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A Proclamacao da Republica Copytighe © 2000, Ceo Casto “Tous of dieiosrxecrats, A eprodusto nio-auiorinada desta publcasio, no Kado ou er pare, cons wolagas Ao copyrighs (Le 5.385) 2009 Dineics para ests edigsocomtrtidos com Joie Zaher Eft Lid. rat Mévie 31 sobre 20031-114 Ri de arsing, Rj seks 2D) 240.0236 fa: (21) 260-5123 ‘oil jee@eaharcom be Capa: Carol Sé- Sergio Campane usagzo dy caps: “A Revoluyio Brace’, desenho de Sollenger Vines da coke ustracto de Debret Composigio Tap Testes Edie Impress: Harburg Danley © CIP-Ba. Caalogito-ne- Fonte Singicaro Naional don Editors de Uta. Ri — Car, Caso | C359 A Procamazto da Replica 1 Cate Caste, — Rio Ineo: org Zahara 2000 1h Descolrindo Bei) Ince bibgraia ISBN 55 7110-5340 1 Bas - Misi Pols sil Mice 168 0d Reps, 1, | 1 Thal. Serie | 0D 981.05, CU 96t"1¢89" Sumario Introdugio 7 A mocidade militar 11 A Questo Militar 28 Deodoro e Benjamin 32 A procura de um lider 40 Acconspitagio 60 A terra da promissie? Cronologia 80 Refertncias e fontes 82 Suugesties de leeura 85 Sobre 0 auror 86 Mbustragies (entre p.48-49) Créditos das Hustracoes 1. Foro da Escala Militar. Colegio Mare Ferrez(gentilenre cédida por Gilberto Ferre) cos de Benjarnin Constant. Fundagéo Getulio Vargas! CPDOC (Arquivo Horta Barbosa) 3, Pacto de Sangue. Ata da sesso do Clube Militar de 5.11.1889. Colegio de Pactos de Sangue © mensagens recebidos por Benjamin Constant (reproduzido no Gabi- neve Forocartograico do Ministério da Guerra, 1939) 4. "A Revolucio Brasileira” (desenho). Fundagio Geealio ‘Vargasic?D0C (Arquivo Quintino Bocaitva) { | | | { | | Introdugio © 15 de Novembro é hoje um dos feriados nacionais menos evocativos. Nio hi um heréi a ser lembrado, como Tiradentes no 21 de Abril, nem paradas militares ou desfiles de estudantes, como no 7 de Setembro Nem mesmo uma imagem consigrada, como a da forca, ou um grto, como o do Ipiranga: apenas uma “proclamasio”, um antincio piblico de que a Monar~ quia havia sido substitulda pela Repiiblica. Sem huta, sem sangus, sem mortes. Para os que na época defen diam os republicanos, prova cabal de que o Império jé sstava hé muito com os dias contados ¢ que a nova forma de governo amadurecesa no espirito do povo brasileiro, Para os monarquistas, a Proclamagio fora apenas uma quartelada que inseria 0 Brasil no triste squadro das outras nagGes sul-americanas, marcadas por inkimeros pronunciamientos militares. Na expressio de Aristides Lobo, um jornalista republicano da época, rrarara-se de um evento a0 qual a maioria da populagio assistira “bestalicada, arbnita, surpresa, sein saber 0 que significava.” Oficil sucesso do golpe republicano coloca algumas armadilhas & nossa percepsio historica do evento. Po- deviamos imaginar que a Repaiblica cra inevitével, uma ctapa necessiria da “evolugio” da sociedade brasileira Também seria Fieil pensar que os principais protago~ nistas do movimento — na linguagem da época, a “classe militae” — atwaram de fortna unida e coesa assim tivesse sido, sexia Facil explicar a falea de reagio por parte do governo ¢ 0 modo indiferente com que a :maioria da populagio assistiu aos acontecimentos. Nio € essa a histdria que se contarg neste livro, Para termos urn quadro mais pre 15 de novembro de 1889, é preciso, em primeiro lugar, recuperar 0 grau de risco politica envolvido no em- presndimento, Nao havia cerceza quanto aos resulta- iso do que se passou em dos do golpe de Estado, principalmente porque n30 havia unidade entre os militares. De faro, apenas uma pequena fragio do Exército, ¢ com caracteristicas mui~ to especificas, esteve envolvida na conspiracao republi Ogolpe de 1889 — ou a “Proclamacio da Republi- ca", como passou & histéria— foi um momento-chave no surgimento dos militares como protagonistas no cenario politico brasileiro. A Reptiblica entao “procla- mada’ sempre esteve,em alguma medida, marcada por esse sinal de nasceng: nal). Havia muitos republicans civis no final do Im- (ou, para muitos, pecado origi- pério, mas eles estiveram praticamente ausentes da a A ocusngho OA REPUBLEA conspirasio. O golpe republicano foi militar, em sua ‘organizagio ¢ execugio. No entanto, foi fruto da agio de apenas alguns militares. Quase nao houve part io da Marinha, nem de individuos na base da hi quia militar (as “pragas”, como os soldados ou sargen- 105), Mesmo em relagio ao Exércico, também estiveram ausentes oficiais situados no topo da hierarquia, Den- tte os generais, apenas Deodoro esteve presente. Os oficiais supetiores podiam ser contados nos dedos, ¢ 0 que mais se destacou entre eles nao exercia posicio de comando de tropa: trata-se do tenente-coronel Benja- min Constant, professor de matemitica na Escola Mi- lita Quem foram, entio, os militares que conspiraram pela Republica e se dirigiram 20 Campo de Santana na manha do dia 15 de novembro de 1889 dispostos 2 derrubar 0 Impétio? Basicamente, um conjunto de oficiais de patentes inferiores do Exército Lala nos, tenentes ¢ copities) que possula educagio supe ou “cientifica” obtida durante 0 curso da Escola Mili tat, entéo localizada na Praia Vermelha, Rio de Jancito. Na linguagem da época, eles eram a “mocidade mili- car’ ‘Minha versio dos acontecimentos difere em pontos importantes das opinides disponiveis na bibliografia histérica sobre o tema. Em algumas versbes, Deodoro aparece unindo simbolicamente todo 0 Exército, ou- tras veres representando apenas os oficiais mais ligados +9 caso casa a tropa, chamadas de “tarimbeiros”, geralmente sem estudos superiotes e que constituiam a maior parte da oficialidade. Minka visio de Deodoro, como veremos adiante, é a de um chefe militar levade 20 confronte com 0 governo, motivade pelo que imaginava ser a defesa da “honsa” do Exército e por algumas particu- laridades da politica do Rio Grande do Sul, que havia chefiado hi pouco; nio por convicgdes republicanas. Pouco antes do golpe, reuniu-se em torno de Deodoro tum grupo muito pequeno de oficiais de pacentes mé- dias, “Todas as fontes dispontveis destacam alideranga que Benjamin Constant, por er sido durante muitos anos seu professor de matemitica, exetcia sobre a “mocidade militar” formads na Escola Militar da Praia Vermelha, Ele seria 0 “mestre”, “lider”, “catequizador" ou “apés- colo” desses militares, Para varios autores, principal ‘mente 0s vinculados 3 rradigio positivista, Benjamin ¢ seus jovens liderados teria sido o principal elemento na conspicasio. Minha perspectiva, no entanto, foca- Jiza nao o “lider” ou “mestre”, mas seus pretensos “liderados” ou “discipulos”. Ao invés de assistirmas @ Benjamin Constant catequizando os jovens da Fscola Militas, encontraremos justamente a "mocidade mili- tar” seduzindo-o e convertendo-o para o ideal republi- cano, Arribuo i “mocidade militar’, portanto, 0 be de protagonista da conspiragao republicana no intetio do Exéccito. 10+ ‘emocuawacho Da werUBDca ‘As perguntas que tentaremos responder a seguir si: quem cram esses militares? Por que se envolveram, numa conspiragao epublicana? Comoo movimento se desenvolveu: e levou ao golpe que pés fim ao Impérioz A"mocidade militar" Benjamin Constant recebeu, nos dias que antecederam 420 golpe, seis abaixo-assinados secretos que posterior- ‘mente ficaram conhecidos como “pactos de sangue”, pois Ihe garantiam solidariedade incondicional até a ‘morte em sua atuagio como representante da “classe tmilitar” contra 0 governo, Um exame dos 173 signaté- tos desses documentos permite-nas rer uma boa nogdo de quem ram seus “liderados”. Hé entre cles apenas ois oficiais superiores, em meio a 13 capitées, 37 tenentes, 120 alunos de escolas militares (incluindo alferes-alunos) ¢ um cuja patente nao foi possivel iden- tificat, Ou seja, « maioria de militares em inicio de ‘arteira ¢ esmagadora. Examinando as unidades a que cles pertenciam, temos 110 ahinos da Escola Militar da Praia Vetmelha ou da Escola Superior de Guerra (um desdobramento da anterios, cada em 1889) 48 da 2: Brigada do Exército, além de 14 nao especificados. ‘As duas escolas de formagio de oficiais cespondem, dessa forma, por aproximadamente 2/3 do total, ¢ a 2 Brigada, com quase todos os oficiais tendo sido “We caso cAI formados na Escola Milita, pelo tergo restance. Desse modo, praticamente a rotalidade dos que assinaram os “ pacios de sanguc’ é composta de militares que ainda estudavam nas duas escolas superiores de formagio de Gficlais do Exército e offciais das patentes inferiores (cenentes ¢ capitis), reeém-egressos dessas escolas mic litares. Consegul estabelecer alguns dados biograficos para tuma parte dos assinantes desses“pactes de sangue”. E mmarcante a predominincia de pessoas oriundas das provincias do Norte do pats (da Bahia ao Amazonas) exeetuando-se uma cepresentagio significativa (calvez entre 15% e 20%) de alunos naturais do Rio Grande ddo Sul, Além disso, podemos ver que o membro tipico da “mocidade militar” tinha menos de 30 anos 20 scr proclamadaa Repiblica eestudou na Escola Militar da Praia Vermelha no petiodo posterior a 1874 (quando a Escola foi reaberta apos ter estado fechada durante a Guerra do Paraguai). Muitos ainda eam alunos em 1889; se j4 fossem tenentes, teriam sido promovidos pouco antes. & portanto fundamental, para compreen- idermos a formagio desses jovens, conhecer sua expe- riéncia na Escola Militar da Praia Vermelha. Para a maioria dos estudantes milicares, que vinha das provincias menos desenvolvidas do pals, chegar 8 Corte pela primeira ver implicava no apenas um Geslocamento espacial, mas principalmente clnual Ocorria o contato com um tempo social distinto: mais “12. ‘A PRoclaagAo 04 REPUBLICA “moderne”, “adiantado” ¢ “velo2”, a fazer contraste com um tempo mais “lento” e “atrasado”, quase ainda colonial, das provincias. Acravés das cartas que o aluno José Bevilaqua, de 16 anos, enviou & familia, em uma jpequena cidade do Ceara logo apés chegar 20 Rio em 1879, podemos ver o quanto a cidade fascinava muitos cde sua geragio, Suas primeiras impressbes na Corte sio de desiumbramento, Contou da primeira vex que an- dou de bonde, que foi 20 teatro e do fondgrafo, uma “méquina que fala”, “invengo maravilliosa” que 00- nhecera a0 passear pela rua do Ouvidor, rua da moda ¢ coragio da cidade. Ele sintetiza assim 0 novo mundo que descobria: "O Rio de Jancito € 0 Brasil ea rua do Ouvidoré o Rio de Janciro, Tudo aqui é muito bonito.” A preferéncia & clara: 0 Brasil passe a ter no Rio de Janeiro — ou melhor, na rua do Ouvidor — sett espelho, € a estar mais préximo da Europa que dos sertbes, ‘Afastados da terra natal, ao ingressar na Escola Militar esses jovens passavam a ter como grupo bisico de referencia nfo mais suas familias ¢ sim os outros alunos, entre os quais se desenvolvia intensa convivén- cia cotidiana. O infcio era dificil. © novato precisava softer com tesignagio 0 rito dos totes, durante os quais era sistematicamente submetido a situacdes bumilhan- tes. Asubmissdo, no entanto, aproximava-o dos alunos ‘yereranos, principais responsveis pela socializagio dos novos alunos no ambiente cultural da Praia Vermelha 113s casa caso Havia uma marcante concentragio de interagbes dentro do préprio grupo de alunos, reforgando seu espirito-de-corpo. E notavel, em seus relatos, a palidez dda imagem que os alunos guardam de seus professores e comandantes, cm contraste com a vivida lembranga da interacio com colegas. Afastados de suas familias por muitos anos ¢ desde cedo, tinham em seus pares 0 grupo fundamental. ‘AsinteragBes com colegas nos trotes; nos momentos de lazer, nos alojamentos ¢ em diversas associagdes recreativas¢ literitiascriadas e mantidas pelos préprios alunos conttibuiam em grande parte paraa construgio da identidade social dos jovens formados na Praia Vermelha. Outros dois poderosos elementos de coesio social erama mentalidade “cientificista” predominance nna cultura escolar € a importincia dada ao mérito pessoal. Esses elementos culturais orientaram a a¢i0 politiea que levou ao firn da monarquia e3 instauragao de um regime republicano no Brasil ‘A supervalorizagéo da ciéncia, ou “cientificismo”, expressava-se na pr6pria mancira pela qual os alunos se referiam informalmente & Escola — “Tabernéeulo da Ciéneia" —, deixando desde logo evidentea alta estima que tinham pelo estudo’das ciéncias. E importance observar que a Escola Milicar foi durante muito tempo a sinica escola de engenharia do Império. Ela era co- rnhecida por seu alto grau de exigencia, especialmente devido 20 forte ensino de maremitica, ¢ os estudos sae A mocianagao 04 FEPIBUCA teGricos mereciam maior atengéo do que os estudos priticos. Havia uma clara superioridade no custiculo do estudo das armas chamadas “cientficas” (artlharia eengenharia) sobre os estudos de infancaria e cavalaria, que correspondiam aos anos iniciais do curso. Basta dizer que os alunos que seguiam 0 curso superior ‘completo, de cinco anos, recebiam o tftulode “bacharel sm materuéticase céncias fisicas” Dessa forma, era enorme 0 fosso entie os oficiis formados na Escola Militar e cestante (2 maioria) da oficialidade do Exército, sem estudos superiores, mais ligados & vida na caserna, com a tropa, O curso na Escola Militar nao era obrigatério para 0 ingresso no oficialato ¢ a ascensio hierirquica. De fato, 2 carreira militar ndo oferecia vantagens ou boas oportunidades pata 0s jovens “cientificos’. Na falta de perspectivas consideradas etraentes para a ascensto profissional dentro do Exércico, ales passavam a interessar-se menos pele profissio militar (muias vezes a fala de vocagio cera assumida desde o inicio) ¢ mais por seu pene] mento 2 elite intelectual da sociedade brasileira. com os membros dessa elite que disputavam, social © simbelicamente, espago ¢ poder Durante todo o Império, foi clara a hegemonia dos bacharéis em direiso no interior da elive. Enquanto 0 status social dos militares era baixo, os jovens bacharéis ‘em direito tinham caminho aberco para cargos ¢ fun {0es piiblicas em todos os quadros administtativos ¢ 115. cus casi paliticos do pats. Os jovens “cieneficos’ de Exército finham que Iutar pare sitar-se melhor dentro de wma sociedade dominada pelos bacharéis em direico. ‘Nos eseritos dos jovens militares “ciencificos” da gpoca, a oposigéo aos bachardis em direito aparece clatamente. A falta de elementos “cientificos” € =pon- tada como o principal defeito da formagio dos bacha- séisem direito, Euciides da Cunha, por exemplo, entio uum jovem aluno de 20 anos, critica em um artigo © “esisce quadro das nossas academias de direito, onde estudacse a sociedade sem as nogbes das mais simples leis naturais". © estudo das ciéncias, ¢ em especial da matemética, era um poderoso elemento simbélico de diferenciagao pata os estudantes militares da época, um ‘elemento constinutivo de sua identidade socal, ‘Amencalidade cientificistz predominante nas déca~ das finais do sécula XIX vig 0 mundo social como redutivel ao plano dos fenémenes fisicos € natursis. ‘Auavés da incorporagio da histéria 4 natureza, princi- palmente através da nogio de evolugae, os distintos valores morais, politicos e filosSficos eram vistos como manifestagbes dos diferentes estigios pelos quais passa yaa hummanidade, Essa visio alimentava um sentimento desuperioridade intelectual por partedos centificitas, que se consideravam produtos, naturalmente, do esté- gio mais “adianeado” do desenvolvimento humano. © tipo intelectual earacteristica do cientificisme imperou na segunda metade do séeulo XIX, encarnado +18. A pwctaaga 2A AeUBUCA om cv adn inclesins maeilisn, po- sitvisme, darwinismo, evolucionismo, monismo, To- ds procusvm descobrt a let que ee 0 progen ave determina a evolugio, Com 0 positivismo de ‘omte, por exemplo, ela tomaria a forma da lei dos tes etados — teoldgico, metalic e positive —, que cxplicatiatode a historia e desembocata na const ‘do de uma rcligito, a da Humanidade, Com Darwin ¢ Haeckel, sali sera ada Inca pla vide eda sobre. vivencia dos mais aptos, Com Spence, lei apareceria sob forma wh dohonngeno pan shee gine deerme difensao. ipl teiade rasa, ess diferentes doutrnascientfistas apon. "avam nium nico sentido: a identidade ene nacie nal € o universal, Desse modo, a sinuagio histérica especfica do Baslerapensida como uma ape dnt petro jd realizado pelas nagdes “mais adiantadas "ara o cientificista, cumpria, pois, apressar a marcha do progresio do pas, de forma a que ele passe 4 tomar parte, ativamente, na histéria universal Osesritos dos ahinos da Escola Miltar revela urn ambience intelectual dverifiado, Contrarian urna versio comum em nossa hstoriograia, os paiva orcodoxos,fliados Igreja Posi, mane femme uum grupo sgrificaivoentreos alunos. O dentifiiso predominante eta uma mistura ecésica de diveres loutrinas — positivism, evolucionisme, monismo —,20 maisimporante para osjovens "cientfios” era “7 caso case seu o espirito geral. As diferengas encre os aucores eram minimizadas pelo que afiemavam em comum: a fé no progresso ¢ na posigao de destaque devida & ciéncia para se atingir wma visio correta da vida social e da politica, Junto a0 cientificismo, a valorizagao do principio do oO mérito foi outro clemento presente na base da identi- dade social da “mocidade militar” que ajudavaa orien- tar sua agio politica, O desenvolvimento de valores meritocracicos nos Exércitos profissionais modernos e, cspecificamente, nas academias militares foi um fend- meno histérica bastante difundido. Idealmente, 0 po- der baseado no parentesco ou na rigueza passava a subordinar-se 20 mérito dos individuos, aferido no sistema escolar, Na nova elite social que assim deveria surgi, as posigbes sociais deixariam de ser asribu por privilégio de nascimento, passando aser coerk) gragas A capacidade individual. A sociedade meritocr tica seria aquela onde vigoraria plenamente esse prin- cipio. E claro que hé uma enorme distancia entre a afirmagio ideolégica do principio do mérito © seu fancionamento efetivo. Mas o que importa neste mo- mento & perceber a crenga inabslavel que os jovens riilicares “clentificos" tinham no métito como princi pio de ordenagio da sociedade, A introdugéo no Exército brasileiro, a partir de 1850, de mecanismos baseados no merecimento para a progressio na carteira pode ser considerada um marco see A proctancAo DA RERICK fundamental do processo de diferenciagao da oficiali- dade “cientifica” do Exétcito em relagio a elite civil e dentro do Exército, 4 maioria de oficiais sem estudos superiores e de perfil mais eroupier, isto é, ligados & ‘ropa, em sua maior parte pestencences &infantaria ¢4 cavalaria, Apesar disso os oficiais das “armas cientifi- cas” no se tornaram profissionalmente privilegizdos, Muito pelo contritio. A valorizagio da performance académica nfo acarretou, porexemplo, uma ampliagio significativa de unidades e vagas pata fungdes de co- mando. Com isso, muitos oficiais“cientificos”tiveram de passar fongos periodos em fungées burocriticas ou dedicar-se a0 magistério. Havia, portanto, uma enor me distancia entre a afirmagao, no curso da Escola Militar, da superioridade do mérito ¢ dos estudos “ciencficos” e sua efetivagio na reatidade de um Exe ito que custava a se modernizar. ‘As memérias e documentos de ex-alunos da Escola Miilicar da Praia Vermelha permitem que se veja de forma inequivoca o valor excepcioneal que atribusam a0 principio do métite, Este nio tinha, para os alunos, uma existéncia apenas ideal: materializava-se no titulo de “alferes-aluno”, exclusivo dos alunos da Escola Mi- licar que se descacassem nos dois anos iniciais do cusso superior. Esse titulo, criado em 1840, consagra 2 pri- mazia dos estudos “cientificos". Recebido pelos alunos aprovados plenamente a0 final dos anos iniciais do curso (infantes e cavalarianos, portanto, no poderiam +19 aso ASIA ser alferes-alunos), representava um prémio pelo de- sempenhe escolat e, além disso, um aumento substan~ cial nos vencimentos que recebiam. Pate muitos, este faror era também importante, Embora nao tenhamos uitos dados sobre a origem social dos altinos, parece ‘evidence quie a maioria nao pertencia& elite ccondmica do império. Durante todo 0 Impétio, a Escola Militar {ojo Ginico estabelecimento de ensino superior efetivae mente gratuito (de fato, os alunos ainda recebiam para estudat). Dessa forma, representava uma rara oportue nnidade de ascensio social para jovens oriundos de familias mais modestas. Para além de consideragoes monetirias, 2 ascensio por mérito representava um bem simbdlico fundamen- tal para a construgio da identidade social desses jovens militares. Qutra carta de José Bevilaqua, 0 novato deslumbrado com o Rio de Janciro que conhecemos hi pouco, ¢ bem ilustrativa. Escrevendo em 1884, agora no meio do curso, cle informa orgulhosamente 40s pais seu sucesso nos estudas e comunica que por isso estard habilitado a ser nomeado, em breve, alferes- ahuno: Esce posto ... é um prémio que se dd aos estudantes que sio aprovados plenzmente nas matérias de dois anos do Curso Superior: .. é uma promogio muito considerada no Exército, visto ser pot leie por estudos, independentemente da vontade do ministro, que no +20. ‘poco 08 REPUBLICA outro caso promove aos protegidos. (sublinhado no, original] A “mocidade militar” com estudos superiores se sentia vitima, porianto, de uma dupla marginalizagao: como parte do Exércico dentro da ordem monérquica dominada pelos bacharéis em direito ecomo um grupo de oficiais com estudos “cientifices” dentro de um Exército que nio se modernizava. © isolamento ¢ 0. ressentimento daf resultantes possibilitariam o desen- volvimento de caracteristicasideolégicasdistintase em grande parte contritas a da elite civil A canalizagio desses elementos eulturaisem projetos de asio coletivos segitia um caminao especifico. Na Escola Militar, socializagSo informal que ocortia fora das salas de aula, comandada pelos proprios alunos, foi muito mais importante para a formagio da mencalida- de caracteristica da “mocidade militar” do que aquilo que se aprendia com os professores. Pelo menos dois indicadores apontam nessa ditegio. Primeiro, a quan- tidade muito menor de referéncias, nas memériss de exalunos, aos professores ¢ ao ensino formal do que 2 socializagio informal — teotes, associagdes de alunos, momentos de lazer, Em segundo lugar, 0 fato de que ‘muito do que maisintensamente se discutia nas revstas ¢ reunides dos alunos nao feria parce do curriculo nem ara ensinado pelos professores. Por exemplo, ao discu- tirem as teorias cientifcistas mais modernas, como as sae de Spencer e Haeckel, os escritas das alunos nos mos- «ram um ambiente intelectual muito mais hetezogneo ¢ diversificado — muito mais “avangado” — que o de ‘Os lacos horizontais de camaradagem ¢ lealdade entre os alunos materializavam-se também em diversas sociedades cientificas, recreativas ¢ literérias mancidas por cles proprios. Se eram permiridas pela ditegio da Escola, nao eram dela originarias nem dela dependiam, AAlunos mais adiantados, embora também jovens, sempenhavam, come virnos, um papel avo na sociae lizagdo ¢ formagio intelectual de outros alunos mais novos, Estes, muitas veres, viviam um verdadeiro cho- gue intelectual ao chegar (a maioria, das provincias) para estudar no “Taberndculo da Ciéncia” — denomi- o, lembremos, dada pelos proprios alunos 3 sua Escola, significando mais a escola informal que a for- mal, Esse processo, por sua intensidade e velocidade, muitas vezes dava a esses jovens a sensagio de que sua pouca idade cronolégica ere compensada pelo apren- dizado das doutsinas “cientificas” e “modernas’. O aluno Lauro Sodsé, por exemplo, em artigos de 1881 que polemizam como clero de seu estado natal, o Pars, eseritos quando tinha 23 anos, € um exemplo do sensimento de superioridade intelectual desses jovens: ‘Mais valor cem uma observacio mesmo curta, mas bem dirigida, do que longos anos de uma experiéncia 122. APROCLAWAAD DA REELCA desorientada, Nao admia, portanto, que 0 mogo obs- cro, aucor descas inhas, conhegaa filosofia positivae que 2 desconhegam velhos sacerdotes da religido cat6- lca O republicanismo da “mocidade militar” era ortu do da valorizacio simbélica do mérito individual mada cultura cientificistz hegeménica entre os alunos ¢ jovens ofictais “cientificos”. As ultimas décadas do século XIX viram a aproximacio cada ver mais estreita ence © “culto da ciéneia” ¢ 0 republicanismo. Na Franga, centto cultural do “mando civilizado” de en- do, 0 surgimento da Tereeira Reptiblica elevou o culto da citncia, da cazi0, da evolugio € do progresso & condigao de ideologia oficial. “Ciéncia” rornou-se pa- lavia comum nos manifestos republicanos e ser como arma ideoldgica contra monarquistas ¢ conse No Brasil, 2 estreita vinculagio enue republicanis- mo ¢ ciéncia também foi freqiientemente reiterada. O agora tenente Lauro Sodré, que acompanhamos acima, criticando os sacerdotes, ditigiu, em 1885, uma “Carta 20 Imperado:”, através de um jomal de sua provine! onde afirmava, baseado nos métodos das eiéncias turais, a inevitabilidade do progresso, “a marcha inde- fectivel da civilizagio para diante". Citendo Spencer, defendia que 2 Monarguia era “um atestado de infe tioridade mental ¢ de baixeza de caréter" 123. cets0 caso ‘© mesmo Lauro Sodré foi o redator de um mani- festo republicano em 1886, no qual afirma que 0 objetivo é “a clirninagéo da realeza, que para ni presenta a causa do nosso arraso”. A certeza de oe Repéblica viria mais cedo ou mais tarde era justfieada om cermos cientificistas: Por vituude da evolugio, essa lei eterna que rege todos (5 fenémenos da nacureza, que vai do microcosmo 20 macrocosmo, do domo diferencial a0 grande wodo chamado universo, a luz da civilizasio pode penetrat ‘os antros do despotismo e varrer da superficie da terra a sombra dos auroctatas. Ainda segundo esse jovem militar “cientfico”, a mudanga de regime nao ocorreria sem comogio e sem abalo: “Séo fatos aaturais na ordem social, esses cho- ques violentas chamados revo Alguns artigos escritos por Euclides da Cunha em 1888-89 fornecem érimos exemplos de como @ cultura cientificisca da “mocidade militac” se proje- tava sobte a visio que eles tinham da politica. Des- tacarse, neles, a certeza absoluta de que os ideais democriticos dos republicanos si ciemtificos — formula que Euclides resume admiravelmente na gio: “Formu-se um democrata como se faz um geémetra” ses.” 128. APnoctatncho vx surUsios Pois bem, a politica do século XIX chama-se democrae Cia: de hi muito a colaboracio de todas as ciénciss ¢ das tendéncias naturais de nosso temperamento des Dua do frigil cardeer de urna opiniio pattidétia, para rovesticla da fortaleza da légica inquebrantavel de uma declucao cientifca, Em sociologia, eu creio que. chegese # ela tao naturalmente como Lagrange 3 féemula geral da dindmica, Assim, no é uma forma cle governo que se adot, um resultado flsstico que s¢ € obrigado 2 adorar; forma-se um democrata como se fae uum gedmerra, pela observagao ¢ pelo estudo; e, nessa lua acitrada dos pats, por fim o republicane do vencerd — convener; e, endo enfim dominade osadversitios, nio os enviaréa guilhocina, mand-ios, 4 paraa.escola, Outra carta de nosso jf conhecido José Bevilaqua, eserita no inicio de 1886, é ainda mais clara a esee tespeito. Ele procura tanqiiilizar sua mae, carslica Praticante, do susto que ela tivera ao receber a noticia Ge que o filho, agora alferes-aluno, em breve deixatia 0s alojamentos da Escola Militar para ir morar com colegas numa “republica”, A forma pela qual joven “ciencifico” de 23 anos desfuz esse mal-entendido ¢ notivel Vin no tem razio para sentir calaftios ante apalavra Repuiblica; em primeiro lugar porque ela simbolian a +25. ceaso C4800 forma de governioem que os direitos dos cidadios sto melhor definidos, porquanto néo admitindo priv gios de famili cidadaos ea tn ‘ou de classes, as leis igualam rodos mérito ¢ das vireudes indiviguais i dem vase de uma casa de estudanres, que costumarse de- signa por ese nome. ‘A “mocidade militar” era francamente republicana desde muito antes da “Questio Militar” de 1886-87, em geral considerada um marco da radicalizagio poll- tica dos militares ao final do Império. A partir de 1878, alunos da Escola Militar tiaram clubes secretos repu~ bblicanos e, em diversas ocasibes, cantaram ou tentaram cantar, desafiando seus superiones, a Marseilles, 0 hino revolucionério francés. E notivel o radicalismo de sua atuagio € 0 fato de qy dos jovens “cientficos’, no aparegam referencias a professores ou politicos convertendo-os a0 republica- nos escritos ¢ nas memérias nismo, As referdncias a esse respeito Jevam sempre @ livros por eles adquiridos e devorados e, principalmen- te, Binfluéncia de outros jovens" cientificos” agrupados ‘em associagées ¢ clubes de alunos. Entre a “mocidade militar” nto havia lan respeito de como Repiiblica vindoura seria org a, Parece ter sido suficiente seber que se tarava da ‘inica forma cientifiea de governo, aquela onde rei ‘6 mérito, ordenador de toda a vida social. A fat ‘A procawAgho a8 EAUBLCA definigéo a respeito de como seriaa Replica faclitou, por um lado, a unidade de pensamento ¢ agio “mocidade militar” ances do golpe de 1885; rou] lado, ajudow a apressar sua fragmentagio tio logo a Repablica foi instiruida Também é imporcance perceber, pata além das co- nexdes do republicanismo da “mocidade militar” com a ideologia do métito e com as douttinas cientificistas que a imagem da Repiiblica exercia sobre cla fs] atragao estética, A imagem ds Repiiblica era feminina, representada sempre como uma mulher — em “] da qual, para os jovens cepublicanos, se agia, exemplo iJustrativo ven, mais uma vez, do jovem Buclides da Cunha, No dia 16 de novembro de 1889, Buclides, acompanhado de alunos da Escola Militar, foia uma reuniao na casa do major Ssion Ribeiro, para comemorar a Repiiblica. Nessa reuniio, conhecew @ jovern Ana, filha daquele oficial, com quem meses mais tarde se casaria—e por quem anos mais tarde morretia Ao sain. deixou na mio da meaina um bilhete: “Entrei aqui com a imagem da Repablica parto com a tua imagem..” Pretendi, através dessa breve apresentacio da Escola Militar nos anos finais do Império, apontar as ligagdes ¢-a coeréncia dos elementos culturais predominantes encre os alunos. O mézito contra os prvilégios, © progresso contra 0 atras0, o futuro contra o passado Ce errencas viva quotmaren soe ae + eis caso politica por eles desenvolvida em sociedades abolicio nistase republicanas ena conspirasio que levou ao fimn da monarqui contepuram sti alguns oftcialsnio poltiados como Benjamin Constant — e outros de perfil mais troupier, como Deodoro. Apesar de poucos, esses of ia no Brasil, Nesse processo, esses jovens ciais mais graduados foram importantes para passar 2 Nagio ¢ a0 Exército a idéia de que representavam ‘classe militar’. A Questao Militar Foi com esplrito “cientfco”crepublicano quea“me- cidade militar” patticipou ativamente da “Questio Militar”, nome dado a uma série de conflitos entre militares © © governo iniciados em agosto de 1886 ¢ que se prolongaram até maio de 1887. O motivo que iniciow a Questo foi a repreensio feita pelo governo a dois oficiais do Exército, os coronéis Cunha Matos € Sena Madureira, por declaragSesfeiras na imprensa, O marechal Manuel Deodato da Fonseca, comandante das Armas e presidente em exercicio da provincia do Rio Grande do Sul, logo foi envolvido, pronunciando~ se favor dos dois oficias. Visas reunides de oficais ‘ocorreram ¢, com isso, a questio passou a se configurar, cada vez mais, como um confronto encte militares ¢ governo, ¢ no mais apenas como um caso isolado de +28 enoetaMacho 24 gtniBuica indisciplina ou de perseguicio politica. Cunha Matos € Sena Madureita foram repreendidos pelo governo Deodoro terminou exonerado das funcSes que exercia, sendo transferido para o Rio. Foi num clima tenso que Deodoro chegou & Corte, acompanhado de Sena Madureira, em 26 de janeiro de 1887, Poucos dias depois houve uma reunigo no’Teatro Recreio Dramitico, a qual compareceram Deodoro, Sena Madureira e Cunha Matos, alm de Benjamin Constant ¢ cerca de 180 oficiais ealferes-alunos “cien- tificos", Os generais que serviara na Corte nfo compa receram, bem como nenhum membro da Marinha, Foram apenas mais um cu dois oficiaissuperiores, am dos jé mencionados. Quem compareceu, portanto, € macigamente, foi a “mocidade militar”. Na reuniio, Deodoro apresentou uma mosio que aficmava que os oficiais presentes “nao julgario terminado com honra para a classe militar 0 coniica suscitado entre esta e 0 governo” enquanto perdurassem as repreensées feitas 208 dois oficias. Poucos diss depois, Deodoro foi visitaro Imperador € entregoi-the uma carta na qual crticava violenta- mente 8 punigées infligidas pelo goverzo a Cunha Matos ¢ Sena Madurcira, bem como of ataques que eles softeram de membros do Parlamento, Deodoro utiliza em sua carta as palavras “brios”, “dignidade” “honra’, “pundonor” e *hombridade”, referindo-se 20s sentimentos do Exército que foram ofendidos. 2296 cx casrro Termina pedinda ao Imperador, em nome do Exército < “com o mais profundo respeito”, que tesolva a ques- © ministro da Guerra acabou pedinde demissio, pois o Imperador nio aceitou sua proposta de encerrar a carteira militat de Deodoro. © novo ministro comu- nicou que as notas de repreensio seriam canceladas, tio logo os atingidos o solicitassem. Com isso, Deodoro deu por encertada a Questao Militar, Esta, no entanto, se prolongatia, pois Sena Maduteira ¢ Cunha Matos negaram-se terminantemente a solicitaro trancamento das notas, afirmando que cabia 20 governo admicir seu erro, cancelando, ex-officia, as repreensies. Nessa oca- sito, segundo 0 depoimento de Cunha Matos, os dois foram censurados por Benjamin Constant, que lhes disse: “Os senhores so uns turbulentos que querem fazer a Replica; devem requerer 0 tancamento das notas.” Madureira respondeu com veeméncia, con- cluindo: “Cortem-me a mao, mas niio requeiro,” A posigio dos dois oficiais levou so prolongsmento da Questéo Militar. Deodoto, « principio relutante, vol- ou atrds em sua posigéo de dar a Questio como cencerrada. Em 14 de maio de 1887, Deodoro e 0 general ‘Camara (0 visconde de Pelotas, agora senador pelo Rio Grande do Sul) assinaram 0 manifesto “Ao Parlamento € 8 Nagio”, em que reafiemavam no poderem com- pactuar com tna posigo “que nos ludibria, atancan- -30+ APROCUAMAGHO DA EPOCH do-nos adignidade de cidadios atmmados, pare nio nos deixar mais que a subservigncia dos jantzatos" — uma alusio 20 exército de escravos dos sul:bes do Império Otomano. No dia 16, realizou-se uma reuniéo entre Peloras, Deodoro, Sena Madureira, Benjamin Cons- fant, seu itmio Marciano, o capitéo Serzedelo Corréa como tepresentante da Escola Militar ¢ um repee- sentante de cada um dos corpos da guarnigao da Corte, Serzedelo disse que a Escola Militar seria vanguarda Srna possivel revolucao, Peloras, no entanto, preferiy 2 negociasao parlamentar. O impasse foi resolvido no ia 20, quando o Senado se articulou para aptovar ums mogao que “convidava” governo a realizar 0 cance lamento das notas. Com isso, estava encerrada a Ques- tao Militar Pela primeica vex na histériabrasilers, grupos de militares haviam afirmado publicamente ¢ com forga a enisténcia de uma “classe militat", opondo-se a ates ée governo. A Questo Militar, ao entanto, ngo mo- bilizou toda a instituigio, nem mesmo sua maloria manilfestagdes que ocorreram no houve parti 2) da Marina, nem da maioria dos oficiaissupetiores Para nao falarmos de oficiais-generais, Aléin disso, as Principals adesées ficaram restrita & guatniglo da pro- vincia do Rio Grande do Sul, No entarto, os militares que participaram da Ques o, conscientemente ou no, conseguisam vinculi-la ‘um resencintensoconsra os civis em geral 0s politicos are caso castno em particulas, manipulando elementos simbélicas ex: tremamente importantes para os militares, como "hom, ra" e“brios" mo resultado, eventos que podiam ter sido tatados como simples casos de indisciplina ¢ insubmissio a0 poder civil transformaram-se em epi- bios de defesa da “classe militat” co biam s possulam de mais caro. Com isso, nntra 0 que perce- twa humilhagao ¢ afronta do governo a0 que se efetivamente apenas uma parte do Exército se mobilizou, muitos ofcias leas ao governo passaram a ver com simpatia, ‘embora & distancia, 9 desenrolar dos Deodoro € Benjamin Foi desastroso para o governo dette: matechal que desfrutava de grande p acontecimentos, imtar-se com um restigio no Exér- ito, como Manuel Deodoro da Fonseca (1827-92).0 homeim que administrava € comandava militarmence 4 guamisio mais poderosa do pais era, antes de mais ada, um militar que ascendera no Ex ército.em grande parte devido as suas qualidades guerreiras, demonstta. clas diverse vezes nos campos de batalha. Sua posigaa dlarante toda 2 Questio Militar foi ade umn roupier ‘cuja vida se manteve v culada a0 Exército, que estatia sendo ameasado pelos politicos — ou “casacas”, como costumava dizer. exemplo mais dramitico desse tipo de pensamento ocorretia no dia 15 +32. de novembro de ‘A phorzamacio on nerosuca 1889, quando, dsigindo-se a visconde de Ouro Pre- {scale gebinetvinka derubat, Deodoroafemou que © Exéecto era maltratado pelos politicos, embors fee Paani instiuigéo do pats que sabia sacrificar-te pels Pista, Aludiu em seguida aos servigos que presan, ng Sampo de batalha, lembrando que certa vez, na Guene do Paraguai, passara més dias e tts noites combarendls um pantanal, sscficio que ele — Ouro Preto, ah ‘spresentando todos os “casacas" — nio pocia svalian AS posigdes de Deodoro ¢ Pelotas cin defer ce honra militar foram parilhadas por alguns ofcaiy do Bateres intermediias, entre eles alguns ofcias supe, Hows conto Cunha Matos, Sena Madutcira e Benja. {hin Constant. Os militares dessa gerasio partcipareen tt Guerra do Paraguai como oficisisubsltermos, Den fants 08 deaesscis anos do periodo entre o Ansl de suerra a Questdo Militar, cles, em geral,sofieram com Promogées lentas, falta de aumento dos vencimens, 9 redutido orsamenco desinado a0 Exércit. A Lo) uadro poco animador devemos acrescentarsftade interes polio dos sucessvos governos que se seg. ‘am 4 guerra em implememtar medidas de reform « tmodsinizago do Exércit, liso abriu espag, especie, mente ap6s 2 Questio Militar de 1886-87, ao eresci mento do movimento radical da “mocidade milita Surge nessa €poca uum novo espaco institucional Saclube Miltat — e um novo lider — Benjomin Conseant. 233. _ a ——— cso caso A Questéo Militar marcou o ingresso, na cena politica, do entao major Benjamin Constant Bote- Iho de Magalhaes. Pela primeisa vex ocorreu o ¢1 contro, em espago pitblico e fora das salas de aula, da “mocidade militar” com 0 “Dr. Benja era chamado por seus alunos. Esse en ntro tera importantes desdobramemtos. A partir do final de 1886, 2 biografia de Benjamin Constant néo pode mais ser desvinculada de sua relacio com a “moci- dade militar”. £ no “Dr. Benjamin” que os jovens oficiais “cientificos” iro se fixar na busca por um lider da conspiragio republicans. Benjamin Constant (1837-91) trazia em sua bio fia, porum lado,a marca da auséncia de weestsos sociais herdados, incluindo passagens trigicas core a more do pai, @ loueura da mac ¢ uma tentativa de suicidio aos treze anos: por outro lado, a experigncia da ascensao social por mérito. Ingressando na Escola Militar antes por necessidade que vocagio, conseguiu concluir 0 cutso e receber 0 to almejado titulo de bacharel em, matematicas ¢ cléncias fisicas. Nos anos que se segui- tam, ficam claroso afastamento de Benjamin Constant da carreira militar, sua dedicagio 20 magistério como professor de matemética, ¢ as frusteagbes e decepgbes que sofreu na busca por boas posides docentes. Apesat de sua competéncia intelectual, Benjamin, a0 que pa: rece por falta de background social, sé conseguiu ingtes- sar como professorem excolas menores. As dificuldades 234. A paocLAMAGhO OA RPIRLUCA para obter uma boa posigéo no magistério surgiam apesar de seu prestigio como professor de matemética. No inicio de 1866, Benjamin Constant, recebeut ordem para seguir para o teatro deop i. No pouco mais de u es na guerra ano que eu ‘como oficial deengenhariaem trabalhos deabastecimento, constru- ‘gio de tischeirase claboragio de esbagos topograficos. Pelas cartas que enviou % sua familia durante esse contra o Parag perfodo — publicadas, embora com cortes, apenas apés sua morte —, fica claro o desinceresse que tinha pela carreira militar e as fortes criticas que fazia 3 condugio da guerra € aos comandances do Exércico brasileiro, especialmente Caxias. Fica evidente tam- bém sua filiagéo & doutrina positivista formulada Aogt Cmte, Benjamin sempre coer) Comte, vindo encanto, na parte “cientifiea” da obra a romper com a Igreja Positvista do Brasil em 1882, por discordar da orientagao proselitista de seus dite- cores Em meados de 1867, Benjamin pide retomar & Corte por ter recebido uma licenca de saide, que seria seguidamente renovada. Desse modo, nfo mais retor- nou’ guerta. Em win manuserito dessa época existente em seu arquivo pessoal, ele pedia demisst0 do a “deixando a carteira das armas e seguindo out dedicado e para aqual sentea mais decidida vocagio”. O requerimento rio], a que o suplicante se 235 caso caste io chegou a ser encaminhado, talver porque em junho de 1868 Benjamin Constant renha sido nomea do para uma fungio no Observatério Astrondmico, 0 que ihe permitia evitaro rerorno & guerra. retomar stia carteira no magistério. Em maio de 186 sogto, diretor do Instiuco de Meninos Cegos, ¢ Ben= jamin assume seu lugar 3 frente dessa instituigio, onde , morre seu permanecetia por muitos anos. Benjamin Constant entrou para 0 magistétio da Escola Militar da Praia Vermelha em 1872, gio de repetidor: Quando a Questio Militar rebentou, encontrava-se ptofundamente insatisfeio profissional- mente, especialmente porque nao conseguia que 0 wa condi- governo melhorasse sua siruagio na Escola Milica, nomeando-o (¢ também a outros colegas) professor catedritico, nica esperanga que entio possuta de me- Ihorat sua precitia situagio financeira, Uma anotagio em sua agenda, do dia 13.9.1886, diz o seguinte Hi mais de 13 anos tive a certera de que... apesar do diteito incontestavel As suas nomeagées de lentes cate driticos © capricho (1) [Imperador] tem triunfado de tudo ¢ de todos. ... Assim violentado em meus direitos, requeri 0 Parlamento, a nha nomeagio de lente catedratico Surgiu a possbilidade de prestar concurs para ob- ter a citedra, ou de que a nomeagio fosse feits por 236+ A pRociawagho Da neauca vontade do Imperador, mas Benjamin continua a es- crever revoltado, em seu didtio, que nfo aceitaria nem prestar coneutso nem a promogio “como um gesto de loméncia Imperial. .. Nao quero como favor o que me competia por direito, Rejeitarei esse nomeagio se clase der.” [sublinhado no original] Na mesma época, coineidentemente, havin « Ques- to Militar. Foi a primeira vez que Benjamin atuou voluntariamense como membro da “classe militar”, € io como um professor de matemética. Vimos que ingressou na carreira militar por necessidade, e nao por voragio. Chegou mesmo a quase pedir demissio do Exdicito, 5 como demonstra o cratamenco de “Dr. Benjamin” que -npre se considerou — e foi considerado, recebia dos alunos — antes um professor que um nliar, Exceto pela curta estada na Guerra do Paraguai, nunca desempenhou qualquer fungio no Exércico além do magistério. ‘© queem 1886-87 uniu provisoriamente na mesma pessoa os papéis sociais de professore militar — 0 “Dr. Benjamin” 0 “major Benjamin” — foi a insatisfacio, deambos com 0 governo pelo nio-reconhecimento de seus direitos. Na mesma época em que © Dr Benjamin se sentia logrado em seu diceito A citedra da Escola Milicar — que representava, am do reconhecimento académico, 0 alivio financeito tio desesperadarente necessitio —, havia uma quescio entre 0 governo € 137 | cise cast militares que s¢ viam atingidos em seus direitos ¢ em sua honra. No inicio de 1887 Benjamin Constant era um homem de 50 anos, em sérias dificuldades financeiras, doente — viv uma vida profissional marcada, a seu ver, pela ma sorte, Menos de erés anos depois, vemos o pacato professor de matemética meramorfoseado em Ides radical do golpe militar eepublicano, deixando sua casa numa madrugada para unir-se ¢jovens milicares nuima aven- cura politica. Dencre todos os destinos que the era possivel escolhes, Benjamin tomou a diresio aparente~ mente menos previsivel, se tivermos como referéncia sua vida até 1887. ‘O interessante é que Benjamin serd levado a desem- ia apenas mais quatro anos —, ¢ com penhar © papel com que passou & hiss6ria por uma mocidade militar” formada de jovens que, como ele, apesar de fazerem parte do Exércto, também se viem entfficos” que como militares. O fato de canto Benjamin quanto a “mocidade militar” ocupa antes como“: fem uma posigio periférica na carrcita militar & no encanto, bastante significative para a compreensio das condigoes sociolégicas que possibilitaram esse encon- Outtas afinidades ficam claras quando colocamos em paralelo as caracteristicas da cultura da "mocidade militar” ¢ da biografia de Benjamin Constant. Vimos +385 8 prociamagio 04 PUBLICA quea “mocidade militar” era um grupo relativamente homogénco em termos de experiéncias profissionais ¢ de valores, com uma identidade social consteuda em parte pela oposicio simbélica, fora do mundo milicas, a0 mundo dos capitais sociais herdados (e néo adqui- ridos por mérito pessoal) — 0 mundo deminado pelos bachatéis de dircito — e, em parte, dentro do mundo mlitat, pela oposigao ao Exército “tarimbeir0”, ligado 3 tropa. Varios pontos da biografia de Benjamin Constant encontram ressonaincia sociolégica na cultura da “mo- cidade milicar’. Inicialmente, temos 0 baixo capital social herdado ¢ o ingresso na carceita militar antes necessidade que por vocasio. A isso soma-se a pe i] zagio profissional na Escola Militar, com as mesmas ‘experiéncias de afirmagio do principio do métito in- dividual, consubstanciado no titulo dealferes-aluno. E ais, o desintcresse pela parte bélica da carreira, 0 descompasso entre o sentimento de pertencer a urna lice intelectual ¢ a falta de oportunidades sociais, 0 ressentimento com o governo pelas dificuldades na cartcira. A explicita filiagio de Benjamin ao posicivis- mio em seus aspectos mateméticos e “cientificos” tam- bém deve ser destacada. Vimos como a matemis ocupava um lugar de honra para a “mocidade mili Se Benjamin Conscant nio tinka em sua biografia os elementos socialmente mais valorizados pela elise po- litica ¢ social da época, para a cultura da “mocidade 29+ militar” ele era, a0 contrério, possuidor de um verda ‘Constant tinha 0 érito adicional ce ser sido, se no 0 inico, um dos deiso resouro biogrifico. Benjam poucos oficiais superiores da Corte a se apresentar e ddefesa da “classe militar” durante os epissdias da Ques cio Militar No inicio de 1887, 0 primeito encontro entre a “mocidade militar” © seu fururo “Iide:” jf ocortera Mas entre o professor e 0 golpista, ainda havia uma longa distancia a percortes, A procura de um lider ‘A sucessao de incidentes da Questio Militar havia demonstrado que a unidade militar s6 poderia existir sando estivessern em jogo questOes lig nao questdes estritamente politicas. Jitar’, no entanto, imediatamente articulow-se para nio deixar precitia entidade socal forjade na Questio, a “classe militar” — perder forma ¢ desapatecer objetivo era instinucionalizar uma associagio que re- presentasse a “classe” e fugise ao controle da cadeia de comando militar existente. Divetsas retunibes de jovens oficiais “cientlficos” ‘ocorteram no Rio, culminando na criagio do Clube Militar, em 26 de junho de 1887, sob a presidéncia de Deodoro. A inicistiva da organizagio do Clube tinh +40. A pncuamagio on RERDBUCA partido de oficiais jovens que desejavam ctiar um centro politizador de “classe militar”. Entretanto, no momento inicial de sua fundagio, ficou claro que os poucos oficiais mais graduados presentes, inclusive Deodoro, pretendiam que a nova agiemiagio tivesse atuagao moderada edentio dalegalidade. Apesar diso, é incgivel que a criagio do Clube representara ganho de espago politico pata o grupo de oficiais mais bg | radicals, que conseguira na Questio Militar ample car su yor dean ogovine cm nome da “la Mas 0 objetivo final dos jovens oficiais “cientificos” era a Republica, ¢ alcangé-la ficava muito mais dificil sem que surgisse uma nova “Questio” que mobilizasse a “classe”. Deodoro nfo era de forma alguma um republicano. Muito pelo contrario. No segundo semes- ue de 1888, escreveu uma carta a seu sobrinho Clo- doalde — entao estudante da Escola Militar de Porto Alegre &, como a maioria de seus colegas, republicano — que é definitiva a esse respeito: Repiblica no Brasil’é coisa impossivel, porque serd verdadeira desgrara. Quem quer Repiiblica, quer que (Brasil sea dos gaspares, Cotegipe, Paulino de Sou: etc, Os brasileiras esto e estario muito mal educad para “republicanos”. © iinico sustensiculo do nosso Brasil éa monarquia: se mat com ela, pior sem ela Nio ce metas em quest6es “republicanas”, porquanto ae Repiiblica no Brasil e desgraca completa ¢ a mesma coisa; os brasileiros nunca se preparatio para iso, porque sempre Ihes faltardo educagio e respeito para Apesar de rejeitar o regime republicano, a posicio de evidéncia de Deodoro como presidente do Clube Militar, fraro de sua atu incémoda para © governo. No final de 1888, ele foi nomeado pata comandar a provincia de Maro Grosso, ica, a um desterro mal disfer- igosto, Deodoro nio pode resis- tin, sob isco de dar a0 governo pretexto para uma acusagdo de insubordinagio, Embarcou para Mato Grosso, deixando Benjamin Conscant na presidéncia do Clube Militar. © ano € meio que se seguitt ao final da Questio Milicar foi dificil para os jovens oficias “cientificas”, que compunham a quase rotalidade da pos fo na Questio Milita, era 0 republi- cana do Exército. O Clube Militar fora dominado, desde seu inicio, por chefes militares que desi] ‘uma atuagio moderada, nlo radical. Além disso, o im da escravidio retirarao forte elemento mobilizador da campanha abolicionista, na qual osjovens “cientificos” haviam atuado de maneisa destacada. O imperador, sobre cujo estado fi de ume viagem & Europa em agosto, melhor de saide, desfazendo a impressio de que encontravase mori- ico sempre se especulava, voltara 242. I PROCLAMAGHO Ba REPUBLICA bundo. Havia Deodoto, que, embora nae fosse rept bilicano, poderia talvez polarizar novamente uma opo- sigio militar por conta de seus descontentamentos pessoais com o governo e a cipula do Exrcito. No entanto, 0 governo tinka conseguido neutralid-ld taviando-o pura 0 "destero" cm Mate Grose oH morte, em 28 de janeiro de 1889, de Sena Maduseira, foi mais um golpe a atingir o radicalismo militar. Dos clementos mais ativos na Questao Militar, restava ape- nas Benjamin Constant, com quem os jovens “ciea ficos" haviam conseguido esttcitarrelagdes, Um event extraordindtio secramentou essa aproxi No final de maio de 1888, Benjamin fora promovi- do a tenente-coronel, apés permanecer quase treze anos como major. Nos dias de aula, coscumava ir & paisana para a Escola Militas, rocando de roupa ¢ vestindo o uniforme militar na casa do porteiro, artes de enttar no edificio. No dia 8 de junho, a0 trocat-se, descobriu que os alunos haviam substituido as divisas de major pelas de tenente-corone! ¢ trocado seu boné por um novo. Ae seguir para a Escola, nova surpresa 0 aguardava, Desdeo portio de entrada atéasala de aula, Benjamin teve de passar por entre fileiras de alunos que Ihe jogavam pétalas de rosas. A sala de aula escava completamente lorade, ¢ 0s alunos desam ts rodadas de vivas © palmas acompanhadas de mani stagbes de aprego. Muito suxpreso, Benjamin Constant agrade- ceu, profundamente emocionado, a manifestagio. Ao +435 exiso esi sair da sala, foi abragado por todos os alunos, num raro gesto de insimidade entre ocupanres de posigies hie rdrquicas tio desiguais. os owenagens ainda nao haviam acabado. Ao dei xara Escola, acompanhado por todos os alunos, encre vivas € palmas, Benjamin teve que tomar o escaler privarivo do comandante, que os pr6prios alunos ha vyiam solicitado ¢ que fizeram questio de tripular na viagem acéa praia de Botafogo. Como coroamento das hhomenagens dos alunos por sua promogio, Benjamin Constant ainda recebeut de presente, poucos dias mais tarde, urn exemplar, ricamente encadernado, da Syr- eve subjective de Comte, encertado num estojo com oe do lema positivista em letras douradas: “O ‘Amor por principio, a Ordem por base, 0 Progresso por fim" (Ordem ¢ Progreso, sem 0 Amor, ficariam faturamente registtados na bandeira republicana). ‘Essa homenagem dos alunos representou uma snor- me surpresa para Benjamin Constant. A promogo recebida ndo justficava tanta comemoragio, € de for- ma alguma representava um grande momento em sia cancramiiar —& gua als, dl munca fora muito ledicado. Que significado, portanto, tinha esse episd- Shor Benin, como varoy eee funda mentalmente como professor de matemética— 0 “Ds a biografia tinha, enjamin” — e como positivist como jé notamos, diversas crac * mente positivas para a cultura da “mocidade militar”. risticas sociologica- a4 A Pocawagio oa REPUBUCA Além disso, durante 2 Questio Militar, havia sido 0 Linico professor da Escola ase envolver seriamente nos acontecimentos, ravdo pela qual veio a ter assegurado tum lugar de destague na criagio do Clube Militar Benjamin nao era, no entanto, um professor “popular encre os alunos. Nao hg, em qualquer dos depoimentos de ex-alunos, mengio a encontros ou conversas infor: imis fore da sala de aula, Exceto as reunises a que compareceu durante a Questio Militar e no Clube Milicar, todas as referéncias sio & sala de aula. Com seus tempo tomado entre diversos empregos, Benjainin dificilmente ceria tempo livre para permanecer na Es- cola Milicar fora dos horirios de aula. ‘As homenagens pela promogio tiveram 0 efeito de aproximar Benjamin de seus alunos. Os abragos troce: dos 8 salda da sala de aula sio o simbolo méximo de uma intimidade que ultrapassava as rigidas barreiras da hierarquia militar ¢ da relagio professor-alunos, Todo ‘© ciclo de homenagens representava ainda um contras- ‘e formidivel entre 2 maneira como Benjamin via sua situagao objetiva de vida — resultado, a seu ver, da jungio entre a mé sorte que o perseguia ¢ as injustigas ‘quesoftia por parte do governo— ca forma desmedida pela qual os alunos o reverenciaram, O que seta espe- rado em rettibuigao a todas essas homenagens inusita- cas) A“mocidade militar” desejava que Benjamin Cons- tant se tomnasse seu “lider” através do engajamento na +45. — casa cast0| causa republicana radical — tinico ponto importante que, na época, ainda os afastava, Durante a Questa Miilicar, a awacio de Benjamin havia sido contempo~ rizadora. Sem divida, enquanto positivista, poss tama certeza cientifica quanto ao icress to em diregao 20 progresso, Nesse estigio positivo do desenvolvimento futuro da humanidade, mesmo miiscio guerrcira dos exércitos perderia sua razdo de se: [A farda é incémoda tanto para Benjemin quanto para 0s jovens “cientficos”. Nesse ponto, compartilham das mesmas idéias. © contraste com 05 lideres da Questo Militar, evocando, como Deodoro, 0s sacrificios feitos nos campos de batalha, é aotavel, e mostte com nitidez ce quanto 0s “cientificos” seafastavam da grande maio- ria do Exército — 0s oficiais de perfil senpier, orien- tados para a carteira ‘Apesat de enconcrar eco entre os alunos, as pos es de Benjamin Constant em 1888 ainda eram m moderadas para a *mocidade militar. Para os joven’ imilieares republicanos, nao era bastante aguardar evolugio inevitivel da Humanidades eles pretendiam viver 0 futuro ainda durante suas vidas, i estava feica 4 reforrme das iddias, eta chegada a “paca da asio”, como afirmatia o alferes-aluno Tasso Fragoso em um artigo publicado em maio de 1889. Euclides da Cunha, seu contemporineo de Escola Militar, fora ainda mais cexplicio, iniciande seu artigo “Revolucionérios”, de dezembro de 1888, coma frase: “O republicano brasi- 146+ ‘A PRocLaMAgAO DA ERUBLICA Ieiro deve ser, sobretudo, eminentemente revolucion’- tio.” Faltava apenas convencer um “lider” a assumic esse discurso No inicio de 1889, Deodoro estava “descerrado” em Mato Grosso, Sena Madureira morto ¢ a situagio no Exército estaria calma, nic fosse o clima explosivo nia Escola Militar. Um exemplo den bordinagia do aluno Euclides da Cunha, expulso da escola no final de 1888 por ter, durante visiea do ministzo da Guerra, saido de forma ¢ atirado ao chio sua carabina © © sabre-baioneta, Seu gesto eta um protesto contra 0 governo pela demora em efetivar as promogécs a alferes-aluno de sua cuzma ¢, segun Virias fontes, rambém uma demonstr a blicana wutros foi a insu de Fé repu- 4 Para neutralizar o clima na Escola, o governo tomou liversas providéncias:efetivou as promogBesatrasadas, dividiu a Escola Militar em duas ¢ procuroa coopt Benjamin Constant. Foi criada uma Escola Supetior de Guetta (sem continuidade histérica com a atual), para onde foram rransferidos os cursos das armas ‘cien- ificas” — portanto, todos os aferes-alunos. Permane- ceram na Praia Vermelha apenas os cursos de infantaria e cavalaria Segundo o relatério do ministzo da Guerra de 1889, a criagio da nova escola faria melhorar a disciplina na instituigao, afastando os alferes-alunos dos novatos — cortando, assim, a linha de transmissio das idéias 247 tepublicanas. Se 0 objetivo do governo era neutralizae © radicalismo dos jovens “cientificos", 0 tito saiu pela culatra. A Escola Superior de Guerta (FSG) foi instalads | Crist6vao, préximo aos quartéis do 1° Regimento de Cavalaria e do 2° Regimento de Arsilharia, duas das unidades militares mais poderosas da Corte, e que compunham a 2 Brigada do Exéscico. Como nio havia regime de inter- rato na ESG, os alferes-alunos para 4 eransferidos foram morar nas famosas “reptiblicas’, Em pouco tem- po, estreitaram lagos de camatadagem com os oficiais 0 bairro, 2 grande em um edificio no bairso de S: infetiores das unidades sediadas mmaioria deles também ex-alunos “centificos” da Escola Militar. Meis tarde, todos estarSo juntos na assinaeura dos “pactos de sanguc” ¢ no movimento insurrecional Em 1889 Sto Crist6vio tornacse, portanto, um reduto a “mocidade militar’. © governo procirou também por diversos cooptar Benjamin Constant, Transferidos para a nova escola, ele e outros professores da Escola Militar firal- rence tiveram a tio esperada nomeagio para caredrs- FD ticos. Alem disso, © governo oferecen a Benjamin o cargo de vice-diretor da £SG, que acumularia com os vencimentos de lente, ¢ mais o titulo de conseheiro. Benjamin recusou ambas ofertas, Por qe? Para responder a esta pergunta, ha que se nowanem | primeciro lugar, que seu desgosto como governo, frst de longa insatisfacio profissional, parecia haver chega- ia": a Escola Militar da Praia Vermelha, .1885, (Foto de Mare Ferrez) 4B. sem berms sa dc ee nde ana pts e oyost ae od oda {Bite Beara fra de Benamin Constant 2.101888, ds do banque oo fi ems) etigenmchn, ofewnoron J flrirn whee AD, hepusior th fan, stab. Bee Za Sila. ah! Jobe, orm Parken Goce finals Loaecisaelfal?} “Benjamin Constant Botelho de Magalhaes, ranel do Estado-Malor de 1 classe, em suas deiiberagaes, até o terreno da ressténeia armada” (Trecho do Paci de Sangue os alunos da E56 oferecido a Benjarnia Constant, 11.11.1889), 4. "A Revolugde Bresilira ~ Os chefes do movimiento persarrend @ cidade do Bio & frerte das tropes reunidas a Reputiiea” {Desento de Bellenger publicado em LMlustrotion, 21.12 188 A pRactanazio DAEPiRCA do um ponto sem volta. A nomeagio para catedritico deveria, a seu vet, ter sido feita quinze anos antes. Caso aceitasse 0 titulo de conselheiro eo cargo de vice-dire- tor da FSG, Benjamin certamente petderia todo 0 prestigio de que desfrutava perante a “mocidade mili- tar" ¢ seus alunos em particular, dos quais recebera, como vitnos, grandes manifestases de aprego no ano anterior. interessante notar que, no inico dia que se passou entre 0 oferccimento das homenagens e sua recusa, ele recebeu a visita de um ativo membro da “mocidade militar’, 0 capitio Serzedelo Cortés, com quem conversou sobre a reforma da Escola Militar. Benjamin preferiu continuas sendo o “venerando mes- tre” dos jovens oficiais“cientificos”, Estes, porseu lado, continuaram agindo tendo em vista antecipara chega- da da Republica Em 7 de julho de 1889 subiu ao poder o ministério liberal chefiado por Afonso Celso de Assis Figueiredo, © visconde de Ouro Preto, que seria o dltime do Impétio. O novo gabinete tomou diversas i ciativas para tentar controlar a aca milita:, Enquanto isso, no Clube Milita, foi eleita em 11 de julho uma chapa encabegada por Deodoro (presidente) ¢ Benjamin ‘Constant (vice), na auséncia do primeiro, que ainda estava em Mato Grosso. O guorwn de apenas 30 membros, a maioria oficiais inferiores, mostra que 0 Clube andava em estado de abandono. Essa inativida- dé, no entanto, menos que sinal de desmobilizacio +49. poli, sugere que o Clube es um expago mais vical que real, a ser ocupado apenas para se evocar a “classe ficos”, Em 14 de julho de 1889, os republicanos comemoraram 0 centenirio da Queda da Bastilha com uma aglomerasio em frente ao Clube Tiraden- tes, seguida de uma caminhada até 0 Congresso Nacional, onde foi realizada uma sessio, Depois, n dados vives & Repitblica, sendo a manifestasio dusamente teprimida. Alguns na rua do Ouvidor, for jovens militares ‘cienlficos” (deatre 0: quais nossos JA conhecidos José Bevilaqua e Tasso Fragoso), fat- dados ¢ armados, defenderam os manifestantes, dis parando alguns tiros. A" mocidade militar” permanecia, portanto, no ter reno da radicalizagio, Sutgiu, finalmente, a oportuni dade tio esperada para tencar etiar uma nova Questo Militar. No dia 13 de setembro de 1889, Deodoro volrou 2 Corte, desgestoso com 0 governo por sua situagio no Exézcico e pela eseolha de um rival politico —o senador Silveira Martins — para a presidéncia da provincia do Rio Grande do Sul, que pouco antes chefiara. No dia seguince, ocorrew um fao em si pouco importante, mas que os jovens oficiais republicanos bem souberam explorar politicamente, iniciando um processo de radicalizagio que levara ao golpe. Durante visita 20 Tesouto, 0 visconde de Quro Preto nio en- A ranctatngio ba nePuaucn sontrou cm seu posto o comandante da guard, enene te Pedro Caroline, que cstava dormindo ina versio de Ouro Preto) ou no banheito (na versio do militar). O tenente foi imediatamente punido com prisio por ‘Ouro Preto. O caso era de muito pouca importincia ¢ © oficial em questio pouco estimado inclusive por seus olegas. Mesmo assim, na falra de algo melhor, servia dle pretexto para que a “mocidade militar” cencasce erar uma nova situagao de conflito entre militares e 0 governe, Nos dias seguintes, ocortem diversas vsicas de jo- vens “cientificos” 4 casa de Benjamin Constant, com a finalidade de atcat-lo para o que desejavai fosse cana “nova Questio Milla”. No dia 16, surge um requeti- mento de 40 sécios do Clube Militar 1 Deodoro, pedinda que convocasse uma sessio extraordinatis “para ratar-se de negécio urgentee telativo aos direitos © garantias da classe”. Examinandose o nome dos signatirios, vé-se que todos sio tenentes ou alferes-al. nos; dentre eles, 0) em breve asinariam os “pactos de sengue” oferecidosa Benjamin Constant, Pode-se afi mas, portanio, que © documento era asinado pela “mocidade militar”, desejosa de explorar a0 méximo o incldente — a referencia 20s “direitos e garantias da classe” nio deixa dividas a esse respeito, Esse requeri- mento muito provavelmeate foi apresentado a Bena min antes de serentregue a Deodoro, Benjamin anexou um bilhete a Deadoro encaminhando o requer sate | | cso cas Um acontecimento lamentével dado entte 0 St. minis tro da Fazenda ¢ um oficial do nosso Exércico parece- me digno de um protesto por parte do Clube. V. Excia, com o seu reconhecido critério € devotado amor 4 classe da qual V. Excia. € um dos mais belos onmamentos, resolverd 2 respeite, Adiro desde jé & resolugio que V. Excia, tomar em nome da classe. A referencia a “um oficial do nosso Exército” ¢ a antccipagio de um “protesto” em nome da “classe” mostram claramente que Benjamin endossara o espiti- to do requerimento dos jovens oficiais. Um rascunho dobilhete, localizado em seu arquivo, revela que, antes de escrever “parece-me digno", Benjamin tentars 2 forma mais enfiica “parece-me exigit”. Essa substitui- fo sugere que Benjamin imaginava ser 0 termo forte demais para Deodoto, talvez pela distancia hierarquica que separava os dois, talven pela postura exaltada que revelava. De fate, a resposta, no dia 17, foi um curto € seco “por hora nio hé necessidade de reunir-sea sessio pedida’, anotado por Deodoro no proprio requeri- mento. Os jovens oficiais signatdrios do requetimento nfo se conformaram com a recusa de Deodoro, prin- cipalmente porque, de acordo com os estatutos do Clubs, em sessio nao poderia deixar de ser convocada, Volraram sta do miimero de sécios requerentes, a entio a procurar Benjamin, 82+ Armoctawagio on neO8ucn Os acontecimentos rlativos a0 que ficou coniecido ‘como “incidente Caroline” mostram a “mocidade mi- licar’, jf bastante radicalizada, indo 2 Benjamin em busca de apoio para a reedigio da Questio Militar. Além disso, podemos acompanhas, nesse encontto com os javens ientificos” republicanos, a crescence radicalizasio politica de Benjamin Constant. A con- fiarmos num depoimento posterior do alferes-aluno Tasso Fragoso, & época do incidente, “apesardo excep- cional entusiasmo que os discipulos de Benjamin Constant he votavem, no suspeitavam eles que 0 emétito professor virla brevemente corresponder as suas aspiragdes republicanas”. Toda 2 ago da“mocida- de militar” — agora contando com o envolvimento de Benjamin Constant ~~ seri no sentido de forjar uma continuidade da Questio Militar de 1886-87 com 0 “incidente Carolina”. Esses dois momento: parte de uma mesma “questio", como geralmente se supe, Pelo menos no para Deodoro, que sic queria fazer a reuniéo; também no para os poucos oficiais superiores envolvidos ha Questo Militar, que agora — A excegio de Benjamin — nao estavam presentes. A Questio Militar de 1886-87 foi fundamencalmente corporativa, apesar do desejo da “mocidade militar” de radicaliz de 1889 € es- sencialmente republicana ¢ envolve, até poucos dias antes do golpe, uma parcela ainda menor do Exército. Ja polticamente; a “ques 253. i i | ene cso cx Por essa época, setembro-outubro de 1889, confluit, para a Corte um pequeno geupo de oficiais que vi ter papel importante na eclosio do golpe, atwando rine Solon de Sampaio Ribeiv, 0 caitio Antonio Adolfo da Fontoura Mena Barreto ¢ 0 tenente de cavalaria Sebastido Bandeira, Era um grupo de oficiais de perfil discinto da" mocidade militar”, Mais velhos, veterans do Paragusi e da arma de cavalaria, com perfil profis- sional antes “tarimbeiro” que “cientifico”. No encanto, também eram politicamente exaltados. Sélon parece mente junto a Deodoro: © major Frederico ser 0 nice ideologicamente definido como republica- ho; para os outros, a questio mobilizadota era, em primciro lugaz, a politica rio-grandense, seu estado natal. Eles iriam diversas vezes & casa de Deodoro, procurando cooptéclo para uma conspiraggo contra 0 governo. Apenas is vésperas do golpe, ¢ contando com a participagao de Benjamin Constant, jé atuando na conspiragio, conseguitiam convencé-lo, Em meados de outubro de 1889, Benjamin recebew um “convite especial” de uma comissio de alunos da Escola Militar da Praia Vermelha — da gual havia sido desligado hé pouco, ao ser criada a ESG — para com- parecer, no dia 23, a um banguete em homenagem aos oficiais do cruzador chileno Almirante Cochrane, que ‘stava no Brasil em missio oficial para patticipar dos festejos das bodas de prata dos principes imperiais, +34 A pmoctamagio of REPUBLICA No dia do evento, além dos oficiais chilenos ¢ do comandante da Escola, estava presente, representando ‘ogoverno brasileiro, o ministro interino da Guerra, Na primeira mesa do banquete, autoridades chilenas e brasileiras trocaram os brindes previstos no prorocolo. Na segunda mesa do banquete, jf 20 cair da rarde, uma surpresa: um aluno levantou-se, tomou a palavra e fez uma saudacio emocionada a Benjamin Constant, que terminou, sob aplausos dos colegas, com um inusitado “Viva o mestre Benjamin Constane”. Seguiram-se vi- vs, palmas¢ flores que duraram mais de quinze minu- tos, diante de um ministro, um comandante da Escola e de oficiais chilenos aténitos. Mas 0 pior — ou melhor — estava por vit. Se todo. © ciclo de homenagens promovido pouico mais de um ano antes pelos alunos & promogio de Benjamin Cons- tant deveria ser retribuido, a hora era essa, ¢ Benjamin nio a deixou passar: comou a palavra e, apés sublinhar que estava alia convite dos alunos, fez uma saudagao ‘exaltada & “mocidade militar” ¢ um ataque ftontal a0. governo. O discurso, segundo algumas fontes, teria se encerraco com a afirmacio de que o Exércto brasileito no era composto de janizaros ¢ que, "sob a farda de cada soldado, pulsa o coracdo de um cidadao ¢ de um patciota!”. O ministro da Guerra, afrontado, retirou-se ances de Benjamin Constant rerminar seu discurso, de quase uma hora, Ao final, Benjamin foi saudado, se- _gundo os jornais, de forma entusidstica ¢ delirante +55 a Una das filhas de Benjamin Constant, Bernardina, registrou em seu difrio, nesse dia, que seu pai lhe contara que “os alunos ¢ quase a escola em peso aplau- diu-o muito com palmas, vivas e flores, eat ras foram cumprimenté-lo ¢jogar-Ihe flores”. Segundo José Bevilaqua, Benjamin teria saido da Escola dizendo aos jovens militares que o cercavam: “Arre! Desabafei! Isto valeu por cinco ou seis sessbes!” — uma referéncia ao esperada sesso do Clube Militar que fora negada por Deodoro, Segundo um documento reservado do comandante da 2* Brigada, quando 0 ministro © os oficiais que 0 acompanhavam se retiravam, “houve de pelo pova que se achava porta da mesmae pelas pracas ro do edificio ... vivas inconvenientes ¢ ouvidos dos regimentos que se achavam em frente’. Eram vivas 8 Republica... do Chile’, prolongando pausa para marcar @ intengio, Os alunos e jovens oficiais “cientf- ficos", exul:ances, improvisaram um baile que varou a Para os jovens militares, 0 eftito do discurso de Benjamin foi formidavel. Apesar de nao haver uma 4o imediata por parte do governo, correu o boato de que Benjamin Constant seria preso, Os alunos da SG, em vista disso, fizeram uma manilestagio-surpre- sano dia 25. Quando Benjamin cerminou sua aula, a sala foi invadida por praticamente todos os oficiais inferiores da 2 Brigada — 37 pessoas, sendo 9 capities, 156+ ‘A PROCLAMAGKO DA REP ISL 16 tencnres ¢ 12 alferes ¢ alferes-alunos —, além de alguns oficiais de barathoes de infancaria c, € claro, os 59 alferes-alunos da 8SG. Ou seja, quase todaa “moci- dade militar”, crescida dos jé conhecidos Mena Bar- rer0 e Sebastiao Bandcira Ainda segundo 0 diario de Bernardina, 0 objetivo de todos era deixar claro que estavam i sua disposigdo para o que quisesse; os alunos declarando que nio tendo mais manifestagio a fazer que demonstiasse 0 aprego e © grau de amizade {que tém a papai disseram gue escavamn todos a0 seu dispor e que the entregavam o corpo, a inteligencia, 0 coragio etc, ¢ o governo tentasse conta ee alguma vinganga alferes-aluno Tasso Fragoso, que discursou em nome dos alunos da £8G, teria terminado afirmando: “Mestre! Nés delegamos em tio nosso modo de pensar, de agir e de sentir na transformasio republicana de nossa Patti”, De idéntico espirio era uma mensagem assinada por 39 alunos da Escola Militar, entregue na ‘casio, que termina com a frase: “Mestre, sede 0 nosso guia em busca de terra da promissio — 0 solo da liberdade!". Apés ser erguido um viva “& dignidade do Exército”, Benjamin agradeceu, comovidissimo — se- gundo o Didrio de Noticias, nestes termos: 87+ Disse que pertencia 4 Familia, ao Exército ¢ & Pétria por quem se sacrificaria; que queria ver 0 Exército respeitade e intciramente respeitadot. como garantia deseguranca da manutengio da ordem e ranquilidade fblicas e rrabalhando condignamente para o engran Nien 0 ‘e Pécria,respe ano drei plies, lesde que estes cumprissem a lei, ¢ reagindo até, se eel fosse, na pce piblica, quando 0s desmandos os governos levassem o desrespito a lei até a cons purcacdo dos direitos ¢ brios do Exército, incompatt- vyeis com a dignidade de uma classe patridtica ¢ que ama extremamente 2 sua Patria Benjamin fea sua escolba. A “mocidade militar encontrou seu lider Como jé foi observado, Benjamin Constant muitas vezes & apresentado como um lider catismatico que tizou” econverteuseus“discipulos” para a cons- 4 arquico. Pretendi mostrar piragfo conta o regime monaquico.P tr contdros ele é que fo atraldo pela “mocidade li meno sociolégico, a lideranga deve ser vista, em pri- rmeiro hugar, como uma relagao de interdependéncia na aqua lider ¢ liderados se encontram em interagio, em que estava 2 procura de um lider. Enquanto fend- influéncia teciproca: ndo como uma qualidade in seca que se possi ou como tum poder que é exercido sobre um geupo de pessoa. Ser Ider significa também ser levado a exerccr em plenitude seu papel, ¢ nio 258+ | | | | A macuaMarA bs Reraicn apenas fazer com qug os liderados sigam. F, intcres- sante, a esse cespeito, saber que Benjamin Constant costumava se chamar, jf na Repiblica, de “heroi & forsa’. Além disso, ¢ importance perceber que o lider i forina ao grupa. Falar em “mocidade militac” em sido, até aqui, um artficio sociolégico ¢ literétio para facilitar a descrigéo do universo culcural dos jovens oficiais “cientificos” e permitira natrasio de suas ag6es politicass a rigor, no entanto, a “mocidade militar” s6 existiu a partir do momento cin que esses oficiais delegaram a Benjamin Constant a misao de repre- senticla, ¢ que este asswaniu tal responsabilidade. Por que Benjamin Constant veio a ser este lider? Vimos importantes caracteristicas da biografia de Ben- jamin Constant gue 0 tornavam um possivel “candi- aco” & posigdo de lider da “mocidade militar”. Ainda assim, elas ndo sio suficientes para explicas como.e por que ele veio a ocupar essa posisio. Ao contratio do que alguns de seus bidgrafos pretendem, nfo hd uma pre- destinacio inscrita em sua biogeafla para 0 papel que viria a desempenhar; da mesma forma, Benjamin tam- bém néo nasceu como carimma— dom, graga, sinal — que um dia seus “discipulos” nele reconheceriam, Na breve reconstituig20 histérica dos eventos decorrides desde a Questo Militar de 1886-87, procurei mostrar que as apdes de Benjamin, sua performance — em grande parte, consciente — mum papel que a “mocie dade militar” Ihe ofesecia, & que foram decisivas para 2895 cso casio torné-lo um lider. Foi comparecendo & reunides, pro~ ferindo discursos ¢ exp: mentos que ele se habilitou ao carisma que the foi atrbuidos Benjamin foi repensdeel por seu catsma Este 36 foi “reconhecido” por seus “discipulos” apés ssando publicamente senti- vitios momentos de encontro ¢ de seduigio, de divas ¢ retribuigoes, S6 depois de vivé-los ¢ que Benjamin ¢ a mocidade militar” se decidisam a rentar, juntos, uma aventura politica. Entretanto, em meio as homenages: discursos, as palmas c aos manifestos que temos scom- aos protestos, ranhado, havia uma dose de iniciativa e tisco — presenter aliés, em toda aco politica, Nessa altura, no entanto, a fortina estava sortindo para a “mocidade mila” © para Benjamin Constant. Juntos, veneer as menos de tris semanas que os separavam da Repii- blica. A conspiracio Se dependesse de Ouro Preto, Benjamin teria sido prontamente punido, O presidente do Conselho, in. dignado com © discurso na Escola Militar, titicou 0 ministro, dizenda que ele deveria ter prendido Benj. vés de se retirar da Escola, No dia seguiinte & manifestagao na SG, Benjamin recebeu um oficio do diretor da Escola solicitando esclarecimentos, min Constant 20 im = 60» ‘NPROCLAMBCA bs AEMOBICA a pedido do ministro da Gueera, sobre 0 teor de ui artigo publicado em jornal, descrevenco a manifesta- so. Benjamin sesponden que o artigo estava fel 20 ccorrido. Ouro Preto procurou entéo ¢ Imperador, sugerindo que 0 comandante da ESG fosse substituide € que um novo diretor punisse Benjamin Constant Pedro 1 respondeu-lhe: “Olhe, 0 Benjamin é uma ‘excelente criatuta, incapaz de violéncias, é homem de x +b,ealém disso muito mew amigo; mande chamé-lo, fale com franqueza e veré que ele acabaré voltando 20 bom caminho.” Iso posto, a kinica atitude oficial em relagio & manifescacdo na ESG acabou sendo uma ordem-do-dia do comandante da Brigada lamentan- do “fato tio in egular” — motivado, a seu ver, por “irteflexdo, influéncia ¢ encusiasmo de momento". A aproximagio eferiva entre Benjamin ¢ os lideres republicans civis ocotreu apenas apés o discurso na ‘ecepsi0 aos chilenos. Nos dias que se seguieam 4 manifesiayio na ESG, Benjamin encontrow-se com Quinsino Bocaitiva ¢ Aristides Lobo. Republicanos civis fieqtientemente apoiavam os militares em suas questOes contra o governo. Apesar disso, descontado o «2s0 expecifico do Rio Grande do Sul, uma aproximma. io cfetiva 96 se dew rardiamente, Quintino Bocaitva dia, faruramente, que, jd as vésperas do golpe, tanto Deodoro quanto Benjamin desconheciam quase com. pletamente os politicos republicanos. O goipe foi mi ‘tar em sua orgenizasdo ¢ execuio; politicos republi “61. | | | ies iil a I canos civis tiveram um papel importante apenas na izagao do nove regime, nao antes OS decane as veres srabaldo aos efeitos da propa- senda sepubians # eagerade, Em 1659, o poder cleitoral do Partido Republicano era pequeno. Em agosto daquele ano, na eleicgéo para 2 Cémara dos Depurados, os trée candidatos do partido aa Corte receberam apenas 1296 dos voros. Nas provincias, 0 partido era uma forga politica significativa apenas no Rio Grandedo Sul, onde talvez fosse o segundo partido em importincia, ¢ em Sao Paulo, onde contava com cerca de 25% do cleitorado e estava em franco cresci- mento, devido ao apoio que pass areceber de muitos zendeiros apés 0 fim da escravidao. * Sloe fess modesta forga cleitoral, o Partido Rept blicano sempre foi, desde sua fundagso em 1870, um partido dividido, Os republicanos “douttindrios” eram em sua maioria ex-membros do Partido Liberal. T ode funded pao come tfe- namo mani réncia, centrando suas esperan politica através do cafaqueciment do Executivo edo fortalecimenco das provincias — “federacio" eta a palavra magica. Em 1889, era essa corrente, mais mo- derads, que estava a0 controle do partido, No Con _gresso Republicano de maio de 1889, realizado em Séo Paulo, Quintine Bocaitiva foi eleito para 2 chefia na- cional, Na ocasio, procurou contemporizar com a ala mais radical do partido, mas enfatizou sua petspectiva 2. | | Apmocuuagho Da Reuien Politicamente “evolucionista”, nao revoluciontia, que levou ao afastamento de diversos lideres Osrepublicanos civis também estavamn divididos em telagao a conveniéncia de se aliar aos militares para um golpe de Estado, No final de 1889, para os republica- 1s civis, eleitoralmente fracos ¢ com um partido ainda pequeno ¢ dividido, © encontro com os principais lideres miliares em: antagonismo com 0 governo era de intetesse mais “instrumental” —~ a tinica possibilidade Visivel dese fundarlogoa Repiiblica — do que politico ou idcolbgico, Para of militares, esse encontro repre sentava a possibilidade de datem ao golpe o caréter de tum movimento mais amplo que ume simples insurrei- so militar. Mesmo assim, essa aproximagio, antes de 15 de novembro, seta cimida e, a0 menos da parte de Deodoro, civada de descontiangas Nos primeiros dias de novebro, a grande preocu- pasio de Benjamin Constant e de “mocidade milicar” ta preparar tao aguardada reuniao do Clube Militar para tratar do “incidente Carolino”. Embora jéestives sem decidlidos pela conspiragio, o endosso do Clube ‘ra essencial para configurar o movimento como sendo da “classe militar” ¢, com iso, arair Deodoro e conse- guira adesio de uni ntimero maior de oficiais. Quanto 2 Sélon, Mena Barreto e Bandeira, seus esforcos estario concentrados na tentativa de mobilizar alguns elemen- tosda i@ Brigada (que inclufa os batalhées de infantatia escionados na Corte) © na vencativa de envolver = 63+ eer caso casin0 Deodoro na conspiragio, © desejado encontro entre alguns republicanos civis e Deodoro seré realizado apenas no dia 1} de novembro. ‘Antes disso, aconteceu a reunio no Clube Militar. A preparacio foi muito cuidadosa. £ importante ob. servar que 0 Clube Militar nao se reunia em sessio desde a eleigao de Deodoro ¢ Benjamin, 2 11 de julho quase quatro meses antes, portanto, No mesino periodo.a diretoria se reuniu apenas trés vezes(atiltima em 29 de agosto), ¢ somente 16 novos sécios aderiram. © Clube Militar, nesta fase inicial, no era um lugar de funcionamento permanente, onde convivessem os membros. Era, como jé foi observado, um espago virtual, a ser ocupado apenas quando fosse necessério evocar a “classe militar” — justamente o objetivo da reunio de dia 9 de navembro. No dia 5, acomteceu uma reuniéo da diretoria do Clube, presidida por Benjamin (lembremos que ele havia assumido a presidéncia interina). © tinico obje- tivo parece ter sido aprovar a adesio de 43 novos membros. Examinando-se a lista desses membros, ve- mos que hé apenas oito ofciais superiores; a maior parte era de tenentes ¢ alferes-alanos. O objetivo dessa adesio em massa de jovens oficiais radieais era claro: garancie o quorum e uma conforcivel maioria na sessi0 seguince ‘No dia 9, & noice, realizou-sea tio aguardada assem- bléia geral do Chibe Militar, a thima a ocorrer sob 0 6a. ‘A moc auncho A HeRUauea regime mondrquico. Por uma notével coincidéncia histérica, nessa mesma noite, decortidos 17 dias desde a recepgio aos chilenos na Escola Militar, acontecia o ‘grande baile da Itha Fiscal, promovido pelo Imperador em homenagem aes mesmos visitanres chilenos. Era a maior ¢ mais imponente festa até entio realizada pelo Impétio, Enquanto a Monarquia comemorava, 0 ambiente ‘no Clube Militrerade exaltagio. A sesso fai prs Por Benjamin Constant, © nao contou com a parti Pasdo de Deodoro, que encontrava-se doente. Confor- ‘me registra a ata, Benjamin comegou referindo-se aos 10s do governo Ouro Preto, que, segundo cle, carac- terizavam os “maus intuitos do governo” para com a classe militat. Terminou pedindo the fossem dados plenos poderes para cirar « classe militar de um estado de coisas incompativel com a sua hhonra e dignidade; que a isso se comprometia sob a sua palavra de honta,.c que desde jé poderiam ficar ciemtes de que, se fasse mal sucedido, resignatia todos 0s empregos piblicos que lhe foram confiados, que- brando até a sua espada, Apoiado enfaticamente pelos jovens oficiais, Benjae minencertaasessio dizendo, ainda segundo ata, que, ‘lo sendo os meios legais suficientes para mudar 4 diresdo dos acontecimentos, -65. estaria pronto para desprezar o que havia de mais sagrado—o amor da familia — pata ie morter conos- co nas pragas piblicas, combatendo em prol da patria, que era vitima de verdadeiros abures, pata 0 que s6 pedia Ihe fossem daclos alguns dias para desempenhat- se de to drdua quanco dificil missto de que foi inves- tido pela classe 2 que vem s honra de pertencer A assembléia encerrou-se, come ¢ ficil imaginan com o aplauso delirance dos presentes. Mesmo sendo uma assembléia composta quase que exclusivamente pela “mocidade militar”, © discursa de Benjamin é ditigido & “classe militar” em geral,e toda a prepatagio envolvende a sessio no tem outro objetivo senao 0 de garantit 0 apoio simbélico dessa “classe”. Simbélico porque, de faro, a assembleia nfo era representativa do conjunto do Exétcito. Em nome da “classe militar” estavam reunidos no Clube seus membros menos orieatados para a carveira. Incorporar parte da porsio Iais troupier da oficialidade sera a peincipal tarefa nos cinco dias que faltam para o golpe. Ironia da histéria, a familia de Benjamin Ihe reser- varia uma surpresa ao voltar para casa, apés a sesséo, Pelo didrio de Bernardina, ficamos sabendo que, quanto no Clube Militar seu pai conspirava pelo fim do Império, todos em sua casa haviam ido & ponte das bareas ver a iluminacio ¢ os convidados que seguiam para... 0 Baile da Ilha Fiscal! Chegando em casa e no +66. ApRacsaaghe Da REPIBUCA os encontrando, Benjamin foi procuré-los; nesse meio tempo, se desencontraram, Eram 11 horas da noite quando a famnllia recornow, Estavam to excitados com a festa que resolveram esperar por Benjamin para volear 4s arcis e tentar vera ilha de perto. Bernardina conta que "papai d indagou se nfo se podia ir na barca dos convidados para voltar na mesma”, mas negaram © pedido dizendo que s6 com convites “entio papai ‘racou um escalera 1S por pessoa evimosperfeitamense a ilha, 0 baile e as pessoas. Chegamos em casa as 3h & tanto da madrugada”, Duas semanas mais tarde, mu- ther ¢ filhas de Benjamin escariam ocupadas em fazer os vestidos para — agora como convidadas de honca — a festa que o governo republicano daria na despedi- a dos mesmos oficiais chilenos Realizada a sessio do Clube Milirar, Benjamin Constant ¢ a “mocidade militar” estavam em pé de guerra, bem como o pequeno grupo decticiais iroupiers composto por Sélon, Bandeira ¢ Mena Barreto. Para que 0 movimento néo ficasse qualificato como uma simples quartelada, jase havia feito a aproximagio com alguns republicanos civis. Para os conspiradores, falta- va prineipalmente confiemar @ adesio de Deodoro ¢ tentar ampliar contatos com outros oficiaissuperiores. No diz 10, Benjamin foi & casa de Deodoro, que se cencontrava bastante doente, informé-lo da sesso do dia anterior no Clube Militar e falar-lhe claramence sobre a necessidade de uma sevolugdo republicans. +67 a cs0 casa Deodoro entio pergunton: “E o velho?”, referindo-se ao Imperador. Benjamin respondeu que ele seria trata- do dignamente. Apés nova pausa, Benjamin pediu a Deodoro queaceitasse se colocara frente do movimen- to republican. Deodoro, passado longo tempo ¢ pro fandamente abatido, teria dito: “Benjamin, jé que ndo uf outro remeédio, Jeve a breca a Monarquia; nada ba mais que esperar dela, venha a Republics.” Na tarde do dia seguinre, Benjamin ¢ Sebastiio Bandeira foram & casa de Deodoro propor a realizacio de um encontro com alguns repul nos civis. Deo doso resistia: “E 0 que teros nds aver com paisanos?” Convencido Deodoro da necessidade de vote 20 movimento catiter mais amplo que o de uma revolta ramente militas, reunite realizou-se na noite desse mo dia, com a presenca dos republicanos civis tides Lobo, Rui Barboss © Q Francisco Glicétio, ‘Ainda nessa mesma noite, foi assinado o primeiro dos “pactos de sangue” oferecidos a Benjamin tant. Nos dias seguintes, os conspiradores iptensifica ram os preparativos para o movimento, Os golpistas sginavam fossem encontrar uma forte resisténcia, dal a necesvidade que sentiam de contar com um rilitarimportante ¢ respeitado pela tropa, como Deo- doro. Enguanto isso, do lado do governo edos militares que Ihe eram teoricamente leais — a maioria —, a paralisia era evidente; se por falta de informagio ou de 68+ \ | are OUEE ARSE EASE STR A cuamaxtAd 94 REPUBLICA disposgho, ¢ diBeil precisa, Ouro Preto, na reunizo sninieteril do dia 12,pedira ao ministro da Guerra que wr informasse sobre 0 que se passava nos quartéis. O ‘ninistro tranqililizou-o, dizendo que naquele mesmo dda o ajudante-general do Exércto, Florian Peixoro, f informara de que cado corria regularmente. Suberce, no encanto, que so dia 13 Floriano foi ehamado por Deodoro, com quem mantinha relagses cordiais, Deodoro teria falado do elima de revalea nos Guartis com a politica de Ouro Preto, ao que Florian stepondera ainda haver possbilidade de wm entendi- mete como governo, oferecendo-se para mediar una Toncliago que acalmasse os animos. No entanro, “ante da afiemagio de Deodoro de que nao Ficaria saisfeito apenas com palavras, que © momento era de eo, Flotiano tesa dito: “Enfim, sa coisa € contra vescas, 1A tenho ainda a minha espingatda velhs.” Neste mesmo dia 13, Floriano escreveu a0 ministro da Justiga: “A esta hora deve V. Exciter conhesimens® de que tramam algo por ai am: no tame. quanto seria preciso, confie na lealdade dos importincia, chefes, que ji esto alertas.” Pare a defesa do govern, seria fundamencal que Floriano eativesse disposto a dar combate aos revolto~ sos, Sua real posigao nos momentos finais da Monar- ghia imposivel de se dererminat — por pastagens Jomo essa c ourras é que cle passaia 8 historia como maior “esfinge” da politica brasileira. Nzo sabemos s© +63 cts0 casio Floriano estava na verdade agindo disfargadamente a favor dos rebeldes, se estava aguardando ‘ont i definigéo da sicuaso para se posicionas, ou se perma necia leal 20 governo, rendendo-se, afinal, ao “impésio das circunstincias” — ou scria mais apropriado dizer “a reptiblica das circunstancias”? © fato € que tanto golpistas quanto governo contavam com Flosiano a sew lado na hora do combare. A carta de Floriano mencionando que “se eramava algo" foi encaminheda no dia 14 a Ouro Preto, que tomon diversas providéncias, ordenando que a Policia 1 Guarda Nacional fossem postas em proniidio até que se descobrisse a verdade sobre o que estava acon- tecendo, Ao final da tarde, 0 major Sélon resolveu — 40 que parece por conta prépria, temendo que o go. veino aboreasse © movimento — espalhar a noticia falsa de que. governo dera ordem de prender Deadoro e Benjamin e boaros de que 2 2* Brigada seria aracada por forgas do governo, Essa atirude precipicou os acon- (ecimentos, Durante toda a madrugada, oficais infe- riores dos regimentos de artilharia eavalaria,além dos alferes-alunos da FSG, rebelados, organizaram a salda das tropas para atacar o governo. Ouro Preto, informa do do que se passava, convoca divessas unidades ¢ se refisgia com 0 ministério no Quartel-General do Exér- cito, de onde deveria ser organizada a resistencia a0 polpe. ‘A pmoclanAgo A REPUBLOA Do lado dos golpistas, toda a preparagio da tropa para 6 combate se deu sem a presenca de Benjamin Deodoro, amos doentes. Ao final da madrugads do dia 15, foram buscar Benjamin em casa, para que comandasse as tropas no deslocamento em dire¢io 20 QG. Antes de sir, Benjamin lembrow-se de entregar & mulher os “pactos de sangue”, pedindo que ela os qucimesse caso 0 pior acontecesse, A austncia de Deo- dora cra motivo de preocupagio, pois <6 ele teria ascendéncia suficiente sobre a tropa — espectalmente ia da 14 Brigada, que ndo cestavam com os revoltosos. Tinha-se como certa a impossibilidade fisica de Deodoro acompanhé-los, dada a gravidade de seu estado de sade, Para surpresa de todos, no entanto, avisado da movimentagao, Deo- ddoro, embora depatiperado, levantou-sec foi ao eneon- tro das tropas sublevadas, jf em movimento, que pas- sobre os batalhoes de infant sou entio a comandas, Dolado do governo, Ouro Preto tentava inutilmen- te organizar a resistencia. As tropas cebeladas entraram no Campo dc Santana no inicio da manha. talver uns 600 homens, incluindo os tés regimentos da 24 Brigada c os alferes-alunos da 886. Os alunos da Escola Militar da Praia Vermelha s6 conseguicam che- gar quando a situagio j havia se resolvido. Em termos belicos, era uma tropa extremamente problematica, Os canhdesdo regimento de artilharia, sem infancaria para defendé-los, difichmente poderiam entrar em posigao “Me ‘cee caso cast de combare. Grande parte dos regimentos de caval seguia a pé ¢ mal municiada. Os alferes-alunos da & formados como tropa de infantaria, nao constituiam grande reforgo e, apesar de contatos havidos nos tlt ‘mos dias, no havia ninguém dz Marinha marchando cam os revoltosos. Além disso, de oficiais superiores comprometidos com a conspiracao republicans, havia apenas Benjamin ¢ Sélon. Q tenente-corone! Silva “Teles, que comandava interinamente a Brigada, aderira 4: sleima hora, apés haver inutilmente tentado impedir a entrada em forma da unidade. O major Lobo Bote- tho, comandante do 28 Regimento de Cavalaria, no estava informado do cari republicano do movimen- to, Tentara, inutiimente, fazer com que sua unidade desfraldasse a bandeira imperial e respondesse a um viva ao Imperadar, ordens prontamente repelidas pelos oficiasinferioresteoricamente sob seu comando, Lobo Botelho acabaria abandonando a coluna revoltosa an- tes de ela chegar 20 Campo de Santana ‘A tropa arregimentada pelo governo ¢ disposta no interior ow nas imediagées do QG cra muito melhor estruturada e diversas vezes maior: seriam talvez umas duas mil pessoas, incluindo batalhées de infantaria, fiuileiros navais, marinheizos, Policia da Corte ¢ Corpo de Bombeitos. Apesar das repetidas ordens dadas por Ouro Preto nesse sentido, nio houve, por parte de Floriano Peixoto, disposicio em dar combate. Os re- vyoltosos puderam, assim, posicionar seus canhSes em. “1s A eRociANAGAO OA REPUBLICA frente a0 QG sem que fossem incomodados. Da sltima vex que ordenou ataque, lembrando @ Floriane que no Paraguai os soldados se apoderaram de pegas de arti- Iharia em situacdes mulko mais desfavoraveis, Ouro Preto recebeu como resposta: “Maas 1é tinhamos em frente inimigos € aqui somos todos brasileios.” Com jo, efa claro que nio havia mais © que fazer. Ouro Preto reuniuese com o ministério ¢ capitulou, Deodo- ro, seguido dos principais militares tebelados, ingres- sou a cavalo no interior do QG, foi saudado pela crops ¢ ordenou uma salva de cos de canhio. Passados alguns instantes, Deodoro enrou nasala em qucestava teunido o ministéro, seguido de grande nimero de acompanbantes, A versio de Ouro Preto do que entio the disse Deodoro € reconhecida por diversas fontes. ‘como basicamente corteta No meio do mais profundo silencio, cientificou-me de aque se pusera & frente do Exércico pata vingar as xavissimasinjustigas ¢ ofensas por ele recebidas do governo, as quaisenumerot.. $60 Exércio,airmon, fabia sacrificar-se pela pétria€, no entanco, malrata- vyam-no os homens politicos, que acé encio haviam dirigido 0 als, cuidando exslusivamente dos seus intetesses pessons. Apesar de enfermo, nao se puders cescusar a dirigi 0s seus camaradas pot nfo set homem que recuasse diante de coisa alguma, temendo 96 2 ‘Deus, Aludiu aos seus servigos nos campos de batalha, 213+ TTT cso casing comemorando que pela patria estivera durante trés dias ts noitescombarendo no meio de um lodacal, sscrificio que eu nfo podia avalia, Decharou que o ministétio estava deposto e que se organizatia outro de acordo com as indicagSes que ini levat a0 imperado. Disse que todos os ministros podiam retirat-se pata ‘suas casas, exceto eu —homem teimosissimo, mas nao tanco como ele (assim se exprimiuy) —eo Sr. ministro da Justica, que ficarfamos presos até se:mos deporta- dos para a Europa, Quanto 20 Imperador, conclu, tem a minha dedicagao, sou seu amigo, devorhe favo ¥es, Sous dizcivos serdo respeitados e garancidos Os motives para a falta de reagio por parte das tropas do governo podem ser encontcados, em parte, nos longos anos de insatisfacio profissional dos milica. res. Outre parte deve ser creditada 4 falta de uma lideranse disposta a tomara iniciativa do combate, tio essencial nesses momentos, ecuja auséncia repidanren- tetransforma situagdes de clara superioridadetética cm derroras completas. A inabilidade de Ouro Preto no rato com os militares também parece ter dado sua parcela de contribuicéo para a falta de resistencia O fato é que, naquela manhi de 15 de novembro de 1889, configurou-se uma situacio de confronto entre “militares” € “casacas”, vencendo a “classe militar” Mas as coisas nao aconteceram exalamente no sentido descjado por Benjamin e pelos jovens republicanos. O 74. LTRS RR ‘A PhocLanagio oa nerdBucn Pronunciamento de Deodoro havia sido 0 de um militar wroupier, nao 0 de um republicano — as refe- séncias’ Guerra do Paraguaie Asinjusticas ot Exército falam por si s6. Além disso, el mudanea de regime ao derrubar o miistério, ¢ sim em entender-se com © Imperador para ongenizar novo ministério. Ha também a versio — negada enfatiea- mente por todos os partiditios de Deodoro — de que ele teria erguido um viva 20 Imperador. Menos con- testada, eneretanto, da versio de que ele teria repricmido energicamente — com que intengéo, também se dis ‘cure — um viva & Repitblica dado portum jovem oficial “cientifico”. De qualquer modo, na tarde do dia 15, erbora jé deposto o gabinete, republicanos militarege

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