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Realização:
Grupo Tripé | Ana Quintas, Gustavo Haeser e João Pedreira
Projeto gráfico:
Gabriel Guirá
Produção:
Desvio Produções Culturais | Elisa Mattos
Revisão:
Thaís Costa
www.grupotripe.com
emaildotripe@gmail.com
@grupotripe
05 Texto de
Apresentação 11 Nossa
Trajetória
17 Entre
Quartos 33 O Novo
Espetáculo
45 todo mundo
perde alguma
coisa aos
57 Aquário
oito anos
63 Ocupação
Independente 67 Prêmio
Web
77 Cenas
de Uma
Década
81 Tripé
em Números
82 Agradecimentos
T e xt o d e A p r e s e n t a ç ã o
po r Victor Hugo Le ite
BT-16. Coordenadas em meio a uma cidade em que as ruas não têm nome.
Letras e números em um corredor que vai se enchendo de significado.
Um lugar de passagem, que transformamos em terreno e território de
muitas permanências. Essa sigla (BT-16) nos destina a uma sala do
Departamento de Artes Cênicas da Universidade de Brasília.
Na cidade em que as siglas (per)fazem sentido, escrevem no espaço
uma poesia repleta de letras e números. Grupo Tripé! A memória
também tem suas letras e números, vamos fazendo sentido para as
coisas. 3 é um número que faz a gente pensar Tripé, à primeira
vista, mas, ao mesmo tempo, não dá conta de inúmeras pessoas que já
foram atravessadas por esse grupo. Eu mesmo conheci um grupo de 4.
Eram Davi, Quintas, Gustavo e Miguel. Conheci assim. Embora eu já
conhecesse o Davi e o Gustavo de outras histórias-antes, eu conto
já-já. 10. 10 é um número que faz sentido para nós, na partilha
desse momento e desse texto que nos são presentes agora. 10 é um
número que vem a desenhar a porção de tempo que nós estamos aqui,
juntes, celebrando, mas vocês podem estar se perguntando se eu
estou falando disso num sentido real ou num sentido figurado, né?
Quanto tempo pode caber dentro do tempo? Quanto tempo pode caber
dentro de 10 anos? É aí que vamos tecendo nossos sentidos e
significados para as coisas. Desse jeito que a memória tem de
embalar o tempo, esculpindo nele os momentos (e)ternos que vivemos
juntes.
Esse texto pode estar parecendo um pouco surreal, um pouco confuso,
um pouco incompleto e, talvez, seja porque ele se move entre
memória, tempo, emoção e experiência. Talvez, também, porque ele
não deseja se encerrar em si, aqui, sem vocês, que agora estão lendo
essas palavras, que serão eternamente presentes na boca de quem lê
, na memória de quem se recorda e de quem viveu. Assim como
o teatro, desejo que esse texto seja um eterno presente a este tão
amado acontecimento-aniversariante, que é o Grupo Tripé, que ao
longo de sua vida, com tantas vidas dentro da sua existência, nos
entregou e entrega instantes de paixão, sentimento, reflexão,
brincadeira, exposição, partilha e comunhão. Escrevo para fazermos
um brinde e um hino à memória desse grupo que nos atravessa, escrevo
com uma enorme gratidão, em prece para que minhas palavras finitas
possam dar conta da grandeza dos acontecimentos que evocam o Grupo
05
BT-16 é uma sala do Departamento de Artes Cênicas da Universidade
de Brasília que hoje tem um nome, sala João Antônio, nosso jeito de
dar significado e sentido para os espaços. Foi lá que eu vi pela
primeira vez, no Cometa Cenas, uma peça do Tripé, que ainda estava
em nascência, Entre Quartos. O Tripé já começa em nosso íntimo:
livros espalhados, uma melancolia amorosa, aquela gostosa dor e
ferida de amor, música envolvente, sim, Miguel, você mexeu com a
gente! Aquelas casquinhas cicatrizando boas de cutucar, sabe? Tinha
até cena do balcão de Romeu e Julieta de Shakespeare! Meio, ou, toda
adolescente e, que engraçado, a gente se identifica. Imagina poder
ver este povo do grupo, 10 anos depois, mais adultes, fazendo esse
mesmo espetáculo, tudo novo, de novo, nos trazendo mais e mais
camadas de sentires, impactos, sensações, saudades, sonhos
diretamente no Cena Contemporânea, um dos festivais de teatro mais
importantes da cidade. A gente começa a falar desse grupo, com es
integrantes nos trazendo para a sala de suas casas, para contar e
falar de amor, delus, nosso, nos transportamos para o espaço de seus
íntimos, a gente até se constrange algumas vezes, desabrocham por
dentro delus e de nós. BSS-51/BSS-59 são outras salas-espaços
possíveis de eu ter visto mais versões de Entre Quartos em estado
de nascimento. Ao longo de dez anos, além de nós do público, esta
sala foi casa de convidades especiais, como Ultra Martini, Zé Reis,
Nine Ribeiro em Brasília, no avião e fora dele, em teatros
especiais, alguns falecidos, embora vivos e eternos na nossa
memória, como o Teatro Goldoni, em quebradas e além-mar, nas terras
da Irlanda, movendo corações-continentes, com o movimento e a
dinâmica que precisa ter uma obra viva.
Costumo dizer que as coisas começam antes de começar, as histórias
começam antes do começo. Se pensarmos a história do Tripé como uma
dança, daquilo que vai para frente e também vai para trás,
saudaremos gerações de artistas que vieram antes de nós e claro, as
gerações que vieram antes de artistas que vieram antes de nós. Falar
de teatro em Brasília, no Distrito Federal é se aperceber dessas
gerações que nos formaram e transformaram, EVOÉ! ou AGÔ! para quem
for de AGÔ!
Tenho uma história de como conheci Davi e Gustavo na oficina
Teatrando de Férias com Adriana Lodi no Espaço Cultural Renato
Russo na 508 Sul. A paixão deles pelo teatro me encantou de cara.
Davi, Gustavo, vocês mexeram comigo hehe. Eu que já queria fazer
teatro, quis fazer também. Isso tem 11 anos, me lembro até hoje
06
desse tempo especial. Com Davi, fiz um exercício do espelho, o qual
nunca me esqueci de nossa conexão, não sabíamos mais quem era um e
o outro, guiados pela voz de Adriana Lodi, a potência de um
exercício! Quando estava ensaiando para a prova específica de Artes
Cênicas, fazendo uma cena aos berros, nas entrequadras 403/404 sul,
Gustavo, que, muito provavelmente, assistia à sessão da tarde,
ouviu uns gritos e quis saber o que ocorria ali. Ele desceu para
ver o que era e acompanhou com olhar atento o ensaio de minhas
cenas. Existimos assim, em comunidade, partilhamos dentre tantas
coisas, de afeto em rede. Nos apercebemos parte de uma geração.
Naquela época da oficina da Lodi, Davi e Gustavo chegaram a comentar
de outras oficinas que fizeram/faziam com Abaetê Queiroz, de
montagem teatral. Assim como a Universidade de Brasília foi um
espaço de encontro, impulsão e propulsão desses artistas e das
gerações que nos formaram, faço questão de saudar esses espaços de
arte e educação que encontramos ao longo de nossas caminhadas.
Pensar hoje é pensar o antes, para, assim, pensar futuros. Aliás,
falando em pensar futuros, o Tripé fez futuros ao pensar o Novo.
O Novo, que vem para modificar, transformar, sacudir, brincar,
ficar em pé, agir, rir, se soltar, tem tanto verbo para o Novo, que
vem para inventar, propor, não definir, desestabilizar, celebrar,
comungar, ritualizar, narrar. O Novo é uma dessas coisas sobre o
Tripé, que celebramos ali em cima, um encontro de
(intérpretes-criadores, performers), ou melhor, pessoas soltas com
uma figura ancestral, complexa, generosa, inventiva, grandiosa que
é Similião Aurélio. Enquanto Quintas se deslocava para estudar na
Irlanda, Elisa foi uma das pessoas soltas que compôs o espetáculo,
depois do retorno de Quintas, compuseram juntes.
O Novo celebra gerações em estado de encontro e espetacularidade.
Nesse acontecimento, mais que espetáculo, nessa comunhão, mais que
experiência cênica deslizamos entre o jogo das representações,
performatividades, elevando o teatrar, o fazer cênico ao nível do
brinquedo, digno da poesia de Manoel de Barros. É assim que vamos
sentindo, ou simplesmente vivendo as inscrições no efêmero que o
Tripé vai tecendo, desafiando, desfiando e desbravando espaços
não-convencionais, com a encenação engenhosa, conferidora de tanta
vida à trama da epopeia de herois e heroias contra um ditador. E a
iluminação cheia de artimanhas e artefatos? Sim, Quintas, você
mexeu com a gente hehe! Nós nos perguntamos quem somos nesse jogo
e em que sistema estamos vivendo, diante de uma distopia
07
assustadoramente tão próxima de nós.
O Novo Espetáculo (Tudo está a venda), carinhosa e engenhosamente
apelidado, semantizado como O Novo é um convite ao brinquedo, linda
história bailada, festejada e vivida por tantos tempos, espaços,
gentes e anos. Anos que, para mim, se tornam tantos, se retomarmos
a pergunta: Quanto tempo há dentro do tempo? Inclusive,
recentemente, ou nem tão recentemente assim dependendo de como
vocês sentiram esse tempo. Em 2020, o Novo teve uma de suas
vivencialidades lindamente presentificada, eternizada semanas
antes dessa onda toda de COVID-19 nos atravessar dessa forma, que
coisa, né? E de Novo, teríamos que lidar com O Novo, de Novo!
Neste livro tão precioso de memórias, imagens, relatos vivos de
experiência, documentos de cena, afetividades em trânsito você
encontrará um entrecruzamento entre Tripé e Liquidificador,
importantes grupos quando falamos desse aniversário de 10 anos do
Grupo Tripé e do que memoramos desse intervalo de 2012-2022 na
história do teatro do DF.
O Grupo Liquidificador é um desses que marcaram a geração que veio
alguns anos antes da minha e da de algumas pessoas do Tripé. O
espetáculo Aquário apresenta instâncias de performatividade,
invenção e tecnologias da encenação-iluminação aplicadas ao
espetáculo e acontecimento cênico que deslinda contornos clássicos
de operação, concepção, desenho e executividade desse elemento em
cena. Coisas que nos orgulhamos, coisas típicas de Ana Quintas, que
mexe com a gente, que revoluciona poéticas da luz, a partir de
espaços não-convencionais ou de não-convencionalidades luminosas
para espaços convencionais, em um jogo de subversão e ocupação
inventiva da cena. Subversão e ocupação quando percebemos a
importância de sua presença em uma cena de iluminação ainda marcada
pela presença masculina, entre de machismos e misoginias
estruturais. Alegria de destacar a assinatura desse
iluminadore-criadore em tantas produções brasilienses. Quintas
percebeu a oportunidade de integrar Tripé e Liquidificador por meio
da assunção e concepção de uma Equipe Invisível de iluminação,
lindezas poéticas, estéticas de uma engenharia espetaculosa que
vocês poderão conferir em páginas mais à frente e na própria
dissertação dele.
Essa vontade de fazer junte, de comungar, de trocar, de pesquisar,
de encontrar que o Tripé movimenta não parou por intercâmbios com
08
artistas de diversas gerações que aconteceram desde as primeiras
peças do grupo, entre elencos, criações e direção. A prática
coletiva e colaborativa foi guiando o grupo em composições
múltiplas, refletindo, criticando e propondo ações que movimentaram
e movimentam a cena contemporânea de teatros em Brasília.
No espetáculo Todo mundo perde alguma coisa aos oito anos, vemos
essa energia gostosa do Tripé de continuar fazendo junte, mesmo
quando o caminho é por uma estrada mais autônoma, digo isso porque
foi a direção do Gustavo, mas a realização é do grupo, elus sempre
estão jogando juntes e reunindo mais gente para estar no jogo, gente
que ama estar, que é atravessada por, gostoso é ler e ouvir quem
fez parte, sempre com essa vontade de pensar e movimentar seus
lugares no mundo.
Ainda nessa pulsão coletiva, o Grupo Tripé promoveu a Oficina de
Investigação Cênica em Processo Coletivo, uma Ocupação Independente
e o Prêmio Web de Teatro do DF. Essas iniciativas nos retomam e
recolocam como comunidade de pessoas fazedoras de teatro no DF,
impulsionando e mobilizando distintas e diversas gerações do setor
de cultura e economia criativa em nosso território. Aqui, me
arrisco em pluralizar o tom coletivo do discurso, a primeira pessoa
do plural, assumir o nós, porque o Tripé nos convida a fazer parte
da festa, movemos afetos, reconhecimentos, saberes, emoções,
pensamentos nesses dez anos com esse grupo. O Prêmio Web de Teatro
do DF trouxe uma partilha comunitária, democrática e celebrativa de
visibilidade das realizações e produções artísticas de nosso tempo,
de nosso aqui e agora, comemoramos o movimento redivivo de um teatro
que assume diversos elencos, diversas representatividades,
estéticas e representações. Uma premiação nossa, que termina em
rito de encontro, daquelas, daqueles, daquelus que se misturam a
mística e mágica experiência do fazer com e em comunidade, saudando
as origens de nossas artes espetaculares.
de nosso aqui e agora, comemoramos o movimento redivivo de um teatro
que assume diversos elencos, diversas representatividades,
estéticas e representações. Uma premiação nossa, que termina em
rito de encontro, daquelas, daqueles, daquelus que se misturam a
mística e mágica experiência do fazer com e em comunidade, saudando
as origens de nossas artes espetaculares.
Parabéns, palavra que trazemos nos aniversários. Bravo! Palavra que
nos sai da boca diante do espetáculo da vida. Vida longa! Nosso
desejo para contar e recontar as histórias tantas de nosso amado
Tripé ao longo de mais e mais tempo. Muito obrigado! Nosso
agradecimento aos eternos e efêmeros mo(vi)mentos que
experimentamos junto e com o Grupo Tripé. Fé! Porque temos que
acreditar para seguir. Esperança! Porque ela tem vindo a partir de
suas ações.
09
No meio desse texto, falei de alguns falecidos teatros em nossa
cidade, acho que fui duro demais, graças a nós, gentes de teatro,
entre profissionais e públicos, os teatros nunca morrem, se
eternizam, no jeito que a gente faz as eternidades bailarem em nossa
memória e de efêmeros, só nos restam os momentos, pois nos tomamos
de um sentimento que se faz presente, este é o meu para vocês, hoje,
Quintas, Gustavo, Miguel, num ontem, bem pertin, Davi, um cheiro em
todes passantes, transformantes, amantes, encenantes, ficantes,
realizantes.
entre profissionais e públicos, os teatros nunca morrem, se
eternizam, no jeito que a gente faz as eternidades bailarem em nossa
memória e de efêmeros, só nos restam os momentos, pois nos tomamos
de um sentimento que se faz presente, este é o meu para vocês, hoje,
Quintas, Gustavo, Miguel, num ontem, bem pertin, Davi, um cheiro em
todes passantes, transformantes, amantes, encenantes, ficantes,
realizantes.
Te amo, Tripé!
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Nossa
Traje t ó r i a
Com 10 anos de trabalho continuado, o Grupo Tripé
iniciou sua trajetória entre as quadras do Plano
Piloto, misturando experiências das escolas de teatro
da capital com referências acadêmicas da Universidade
de Brasília. Os processos, a criação e a administração
do grupo são influenciados pelos conceitos de teatro de
grupo e teatro em estado de encontro, até então
marcados também por construção de dramaturgias
autorais, uso da iluminação enquanto ferramenta de
criação e a discussão de questões ligadas à juventude.
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j u lh o Queremos ser um grupo de teatro.
2 0 12
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2 0 17 Entre Quartos é selecionado para o XIX Festival do Teatro
Brasileiro e realiza duas apresentações no Galpão 4 da
Funarte Belo Horizonte;
Apresenta o projeto musical Eletronicidades e Os Gêmeos da
Destruição, com composições de João Pedreira;
Participa do projeto Teatro Bar - ANO 1, apresentando a 4ª
temporada de Entre Quartos;
O Novo Espetáculo (Tudo Está à Venda) recebe o Prêmio SESC do
Teatro Candango nas categorias Melhor Espetáculo, Melhor
Dramaturgia (Similião Aurélio e Grupo Tripé) e Melhor Direção
(Similião Aurélio), sendo indicado também em Melhor Iluminação
(Ana Quintas), Melhor Sonoplastia (Luiz Alberto Pires),
Melhor Atriz (Ana Quintas) e Melhor Ator (João Pedreira).
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2020 Realiza o Ciclo de Debates do Prêmio Web de Teatro do DF,
reunindo nas mesas alunos das instituições de graduação em
artes cênicas do DF, gestores de espaços culturais e grupos
com experiência em circulação, além de uma roda aberta
sobre censura nas artes;
Realiza, com recursos próprios, a Noite de Premiação, evento
de encerramento da 2ª Edição do Prêmio Web de Teatro do DF
2019, anunciando as produções e projetos mais votados pelo
público, contando com homenagens a Hugo Rodas, Iara
Pietricovsky, Alexandre Ribondi e também a 3 iniciativas
virtuais ligadas ao teatro do DF, sendo elas: Vá Ao Teatro,
3 Perguntas e @teatrobsb;
Em comemoração aos 05 anos em cartaz com O Novo Espetáculo
(Tudo Está à Venda), realiza, de forma independente, curta
temporada no Teatro Sesc Garagem, com apoio do Programa de
Incentivo à Produção Cultural do SESC DF;
Adere a campanha #TeatroParaTemposIsolados, disponibilizando
todo o repertório de espetáculos do grupo de forma gratuita e
aberta durante o isolamento social em decorrência da pandemia
de Covid-19;
Junto de outros 7 coletivos teatrais da cidade, faz nascer
e se integra a GARRA - Grupos de Artistas em Rede Associada;
Junto aos coletivos da GARRA, integra a programação do
Cena Contemporânea 2020 - Festival Internacional de Teatro
de Brasília;
É aprovado no edital Aldir Blanc Gran Circular,
realizado pela SECEC - DF.
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Entr e
Quar t o s
Três pessoas vivem um triângulo amoroso confinadas dentro de um
apartamento, do momento que se conhecem e decidem morar juntas até
a decisão de terminarem o relacionamento. Um homem se preparando pra
mudar, pega seu violão e relembra tudo que viveu morando ali.
A sala-de-estar abriga as quatro personagens e, de forma não-linear,
mistura realidade, memória, presença e ausência, criando uma
dramaturgia sensível que versa sobre o amor, sobre estar apaixonado
e sobre o fim.
“owem foi dia de gerg no nosso apartamewo.
limpamos os tapbes, piwamos as paredes,
arrumamos os livros em ordem gffética,
compramos gmofadas novas pro sofá velho, trocamos
de cadeira. agora só fxam três caixas.”
10 de fril de 2014
EN T RE QUARTOS
CO M EÇOU...
Entre Quartos estreou em uma quinta-feira, mais precisamente dia 10
de abril de 2014, na sala Adolfo Celi do Teatro Goldoni para uma
plateia recheada de pessoas queridas que tinham sido colaboradoras
da nossa campanha de financiamento coletivo, e que eram as grandes
responsáveis por conseguirmos levantar essa primeira temporada. Além
das colaboradoras da campanha, também convidamos artistas e
coletivos de Brasília para conhecer o nosso primeiro espetáculo.
Essa noite, que chamamos de pré-estreia foi muito especial, pois
havia uma sensação de estarmos finalmente colocando o Tripé no
mundo. A temporada oficial seguiu do dia 12 de abril ao dia 27, três
finais de semana, aos sábados e domingos. Porém, Entre Quartos
começou a ser gerado dois anos antes de sua estreia oficial,
iniciamos o processo de criação do espetáculo em julho de 2012, após
a fundação do grupo no dia 9 do mesmo mês. Esse processo de criação
foi o que marcou os dois primeiros anos do grupo. Na época, estávamos
interessades em experimentar, em nos jogar em horas a fio de
improvisos, inventar textos, cenas, músicas.
Não tínhamos tanta pressa em estrear logo, queríamos usufruir do
processo, no qual experimentamos a criação coletiva e assumimos
juntes a direção e a dramaturgia. E assim foi, ao longo desses 2
anos, aproveitamos a presença da Quintas como aluna da UnB e fizemos
da mostra de final de semestre do curso de Artes Cênicas, o Cometa
Cenas, o nosso lugar para fazer testes e experimentar o que
estávamos criando com o público. Fizemos então três ensaios abertos:
O primeiro chamado Bloco 3 (dezembro de 2012), o segundo chamado
Eloquência (junho de 2013) e o terceiro já chamado de Entre Quartos
(dezembro de 2013).
E por fim no início de 2014, decidimos que era hora de sair dos
palcos universitários e colocar profissionalmente o espetáculo no
mundo. Fizemos uma campanha de financiamento coletivo, arrecadamos
um mínimo possível para se levantar uma peça — salvo engano algo em
torno de R$ 5000,00 — convidamos pessoas amigas e amores para compor
a equipe, e aqui fazemos um adendo especial para Nine que chegou para
trabalhar como assistente de direção, mas além disso colaborou de
forma maravilhosa na dramaturgia, e para Fernanda Alpino que
colaborou na concepção dos figurinos e seguiu depois dali sendo uma
super parceira, operando as luzes e sendo uma espécie de conselheira
oficial. Compramos o nosso sofá, os figurinos, a samambaia,
desenhamos de próprio punho o primeiro cartaz, e conseguimos assim
fazer a primeira temporada desse espetáculo que depois dali ganhou
asas e voou.
20
D ep o i m e n t o
L eon a r d o
S ham a h
21
Fiquei feliz de ter presenciado essa estreia na vida profissional
naquele lugar onde eu também comecei. Cheguei em casa e fiquei
pensando no poder de transformação do pensamento e da ação jovem,
daquilo que ainda não se contaminou com as nossas carcaças
ideológicas. Fiquei feliz de ver que tem gente que escolhe o caminho
que quer trilhar, com os recursos que tem, do jeito que quer e pode.
O espetáculo propõe outra forma de interpretação, quando em geral
nessa idade os atores estão perdidos em arremedos de teatro
clássico, em Entre Quartos eles se colocam para chegar nesse lugar
em alguns momentos (que pra mim são os piores). Alguém me falou do
quanto eles são blasé (é o que eu mais gosto e acho que podem ser
ainda mais). Alguém e eu lembramos do teatro argentino (não me
incomoda, até acho legal). Alguém e eu pensamos que eles parecem
hipsters, meio neo-punk suave (ótimo, os atores exploram a
humanidade dentro desse universo, e isso é bom). Enfim, de novo,
adorei e se eu fosse você iria assistir nesse fim de semana.
Vale a pena!
18 de abril de 2014
em sua página pessoal de Facebook
22
E N T RE QUAR TOS SEGUIU.. .
23
Mensagens
do
Púb l i c o
24
D ep o i m e n t o
Zé Reis Era um dia comum quando recebi um
convite urgente para fazer a peça
Entre Quartos no lugar do artista
imenso que é o Davi Maia. Assim o Tripé me trouxe de volta
ao teatro quando eu não acreditava mais no ator que eu
sou. Eu achava que não fosse dar conta, mas o Davi foi
generoso e disse que confiava em mim para o papel.
Rapidamente eu me apaixonei pelo texto, pelas músicas,
pelas possibilidades de intervenção. Pude trazer o que
tinha de precioso e ali encontrei um novo espaço para
existir. Voltei a decorar texto, a contracenar e perdi o
medo de atuar que estava latente em mim.
A peça já estava pronta, mas quando eu entrei era como se
tudo estivesse recomeçando. Para mim, era sempre novo
falar “Oi” e ouvir o silêncio da Quintas. Enfrentar o
Gustavo na cena me ajudava a ser mais firme na vida,
enchendo as palavras de verdade. Ouvir o som do João e
cantar baixinho me deixava mais doce. Falar de amor fez
ser possível eu me apaixonar de novo e de novo. Voltei a
ser um jovem apaixonado pelo teatro, pelos atores, pelo
público, pelas andanças. Me apaixonei em Brasília, em
Belo Horizonte e em Dublin. Vivi um frescor raro com
Quintas, Fernanda, João, Gustavo e Ultra.
Tomava vinho até ficar de boca roxa na Irlanda, brincando
de fazer teatro contemporâneo à beira do rio. Pela
primeira e última vez cruzei o Atlântico, cheio de orgulho
de mim e de nós por fazermos um longo voo para mostrar ao
mundo nossa singularidade artística. Sempre lembro dos
meninos e agradeço por terem me levado junto, eu sem um
centavo no bolso na época, mas amparado por eles que até
roupas compraram para mim no exterior. Eles também
conheciam meu sol em touro e faziam questão de escolher o
bolo para a cena do biscoito. Quando não era bolo, era
doce de leite de Viçosa comprado em Belo Horizonte para
eu me lambuzar enquanto dançava com a Ultra e depois com
a Quintas.
Nunca me esqueço do quanto abri meu coração e meu sorriso
para me aproximar desses artistas e falar de amor e de
juventude, arriscando um inglês terrível no aeroporto de
Addis Ababa na companhia da master tradutora
international Fernanda Alpino, esse anjo do grupo que
acompanhava com rigor e delicadeza todos os detalhes da
obra, de um texto esquecido a uma mudança de luz, sem
falar dos acolhimentos, dos pratos maravilhosos e da
companhia generosa. Aguardo vocês em Teresina!
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Depoiment o
Uma das minhas maiores felicidades
do teatro foi realmente ter podido
Ul t r a
participar um pouco do rolê do
Tripé! Que delícia! Foi tipo me Martini
jogar na roda com geral e deixar o
amor do fazer teatro tomar conta. Essa parceria me
atravessou de tal forma que ouço aquelas canções no Spotify
na minha própria sala com meu próprio vinho e meus próprios
amores. Fazer é um pouco ser, saquei isso no primeiro ensaio
que eu tive com elus. Gus, meu generoso, pró-criativo e meu
primeiro guia pessoal na família tripé. Quintas a pessoa
mais doce, entregue e divertida que me fez sentir como se
eu estivesse em casa. João praticamente me viu crescer junto
com ele nos nossos destinos artísticos, ele e seu violão
foram sempre canto pra cantar e canto pra estar dentro do
grupo. E tantos outros artistas que cruzaram comigo por
estar lá com eles. Tá aí, quero ver Tripé ganhar o Brasil,
quero ver Tripé amar no mundo. Um ultra-beijo para vocês.
Depoimento
Nin e
A primeira vez que publiquei uma carta para o Grupo Tripé foi no
dia 8 de junho de 2015, pré-golpe. Hoje é 10 de junho de 2022. 7
nos de lá pá cá, o mundo conseguiu ficar pior. Como eu publicava
no blog sem ser blogueirinhe, o texto passou despercebido. Peço
licença para trazê-lo de volta, pois o sentimento comeu o próprio
rabo e ficou maior. A carta me lembra o quanto eu sempre estive
a fim de vocês, a ponto de inventar um lance de investigação só
para encontrar vocês no rolê.
Dizia assim:
“Tenho acompanhado vocês em busca de inspiração para escrever um
texto sobre vocês. Tudo começou, porque eu queria sair de casa
naquele dia do picnik. Era terça-feira, 21 de abril. Deveria ser
proibido feriados na terça, porque eles são mais deprimentes que
o domingo. É tipo um intervalo de escola, ‘tá legal galera 15
minutos e já voltamos’. E o que a gente faz se o intervalo dura
o dia todo e você tá deprê? Para onde eu vou? Minha família não
era mais a mesma e eu havia cansado de todes meus amigues, lá em
casa, ressaqueades do tédio da noite passada. Eu a fim de
movimento — ficar deprê pra quê? — vi no jornal que vocês iam se
apresentar no parque. Pronto, já sabia o que queria fazer no
feriado. Investigação, pesquisa! Peguei o buzão. Cheguei na
apresentação pronte para uma terça inesquecível, me atrasei. Que
espécie de jornalista é essa que não chega a tempo de pegar seu
flagrante? Conversamos meia dúzia de palavra sobre brincadeira
de criança, gravamos uns vídeos... Perdi tudo. Nada realmente
foi usado. Aquela investigação não era real. Na vera, era. Eu
estava ali em busca de amizade. Gosto de vocês. Sei lá! Vocês são
legais para caralho, tipo gente descolada, tipo gangue do mal que
todo mundo quer ser amigue. Esse tipo de gente me deixa louca de
vontade de tá junte. Esperei sair de lá com vocês, mas vocês
foram tirar uma foto de grupo. Eu fiquei de fora. Achei outros
amigues e vida que segue.”
Sinceridade. É o que dá pra oferecer em tempos de guerra. Escrevi
essa carta 1 ano depois de termos trabalhado juntes para a
estreia do “Entre Quartos”, no demolido (por que será?) Teatro
Goldoni. Lembro do nosso primeiro ensaio, experimentações
Lecoquianas, as 7 energias do corpo, que começa na “larva” e
27
e termina com o “alerta”. Na época eu queria que o corpo de vocês
saísse da atitude “adolescente”. Engraçado, hoje faço parte do
elenco do “Entre” e tudo que o meu corpo mais quer é lembrar como
é ser adolescente, sentir tudo como se fosse a primeira vez.
Precisar sem culpa. Sem desculpa. Não tem ilusão. Eu quero estar
junte e continuar escrevendo cartas de amor, brincando joguinhos
de reaproximação.
Esse ano vocês me chamaram para dar rolê, eu estava aqui só
esperando. De olho, a fim de mais um lance, comer biscoito, tomar
café, F1. Dar continuidade ao que nunca acaba — o nosso tesão. E
a gente segue metendo as caras. Se mantendo. Gratidão pelas
trocas e pelas aventuras que vivemos juntes. Do fundo do meu
introspectivo, grito aos quatro cantos: Vida longa ao Grupo
Tripé! Meu xodó.
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Depoimento
Giov a n n a L i s b o a
texto
GRUPO TRIPÉ, BEATRIZ ROEDEL, JULIANA MOTTER e adaptações
de CAIO FERNANDO ABREU, TCHEKOV, MOLIÉRE e CARPINEJAR
dramaturgia
GRUPO TRIPÉ e NINE
elenco regular
ANA QUINTAS, GUSTAVO HAESER e JOÃO PEDREIRA
outros atuantes
NINE, ULTRA MARTINI e ZÉ REIS
iluminação
ANA QUINTAS e GRUPO TRIPÉ
figurinos
FERNANDA ALPINO e GRUPO TRIPÉ
cenografia
GRUPO TRIPÉ
identidade visual
GABRIEL GUIRÁ e LUISA MALHEIROS
equipe de criação
ANA QUINTAS, DAVI MAIA, GUSTAVO HAESER e JOÃO PEDREIRA
direção de produção
GUSTAVO HAESER
produção associada
ELISA MATTOS | DESVIO PRODUÇÕES CULTURAIS
realização
GRUPO TRIPÉ
32
O No v o
E spe t á c u l o
Tu d o E stá à Venda
Imagine um mundo onde a música foi banida e o único sistema de som
se encontra nas mãos de um ditador...
O Novo Espetáculo (Tudo Está à Venda) é um experimento de teatro
altamente interativo, um lugar onde tudo pode acontecer, um convite
a dançar e celebrar a alegria de estar vivo e a capacidade de superar
os desafios.
S obre o
p roc e s s o
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Estreamos em maio e fazer um espetáculo que fosse vibrante,
pulsante, que celebrasse o fato de estarmos vivos. Entre andaimes,
batatinha-fritas 1,2,3, pulando cordas, contando a história de como
um herói destruiu um ditador em um mundo pós-apocalíptico, leilão de
cenas, músicas e finalizando com a participação super especial dos
alunos da oficina de percussão do grupo Patubatê — que topou
colaborar com o nosso espetáculo e finalizá-lo de maneira
especialmente mágica com um cortejo de música ao vivo tocada por
mais de 20 pessoas.
Fizemos uma temporada curta de dois finais de semana, mas que nos
marcou de maneira especial, a relação com o público, a liberdade de
fazer um espetáculo da forma como estávamos fazendo e várias outras
questões nos fizeram criar uma nova atitude perante as nossas
criações que seguem, até hoje, reverberando em nós.
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Sem cadeiras, sem muitas regras, sem divisão
palco-plateia, O Novo Espetáculo é um acontecimento
repleto de surpresas e subversões — incluindo o
pagamento do ingresso, que é feito ao final do
espetáculo. Quebras inesperadas e transições com
brincadeiras adotadas, tudo acontece em uma enxurrada
de dinâmicas construídas pelos atores e perpetuada pelo
público. Só se define público pelo fato de não termos
ensaiado com eles… — ISABELLA BAROZ
direção
SIMILIÃO AURÉLIO
texto e dramaturgia
SIMILIÃO AURÉLIO e GRUPO TRIPÉ
elenco
ANA QUINTAS, ELISA CARNEIRO, GUSTAVO HAESER e JOÃO PEDREIRA
iluminação
ANA QUINTAS e GRUPO TRIPÉ
sonoplastia
LUIZ ALBERTO PIRES
cenografia e figurinos
GRUPO TRIPÉ e SIMILIÃO AURÉLIO
participação especial
OFICINA E BLOCO ELETRÔNICO PATUBATÊ
identidade visual
LUISA MALHEIROS e MARCELO ARAÚJO
equipe de criação
ANA QUINTAS, DAVI MAIA, GUSTAVO HAESER,
JOÃO PEDREIRA e SIMILIÃO AURÉLIO
direção de produção
GUSTAVO HAESER
realização
GRUPO TRIPÉ
todo m u n do
perd e a lg um a c o i s a
aos o it o an o s
Em um tempo onde
meninos e homens
erguem armas com
as mãos, um grupo
de amigos se
reúne em uma
festa do pijama.
Depoimento
Caetano
Vill aç a
Em 2014, eu vi um cartaz de “Entre Quartos” na Caixa Cultural, saindo
do estágio. Eu tinha 17 anos, gostava de dançar e queria trabalhar em
áreas administrativas por ser bom com burocracias. Eu alisava meu
cabelo todos os dias e usava um saltinho pra ir trabalhar. Sei lá. Eu
vivia dentro de mim várias vidas que eu não mostrava pra ninguém e de
repente eu comecei a ver isso em cena. Sendo olhado no olho. Ainda
com 17 anos, eu fui atrás de todas as oficinas gratuitas das quais eu
conseguia participar e encontrei o Tripé (e alguns outros artistas do
Distrito Federal) em uma oficina do Teatro da Vertigem e de repente
eu me vi atuando com aquele povo que eu vi em cena e que me
atravessou. Por conta do Vertigem, eu peguei carona com João Miguel
nos dias que a gente precisou ensaiar e estar em cena. Eu fiquei a
fim de dar uns beijos nele, depois passou. Acho engraçado hoje em dia
como a pessoa que ele conheceu nessa época é diferente da pessoa que
eu sou hoje em dia e eu fico me perguntando de vez em quando se ele
sabe que, com 17 anos, foi muito marcante atuar com um grupo como o
Teatro da Vertigem junto com ele (mesmo que eu não fizesse ideia do
que eu estava fazendo para além da empolgação jovem) — e ainda escuto
com carinho o álbum do “Entre Quartos” de tempos em tempos. Me entendi
como transmasculino durante um trabalho com Quintas que nunca
aconteceu. A gente dormiu de conchinha numa cabana no meio do mato,
no frio, depois de 12h de ensaio. Acho que na conversa final, depois
que tudo desabou, a gente desabou junto um pouco. Sou extremamente
grato por todas as experiências e memórias construídas — são memórias
em rosa magenta, rosa-bebê e turquesa, ami —, acredito que trabalhar
com Quintas foi e continua sendo um marco essencial em quem tenho me
construído enquanto artista — sendo um grande privilégio as
possibilidades de diálogo e troca sobre teatro performativo e design
de iluminação que Quintas propõe enquanto pesquisa.
Meu trabalho mais recente com o grupo foi, então, o “Todo Mundo Perde
Alguma Coisa aos Oito Anos”, dirigido pelo Gustavo. Sei lá, o Gustavo
é o amor da minha vida, o ariano que de cara eu gosto, mesmo quando
está fazendo e falando merda. Pela curiosidade. Pela vontade genuína
de vida e de mundo. Pelo quão óbvio fica quando ele sente alguma coisa
e a sinceridade do corpo para com o sentir. Acho que a curiosidade
dele sempre andou meio perto da minha e eu sempre fiquei feliz de
poder observar. A existência do Grupo Tripé me atravessa não só como
formação artística, mas como afeto. Como relação. Como ocupação. Vida
longa aos olhares de vocês.
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E Adão o primeiro dos homens… Aquele, que de bom grado
doou uma costela pra que Deus criasse uma mulher submissa.
E que futuramente a culparia, por ele mesmo ter comido do
fruto proibido.
O índio Galdino, e os 5 rapazes! Repito. 5 rapazes! E você,
quem você queimou hoje? Quem queimou ontem? Em qual
inquisição você é carrasco? E com qual parte do seu órgão
reprodutor? Eu to falando com você… Homem! E o seu pai?
Vamos falar do seu pai. Do meu pai. Ele é feliz? E quantas
vezes ele chorou? E quantas na sua frente?
Falando em Aquiles, Aqueles rapazes, homens, garotos, estão
arrancando as antenas das saúvas e colocando-as para lutar
na arena de MMA.
Atire a flecha! Atire o rifle… Que exploda o homem bomba!
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desejávamos mais. Estávamos assim, movendo as questões sobre falo
por questões como a cumplicidade masculina, a padronização dos
corpos musculosos, nepotismo, violência verbal e agressões físicas
como forma de dominação. [...] Essa possibilidade de um deslocamento
mínimo ser capaz de gerar uma revolução é algo que levo em conta,
visto que, como mencionei anteriormente, o que se defendeu no
processo foi uma destruição que preserva os alicerces fundamentais
da obra. Mesmo pequenas ações/reflexões/dúvidas frente a uma
dramaturgia ou um roteiro estabelecidos já podem ser o suficiente
para a geração de novos sentidos e significações, novas provocações,
encontros, afetos e políticas. Sobre isso, João Ricken afirma que
“Não tinha uma apresentação que não acontecia alguma coisa muito
preciosa que não ia ter como repetir”. A possibilidade de manter
fértil e aberta para rasuras até mesmo obras já entregues ao
público, me parece uma maneira de abraçar a efemeridade do teatro e
seguir sempre atento às relações, aos afetos, aos acontecimentos
políticos, sociais, culturais e históricos do nosso tempo. Sendo
assim, permitir que a criação seja geradora de novos conhecimentos.
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Acompanhar o tripé é ter a referência do que é crescer bem e ter uma
boa vida: obstinada, sólida, intensa e desfrutada. Ver de pertinho
é muito gratificante. Me dá pistas de quem sou nessa cidade-capital
tão florida e tão seca, nesse bosque de concreto. Sempre me mostra
que a potência precisa de consistência pra transformar em realidade
aqueles sonhos tão lindos, mas ainda tão abstratos na cabeça antes
dos pés darem o primeiro passo. E o tripé tem frescor infinito, mesmo
depois dessa longa caminhada. Se renovam quase como método: todo
passo é sempre o primeiro. Com esse pessoal, as coisas passam pelo
coração e tomam forma da maneira mais genuína que pode existir. Eu
sei disso porque pude fazer parte de processos do grupo, que foram,
sem dúvidas, das experiências mais especiais para uma trajetória
como a minha: artista jovem tendo como dádiva poder não só ser
inspirado por outras gerações, mas por outres artistas jovens, que
têm em comum a sede por contar as histórias mais difíceis de serem
contadas - as recitadas pela alma, por isso as mais gratificantes.
Voltando ao início, algo assim é referência. Eu amo muito!
EMANUEL LAVOR
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Vi "todo mundo perde alguma coisa aos oito anos" nascer em um ensaio
geral para a estreia de sua primeira temporada. Até então, eu não
fazia parte do elenco; estava ali como amigo e espectador. Mesmo
antes de entrar para o elenco, cheguei a acompanhar alguns
estilhaços de conversas com o grupo quando estavam em processo de
criação/ensaios para a primeira temporada. Desde lá, já senti um
senso de propósito enorme em relação àquele trabalho; sentia
reverberar no meu corpo a urgência do que estava sendo
discutido/levantado/exposto ali, principalmente quando efetivamente
vi o espetáculo na sua primeira versão.
Também nunca tinha estado em um processo de teatro em que eu tivesse
passado tanto tempo dedicado não a levantar cenas, mas a aprofundar
discursos e dialogar afetos dentro do elenco/equipe. Vale dizer que
no nosso processo de ensaios, em meio a exercícios fisicamente
cansativos e temas desconfortáveis, duas coisas eram regra: se faz
calor, tomamos banho de mangueira; se estamos com fome, pausa no
ensaio que tá vindo o carro da pamonha! Tudo isso causou impactos
radicais na minha forma de pensar/fazer teatro e também na minha
forma de lidar comigo mesmo, com meu corpo, o como entendo minha
identidade...
Justamente por se manter ao que sempre se propôs ser, o "todo mundo
perde alguma coisa aos oito anos" que estreou em 2018 foi
radicalmente diferente do que o que reestreou em 2019 e certamente
será radicalmente diferente se/quando viermos a montá-lo novamente.
Ainda há muito a ser discutido, problematizado, aprofundado,
abandonado, resgatado… Quanto mais mergulhamos, mais fomos/vamos
provocando rachaduras por dentro e por fora. Talvez a primeira
rachadura que senti foi logo no início quando me dei conta que não
sabia responder à simples pergunta: "o que é um homem?". A palavra
"homem" significa tanto e ao mesmo tempo tão pouco…
Durante e após o processo fomos entendendo que não estávamos falando
necessariamente de "homens" ou somente de "masculinidades". Fomos
entendendo, inclusive, que nem todos de nós que originalmente
compunham aquele elenco de "meninos de oito anos" éramos/somos
homens (eu mesmo já sinto que a palavra "homem" diz respeito somente
a uma camada do meu gênero; e o rótulo "gay", que um dia abracei como
uma caixa, hoje abraço como um ponto de referência e um símbolo de
luta, não como um limitante/determinante da minha experiência de
gênero e sexualidade). Me pego voltando diversas vezes em pensamento
para as discussões e trocas que tínhamos nesse processo e entendendo
novas camadas do que esse nosso trabalho abrange. É um trabalho que
me captou enquanto artista e ser humano; tenho todas as vontades de
vê-lo tomar novas formas e seguir alcançando novas camadas, novos
públicos e novas inquietações.
JOÃO RICKEN
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F ich a T é n i c a
t odo mu nd o
p erde a lg u m a c o i s a
a os o it o a n o s
texto e dramaturgia
A EQUIPE
elenco
ANA MATUZA, CAETANO VILLAÇA, DENI MOREIRA,
EMANUEL LAVOR, JOÃO RICKEN e TAUÃ FRANCO
colaborações
JOÃO GABRIEL AGUIAR, JOÃO QUINTO e MARCOS LOPES
provocações
FERNANDA ALPINO e LEONARDO SHAMAH
dramaturgismo
RODOLFO GODOI
iluminação
ANA QUINTAS
cenografia e figurinos
GIOVANNA LISBOA e GUSTAVO HAESER
design de som
ARNOLD GULES
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remix "Homens"
VINÍCIUS FONTENELE
vídeos
MATHEUS LIMA
design gráfico
GUILHERME NOMURA
fotos
BRUNO ARAÚJO, JOACY PINHEIRO,
MANOELA MORGADO E MARCOS LOPES
agradecimentos
DENIS CAMARGO, ELISA MATTOS, LEO SYKES e PAULA OTERO.
apoio
CAIXA CÊNICA, CASA DOS QUATRO,
COLETIVO COLUMNA E UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
realização
GRUPO TRIPÉ
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D ep oimento
F e r n a n d a Alpino
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nesses 10 anos o melhor lugar na plateia. E sentada nele (ou
em pé dançando), eu paguei minha língua (e que sensação
deliciosa). Quando eu, do alto do meu ceticismo e de toda a
experiência que eu ingenuamente achava que tinha, julguei que
esse projeto de grupo não ia muito longe eu não conhecia ainda
a insistência deles. Quintas, Gustavo e João têm um fogo
queimando inquieto dentro deles, o que faz com que eles digam
muitos sims pros sonhos deles. Um alimentando o sonho de
outre. E insistindo! Eu conheço bem a importância que a
insistência tem pro teatro de grupo, mas assumo que eles
insistem com uma alegria e ímpeto que eu acho que nunca tive.
Então, do meu lugar (camarote) eu aprendo até hoje com eles.
Aprendo sobre mudança, flexibilidade, continuidade, paixão,
confiança, atrevimento, orgulho, humildade e afeto. Espero que
eu possa seguir acompanhando de perto as próximas invenções
megalomaníacas desse Tripé, eles ainda têm muito pra me
ensinar e eu tenho amor pra dar. Entretanto, mesmo se não for
possível seguir ao lado deles, ainda assim eu seguirei movida
por esses afetos e muito grata por tudo que vivi, pelas
oportunidades, aventuras e dúvidas que o Tripé me
proporcionou. Seja como for, eu estarei atenta ao que virá na
vida longa desse Grupo, desses artistas que o constroem
diariamente e das parceiras, parceires e parceiros que
compuseram o caminho até aqui.
Se você ainda não se apaixonou pelo Grupo Tripé, eu sugiro que
você chegue um pouquinho mais perto e se deixe seduzir.
Aproveite, vai ser uma experiência emocionante.
Aqu á r i o
do Grupo Liquidificador
Foi no espetáculo Aquário que aconteceu pela primeira vez
uma troca entre o Grupo Liquidificador e o Tripé. Ana
Quintas fez a luz de Aquário e o Tripé assumiu a operação
da luz, que acontecia de forma performática e nada
tradicional. Reservamos algumas páginas para falar sobre
esse acontecimento.
Como nos reservatórios de vidro, comumente usados na
decoração de consultórios, “Aquário” é uma metáfora para um
cativeiro onde a natureza acontece ciclicamente, dentro de
um contexto restrito. No espetáculo, um casal de corretores
se destaca dentre os núcleos de pessoas que há muito
habitam aquele espaço e que, por força de suas memórias
curtas, sequer se lembraram de tentar escapar do local.
O sistema de repetição de ações entra em pane quando o
público chega para conhecer a casa, guiado pelos
corretores. O plano do casal é que alguém ocupe o espaço
para que eles consigam, finalmente, se libertar de lá.
“Aquário” segue também a intenção do Liquidificador de
sempre trabalhar próximo ao público. Não por acaso, é a
plateia quem quebra a rotina dos personagens de repetições
eternas. A peça acontece pelos cômodos de uma casa comum,
para um público reduzido, numa relação muito próxima, de
olho no olho. A esses “visitantes”, entretanto, é reservado
o direito “voyeur” de espectador. Apesar de parte
importante da dramaturgia do espetáculo, o público só
interage com as cenas se quiser.
O espetáculo marca um momento importante do Grupo
Liquidificador, o único espetáculo a ser dirigido por uma
diretora convidada, nesse caso Ana Flávia Garcia.
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Nós estávamos mergulhados no Aquário, espetáculo colab minha
com Grupo Liquidificador. O espetáculo era ancorado numa casa
na Vila Telebrasília e tinha uma ambiência absolutamente
cinematográfica, misteriosa e assustadora. Eram camadas espaço
temporais versadas nessa mesma casa. Pra isso ser possível era
necessário trucagem. Mágica. Efeitos de aparecimento e
desaparecimento de ambientes, coisas, corpos... De repente a
gente viu que precisava contar com o assombro. Com os
fantasmas. Aí idealizamos uma espécie de contrarregragem
mágica, meio ninja, meio assombração. Essa trupe ninja fantasma
ilusionista precisava transformar o ambiente a cada mudança de
espaço do público dentro da casa. O grupo Tripé apareceu na
minha vida assim. No escuro, como gatos, deslizando
secretamente, trocando a casa toda e alterando as lógicas. É
nesse momento que eu conheço Ana Quintas e juntes dessa
potência tricoletiva, criamos e executamos uma das luzes mais
lindas que eu já tive oportunidade de fruir e mover num
trabalho. Icônica. Inesquecível a lembrança da partilha de
ideias e a fala de Quintinhas diante dos delírios: "Tudo é
possível, nós vamos dar um jeito!" . Assim brotou a Equipe
Invisível, minha trupe de mágicos ninjas gatunos fantasmas que,
manipulando tecnologias cotidianas e potência, fazia nascer
pra mim uma lua cheia na janela toda noite de espetáculo... Foi
bom demais trombar em silêncio com elus no escuro secreto do
nosso Aquário e pra sempre fazendo barulho por aí na nossa
função. Salve Tripé. Tem muito amor aqui pra vocês.
FERNANDO DE CARVALHO.
Equi pe
Invi s í v e l
61
Realizamos, de 6 a 17 de abril de 2016, o projeto OCUPAÇÃO
INDEPENDENTE, uma mostra que reuniu uma série de espetáculos teatrais,
oficinas e rodas de conversa no Teatro Plínio Marcos e na Área Externa
da Funarte (DF), em Brasília.
A curadoria de espetáculos levou em conta produções que foram criadas
e produzidas de forma independente, sem patrocínio da iniciativa
privada nem apoio governamental, e contou com os coletivos Andaime
cia. de teatro, cia. viÇeras, cia. Mandacajú e Trupe Raiz de Circo,
além de obras do nosso repertório.
Além dos espetáculos, contamos também com a “Oficina de Improvisação
Teatral”, com o Grupo Liquidificador, a “Oficina Investigação Cênica
em Processo Coletivo”, com o Grupo Tripé, e a roda de conversa
“(in)Dependência, ou morte? – Diálogos sobre financiamento cultural”.
Ocupação
Independente
45 projetos
realizados por + de
40 coletivos teatrais
realizaram + de
250 apresentações
movimentaram + de
680 profissionais
30 espaços culturais
32.900 espectadores
20 1 9
2 a edição
72 projetos
realizaram + de
880 apresentações
circularam por + de
50 cidades em 10 países
movimentaram + de
1.500 profissionais
24 espaços culturais
73.000 espectadores
geraram + de
2.250 empregos
Fich a T én ic a
PRÊM I O WE B
PRÊMIO WEB
assistência geral:
ANA QUINTAS, JOÃO PEDREIRA E LARISSA SOUZA
design gráfico:
PAULA OTERO
apresentação: apresentação:
ELISA CARNEIRO E NINE AS RACHAS | ANA FLÁVIA GARCIA,
ANA LUIZA BELLACOSTA
cobertura audiovisual: E ELISA CARNEIRO
BRUNO ZAKKA
cobertura audiovisual:
cobertura fotográfica: COLETIVO COLUMNA | MARCOS LOPES
NINA QUINTANA E MATHEUS LIMA
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Nos meus primeiros passos no teatro eles estavam lá. Eles ainda não
eram Tripé, e eu ainda não era Desvio. Quando o Tripé começou a
nascer, eu também estava nascendo na produção. Temos uma vida
profissional inteira juntos, caminhando lado a lado, trocando,
compartilhando, amando, tropeçando, enfrentando desafios, pensando
em desistir, pensando em seguir e vivenciando as dores e os prazeres
de viver o teatro.
Nosso caminho é permeado por essa temática, mas o que a vida nos
trouxe vai muito além da experiência profissional. Essa relação há
muito tempo me ensina sobre ser, acreditar, crescer e expandir. Sou
mais quando estou com eles e amo fazer parte dessa história!
ELISA MATTOS .
CENAS de uma DÉCADA
77
grupos
parti c i p a n t e s
78
Grupo Teatral Pujança
Noigandres
Ser a dois
Humus de Teatro
Seu Estrelo e o Fuá do
isso NãO é Um CoLeTiVo Terreiro
NEM – Núcleo Teatro Caleidoscópio
Experimental em
Movimento Teatro do Concreto
realização:
GRUPO TRIPÉ
coordenação de produção e gestão administrativa:
DESVIO PRODUÇÕES | ELISA MATTOS
curadoria:
ADRIANA LODI, GLAUBER CURADESQUI E
GRUPO TRIPÉ (ANA QUINTAS, GUSTAVO HAESER, JOÃO PEDREIRA)
projeto expográfico:
MONICA NASSAR
cenotécnica:
ERICK PORTO
projeto gráfico:
GABRIEL GUIRÁ E MANUELLA LEITE
mediação:
GRUPO TRIPÉ
arte educadora:
GIOVANNA LISBOA
assessoria de imprensa:
MAÍRA DE DEUS BRITO
apoio:
UnB | CEN | IDA
T rip é
em números
3 espetáculos criados
86 sessões apresentadas
27 debates realizados
1 edição da OCUPAÇÃO INDEPENDENTE, com 5 coletivos teatrais
do DF
2 CD’s gravados
12 temporadas realizadas
2 temporadas de Aquário, do Grupo Liquidificador
8 participações em festivais nacionais e internacionais
15 indicações ao Prêmio Sesc do Teatro Candango
5 troféus do Prêmio Sesc do Teatro Candango
+ de 100 horas de oficinas ministradas
+ de 150 empregos diretos gerados
+ de 9.000 espectadores
Nas redes:
+ 17,5 mil visitas no Site
+ de 1.600 seguidores no Instagram
+ de 5,7 mil visualizações no Youtube
+ de 260 horas assistidas no YouTube
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Agr a d e c i me n t o s
Agradecemos a todas as pessoas, coletivos, espaços, empresas,
institutos e iniciativas que contribuiram com a nossa caminhada
durante esses dez anos, só foi possível com vocês.
Fotos
NINA QUINTANA
Pg. Capa, 13/14, 18, 19/20, 30, 33, 35/36, 40, 43, 44, 45/46,
47/48, 58, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74 e 77/78
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ESTE LIVRO FOI PUBLICADO EM 2022
Este projeto é realizado com recursos do Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal.