa que
viveu em meu coração no primeiro ano, eu havia superado essa história há
muito tempo, e hoje não passava de uma lembrança ruim.
— Eu sou a irmã mais velha, e não vou deixar que insista nos
mesmos erros. Diogo, você tem ao menos uns quinze anos a mais da idade
da Gabriela! Parou alguma vez para pensar nas intenções dessa menina?
Nem sei a razão das comparações, mas enquanto observava Cora,
foi impossível não pensar nas diferenças gritantes entre Gabriela e Paola.
De um lado, uma mulher incrível, batalhadora, uma mãe exemplar que dava
um duro danado para criar a filha sozinha; do outro, uma garota pistoleira,
desesperada para se dar bem na vida às custas dos outros e que foi capaz de
cometer a maior canalhice para alcançar seus objetivos.
— Pare de me tratar como criança, eu tenho quase quarenta anos e
não vou permitir que se intrometa na minha vida desse jeito.
— Você diz que não é, mas age como se fosse — retrucou ela,
diminuindo a voz. — Percebe como é ridículo? Eu fico até na dúvida se por
acaso não foi pra cama com uma novinha só pra reafirmar a sua
masculinidade.
— Chega, Cora! — reagi, lançando um olhar assassino na direção
da minha irmã. — Não permitirei que use o meu passado para causar
descrédito em minhas ações. Eu não tenho mais vinte anos, sei bem o que
eu faço e não pretendo me afastar da Gabriela. Se conforme.
Abri a porta e saí num impulso, sentindo que ainda precisava falar
mais coisas, extravasar a irritação de alguma forma, mas que não seria uma
boa ideia confrontá-la nervoso como estava. O melhor a fazer era ir pra
casa.
Cora deveria cuidar da própria vida. Tudo bem que ela não tinha
com que gastar seu tempo, já que não possuía nem um animal de estimação.
A culpa não era minha, que arrumasse um gato e fosse cuidar das sete vidas
dele.
Depois de deixar a clínica, dirigi de volta para o meu apartamento,
ou melhor, para o de Gabriela.
O percurso seria rápido, menos de dez minutos. Essa era uma das
vantagens de morar em uma cidade pequena, calma. Você saía exausto do
trabalho, porém com a certeza de que logo chegaria em casa.
Conforme passava pelas ruas, não pude deixar de admirar o belo
centro histórico, que contava com inúmeros casarões do período áureo do
ciclo do café, muito bem preservados. Além da imponente Igreja Matriz de
São Sebastião, com sua alta torre, as estrondosas árvores centenárias ao seu
redor.
Quando cheguei, toquei a campainha e olhei para a porta, o coração
ainda disparado pela discussão com minha irmã. Respirei fundo, deixando
para o lado de fora da casa de Gabriela todo sentimento ruim que Cora
despertara em mim. Só traria para Gaby e Isa coisas boas.
Não demorou nem trinta segundos para que a porta fosse aberta e
Alexandre, o primo de Gaby, me atendesse com o rosto todo maquiado.
Contudo, a julgar pela mistura de cores desordenadas em sua face, algo me
dizia que aquilo era obra de Isabela.
— Boa noite, Diogo. Desculpe a aparência, mas fui recrutado para
ser modelo de uma certa garotinha. — Ele fez um gesto com ambas as mãos
na direção do rosto e pediu que entrasse. — Entre, por favor.
A casa estava em uma calmaria estranha e o único som era de um
desenho animado, que vinha de um dos quartos, que supus ser de
Alexandre.
— A Gaby está em casa?
— Sim, no banho. Se quiser ir até lá, fique à vontade. Acho que não
preciso indicar o caminho. Não é? — questionou, piscando, e eu assenti,
sorrindo, aceitando sua sugestão.
Dei três batidinhas na porta e como não recebi resposta, entrei. O
máximo que poderia acontecer seria eu flagrar a garota pelada e não via
nada demais se isso acontecesse. Havíamos passado desse ponto.
Gaby estava de costas, em pé perto da cama cantando uma música
conhecida de Anitta, e, como usava fones de ouvido, não me ouviu entrar
de imediato. Tive a chance de ouvir a voz dela, de descobrir que era ruim
pra caramba, e que não parecia se preocupar em ser afinada, queria apenas
se divertir, curtindo seu momento de paz, feliz.
Sem perder mais tempo, fui direto até ela, circulei os braços ao
redor de sua cintura e beijei o pedaço de pele exposta de seu pescoço. Seu
corpo imediatamente arrepiou e sorri, vitorioso, por ver que não era
indiferente ao meu toque.
— Oi, doutor. — Gaby tirou um fone de ouvido e se virou, sorrindo.
— Você demorou.
— Olá, linda. Desculpe o atraso, Cora me pegou quando estava
saindo — disse, sem entrar em detalhes. Não queria que soubesse da minha
discussão com minha irmã, muito menos do motivo dela.
— Você teve sorte. Isa estava te esperando pra brincar de
maquiadora. — Rindo, ela jogou o cabelo úmido do banho para trás, e uma
mecha comprida e teimosa caiu em seus olhos conforme me abraçava.
Olhei-a, apaixonado, e a prendi atrás de sua orelha.
— Sério? Eu vi Alexandre na sala e tive uma amostra de como seria.
Na próxima faço questão de ser o modelo.
— Você parece tenso. Aconteceu alguma coisa?
— Não é nada, só problemas no trabalho. Sei de uma coisa que pode
fazer pra me relaxar.
— Hummm… sua ideia é deliciosa. Pena que não podemos pensar
em fazer nada disso enquanto Isabela não dormir. Já já ela descobre que
você está aqui e vem desesperada ver o tio Di.
— Estou com saudades da lindinha.
— Tem certeza de que você é real? — perguntou, enlaçando meu
pescoço, e me encarou.
— O que eu preciso fazer para você entender que estou contigo?
— Você está sendo incrível, Diogo, não precisa fazer mais nada. Eu
que tenho que parar de ser besta. O problema é que quando a gente está
acostumada a só levar tombo na vida, é difícil acreditar nas coisas boas que
acontecem.
— Pois, acredite, vou te ajudar a espantar essa nuvem negra de sua
cabeça. — Trocamos um beijo rápido, cheio de promessas. — A propósito,
como foi no colégio? Resolveu o que fazer?
— Então, fiz planos de chegar lá com tudo, exigindo explicações,
mas quando comecei a conversar com a diretora e ela veio com
desculpinhas sem sentido, vi que não valia a pena discutir. Só comuniquei
que queria transferência e fui embora.
— Você fez certo. Isso evitará estresse, inclusive para Isabela.
— Verdade. Agora preciso resolver qual escola colocá-la.
— Vocês são namorados? — Ouvimos uma voz infantil perguntar
muito curiosa e nos afastamos rapidamente.
Isa vagou o olhar de um para o outro, nos investigando com seus
olhinhos, curiosos.
— Você é muito bisbilhoteira, garota — Ela ralhou com a filha, e foi
de encontro à criança.
— Nossa, estava morrendo de saudades, e é assim que me
recepciona, lindinha? Cadê meu abraço? — perguntei, fingindo tristeza e
me abaixei para ficar na sua altura.
Em um minuto ela se pendura em meu pescoço, contando como foi
a brincadeira com Alexandre, esquecendo completamente a história do
namoro. Minha vontade era concordar, dizer de forma explícita o que
sentia, porém, precisava ter certeza de que não assustaria Gabriela com
minha intensidade.
Capítulo 19

GABRIELA

O pronto-socorro estava bem cheio naquela sexta-feira. Não tinha


encontrado com Diogo quando ele saiu depois que o despertador tocou
naquela manhã até ele aparecer atrás de mim.
— Ei, pessoal. Fiquei sabendo que as coisas estão quentes por aqui,
hoje. — Entrou na sala todo sorridente, e parou ao meu lado.
— Sim. Depois dessa última frente fria não tinha como ser diferente.
Geral tá gripada ou com alguma doença respiratória atacada — eu respondi,
enquanto guardava as caixas de luvas que carregava dentro do armário.
— Pode parecer loucura, mas sinto falta dessa agitação, de pegar um
pronto atendimento cheio — divagou, olhando para o nada.
— Coloca um jaleco e põe a mão na massa, doutor Diogo. Tenho
certeza que os colegas de profissão não se incomodariam de receber ajuda
— Clarice insistiu, mais sorridente que o normal.
— Me disseram uma frase impertinente esses dias, e que faz o maior
sentido. Era assim: Infelizmente, nem tudo o que eu quero, eu posso ou me
convém. — Ele me olhou com um olhar divertido e continuou: — Bom,
tenho que ir. Meu dia está uma correria.
Quando Diogo virou, não consegui evitar de observá-lo enquanto se
afastava. Ele havia se infiltrado em minha vida de maneira repentina, nos
dávamos tão bem, na cama ou fora dela, como se estivéssemos juntos há
anos. Sem contar que o homem era a personificação de um deus grego,
ninguém podia me julgar por encarar aquela gostosura.
— Terra chamando Gaby — Clarice zombou, estalando os dedos na
frente do meu rosto. — Fica tranquila que não vou te julgar, é mesmo difícil
prestar atenção em qualquer outra coisa com esse homem por perto.
— Bem, se vale como desculpa, o doutor Diogo, tem uma beleza
diferenciada dos médicos com quem estamos acostumadas a trabalhar —
comentei, dando de ombros, e peguei o prontuário do próximo paciente. —
Ah, lembra do carrão que admirávamos dias atrás? Era dele.
— Caraca, o carro é a cara dele. Sofisticado, exala poder e riqueza.
Você acha que ele é gay? — Ela se inclinou e cochichou, mudando
completamente o assunto. Quase engasguei com a própria saliva.
— Eu não! Por que acharia isso? — perguntei, apesar de saber que
aquilo não era verdade.
— Ele é um gostoso e ainda está solteiro aos quase quarenta anos.
Ah... a Marina contou que deu mole pra ele e o doutorzinho fingiu de
morto.
Não resisti e acabei soltando uma risada com sua resposta, adorando
saber que a periguete gostosona da clínica tinha sido rejeitada pelo Diogo.
Eu ia soltar uma piada, mas a porta abriu e uma carrancuda Cora
apareceu em sua pose de chefe controladora.
— Posso saber o que é tão engraçado para que eu consiga ouvir a
risada das duas do corredor?
— Nada não — respondemos, juntas.
— Muito bem. Clarice, volte ao trabalho e você, Gabriela, vá até a
Felícia e diga que te enviei para substituir a Vera, que faltou hoje. — Cora
bufou e se virou, mal deu um passo, voltou. — Fique de sobreaviso para o
caso de precisar substituí-la por mais alguns dias.
Concordei e ela me lançou um olhar estranho, como se quisesse
falar algo, contudo, se virou e foi embora.
— Que dia de cão! — disse ao fechar a porta de casa e colocar a
chave sobre o aparador.
Isabela e Alê assistiam TV distraídos, deitados no sofá da sala, e me
olharam curiosos.
— Vem ver desenho com a gente, mamãe — Isa pediu, esticando o
bracinho, e fui até ela.
— Daqui a pouco, amorzinho, preciso de uns minutos para
recuperar as forças. — Beijei sua bochecha e o rosto do meu primo. Como
estava entretida com o desenho animado, Isa me ignorou sem insistir.
Alê agiu do mesmo modo, conhecia meu jeito estressado e apenas
piscou, sabendo que quando eu chegava em casa resmungando daquele jeito
o melhor era me deixar quieta.
Suspirei e me sentei ao lado deles, em um dos móveis do
apartamento que eu mais gostava, um conjunto de poltrona e puff, que
servia de descanso para os pés. Tirei os sapatos, estiquei as pernas, que
estalaram, e apoiei a cabeça no encosto, de olhos fechados, tomando um
fôlego para recuperar as forças.
Meu expediente na clínica tinha sido muito cansativo e só consegui
encerrá-lo duas horas depois do normal. Passei quase o dia todo
perambulando pela cidade em atendimentos domiciliares, um serviço que
não era meu, e que Cora novamente designara para mim.
Não gostava de fazer acusações sem provas, só que nada tirava da
minha cabeça que ela fizera aquilo de propósito. Desde que comecei a sair
com Diogo ela estava diferente, tratando-me de um jeito grosseiro, com
indiferença. Nunca fomos amigas, mas ela costumava ser mais amigável.
Será que sabia do meu lance com o irmão dela?
Parei de divagar quando uma ligação em vídeo de Diogo apareceu
no meu celular e atendi. Ele me deu um sorriso empolgado, o que parecia
ótimo, pelo menos um de nós teve um dia bom.
— Oi, linda, já jantou?
— Não. Acabei de entrar em casa.
— Estava trabalhando até agora? — Assim que confirmei com um
aceno, ele continuou: — Você não sai do trabalho às quatro horas?
— Sim, mas hoje atrasei. Precisei substituir uma colega que faltou.
— Quer vir jantar comigo? O convite se estende a Isa também.
— Claro, sabe que nunca recuso comida. Vou tomar um banho
rápido e já volto.
Vinte minutos depois, toquei a campainha do apartamento de Diogo.
A porta se abriu e fui recebida por uma lufada do seu cheiro que flutuou até
mim, embriagante.
— Entra, querida. Cadê a lindinha? — Ele me recebeu sorridente e
olhou ao redor, levantando uma sobrancelha.
— Dormiu enquanto eu tomava banho. Alê contou que ela aprontou
todas hoje.
— Sério? De gesso e tudo?
— E algo segura aquela pestinha? — Ri, parando no meio da sala.
— Eu queria levá-la para jantar em um lugar bonito, onde
pudéssemos apreciar uma boa comida, um papo gostoso, mas estava
estressado, e o melhor remédio para mim nesses casos, é cozinhar. Uma
coisa garanto, minha comida é deliciosa. Qualquer uma delas. — Sorriu,
malicioso.
— Gente, que homem convencido.
— Fazer o que? Eu conheço meus dotes. — Piscou e agarrou minha
cintura. — Parece que não toco em você há uma eternidade.
— Então, aproveita que estou aqui e mata a saudade.
Logo seus lábios tocaram os meus e sua língua invadiu minha boca,
ávida, urgente. Ele apertou minha bunda, colando o corpo em mim, e
minhas mãos prenderam ao redor do seu pescoço, acariciando sua nuca.
Nos beijamos com paixão, sua língua sugando a minha, uma delícia.
— Eu realmente não tinha nenhuma safadeza em mente quando te
convidei para esse jantar, agora, já que estamos sozinhos, vou me aproveitar
muito de você.
— Sou toda sua.
Suspirei, totalmente entregue e dei um passo para trás para encará-
lo. Seus olhos desceram do meu rosto, passaram pelo decote do vestido e
pararam nas pernas.
— Ei, meu rosto está mais pra cima.
— Quem manda ser gostosa. Acabo me perdendo nessa visão que é
você. — Deu-me um beijo rápido e disse: — Vem comigo, preciso olhar
minhas panelas.
Diogo entrelaçou os dedos nos meus e saiu me puxando na direção
da cozinha. Cravei meus olhos em suas costas largas, adorando o que via.
Ele vestia uma camiseta cinza justa e uma bermuda escura, cheirava a
colônia, que devia ter acabado de passar, porém, o que chamou minha foi o
pó branco manchando sua roupa.
— O que é isso na sua bunda?
— Onde? — Virou, procurando a sujeira e respondeu: — Ah,
farinha. Estou cozinhando, lembra? — perguntou, divertido, e bateu a mão
na roupa para limpá-la.
— Uau. O que é? — Olhei para o balcão da pia e vi alguns tomates
assados em uma forma e várias bolinhas de massa dentro de uma forma de
vidro.
— Está tudo sobre a bancada. Dá uma olhada e tenta adivinhar. —
Dei risada e me aproximei do fogão.
— Você tá fazendo nhoque?
— Sim. Lembrei que era um prato que comia muito na casa dos seus
pais. Achei que você ia gostar.
— Amei sua escolha. Na verdade, eu era a culpada de sempre ser a
mesma comida. Eu amo nhoque.
— Fico feliz em ouvir isso.
Sorrimos um para o outro. Fiquei aliviada por ele não ter percebido
o leve incômodo ao mencionar nosso passado, não pelo que me acontecera
depois que engravidei, mas pelas desilusões que a Gaby adolescente viveu.
Quando seus olhos demoraram nos meus por alguns segundos, temi que
enxergasse o que não devia e falei:
— O cheiro está incrível.
— É uma versão mais saudável e totalmente caseira. Uso farinha
sem glúten na massa e molho fresco com tomates assados.
— Que você é desses que se cuida eu sei, é todo malhado de
academia. Não me diga que é desses que come tudo natural, vegano ou
vegetariano?
— Não mesmo, seria impossível, adoro uma boa carne. Só procuro
fazer boas escolhas dos ingredientes e alimentos que ingiro.
— Admiro quem consiga manter uma alimentação equilibrada. Com
trabalho, casa e filha para cuidar, confesso que me sucumbo fácil por fast
food.
— O que quer beber? — perguntou, indo até a geladeira. — Tenho
refrigerante, cerveja e vinho.
— Pode ser vinho.
Diogo retirou a garrafa da geladeira, explicou que era um Sauvignon
Blanc que trouxe de São Paulo e serviu duas taças. Perguntou se me
incomodava ficar na cozinha enquanto ele terminava nossa comida e como
neguei, permanecemos ali, bebendo vinho, conversando. Nos momentos em
que ele precisou usar o liquidificador para bater os tomates do molho, fiquei
feito boba, acompanhando sua destreza em cozinhar, como parecia
confiante.
O aroma tomou ainda mais conta do apartamento quando o timer do
forno apitou, e Diogo retirou a travessa, colocando-a diante de mim. O
queijo ainda borbulhava sobre o molho e torci para que tivesse tão bom
quanto estava bonito.
— Isso parece delicioso.
— Espere até provar — disse, e me serviu. — Nhoque com molho
rústico de ossobuco. Bom apetite.
Espetei duas bolinhas de massa e as coloquei na boca. Estava leve,
quase derretendo na boca, bom demais. O gemido de satisfação saiu sem
controle.
— Pelos sons está aprovado — Ele se sentou à minha frente e
sorriu.
— Aham. Bom é pouco pra descrever essa delícia. Você arrasou,
doutor, parabéns.
Depois do jantar, que estava surpreendentemente bom, ficamos
abraçados no sofá da sala, e nos perdemos contando histórias do passado.
Precisava ressaltar que Diogo aproveitara cada minuto, divertindo-se ao
reviver momentos vergonhosos e engraçados da minha infância.
— Sacanagem você saber tanta coisa sobre mim e eu quase nada de
você. Devia me contar umas sujeiras suas. Conta alguma coisa que eu não
saiba.
— Acha que sou maluco, não é? Nunca ouviu dizer que não se deve
produzir provas contra si mesmo?
— Chato — bufei, indignada.
— Quer mais vinho? — perguntou, pegando a garrafa sobre a mesa
de centro.
Concordei e minha taça foi enchida. Diogo e eu ficamos um bom
tempo sem nos tocar com segundas intenções, apenas leves carícias, e
bebemos quase toda a garrafa de vinho. Ele disse que o tempo serviria para
que a comida fizesse digestão, pois, o que pretendia fazer comigo seria
intenso demais. Percebi que eu tinha bebido demais quando ele se soltou
para se levantar um pouco e fiz manha, triste com seu distanciamento.
— Ei, onde vai?
— Vou dar uma voltinha para acalmar isso aqui — riu, apontando
para o volume sob a calça.
— Senta aqui que eu sento aí — incitei, desinibida pela bebida, e
bati a mão no assento do sofá.
— Senta que você vai de trem, de trem você não vai, senta aqui no
meu carai — Diogo completou, formando uma frase toda desconexa.
— Que foi isso? Não entendi uma palavra do que falou —
perguntei, rindo muito.
— Rima de moleque! Bom, tudo bem que não me lembro do resto
dela, mas está valendo.
— Nossa, verdade. Você e Junior faziam umas rimas de putaria
ridículas. Mamãe odiava e vivia brigando.
— Sabe, há muitos anos eu não fazia uma e hoje saiu naturalmente.
— Talvez o convívio com uma novinha tenha despertado o seu lado
cômico — provoquei, e pisquei, divertida. — Porque, vamos combinar,
quem te vê agora, todo sério, com esse ar de doutor fodão, nem imagina
como você era impossível quando jovem.
— Doutor fodão, é? Gostei do apelido. — Ele se sentou ao meu lado
e me puxou para seu colo. — Vem aqui que vou te mostrar como posso ser
fodão de verdade.
O rosto másculo e bonito ficou muito próximo do meu, e seus
braços me envolveram firme, colando nossos corpos, e senti minha pele
esquentar. Uma de suas mãos pousou em minha bunda, a outra subiu pelo
meu pescoço, e gemi ao ter minha boca tomada em um beijo necessitado.
Diogo lambeu os meus lábios, abrindo-os com a sua língua quente, numa
pegada gostosa. Agarrei seu pescoço com minhas mãos, trazendo-o para
mais perto de mim, embriagada pelo seu cheiro, seu gosto de vinho.
Irresistível.
Desejei estar deitada no sofá, com Diogo entre minhas, ou até
mesmo no tapete macio. Era definitivo. Ele me transformou em uma
devassa, desesperada por sexo. Sexo quente e suado com ele.
Quando me soltei dos seus braços e fiz menção de que me deitaria
no sofá, Diogo riu, acompanhou eu abaixar as alças do vestido e levou a
mão ao jeans para abri-lo, mas parou ao ouvir o barulho da campainha.
— Sério? Quem será? — resmunguei, subindo o vestido pelo corpo.
Eu me sentia tonta pelo excesso de vinho e me acomodei no sofá
novamente, esperando para ver quem seria a visita inesperada àquela hora
da noite. Só esperava não ser algo com minha filha. Não tinha condições de
dar nenhum passo sem que tudo girasse ao meu redor.
— Mãe?! — Ouvi Diogo dizer, espantado, e levantei a cabeça.
Quase tive um treco ao encontrar Francisca, mãe de Diogo, parada
na porta, seus olhos viajando de mim para o filho. Não podia me levantar,
causaria mais mal estar se ela me visse naquele estado levemente
alcoolizado, então, descruzei as pernas e passei as mãos pelos cabelos,
tentando organizar a desordem que eu devia estar.
— Oi, Diogo, achei que estivesse sozinho.
— Por que não me ligou avisando que vinha?
— Queria conversar sobre o estado de saúde do seu pai, e achei que
não precisava pedir permissão para visitar meu filho.
— A senhora sabe que não é esse o caso. Entre.
— Sim, verdade. — Ela fingiu um sorriso, que deu para ver que era
mais falso que o loiro do seu cabelo, e entrou. — Estou atrapalhando algo?
— Não. Acabamos de jantar.
— Vocês dois parecem estar se dando muito bem para duas pessoas
que acabaram de se conhecer. — Ela olhou para mim, e pude ver que estava
desconfortável.
— Gabriela é uma mulher maravilhosa, não teria como ser diferente.
— Ele sorriu carinhoso para mim e se virou para ela.
A careta que Francisca fez deixou bem claro que não gostara nada
da resposta do filho. Algo no olhar da senhora me incomodou, me fez sentir
indesejada, errada. Definitivamente, era hora de eu voltar para casa.
Levantei, rezando para não me esbarrar em nada e parei a alguns passos de
Diogo, que tinha a expressão frustrada.
— Bom, eu vou indo. Está tarde e eu estou cansada.
— Você não precisa ir.
— Preciso sim. Acho que o vinho tá fazendo efeito. — Bocejei,
teatralmente. — Adorei o jantar, a comida estava deliciosa, obrigada.
— Fico feliz que gostou. Boa noite, Gabriela. — Ele sorriu de um
jeito que parecia um pedido de desculpas silencioso. Abri mais um sorriso
para ele, torcendo para que não me abraçasse perto de sua mãe e depois
olhei para ela.
— Boa noite, Francisca. — Sorri, educada e saí.
Não sei porque, mas senti um arrepio estranho ao passar pela
senhora elegante e sair por aquela porta. Estava na cara que Francisca não
gostara nada de me encontrar com o filho. Só esperava que ela não tentasse
destruir o que tínhamos.
Capítulo 20

DIOGO

Precisava de uma bebida forte para encarar aquela conversa.


Conhecendo minha mãe, só pela sua expressão sabia que não gostara de
encontrar Gabriela em minha casa.
Fechei a porta assim que Gabriela entrou em seu apartamento e
segui para a bandeja repleta de bebidas, resgatando a garrafa do meu
whisky preferido. Bebi uma dose em um único gole, que desceu queimando
a garganta, e tornei a encher o copo. Respirei fundo, buscando energia para
o confronto que seria inevitável.
— Apesar de tudo, não foi uma surpresa encontrar essa menina aqui.
Cora tinha me falado do seu interesse intempestivo por Gabriela — disse
minha mãe assim que parei ao seu lado.
— Cora… entendi — rosnei, respirando fundo para não perder a
calma, e caminhei até a janela. — Qual é o problema de vocês?
— Não ouse falar comigo neste tom! — Levantou a voz,
repreendendo-me. — Eu sou sua mãe.
— Sim, minha mãe, não minha dona.
— Não tem vergonha, Diogo? — perguntou, indo em minha
direção.
— E do que, exatamente, eu deveria me envergonhar?
— Você tem quase quarenta anos! É um homem feito, reconhecido
na sua profissão, e continua agindo como um jovem bobo, guiado pelos
hormônios.
Estreitei os olhos para ela, sem entender aonde queria chegar,
contudo, lembrei-me de minha discussão com Cora e compreendi. Caralho,
parecia que estava ouvindo minha irmã falar. Minha mãe também
comparava Gaby com Paola. Inacreditável.
— Sinto muito, minha mãe..., não tenho culpa se a senhora e Cora
vivem presas ao passado. Não vou deixar que fatos acontecidos há quase
vinte anos interfiram no meu futuro.
— Não é possível isso! Já perguntou quantos anos essa menina tem?
— vociferou, continuando a procurar problemas.
— Vinte e quatro. E o nome dela é Gabriela, mãe, não “essa
menina”. — Minha pulsação estava disparada e foi preciso muito
autocontrole e respeito para não gritar.
— Ela é quinze anos mais nova do que você? — Minha mãe fez
careta, na certa não imaginava que fosse tanto.
— Sim. E estou pouco me importando com isso.
Estaria mentindo se dissesse que a diferença de idade não me
incomodava um pouco, mas Gabriela tinha uma maturidade incrível.
— Definitivamente, você perdeu o juízo. Para piorar, ela ainda tem
uma filha, vai fazer de tudo para te prender. Mal deve conseguir bancar os
gastos da criança, da casa, se envolver com você seria como ganhar na
loteria.
— Mãe, ouça o que vou dizer. Vocês tem uma imagem deturpada da
Gabriela, ela é uma mulher maravilhosa, dá sim um duro danado pra criar a
filha, só que é honesta, trabalhadora e nunca dependeu de ninguém para
sustentá-la. Mas, como falou, eu sou um homem feito e faz tempo que não
preciso dar satisfação da minha vida a ninguém. Se resolver ficar com ela o
problema é meu, ninguém têm nada a ver com isso.
Não conseguia me lembrar da última vez que discuti com minha
mãe, sempre fui respeitoso, contudo, as suposições e os ataques a Gabriela
estavam me deixando fora de mim.
— Meu Deus, Diogo. Ouça o que está dizendo. Você pode ter
praticamente qualquer mulher que quiser. Vai escolher uma que tem uma
carga pesada como essa, que te obrigará a criar o filho de outro homem? —
perguntou, ignorando minhas palavras.
— Não vou mais discutir esse assunto com a senhora. A vida é
minha, mãe, e dela, pode deixar que eu cuido. — Fui firme, deixando claro
o que pensava e ignorei as besteiras que falava.
Dona Francisca me encarou furiosa, engoliu a ira que crescia dentro
de si e deu-me as costas, saindo sem se despedir.
Senti um desejo insano de conversar com Gabriela, de me desculpar
pelo jeito grosseiro como minha mãe a tratou. Peguei o celular e vi que
havia poucos minutos que estava online no aplicativo de mensagens, resolvi
arriscar e mandei uma mensagem.

Diogo: Oi, Gaby, ainda está acordada?


Menos de um minuto depois, ela respondeu:
Gaby: Sim. Tomei um banho e acabei de deitar.
Diogo: Posso ir aí?
Gaby: Claro. Aproveita e dorme de conchinha comigo.

— Oi. — Gaby me recepcionou com um lindo sorriso e pegou em


minha mão. — Vem, vamos logo para o meu quarto para não acordarmos a
Isa.
Segui Gabriela pelo apartamento e entramos em seu quarto em
silêncio. Ela tentava demonstrar tranquilidade, porém, sua testa estava
franzida, mordia o cantinho da boca repetidamente.
— Ei, o que houve? Nunca te vi tão tensa.
— Acho que bebi demais. Podemos só dormir?
— Linda, eu não vim aqui com segundas intenções. — Quando ela
sorriu, mostrando que não acreditava em mim, agarrei sua cintura e disse:
— É sério. Embora você seja muito gostosa e eu queira sempre me
aproveitar desse seu corpo gostoso, hoje, só queria estar junto de você e me
desculpar por minha mãe ter estragado nossa noite.
— Diogo, não precisa se desculpar por sua mãe te visitar. — Passou
a mão no meu cabelo, depois segurou minha mão.
— Eu sei, mas minha mãe é uma pessoa complicada.
Gaby inclinou a cabeça para o lado, o sorriso desapareceu de seu
rosto e mesmo contra minha vontade fui obrigado a contar o que acontecia,
ou pelo menos parte dela.
— Francisca não gostou de me ver na sua casa, né? Eu percebi.
— Ela acha que sou muito velho pra você. — Respirando fundo,
senti meus ombros caírem.
— E o que você acha, Diogo?
— Se disser que a diferença de idade nunca me incomodou, estarei
mentindo, afinal, são quinze anos. Ainda tem o fato de te conhecer desde
criança, então. — Dei de ombros e continuei: — Tudo ficou bagunçado na
minha mente quando te reencontrei, mas, sabe, o que está acontecendo entre
nós é tão incrível, que decidi parar de perder tempo com besteira e deixar
rolar.
— Então, faz como eu. Liga o foda-se para a opinião alheia. É
libertador não precisar viver esperando sempre suprir as expectativas dos
outros.
— Perfeito. Só tenho medo que isso te assuste.
— Não vai.
Envolvi Gabriela em meus braços e nos beijamos sem pressa, ambos
aproveitando o carinho, os sentimentos que mesmo não ditos
transbordavam por nossas faces, corpos. Quando nos afastamos ela bocejou.
Deitei com ela em meus braços, a cabeça encostada em meu peito e ficamos
ali, curtindo a presença um do outro, até que senti a respiração dela se
aquietar, indicando que pegara no sono, e fechei os olhos, torcendo para que
tudo fosse fácil como Gabriela dizia.

Acordei com o barulho do celular tocando insistente. Abri os olhos e


praguejei ao constatar que devia ser bem cedo, o sol nem brilhava ainda do
lado de fora. Meu único compromisso naquele dia seria recepcionar Lucas e
apresentá-lo a Pró Vita, o que devia acontecer lá pelas dez horas da manhã.
Gabriela dormia com a cabeça deitada em meu peito, a perna direita
jogada sobre a minha. Infelizmente, o celular voltou a tocar e, por mais que
desejasse ficar ali, precisava atender a droga do telefone, antes que
acordasse toda a casa. Tive que fazer um grande malabarismo para alcançá-
lo sobre a mesa de cabeceira e o coloquei no silencioso. Passei uma mão
por baixo de sua cabeça, puxando meu braço devagar, e com a outra
coloquei um travesseiro no lugar. Não deu certo, assim que saí da cama
Gabriela acordou.
— Já vai? — Ela se virou, sonolenta, e se espreguiçou.
— Sim… Sinto muito te acordar, querida, mas esqueci de colocar a
droga do celular no silencioso.
— Não tem problema. É bom, assim posso me despedir.
— Quando terminar com Lucas te mando uma mensagem para
combinarmos algo. O que acha?
— Perfeito — bocejou, e enfiou o rosto no travesseiro. — Vou
dormir mais um pouquinho.
— Bom dia, linda.
— Bom dia.
Coloquei a calça e sai em silêncio, segurando os sapatos nas mãos
para não acordar Isabela e logo que alcancei o hall de entrada, toquei na
foto de Lucas que não parava de piscar na tela do celular.
— Diogo! — Lucas me cumprimentou antes mesmo que eu dissesse
algo.
— Por que você está me ligando a essa hora? Desistiu de vir?
— Então... — Ele titubeou, o que não era seu normal, e isso me
deixou em alerta. — Pelo contrário. Nós chegamos, estamos aqui na frente
do seu prédio. — Ouvi vozes rindo e falando ao mesmo tempo, o que me
confundiu ainda mais.
— Aqui? Quem é nós? — Enquanto conversávamos, abri a porta de
casa e fui direto para o meu banheiro.
— Resumindo, aconteceu um fato essa semana que me fez tomar
uma decisão drástica. Contratei uma empresa de mudanças e vim com
minha família para Mococa, antes mesmo de fecharmos o acordo de
trabalho. Trouxe até os cachorros.
— É sério? Isso não é do seu feitio.
— Situações drásticas, precisam de decisões drásticas. Enfim, você
virá nos recepcionar ou não?
— Você não quer subir?
— Não. Prefiro que desça. Dorinha está com fome e aposto que no
seu apartamento não tem nada que criança goste de comer no café da
manhã.
— Certo. Desço em dez minutos. — Encerrei a chamada e retirei a
roupa a fim de tomar um banho rápido. Minha mente fervia, estava curioso
para descobrir o que fizera uma pessoa metódica e sensata como Lucas
mudar de cidade de uma hora para outra.

— Ah, finalmente o doutor se dignou a aparecer — provocou Lucas,


assim que me viu sair pelo portão social do prédio.
Meu amigo estava encostado em seu SUV, de braços cruzados e com
um sorriso irônico nos lábios, mas o que me animou mesmo foi a linda
garotinha de 8 anos que sorria para mim pela janela do carro.
— Oi, tio Diogo, que saudade. — Ela abriu a porta do veículo e veio
correndo na minha direção, e agachei para receber um abraço.
— Também estava com muitas saudades, Dorinha. — Dei um beijo
em seu rosto e, ao me afastar e olhá-la um pouco melhor, me espantei em
como havia crescido. — Seu pai anda te dando fermento? Caramba, como
você cresceu.
— Para de puxar saco da minha filha e me conta o que andou
fazendo a noite passada que desmaiou e ninguém conseguiu te acordar.
Estamos desde às seis e meia da manhã te ligando, o porteiro interfonou, foi
até seu apartamento, tocou a campainha, e nada do senhor atender.
— Eu não estava no meu apartamento, mas essa é uma longa
história e te conto depois, a sós. Agora quero saber que história é essa de vir
de mudança. Por que não me avisou?
— Também não quero falar disso. — Apontou para a filha, que
voltara a sentar no banco de trás do carro. — Preciso alimentar minha filha
antes que criança desmaie de fome.
— E a mudança, como está?
— Contratei uma empresa para cuidar de tudo e eles estão desde
ontem na cidade organizando a casa nova. Disseram que a arrumação ficará
pronta por volta do meio dia de hoje. Tomara!
Perguntei o endereço e ele estendeu um pedaço de papel. Sorri ao
reconhecer o lugar. O condomínio residencial era novo, e ganhava
notoriedade entre os mais abastados da cidade por ter uma segurança
impecável e construções com altos níveis de requinte. Inclusive, minha
corretora já havia me levado duas vezes ao lugar para conhecer algumas
propriedades, que eu não gostei.
— Certo. Vou pegar meu carro na garagem. — Sorri, dando um
tapinha camarada nas costas de Lucas. — Estou muito feliz de tê-lo aqui,
Lucas. Bem-vindo, amigo.
— Obrigado. Apesar dos pesares, estou feliz também.

— Agora, me conta, Diogo, que história foi aquela de você estar no


prédio, mas não estar no seu apartamento. Arrumou um rabo de saia? —
Lucas jogou a pergunta na primeira oportunidade que teve, olhando para
mim com uma expressão divertida.
A casa já havia sido entregue e saímos para comprar algumas coisas
que faltavam. Na volta, paramos para abastecer o carro de Lucas e
decidimos tomar um café na loja de conveniência do posto de combustíveis.
Claro que ele não perderia a oportunidade de descobrir de uma vez o que
aconteceu comigo.
— Muito mais que um rabo de saia, meu amigo. Arrumei foi uma
paixão arrebatadora — confessei, externando meus sentimentos pela
primeira vez.
— Não acredito! O cara que pegava e nunca se apegava, finalmente
foi fisgado? Ainda bem que vivi para ver isso — zombou, batendo a xícara
de café na minha.
— Vai, pode dizer que avisou que eu estava solteiro porque ainda
não tinha encontrado a mulher certa.
— Jamais faria isso. Embora esteja gostando de ver essa sua cara de
bobo apaixonado, estou muito feliz por você, Diogo.
— Eu sei. Implicamos um com outro, mas é por pura zoação.
Porém, nem tudo está sendo esse mar de rosas que pensa. Minha mãe e
minha irmã resolveram implicar com a garota. Tive uma discussão horrível
com minha mãe, ontem.
— Nossa, por quê?
— Gabriela é quinze anos mais nova que eu, tem uma filha de seis
anos, e as duas mulheres malucas da minha família invocaram que a garota
está tentando me dar o golpe do baú.
— E não tá? — Olhou-me franzindo o cenho, preocupado.
— Claro que não. Gabriela é uma mulher incrível, dá um duro
danado para criar a filha. Ela é enfermeira na clínica, meu pai a adora e
confia nela.
— Então, se você confia, qual o problema?
— Minha mãe é cabeça dura, não vai ceder, tenho medo que
transforme a vida da Gaby em um inferno. E lhe digo, dona Francisca é
bem capaz disso.
— Olha, se me permite lhe dar um conselho, dê tempo ao tempo,
mas deixe a garota a par do que está acontecendo, sem segredos. Enfrentem
juntos e terão uma oportunidade de sair dessa ainda mais unidos. Palavra de
quem tem experiência no assunto. — Lucas me encarou com um sorriso
triste, um mar de sentimentos passando por seus olhos.
— Quer conversar?
— Não, amigo. O que aconteceu comigo foi antes de Martha, é
passado. Portanto, ficou lá atrás, em seu lugar.
Concordei com um aceno de cabeça e foi minha vez de questioná-lo.
— E o que aconteceu com você, para mudar os planos de última
hora.
— Me assaltaram no estacionamento do hospital em que trabalhava.
Um pivete, batedor de carteira com uma arma de brinquedo nas mãos. Não
aguento mais viver daquele jeito, com medo, inseguro se ia sair de casa para
trabalhar e não voltaria para casa no final do dia.
— Que foda isso, cara. Nem sei o que dizer. Olha, a violência está
em qualquer lugar, mas aqui terá uma vida bem tranquila e segura. Pode ter
certeza.
— É só isso que eu quero.
Capítulo 21

GABRIELA

Depois de ficar em uma indecisão terrível sobre qual escola


matricular Isabela, decidi por uma que a irmã de Ana indicou. Vanessa
garantiu que os funcionários eram prestativos e educados, sua filhinha
estudava lá há anos e amava o lugar. Outro ponto favorável foi o ensino
integral e a excelente proposta educacional.
Quem não gostou muito da novidade foi Isa. Ela tinha tirado o gesso
havia uma semana, contudo, a baixinha continuava irredutível quanto a
voltar a estudar. Estava sendo uma luta convencê-la de que aquilo era
necessário.
Voltei para o quarto da minha filha e sorri ao ver a cena, ela sentada
dentro da cabaninha das princesas conversando aos sussurros com sua
boneca favorita. Ou melhor, resmungando no ouvido de Mimi.
Eu a havia arrumado como uma princesa. Uniforme bem passado, o
cabelo loiro penteado para trás e preso por um rabo de cavalo, decorado
com um lindo laço cor de rosa.
— Ei, amorzinho, vamos? — Ajoelhei-me em sua frente e abaixei
para ser vista pela abertura da barraca. Ela acenou com a cabeça que sim,
disse algo no ouvido da boneca e saiu. — O que você falou para a Mimi?
— Nada. Só tchau — respondeu sem me encarar.
Os problemas com os coleguinhas da escola anterior deixaram
minha filha insegura. Sentei-me em sua cama, um sorriso confiante nos
meus lábios, e a acomodei sobre minhas pernas.
— Filha, eu sei que o que é novo assusta, mas não podemos deixar
que o medo e as inseguranças nos impeçam de seguir em frente.
— Mas ... e se acontecer alguma coisa, se alguém não for legal
comigo?
— Vai dar tudo certo. Olha, para te deixar mais tranquila, podemos
combinar uma coisa. Deixarei meu nome e telefone anotados no caderninho
vermelho que fica na sua mochila. Se acontecer qualquer coisa, pede para
um adulto me ligar, tá bom? — Ela levantou o rostinho, um pouco
hesitante, e continuei: — Prometo que vou na hora.
Sem receber nenhuma confirmação, considerei seu silêncio como
um sim. Não dizem que quem cala consente?
Coloquei a sua mochila e a minha bolsa nos ombros e saí apressada
para não atrasar. Dirigi o caminho todo conversando com ela, falando das
qualidades e novidades do novo colégio, torcendo para que minha
empolgação passasse para ela.
— É aqui? — perguntou, assim que estacionei, rostinho grudado no
vidro do carro para verificar a fachada do prédio.
— Sim. Bonito, né?
O colégio Arte do Saber possuía um lindo jardim na frente e se
dividia em dois blocos de três andares. Na visita que fiz na semana anterior,
vi que tinha um amplo pátio arborizado nos fundos, com playground e
bancos. Um ambiente acolhedor, bem diferente da escola antiga. Minha
filha ia amar, ela só precisava ser corajosa e enfrentar seus medos.
Quando seguimos até a parte de dentro do prédio, o sinal da entrada
dos alunos tocou estridente pelos alto-falantes, fazendo-me pular de susto.
Droga, era a mesma coisa que ouvir a sirene de uma ambulância, com o
agravante de o volume ser muito mais alto. Eu detestava aquele som
escandaloso, que mesmo depois de uma década as escolas insistiam em
usar.
— Vamos lá, amorzinho, vou mostrar a sua sala. Ela é linda.
De mãos dadas, seguimos até a sala de aula e a professora nos
recepcionou na porta. Cumprimentei-a, sorridente, entreguei a mochila e me
agachei para me despedir da minha menina.
— Eu te amo muito… — Acariciei sua bochecha e meu coração se
apertou ao ver uma lágrima deslizar por ela. Respirei fundo, lutando para
não ser a próxima a chorar, e continuei, descontraída: — Boa aula e não se
esqueça que não pode brigar. Promete pra mamãe?
— Prometo! Prometido. — Ela cruzou os dedinhos e o beijou, um
gesto conhecido por nós duas para formalizar nossas promessas.
Estiquei os braços e a envolvi em um abraço gostoso. Notei seu
coração acelerado e confirmei, mais uma vez, que tudo ficaria bem. Porém,
ao levantar a cabeça e meus olhos encontrarem o relógio da sala de aula,
quase tive um treco.
Perdi completamente a noção do tempo e havia passado meia hora
do meu horário de entrada no trabalho. Tive que sair às pressas do colégio.
Caramba, estava ferrada. Cora vinha pegando no meu pé desde que comecei
a sair com Diogo, sempre por motivos bobos, agora ela teria um real para
implicar comigo.

Entrei na clínica meio atrapalhada e segui direto para o vestiário.


Agradeci mentalmente por não encontrar com minha chefe pelo caminho,
mas o sorriso de deboche de Marina, a recepcionista que me detestava,
deixou-me com a sensação de que a fofoqueira se encarregaria de avisar
que cheguei.
— Quer saber, foda-se todo mundo — resmunguei, sozinha,
enquanto trocava de roupa.
— Olha, ela fala palavrão — Clarice, zombou, dando-me um
tremendo susto.
— Credo, mulher, quer me matar do coração?
— Desculpa, querida, estou com pressa. Deixei um paciente sozinho
para vir aqui te contar uma coisa importante — disse baixinho, como se
estivesse contando um segredo, e olhou para os lados.
— O que aconteceu? — Arqueei as sobrancelhas e larguei a roupa
que dobrava sobre o banco.
— A Cora estava te procurando mais cedo com uma expressão de
quem comeu e não gostou. Precisava ver, num mau humor que deu até
medo.
— Imagino que seja pelo meu atraso. Apesar de que ela não pega no
pé dos outros funcionários desse jeito, o problema dela é comigo. —
Irritada, passei as mãos pelo cabelo e voltei a guardar a minha roupa.
— Por que está dizendo isso?
— Por nada, amiga, deixa quieto — desviei do assunto, ou teria que
contar sobre o meu envolvimento com Diogo. — Eu agradeço muito pelo
alerta. Agora preciso ir para o meu posto.
— Nossa, também tenho que ir. Fui… — E saiu, desaparecendo
rápido como chegou.
Depois do episódio do vestiário, o dia correu tranquilo, bastante
trabalho, e nada fora do normal. Estava guardando alguns prontuários e
cantarolando uma música baixinho, quando escutei a porta do arquivo abrir.
Guardei a última pasta, disposta a sair rápido daquele cômodo minúsculo
em que mal cabia uma pessoa, e, ao virar, arregalei os olhos ao ver a pessoa
parada à minha frente.
Nem sabia o porquê da surpresa. Depois do aviso de Clarice, ficou
óbvio que Cora jamais deixaria o meu atraso passar batido. Até que
demorou para vir ao meu encontro.
Incomodada com sua presença, mesmo antes de ela abrir a boca
assumi uma postura defensiva. Torci para que minha chefe não
ultrapassasse os limites da educação, despejando sua irritação em mim. Eu
entenderia e aceitaria numa boa se chamasse minha atenção por algo
referente ao meu trabalho, mas, se minha intuição estivesse certa e o seu
problema comigo fosse pelo meu envolvimento com Diogo, não sei se teria
sangue de barata para aguentar seus insultos.
— Boa tarde, Gabriela, que bom ver que resolveu trabalhar — disse,
debochada, como se fosse costumeiro eu me atrasar.
Filha da mãe. Nesses quatro anos que trabalhava na Pró Vita, podia-
se contar nos dedos as vezes que faltei. Mesmo sendo mãe solo, sempre fui
profissional e só faltava por motivos de saúde.
— Boa tarde, Cora. Não entendi sua alfinetada. Sempre cumpri os
meus horários, nunca dei motivos para reclamações. Hoje me atrasei
porque, infelizmente, tive um imprevisto com Isabela — retruquei,
impaciente, minha cabeça dando sinais que começaria a doer.
— Alfinetada? Imagina! Apenas achei que teria que dobrar a carga
horária de alguma coitada para cobrir sua falta.
— Sério que pensou isso? Mas, sabe, te entendo, afinal, sempre sou
eu a coitada que cobre os furos dos outros — respondi, sarcástica,
encarando-a sem abaixar a cabeça.
— Nem tanto assim, não é. Afinal sempre foi a protegida do papai e
agora é a do meu irmão.
Senhor, dai-me paciência. Do jeito que as coisas andavam,
ficaríamos horas naquele jogo de ofensas. Uma de nós duas precisava
encerrar o bate-boca, e teria que ser eu. Conhecia Cora o suficiente para
saber que ela ia até o fim em uma discussão, até detonar seu oponente. Já vi
funcionárias saírem chorando da clínica.
— Onde quer chegar com essa provocação, Cora? Por favor, não
quero problemas. Preciso do trabalho.
— Então, espero que seus atrasos não se transformem em faltas. O
fato de você estar trepando com o dono não te exime de ter que seguir os
horários e regras da clínica.
Engoli em seco, sem saber se revidava ou enfiava o rabinho no meio
das pernas e saía dali.
Seu sorriso vitorioso e sua postura arrogante quase me fizeram
responder. Quase. Porque sabia que era isso que queria. Sua intenção era
que eu perdesse a calma e partisse para a ignorância. Uma briga, talvez.
Assim, teria motivos para me despedir. Não tinha outro motivo para uma
mulher tão centrada baixar o nível desse jeito.
— Desisto, Cora. — Peguei a caixa vazia que havia levado com os
prontuários e passei por ela. Ao abrir a porta, a encarei e disse: — Vou
repetir. Não quero confusão e não vou entrar na sua, discutindo com você.
Se quiser falar sobre trabalho, sabe onde me encontrar.

Parei em frente ao portão da casa de Ana e toquei a campainha três


vezes seguidas. Ainda me sentia alterada por causa da conversa acalorada
com Cora e precisava desabafar com minha amiga, pôr para fora um pouco
da raiva que borbulhava dentro de mim.
Depois que saí da sala de Cora, enviei um áudio gigante para a Ana
contando o que aconteceu e ela me fez prometer que sairia do trabalho
direto para sua casa. No final, acabou que precisei ir para lá de qualquer
jeito. Por causa do meu atraso da manhã, Felícia me segurou na clínica até
depois do meu horário mais uma vez e, como minha amiga estava de folga,
se prontificou a buscar Isabela no colégio.
— Oi, Ana.
— Olá, amiga. Vai com calma para não explodir na frente da sua
filha. A bichinha não tá acostumada a te ver nervosa desse jeito. —
Concordei com um sorriso fraco e passei por ela.
— Onde a Isa está?
— Na cozinha, bebendo água.
Como se ouvisse seu nome, minha filha entrou na sala, serelepe
como sempre, e veio até mim.
— Oi, meu amor.
— Mãe, a escola é muito legal. Eu brinquei no parquinho, tive aula
no computador, fiz até uma amiguinha nova.
Isabela contou aos tropeços, quase que num fôlego só e sua voz
animada melhorou um pouco o meu humor. Olhei para baixo, minha filha à
minha frente sorrindo, graciosa, e me abaixei para abraçá-la.
— Eu falei que ia ser incrível, lembra? Mãe sabe das coisas.
— Isa, a pizza que pedi deve estar quase chegando. Por que não vai
tomar banho enquanto esperamos? — Ana pediu, e, para meu espanto,
minha filha obedeceu logo de primeira.
Isabela correu animada pela sala e sumiu pelo corredor.
— Não tô legal. Obrigada por cuidar da minha pequena e ainda dar
banho e comida. Não sei o que seria de mim sem você.
— Tô vendo. Vai… desembucha. O que a filha da mãe da Cora
aprontou?
— Eu já contei tudo por telefone, amiga. Tô abalada desse jeito,
nem foi pelo que ela falou, mas porque me sinto irada por ter tido que ouvir
aquelas coisas calada, sem poder reagir.
— Imagino. Você sempre tem uma resposta na ponta da língua e
nunca gostou de levar desaforo para casa.
— Me segurei pra não dar na cara dela. O pior é que Diogo nem é
meu namorado e Cora resolveu agir como uma cunhada jararaca caninana.
— Você precisa ter muita calma, Gaby. Nós conhecemos a Cora,
sabemos como a danada é tinhosa, e pode ter certeza que ela continuará te
atormentando para que desista de Diogo.
— E esse é o meu medo. Sinto que uma hora eu vou ter que escolher
entre o trabalho e o Diogo.
— E qual seria a sua escolha?
— Aí é que tá. Eu ficaria com Diogo, sem dúvida nenhuma. Agora
me diz: como vou sustentar a minha filha se perder o emprego?
— Gaby, pensa fora da casinha. A Pró Vita não é o único lugar que
pode trabalhar. É verdade que nosso salário é fora da média, mas você pode
arrumar outro lugar incrível.
— Está certa, mais uma vez. Vivo falando para a Isabela que ela não
pode ter medo do novo, que precisa viver e deixar que o tempo acerte as
coisas, e não sigo o que eu mesma prego.
— Sei bem o que é isso. Dou tantos conselhos pra você, e não
pratico nem metade deles.
Pega de surpresa por sua declaração, levantei a cabeça e virei em
sua direção. Ana estava atenta a tela do seu celular, por isso demorou a
perceber que a encarava.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não. — O modo como mordeu a parte interna da bochecha
deixou claro que ela não estava dizendo a verdade.
— Ana! — adverti, a expressão dura diante da minha amiga.
— Certo, aconteceu algo sim. — Ela suspirou, e, ao deixar a
máscara de mulher forte cair, uma lágrima desceu por seu rosto. — Bruno
pediu um tempo. Disse que está confuso quanto ao que sente por mim.
Franzi a testa, chocada, porque sempre achei que eles tinham uma
relação de amor inabalável.
— Filho da puta! — soltei, irada. Na verdade, não sabia se me
revoltava com o desgraçado do noivo de Ana ou comigo, que não percebi
que o relacionamento da minha amiga não ia bem.
Avancei na direção de Ana e a abracei apertado. Dei a ela todo o
meu apoio e carinho, e ficamos ali, quietinhas, até que seu pranto cessou.
— Sabe, eu estou muito triste, claro, foram cinco anos juntos, mas,
se for ver, o Bruno está certo. Não existia mais aquele fogo gostoso entre a
gente, só amizade.
— Não sei o que dizer, amiga. Não pensei que isso pudesse
acontecer com vocês.
Mudamos de assunto ao ouvir o barulho da porta do banheiro ranger
e fingimos estar conversando sobre o meu dia no trabalho.
— Mãe, olha o desenho que eu fiz.
Capítulo 22

GABRIELA

Sexta-feira à tarde era dia de eu fazer uma ronda pelos pacientes que
ficavam sob minha responsabilidade. O que significava que passaria um
bom tempo aferindo pressão, administrando medicação e garantindo que
meus velhinhos ficassem bem. Tudo o que fazia precisava ser anotado nos
prontuários físicos e eletrônicos, para que nenhuma informação fosse
esquecida de repassar aos técnicos de enfermagem que trabalhariam no
final de semana.
A equipe de enfermeiros e técnicos em enfermagem da Pró Vita se
dividiam em dois tipos de escalas de trabalho. O turno de 12/36h, que
significava trabalhar um dia sim e outro não, e os que tinham uma carga
horária de seis horas diárias, sendo cinco dias na semana e um no final de
semana. E esses eram revezados, uma semana trabalhava no sábado e a
outra no domingo.
Comigo não funcionava assim. Talvez por isso Cora me acusou de
ser a protegida do doutor Nelson. Desde o final do estágio ele permitiu que
eu trabalhasse de segunda a sexta-feira, em nove horas diárias que
compensavam as folgas dos finais de semanas e feriados. Uma regalia que
pouquíssimas tinham ali.
Por sorte, naquele dia todos os funcionários estavam em seus postos
e eu não teria que ficar até tarde para cobrir ninguém. Na verdade, desde a
segunda-feira em que Diogo questionou sobre meus horários, Felícia não
havia pedido que ficasse até tarde. Eu podia apostar que ele desconsiderou o
meu pedido de não falar com a irmã, pois, ao contrário do que imaginara
que acontecia, o humor de Cora comigo piorou e muito. Não sabia onde
isso ia acabar, com ela desistindo da implicância ou eu do trabalho.
Troquei o soro com a medicação de dona Gertrudes, que dormia
serena, e peguei seu prontuário. Meu coração apertou quando vi o histórico
da senhorinha. Ela tinha diabetes e sua glicemia vinha totalmente
desregulada. Ora alta demais, ou baixa ao ponto de fazê-la perder os
sentidos.
— Finalmente te encontrei! — disse uma voz desconhecida, num
tom nada amigável.
Poderia não reconhecer a voz, mas o rosto da mãe de Diogo era
inconfundível. A senhora elegante, em seu vestido de grife que exalava
poder, encarou-me com o cenho franzido, a boca torta pelo semblante
contrariado, os braços cruzados sobre o peito. Como eu não respondi, ela
continuou:
— O gato comeu sua língua? — Ela continuou, em seu tom irritado,
e foi se aproximando da cama da paciente.
— Não. Minha língua está no lugar. Apenas não acho legal arrumar
confusão no quarto de uma paciente.
— Você é muito bonita, Gabriela. Sabe, confesso que quando
descobri sobre seu casinho com meu filho, achei que Diogo só iria se
divertir e logo te daria um pé na bunda, mas me enganei. Subestimei sua
inteligência. Você foi mais esperta do que imaginei. Está fazendo de tudo
para amarrar meu filho.
— Sabia que seu filho é maior de idade, vacinado e dono do próprio
nariz? Diogo não é esse idiota inocente que você e sua filha pensam que é.
Ele sabe cuidar da própria vida.
— Eu achava isso até você entrar no caminho dele. Não sei o que
fez, só que deve estar fazendo muito bem feito, ele não parece o mesmo.
Pensando bem, olhando melhor para você, consigo imaginar o que anda
aprontando para deixar meu filho doido.
— Ah, não! Não vou ficar ouvindo suas acusações e insultos. —
Revirei os olhos e peguei a bandeja de medicação para sair do quarto, mas
parei quando a ouvi voltar a falar.
— Aproveita bem o tempo que passa com o meu filho, porque em
breve ele vai voltar a razão e te enxotar da vida dele. — Seu tom foi frio e
meu coração gelou ante a possibilidade de acontecer o que disse. Um
calafrio percorreu meu corpo, e arrumei a postura para que não percebesse
como suas palavras me abalaram.
— Veremos!
— Vou avisar pela última vez. — Ela ergueu o queixo imponente e
deu um passo na minha direção. — Se afaste do Diogo, você e sua filha. Sei
que já percebeu que a criança é o ponto fraco dele, e não o deixarei criar a
filha de outro homem, muito menos que se case com uma mulher como
você.
— Você é louca… Não pode querer controlar assim a vida do Diogo
— Endireitei a postura, irritando-a ainda mais.
— Só cuido daqueles que amo.
— O que está acontecendo aqui? — Ouvi a voz preocupada de
Diogo vindo atrás de mim e logo sua mão tocou a base da minha coluna.
— Nada, filho. — Francisca riu falsamente e acabei soltando o ar,
frustrada.
— Eu tenho que trabalhar. — Não me dei ao trabalho de responder-
lhe, virei para Diogo e me despedi com um sorriso fraco. Sai da sala
desnorteada. Sem condições psicológicas para atender nenhum paciente,
peguei o corredor para a saída dos fundos com as palavras de Francisca na
mente.
“Aproveita bem o tempo que passa com o meu filho, porque em
breve ele vai voltar a razão e te enxotar da vida dele.”
Perdida em um turbilhão de sentimentos, não vi quando alguém se
aproximou e fui tomada por um abraço apertado. Não precisei levantar a
cabeça para saber que era Diogo me abraçava, seu cheiro e seu toque eram
inconfundíveis.
— Meus Deus, está chorando? Me conta o que houve, Gaby, por
favor.
— Por que não me contou que sua mãe era contra nós dois juntos?
Lágrimas escorreram por minhas bochechas e deixei o pranto vir
sem vergonha. Solucei, arrasada por não ser aceita, com medo de que
aquela mulher terrível pudesse nos afastar.
— Vem comigo! — Diogo entrelaçou os dedos nos meus e me levou
para sua sala, que ficava próxima de onde estávamos. Ao passar por sua
secretária, avisou que não queria ser incomodado por ninguém, nem mesmo
por alguém de sua família, e nos trancou lá dentro.
— Senta.
Pediu e me aconcheguei no sofá macio. Ele foi até o frigobar na
lateral da sala e voltou com uma garrafinha de água. Só quando percebeu
que eu parava de tremer que continuou:
— Me desculpe, a culpa é toda minha. — Deu um beijo em minha
testa e se levantou. — Eu devia ter previsto que minha mãe seria capaz de
fazer uma coisa dessas.
— Para de besteira, Diogo, você não tem culpa de nada. Mas devia
ter me contado. — Fui até ele, que havia se recostado cabisbaixo em sua
mesa e olhava fixo para mim.
— Não quis te incomodar com essa besteira. Simplesmente porque
não importa o que ela ou qualquer outra pessoa pense. A vida é minha…
nossa, Gaby.
— Sua mãe não entende isso, aliás, sua ordem foi bem direta: “Se
afaste do meu filho, você e sua filha."
Omiti a parte em que ela acusou que eu daria o golpe da barriga,
para obrigá-lo a casar comigo e criar a filha de outro homem. Foi
humilhante demais ouvir aquelas palavras e eu não repetiria suas
insanidades.
— Não faça isso, por favor… não dê ouvidos ao que quer que minha
mãe tenha dito — sussurrou, sua testa colada na minha. — Eu morreria se
perdesse vocês duas.
Suas palavras soaram tão verdadeiras e intensas, que a minha reação
imediata foi abraçá-lo e beijá-lo, até que toda a agonia em meu coração
passe.
— Não vou! — confirmei, acariciando seu rosto.
Ainda preocupado, ele afastou os papéis que estavam espalhados na
mesa e me colocou encostada nela. Entrelaçou os braços em minha cintura e
abocanhou os meus lábios num beijo quente e fogoso.
— Preciso sentir você, Gaby… — Ele suspirou, fechando os olhos.
— Tem gente lá fora.
— Eu sei. — Diogo avançou, puxando minha calça e minha
calcinha ao mesmo tempo e me colocou sentada sobre mesa, nua. — É só
não fazermos barulho.
— Ah, doutor, se souberem que...
O meu apelo se perdeu no prazer de ter sua boca em mim. Havia
algo diferente em Diogo, seus toques pareciam desesperados, aflitos, como
se precisasse urgentemente se enterrar dentro de mim.
Desci minha mão direita pelo seu corpo até alcançar o botão da sua
calça. Libertei sua ereção, que saltou rígida para fora da cueca e comecei a
massageá-lo da base até a cabeça. Diogo fechou os olhos em êxtase, gemeu
baixinho, sua mão apertando meu seio sob a blusa de malha.
Uma mão desceu até meu clitóris e senti um aperto mais firme em
meu mamilo que me arrancou um suspiro alto. Antes que os sons do meu
prazer se transformassem em gemidos, ele tomou minha boca de novo e
enterrou um dedo dentro de mim, entrando e saindo.
— Você é tão gostosa! — Buscou a mão que estava entre minhas
dobras e chupou dedo por dedo, a língua passando por eles devagar, sem
tirar os olhos dos meus.
A visão de Diogo nu era sempre deliciosa, pena que nem tive tempo
para admirar, pois o safado estava enlouquecido para transar de uma vez.
Porém, quando estava abrindo minhas pernas para me penetrar, parou como
se se lembrasse de algo e puxou a carteira jogada ao na mesa. Mexeu,
retirando de dentro um preservativo e descartou a embalagem sem
enrolação.
Ao voltar, posicionou o pau sobre a minha abertura e puxei Diogo
para mais perto, precisando tocar, cheirar, senti-lo através de todos os meus
sentidos. Ele gemeu em meu ouvido, movendo os quadris na minha boceta
sem me penetrar, depois me beijou, chupando meus lábios, esfomeado.
— Porra, estou viciado — murmurou, rouco, quando finalmente me
penetrou. — Poderia ficar dentro de você o dia todo.
Ele me devorou, rápido e com força. Meus gemidos o incentivaram
a continuar com a pegada mais bruta, com certeza ficaria marcada por seus
dedos, pelos chupões que distribuía no meu colo sem pena.
— Meu Deus, doutor… assim — gemi contra a sua boca quando seu
dedo estimulou meu clitóris, ao mesmo tempo que me comia na velocidade
alucinante.
— Estou com medo de te machucar — confessou, parando por um
segundo e encostou a testa na minha.
— Continue, sem medo — autorizei, arranhando suas costas. — Me
come do jeito que quiser.
— Assim você complica a minha vida, Gaby. Estou me segurando
para não dar uns tapas na sua bunda e te fazer gritar de prazer.
— Agora não posso gritar, mas vou adorar que repliquemos essa
cena quando estivermos realmente a sós. — Agarrei seus cabelos e lambi
sua boca.
Diogo não respondeu, apenas agarrou meus cabelos em seu punho
fechado e começou a estocar mais rápido, um vai e vem alucinante que
tirou meu fôlego. Um sorriso vitorioso escapou de mim quando o senti
vibrar. Naquela posição, o orgasmo se formou rápido em meu ventre e
acabei gozando, sentindo cada terminação nervosa conforme minhas
paredes internas pressionavam Diogo.
— Vai, linda, goza que vou explodir com você.
Senti sua respiração pesada em meu pescoço e ele beijou meu
ombro, depois a bochecha, a boca, enquanto gemia gostoso. Eu ainda
latejava com as sensações do orgasmo quando o senti ficar mais duro e seus
movimentos foram diminuindo, ao mesmo tempo que me encarava.
— Estou gozando… porra, Gaby, veja como me faz gozar gostoso,
não preciso nem mexer muito, só sentir a porra vir — sussurrou, encarando-
me cheio de tesão.
Suas estocadas foram curtas, pude senti-lo vibrar dentro de mim, e
em nenhum momento seus olhos desgrudaram dos meus. A conexão que
dividimos ali foi intensa e diferente. Mesmo que não houvesse uma
declaração, pude sentir que nos conectávamos além do sexo, uma ligação
que ia até nossas almas.
Capítulo 23

DIOGO

Pelo modo como chorou, era óbvio que Gaby não me contou tudo o
que aconteceu. E aquela certeza se infiltrou em cada célula do meu ser,
queimando e dilacerando meu coração. Minha mãe e Cora precisavam parar
de se intrometerem na minha vida e eu teria que fazer algo urgente para
resolver essa situação de uma vez por todas.
E eu começaria por Cora.
Procurei por minha irmã em sua sala e fui informado por sua
secretária que ela saiu mais cedo. Como a conhecia, imediatamente, soube
que estava na casa dos nossos pais, fofocando com nossa mãe sobre o meu
envolvimento com Gabriela.
Deixei a clínica e fui direto ao encontro das duas. Quando cheguei,
estranhei ao encontrar um Peugeot amarelo parado atrás do carro de Cora.
Só havia uma pessoa que eu conhecia que tinha um automóvel daquele:
Fabiana. O que não consegui compreender era o que a mulher que até a
pouco tempo frequentava a minha cama fazia ali.
Como tinha a minha chave e não queria que me vissem, entrei pela
porta da frente sorrateiramente. O piso de madeira antigo por muito pouco
não denunciou minha chegada, mas os anos de moleque que passei ali
serviram de algo.
Caminhei pelas emendas do assoalho onde o barulho seria inaudível,
pé ante pé, e parei ao ouvir a voz de Cora. Me senti ridículo, um homem
independente de 40 anos prestando a um papel daqueles, contudo, segui
com o que fazia, pois precisava saber o que acontecia.
— Eu percebi que algo estava acontecendo, não nos falamos há dias.
— Meu filho perdeu o juízo. A garota é quinze anos mais nova que
ele e ainda é mãe solo. Está na cara que quer dar o golpe do baú — mamãe
discursou, imperativa como sempre.
— Francisca, não acho que o Diogo seja ingênuo como vocês
imaginam — Fabi ainda tentou argumentar, mas sua opinião foi abafada e
ignorada.
— Fabiana, precisamos de você. Diogo perdeu a noção do ridículo e
não sabemos mais o que fazer. — disse Cora, interferindo na conversa.
— Não posso fazer o que estão me pedindo. Sou amiga do Diogo há
anos, seria incapaz de prejudicá-lo desse jeito.
A forma como a loira elegante encarava as mulheres, o semblante
sério, o apertar firme da bolsa em seu colo, deixou claro que estava aflita,
desesperada para sair dali.
— Obrigado, Fabi. Pelo menos alguém nessa sala tem juízo.
Entrei no cômodo, irritado, e encarei minha mãe, que nem piscava
um olho, nervosa por ser pega em flagrante, mas não desfez a pose
arrogante. Fui até a minha amiga e a cumprimentei com um beijo no rosto.
Pedi desculpas e me afastei.
— Sinto muito. — Sua pele branca atingiu um avermelhado
uniforme com a descarga de adrenalina de presenciar a situação
constrangedora.
— Vem, vou te levar até a porta. — Elas se despediram com um
leve aceno de cabeça, e, ao chegar na porta, continuei: — Desculpe pela
confusão.
— Quero que saiba que jamais viria se soubesse o real motivo da
conversa. Cora me convidou para tratarmos sobre uma doação para a ONG
em que sou voluntária, não imaginei que seria para isso.
— Eu sei, fica tranquila. E vou me certificar para que essa tal
doação seja feita. Prometo.
— Nossa, agradeço. Esse dinheiro ajudará e muito as crianças do
abrigo — Fabi agradeceu e saiu.
Voltei para a sala e encarei as duas mulheres sentadas em um sofá de
couro, imersas em seus próprios pensamentos.
Minha mãe julgava bastante. Era uma mulher sistemática, de
princípios enraizados e com uma mente bem fechada quando queria suas
vontades aceitas. Por isso, hesitei em começar uma discussão, sabia que não
adiantaria muita coisa, no entanto, precisava que ela entendesse que eu
também não desistiria de Gabriela.
— Eu nunca pensei que pudessem chegar a tanto.
— Nem nós imaginávamos que você perderia a cabeça por uma
ninfeta — rebateu Cora, postura ereta e olhar matador.
— Chega, Cora, não admito que ataque a Gabriela desse jeito.
— Vai mesmo criar a filha de outro homem? Dar o que é nosso para
uma bastarda? — Cora continuou a soltar suas insanidades, descontrolada.
— Meu Deus, acho que voltei para o século XIX. Cora, qual é o seu
problema?
— O que está acontecendo aqui? — Um timbre rouco invadiu a sala
e não precisei me virar para saber que meu pai se aproximava.
— Essas duas malucas resolveram pegar no pé por causa do meu
envolvimento com Gabriela.
— Filho, você tem consciência do que está fazendo? Lembre-se que
tem uma criança no meio disso. Ela pode se apegar a você e você a ela. Se
não der certo, o sofrimento será grande.
— Já aconteceu pai. Eu as amo.
— Como pode amar a filha de outro homem? — Foi a vez da minha
mãe falar, indignada.
— O desgraçado nunca quis saber da menina. Se Gabriela aceitar,
um dia, eu serei o pai de Isa e darei todo o amor de pai que a pequena não
teve até hoje.
— Meu Deus — murmurou minha mãe e começou a chorar.
— Mãe e Cora, com todo o respeito, preciso que entendam uma
coisa com bastante clareza. — Respirei fundo, tentando me controlar. —
Mãe, se me ama como diz, precisa parar de questionar minha escolha.
Pensam que conhecem Gabriela, a julgam, mas não sabem de nada. Papai
sabe do que estou falando, ele trabalha com ela há anos, conhece a índole
dela. Eu cansei disso, de ter que ficar me justificando, dando explicações.
Então, prestem bem atenção ao que eu vou dizer. Não vou desistir da
Gabriela. Se não pararem com a perseguição, eu vou voltar para São Paulo
com Gabriela e Isabela, e construirei minha vida lá, longe de vocês. Eu sou
um homem independente, tenho minha carreira consolidada, inclusive, nem
meu apartamento de lá não foi vendido ainda. Não quero submeter a mulher
que eu amo a tudo o que vocês duas são capazes.
— Ama? — Cora bufou, descrente, e minha mãe soluçou mais uma
vez.
— Dou minha palavra que isso vai parar, meu filho. Vocês duas
ouviram? Ou param com isso ou tomarei medidas drásticas. Eu me separo
de você, Francisca, e te demito da clínica, Cora.
— Claro, como sempre o senhor ficará do lado do seu filhinho
preferido, o mesmo que te abandonou e foi usufruir da sua fortuna em São
Paulo. Não da filha que ficou ao seu lado e dedicou toda a sua vida a
trabalhar com o senhor. — Assim que terminou de jorrar suas sandices,
minha irmã me olhou de soslaio, me escaneando por inteiro. Vi em seu
rosto um ressentimento que nunca percebi.
— Você está doida, Cora. Eu não abandonei ninguém, fui em busca
dos meus sonhos, coisa que você nunca teve coragem de fazer. E mais,
dependi do dinheiro do nosso pai apenas durante a faculdade. — O silêncio
imperou enquanto eu falava, permitindo que o eco da minha voz ressoasse
alto pela sala e percebesse o quanto estava alterado. Respirei fundo,
decidido a encerrar a discussão, que foi longe demais para o meu gosto. —
Quer saber, pra mim chega!
— Filho, não saia assim, nervoso. — Minha mãe segurou meu
braço, os olhos vermelhos pelas lágrimas derramadas.
Apesar da preocupação genuína, a voz suave, protetora, não
conseguia no momento esquecer as loucuras que fizera. Nada justificava
seu controle exacerbado.
— Me deixe! Lembre-se do que eu falei, mãe, se me quiser vivendo
aqui, pare de se intrometer na minha vida e controle a Cora para que ela
pare também — esbravejei, no limite da sanidade.
Só havia uma pessoa que poderia me acalmar. Uma não, duas.
Gabriela e Isabela eram sempre um bálsamo para a minha vida maluca.
Peguei o celular e enviei uma mensagem. A resposta veio em segundos,
junto com um convite para passar em seu apartamento quando chegasse.

Foi Gaby quem abriu a porta. A primeira coisa que me atingiu foi o
seu delicioso perfume. Nossa! Minha cama ficou com o cheiro dela na
última vez que transamos apaixonados por dias. Com um short curto, uma
blusinha de botões cor de rosa e os cabelos presos em um coque no alto da
cabeça, ela era uma visão e tanto. Mas o que mais se destacava, porém, era
o sorriso afetuoso.
Ela me lançou um olhar avaliador e ficamos nos encarando a dois
passos de distância por uns dez segundos, até que se aproximou e disse:
— Aconteceu algo… você está triste? — Aquela era uma pergunta
retórica, claro. Às vezes, Gabriela parecia me conhecer melhor que eu
mesmo.
— Sim, mas não quero falar sobre isso agora. Quer me ajudar? —
Ela concordou e eu continuei: — Me dá um beijo.
— Isa pode nos ver. — Ela olhou para dentro do apartamento para
confirmar se a filha não nos via.
— Não vai. — A puxei para um canto longe da porta e selei nossos
lábios com um beijo quente, porém, rápido.
— Entra, preciso terminar o jantar.
Assim que passei pela porta, fui atacado pela Mulher Maravilha.
Olhei para baixo e sorri com a cena. Isabela usava uma fantasia da heroína,
a tiara pendia torta em sua cabeça, e agarrava em minhas pernas com seus
bracinhos frágeis como se fosse me derrubar de verdade.
— Ela é toda sua — Gaby disse e saiu rindo na direção da cozinha.
— Meu Deus, que menina forte!
Ela soltou uma risadinha baixa e permaneceu agarrada em mim até
que resolvi entrar na brincadeira e caí no chão. Não demorou para eu ser
atacado por beijos, abraços, e por bracinhos que envolveram meu pescoço
em um abraço carinhoso.
— Eu sou muito fortona.
— Muito, conseguiu me derrubar.
Isa ficou de pé e pude observar melhor sua roupa. Vestia uma saia
de tule azul sobre o collant vermelho, mais os braceletes, botas de um
vermelho brilhante nos pés e um laço tipo cowboy pendurado na cintura.
Muito fofinha.
— Muito bem, pessoal. O jantar estar pronto. — Gabriela voltou,
batendo palmas e esticou a mão para me ajudar a levantar do chão.
— Não era pra essa menina estar brincando de boneca? Não tenho
mais idade para isso.
— Bom, não que meninas devam só brincar de bonecas e princesas,
mas concordo com você, seria mais tranquilo se Isa escolhesse dançar, por
exemplo. O problema é que ela tem um tio safado como Júnior, que detesta
ser cobaia nas brincadeiras de meninas, e, sempre que vem para Mococa
inventa algo novo.
— O Júnior está aqui?
— Sim, tá no banho.
— Calma aí, maninha, tô aqui — Júnior riu e entrou na sala.
Tínhamos a mesma idade e continuávamos com o mesmo porte físico. A
diferença estava na forma de se vestir. Eu, um pouco mais tradicional, com
camisa social e calça estilo alfaiataria, e Júnior de jeans escuro e camiseta
preta.
— Dr Diogo Ferreira Libardi está vivo e retornou para Mococa. —
O sorriso foi crescendo em seu rosto e no meu também.
Júnior me surpreendeu com um abraço. Eu não esperava uma
recepção calorosa como aquela e precisei de alguns segundos para
corresponder ao seu aperto. Quando fui embora e perdi contato com ele,
imaginei que nunca mais restabeleceríamos a nossa amizade, e pelo visto
estava errado.
— Cara, quanto tempo! Bom te ver. — Nós nos abraçamos daquele
jeito que os homens costumavam se cumprimentar, com tapas fortes nas
costas.
— Digo o mesmo. Tô feliz demais de ter voltado. — Meus olhos
desviaram rapidamente para a Gabriela, que ajudava Isa a tirar os braceletes
da fantasia.
— Já entendi tudo. Depois quero saber que negócio é esse que tá
rolando com a minha irmã. Não vou bancar o ciumento, mas preciso ter
certeza que não a fará sofrer.
— Você tem minha palavra que não farei isso. Os cabelos brancos
vieram precocemente e trouxeram muito juízo pra minha vida.
— O que ficou fazendo em São Paulo que nunca voltou?
— Enfiei de cabeça nos estudos e no trabalho. Sabe como eu sou,
não é? Essa mania de exigir a perfeição de mim mesmo meio que me
transformou em um robô. E você, Gaby me contou que formou em
engenharia, mudança radical de planos, hein?
— Nossa, tenho muito para contar. Tanta coisa aconteceu.
— Ah, terão que deixar essa conversa para depois. Vamos jantar que
a comida está esfriando.
Capítulo 24

GABRIELA

Logo depois do jantar Isabela foi vencida pelo cansaço e dormiu


ainda de fantasia. Diogo ajudou com o processo de tirar os adereços que
poderiam machucá-la durante o sono e não sossegou enquanto não me
convenceu a vir para o seu apartamento.
— Tô me sentindo uma péssima mãe por colocar minha filha pra
dormir e vir transar com você. Ainda mais por deixá-la em casa sozinha
com o Júnior, que não entende nada de crianças.
— Não diga besteiras, Gaby, você é uma mãe maravilhosa.
Estava pensando seriamente em voltar para casa, quando Diogo
deitou sobre mim e se esfregou, fazendo-me sentir sua ereção deliciosa sob
a calça. Sua boca tocou meu colo exposto e os dedos trabalharam
rapidamente em desabotoar os botões da minha blusa. Diogo agia como se
não quisesse que sobrasse tempo para eu protestar, o que ele não sabia era
que eu jamais o faria parar.
Conforme ele me deixava nua, sentia minha vagina começar a
reagir, piscando de desejo, e me perdi em um mar de lamentos de prazer
quando, ao liberar meus seios do sutiã, ele o abocanhou cheio de fome.
— Preciso saber se podemos transar sem camisinha — murmurou,
ao se afastar, parecia atordoado. — Usei as últimas no nosso último
encontro e esqueci de passar na farmácia. Estou limpo, fiz exames
recentemente.
— Por mim tudo bem. Eu tomo anticoncepcional e meus exames
também estão em dia.
Sim, eu não transava, mas era obrigada a tomar o remédio para
controle da minha menstruação que era toda desregulada.
— Sei que é um passo muito grande de confiança, Gaby, mas…
Acho que está na hora de assumirmos nosso namoro. Não tenho mais idade
para namorar escondido.
Nossa, como assim? Será que ouvi direto?
— Oi?
Abri a boca para extravasar o surto interno em uma pergunta
qualquer, e me calei ao ser penetrada por seus dedos ágeis, frios, indo fundo
dentro da minha carne. Senti o mundo girar, minha vagina se contraiu em
espasmos potentes e agarrei o lençol, pois, ao contrário, seus cabelos
sofreriam com meu aperto.
— Porra, mal te toquei e já está toda molhadinha — Seus dedos
iniciaram uma massagem deliciosa sobre meu clitóris e deixei que o
primeiro orgasmo viesse.
— Ah, Diogo… isso.
— Quero você gemendo e gritando meu nome — sussurrou,
lambendo meu mamilo. — Depois vou meter gostoso nessa bocetinha
apertada até ver minha porra escorrendo por entre suas pernas.
Joguei a cabeça para trás, deitando-a sobre o travesseiro e rebolei
em sua mão ao sentir o orgasmo me dominar. Soltei um grito agudo sem
querer e ele tapou minha boca, com a sua, sem parar de acariciar meu ponto
sensível.
Puta merda! O orgasmo veio e me atingiu em cheio, espalhando-se
por meu corpo todo. Diogo abocanhou o mamilo eriçado e, o chupando
esfomeado, não parou até que eu caísse relaxada em seus braços.
— Adoro te ver gemer, mas acho melhor não fazer barulho. Minha
vizinha é geniosa e odeia ouvir minhas putarias.
— Ela não odeia, só estava morrendo de inveja da sortuda que você
comia.
Diogo sorriu e beijou o meu ombro. Sem dizer uma palavra,
levantou para livrar da roupa que ainda usava e deitou entre minhas pernas.
— Mas não devia. Nenhuma outra mulher que passou por minha
cama tocou meu coração como você fez. Eu só quero você, Gaby, de todos
os jeitos. Na minha vida, na minha cama, no meu coração.
— Você sempre consegue me deixar sem palavras.
Enquanto eu falava, seus olhos não desgrudaram dos meus, do
mesmo jeito que sua mão livre continuou a deslizar por meu ventre,
acariciando, apertando minha pele.
— Garanto que te deixarei mais vezes sem palavras essa noite. —
Diogo me lançou um olhar enigmático e me virou bruscamente, empinando
minha bunda.
— Caramba, tá achando que sou boneca — murmurei, surpresa com
a facilidade com que me posicionou na posição que queria.
A posição me deixou com meus seios e joelhos pressionados no
colchão macio, e me arrepiei inteira quando seus dedos alisaram minha
bunda antes de apertarem a carne tão forte que um gemido esganiçado sai
da minha garganta.
— Ah, querida, se segura. Meus quinze anos a mais de experiência
vão te fazer gritar ou te deixar sem palavras. Você escolhe.
Ele me penetrou sem qualquer aviso, sabendo que eu estava
lubrificada do orgasmo recente. Eu gritei, excitada por suas palavras e
maravilhada de como seu membro me possuía e parecia preencher até
minha alma.
— Gostosa pra caralho! — gemeu, estocando devagar, tão
lentamente que eu conseguia sentir cada centímetro dele me alargando. —
Porra, meter tendo a visão privilegiada da sua boceta me engolindo me
deixa louco.
Agarrei o travesseiro, adorando como seu membro duro me comia
naquela posição. Sua pegada era firme, desesperada e um tapa forte me
pegou desprevenida e acabei gritando. A dor e o prazer duelando, fazendo
minha boceta pular ainda mais em torno do seu pau.
— Você gosta, não é, dessa pegada mais bruta? — Concordei, e ele
começou a estocar com um pouco mais de força, chocando seu corpo contra
o meu de um jeito ruidosamente excitante. — Então, rebola no meu pau,
Gaby.
— Puta merda… Que delícia — murmurei, quase sem ar, mas sem
parar de rebolar.
Empinei a bunda, rebolei gostoso, e entramos em uma dança
sensual. Deixei que me fodesse com força, o colchão trepidando no ritmo
dos nossos corpos, e rezei para que ninguém no meu apartamento nos
ouvisse. Eu me sentia uma devassa, experimentando tudo aquilo, feliz como
nunca estive por viver algo que nunca imaginei, nem nos meus mais belos
sonhos.
— Porra, além de ser apertadinha você ainda me suga pra dentro de
sua boceta desse jeito, faminta.
— Senhor… Diogo, eu vou gozar.
— Espera, quero que goze olhando nos meus olhos.
Resmunguei com a parada repentina, contudo, Diogo inverteu
nossas posições mais uma vez, colocando-me sentada sobre seu membro e
nós dois arfamos ao me penetrar. O clima mudou e o Diogo safado cedeu
lugar ao romântico, carinhoso. Ele encostou a testa na minha e ficamos em
silêncio por alguns segundos, seus olhos exteriorizando o turbilhão de
sentimentos que também habitava dentro dele.
Sua língua enroscou na minha com um beijo de tirar o fôlego, ao
mesmo tempo que eu explorava aquele peitoral sarado e peludo que ele
ostentava. Conforme eu mexia, sentia os músculos rígidos se
movimentarem junto, ficando cada vez mais fora de mim.
— Vai, linda, rebola no meu pau.
Não demorou para que eu começasse a me mover, porém, diferente
de como tínhamos feito até ali. Comigo no comando, o entra e sai de dentro
de mim foi lento, contemplativo, as estocadas longas fazendo meu sangue
vibrar.
— Se não quiser que eu goze agora, é melhor diminuir o ritmo.
Ansiosa, agarrei seus cabelos, nossos olhos conectados, e me
esfreguei ainda mais nele, roçando meu clitóris que latejava. Perdemos o
controle. O orgasmo veio tão forte que grudei minha boca na sua para não
gritar e apertei os braços no pescoço de Diogo, que continuou estocando
firme e se desmanchou segundos depois dentro de mim.
— Você é maravilhosa, Gaby — murmurou, ofegante. — Nunca
gozei tão rápido na vida. Isso porque ainda precisei segurar a porra por
diversas vezes.
— Nossa… Isso foi…
— Sim. — Riu e, quando percebeu que estava me levantando,
apertou-me e não me deixou sair. — Espera.
— Não acredito… já está pronto pra outra? — perguntei, incrédula,
e deslizei a boca em seu pescoço.
— Olha pra mim — Diogo tocou minhas costas, mexendo com meu
cabelo e beijou meus lábios. — Te amo, Gaby — soltou, como se tivesse
falado aquilo outras vezes, e abriu um sorriso. — Espero que goste de ouvir
e não se assuste com isso.
Fitei Diogo com atenção e ele permaneceu sério, sem desviar o
olhar. Meu maior medo era que dissesse aquilo no calor do momento de
quem acabara de gozar. Contudo, o receio não impediu meu coração de
criar esperanças quanto a um futuro ao lado dele.
— Sei que você ainda tem dúvidas e não espero que diga de volta
agora. Mas precisava que soubesse dos meus sentimentos. — confessou, e
senti que meu silêncio o deixou inseguro.
— Não tenho problema em falar, Diogo. Eu também te amo, e há
bem mais tempo do que imagina. Só tenho medo de me machucar… de
machucar a minha filha. Eu sei que sua família jamais aceitará o nosso
relacionamento.
Fechei meus olhos e escondi o rosto no pescoço dele. Meus olhos
arderam e uma lágrima desceu, esquentando meu rosto e molhando a pele
de Diogo.
— Não chore, meu amor, por favor. Parte meu coração vê-la desse
jeito — disse, segurando meu rosto com as duas mãos.
— Desculpa, não queria estragar o momento. Sabe, fiquei cascuda
com as rasteiras que a vida me deu e sou capaz de suportar muita coisa, mas
Isabela não. Ela é um serzinho doce, inocente e não merece ser rejeitada por
mais ninguém.
— Isso não vai acontecer, confia em mim. Eu sei que a situação é
complicada, mas nós vamos dar um jeito.
— Eu confio, doutor. — Sorri, confiante, e sua firmeza me animou.
Ele tocou meus olhos molhados e segurei a mão dele, acariciando
seus dedos, até que me aconchegou mais uma vez dentro de um abraço.

Às sete da manhã, eu ainda não tinha dormido o suficiente e Isabela


me acordou pulando sobre mim. Então, resolvi preparar um café reforçado
para nós duas e Júnior, que sempre levantava faminto. Eu estava acabada.
Bem feito, quem mandou ficar transando até tarde com meu namorado,
sabendo que em casa havia uma criança que acordava com as galinhas.
Namorado…
Eu ainda não acreditava que Diogo tinha se declarado. Passei dias
guardando meus sentimentos para mim, temendo assustá-lo, e a
surpreendida fui eu.
— Faz mais rápido se ficar olhando?
— Droga, que susto. — Encarei meu irmão, irritada, e o vi se sentar
na cadeira à minha frente.
— Desculpa, pensei que tinha ouvido. Chamei seu nome três vezes.
— É, não acordei direito ainda.
— Depois da noitada de ontem, deve ter sido mesmo difícil levantar.
— Nem começa, Júnior — retruquei, sem um pingo de vontade de
conversar com ele sobre a minha vida sexual. — Isa me tirou da cama na
força do ódio. E você, por que está de pé tão cedo?
— Relógio biológico é uma merda. Acordo todo dia nesse horário.
A luz da cafeteira acendeu indicando que o café estava pronto, e
enchi duas xícaras, entregando uma para Júnior. Sentei ao seu lado e, como
ele, assoprei o líquido fumegante e tomei um gole da bebida. Voltei minha
atenção para ele e o peguei me observando, o olhar preocupado e com um
ar de que queria perguntar alguma coisa.
— Vai, Jú, pode contar o que está passando na sua cabecinha.
— Não é nada. Só é meio surreal minha irmã tá de rolo com o meu
amigo.
— De rolo não, Júnior, nós estamos namorando. Fui pedida em
namoro ontem à noite. — Meu irmão abriu a boca e congelou aquele
movimento pelos segundos que se passaram até reagir. E eu desatei a rir.
— Não creio! Caralho, o Diogo não perde tempo.
— E como. Não imaginei que as coisas entre a gente fosse
desenrolar tão rápido.
— Como tá se sentindo? Eu sei que gostava do Diogo quando era
novinha.
— Pra você não tem como negar, né, Jú? — confessei de uma vez e
depois suspirei, deixando as mãos caírem em meu colo. — O Diogo fez
parte dos meus sonhos durante boa parte da minha adolescência, e nunca
imaginei que eu teria uma chance por causa da diferença de idade.
— Você tá de boa com o fato dele ser mais velho?
— Eu amo o Diogo, muito, e tanto faz se ele tem 39 ou 24 anos,
como eu. O problema está sendo a mãe e a irmã, que não aceitam o nosso
relacionamento.
— Nunca fui com a cara da Cora. Desde novinha ela era metida,
antipática, tratava os outros como se tivesse o rei na barriga. Na real, nem
parece irmã do Diogo.
— Cora sempre me tratou com educação e nunca tive atrito com ela.
Agora que começou a me causar problemas no trabalho e estou fazendo um
esforço danado para não cair nas provocações. Penso só na Isa, tenho medo
desse rolo chegar nela. Nossa pequena sofreu tanto por minhas escolhas
erradas.
— Não pense assim. O Diogo vai dar um jeito naquelas duas
malucas. — Ele parou me encarando um pouco ressabiado, porém, respirou
fundo e continuou: — Mana, eu queria te fazer uma pergunta pessoal.
Posso?
— Senhor… que medo. Vai, manda. — Fechei os olhos e tapei o
rosto com as mãos.
— Você nunca contou quem era o pai da Isabela e eu também não
perguntei. Você já tinha tanta coisa pra lidar e não queria causar mais
tristeza. Quem é ele, o desgraçado nunca quis saber da criança? — Foi
Júnior quem trouxe aquele assunto à tona, mas ele era tão incômodo que
meu irmão ficou tenso. Com as mãos apoiadas no encosto de uma cadeira,
nem piscou, atento às minhas expressões.
— Eu agradeço por respeitar e não ter questionado na época. Foi
sofrido ser abandonada como eu fui. Bom, não tem muita coisa pra contar
sobre o Vitor. Ele se mudou para São João da Boa Vista para cursar a
faculdade de Direito e acho que a cidade natal dele era Guaranésia. Quando
ficou sabendo da gravidez ele disse que não podia assumir um filho e
desapareceu, abandonou a faculdade e nunca mais o vi.
— Filho da puta. — Ele me abraçou ao se inclinar e eu permiti que
me consolasse.
— Eu o odiei e culpei pelas coisas que me aconteceram durante um
bom tempo. Mas os anos foram passando e entendi que eu também tinha
minha parcela de culpa. Podia ter prevenido a gravidez, e não fiz. Não vou
mentir, sinto mágoa ainda, não pelo que me fez, e sim por sua decisão de
não ser pai, que afeta Isabela.
— Nossa menininha é forte, vai vencer isso e nós vamos apoiá-la
em tudo — tranquilizou-me, sentando mais perto e me abraçou.
— É, vamos sim.
— Estou entrando. — Assustei ao escutar a voz de Diogo bem
próximo da cozinha e sequei o rosto depressa para que não me visse chorar.
— Bom dia, namorado.
— Bom dia, namorada, gostosa.
Diogo abriu um daqueles sorrisos safados que me deixava cheia de
ideias e abaixou para me dar um beijo na boca.
— Ei, não comecem com sacanagem na minha frente. Não preciso
ver meu amigo dar uns pegas na minha irmã.
— Deixa de palhaçada, Jú, não vamos fazer nada. Esqueceu que tem
criança em casa?
Levantei para pegar uma xícara para Diogo, rindo das palhaçadas do
meu irmão. Logo em seguida Isa entrou, fazendo-nos mudar o foco da
conversa.
— Oi, tio Di — Isa gritou e correu para Diogo, abraçando-o pelas
pernas.
— Oi, meu amorzinho.
Diogo abaixou para ficar na altura dela. Isa como de costume o
enlaçou pelo pescoço em um abraço apertado, e ele a pegou no colo. Era
emocionante ver como os dois sempre interagiam com muito carinho. Isa
amava o tio postiço e eu tinha certeza que ele também. Diogo não dizia,
mas suas ações falavam por ele.
— Eu estava com saudades, lindinha — declarou, deslizando as
mãos pelos cabelos macios e beijou a testa da pequena.
— Isabela, o que você acharia se a mamãe tivesse um namorado? —
Soltei, num impulso.
Diogo, que não esperava que eu fosse tocar naquele assunto no café
da manhã, colocou minha filha no chão e me olhou sem saber o que falar.
— Namorado? — A menina arregalou os olhos atenta à minha
resposta.
— Sim, filha. Como a dinda e o Bruno. — Claro que omiti a
informação de que os dois tinham se separado.
— Legal…, Mas seu namorado não vai ser aquele velhinho chato da
praça, né?
— Não, ele não. Deus me livre! Eu pensei em alguém mais legal,
como o Diogo.
— O tio Di? — perguntou Isabela, batendo palmas e pulando, mas,
para nosso desespero, sua expressão se transformou e ficou chorosa.
Fui até ela em um rompante, preocupada, e me ajoelhei aos seus pés.
— Ei, o que houve, meu amor, não gostou?
Isa não respondeu, apenas me abraçou pelo pescoço e chorou.
Continuei afagando seus cabelos e Diogo se agachou ao nosso lado.
— Filha, conversa com a mamãe. Lembra que combinamos de
sempre contarmos tudo uma para a outra? — Distancie um pouquinho para
ver melhor seu rosto e continuei: — Você não gostou? É isso?
— Eu gostei sim e tô chorando de felicidade — ela disse, passando
o braço sobre o rostinho molhado. — Era o que eu mais queria no mundo
todo. Eu amo o tio Di.
— Eu também amo muito você, lindinha. — Os dois se abraçaram e,
quando vi os olhos de Diogo cheios de lágrimas, não consegui me conter
nem mais um segundo e chorei junto.
Capítulo 25

QUATRO MESES DEPOIS

DIOGO

Dias se transformaram em semanas, em meses e entramos em uma


rotina gostosa. Eu acordava cedo, ia para o apartamento de Gaby, isso
quando não dormia por lá, ajudava a arrumar Isa para a escola e íamos
juntos para o trabalho. No almoço, nem sempre conseguia comer junto com
ela, mas à noite nos encontrávamos no jantar novamente.
A vida profissional também ia de vento em popa. Com o Lucas
dividindo a administração da clínica comigo, voltei a clinicar, dando
atendimento no centro de ortopedia como eu desejava desde que voltei.
Bom, hoje eu teria que sair da minha rotina e precisava confessar
que era aquele tipo de pessoa que detestava quando isso acontecia. Ainda
mais quando a causadora da mudança era Cora. Gabriela foi pega de
surpresa às cinco da manhã pelo toque do celular, com uma mensagem de
Felícia avisando sobre a troca repentina de horário.
Se pensam que Cora nos deu uma trégua nesses meses, não
poderiam estar mais enganados. Ela tinha melhorado muito, mas às vezes,
como hoje, aparecia alguma surpresa na escala de trabalho de Gabriela, que
eu via como um lembrete da minha irmã que ela ainda não aceitava o nosso
relacionamento. Como se sua opinião tivesse importância para nós.
— Não acredito que Cora fez isso de novo — resmunguei,
assistindo-a trocar de roupa.
— Não diz isso. — Olhei para Gaby com um olhar descrente, ela
sabia tanto quanto eu que minha irmã estava envolvida com aquele
chamado, e continuou: — Tem razão. Mas não temos como provar que é
armação dela. O importante é que eu não quero que você interfira, indo
falar com Cora a esse respeito. É exatamente isso que ela quer. Se piorar,
vemos um jeito de resolver.
— Não concordo, mas entendo seu raciocínio.
— Tem certeza que não tem problema você levar a Isa para a escola
hoje? — Levantei da cama e fui até ela, que estava se arrumando em frente
ao espelho, e abracei sua cintura. Trocamos um beijo rápido e me afastei.
— De maneira alguma. Fica tranquila que eu dou conta da lindinha.
— Eu sei que dá. Inclusive, você tem mais paciência que eu.
— Ah, isso eu tenho mesmo — zombei, lembrando da nossa última
conversa.

— Tio, posso te pedir uma coisa? — Isabela estava no banco de trás


do meu carro enquanto eu dirigia para a escola dela.
— Depende. Vou ter que mentir para a sua mãe? — Encarei a
pequena sapeca pelo espelho retrovisor e precisei segurar o riso ao ver sua
careta. — É, a senhorita lembra a encrenca que arrumamos semana passada.
Sua mãe ficou possessa porque te ajudei a burlar o castigo.
— Ficou mesmo.
— Vai, me conta o que está acontecendo.
— Sábado vai ter a festinha da família na escola. Você pode ir com a
gente? Vai ter brincadeiras e a mamãe não quer ir porque disse que é ruim
nessas coisas. Você é meu tio, tá namorando a mamãe, pode ir.
Isabela tagarelou toda inocente, sem ter a mínima noção de como
seu convite mexeu comigo. Que a pequena me considerava da família eu
sabia, contudo, será que me via como pai? Um calor diferente subiu pelo
meu peito diante daquela possibilidade. Eu fiquei em êxtase na noite que
confessou me amar e meu coração derreteu de felicidade. Eu também já a
amava como um pai ama um filho, demonstrava sempre com gestos, dando
todo o carinho que ela nunca teve, mas, por sentir que Gabriela ainda estava
receosa, achei melhor segurar meu ímpeto e ir devagar nas declarações.
O silêncio imperou por alguns segundos. Eu não sabia o que
responder.
— Está bem, vou conversar com a sua mãe e, se ela concordar, eu
vou.
Parei no semáforo e virei para trás. Isa sorriu e a animação da
menina aqueceu meu coração.
— Por favorzinho, tio, convence ela.
— Não posso garantir, meu amor, mas prometo que vou tentar. Tá
bem?
— Simmmm.
Isabela sorria de orelha a orelha quando estacionei na frente da
escola. Corri para ajudá-la a descer e ela, independente como era, colocou a
mochila nas costas e se despediu com um abraço. Assisti a pequena
caminhar até a funcionária parada na entrada, e, antes de passar pelo portão,
Isa virou para trás e me mandou um beijo. Derreti mais um pouquinho.
Preso pelo laço de fofura daquela pequena espertinha.

Meia hora depois, eu estava concentrado, lendo uns papéis em


minha sala, quando a porta se abriu e Ana irrompeu no cômodo, apressada.
Olhei para ela e vi seu rosto todo vermelho, com certeza, ela estivera
chorando. Levantei apressado, o peito se comprimindo em agonia, e,
imediatamente meus pensamentos foram para Gaby e Isa.
— O que houve?
— A peste da sua irmã colocou a Gaby para trabalhar no posto de
diagnóstico por imagem e o pai dela tinha uma consulta agendada para essa
manhã. O velho destratou Gaby na frente de um monte de gente. Ela está
parada na porta da sala, aos prantos, esperando o exame terminar para tentar
falar com ele.
— Dessa vez eu acabo com a Cora.
Passei minha vida sendo um homem calmo, que aceitava os
acontecimentos com resiliência, e nunca tinha sentido uma fúria insana
como aquela.
Um aperto dilacerou meu coração por pensar na dor que afligia
Gabriela e corri pelos corredores como um louco. Pacientes que
bloqueavam o caminho saíram ao me ver, na certa por eu estar de jaleco
branco e imaginar que ia de encontro a um paciente em estado grave. Eu
estava sim, indo socorrer alguém, mas a mulher que eu amava.
Gabriela estava parada em pé, ao lado da porta fechada, pálida,
apavorada e sua expressão contorcida pelo choro. Respirei fundo e fui de
encontro a ela. Abracei-a protetoramente e deixei que ficasse ali, até aplacar
os soluços e conseguir falar.
— Calma, meu amor.
— Ele está doente, Diogo. O doutor Douglas não quis me explicar
direito, meu pai o proibiu, contou apenas que foi diagnosticado com câncer
de pulmão, que precisa operar, mas que o teimoso se recusa.
— Sinto muito, Gaby. Venha, vamos sair daqui. — Puxei-a, pronto
para levá-la para a minha sala.
— Não vou embora enquanto não ver o meu pai. Preciso convencê-
lo a fazer a operação.
Seu rosto estava uma bagunça, vermelho, a maquiagem com que
saiu de casa naquela manhã toda bagunçada e os lindos olhos verdes
pareciam maiores e perturbados. Limpei como pude sua face e disse:
— Amor, ele vai tratá-la mal.
— Eu aguento. Preciso fazer isso pra viver em paz.
Balancei a cabeça. Foi muito difícil concordar com a decisão de
Gabriela, principalmente quando a porta abriu e eu vi Mário sair da sala
com a expressão carrancuda, e encarar a filha com um certo desprezo.
— Pai…
— Não quero conversar, Gabriela.
— Por favor, pai, me ouve só um minuto.
— Um minuto e nada mais — respondeu, depois de ponderar por
um instante.
— Vamos voltar para dentro dessa sala, vocês terão mais
privacidade.
Gabriela agradeceu com um sorriso fraco e dispensei a enfermeira
que estava lá dentro. Quando o homem atravessou a porta, ele olhou para
mim, inquiridor, e vi no seu olhar que sabia do meu relacionamento com
sua filha. Porém, agiu com indiferença e entrou com passos vacilantes,
lentos devido a saúde debilitada.
— Diz de uma vez o que quer, Gabriela.
— Pai, fiquei sabendo que está doente. O senhor precisa fazer a
cirurgia.
— Não era para terem passado adiante o meu prognóstico. Onde
fica o sigilo médico?
— O doutor não quis contar nada, eu que peguei seu prontuário. —
mentiu, na certa temendo que fizesse algo contra a clínica. — Pai, o médico
garantiu que o senhor tem chance se fizer a cirurgia e seguir corretamente o
tratamento.
— Não vou discutir o plano de tratamento do doutor Douglas.
Minha decisão já foi tomada.
— Por favor, pai, pense…
— Gabriela, não seja insistente. Vá embora e me deixe morrer em
paz! — reclamou, de forma severa.
— Sabe, pai, eu desisto. Apesar do abandono, sempre tentei
entendê-lo. O senhor foi criado assim, baseado nos preceitos da religião,
rígido, mas, hoje, consigo ver que nada disso tem a ver. O senhor
simplesmente nunca me amou. Uma pessoa que ama não é capaz de ser tão
insensível e cruel como você. Não entendo como um pai consegue virar as
costas para um filho, simplesmente por pensarem diferente ou cometer
erros. Eu nunca faria isso com minha filha.
Se ela esperava que seu discurso abrandasse o coração frio do
homem, estava enganada. Mário logo reagiu:
— Não devemos desperdiçar energia com aquilo que não presta…
— Chega, Mário! Gabriela veio com a melhor das intenções,
preocupada com sua saúde, não querendo que o pai morra, e é assim que a
trata? — exigi, não permitindo que continuasse a magoá-la.
— Deixa, Diogo, estou acostumada.
— Não se meta, doutorzinho. — O homem se ergueu com um olhar
mortal, nem a doença sendo capaz de mudá-lo, e enfiou as mãos nos bolsos
da calça de linho. Antes de passar pela porta, disse: — Esse assunto acaba
aqui. Quem dá a última palavra sobre a minha saúde, sou eu.
Meu rosto queimou diante das coisas que queria dizer a ele.
Contudo, desisti de retrucar e recuei, deixando minha raiva de lado para
cuidar da minha mulher. Sentei ao lado de Gaby, puxando-a para meu colo e
a apertei em meus braços. Em meus trinta e nove anos, nunca tinha
presenciado um pai ser tão cruel com um filho. Relembrei minha criação, o
carinho e respeito com que meus pais me criaram e pensei em Gabriela,
como deve ter sido difícil crescer com um pai daquele, sendo tratada com
tanta truculência e sem receber nenhum apoio. Não conseguia nem imaginar
a tristeza que habitava o coração de Gabriela.

De banho tomado, entrei debaixo do edredom com Gabriela e a


envolvi em meus braços carinhosamente. Eu não saí do lado dela desde que
chegamos em casa. A amparei cheio de cuidado e precisei convencê-la a
tomar um remédio para relaxar, pois não parava de chorar.
Passamos o resto do dia na cama, só quando Isabela voltou da escola
que Gaby se forçou a reagir. Tomou um banho, comeu um pouco da sopa
que Alê preparou e ficou com a filha até que o sono venceu a baixinha.
Fechei os olhos por um momento quando senti Gaby se aconchegar
em meu peito. Queria conversar, dizer tanta coisa para consolá-la, porém,
permaneci por um longo momento em silêncio, fazendo a única coisa que
me cabia: dar carinho até que se sentisse preparada para falar.
— Acho que vou passar a vida te agradecendo por todo o apoio que
me deu desde que nos reencontramos. O que fez por mim hoje foi incrível,
Diogo. Obrigada. — Ela se virou de lado na cama e mergulhou os olhos
verdes nos meus.
— Querida, amor a gente não agradece, retribui… e isso você faz
diariamente, meu amor. — Beijei sua testa, alisando seus cabelos
bagunçados.
— É difícil mudar velhos hábitos — murmurou, dando de ombros.
— Sempre me senti preterida, amaldiçoada, não merecedora de amor. Mas
como podia ser diferente? Meu pai era tão duro e distante, que nunca senti o
amor dele; a minha mãe, a pessoa que me amava incondicionalmente,
morreu de forma inesperada, traumática, ainda quando eu era nova; depois,
o homem que eu pensei amar me abandonou grávida como um sapato
velho; ainda perdi a convivência com meu irmão, porque, arrependido das
burradas que fez, ele foi embora de Mococa. Sabe, apesar disso, eu vivi
uma vida feliz, afinal, ganhei a minha filha, que é o bem mais precioso que
eu tenho, a pessoa que dá sentido à minha vida; tive meu primo e a Ana,
que sempre estiveram ao meu lado, amando-me de verdade.
— Eu sinto tanto pelo que passou, meu amor. Nenhuma criança
deveria crescer sem sentir o amor incondicional de um pai, sem o apoio e
suporte de uma família. — Senti um nó na garganta e meus olhos se
encheram de lágrimas inevitáveis. E com toda certeza que tinha dentro de
mim, garanti: — Mas agora você também tem a mim, e vou dar o meu
melhor para que se sinta amada.
— Você não precisa fazer mais nada, Diogo, eu já sinto. Eu te amo,
Diogo — disse ela, e pulou nos meus braços, apertando-me forte. Eu a
puxei para o colo e a abracei emocionado.
— Eu também amo você, muito. Não quero pular etapas, você é
nova ainda, tem coisas para viver, descobrir, mas gostaria de viver tudo isso
junto com você, com a Isa. Eu quero construir uma família feliz ao seu lado,
meu amor.
— Está, por acaso, me pedindo em casamento? — Gaby arregalou
os olhos e sentou num rompante.
— Ainda não. — Sorri, agarrando seu cabelo. Ela deu uma risada
entre lágrimas. — Por enquanto, só estou preparando o caminho.
— Você é o rei em fazer declarações importantes nas horas mais
atrapalhadas — resmungou, e quando eu ri, beliscou meu braço por cima da
camisa. — É sério, fez a mesma coisa com o pedido de namoro. Cadê o
romantismo que dizem que os homens mais velhos têm?
— Se atente ao que é importante, Gabriela. Eu te fiz sorrir.
— Só para saber, eu não preciso de nada disso, apenas de você ao
meu lado. — Ela segurou meu rosto com as duas mãos. — Eu nunca soube
o que era ter uma família de verdade e a ideia de conhecer isso com você é
maravilhosa.
Meus dedos envolveram os seus num gesto que, atualmente, tinha se
tornado automático, de tanto que necessitava manter contato físico.
Aproximei sua mão dos meus lábios e a beijei com carinho.
— Esse assunto de família me lembrou que preciso te perguntar uma
coisa. Por que não quer ir à festa da família na escola de Isabela?
— Como sabe disso? — questionou, e, antes de eu responder,
Gabriela fez uma careta e continuou: — Isabela…
— Sim. Ela me perguntou hoje de manhã se eu podia acompanhá-las
a essa festa, pois, segundo a cabecinha dela, já que você não gosta de
participar das brincadeiras, se eu for, vou poder te substituir e você não terá
desculpa para não ir.
— Não acredito que ela fez isso. — Gabriela fechou os olhos,
apertando-os com o indicado e o polegar, depois suspirou. — Depois do que
aconteceu na outra escola, fiquei com medo que ela comparasse a nossa
família com a dos amigos. Não quero que minha filha sofra.
— Será que essa é uma boa decisão? — Percebi que mordeu o lábio
inferior, insegura, e voltou a me encarar. — Olha, não entendo nada de
como criar filhos, mas meu pai sempre repetiu que não dá para
superproteger um filho pelo resto da vida, nós que devemos prepará-los
para enfrentar qualquer situação desfavorável que encontre pelo caminho.
Pense nisso.
— Você tem razão e vou adorar ouvir seus conselhos daqui por
diante.
Gabriela falou aquilo sem ter a mínima noção de como me deixava
feliz. Alegrou-me a ideia de ajudá-la na criação de Isabela. Como disse, não
possuía nenhuma experiência, mas fui criado por um homem e um pai
maravilhoso, tinha bons exemplos para me inspirar.
Capítulo 26

GABRIELA

Passei o resto da semana tentando esquecer o que aconteceu com


meu pai, contudo, nossa discussão na clínica serviu para colocar um ponto
final nessa minha batalha interna por reconciliação. Mesmo eu estando lá,
de braços abertos, sofrendo por sua doença e pelo prognóstico ruim, tudo
que ele fez foi mostrar o quanto não merecia meu amor.
Mas doeu. Nossa, como doeu seu desprezo!
Quando fitei os olhos dele, do homem de quem sempre busquei
amor e aprovação, e só vi o ser frio que me criou me encarando com
desprezo, ali eu entendi que deveria deixá-lo ir e seguir com minha vida.
Não que tenha sido uma decisão fácil, precisei aceitar que o amor de
verdade não podia ser forçado. E ele nunca me amou.
Hoje vejo que o grande advogado Mário Mendes Porto quis manter
o teatro da família feliz, a fim cuidar da sua imagem de homem de bem,
religioso, e ficar longe de escândalos. E isso ruiu quando sua inocente filha
virou mãe solo.
Porém, o que passei era compensado por ter minha filha na minha
vida.
Procurei Isabela com o olhar e a encontrei brincando no campinho
com Diogo, feliz como nunca a vi. Meu namorado fez um gol, gritou
erguendo os braços e ela correu ao seu encontro, agarrando o pescoço dele
para parabenizá-lo pela vitória. Minha garganta embargou ao contemplar o
jeito amoroso que a tratava.
Falei tanto que não iria à comemoração da escola e ali estava eu. Na
verdade, todos resolveram ir. Eu, Diogo, Isa, Ana com a irmã e a sobrinha
que também estudava no colégio, e Lucas com a mãe e a filha que era a
mais nova aluna do colégio. As meninas estavam empolgadas e aquele era o
único assunto há dias.
Alunos e familiares curtiam as diversas atrações, desde
apresentações de fantoches e oficinas de artes para os menores, jogos e
brincadeiras em família para o restante da criançada que só se contentavam
com um pouco mais de ação.
— Ah, o amor… dá até gosto ver como seus olhinhos brilham —
Ana disse, parando ao meu lado, e me abraçou.
— Tem como ser diferente? Esse homem parece um príncipe dos
famosos contos de fadas clichês. Meu único medo é que eu pertença a
classe das mulheres azaradas e o meu seja o que vira sapo.
— Você é doida. — Riu da minha careta, mas a alegria pareceu não
chegar aos olhos. — Tô tão feliz por você, amiga
— Não gosto nada de te ver triste. Tenha fé que logo você
encontrará o amor de verdade, Ana. Se não deu certo com o Bruno é porque
ele não era o homem certo pra você.
— Minha mente sabe disso, pena que meu coração idiota não.
— Oi, tia Ana… tia Gaby. Cadê a Isa?
Enquanto a filha de Lucas conversava animada, fazendo gesto com
as mãos, percebi que minha amiga estava absorta à falação da criança.
Parecia mais interessada no pai da pequena que caminhava sem pressa na
nossa direção.
— Oi, Dorinha, a Isa tá no campo com o Diogo. Vai lá brincar com
eles.
Minha intenção era tirar Ana da cena vergonhosa que viria se
continuasse encarando o médico. Antes que Lucas se aproximasse, dei um
cutucão disfarçado na minha amiga, e ela me encarou assustada ao perceber
que eu a olhava com um sorriso debochado e os braços cruzados. Corou na
hora.
— Santo Deus! Eu vivi para te ver envergonhada.
— Esse homem é um pedaço de mau caminho. — Seu murmúrio foi
recebido por mim com um levantar de sobrancelha e ela continuou: — Ah,
vai, posso estar com o coração partido, mas é impossível não olhar para
ele.
— Bom dia, garotas — disse Lucas, interrompendo o nosso papo, e
como Ana congelou ao meu lado, fui eu quem respondeu.
— Bom dia, Lucas. Tudo bem?
— Tudo sim, e vocês? Divertindo-se muito? — Vi que fitou Ana,
que retribuiu o olhar e acenou com a cabeça para ele, e mesmo tentando
disfarçar, percebi que comeu minha amiga com os olhos.
— Nada. Acabamos de chegar.
— Eu ia perguntar onde está meu amigo, mas acho que é só seguir a
minha filha. — Lucas riu e apontou para o caminho que a filha seguia.
— Sim. Ela e Isa viraram um grude.
— Não imagina como isso me deixa feliz. Isadora tinha uma vida
muito presa em São Paulo e vê-la livre, brincando em segurança, era o que
sempre desejei. Bom, eu vou encontrar o Diogo. — Esperei que elaborasse
mais, porém parou por aí. Estava curiosa para saber mais da história de
Lucas. Diogo era um amigo fiel e não revelou detalhes. Não que eu tenha
perguntado.
— Ou fecha a boca ou vou ter que colá-la pra você não babar no
doutor — zombei, assim que Lucas se distanciou, e agarrei o braço de Ana,
e a arrastei até a barraca de bebidas.
— É mais forte do que eu, amiga, Lucas chega e me torno uma
idiota que não consegue nem falar. A diferença de idade que lhe dá esse ar
de macho alfa, um ser superior, dono da porra toda.
Isabela ainda pulava para lá e para cá, divertindo-se como nunca
junto com Diogo, quando nós, mulheres, decidimos nos sentar à sombra.
Estávamos a tarde toda ali, fomos arrastadas para todos os cantos: no jogo
Boca do Palhaço, no de Argolas, fora os outros que eu nem sabia o nome.
Só paramos para assistir à apresentação de dança com os alunos do ensino
médio e depois para comer.
— Não aguento o pique dessas meninas — Mercedes, mãe de
Lucas, reclamou ao sentar do lado de Ana.
— Eu desisti há muito tempo. Esse era um dos motivos de eu não
querer vir sozinha com Isa.
— Olha lá, parecem dois babões — Ana disse, apontando na direção
de Diogo e Lucas. Meu namorado aguardava Isa saltar no pula-pula
inflável, enquanto o amigo brincava de corrida de saco com a filha.
— Minha irmã acabou de ir embora. Que horas vocês vão?
— O mais rápido possível. Meus pés estão me matando. —
Mercedes, respondeu rápido, e procurou o filho com os olhos.
— A senhora se acostumou com a cidade, dona Mercedes?
— Sim. Estou amando o clima, a tranquilidade, o condomínio que
meu filho escolheu. Sinto falta dos meus passeios ao shopping, mas não dá
para ter tudo nessa vida. Só de ver meu filho feliz, compensa.
— Vovó… vovó, vem ver o joguinho que descobri. Dominó. Esse dá
pra senhora brincar comigo — Dorinha chegou gritando e puxou a mão da
senhora.
— Vamos também, mamãe. É legal. — Foi a vez de Isa aparecer
feito um furacão.
— Ah, mas não vou mesmo. Chama a dinda.
— Amiga, faz isso comigo não. — Ana escorregou na cadeira,
choramingando de forma trágica.
— Vai lá, distrai a Isa que vou chamar os meninos para ir embora —
sussurrei, bem pertinho do ouvido Ana. A safada levantou e acompanhou
minha filha sorridente.
Sendo assim, sai a procura de Diogo e o encontrei conversando com
Mercedes e Lucas. Para que meu plano desse certo, e eu pudesse ir embora
para casa antes da hora, Isabela não podia me ver enquanto tentava
convencer Diogo. E só tinha um jeito de fazer isso: por mensagem de texto.

Gaby: Amor, vamos embora? Passamos quase o dia todo aqui e eu


tô mortinha da Silva.
Diogo: Tadinha da Isa… ela tá tão feliz brincando. Vamos ficar
mais um pouquinho.

Resolvi provocar um pouquinho e mandar uma foto instigante para


ele. Olhei ao meu redor, conferindo se havia um lugar mais vazio, e corri
para debaixo de uma árvore. Eu usava uma blusinha de botões vermelha,
que por si só já era sensual por causa da transparência em renda nas costas.
Abri o primeiro botão e meu colo ficou em evidência. Antes que fosse pega
no flagra, fiz uma selfie e enviei para Diogo.

Diogo: Porra, Gabriela, isso não se faz.

Segundos depois, recebi uma foto que tive dificuldade em entender,


tirada de cima para baixo. Fiquei incontáveis minutos analisando até que
entendi que Diogo tinha tirado uma foto do pau duro sob a calça jeans.

Gaby: Credo. Você não sabe brincar.


Diogo: Para você aprender a não mexer com quem está quieto.
Gaby: Ah, é? Então, lá vai. Sabe aquele presentinho que você
queria de Natal? Se formos embora agora, eu te dou e ainda antecipado.
Diogo: Agora sim me convenceu. Para de me mandar mensagens e
vem buscar seu homem.

Agora não tinha mais volta. Ele vivia sedento por minha bunda, e eu
sempre esquivava quando vinha com sua lábia de safado para comer meu
cu. Poxa, Diogo tinha um pau acima da média e o buraco da minha
retaguarda parecia bem pequeno para ele. O que havia me salvado até ali,
era que o sexo entre nós era tão delicioso que aquilo acabou não fazendo
falta para ele, que preferia ser paciente e esperar pelo meu tempo.
A sorte de Diogo era que ele despertou em mim um lado que eu não
conhecia e nem sabia que tinha. O da mulher confiante, fogosa, desejosa
para experimentar tudo com seu homem.
Tínhamos deixado Isabela brincar na casa de Dorinha, que a
propósito estava eufórica por dormir com a amiga. Depois da nossa troca de
mensagens, o safado armou um esquema com Lucas para que nós dois
ficássemos inteiramente a sós, e não seria eu quem iria reclamar.
Entramos no apartamento de Diogo aos tropeços, nossos corpos e
bocas unidos em um beijo quente.
Seus olhos estavam tão nublados de tesão, que achei que me
devoraria ali mesmo, na sala, contudo, Diogo me pegou no colo e levou
para seu quarto. O surpreendido depois disso foi ele, pois não fiquei
esperando que guiasse a transa. Quando me colocou no chão, retirei as
roupas cheia de pressa e segui na direção da grande cama que ficava no
centro do cômodo.
Eu podia parecer confiante, mas tremia de ansiedade.
Subi na cama e arrastei pelo acolchoado macio com a bunda virada
na sua direção. Deitei de bruços, os cotovelos e os joelhos apoiados no
colchão, e assim que me senti preparada, virei a cabeça na direção que o
deixei.
— Vem pegar o seu presente — declarei, suspirando com um sorriso
safado. — Mas lembre-se. Esse buraquinho é virgem. Seja carinhoso.
— Tem certeza que quer fazer isso? Não quero que faça nada só
para me agradar — disse, pegando-me de surpresa ao inverter nossas
posições, colocando-me montada sobre seu corpo.
— Tenho. Confio em você e sei que vai fazer valer a pena a dor que
vou sentir.
— Promete pra mim, que se não aguentar, pede para eu parar? —
pediu, esticando as mãos para apertar seus seios.
— Sim — murmurei, rebolando em seu pau, que já estava livre da
roupa e roçava deliciosamente sob meu clitóris.
Perdido na névoa de prazer, Diogo massageou meus mamilos,
chupou-os enlouquecido de tesão, e meu gemido saiu entrecortado quando o
senti sugar para dentro de seus lábios e mamar com vontade.
As sensações intensificaram, e, sem conseguir resistir, ele sentou
rápido na cama e me agarrou pela cintura, puxando meus quadris para
inverter nossas posições de novo.
— Vou pegar o gel. — Ele pulou da cama com pressa e correu até o
banheiro.
Não demorou a voltar com o frasco na mão, sorridente, e esperei
que se ajeitasse mais uma vez atrás de mim. Pela primeira vez desde que
comecei a provocá-lo, a ansiedade me dominou e todos os meus sentidos
ficaram em alerta.
O que veio a seguir me deixou como se estivesse em câmera lenta.
Ouvi o clique da embalagem sendo aberto e soube, inclusive, o exato
momento em que o gel saiu do frasco e foi parar nos seus dedos, pois o
barulho do produto melequento era inconfundível. Em seguida, seus dedos
tocaram o ponto de desejo e foi impossível não retesar, contraindo
involuntariamente a musculatura anal.
— Amor, você precisa relaxar. Faça força ao invés de contrair. Será
menos doloroso e bem mais fácil entrar em você assim — avisou, fazendo
movimentos circulares na entrada apertada e empurrando o dedo aos
poucos.
— Pode ir… confio em você... — murmurei, e gemi baixinho
quando introduziu o segundo dedo, girando-os devagar.
Foi estranha a sensação de ser penetrada ali, senti uma leve
ardência, mas nada insuportável. Estremeci e me sacudi, empinando a
bunda para incentivá-lo e permanecemos nesse ritmo, até que Diogo me
sentiu pronta para receber seu membro duro.
— Quero que seja prazeroso para nós dois, meu amor, por isso não
esqueça o que falei, faça força para fora e não se contraia — instruiu, firme,
e depositou um beijo em minhas costas.
Eu me preparei, tensa, trêmula. A ponta do seu membro entrou,
deslizando com a ajuda do gel, mas nada tinha me preparado para sentir seu
membro grosso me penetrar, por mais lubrificada que eu estivesse. Doeu
como o inferno e quase desisti. Quase. Porque Diogo sendo experiente,
percebeu que doía e desceu uma mão pela minha boceta, estimulando o
clitóris com movimentos circulares deliciosos, fazendo-me esquecer de
qualquer coisa que não fosse o prazer absoluto que sentia.
— Porra, que delícia de cu apertado! Vou ficar viciado nisso.
Deixei que comandasse o vai e vem de seus quadris, de forma que
seu pau me preencheu até que eu o senti se enterrar todo dentro de mim. Tê-
lo acariciando meu clitóris enquanto seu pau se apoderava do meu cuzinho
foi essencial. Diogo conseguiu entrar com mais facilidade e esqueci a dor,
sendo envolvida por um tesão tão intenso, que fui dominada por um prazer
sem igual. Rebolei, entregue, e Diogo agarrou minha cintura, segurando-me
firme, enquanto gemia e estocava lento, contudo, sem parar.
— Sua boceta tá piscando na minha mão, doidinha pra gozar. Deixa
vir e goze comigo, amor. Não vou conseguir segurar por muito tempo.
Ali relaxei e deixei o gozo vir. Diogo abaixou, instigando-me,
lambendo e sugando minha pele, e experimentei um orgasmo surreal.
Imersa em uma nuvem de tesão, arquejei, sentindo todas as terminações
nervosas da minha boceta latejando, enquanto ele aumentava a velocidade
em busca do próprio prazer. Diogo estocou mais três vezes forte e rápido,
fazendo um barulho gostoso, e seu orgasmo veio violento.
Fiquei lá, esparramada na cama, sem forças para nada. Ele saiu
devagar de dentro de mim e me virou com delicadeza. Depois, deitou-se ao
meu lado, beijando meu rosto e brincando com meus mamilos.
— Você me surpreende, está cada dia mais safada. — murmurou em
meu ouvido. — Que orgasmo foda foi esse, amor.
— Você que está me transformando nessa safada.
Ele sorriu e puxou meu rosto em sua direção, dando um beijo em
meus lábios. O clima esquentou novamente, o beijo ficou mais intenso e,
num roçar de corpos, senti seu membro ereto me cutucando.
— Não é possível! — disse, afastando o meu corpo para olhar o pau
duro dele.
— Efeito Gabriela. Tenho um tesão imenso por você, meu amor.
Achei que entendia alguma coisa sobre os limites fisiológicos dos
homens, mas Diogo me mostrava que eu não sabia de nada. Em poucos
minutos depois de um orgasmo intenso, o homem estava duro e pronto para
transar de novo.
Capítulo 27

DIOGO

Finalmente havia chegado o dia da confraternização de fim de ano


da Pró Vita. Embora eu não tivesse nada a ver com a organização do evento,
passamos dias tumultuados. Gabriela estava uma pilha de nervos por
reencontrar a minha família, ou melhor, minha mãe e Cora, e o pior que eu
também não estava muito diferente.
Embora Gaby não reclamasse, conseguia sentir como a rejeição de
não aprovar nosso relacionamento a afetava. Doía vê-la triste, porém, eu
sabia que era questão de tempo até minha mãe enxergar o quanto Gabriela
me fazia feliz e aceitá-la de uma vez. Quanto a Cora, a opinião dela não
fazia diferença para mim, queria apenas que nos deixasse em paz. O
problema estava sendo que minha namorada era resiliente demais para o
meu gosto e me fez prometer que não tomaria nenhuma atitude com relação
a Cora. Claro que não consegui ficar sem iniciativa como prometi e tive
uma conversa acalorada com minha irmã. Ela jurou que não teve nada a ver
com a troca de plantões do dia do confronto de Gabi com o pai e, como
jamais conseguiria fazer Felícia abrir a boca para depor contra a amiga,
fiquei de mãos atadas.
Chequei a hora, fazia uns trinta minutos que eu estava pronto,
esperando minha acompanhante se preparar. Como Alexandre era
cabeleireiro, ele se prontificou a arrumá-la e já havia se passado duas horas
desde que a deixei aos cuidados dele.
A porta da frente se abriu e eu ouvi as vozes da minha namorada e
do primo. De frente ao espelho, ajeitei pela última vez a gravata do smoking
e, antes de checar Gabi, borrifei o perfume que ela adorava. Estava louco
para desfilar com ela, apresentá-la a todos como minha namorada, e, quem
sabe em breve, algo mais.
Cheguei na sala e, assim que ela se virou para mim, congelei no
lugar, encarando-a fascinado. A beleza de Gabriela era inquestionável e não
seria hipócrita em dizer que esse não foi o primeiro fator a chamar minha
atenção quando a vi parada na porta do meu apartamento. Mas, naquele
momento, meu Deus… Gabriela parecia uma deusa saída do Olimpo, uma
visão digna de adoração.
Os olhos verdes marcados com uma maquiagem escura, a boca
delicada evidenciada deliciosamente por um batom vermelho, os cabelos
pretos arrumados em um penteado que o fazia cair em cascata pelas costas.
Para fechar com chave de ouro e acabar com minha sanidade, ela usava um
lindo vestido longo sofisticado na cor marsala, de modelagem acinturada e
decote profundo, nenhum pouco vulgar, que valorizava seu corpo gostoso.
— Nem se aproxime, bonitão — Alexandre provocou, parando entre
mim e Gaby. — Proíbo até mesmo um beijinho. Não tenho tempo para
refazer a maquiagem dela, esqueceu que eu também vou a essa festa com
meu noivo?
— Pode ir se arrumar, primo. Prometo que não vou deixar o Diogo
me desarrumar.
— Isso é maldade, amor. Você está perfeita e nem posso aproveitar
— disse, assim que ficamos sozinhos.
— Digo o mesmo. Você ficou um espetáculo de smoking. — Ela se
aproximou e deu uma voltinha pelo corpo, analisando-me, e seus olhos
pararam na ereção monstruosa que eu ostentava.
— Eu sei que adora ver como me afeta e me deixa duro com
facilidade. Tenho um tesão danado em você.
Ao invés de recuar, a safada se aproximou e avançou. Sem desvia os
olhos dos meus, ela tocou o meu pau por sobre a roupa e o apertou com
força, acariciando-o como dava. Quando fui avançar para beijá-la, a safada
simplesmente tirou a mão dali e se afastou, virando-se na direção de onde
havia deixado a bolsa.
— Vamos? Não quero dar mais um motivo para sua mãe implicar
comigo.
— Sério que vai me deixar assim, de pau duro?
— Vou, ué! Infelizmente não temos tempo — respondi, sorrindo
inocentemente, e enviou um beijo por cima do ombro.
— Gabriela, Gabriela… — Agarrei sua cintura, prendendo suas
costas contra meu peito, e sussurrei em seu ouvido. — Aguarde que na
volta essa provocação vai ter troco. Ouviu? — Terminei de falar, e, como
não podia estragar sua maquiagem, aplaquei a necessidade de gozar
beijando seu pescoço com fome.
— Ui… você não sabe brincar — sussurrou, ofegante.
— Não mesmo. — Dei um último beijo em seu pescoço e tomei sua
mão, deixando o apartamento para trás com ela ao meu lado.

Uma imensa árvore de Natal decorava a entrada do salão de festas e


o som da melodia natalina podia ser ouvida por todo o ambiente. As
equipes responsáveis por manter as coisas funcionando já tinham começado
os trabalhos, distribuindo bebidas e aperitivo para os convidados, e tudo
parecia funcionar perfeitamente. O evento seria grandioso, minha mãe e a
organizadora de eventos o prepararam com muito cuidado e refinamento,
oferecendo aos colaboradores e parceiros de negócios da clínica uma
recepção que sempre virava assunto na cidade por dias.
— Ainda não acredito que aceitei vir — Gabriela bufou ao avistar o
mar de pessoas que nos esperava ao final da escadaria. — Vamos de uma
vez... Dói mais tirar o curativo devagar do que arrancar de uma vez.
— Gostei da analogia, faz total sentido se levarmos em conta nossas
profissões — disse, descontraído, e parei em sua frente, mudando o tom da
conversa. — Meu amor, sei que está ansiosa por encontrar a minha mãe,
mas lembre-se, independente da opinião dela, eu te amo e nada mudará isso.
— Eu sei… — Gabriela concordou, forçando um sorriso que não
alcançava os olhos. — Venha, acabei de ver a Ana. Vamos cumprimentá-la.
Pousei a mão na lombar da minha mulher, torcendo para que sua
amiga me ajudasse a distraí-la.
— Minha nossa, amiga, você está deslumbrante! — Ana exclamou
assim que viu Gabriela parar ao seu lado.
— E você mais ainda, Ana. Mulher, essa fenda vai deixar os homens
babando.
— Ah, essa é a intenção. Quero deixar o fdp do Bruno mortinho de
arrependimento. — Ela indicou um homem sentado junto a um grupinho de
mulheres, duas mesas da nossa.
— Errada você não está.
Gabriela preferiu encontrar nossa mesa e se acomodar. Ana nos
acompanhou e percebi que me observava de esguelha e percebi pela
confusão em seus olhos que algo estava acontecendo.
E não demorou muito para eu descobrir o que era. Assim que
encontramos a mesa que compartilharíamos com algumas pessoas, vi que
não havia um lugar reservado para mim ali, somente as placas de
identificação com os nomes de Gabriela e Ana. Aquilo foi obra da minha
mãe, que provavelmente me colocara junto dela e de nossa família,
deixando minha acompanhante bem longe de sua mesa. Ela sonhava se
pensava que aceitaria aquilo.
— Ei, Diogo, não tem problema. Eu fico com a Ana — argumentou
Gabriela, de queixo erguido, tentando passar uma tranquilidade que não
tinha.
— Não, Gaby, nada está bem. Elas fizeram as escolhas delas, as
minhas eu mesmo faço.
— Eu tenho uma ideia onde mataremos dois coelhos com uma
cajadada só. — Eu olhei para Ana sem entender e a garota continuou: — É
o seguinte, Diogo, eu vou ajudá-lo, mas preciso de um favorzinho seu. O
meu ex, o doutor Bruno Ramos, está aqui acompanhado de uma ruiva
estonteante, e eu não quero que me veja sozinha. Meu pedido é simples, nós
mudamos de mesa e em troca você pede para o Lucas ser meu
acompanhante por um tempinho. Não precisa ser pela festa toda.
— Feito — disse, estendendo a mão. Era um absurdo estar
negociando aquilo com ela, mas, de certa forma, fui vencido por imaginar a
raiva de dona Francisca quando não me visse sentado em meu lugar. Lucas
não seria um problema, como bom amigo que era, não recusaria o pedido.
— Você é maluca, Ana.
— É fácil falar, né, Gabriela? Tu encontrou o príncipe encantado.
— Bom, o príncipe encantado vai resolver isso.
— Amor, não enfrente sua mãe hoje, por favor.
— Prometo que não farei nada, fique tranquila. — Segurei seu rosto
em concha e trazendo-o para perto do meu, fiz com que a ponta dos nossos
narizes se tocasse. — Volto logo.
Eu a beijei, tomando os seus lábios com delicadeza. Ao me virar
para sair, percebi um grupinho de senhoras conversando e olhando para
mim e Gabriela com certo interesse e julgamento no olhar, o que me deixou
um pouco incomodado. Com a correria do trabalho e da rotina puxada de
Gabriela, era a primeira vez que aparecíamos juntos, de mãos dadas e
demonstrando afeto em público, e era bem nítido que Gabriela era mais
nova do que eu. Senti como se estivessem julgando a nossa relação, e o
incômodo não se tornou maior porque as olhei de volta, o semblante duro
de quem havia percebido a inconveniência descabida delas.
Enquanto seguia, aproveitei para observar melhor a decoração
opulenta do salão, mesas enfeitadas por arranjos de flores naturais e
preparada para o jantar de logo mais.
No caminho para encontrar Lucas, esbarrei em algumas pessoas,
inclusive meus pais e Cora. Essa parecia não ter ficado feliz por me ver
junto de Gabriela, apenas ignorei e direcionei um cumprimento geral.
— Boa noite.
— Finalmente se dignou a vir cumprimentar seus pais — Minha
mãe murmurou entredentes.
— Francisca! Você prometeu. Lembra?
— Sim. Eu disse que aceitaria a decisão de Diogo e que respeitaria a
garota, o que não significa que eu precise gostar de vê-la com meu filho.
Cora abafou uma risada e eu achei melhor seguir meu caminho antes
que a conversa desandasse. Despedi-me deles e fui ao encontro de Lucas
que estava acomodado em uma mesa à frente do pequeno palco
improvisado, com um telão de led iluminado com o logo da Clínica Pró
Vita.
— Pelo jeito vocês foram os escolhidos para sentarem à mesa com a
rainha da Pró Vita — provoquei, ácido, ao ver que a mesa em que ele e a
mãe estavam era a da minha família.
— Algum problema, Diogo? — Lucas me conhecia bem, e como
não adiantaria mentir, contei-lhe o que estava acontecendo e aproveitei para
contar sobre o plano de Ana.
— Claro que aceito. Pede para a garota vir somente quando o jantar
começar, não queremos que sua mãe tenha tempo para interferir.
— Vou adorar ter Ana aqui conosco. Estou me sentindo um pouco
deslocada. — Mercedes olhou para o filho com um sorriso animado.
— Obrigado, amigo. Fico te devendo mais uma.
Voltei para junto de Gabriela e passei o recado de Lucas a Ana. Uma
música romântica tocava na pista de dança e, como minha namorada
observava os casais que lá dançavam com certa animação, fiz-me confiante
e a chamei para dançar.
— O que acha de nos juntarmos a eles?
— Sério? Desde quando você dança? Lembro que não levava o
menor jeito — Gabriela perguntou, e percebi um rubor diferente em sua
face.
— Bom, isso é verdade. Mas podemos aproveitar para ficarmos
agarradinhos, sentindo o embalo da música — Sorri ao ver o brilho nos
olhos dela e estiquei a mão, que ela pegou sem titubear.
— Vamos lá, antes que eu perca a coragem. — Gabriela se levantou
e antes de sair se virou para a amiga. — Já voltamos, Ana.
— Então quer dizer que a senhorita prestava atenção em mim
quando era mais nova? — Estranhei a careta contrariada que fez ao ouvir
minha pergunta, algo totalmente fora do seu habitual.
— Bom, digamos que sim.
— Não entendi.
— Eu fui apaixonada por você na minha adolescência. Pronto, falei!
— Gabriela soltou a bomba e escondeu o rosto no meu peito.
— Como assim, amor? Explica isso direito. — Levantei seu rosto
com o indicador, instigando-a a continuar, e me sobressaltei ao ver seus
olhos vermelhos.
— Ai, Diogo, não tem o que explicar. Não sei como começou, como
tudo passou da implicância para a paixão, só que era um sentimento doído,
que me fazia ir do céu ao inferno em minutos.
— Caramba, não imaginava. Por que não me contou?
— Sei lá, vergonha, talvez.
— Foi antes ou depois de eu me mudar? — Continuei insistindo,
desesperado para entender essa história.
— Esquece isso, amor. Faz muito tempo.
— Por que está fugindo da conversa, Gaby? — insisti. — Tem mais
coisa aí que não quer me contar.
— Vamos lá pra fora? — pediu, os olhos banhados de lágrimas, e
concordei, levando-a na direção das portas francesas que dava acesso ao
jardim que rodeava o salão.
— Amor, estou ficando preocupado.
— Antes de continuar, quero que saiba que esse episódio já foi
superado.
— Não sei se acredito. Você não estaria chorando se tivesse.
— Juro que isso é insignificante. Nosso amor é lindo demais para eu
me prender a uma situação acontecida há tanto tempo.
A confissão de Gabriela me surpreendeu e meu coração foi partindo
conforme ela narrava o episódio ocorrido em sua festa de aniversário de
dezoito anos. Sentado ao seu lado, forcei-me a lembrar de seis anos atrás,
mais precisamente da festa do seu aniversário de dezoito anos:

Eu e Marina, a gostosa que eu tinha levado como acompanhante e


que acabaria em minha cama no final da noite, estávamos sentados em
volta da piscina rindo, bebendo as cervejas que eram servidas em
abundância pelo buffet da festa de aniversário de Gabriela. Junto de nós,
estava Júnior e mais dois amigos que estavam comigo desde o ensino
médio. Nós quatro formávamos o quarteto fantástico do ensino médio, a
turma que cresceu lado a lado e que mesmo depois de cada um escolher
faculdades em cidades diferentes, sempre tentava se encontrar quando
vínhamos a Mococa.
Júnior era o mais alterado de todos. Ria, falava besteiras e, em uma
das vezes que Gabriela veio até nós para oferecer mais bebidas, ele ficou
me encarando estranho. Quando peguei minha garrafa e a menina saiu, ele
começou a rosnar sandices, dizendo alto para eu não dar corda para a
paixonite da irmã. Na hora não entendi, lembro de ter respondido algo
sobre ela ser uma criança recém saída das fraldas e de não ser o tipo de
mulher que gostava de levar para a cama. Não que sirva de desculpa, mas,
apesar de eu também estar bêbado, temi que alguém acreditasse naquela
maluquice. Seria um escândalo, pois eu era uns quinze anos mais velho do
que ela.

Um aperto forte em minha mão acabou me trazendo de volta para o


presente. Observei Gabriela me encarando preocupada e me senti um idiota
ao lado dela, sem saber o que falar.
Deus do céu, como pude ser tão insensível? Contudo, como eu
poderia saber que a garota ficaria escondida atrás da porta? Para ser sincero,
se não fosse Gaby tocar no assunto, eu não teria me lembrado daquela festa,
muito menos do que disse.
— Eu não tive intenção de te magoar. Nunca teria dito aquilo se
soubesse que você ouvia. — Gaby me abraçou, carinhosa, e seu perfume
envolveu meus sentidos, acalmando um pouco o mar revolto que existia
dentro de mim.
— Eu sei, Diogo. É bem verdade que passei boa parte da minha vida
te odiando, mas você mudou a minha vida, meu amor, deu sentido a ela e
faz a mim e a minha filha tão felizes que nada disso tem importância mais.
Eu amo você!
— Eu também te amo, meu amor.
Capítulo 28

GABRIELA

Os últimos dias tinham sido surreais. Não havia outra palavra para
definir o tanto de coisa que vivi em tão pouco tempo. Estávamos na véspera
de Natal e, embora Alexandre insistisse, há muito tempo essa data
comemorativa não era uma das que eu fizesse questão de festejar. Depois
que minha mãe faleceu e meu pai me pôs para fora de casa, ela se tornou
uma época triste em que a vida me jogava na cara o quanto estava sozinha.
Tudo bem, era exagero dizer isso. Eu tinha minha filha, meu primo e
amigos que não me abandonavam, mas para quem já teve tanto, era difícil
se acostumar com pouco.
Nem com a decoração da casa eu me animava, deixava por conta de
Alexandre que enfeitava tudo com muito carinho e, claro, exagero. Eu fazia
apenas o necessário para deixar minha filha feliz. Montávamos a árvore de
Natal juntas, Isa escrevia uma cartinha para o papai Noel e a deixava
escondida entre as bolas e luzes pisca-pisca, e eu, durante a madrugada,
colocava o presente debaixo da árvore para ela achar na manhã seguinte.
Só que esse ano seria diferente. Com Diogo ao nosso lado a vida
ganhou cor e intensidade. Eu decorei o apartamento praticamente sozinha.
Alê e meu namorado ajudaram com os arranjos que ficavam no alto, e
precisei também procurar um serviço de buffet para não ficar maluca com a
preparação das guloseimas da festa.
Sim, daríamos uma festa. Era véspera de Natal e convidamos nossos
amigos e seus familiares para a ceia. Transformaríamos à noite em uma
festa linda para celebrar a chegada do menino Jesus.
— Mãezinha, posso colocar esse vestido? — Isabela trazia nas mãos
o vestido branco de bolinhas vermelhas que ganhou de Ana há alguns dias e
me encarou cheia de expectativa.
— Não meu amor. O tio Di está trazendo o que encomendamos na
costureira. Lembra?
— Sim… o vermelho lindão — respondeu, abandonando a roupa
sobre a cama e veio até mim: — Mãe, posso perguntar uma coisa?
— Nossa, quando você pede para perguntar, meu coração até gela
— brinquei, pegando-a no colo. — Vai, amorzinho, conta o que é.
— Quando você vai casar com o tio Diogo pra eu poder chamar ele
de pai?
Não disse? Essa menina sabia como me deixar uma pessoa sem
fala.
— Filha, essa pergunta é um pouco complicada. Eu sei que quer
muito ter um pai, mas precisamos ir com calma.
— Não quero ir com calma. Todos os meus amigos tem papais e eu
não.
Isabela retrucou inconformada e não me deu direito de resposta.
Saiu pisando duro para fora do meu quarto e ouvi quando bateu à porta do
seu.
— O que aconteceu? — Diogo perguntou, entrando de surpresa e
me assustando.
— Manha. Daqui a pouco passa — respondi, sem encará-lo e voltei
a procurar pelas sandálias que queria usar na festa.
— Amor, demorei um pouquinho porque passei na casa dos meus
pais, trouxe sua roupa e a de Isa. Vou levar o vestido da manhosa, daqui a
pouco o pessoal começa a chegar. — Diogo beijou o topo da minha cabeça
e saiu.
Eu não queria mentir, mas aquele era um assunto delicado que eu
não sabia como resolver. Apesar de desejar fortemente que Diogo fosse o
pai da minha filha, ele não era e não podia forçá-lo a assumir a paternidade.
Quem sabe um dia.
— Isabela, abre, lindinha. Eu trouxe o seu vestido.
Ouvi Diogo chamar por Isabela e como ela não abriu, voltou até
meu quarto para pegar a cópia da chave que eu guardava para situações de
emergência como essa. Entreguei e o segui, observando como parecia tenso.
Ele abriu a porta e me assustei ao ver uma das bonecas de Isabela
passar voando sobre nossas cabeças. Eu nunca tinha visto minha filha ser
tão mal educada. Ela sempre foi carinhosa, respeitosa, e seu ato de rebeldia
me deixou sem fala. Foi Diogo quem reagiu.
— Que falta de educação é essa, Isabela? Não estou te
reconhecendo — repreendeu-a, tenso, tão confuso quanto eu.
— Nada
— Não pode agir assim. Entendeu? Precisa respeitar sua mãe e eu.
Quando eu tinha a sua idade, se falasse assim com meu pai, ficava de
castigo por um mês inteirinho.
Meu pai…
Droga, sem saber Diogo acabara tocando no cerne do problema ao
dizer a palavra que Isa tanto sonhava por falar.
— É, mas eu não tenho pai pra fazer isso comigo — resmungou,
amarga.
Diogo parou por um minuto, acho que identificando a raiz do
problema, e, quando pensei em intervir, ele fez sinal com a mão para que eu
parasse.
— Posso? — perguntou baixinho para mim.
Concordei, dando de ombros e ele se virou para minha filha com
uma expressão carinhosa na face. Já Isabela, parecia alheia ao que acontecia
ao seu redor e não viu quando Diogo se sentou ao seu lado na cama.
— Quer conversar, lindinha? Eu sei que tem alguma coisa lhe
incomodando. Sabe que pode confiar em mim para contar, não sabe?
Isa levantou a cabeça e meu coração partiu ao ver seu rosto banhado
de lágrimas. Sem que Diogo esperasse, Isabela o abraçou forte, e ficou lá,
até que tomou coragem para, enfim, desabafar.
— Eu queria que você fosse meu pai
Mesmo imaginando o que acontecia, meu namorado não esperava
pela resposta da pequena e ficou por uns dez segundos a encarando em
silêncio. Quando se recuperou da surpresa, eu o amei milhões de vezes mais
pelo que disse e fez.
— Bom, a senhorita estragou os planos que eu tinha para essa noite
— brincou, pegando minha filha no colo. — Sabe, Isa, eu nunca pensei em
ser pai, e logo que te vi pela primeira vez, toda esperta e falante na minha
porta, passei a desejar que se tivesse uma filha um dia, que ela fosse igual a
você. Porém, com o tempo, eu e sua mãe fomos nos aproximando,
acabamos nos apaixonando e o meu amor por você se tornou tão grande,
lindinha, que eu passei a desejar que fosse minha filha de verdade. Então,
meu amor, você querendo ou não, eu já me considero seu pai há muito
tempo, só estava esperando o momento certo para te contar isso. — Ele
beijou o rostinho de Isa e depois de abraçá-la carinhosamente, colocou-a de
pé ao meu lado e se ajoelhou. — Eu tinha preparado essa surpresa para hoje
à noite, mas, como não saiu como planejado, vai na improvisação mesmo.
— Diogo abriu uma caixinha pequena, tirou de lá uma aliança de prata
cravejada de minúsculos diamantes e, no centro, ao invés de existir a
tradicional pedra dos anéis de noivado, existia o símbolo do infinito. — Isa,
você me aceita como seu pai?
— Sim, sim, sim, mil vezes sim.
Ela pulou no colo dele toda feliz, e foi preciso que Diogo apoiasse
as duas mãos no chão para não cair.
— Eu amo muito você, Isabela, nunca se esqueça disso — falou
emocionado.
— Eu também amo muitão… pai.
Diogo a abraçou novamente e chorou de verdade, como nunca vi.
Eu também não estava muito diferente, o rosto molhado, mas o coração
explodindo de felicidade.
— Bom, eu ainda não terminei. — Diogo beijou o rosto da minha
filha mais uma vez e voltou a atenção toda para mim. Sorrindo daquele jeito
que sempre me deixava de pernas bambas, ele retirou do bolso outra
caixinha aveludada, essa maior e mais imponente e a estendeu para mim. —
Casa comigo, meu amor? Eu te amo demais, Gaby, e é apenas ao seu lado
que me vejo construindo uma família, cheia de filhos, cachorro, periquito e
até um gato se quiser.
Caramba, a surpreendida ali fui eu.
Pressionei meus dedos sobre os olhos, limpando as lágrimas que
desciam sem me importar em borrar a maquiagem que estava pronta para a
ceia de logo mais. Caí de joelho aos seus pés, chocada com a declaração
que fizera a mim e à Isabela, pelo pedido de casamento mais lindo do
mundo, e, claro, pelo anel de diamantes com uma pedra enorme, bem no
centro. Nem nos meus sonhos mais loucos eu poderia esperar um pedido de
casamento desses.
— Sim! — declarei, chorando, e o vi retirar o anel da caixinha para
colocar em meu dedo. — Eu amo você, doutor.
Um grito alto irrompeu ao nosso lado e ao olhar para ver quem era,
encontrei meu primo batendo palmas emocionado, junto de Isa. Olhei para a
peça brilhante em meu dedo, sem conseguir parar de tremer, e Diogo me
pegou no colo, girando comigo em seus braços enquanto me beijava.
— Obrigada pelo que fez pela minha filha.
— Nossa filha! — Diogo enlaçou minha cintura, os olhos brilhando
pelas lágrimas que desejavam cair. — Eu amo muito a Isa, Gaby, e não
consigo imaginar uma vida sem vocês duas.
Depois de nos beijarmos bastante e de aproveitarmos nosso
momento, precisamos sair de nossa bolha para receber nossos convidados
queridos para a Ceia de Natal. Confesso que estava doida para espalhar a
boa nova aos nossos amigos e foi o que fiz assim que todos chegaram.
Rimos, bebemos, conversamos muito e brindamos à saúde de todos,
mas, principalmente, à felicidade do novo casal. Ali, sentindo-me preparada
para começar a viver o nosso “felizes para sempre”, vislumbrei o futuro
lindo que havia ganhado de presente de Natal.
E de uma coisa eu tinha certeza: eu ia fazer de tudo para que nosso
amor durasse pela eternidade.
Epílogo

CINCO ANOS DEPOIS

DIOGO

Era sábado à noite, e Gabriela tinha acabado de adormecer ao meu


lado na cama. Mantínhamos uma rotina apertada durante a semana, mas os
fins de semana eram totalmente dedicados à família.
Apenas eu permanecia acordado. Com o volume da TV baixinho, eu
a admirava e contava as bênçãos recebidas. E a primeira delas era eu ter
voltado para Mococa. Essa sem dúvida foi a melhor decisão que tomei e
não houve um dia sequer nesses últimos anos em que eu não me sentisse o
filho da puta mais sortudo do mundo. Além de reencontrar Gabriela e
descobrir o verdadeiro amor, ganhei a oportunidade de formar uma família
ao lado de uma mulher incrível como ela.
Muitos achavam que deveria me envergonhar por ser o marido
quinze anos mais velho, mas era exatamente o contrário, adorava desfilar
com minha mulher de mãos dadas pelas ruas e fazer os maldosos se
contorcerem de inveja. Afinal, eu me cuidava muito, malhava diariamente
para manter a saúde e o físico em dia. Ter quarenta e quatro anos não
significava que estava à beira da impotência, pelo contrário. Eu tinha um
tesão danado na minha esposa e dava conta do fogo da baixinha
tranquilamente.
Sorri, apaixonado, ao encarar minha mulher mais uma vez. Tantas
coisa havia acontecido desde que Gabriela disse sim ao meu pedido de
casamento.
Ao contrário do que imaginei quando pedi Gabriela em casamento,
ela não quis se casar no religioso. Ela contou que não tinha o sonho de se
casar na igreja e fizemos uma reunião na chácara dos pais de Ana, onde nos
casamos no civil só por questões legais, porque de coração e alma já
pertencíamos um ao outro. Não conversamos abertamente sobre isso, mas o
fato de não ter o pai para levá-la até o altar, pode ter influenciado em sua
decisão.
Por falar em Mário, ele faleceu exatamente um ano depois da
descoberta do câncer. E, durante esse período de tratamento, ele não
procurou a filha uma única vez, nem mesmo quando estava à beira da
morte. Preferiu morrer sozinho aos cuidados de desconhecidos. O desprezo
do homem foi tanto, que nem acreditamos quando seu advogado, Adalberto,
procurou Gabriela para comunicar que Mário havia deixado toda a herança
para ela e o irmão.
Por escolha minha, um ano depois do nosso casamento decidi dar
uma pausa na minha profissão, para que Gabriela realizasse o sonho de
cursar a faculdade de Fisioterapia. Eu já tinha feito tanto pela minha
carreira e queria dar a ela a oportunidade de fazer também, porém, não foi
fácil convencê-la disso.
Nos mudamos para a cidade vizinha de São João da Boa Vista, que
possuía uma ótima graduação, e durante os quatro anos do curso a clínica
ficou nas mãos de Cora e Lucas. Eles se mostraram excelentes gestores e eu
ia até lá uma vez por semana para assinar o que era preciso, e aproveitava
para visitar meus pais.
Hoje a relação da minha mãe com Gabriela era completamente
diferente, contudo, demorou um bocado para que vivêssemos em paz. Tudo
mudou no segundo ano da faculdade de Gabriela, quando recebemos um
presente maravilhoso, que também foi um susto para minha esposa. Ela teve
uma infecção urinária muito forte e precisou fazer o uso de antibióticos.
Não deu outra, o anticoncepcional teve sua eficácia reduzida e mesmo nos
cuidando e usando camisinha, Gaby engravidou.
Todos amamos a novidade, principalmente minha mãe por se tornar
avó e foi a partir daí que a paz reinou. Já Gabriela de início surtou com a
gravidez. Não tinha como ser diferente, coitada. De novo ela começou a
faculdade e se descobriu grávida no susto outra vez.
A chegada de Felipe fez tudo ficar ainda mais completo e bonito.
Fisicamente, ele era uma mistura de nós três. Sim, três porque Isabela fazia
parte do pacote. Fisicamente, Lipe era a mistura minha e de Gabriela. Seus
cabelos escuros e olhos verdes eram idênticos aos da mãe, o narizinho
afilado e as bochechas rechonchudas pareciam bastante com as minhas
quando pequeno, só o gênio e a personalidade eram de Isabela. O garotinho
de dois anos era faceiro e esperto como a irmã, mas ao contrário dela,
Felipe era tímido como eu fui na idade dele.
Isabela estava com quase onze anos, alta, esguia, os cabelos lisos e
escuros quase chegando aos ombros. Ela continuava inteligente e amorosa,
e me chamava de pai desde a fatídica noite de Natal em que pedi para ser
minha filha. E eu a amava com o mesmo amor incondicional que tinha por
Felipe.
Agora, cinco anos depois, nossa rotina voltava a de antes.
Retornamos para Mococa e eu trabalhava na Pró Vita apenas como médico
ortopedista. Gabriela havia sido promovida a fisioterapeuta e não tinha mais
seus plantões alterados por Cora. Ela e Gabriela não eram as melhores
amigas, mas se respeitavam. E eu não poderia ficar mais feliz com isso.
— Por que está sorrindo? — perguntou Gabriela, tirando-me do meu
devaneio.
— Felicidade. Estava aqui, perdido em meio às lembranças.
— Sei não. Sua cara parecia a de quando pensava em putaria.
Acabei soltando uma gargalhada e alisei seu cabelo, um gesto que
adorava fazer quando conversávamos deitados.
— Juro que eram pensamentos puros.
— Sabe, eu não posso dizer o mesmo — disse, safada, e me deu um
selinho, antes de completar: — Afinal, estava tendo um sonho erótico tão
gostoso. Pena que acordei justo na hora que você ia me fazer gozar.
— Sério? Assim, por um acaso, será que você ficaria feliz se eu te
ajudasse a resolver esse probleminha? — perguntei, debruçando-me sobre
ela, pronto para tomar posse do seu corpo.
— Eu seria a mulher mais feliz do mundo se o meu homem me
desse prazer. — Alisou minhas costas e impulsionou o quadril para cima.
— Ah, meu amor, então aproveita, porque seu homem vive para te
fazer feliz e te dar prazer. — Rebolei gostoso, roçando o membro duro na
sua boceta e ganhei um gemido em retribuição.
Toquei sua boceta e a senti molhada, pingando excitação. Meu pau
pulsou por vê-la excitada, pronta para se entregar ao tesão que sempre nos
consumia, e, quando buscou os meus lábios, faminta, nos fundimos em um
só, numa completa sintonia entre corpo e alma.
— Eu te amo.
— Eu te amo mais, minha vida, pra todo o sempre.
AGRADECIMENTOS

Ah, esta história se tornou muito mais do que especial para mim. Eu
sempre sonhei com a possibilidade de escrever uma história que se passasse
na minha cidade natal, Mococa. Foi incrível visitar cenários que fizeram
parte da Infância, lugares que há muito tempo eu passava por eles e nem
dava tanta importância. A praça, a igreja matriz, os casarões antigos do
tempo áureo do café. Nossa, tenho paixão por aqueles casarões e morro de
vontade de visitá-los, ver como tudo é por dentro. É lindo demais.
Bom, primeiro quero agradecer a você, leitor, que deu uma chance
ao meu livro. Muito obrigada pelo apoio e carinho! Espero que tenha
curtido a leitura, e, se puder, avalie o livro para mim, isso é importantíssimo
para nós escritores.
Deixo minha gratidão também a todos que torcem por mim. As
maravilhosas autoras do grupo @autoralendoautoraoficial_, que estão
sempre por perto para estender a mão.
Às queridas Bruna, que me acompanha como leitora e beta desde o
meu comecinho como autora, (Olha, ela merece um prêmio pela paciência
que tem com meus sumiços e atrasos!), e autora Ruth Arnaldo, que betou
esse livro com um cuidado incrível. Ela deu dicas, apontou furos, foi
maravilhosa e fez tudo como se o livro fosse dela. Minha gratidão eterna a
vocês. Deus lhes pague pelo apoio e amizade.
Por último, mas tão importante quanto, meu agradecimento às
minhas amigas e autoras do @projeto_oasideia, Silvia Kaercher e Priscila
Castelano, que me convidaram a participar desse lindo projeto. Está sendo
incrível vivenciar isso com vocês e que este seja apenas o começo de um
caminho abençoado, vitorioso e recheado de histórias que aquecerão os
corações dos nossos leitores.
É isso…
Para ficar por dentro dos próximos lançamentos, siga:

@autoratatyaguiar

@projeto_oasideia

Obrigada e até a próxima história


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