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previsto no art.

32º CRP, segundo o qual, na dúvida sobre os factos a provar, o tribunal


decide em favor do arguido (absolvição, não agravação, atenuação, etc.).
O que choca a consciência jurídica não é o facto de a pessoa ser a única a passar naquele
momento, mas sim a ideia da abissal desproporção dos bens jurídicos em confronto. Por
isso, o critério que o Professor propõe tem em vista especificar ideia de abissal
desproporção, visto que no exemplo dado, era a vida da criança que estaria em causa,
sendo que há uma abissal desproporção, visto que apenas se pedia ao agente que puxasse
a mão da criança da água e a salvasse.

Formas especiais do surgimento do crime


As formas especiais de surgimento do crime são formas de surgimento com elementos
diferentes dos da dogmática geral do crime. Por escaparem à sua teorização, elas são
agrupadas por regimes especiais.

Na verdade, todas elas podiam ser agrupadas nalguns pontos dessa matéria. Bem vistas
as coisas, e de acordo com a doutrina, todos os crimes são problemas de ilicitude. Quando
estudamos a ilicitude, podemos englobar estas formas especiais.

Desde o início desta cadeira, partimos sempre de um modelo: um agente que pratica um
crime consumado contra uma vítima. Contudo, não é assim que a realidade se apresenta.
Há situações em que um ou mais agentes praticam um ou mais crimes contra uma ou mais
vítimas…Todas estas hipóteses são equacionáveis. Este modelo é apenas ensinado por
ser o mais simples.

Tentativa

Os crimes por tentativa estão intrinsecamente ligados aos conceitos do desvalor da ação
e desvalor do resultado. Tal como foi dado, a doutrina maioritária segue hoje uma
conceção pessoal da ilicitude (tese do ilícito pessoal) que dá mais relevo ao desvalor da
ação do que à do resultado (diferente do ilícito objetivo).

Pela própria designação, os crimes na forma tentada contrapõem-se aos da forma


consumada. Há tentativa quando temos um crime que não se consumou: temos uma ação
ilícita que não produziu o resultado pretendido. A tentativa é uma forma especial de crime
reservada a certos tipos específicos de crimes: os crimes de resultado. O crime consome-
se quando há resultado. Logo, nos crimes formais, não há punição por tentativa (já que a
sua consumação pressupõe a mera ação, não sendo necessária a produção de um
resultado).

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Existe um caminho até chegarmos à consumação do crime: o iter criminis (ex: um dos
exemplos padrão do homicídio qualificado é o agente ter persistido na preparação do
homicídio).

Iter criminis

1º-Pensamento: no plano das ideias, o direito penal não pode nem deve intervir.
Seria impossível e, do ponto de vista dogmático, se o direito penal é de ultima ratio, então
nunca poderia intervir antes da consumação.

2º-Atos preparatórios da prática do crime: o art. 21ºCP estipula que, em regra,


os atos preparatórios não são puníveis (ex: vender a alguém algo contrafeito). Não se
punem por dois motivos: 1º- esses atos sãolícito. Se eu, por exemplo, vou comprar um
canivete com menos de x cm para matar alguém, a compra em si é lícita. Assim, os atos
preparatórios são lícitos; 2- não se justificaria a punição porque ainda estamos longe desse
momento. O agente ainda tem tempo para se arrepender e não realizar nenhum crime.

Exceções: só são puníveis os atos preparatórios quando a lei o prevê. É o caso da


mutilação genital feminina (art. 144º-A, nº2 do CP). Aqui o direito penal deve intervir
antecipadamente. Outros exemplos: Art. 154º-B CP (casamento forçado) e art. 162ºCP
(mesmo se não a colocar em circulação, contrafazer moeda é crime). Protege-se o bem
jurídico “moeda”. É tão importante que só o ato de contrafazer é um crime.

3º-Atos de execução: a diferença entre a tentativa e a consumação está aqui. Na


tentativa não há lugar à prática de um ato de execução, enquanto que na consumação há.
Não estamos perante uma questão de desistência. Uma coisa é eu não consumar o crime
por fatores externos. Outra coisa é eu pela minha própria vontade parar a conduta.

Para haver tentativa tem de haver atos de execução (elemento objetivo) e tem de haver
dolo (elemento subjetivo- é evidente que não há tentativa em relação a crimes
negligentes). Estes atos estão previstos no art. 22º do CP, onde se consagram as várias
teorias do fundamento da punibilidade da tentativa. A alínea a) consagra a teoria formal
objetiva, a alínea b) a teoria formal subjetiva e a alínea c) a fórmula de Frank.

O nosso legislador optou por uma conceção ampla de atos de execução. A tentativa tem
um lastro histórico muito amplo. No Direito Romano não havia distinção. Eram punidos
de qualquer maneira.

Art. 22º, nº1CP: definição de tentativa- atos de execução de um crime que o agente
decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se (não é a vontade interna, mas fatores
externos que impedem a consumação).

Art. 22º, nº2CP: elenco taxativo. Consagra três alíneas com três diferentes teorias a este
propósito.
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a) Teoria objetiva (aponta para o elemento literal de interpretação das
normas). São atos de execução aqueles que correspondem ao
preenchimento do tipo objetivo (ex: crime de homicídio- preenchimento
do tipo objetivo).

b) Teoria da adequação: são atos de execução aqueles que forem idóneos a


produzir o resultado típico. Recorre-se à teoria da adequação, pois atos
idóneos são aqueles que de acordo com uma regra de previsibilidade irão
produzir um determinado resultado. Há aqui um juízo de valor (art. 10º,
nº1 do CP).

c) Fórmula de Frank: são atos de execução aqueles que, segundo a


experiência comum, forem “de natureza a fazer esperar que se lhes sigam
actos das espécies indicadas”. Welzel afirma que se trata de avançar
imediatamente para a execução. Se tudo correr bem, estes atos vão levar à
produção de um resultado.

Aquilo que é expectável em função da ação que o agente decide apreender é que o
resultado se produza. A alínea c) é sempre uma alínea que antecipa a tutela penal. A partir
do momento em que os agentes começam a executar um ato de execução, se tudo correr
de acordo com o planeado e se nada anormal acontecer, sendo os atos adequados, os atos
irão culminar nas alíneas anteriores. Esta alínea antecipa o efeito útil das alíneas
anteriores.

Não precisam de estar verificadas todas as alíneas para que estejamos perante atos de
execução, sem prejuízo do facto de a al. c) remeter para uma das outras. Se há dolo do
agente sem que haja consumação, estamos perante a tentativa, punível nos termos do art.
23ºCP. O nº1 exige que o crime consumado respectivo corresponda a uma pena superior
a 3 anos de prisão. Isto porque o desvalor do resultado, apesar de não ser o mais
importante, continua a ter relevo. Há interesse no desvalor do resultado, até porque o
direito penal é uma ordem que protege bens jurídicos.

Percebemos então que a tentativa nem sempre é punível, porque os crimes que sejam
puníveis até 3 anos consideram-se menos graves.

Exceções: caso do art. 203º/nº2CP, que pune o furto simples. O Professor considera esta
situação absurda. Fará sentido uma tentativa de furto simples ser punível, mas uma
tentativa de ofensa à integridade física já não o ser (art. 143ºCP)?

Como é que se pune a tentativa: com a pena prevista pelo crime consumado. Art. 23º,
nº3CP. Deve fazer-se uma remissão para o art. 73ºCP (ex: a pessoa ter uma paragem
cardíaca antes de levar um tiro-tentativa inidônea). A tentativa pode ser inidônea por
inexistência do objeto de ação (a pessoa ou a coisa sobre a qual se atua) ou então por
inidoneidade do meio (o meio não é capaz de produzir aquele resultado).

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Exemplo: no séc. XVIII, havia na Suíça a crença que tomar absinto era uma forma de
aborto. A ciência médica diz-nos que isso não é verdade. A tentativa não é punível quando
for manifesta (para a comunidade no seu conjunto) a inaptidão da atuação do agente, ou
a inexistência do objeto… (art. 23º, nº3CP).

Teoria da aparência: é, ou não, aparente para a comunidade no seu conjunto que este
meio não é idóneo para produzir o resultado desejado. A questão da aparência relaciona-
se com o ilícito pessoal. O meu desvalor da ação é igual estando ou não a pessoa já morta
(porque eu achava que ela estava viva e queria com a minha ação que a pessoa morresse).
Salvaguarda-se a ideia de punição geral (tese do ilícito pessoal).

Art. 24ºCP: A tentativa deixa de ser punível quando o agente voluntariamente desiste. Há
casos em que o próprio agente desiste voluntariamente da tentativa (desistência essa que
não tem de ser por um motivo nobre, podendo apenas ser por uma circunstância). A
tentativa deixa de ser punível se o agente tem o dolo, mas desiste voluntariamente (e não
põe em prática atos de execução- ideia de Direito premial).

(exemplo: eu dou um tiro a alguém mas ele não morre. Eu nesse momento pego nele e
levo-o ao hospital de S. António. É uma hipótese de arrependimento ativo. O agente
praticou todos os atos de execução para o crime de homicídio, mas não conseguiu
produzir o resultado e tentou evitá-lo. Chegamos e impedimos o resultado. Se pelo
caminho a pessoa que levou o tiro morrer, eu não vou beneficiar do 24º, nº1CP, mas a
tentativa de salvar a vida da pessoa interessa para determinar a medida concreta da pena.

Art. 24º, nº2CP: temos as hipóteses em que, por exemplo, A acerta com um tiro em B e
ele não morre. As pessoas à volta da situação levam B ao hospital e ele sobrevive. Neste
caso, essa circunstância já não vai beneficiar o agente, porque ele não teve nenhuma
conduta de arrependimento ativo. Logo, ele será punido por crime de homicídio na forma
tentada. Se o agente também vai em socorro de B, a consumação de facto já está a ser
impedida por um facto que decorre da conduta do agente. Logo, ele só não será punido
se também estiver a intervir no processo de salvamento e se tiver evitado o resultado.

Concurso

O concurso engloba todas as situações em que um ou mais agentes praticam vários crimes,
sem que nenhum desses crimes tenha sido objeto de decisão com trânsito em julgado (30
dias).

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Qual é o critério para saber se o agente praticou um ou mais crimes? Ex: crime de
homicídio + profanação de cadáver (aplica-se o critério do art. 20º, nº1 do CP- critério
normativo do concurso de crimes).

O 1º critério que surgiu no direito penal para esta questão foi um critério naturalístico.
Haveria tantos crimes quantas as ações praticadas pelo agente. Isto não era aplicável na
prática. Pensar, abrir a boca, colocar o aparelho vocal, emitir sons… Tudo isto são ações
que de alguma forma podem levar a um crime (neste caso de injúria). Assim, teriamos de
punir o agente por cada uma destas ações (pois todas seriam crime). Esta ideia não é
compatível com a ideia de que o direito penal protege bens jurídicos. Por outro lado, com
uma ação podemos lesionar mais que um bem jurídico (ex: disparar sobre um vidro e
sobre uma pessoa- crime de dano + homicídio).

Mais tarde, para aperfeiçoar este critério, surgiu a figura alemã do concurso ideal: situação
em que uma só ação acaba por lesar o mesmo bem jurídico várias vezes (sendo que o
concurso ideal pode ser heterogéneo ou homogéneo). Vê-se muito nos ordenamentos
jurídicos a figura do concurso ideal VS real. O ideal é uma ficção, porque parte de um
conceito naturalístico de ação, onde se ficciona que há uma só ação que vai lesar o mesmo
bem jurídico várias vezes, ou vários bens jurídicos diferentes. Esta ideia é um erro, e não
é o critério que o nosso CP segue.

Art. 30º, nº1 do CP: o nosso ordenamento jurídico rejeita o conceito naturalístico de ação.
O número de crimes afere-se pelo número de tipos legais de crimes preenchidos, não
interessando o número de ações. Seguimos um critério normativo (graças a Eduardo
Correia). Há tantos crimes quanto o número de tipos legais preenchidos, ou o número de
vezes que eu, através de uma ação, lesei o mesmo bem jurídico.

Seguimos um critério normativo, graças a Eduardo Correia, segundo o qual há tantos


crimes quanto o número de tipos legais preenchidos, ou, estando o mesmo tipo legal
preenchido, o número de vezes que eu, através das minhas ações, lesei o mesmo bem
jurídico (ou seja, pratiquei o mesmo tipo legal várias vezes, através de uma prática
plúrima).

Ex: uma coisa é eu, por exemplo, partir um vidro e matar alguém. Aí estamos perante o
preenchimento de dois tipos legais diferentes. Outra coisa é eu dar uma facada várias
vezes numa pessoa. Aí o tipo de legal é o mesmo. Se eu por exemplo der uma facada em
alguém e, após verificar que a pessoa ainda estava viva, voltar a dar-lhe uma facada, eu
estou a praticar o mesmo tipo legal várias vezes.

Podemos falar de duas modalidades de concurso: concurso efetivo (art. 30º/1) e concurso
aparente (ou legal ou de normas).

O efetivo pune-se nos termos do art. 77º. O nosso sistema é um sistema cumulativo (e
não de acumulação como os americanos). Se houver concurso efetivo de crimes, o sistema
não perde de vista os crimes parcelares. Cada crime mantem a sua autonomia.

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(nota: como é que se determina qual a medida de pena a aplicar num caso de concurso?
1º fase- determina-se a pena de cada crime; 2º fase- constrói-se uma moldura penal geral;
3º fase- calcula-se a medida única da moldura penal (cúmulo jurídico) ).

Concurso efetivo: conjunto de crimes praticados pelo mesmo agente e sobre o qual
o tribunal ainda não se pronunciou em transito em julgado (período de 30 dias entre a data
da prolação da decisão- data do depósito. Conta-se a partir do deposito). É tudo julgado
no mesmo processo.

O nosso sistema segue então um critério material: o critério normativo (e não o


naturalístico). A ideia é ver quantas resoluções/nexos finais/projetos criminosos é que o
agente teve. Às vezes, é dificil saber se houve um ou mais projetos criminosos (por
exemplo, se o agente der mais do que uma facada na vítima, considera-se apenas um
projeto criminoso ou vários consoante o núemro de facadas? Na dúvida, aplica-se o pr. in
dubio pro reo: quando tem uma dúvida insanável, o tribunal nunca pode deixar de decidir,
pelo que deve decidir a favor do réu. Só se aplica para a matéria de facto (iuri novit curia).

Logo, neste caso considera-se que só houve um projeto criminoso. O critério temporal
ajuda a perceber. Se houve um afastamento temporal entre atos, então há 2 projetos
criminosos diferentes (o mesmo tipo legal preenchido duas vezes).

Concurso aparente: conjunto de crimes praticados pelo mesmo agente em que


aparentemente se preencheu mais do que um tipo legal, quando na verdade não.

Formas de concurso aparente

Especialidade

Ex: A matou a sua irmã. Que normas é que o ordenamento jurídico quereria aplicar a este
caso?- art. 131º e 132º. Eu tenho duas normas que se querem aparentemente aplicar ao
caso em abstrato. Mas eu por um processo de mera interpretação dos factos, concluo que
o art. 132º prevê a mesma hipótese do 131º, mas com um elemento acrescido. Se no caso
concreto, o agente revelar especial perversidade e for irmão da vítima, afastamos o art.
131º e aplicamos o 132º (pr. da especialidade: norma especial revoga norma geral).

Ou seja, no concurso aparente parece que, em abstrato, várias normas se querem aplicar,
mas depois, recorrendo à hermenêutica, conclui-se que na prática só podemos aplicar uma
norma.

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Ex: furto simples + entrada ilegal na habitação de uma pessoa (aplica-se o art. 204º/1/).
Aqui, ninguém tem dúvidas de que se aplica o art. 204º e não o 203º.

Ex: homicídio privilegiado (homícidio cuja causa que diminui a ilicitude ou a culpa do
crime, ou os dois- por exemplo matar para salvar outra pessoa).

Em ambos, estamos perante uma relação de especialidade entre as duas normas em


concurso, sendo que a norma especial prevalece sobre a geral.

Consunção

Ex: A quer burlar B. B quer comprar um prédio no sítio X. A falsifica uma certidão de
registo predial para se fazer passar por proprietária. Ambos celebram um contrato.

Crimes: falseamento de documentos + burla. Há 2 normas que se pretendem aplicar. Qual


é o projeto criminoso? Obter dinheiro. Como é que elaborou o plano: através do
falseamento de um documento.

Seria aplicável o disposto no art. 218º (burla qualificada) e do art. 256º (falsificação de
documentos) (nota: o documento, nos termos do art. 255º, é uma das modalidades da burla
/formas de burlar).

Na relação de consunção, há uma norma que consome o conteúdo e ilicitude de outra.


No caso em concreto, dentro do quantum de ilicitude do art. 218º já está o 256º (crime
de falseamento de documento). Temos um crime de meio (falsificação de documentos) +
um crime de fim (burla). Esta questão depende da interpretação de cada um dos tipos
legais de crime.

Na burla, protege-se o património (o bem jurídico é o património). Já na falsificação,


protege-se a fé pública nos documentos jurídicos (registo, escrituras…). Os documentos
revestem uma função de segurança jurídica. De acordo com um acordão de uniformização
de jurisprudência (AUJ) do STJ, entre o crime de burla e o de falsificação, quando o 2º é
o meio do 1º, há uma relação de concurso efetivo.

O professor discorda desta opinião: na opinião do professor, não é pelo bem jurídico ser
diferente o concurso deixa de ser aparente. Há zonas de sobreposição de plano, e de
sobreposição de normas jurídicas. O que o professor e grande parte da doutrina defendem
é que a relação de consumação não deve usar o critério do bem jurídico, mas sim o do
conteúdo da ilicitude, de modo a saber se é ou não absorvido. O conteúdo de burla abrange
o conteúdo da falsificação de documentos, visto que o 2º esteve ao serviço do 1º.

Outro ex: furto simples + ofensa à integridade física simples (Art. 143º/1 + 203º). Parece
que há dois crimes, mas o ordenamento jurídico já configurou um crime que abrange as
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duas ilicitudes- o roubo (art. 210º). O roubo consome o conteúdo e ilicitude dos crimes
anteriores. Já há um crime pensado para abranger o conteúdo e ilicitude. Trata-se de uma
relação de consunção.

Subsidariedade

Ex: crime de violência doméstica (art. 152º). A lei estabelece uma moldura penal abstrata
para este crime. Mas refere que só se “não houver pena mais agravada”. Há várias formas
de violência doméstica (sequestro, violação…). As normas com esta previsão são norma
de aplicação subsidiária. A pena da uma norma é garantida, mas se a conduta se
subsumir a outra norma com uma penamais grave, aplica-se a pena dessa norma. O 152º
apenas garante o mínimo de pena.

A subsidiariedade nem sempre é expressa. Pode também ser tácita.

Ex: art. 152º VS 153º . Crime de coação e de ameaça.

O crime de ameaça é menos grave que o da coação. A coação é uma ameaça com
determinadas caraterísticas específicas. Na ameaça, o agente ameaça alguém apenas para
lhe provocar medo. Na coação, há um objetivo de constranger a pessoa a uma ação ou
omissão, ou a suportar uma atividade. Há uma relação de subsidiariedade tácita entre a
ameaça e a coação. A pena da coação é superior à da ameaça, pelo que a norma do 2º
crime aplica-se subsidiariamente.

Coação sexual (art. 163º): na coação sexual, a ameaça tem de ter como objetivo
constranger a pessoa a praticar um ato sexual de relevo (ficxa a dúvida sobre o que é um
ato sexual de relevo). Ex: um agente ameaça divulgar fotos intimas da vítima se ela não
tiver relações sexuais com ele. Podiamos aplicar 3 normas: coação sexual, coação e
ameaça. Se faltar os requisitos da coação sexual, ficamos com a possibilidade de aplicar
o crime de coação. Se faltarem os requisitos da coação, aplica-se o crime de ameaça.
Tentamos preencher os tipos legais com as penas mais graves, e vamos descendo até aos
menos graves (que se aplicam subsidiariamente).

Alternatividade

Ex: manter alguém sem a alimentar. Será sequestro ou rapto? Uma parte do bem jurídico
é igual: a liberdade de movimento. O Art. 158º pune a privação de liberdade, qualquer
que seja. O Art. 161º pune o rapto. No sequestro, a privação de liberdade é suficiente. No
rapto, tem de haver um fim específico que agrava a conduta. Estas duas normas nunca se

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aplicam ao mesmo tempo. Estão numa relação de alternatividade: ou se aplica um ou se
aplica outro. Não são sinónimos.

Logo, há um único tipo legal que se aplica. O concurso é apenas aparente.

Comparticipação

Nas situações de comparticipação, em que o mesmo crime é praticado por mais do que
um agente, para identificar quais os agentes que participaram na prática do crime
utilizamos o um critério de Roxin: o critério do domínio do facto.

O problema da comparticipação é um problema de imputação objetiva. É uma forma


especial, mas encontra o seu espaço na matéria da ilicitude. São matérias do ilícito. A
teoria diz-nos que a forma como alguém controla o resultado criminoso oscila.

Ex: A e B vão furtar o computador de C VS A vai furtar e B está só a incentivar. Quem


comparticipa no crime?

Teoria do domínio do facto: o resultado é imputável à conduta de quem tem a


possibilidade de controlar o facto (se vai haver ou não crime, como, quando, onde…) Há
pessoas que têm a possibilidade de parar o projeto criminoso, mas pode haver outras que
não. Na 1º hipótese, B domina o projeto criminoso. Logo, B é um autor. Se a pessoa não
tem o domínio do facto (na 2º hipótese, B não tem a possibilidade de parar ou por em
funcionamento o projeto. É um mero participante).

Art. 26º e 27º- A lei entende que só há um tipo de participante: o cúmplice.

Art. 27º: faz-se a distinção entre a cumplicidade material e a moral. A 1º caraterística da


cumplicidade é o dolo (a vontade é a mesma, a participação é que é menor). Não tem que
haver dolo direto, basta eventual (remissão para o art. 73º do CP).

Art. 26º: (a lei não quis entrar em divergências dogmáticas- é punível como autor). Prevê
a autoria imediata/material e a autoria mediata (dependendo de quem é o executor
imediato).Se os dois atuarem são coautores. Requisitos cumulativos:

1- acordo (em regra prévio). Diferente de haver apenas o mesmo projeto criminoso.
Pode ser tácito e, às vezes, contemporâneo (ex: assalto uma casa e encontro outro
assaltante. Posso combinar, sem qualquer tipo de mensagem expressa, um acordo na hora)

2- execução conjunta. Para ser coautor é só preciso fazer parte de um projeto


criminoso. A pena pode é depois ser diferente, mas todos os autores serão punidos.

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Instigação: o art. 26º considera a instigação como uma forma de autoria (“quem
determinar outra pessoa à prática do facto”), desde que se verifiquem certos requisitos. O
instigador tem de dolosamente colocar na psique do agente a vontade de praticar o crime.
Tem de ser uma pessoa essencial. E tem ainda de haver execução (se não não posso punir
a pessoa).

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