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Universidade Federal Rural de Pernambuco

Unidade Acadêmica de Educação a Distância e Tecnologia

História da Arte no Brasil

Volume 1

Madalena Zaccara

Recife, 2012
Universidade Federal Rural de Pernambuco
Reitora: Maria José de Sena
Vice-Reitor: Marcelo Brito Carneiro Leão
Pró-Reitor de Administração: Gabriel Rivas de Melo
Pró-Reitor de Atividades de Extensão: Delson Laranjeira
Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Mônica Maria Lins Santiago
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: José Carlos Batista Dubeux Júnior
Pró-Reitor de Planejamento: Romildo Morant de Holanda
Pró-Reitor de Gestão Estudantil: Severino Mendes de Azevedo Júnior

Unidade Acadêmica de Educação a Distância e Tecnologia


Diretor Geral e Acadêmico: Francisco Luiz dos Santos
Coordenadora Geral da UAB: Marizete Silva Santos
Vice-Coordenadora Geral da UAB: Juliana Regueira Basto Diniz
Coordenadora de Cursos de Graduação: Sônia Virgínia Alves França
Coordenador de Produção de Material Didático: Rafael Pereira de Lira
Coordenador Pedagógico: Domingos Sávio Pereira Salazar

Produção Gráfica e Editorial


Capa: Rafael Lira e Igor Leite
Ilustração de Capa: Moisés de Souza
Projeto de Editoração: Rafael Lira e Italo Amorim
Diagramação: Heitor Barbosa
Ilustrações: Hayhallyson Barbosa
Revisão Textual: Rita Barros

Todos os direitos reservados.


Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, sejam quais forem os meios empregados, sem a permissão, por escrito, da Unidade Acadêmica
de Educação a Distância e Tecnologia da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Aos infratores aplicam-se as sanções previstas nos artigos
102, 104, 106 e 107 da Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998.
Sumário

Apresentação..................................................................................................................... 5
Sobre o Brasil pré-colonial, a colônia e a passagem do extrativismo para
a fixação na nova terra..................................................................................................... 9
Sobre o início do investimento europeu nas terras recém-ocupadas......................... 9
Sobre a hibridização cultural brasileira..................................................................... 13
Sobre a contribuição dos povos pré-colombianos que ocupavam a terra
brasilis....................................................................................................................... 15
Anotações sobre as artes visuais anteriores à ocupação branca e no
início do processo colonizador: o índio no contexto da mestiçagem brasileira........ 18
As primeiras manifestações barrocas.......................................................................... 25
Sobre a introdução da linguagem barroca europeia no universo
conquistado brasileiro............................................................................................... 25
Sobre as ordens religiosas e seu papel na formação do barroco brasileiro............. 31
Os Jesuítas.......................................................................................................................31
Os Franciscanos...............................................................................................................33
Os Beneditinos ................................................................................................................36
Os Carmelitas...................................................................................................................38
Sobre o artista/artesão no universo da produção de espaços e imagens
no Brasil colonial....................................................................................................... 39
Personagens que aparecem no capítulo.................................................................. 41
O Barroco Tropicalista.................................................................................................... 45
Sobre o processo de mestiçagem e a produção de uma estética............................ 45
Sobre o Barroco mestiço brasileiro (ou barroco tropical) na sociedade
canavieira colonial nordestina................................................................................... 48
Anotações sobre elementos próprios do barroco tropical substituindo ou
adaptando-se ao código hegemônico ibérico........................................................... 49
Sobre os artistas citados no capítulo........................................................................ 52
A glória e a interrupção da linguagem barroca............................................................ 57
Sobre o apogeu da linguagem barroca no Brasil...................................................... 57
O ciclo do ouro como agente catalizador e unificador do barroco brasileiro............ 61
O Aleijadinho e Mestre Ataide: uma síntese do apogeu do barroco/rococó
colonial...................................................................................................................... 63
Sobre algumas escolas barrocas brasileiras............................................................ 70
Anotações sobre a Escola Fuminense de Pintura............................................................70
Anotações sobre a Escola Baiana....................................................................................71
Anotações sobre a Escola Mineira...................................................................................72
Sobre o Rococó........................................................................................................ 74
O declínio do estilo Barroco e a implantação do vocabulário Neoclássico............... 75
Sobre os artistas citados no capítulo........................................................................ 78
Considerações Finais..................................................................................................... 91
Conheça a Autora............................................................................................................ 96
Apresentação
A História da Arte no Brasil teve início com as observações e escritos do pintor,
caricaturista, arquiteto, professor, crítico de arte e gestor Manuel de Araújo Porto-Alegre
que, inclusive, foi o primeiro diretor brasileiro da Academia Imperial de Belas Artes do
Rio de Janeiro. Ele é conhecido (da mesma forma que Giorgio Vassari o é no que diz
respeito à História da Arte Ocidental) como o pai da História da Arte no Brasil.

Empenhado na tarefa de estabelecer as origens da produção artística brasileira,


Porto-alegre criou o que até hoje se chama de “Escola Fluminense de Pintura”, termo
empregado pela primeira vez no ano de 1841. Esse foi o primeiro esforço de sistematizar
o passado artístico brasileiro. Com uma vida intelectual intensa, ele assumiu posições
de destaque nas duas instituições culturais mais importantes do Império: o Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e a Academia Imperial de Belas Artes (AIBA).

Desde sua atuação como crítico de arte Porto-Alegre procurou unir história e arte.
O seu interesse em buscar uma história da produção artística desenvolvida no país,
mesmo considerando a influência europeia colonialista, destaca-se. Em suas próprias
palavras (1850): “A arte não progride, não forma escola, não adquire um caráter de
superioridade e de permanência enquanto se não nacionaliza: apressar este passo é
conquistar o futuro, é encurtar o tempo”.

Ao admitir os artífices setecentistas como artistas, Porto-Alegre acabou por fundar uma
história da arte brasileira antes mesmo da chegada da Missão Artística Francesa de
1816, que vai introduzir no país um novo vocabulário iconográfico: o Neoclassicismo.

É a partir deste início de uma abordagem científica da produção artística nacional que
iremos montar nosso curso sem esquecer a magnífica produção indígena (mesmo que
de maneira superficial), mas abordando o viés historiográfico a partir das primeiras
tentativas de fixação do europeu na terra. Dessa forma, após uma ligeira introdução
sobre as formas de arte existentes antes do processo de colonização mergulharemos
no desenvolvimento das expressões coloniais até chegarmos ao período barroco e a
glória da igreja católica aliada ao absolutismo português.

Se analisarmos a formação da cultura brasileira, vamos verificar que a civilização pré-


colombiana pouco influenciou o colonizador português. A igreja católica, importando o
barroco europeu, controlou a produção artística. Os conventos se transformaram em
verdadeiros ateliês. Objetivo: a catequese com a substituição do imaginário nativo pela
iconografia católica. A Igreja se constituiu, assim, no grande cenário das atividades
artísticas da colônia e, apesar de não proibir a criatividade: direcionou-a.

Ela representava também a única possibilidade de vida cultural tendo em vista a


total dependência da colônia em relação à metrópole. O povo era pobre e inculto. O

5
proprietário de terras, parte do segmento financeiramente privilegiado, por sua vez, não
tinha qualquer interesse ou preocupação com atividades artísticas.

Dessa forma, a produção de arte colonial foi de caráter religioso, com modelos
importados da Europa, mais precisamente de Portugal. No Brasil, apesar de uma
colonização aparentemente menos cruenta do que a espanhola em seus aspectos
de catequese, as missões jesuíticas se constituíam em verdadeiras fábricas de
imagens que impunham uma visão eurocêntrica do mundo através da Igreja católica.
A colonização cultural que, através de uma hipotética cumplicidade, faz da catequese
uma forma de controle da colônia pelo Estado aconteceu, portanto, desde os primórdios
da formação brasileira embasada na supremacia do invasor em relação aos povos
autóctones.

Podemos considerar o momento histórico do início da formação dos assentamentos


urbanos, na segunda metade do século XVI, que se processou inicialmente no Nordeste
do país, bem como a sua economia açucareira - que vem substituir gradativamente
o extrativismo imperante - como marco da introdução de uma linguagem europeia
que se impôs ao elemento nativo, mas que também iria assimilar algumas de suas
características. Através desse olhar todo um ambiente cultural pode ser determinado.
Foi, portanto, dentro desse contexto social e urbano que se desenvolveram as
manifestações arquitetônicas, inicialmente rudimentares, que foram embriões de um
imaginário barroco particular e único.

Por longos anos as terras conhecidas e achadas pela coroa portuguesa foram deixadas
ao sabor dos que a exploravam. A colonização foi, depois desse tempo de abandono
e invasões de países deixados de fora do Tratado de Tordesilhas, a alternativa para
que a coroa de Portugal mantivesse sua parte do território partilhado com a Espanha:
o chamado Novo Mundo. Se inicialmente ele, o ambiente construído, visou uma mera
sobrevivência para um europeu aventureiro ele logo deu lugar às iniciativas construtivas
voltadas essencialmente para uma arquitetura destinada à religião iniciada pelos
jesuítas e, posteriormente, continuada por franciscanos, beneditinos e carmelitas. As
ordens religiosas marcharam com o colono na fixação e ocupação deste em relação à
nova terra.

Apesar de uma colonização aparentemente menos cruenta que a espanhola no que


diz respeito à catequese e à substituição de um imaginário nativo por um importado,
as missões jesuíticas se constituíam em verdadeiras fábricas de imagens que
impunham uma visão eurocêntrica do mundo através da Igreja católica. A colonização
cultural aconteceu, portanto, desde os primórdios da formação brasileira embasada na
supremacia do invasor em relação aos povos autóctones. É esse momento de fixação
do português na nova terra, da imposição de uma cultura branca e hegemônica, que
iremos estudar no primeiro capítulo deste volume.

O segundo capítulo abordará aspectos dessa fixação. Entre eles a imposição de um

6
imaginário através da força das armas e da conversão a um determinado credo. De
acordo com Octavio Paz (1977, p. 20), “os missionários do século XVI e os antropólogos
contemporâneos se aproximam das comunidades indígenas da mesma forma: não para
conhecê-las, mas para mudá-las”.

Entretanto, uma reação se processou em relação ao elemento autóctone em seus


primeiros momentos de reprodução do ideário imagético do colonizador. Ele assimilou
os valores colonialistas, mas buscou em seu próprio entorno, em seu imaginário
particular, em suas raízes, enfim, parâmetros para uma adaptação iconográfica.
Dessa forma, elementos visuais regionais foram incorporados na leitura e assimilação
simbólica barroca europeia. É o que poderíamos chamar de “tropicalização” do Barroco.
Essa decodificação, em alguns momentos, pode também ser vista como resultado de
certo condicionamento que buscava impor certa hierarquia entre o religioso, o leigo
e, principalmente, o nativo e o escravizado. O poder sempre veio atrelado à religião.
Dessa forma a representação de índios nos adros de algumas construções barrocas
poderia estar ligada a ideia de um ritual de passagem através do qual segundo a
historiadora do barroco paraibano Carla Mary S. Oliveira (2004):

Aqueles índios, meio feras e meio homens, se distanciaram da


selvageria completa, pois já compreendiam parte do significado da
Paixão de Cristo, mas não estavam prontos ainda para adentrar o
“reino do bem” do interior do templo.

Esse é, portanto, um dos aspectos que abordaremos no terceiro capítulo do presente


volume que, finalmente, se encerrará, em seu quarto capítulo, com a celebração do
apogeu barroco que iremos encontrar, principalmente, após o ciclo econômico do ouro
que se processou nas Minas Gerais onde, por conta da dificuldade de comunicação
aliada a uma riqueza cada vez mais presente, a arte barroca no Brasil atingiu sua
glória, seu apogeu.

Esse ápice da civilização barroca brasileira, ainda na primeira metade do século XIX,
vai oficialmente ceder lugar a um novo estilo também importado: o Neoclassicismo. É
um momento político internacional que teve como resultado a introdução de uma arte
laica no país. Essa visão artística profana que se deveu a acontecimentos alienígenas
(a desobediência de Portugal ao bloqueio continental decretado por Napoleão
Bonaparte e as ligações do governo luso com a Inglaterra) vai substituir, pouco a pouco,
o simbolismo barroco religioso adaptado aos trópicos.

A autora.

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8
Capítulo 1

Sobre o Brasil pré-


colonial, a colônia e a
passagem do extrativismo
para a fixação na nova
terra

Objetivos
●● Compreender o processo de fixação do europeu em solo brasileiro;

●● Entender as origens da formação de uma cultura nacional;

●● Observar as etapas e as implicações do relacionamento entre três culturas


encontradas em estágios e papéis diversos: o indígena coletor, o europeu
mercantilista e o negro escravizado.

Sobre o início do investimento europeu


nas terras recém-ocupadas
Durante os primeiros trinta anos (1500 a 1530), Portugal não viu
qualquer interesse em colonizar o Brasil. O seu principal objetivo era
o lucrativo comércio das especiarias orientais bem como o do ouro,
marfim, sal e escravos. Sua relação com as novas terras limitou-se,
portanto, à necessidade de investigá-las e defendê-las através da
fundação de feitorias e do envio de expedições cujo objetivo era a
exploração e a defesa do novo território. Sua ótica extrativista naquele
momento o levou, principalmente, à exploração do pau-brasil que
abundava nativo, nas novas terras recém-descobertas.

As perspectivas econômicas em relação às terras recém-incorporadas


à coroa portuguesa não eram boas: ausência de metais preciosos
ambicionados e uma única alternativa de fácil exploração que era
essa madeira abundante (caesalpina echinata) no litoral brasileiro e
do qual se extraía uma tinta corante própria para tingir tecidos e que
era também usada na fabricação de móveis e remédios. De comércio
garantido ela foi extraída até quase sua extinção.

9
Dessa forma, nesse primeiro período da história do Brasil pós
“descoberta”, as terras achadas pela coroa portuguesa foram deixadas
ao sabor dos que a exploravam independente de sua origem, apesar
das poucas tentativas tomadas em sua defesa. O investimento na
defesa do território ainda não se fizera importante.

Com o aumento dessa exploração, por parte principalmente dos


franceses, Portugal decidiu-se pelo sistema de divisão do território.
Foi a sua primeira ação no sentido de preservar a posse da terra.
Porções de terra, a maneira dos feudos medievais, foram doadas a
pessoas de confiança da coroa. Foram criadas assim as capitanias
hereditárias (Figura 1). Entre os anos de 1534 e 1536, o rei de
Portugal, D. João III, dividiu a terra brasileira em faixas, que partiam
Lembrete do litoral até a linha imaginária do Tratado de Tordesilhas1.
1
Pelo Tratado de
Tordesilhas, assinado a
7 de junho de 1494, por
Portugal e Espanha, os
domínios dessas duas
nações seriam separados
por um meridiano que
pausaria a 370 léguas
a oeste das ilhas de
Cabo Verde. Todas
as terras leste desse
meridiano pertenceriam
aos portugueses e as
que ficassem a oeste aos
espanhóis.

Figura 1. Capitanias Hereditárias.

Estas enormes faixas de terras foram doadas para nobres e pessoas


de confiança do rei: os donatários, que tinham a função de administrar,
colonizar, proteger e desenvolver a região além de combater o nativo
que resistisse à ocupação do território.

As dificuldades de administração das capitanias foram a marca


desse processo de administração implantado pela coroa portuguesa.
A distância da metrópole, os ataques indígenas, a falta de recursos
e a extensão territorial dificultaram muito a implantação do sistema.
Dessa forma, poucas deram certo, grande parte foi abandonada.
Com exceção das capitanias de Pernambuco e São Vicente, todas
acabaram fracassando.

10
Em 1549, o rei de Portugal criou um novo sistema administrativo para
o Brasil: o Governo-Geral. Este seria mais centralizador, cabendo ao
governador geral as funções antes atribuídas aos donatários. Iniciou-
se, então, gradativamente, o povoamento da maior colônia portuguesa
de além-mar: o Brasil.

Já no século XVI encontraremos algumas povoações no território


brasileiro tais como Salvador, Olinda, Rio de Janeiro, Igaraçu e
Villa Velha (Itamaracá). Essas povoações obedeciam ao esquema
de urbanização radial2 (Figura 2) ainda adotado por Portugal. Elas Saiba Mais
erguiam-se em elevações estratégicas gerando ladeiras íngremes e 2
Uma cidade radial
tortuosas emolduradas pelo casário que acompanhava o desenho tem todas as suas
urbano em simplicidade e despojamento nesses tempos iniciais. As ruas voltadas para um
determinado centro que
primitivas ocupações urbanas da América colonial portuguesa não funciona como pólo
tinham qualquer planejamento diferindo da espanhola que exportava aglutinador.
e definia o modelo urbano de suas cidades coloniais.

Figura 2. Malha Urbana Radial. Paris.

Tomando como exemplo a vila de Olinda, em Pernambuco, que adotou


tal organização urbana, ela, segundo José Luis da Mota Menezes
citado por Fernando Guerra (2009, p. 19) assim se comportava em
relação ao espaço geográfico:

Por sua situação topográfica essa parte mais alta


da referida colina se estende ao longo de Leste a
Oeste, balizando os seus dois extremos a Igreja
Matriz do Salvador e o Hospital e Igreja da Santa
casa de Misericórdia, (lembrando disposição
também utilizada em Igaraçu, vila contemporânea
em fundação à de Olinda, e Serinhaém, todas em

11
Pernambuco, além de Itamaracá, na Capitania de
pero Lopes de Souza).

Na vizinha Parahyba as coisas se processam de maneira semelhante.


O padrão de ocupação territorial obedeceu ao mesmo esquema.
Segundo Irineu Pinto (1977, p. 20-22):

Chegando Martim Leitão à nova terra e procurando


o melhor local para plantar a cidade, escolhe o
alto de uma colina, tendo o Rio Sanhauá aos pés,
a dezoito kilômetros da foz do Parahyba, defronte
ao sítio em que João Tavares havia anteriormente
feito a paz com Piragibe.

Figura 3. Igreja de Nossa Senhora da Graça. Olinda. Finais do século XVI.

A arquitetura, expressão maior das artes visuais do período, é o


elemento visual que marca os primeiros momentos da ocupação
europeia no território brasileiro. Ela se caracteriza naquele momento
principalmente pelo despojamento e simplicidade. No que concerne
às habitações, elas tinham caráter efêmero e só as construções
religiosas se caracterizavam por uma intenção mais duradoura
ou marcante. Era uma austeridade própria do que se pretendia
temporário. O fato é que as condições de vida nos povoamentos nos
dois primeiros séculos bem como a carência de meios materiais e
recursos humanos, não permitiram grandes estruturas arquitetônicas
aos “moldes europeus”. As igrejas, juntamente com as fortalezas,
foram sua expressão máxima (Figura 3) e as povoações, sob o signo
da religião católica trazida pelas ordens religiosas que se instalaram
gradativamente no novo território a ser catequizado, se espraiavam
em torno delas.

12
O início do século XVII marcou, segundo a historiografia sobre
o período colonial no Brasil, a expansão e o interesse da Coroa
portuguesa em explorar áreas antes não ocupadas pelo processo de
colonização. O tempo trouxe novas perspectivas para a colônia. A
base econômica para essa atenção foi o açúcar, uma riqueza trazida
de fora e que para o seu desenvolvimento Portugal já tinha experiência
tanto com o seu plantio como com a comercialização do produto nas
Ilhas Atlânticas. Assim, se no século XVI foram as construções de
taipa de pilão que compuserem a paisagem da colônia, no século
XVII a paisagem urbana e arquitetônica se transformou lentamente.
O colono demonstrou, através de construções mais sólidas, sua
intenção de fixação na terra brasileira. Em termos artísticos se iniciará
então a glória de um barroco colonial transformador e original.

Sobre a hibridização cultural brasileira


Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:
“Navegar é preciso; viver não é preciso”. (Pessoa,
Fernando, apud Edgard Belle, 2004, p. 91-103)

A casa dos homens ferve de gente: homens,


mulheres, crianças. Vivos e mortos. Todos os
mairuns estão aqui. Os vivos, surpresos, de pé
ou sentados, olham o velho tuxaua que está
acocorado na frente do aroe, bem no meio da casa
enorme. Os mortos entram e saem esvoaçando
em círculos que sobem do baito para o alto do
céu. Só são visíveis aos olhos do aroe, sentado no
seu banquinho-gavião de duas cabeças. (Ribeiro,
Darcy 1983, p. 24)

Òdòfim dòdòbálè Kòbinrin Òdòfim Òrisànlà (Santos


Edsoleta 2006, p. 220)

Para compreender-se a cultura (material e imaterial) das sociedades


mestiças, como a brasileira deve-se, inicialmente, fugir dos padrões
considerados puros, ocidentais. Isso, naturalmente, tomando-se
como ponto de referência para considerar como “ocidental” o universo
europeu colonizador. Para tanto é necessário deixarmos de lado as
idealizações arianas e tentar sentir esse extraordinário encontro de
povos posto em cena pela colonização portuguesa na América, mais
particularmente no Brasil que coube ao povo lusitano pelo Tratado de
Tordesilhas.

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Foi um encontro trágico e mágico que perdura até os dias que
correm. Trágico em relação aos milhares de índios exterminados e
de africanos escravizados. Mágico, se considerarmos o resultado
desse entrecruzamento de culturas, de três continentes, refazendo
valores, criando códigos de comportamento e sistema de crenças,
gerando esse mosaico, que resiste aos séculos, formado do acúmulo
de povos, ideias, história, linguagem e visões do mundo.

O naturalista alemão, botânico e viajante, Karl Von Martius em seu


livro Como se deve escrever a História do Brasil afirma que a chave,
para compreender essa história está no estudo do cruzamento das
três raças: a branca, a negra e a nativa. Se ele, de uma maneira
geral, pensou o hibridismo racial em termos de botânica (como uma
planta mais forte), não deixou de levar em conta a mistura cultural
resultante, mesmo que tenha priorizado a contribuição portuguesa na
formação da nação brasileira. Admitindo a ideia, mas radicalizando
esse contexto, Varnhagen, autor da História Geral do Brasil, nos traça
um panorama dessa miscigenação através de uma história branca,
e elitista que se voltava contra o indígena enunciando sua barbárie
e ferocidade e silenciava sobre o elemento africano. Capistrano
de Abreu, de certa forma, inovou quando abriu espaço para os
indígenas em Capítulos da História da Colônia: chamou a atenção
para a sociedade colonial brasileira através de seus desequilíbrios e
contrastes, mesmo mantendo uma visão estereotipada em relação a
negros e mestiços, afinada com o pensamento europeu assimilado
pela inteligência brasileira que via a mestiçagem como um perigo. Foi
seguido de perto por outro historiador, Paulo Prado, autor de Retrato
do Brasil, publicado em 1928, retratando um Brasil resultante da
orgia de “portugueses degenerados, índios naturalmente lascivos e
dos africanos igualmente libidinosos”, e pregando a arianização da
sociedade brasileira.

E por aí se desenvolveram as análises sobre essa sociedade


multicultural no início do século XX, com exceções solitárias, como é
o caso de Manuel Bonfim, que em seu livro América Latina: males de
origem o qual enfatiza os males da colonização portuguesa e defende
a miscigenação, mesmo que sob a ótica da biologia: cruzar raças
distintas fortalece o produto.

Os anos 30 vão dar lugar a três visões importantes: a de Gilberto


Freyre, que abandona o conceito de raça e assume o de cultura, a de
Sérgio Buarque de Holanda que esboçou e assumiu alguns aspectos
dessa mescla cultural na formação do Brasil e a de Caio Prado Junior

14
em sua obra Formação do Brasil Contemporâneo, que, marxista,
denuncia e atribui boa parte do problema dessa sociedade hibridizada
à degradação de índios e negros no Brasil, denunciando a escravidão
na sociedade colonial, mas colocando o negro escravo como o foco
do problema, pois que ele procedia de um universo heterogêneo,
ainda em estado de barbárie e que, aqui chegando, se abastardou por
completo. Dessa forma, enquanto Gilberto Freyre abriu caminho para
se pensar uma cultura brasileira original em sua multiculturalidade,
ele reafirmou conceitos e preconceitos antigos.

Freyre lutou pela miscigenação que acreditava, mas, talvez, suas


conclusões não estivessem corretas se pensarmos nessa mistura
como um projeto português, uma propensão lírica e sensual para a
mistura de raças, ideia que se popularizou no imaginário brasileiro.
O fato talvez se deva mais a um projeto de ocupação dos novos
territórios que à inclinação por outras cores de pele. O importante,
porém, é a contribuição africana e mesmo indígena que, embora bem
menos marcante, trouxe elementos importantes para a construção da
cultura e do imaginário brasileiro.

Sobre a contribuição dos povos pré-


colombianos que ocupavam a terra
brasilis
Quando os navegadores europeus chegaram há 500 anos encontraram
populações que viviam há 500 séculos. O encontro dos dois grupos
provocou um grande choque cultural. Os grupos humanos oriundos
da Europa baseavam-se na acumulação de riquezas enquanto os
autóctones viviam em plena economia de coleta e de uma agricultura
de sobrevivência. Segundo Anne Marie Pessis (2003, p. 17-18):

O encontro dos dois grupos provocou um choque


cultural devastador. Os contextos de origem e as
escolhas de valores, sobre os quais foram forjadas
as duas culturas, eram totalmente diferentes. Os
indígenas tinham privilegiado o aprimoramento
de procedimentos que aproveitavam os recursos
da natureza para uma qualidade de vida que
preservasse seu potencial de sobrevivência (...).
Quando os europeus chegaram as terras do Brasil,
seu objetivo principal era a obtenção de riquezas
e, para isso dispunham de dispositivos técnicos de
destruição física e ideológica.

15
Desde o início da ocupação europeia estereótipos foram estabelecidos,
conceitos esses que projetaram uma imagem do indígena até o
presente. Uma imagem distorcida, portanto, foi transmitida. Essa
história preconceituosa afastou o conhecimento de 500 séculos de
pré-história indígena.

Essa cultura ilógica para o conquistador, cheia de mitos e atitudes


incompreensíveis, não encontrou eco junto à arrogância do europeu.
A ingenuidade e a surpresa dos nativos bem como a pouca resistência
à contaminação cultural do homem branco provocou a perca da
memória das tribos expostas à colonização.

Dessa forma, se analisarmos a formação da cultura brasileira,


vamos verificar que a civilização pré-colombiana pouco influenciou o
colonizador português. A igreja católica, importando posteriormente
(após a primeira fase de ocupação territorial) o barroco europeu,
controlou a produção artística. Os conventos se transformaram, então,
em verdadeiros ateliês. Objetivo: a catequese, com a substituição
do imaginário nativo pela iconografia católica. A Igreja se constituiu,
assim, no grande cenário das atividades artísticas da colônia e,
apesar de não proibir a criatividade: direcionava-a.

Ela representava também a única possibilidade de vida cultural tendo


em vista a total dependência da colônia em relação à metrópole. O
distanciamento imposto pelo conquistador/colonizador impunha a
ignorância como forma de controle e só a religião, no melhor estilo
medieval, proporcionava um canal de escape para esses primeiros
habitantes europeus das terras americanas. Dessa forma, a produção
de arte colonial foi de caráter religioso, com modelos importados da
Europa, mais precisamente de Portugal.

De acordo com François Cali (1960), o Barroco, enquanto arte dos


conquistadores serviu à dominação política em cada etapa da marcha
de Cortez sobre o México. Um templo era transformado em igreja
católica a cada passo dessa conquista e para decorá-las foram
criadas milhares de imagens enquanto era proibida a representação
da realidade local. O historiador francês Serge Gruzinsky, em seu
livro A Guerra das Imagens: de Cristovão Colombo à Blade Runner
também se volta para a análise da substituição do imaginário dos
povos indígenas mexicanos por uma iconografia católica que servia
como dispositivo de dominação simbólica e real. De acordo com
Octavio Paz (1977) os missionários do século XVI e os antropólogos
contemporâneos se aproximam das comunidades indígenas da

16
mesma forma: não para conhecê-las, mas para mudá-las. Diz ele:

Los misioneros querían extender la comunidad


cristiana a los indios: nuestros antropólogos
quieren intégralos em la sociedad (...). El
etnocentrismo de los primeros era religioso, el de
los segundos es progresista y nacionalista.

No Brasil, apesar de uma colonização aparentemente menos cruenta,


as missões jesuíticas se constituíam em verdadeiras fábricas de
imagens que impunham uma visão eurocêntrica do mundo através
da Igreja católica. A colonização cultural, que através de uma
hipotética cumplicidade deriva em catequese, não necessariamente
só religiosa, aconteceu, portanto, desde os primórdios da formação
brasileira embasada na supremacia do invasor em relação aos povos
autóctones. Não só no que se refere ao português, mas ao europeu
de maneira geral. Frank Lestringant (1994) no prefácio para a edição
para a Histoire d´ une Voyage en Terre de Brésil, de Jean de Léry,
analisando seu capítulo VIII, constata que:

la complicité instaurée d´emblée entre l´Euroéen et


le sauvage n ´est absolue ni totalement innocente.
Elle n ´est possible qu’avec une certaine catégorie
d ´indiens, ceux qui, dans les faits, sont prêtes
à recevoir la tutelle des Français et à écouter
l’annonce de leur religion. Car le rapport à autrui
ne doit pas être pensé sur le modèle d’une relation
duelle.

Ou seja: essa amizade que ligou algumas tribos do litoral brasileiro


aos franceses que ambicionavam a extração do Pau – Brasil só se
processava em relação a índios já pacificados e prontos para serem
catequizados. Em relação àqueles autóctones que permaneciam fiéis
às suas tradições o procedimento francês era igual ao português: não
interagiam em pé de igualdade.

O africano no universo cultural brasileiro


Compreender nosso perfil africano passa por uma revisão dessa
cultura revisitando uma imagem que se impôs e perdura: uma África
que até sua “descoberta” foi um continente perdido na obscuridade
dos primórdios da civilização, em plena barbárie. As sociedades
africanas pré-coloniais não podem ser compreendidas tomando-se
como referência a organização social, econômica e política ocidental:
elas tinham código próprio. A mudança social provocada pelo fato

17
colonial passou a fazer parte dessa história da África, é verdade.
Ela adaptou se a essa realidade colonial, que queria eliminá-la. E
sobreviveu. Esse amoldamento não se deu somente entre os que
permaneceram no continente, mas, também e principalmente, entre
os que foram sequestrados para a indústria da escravidão. Seu
passado e suas referências permaneceram na memória coletiva do
grupo transplantado à força de suas raízes culturais: Segundo Heloisa
Leuba Salum (2005):

A estética tradicional africana é visível também, nos


dias de hoje, nas produções artísticas dos países
de fora da áfrica, principalmente daqueles, como
o Brasil, cuja população e cultura foram formadas
por grandes contingentes africanos.

A cultura africano-brasileira perpetuou, no Brasil, uma variada

Atenção gama de valores. O ethos3 africano se expandiu a partir do próprio


esforço de afirmação existencial digerindo o contexto para onde
3
Ethos significa uma
característica comum a foi lançado. Uma espécie de antropofagia motivada, no caso, pela
um grupo de indivíduos mera sobrevivência. Paralelamente às atividades estéticas visíveis
pertencentes a uma
mesma sociedade. nessa sociedade dita oficial, produziu-se toda uma permanência
cultural (e plástica), principalmente do sagrado, oculta no interior
das comunidades mestiças. As expressões estéticas emergiram,
com o tempo (e a saída da clandestinidade), a serviço do simbólico,
linguagem que outorga visibilidade à alma africana. Essa linguagem
se expressa através de uma rede de signos comunicando-se por meio
dos gestos e sons, mas também por cores e formas, em um processo
que ultrapassa gerações, conduzindo, transmitindo e transcendendo
seu tempo de origem.

Essa “alma” africana se perpetuou no país interferindo em nuances


da formação de um povo. Suas particularidades culturais sutilmente
invadiram dos hábitos à estética brasileira tornando-a particular
enquanto produto de um todo mestiço.

Anotações sobre as artes visuais


anteriores à ocupação branca e no
início do processo colonizador: o índio
no contexto da mestiçagem brasileira
As primeiras discussões sobre as manifestações pré-colombianas no
Brasil foram conduzidas pela História, Antropologia e principalmente
pela Arqueologia. Os jesuítas, porém, foram os precursores do

18
processo. De acordo com Parrot (apud ROMEU CABRAL, Carlos
Henrique, 2011:17) o objetivo era a busca de explicações bíblicas
para o dilúvio e outros fatos narrados pelo Antigo Testamento.

Alguns personagens do Brasil colonial também se interessaram pelos


registros. Em 1598, pinturas e gravuras foram documentadas pelo
capitão Mor da Paraíba, Feliciano Coelho de Carvalho e o Império,
através de Pedro II, também se interessou por essas pinturas pré-
históricas. Entretanto, só recentemente esse interesse cresceu e se
sistematizou de forma científica. No início do processo colonizador,
exceções a parte, o colono português não atribuiu maior interesse a
essas manifestações rupestres ou à própria cultura viva nativa que o
cercava.

Portanto, a pesquisa arqueológica no Brasil, que nasce com os


viajantes (naturalistas, botânicos, geólogos e paleontólogos)
estrangeiros enviados por seus países no século XIX, comporta-se
como ciência de forma recente. Ela torna-se porém, pouco a pouco,
cada vez mais sistemática juntamente como a sua divulgação. Sítios
com pinturas e gravuras são descobertos todos os anos. Em nosso
país, eles mostram determinadas características específicas: a
atividade pictórica, por exemplo, situa-se habitualmente na entrada
de grutas, em locais que serviam de refúgio ou em acampamentos
temporários, utilizados para caça ou para atividades rituais.

Segundo Anne Marie Pessis (2003) quando os navegantes europeus


chegaram ao território que depois seria denominado Brasil encontraram
uma população antiga, culturalmente diversificada e bem adaptada ao
meio ambiente. Foi nesse contexto que se processou a colonização
baseada num choque profundo e devastador. Os conquistadores
cristãos, apoiados na ideia de catequese e na supremacia da cultura
branca hegemônica objetivaram a devastação de uma cultura
local que incluía apagar seus vestígios materiais. Poucos sítios
arqueológicos escaparam ao desmonte ou ao esquecimento. Ainda
segundo Pessis (2003, p. 25) a região sudeste do Piauí foi um destes
poucos locais. Diz ela:

A região sudeste do Piauí, onde hoje está


localizado o Parque Nacional Serra da Capivara,
ficou momentaneamente excluída do processo
de colonização por ter sido área em litígio.
Eram terras doadas à Companhia de Jesus por
disposições testamenteiras de Domingos Afonso
Sertão, homem de confiança da Casa da Torre e

19
tristemente famoso genocida de índios.

Nessa região, como em bem poucos outros locais sobreviventes e


conhecidos tais como alguns no Estado de Santa Catarina e em Minas
Gerais, é possível se recuperar a imagem dos grupos étnicos que ali
habitaram e resgatar seus registros milenares. Sítios com pinturas
e gravuras continuam sendo descobertos todos os anos, poucos,
entretanto recebem a atenção profissional necessária. O dinamismo
da Arqueologia enquanto ciência vai de encontro à falta de recursos
provocada pelo desinteresse característico dos poderes públicos no
país em relação à preservação.

Nos sítios situados na região Nordeste não existe registros de


atividade pictórica, mas uma escolha por “abrigos de morfologia
variada, situados ao ar livre. Apenas raramente observou-se a
presença de pinturas situadas na entrada das grutas, mas sempre em
locais iluminados pelo sol” (PESSIS, 2003, p. 20). Muitas gerações
são responsáveis por esses registros que são documentos para a
arqueologia e manifestações artísticas para a História da Arte. Elas
Pesquise... aparecem em locais que, para aquelas sociedades, se constituíam
1665 - View of the Jesuit em locais de abrigo temporário, acampamentos, que eram utilizados
Church at Olinda, Brazil. durante as caçadas ou em atividades rituais.
Franz Post.
Essa capacidade de representar graficamente o mundo sensível se
posicionando em relação a si mesmo e aos outros; essa reflexão
sobre sua própria percepção; a busca de controle da natureza
através da invocação do oculto; a escolha de ornar o que poderia ser
apenas utilitário são características que fazem com que o homem
pré-histórico, onde quer que ele tenha existido em termos territoriais,
transcenda de caçador ou xamã e se transforme em artista.

Junto com os portugueses algumas influências renascentistas


Saiba Mais (presentes nas primeiras igrejas) e barrocas chegaram ao novo
4
A Companhia das território. Um imaginário religioso dominou a arquitetura simples, a
Índias Ocidentais,
também conhecida como escultura voltada para a catequese e a pouca pintura. A dominação
Companhia Neerlandesa holandesa, apesar da dinâmica da Companhia das Índias
das Índias Ocidentais,
Ocidentais4 capitaneada no Nordeste por Maurício de Nassau, não
foi uma organização
de caráter privado e deixou maiores influências laicas nesse universo católico. Além disso,
fins mercantilistas que a sua expulsão implicou na devastação da maioria das edificações por
foi responsável pela
ocupação de áreas no eles construídas na antiga Mauriceia, hoje Recife. As poucas obras
nordeste brasileiro. Ela leigas coloniais portuguesas, por sua vez, se limitaram a retratos
tinha como representante
no país o conde Mauricio
de superiores das ordens religiosas que se estabeleceram no Brasil
de Nassau. colônia: beneditinos, jesuítas, carmelitas e franciscanos.

20
A colônia, portanto, nessa fase de sistematização, conheceu poucos
pintores de boa formação artística (laica ou não) com exceção dos
que compunham a equipe de artistas do conde Maurício de Nassau.
Durante seu governo (1637-1644), desenvolveu-se uma maior
atividade no sentido de proporcionar um progresso físico e intelectual
no Nordeste do país. A cidade de Recife (Mauritzland) se transformou,
então, em um dos centros mais cosmopolitas da América do Sul.

Franz Post (1612-1680) (Figura 4), Albert Eckhout (1607/1612-1665)


(Figura 5) e Zacharias Wagner (1614-1688) foram os principais
pintores holandeses membros da equipe do conde e alguns dos
primeiros artistas a trabalhar no Brasil sobre temas não religiosos.
Entretanto, eles trabalharam isolados do resto do país e não
exerceram muita influência sobre o artista local que ficou indiferente
à pintura profana e documentarista e continuou a trabalhar segundo
sua própria tradição artística e iconográfica.

Figura 5. Albert Eckhout.


Mulher Tupinambá com
Criança, 1641-44. Óleo sobre
madeira, 265 x 157 cm Museu
Nacional da Dinamarca.
Domínio Público. Fonte: http://
commons.wikimedia.org/wiki/
File:India_tupi.jpg?uselang=pt
Figura 4. Frans Post. Vista de Itamaracá, Óleo sobre tela, 1637. Domínio Público. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Frans_Post_002.jpg

Segundo Carla Mary da Silva Oliveira (2004, p. 1)

O Barroco Colonial (...) se impõe como temática


instigadora, pois através do seu estudo é
possível chegar à identificação de sutilezas no
imaginário colonial, imaginário este que não
se mostra totalmente nos aspectos econômico
políticos da História, simplesmente por tratar-se
de uma representação mais profunda, também
se revelando naquilo que se relaciona à fé e, por
extensão, ao universo cristão.

Filtrado da matriz português e misturado a elementos das culturas


indígena e africana nos primórdios do processo de colonização
esse barroco inicial se deveu ao clero que se utilizou das imagens

21
(esculturas principalmente e pinturas) para difusão do credo católico.
Obras foram trazidas pelos sacerdotes da Europa referencial até que
os padres e primeiros devotos, índioscatequizados e abrigados nas
missões ou negros recrutados conseguissem uma produção local
(Figura 6).

Essas imagens tornaram-se a essência da propagação da fé e através


dela do controle da metrópole sobre a colônia. Em um momento onde
as florestas e a distância separava o Brasil do resto do mundo a Igreja
tornou-se responsável por manter esse traço de união, esse controle
gerador de uma paz necessária para atender as necessidades do
colonizador.

Dessa forma, vai ser nos núcleos mais ricos da colônia que vai se
Figura. 6. Imagem sacra desenvolver uma arquitetura ainda não rebuscada, uma escultura
brasileira. Século XVII. Autor
desconhecido. Museu de ligada à ideia da catequese e uma pintura ligada aos mesmos
Arte Sacra de Pernambuco. objetivos. Em sua maioria anônima essa produção artística brasileira,
Ricardo André Frantz.
Domínio Público. Fonte: em seus primórdios coloniais, vai, porém, pouco a pouco, evoluindo
http://pt.wikipedia.org/wiki/ para uma adaptação à realidade local e caminhando para a glória
Ficheiro:Maspe-desconhecido.
barroca que vai se manifestar principalmente no século XVIII.
jpg

Revisão
Durante os primeiros trinta anos (1500 a 1530), Portugal não viu qualquer interesse
em colonizar o Brasil. O seu principal objetivo era o lucrativo comércio das especiarias
orientais bem como o do ouro, marfim, sal e escravos. As terras achadas pela coroa
portuguesa foram deixadas ao sabor dos que a exploravam independente de sua origem
apesar das poucas tentativas tomadas em sua defesa.

Entre os anos de 1534 e 1536, o rei de Portugal D. João III dividiu a terra brasileira
em faixas, denominadas de Capitanias Hereditárias, que partiam do litoral até a linha
imaginária do Tratado de Tordesilhas. Com exceção das capitanias de Pernambuco e
São Vicente, todas acabaram fracassando.

Em 1549, o rei de Portugal criou um novo sistema administrativo para o Brasil: o


Governo-Geral que contribuiu para a dinamização da ocupação da colônia. Já no século
XVI encontraremos algumas povoações como Salvador, Olinda, Rio de Janeiro, Igaraçu
e Villa Velha (Itamaracá).

Quando os navegadores europeus chegaram há 500 anos encontraram populações


que viviam há 500 séculos. O encontro dos dois grupos provocou um choque cultural
devastador. Os grupos humanos oriundos da Europa baseavam-se na acumulação
de riquezas enquanto os autóctones viviam em plena economia de coleta e de uma
agricultura de sobrevivência. Essa civilização encontrada pouco influenciou o colonizador
português.

Por outro lado a economia açucareira implantada na colônia gerou o processo de

22
escravização do africano cuja cultura também não pode ser compreendida tomando-se
como referência a organização social, econômica e política ocidental: ela também tinha
código próprio.

Dessa forma a cultura africana- ameríndio- europeia brasileira perpétua, no país, uma
nova gama de valores. Paralelamente às atividades estéticas visíveis nessa sociedade
híbrida produziu-se toda uma permanência cultural (e plástica), principalmente do
sagrado, oculta no seu interior. Isso vai influenciar na adaptação da cultura europeia
colonizadora às condições específicas do nosso território.

Junto com os portugueses algumas influências renascentistas e barrocas chegaram


ao novo território. Um imaginário religioso dominou a arquitetura simples, a escultura
voltada para a catequese e a pouca pintura nesse momento de início do processo de
colonização. A colônia ainda em fase de sistematização conheceu poucos pintores de
boa formação artística laica ou não com exceção dos que compunham a equipe de
artistas do conde Maurício de Nassau que não exerceu maior influência na cultura de
características sacras local.

Filtrado da matriz português e misturado a elementos das culturas indígena e africana


nos primórdios do processo de colonização esse barroco inicial deve-se ao clero que
utilizou as imagens (esculturas e pinturas) para difusão do credo católico.

Vai ser nos núcleos mais ricos da colônia que vai se desenvolver uma arquitetura
ainda não rebuscada, uma escultura ligada à ideia da catequese e uma pintura ligada
aos mesmos objetivos. Em sua maioria anônima essa produção artística brasileira em
seus primórdios coloniais vai porém, pouco a pouco, evoluindo para uma adaptação à
realidade local e caminhando para a glória barroca que vai se manifestar principalmente
no século XVIII.

Atividades Práticas
A partir da imagem ao lado exposta o professor deve convocar os alunos para que
emitam uma opinião própria sobre as influências multiculturais no barroco brasileiro e Pesquise...
dialoguem virtualmente entre si. Eles não necessitam se estender sobre o assunto, mas
Rosto indígena. Pedra
apresentá-lo de forma sintética falando e interagindo sobre o processo de hibridização da calcária, século XVIII,
cultura brasileira e inclusive apresentando imagens capturadas em igrejas visitadas que Arremate do muro do
tenham pontos comuns de hibridismo. A imagem pode ser colocada em um fórum virtual adro, fachada da Igreja de
para debate. São Francisco.

23
24
Capítulo 2

As primeiras
manifestações barrocas

Objetivos
●● Compreender o processo de introdução da linguagem barroca no universo imagético
brasileiro;

●● Observar o papel das ordens religiosas no processo de formação de uma iconografia


barroca;

●● Conhecer o papel do artista artesão no período da introdução do estilo barroco no


território brasileiro.

Sobre a introdução da linguagem


barroca europeia no universo
conquistado brasileiro
Dentro do contexto de um capitalismo mercantil, o Tratado de
Tordesilhas que foi firmado em 1494, aconteceu para limitar a posse
das novas terras descobertas (e gradativamente ocupadas) pelas
nações ibéricas: Espanha e Portugal. O mundo descoberto foi dividido
entre os países católicos causando insatisfação naqueles que ficaram
de fora do rateio.

É necessário que recordemos aqui que a ocupação do continente


americano deu-se a partir e ao longo do litoral atlântico pelos
portugueses, e a partir do Caribe, de noroeste para o sudoeste,
ao longo da costa pacífica, pelos espanhóis bem como que, com a
chegada dos conquistadores, iniciou-se o processo de transformação
(e extinção) de povos, civilizações e culturas estabelecidas
tradicionalmente em todo o continente. Como gafanhotos, eles
chegaram pelo mar em suas naus e com suas cruzes trazendo
consigo o desprezo absoluto pelo desconhecido e ao insólito.

Como já dissemos anteriormente, no Brasil esse processo foi


aparentemente menos cruento. Na América espanhola a dizimação
do nativo foi mais rápida e o sangue correu mais profusamente. O
genocídio cultural, porém, foi o mesmo para os povos que habitavam

25
as terras agora espanholas ou portuguesas.

Nesse processo de apagamento dos códigos culturais autóctones5


Atenção
as populações nativas foram diluídas de várias formas: servidão,
5
Autóctone é aquele ou
aquilo que é natural de miscigenação ou dizimação fizeram parte do processo de substituição
uma região. do código cultural nativo pelo do europeu conquistador. O resultado
Originário do país em que foi à introdução de novos costumes e comportamentos pela espada e
habita e cujos ancestrais
aí sempre habitaram. pela cruz.
Exemplo: os berberes são
populações autóctones da O processo de colonização da América espanhola e da portuguesa
África do Norte. se processou de forma diferente. A situação era diversa também.
Enquanto os nativos brasileiros estavam em uma fase coletora ou de
uma agricultura de sobrevivência, os que viviam nas terras ocupadas
pelos espanhóis faziam parte de civilizações estruturadas. Entretanto,
o modelo de dominação e crueldade não diferiu tanto assim. Não
havia possibilidade de sobrevivência de uma cultura considerada
como inferior pelo europeu. Segundo Darci Ribeiro (1995, p. 53):

De todo o debate, só reluzia, clara como o sol, para


a cúpula real e para a Igreja, a missão salvacionista
que cumpria a cristandade e exercer, a ferro e fogo,
se preciso, para incorporar as novas gentes ao
rebanho do rei e da Igreja. Esse era um mandato
imperativo no plano espiritual. Uma destinação
expressa, uma missão a cargo da Coroa, cujo
direito de avassalar os índios, colonizar e fluir as
riquezas a terra nova decorria do sagrado dever de
salvá-los pela evangelização. (...)

Apesar de o projeto jesuítico de colonização do


Brasil nascente ter sido formulado sem qualquer
escrúpulo humanitário, tal foi a ferocidade da
colonização leiga, que estalou, algumas décadas
depois, um sério conflito entre os padres da
Companhia e os povoadores dos núcleos
agráriomercantis. Para os primeiros, os índios,
então em declínio e ameaçados de extinção,
passaram a ser criaturas de Deus e donos originais
da terra, com direito a sobreviver se abandonassem
suas heresias para se incorporarem ao rebanho
da Igreja, na qualidade de operários da empresa
colonial recolhidos às missões. Para os colonos, os
índios eram um gado humano, cuja natureza, mais
próxima de bicho que de gente, só os recomendava
à escravidão.

O genocídio foi, portanto, a grande bandeira do europeu colonizador

26
ao qual a própria igreja em seus primórdios ocupacionais não se
furtou. Entretanto, posteriormente, a missão da conversão, da
catequese passa a ter prioridade dada a selvageria demonstrada pelo
colono laico naqueles primeiros tempos de ocupação do território.

No que diz respeito ao urbanismo, a ocupação territorial espanhola


baseou-se no modelo urbano renascentista no que diz respeito à
formação de cidades. Ou seja: os planos vinham da metrópole e o
sistema de grelha6 foi utilizado como diretriz urbana. Na América Atenção
portuguesa, com poucas exceções, a ocupação do território 6
Foi no Renascimento
obedeceu a um esquema mais espontâneo tendo, como base, locais que se deu pela primeira
vez uma proposta de
estratégicos para a defesa do território e o uso mais frequente do já reestruturação da ideia
comentado anteriormente sistema radial. vigente de cidade.
Baseada em uma
Além da ocupação laica promovida pelas duas Coroas, também busca de racionalidade
do espaço urbano
chegaram à América diferentes ordens religiosas católicas, num através de uma
período em que a Igreja passava pela Contra-Reforma7 promovida ordenação consciente
a partir do Concílio de Trento. Era necessário reconquistar o rebanho das edificações.
As clarificações
mesmo que este fosse formado por homens sobre os quais se renascentistas obedeciam
discutia a existência de uma alma. Dessa forma, sucessivamente, a uma disposição
de ruas paralelas e
elas – as ordens religiosas – aportaram na América. Inicialmente perpendiculares: o
aqui se instalaram os Jesuítas. Depois foi a vez dos Beneditinos, “sistema de grelha”.
Franciscanos e Carmelitas.

Saiba Mais
7
A Reforma católica ou a Contra-Reforma foi a resposta da Igreja Católica ao
aparecimento de novas religiões. O papado viu o seu poder territorial e influência
diminuírem. Daí a necessidade de uma resposta ser urgente. Só quando o papa Paulo
III assumiu a liderança da Igreja Católica foram criados os meios necessários para iniciar
a contra-reforma e combater as fortes influências protestantes, verificadas sobretudo
nos países do norte. A Contra-Reforma tinha como objetivo principal a reafirmação
do dogma, do culto tradicional e a (re)conversão de fiéis. Para isso vão ser instituidas
reformas internas (elaboradas no Concílio de Trento, em 1545). Essas medidas foram
de ordem repressiva como foi o caso da Inquisição ou de evangelização que tem na
Companhia de Jesus um de seus maiores expoentes.

Destacando-se das demais ordens pelo início e modalidade de suas


atividades em terras brasileiras, os Jesuítas promoveram a construção
de inúmeros colégios, igrejas e povoados, por meio de missões
que foram utilizadas na conquista espiritual dos povos nativos.
A educação marchava junto com a conversão. Sobre o sistema de
catequese adotado no Vice Reino do Peru, por exemplo, em 1567,

27
Ramón Gutiérrez (apud Luiz Antonio Bolcato Custódio, 2004) assim
se posiciona:
Saiba Mais Os jesuítas (...) haviam optado por um tipo de
8
Os ciclos de riqueza
ação evangelizadora que se denominava missão,
do Brasil colônia foram
vários. Inicialmente temos ou seja, um avanço sobre as zonas indígenas não
o ciclo extrativista do Pau catequizadas ou sobre centros urbanos espanhóis,
Brasil que foi explorado onde por certo tempo se pregava e em seguida se
no reinado de D. Manuel
retornava ao colégio ou residência central.
na faixa de terra que
vai do Cabo Frio ao
Rio Grande do Norte. A
O espaço missioneiro se constituiu em um dos primeiros centros
agricultura (que determina de introdução do espírito barroco. Os padres, junto com os índios,
a introdução do barroco criaram obras em um estilo que ficou conhecido como barroco
no Nordeste), simbolizada
principalmente pela missioneiro baseado na importação de modelos europeus trazidos
cana-de-açúcar, foi pelos religiosos.
o ciclo seguinte. A
atividade ocupou o Esse barroco, que depois se espalhou pelos demais centros urbanos
litoral nordestino. Outro
ciclo importante para a provocados pelos vários ciclos de riqueza8 pelos quais passou
consolidação da estética o Brasil colonial, enquanto estilo recebido se constituiu em um
barroca no Brasil foi
a exploração do ouro amálgama de diversas tendências barrocas: portuguesas, francesas,
e pedras preciosas italianas ou espanholas. Europeias, em síntese.
como os diamantes. Ela
aconteceu na região das Incumbidos de catequizar os índios, os sacerdotes utilizaram a
Minas Gerais fundando
cidades ou aldeamentos
linguagem barroca desde a urbanização do espaço físico das
(embriões de cidades) missões, passando por uma arquitetura religiosa inicial que misturava
tais como Ouro Preto e elementos barrocos e renascentistas até a produção das primeiras
Diamantina, por exemplo.
imagens baseadas nas informações importadas da metrópole. Obras
do artesanato português foram trazidas diretamente da Europa e
aqui copiadas pelos próprios sacerdotes até a consolidação de
uma produção local. Essas imagens tornaram-se a essência da
propagação da fé católica. Uma produção que tinha como destino
Pesquise... posterior as igrejas que se multiplicavam em todos os povoados e as
São Paulo. Madeira
policromada e dourada,
moradias coloniais o que abrangia desde as casas dos fazendeiros às
com resplendor de prata. mais humildes moradas de agricultores. As imagens ocupavam todos
os espaços disponíveis para a introdução ou confirmação do credo
católico.

No Nordeste do Brasil com sua economia açucareira, o barroco


surgiu em um contexto econômico, político e social diferente do que
caracterizou o Rio Grande do Sul e suas missões jesuíticas9 e,
posteriormente, do que se derivou do ciclo do ouro nas Minas Gerais.
De certa forma ele se destacou por sua peculiaridade no universo da
conquista, ocupação e dominação portuguesa no litoral nordestino
formando escolas posteriores em seus principais centros. A marca

28
de sua presença nessa região do país, porém, também está unida à
ideia de uma aliança entre a Igreja e o Estado para a dominação do
nativo e controle das populações que aqui se instalavam. Você Sabia?
9
As Missões Jesuíticas
A produção barroca nordestina do período surgiu sob o estigma da no Brasil aproximaram os
coroa espanhola em um momento no qual o domínio do território portugueses da utopia de
integrar os indígenas ao
português (e de suas possessões) estava nas mãos de Felipe II, processo de colonização.
monarca da Espanha. A crise pela qual passou sucessão portuguesa De ensinar (impingir) os
costumes e as crenças
a partir da morte do rei D. Sebastião na batalha de Alcácer-Quibir
europeias o que seria
e que continuou com os fatos posteriores tais como a morte de seu o primeiro passo para
substituto, o cardeal D. Henrique, sem deixar sucessor direto, resultou tornar o país uma efetiva
colônia de Portugal.
na conquista de Portugal por Filipe II, rei da Espanha, em 1580. Elas foram também
chamadas de reduções.
Se nos primeiros tempos o crescimento dos núcleos urbanos no Eram aldeamentos
Nordeste teve como empecilho os constantes conflitos com os índios indígenas organizados
espacialmente e
que habitavam a região, pouco depois da paz firmada com os nativos, hierarquicamente.
esses núcleos entraram em processo de desenvolvimento e tiveram Administrados pelos
jesuítas como parte
sua participação efetiva na economia colonial. Os templos povoaram
de sua obra de cunho
essas comunidades em desenvolvimento. Sobre eles nos fala o civilizador através da
holandês Elias Herckmans (1639, apud Carla Mary Oliveira, 2004, p. catequese. Os nativos
eram organizados em
49) em plena ocupação holandesa do Nordeste brasileiro: povoados com milhares
de indivíduos. Uma
A cidade Frederica está situada ao comprido Missão dispunha de uma
sobre a eminência do monte que fica defronte da completa infraestrutura
Baia do Varadouro. Contam-se nela seis igrejas e administrativa, econômica
e cultural que funcionava
conventos que são os seguintes. O convento de
num regime comunitário,
São Francisco é o maior e mais belo (...) onde os nativos eram
educados na fé cristã e
Segue-se o convento dos Carmelitas, cujos frades em moldes europeus.
se tem conservado neles até o presente (...). O
convento não esta todo acabado, porque somente
há poucos anos que este lugar é cidade, e em
grande parte faltam-lhe os meios.

O mesmo se da com o convento de São Bento.


Quando os Neerlandeses o ocuparam estavam
levantadas as suas paredes, mas não tinha coberta
e muito menos se achava interiormente construído
(...)

Além desses três conventos há nessa cidade três


igrejas, a principal das quais é a matriz. É uma obra
que promete ser grandiosa, mas até o presente
não foi acabada, e assim continua arruinando cada
vez mais de dia em dia (...)

De acordo com essa descrição do governador holandês da então

29
Frederica10 a paisagem arquitetônica de um núcleo urbano nordestino
estava dominada pelas igrejas que se constituíam na principal
Você Sabia? expressão arquitetônica. A arquitetura laica, por sua vez bem modesta
10
A Paraíba foi a última naquele momento, tem uma estrutura de paredes laterais que segundo
cidade a ser conquistada
Gaspar Barleus (1647:72-73 apud Cara Mary da Silva Oliveira, 1999)
pelos holandeses, três
anos após a conquista “são formadas de varas rebocadas sem capricho nem elegância”.
do Recife. Foram três É, portanto, nas construções religiosas e em seu imaginário que se
tentativas frustradas
dos holandeses para instala a estética barroca trazida de Portugal. É importante também
conquistar a Paraíba. lembrar que a completa ausência de uma tradição local juntamente
Após a conquista
holandesa a então
com a presença de engenheiros militares11 portugueses atuando
Filipeia de Nossa nesses primórdios coloniais propiciou uma arquitetura de raízes
senhora das Neves geométricas herdeira das igrejas de Portugal.
recebeu a denominação
de Frederica que foi
Vemos, portanto, que o barroco se solidificou no Brasil algum tempo
dada em homenagem
ao príncipe Frederico da depois da presença colonizadora no território brasileiro, quando a
casa de Orange. população já se multiplicava e já se iniciava um processo cultural
autóctone, quando os residentes naquele espaço recém-ocupado
lutavam para estabelecer uma economia autossustentável. O
Barroco nasceu, pois, num terreno de luta pela posse da terra e pela
Você Sabia? implantação da fé católica.
11
Os responsáveis pelos
projetos arquitetônicos Estilo formado por uma complexa teia de influências europeias e
(“riscos”) da colônia locais ele se desenvolveu na colônia em um espaço social, econômico
ficaram, em grande
parte, no anonimato,
e político e com objetivos completamente diversos daquele que
até mesmo no caso lhe deu origem na Europa. No Brasil o ambiente era de pobreza e
de alguns grandes escassez. Um contexto oposto ao europeu. Sua linguagem no novo
conventos e igrejas. Entre
os autores conhecidos ambiente, portanto adaptou-se, fugiu do estilo erudito e branco,
há religiosos e muitos tornando-se híbrido, impuro12 e, principalmente, primitivo apesar de
engenheiros-militares,
estes últimos com sólidos todo o material precioso empregado em sua fase (posterior) gloriosa.
conhecimentos teóricos Essa linguagem, além de ser importada através de imagens, chegou
de arquitetura. Foram
inspirada nas gravuras de missais e Bíblias. No que diz respeito à rara
mais de duas centenas
de engenheiros militares temática laica ela quase sempre se limitou aos retratos das figuras de
presentes no Brasil destaque das ordens religiosas.
entre os séculos XVI e
primeiras décadas do
Por outro lado, os religiosos em plena atividade naquele momento
XIX. Sua multifacetada
formação permitiu que em território brasileiro eram oriundos de diversos locais da Europa
eles atuassem em e, muitas vezes, tinham exercido sua profissão em diversos países
campos diversos como
a arquitetura militar, civil do império português no Oriente. Isso explica que a mestiçagem
e religiosa, em obras barroca brasileira se processe incluindo, além das influências locais,
públicas de infraestrutura
africanas e europeias, elementos de origem oriental que encontramos
(cais, pontes, calçadas,
portos, obras hidráulicas) ocasionalmente em suas decorações (Figura 7).
e no mapeamento do
território.

30
Figura 7. Leão de Fo. Pedra. Adro do Convento de Santo Antônio. João Pessoa. Paraíba.

Sobre as ordens religiosas e seu papel Atenção


na formação do barroco brasileiro 12
A palavra impura
no texto refere-se ao
abandono de uma
Os Jesuítas linguagem “pura”
europeia e a agregação
A Igreja católica, como já foi dito anteriormente, exerceu um papel de influências variadas na
importante na introdução da estética barroca no Brasil. Principalmente estética barroca colonial.
durante o decorrer dos séculos XVII e XVIII. As diversas ordens
religiosas (beneditinos, carmelitas, franciscanos e jesuítas) que se
instalam no Brasil desenvolveram uma arquitetura religiosa sóbria
inicialmente e, posteriormente, monumental. Construções iniciais Saiba Mais
com fachadas e plantas retilíneas de grande simplicidade ornamental. 13
Em 27 de Setembro
Uma pintura, uma arquitetura e uma rica e elaborada talha que se de 1540, o Papa Paulo
III, aprova a constituição
uniram para formar a cenografia necessária para implantar (ou da nova Ordem também
manter) o catolicismo bem como para exercer o controle daqueles que denominada Companhia
de Jesus, então
habitavam ou se mudavam para as novas terras portuguesas. Nessas
contando apenas 10
construções cenográficas a perspectiva do céu fazia esquecer as membros. A Companhia
provações do dia a dia. de Jesus surgiu com o
objetivo missionário de
espalhar a fé cristã, não
A Companhia de Jesus13, criada em 1534, por Inácio de Loyola,
estando então previsto
surgiu no contexto da Contra-Reforma e com o objetivo de consolidar que fosse uma ordem
e ampliar a fé católica utilizando como veículo a catequese e a religiosa especialmente
consagrada ao ensino. A
educação que podia ser traduzida como a imposição de conceitos e evangelização dos índios,
ideias ocidentais. habitantes das terras
que haviam acabado
Os jesuítas chegaram ao Brasil em 1549, na expedição de Tomé de serem descobertas,
era a tarefa ou missão
de Souza, tendo como seu superior o Padre Manuel da Nóbrega. principal dos Jesuítas,
Desembarcaram na Bahia, onde ajudaram na fundação da cidade de cuja atividade era intensa
no combate contra o
Salvador. Com o segundo Governador Geral Duarte da Costa (1553),
movimento protestante.
chegou o jovem padre José de Anchieta que se destacou por ter

31
aprendido a língua dos índios, da qual escreveu a primeira gramática
e dicionário. Compreender para dominar parece ter sido a tônica
utilizada pelos discípulos de Loyola.

A ação catequista dos jesuítas gerou conflito com os colonos, que


queriam escravizar os índios para servirem nas plantações de cana-
de-açúcar. A ideia das missões congregando um grande contingente
Atenção de catecúmenos14 índios atraia a cobiça dos colonos. Afinal era
14
Catecúmeno é aquele uma mão de obra, dentro do olhar europeu colonial, desperdiçada. A
que se prepara para Companhia de Jesus, por sua vez, não tinha exatamente intenções de
receber o batismo.
caráter humanitário. A proposta era mais de domínio cultural e, através
disso, facilitar o poder do Estado que, aliado à Igreja, se encarregava
da colonização e do seu controle. A catequização do índio fortaleceu
e incentivou a escravidão negra, pelo tráfico negreiro.

No que diz respeito às artes visuais a reprodução e propagação de


imagens sacras tornou-se a grande atividade nos espaços daqueles
religiosos. Segundo Pietro Maria Bardi (1989, p. 14):

O que mais se queria era o aspecto das figuras


sendo tolerado, aliás, incentivado, o ornamento
próprio do Barroco (...) Os executores desse
Barroco foram em parte importados pelas Ordens,
mas a maioria deles, especialmente a mão de obra
criada aqui. (...)

Assim, a reprodução do imaginário europeu foi à tônica do processo


Atenção iconográfico15 brasileiro inicial. Os nativos e africanos repetiam o
15
A palavra iconografia modelo estabelecido sem reflexão. Entretanto, os jesuítas não proibiam
vem do grego eikon a fantasia desde que ela não afastasse o artesão de seu significado
(imagem) e graphia
(escrita), ou seja, original. O aceitar e continuar o estilo tenderia a estabelecer mais um
literalmente: “escrita da processo artesanal do que a uma criação artística tornando difícil se
imagem”. Iconográfico,
descobrir valores individuais no resultado final. A incorporação da
portanto, remete ao
imaginário descrito. realidade local e do caráter mestiço da mão de obra local no resultado
final vai ser o tema de nosso próximo capítulo que refletirá sobre um
barroco que chamaremos de tropical e em que medida esse processo
de hibridismo o torna único e, portanto, uma criação artística.

A arquitetura jesuíta representa as primeiras construções brasileiras


de caráter mais planejado. Os religiosos se entregavam a uma grande
diversidade de ações construtivas: faziam aquedutos, pontes e
Pesquise... edificações em geral. Os aldeamentos das missões se destacam por
Aldeamento Jesuíta. sua formação retangular e o alinhamento de suas construções: capela,
Esquema. residências e oficinas. O terreiro é palco de danças e representações

32
que atuava como meio de divulgação da nova fé.

À ação de transformação do pensamento indígena se juntou, por


vezes, a certa ambiguidade no que diz respeito à possibilidade de
uma dupla lealdade que se dividiria entre a defesa dos índios e os
interesses da Coroa. Entretanto, eles (os jesuítas em particular e as
ordens religiosas que migraram para o Brasil no geral) no final das
contas estavam mais predispostos a servir ao Estado português
contra os nativos, principalmente os menos acomodados, do que a
defendê-los. Isso ocorreu, sobretudo, no primeiro século, quando a
função principal da companhia foi minar as bases da cultura nativa e
sua lealdade racial fazendo com que eles se desgarrassem das tribos
e se atrelassem às missões. Nesse aspecto eles foram extremamente
eficazes e a alienação provocada muito contribuiu para a consequente
dizimação.

Os Franciscanos
Em relação aos religiosos da ordem de São Francisco, os franciscanos,
eles se fizeram presentes no Brasil desde o momento em que os
portugueses aportaram nessa nova área colonial. Podemos lembrar
que o nosso antigo conhecido dos livros de História do Brasil, Frei
Henrique de Coimbra, aquele que celebrou a primeira missa em solo
brasileiro, legitimando a posse do novo território lusitano, pertencia a
essa ordem. Eles vinham com o mesmo objetivo dos Jesuítas: iniciar
um trabalho de catequese junto aos aborígines. Consta que, outros
irmãos da ordem, liderados por Frei Melchior de Santa Catarina
desembarcou em Olinda no dia 12 de abril de 1585, acompanhado
por sete irmãos franciscanos. Eram eles: Frei Francisco de São
Boaventura, Frei Francisco dos Santos, Frei Affonso de Santa Maria,
Frei Manuel da Cruz, Frei Antônio dos Martyres, Frei Antônio da Ilha e
Frei Francisco da Cruz.

Entretanto, apesar dessa precocidade em terras brasileiras, os


franciscanos não se estabeleceram naquele momento como uma
ordem não tendo no território missões fixas e organizadas antes de
1585 quando a “missão” franciscana aqui aportou oficialmente. A
metodologia de doutrinação dos frades franciscanos era considerada
menos rígida e, talvez por esse fato, ele provocasse certa rivalidade
com a ordem jesuíta.

Os franciscanos atuaram no litoral do atual Nordeste (do Rio Grande


do Norte a Alagoas), na Amazônia e no Sudeste. Nas regiões onde

33
havia engenhos de açúcar, esses missionários aliaram- se aos
proprietários de terras e fundaram capelas nas fazendas (Figura
8). A ordem não condenava a exploração da mão de obra africana
ou indígena apesar de seus princípios de desprendimento de bens
materiais.

Atenção
17
A Galilé é um espaço
de uma construção
religiosa católica situada
na entrada do prédio/
templo e coberto. Ela se
destinava a abrigar os
catecúmenos ou pessoas
impedidas de entrar no Figura 8. Frans Post. Engenho com capela. Óleo sobre tela. 1667. Domínio Público. Fonte:
espaço sagrado. No http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Engenho_com_capela.jpg
interior do Brasil o espaço
se destina a abrigar fiéis
A arquitetura franciscana no Brasil, que se desenvolveu principalmente
que vêm de muito longe
(na região rural) e aí no litoral nordestino durante o período, é considerada como a primeira
esperam que o padre manifestação de uma arquitetura mais brasileira. Os franciscanos
abra o espaço religioso
para oficiar a missa. adotaram soluções interessantes adaptando elementos renascentistas
às condições tropicais. E utilizando materiais e soluções adequadas
às circunstâncias regionais.

A adequação espacial ao clima e à topografia dos núcleos urbanos,


portanto, representa uma característica constante que encontramos
nos conventos e igrejas da ordem. Outras se fazem notar, tais
como: o uso de claustros, a igreja mais alta em relação ao conjunto
arquitetônico, uma cruz em um adro16 sempre presente em frente às
construções; o alpendre que descrimina os catecúmenos e aqueles
que não podiam entrar no espaço religioso (Galilé17) além da utilização
de material próprio da região como colocamos anteriormente (Figura
9).

34
Atenção
18
Uma alegoria é uma
imagem literária ou visual
que possui um sentido
oculto que é representado
através de enredos,
personagens e de
determinadas situações.
Normalmente têm um
sentido simbólico.
Figura 9. Imagem de uma galilé.

Esses conjuntos arquitetônicos franciscanos são semelhantes


em todo o Brasil repetindo soluções. Em seu interior e exterior as
alegorias18 pintadas ou em azulejaria repetem cenas da paixão
ou de santos ligados à ordem. Nos forros das edificações pinturas
Atenção
em trompe l’oeil19, profusamente coloridas, são também plenas de
19
Trompe l’œil é uma
terminologia francesa
significados (Figura 10). para designar uma
pintura que dá a ilusão
de uma realidade. No
Barroco (inclusive no
brasileiro) esse recurso
foi muito usado nos tetos
das igrejas para dar a
sensação ao fiel de que
dentro daquele recinto
sagrado ele estaria mais
perto do céu que se
descortinava no forro do
espaço arquitetônico.

Atenção
Figura 10. Manuel da Costa Ataíde. Igreja de São Francisco de Assis, Teto. Exemplo de 16
Um adro é o nome
pintura em trome L´oeil. Domínio Público. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Ataide-teto. pelo qual é conhecida,
jpg arquitetonicamente,
uma área externa
Dentro de um contexto geral de anonimato a autoria de algumas de uma construção
religiosa: uma igreja
pinturas e imagens começa a ser cada vez mais discutida pelos católica. Os franciscanos
historiadores que nem sempre estão de acordo entre eles. Por caracterizaram sua
arquitetura pela presença
exemplo: no que diz respeito ao convento de Santo Antonio em João do adro que tecnicamente
Pessoa, Paraíba de acordo com Carla Mary da Silva Oliveira (2006): separa o espaço profano
do sagrado e onde
A gigantesca pintura de 312 metros quadrados geralmente é postado.
no forro da nave principal da Igreja do Convento
de Santo Antônio da Paraíba motiva, há pouco

35
mais de cinquenta anos, disputas e refregas entre
especialistas quanto à sua autoria: o Cônego
Florentino Barbosa, primeiro paraibano a estudar o
Barroco local de forma sistemática, acreditava ser
o bracarense José Soares de Araújo o seu artífice;
José Luiz da Motta Menezes, Carlos Ott e Antonio
Luiz D’Araújo afirmaram ter sido José Joaquim da
Rocha, personagem fulcral e fundador da Escola
Baiana de Pintura do século XVIII, o autor do teto;
já Octacílio Nóbrega de Queiroz lançou a hipótese
de o forro ter sido ornado, na verdade, por José
Teófilo de Jesus, discípulo e protegido de Rocha
que entre 1794 e 1801 (ou 1807) estudou em
Lisboa e Roma às expensas do seu mestre. (...)
(Figura 11).

Figura 11. Pintura do forro da nave da Igreja do Convento de Santo Antônio. João Pessoa.
Paraíba. Domínio Público. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Convento_Franciscano_
Santo_Antonio.2_045.jpg

É, portanto, dentro desse contexto de anonimato, onde até hoje se


discute uma autoria provável, que trabalhou a ordem franciscana em
suas atividades artísticas coloniais. No Nordeste do Brasil os seus
conjuntos arquitetônicos destacam-se na paisagem das cidades.

Os Beneditinos
Os beneditinos, por sua vez, se constituíam em uma ordem
antiquíssima e erudita. Ela (a ordem) foi fundada por S. Bento, nascido
em Núrsia, Itália, no ano de 480. O seu primeiro convento foi erguido
no Monte Cassino, no ano de 529. A ordem era uma das mais bem-
sucedidas financeiramente e estabeleceu-se definitivamente no Brasil
em 1581, quando a Abadia de São Sebastião, da cidade de Salvador,
foi fundada pelo frei português Antônio Ventura. Os beneditinos

36
dedicavam-se principalmente à vida contemplativa.

Como se processou a inserção de uma ordem ascética no contexto


colonial brasileiro? A decisão de enviar esses religiosos às
possessões portuguesas de ultramar foi tomada atendendo aos
pedidos da coroa lusitana. Dessa forma, vinculados ao trono, como de
resto seus colegas de outras ordens, os religiosos eram remunerados
pelo Tesouro Régio. Assim, eles justificavam ideologicamente a
colonização, ao mesmo tempo em que pretendiam imprimir na
população colonial normas de conduta cristã. Gerida pela Coroa, a
Igreja passou a atuar como um braço da colonização. Desta forma, o
Império português contava com duas formas de dominação: a política
e a religiosa.

A atuação dos beneditinos no Brasil, como de resto a de todas as


ordens religiosas que aqui aportaram nesse período, contribuiu para
a ocupação do território, a pacificação e a inserção do indígena no
regime imposto, o atendimento aos colonos e a fundamentação
teórica de dominação para a colonização.

A partir da primeira fundação, houve um rápido desenvolvimento dos


mosteiros beneditinos no Brasil. Em 1584, o Mosteiro de Salvador
(Figura 12) foi incorporado a Congregação e elevado à abadia. Em
1586, um segundo mosteiro foi constituído, agora em Olinda. Outras
quatro casas foram se constituindo entre fins da década de 1580 e
início de 1590. São elas: as do Rio de Janeiro, São Paulo, Ilhéus e
do Espírito Santo. As casas beneditinas no Brasil se localizavam no
litoral o que demarca sua área de influência e atuação.

Figura 12. Mosteiro de São Bento. Salvador. Agecom Bahia. Domínio Público. Fonte: http://
pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Dia_de_S%C3%A3o_Bento_no_Mosteiro_de_S%C3%A3o_Bento,_
Salvador.jpg

Os monges beneditinos eram criteriosos na escolha dos seus artistas.

37
Em geral, a Ordem Beneditina, sendo douta, empregava arquitetos
e artistas integrantes de seus próprios mosteiros, que mantinham
verdadeiras oficinas de arte. (Zaccara, 2012, p. 8) O Brasil deve
alguns de seus mais belos conjuntos arquitetônicos aos beneditinos.
Os monges sempre revelaram muito critério na escolha de seus
arquitetos, tradição que trouxeram de Portugal.

Os Carmelitas
Os Carmelitas, juntamente com as três ordens já citadas, contribuíram
também para a introdução do vocabulário barroco no contexto
colonial brasileiro. A vinda dos religiosos carmelitas para a colônia
tem a ver, em seus primórdios, com o pedido feito pelo cardeal D.
Henrique, no ano de 1579, aos frades do Carmo lusitano, a fim de que
esses religiosos acompanhassem uma expedição para a povoação
da Paraíba. Naquele momento, além da preocupação do Estado
português em povoar sua nova colônia, existia um grande interesse
dos colonizadores na propagação da fé católica e na conversão
dos indígenas ao cristianismo. Daí a importância da presença dos
carmelitas na expedição. Enfim: os mesmos objetivos das demais
ordens religiosas.

Figura 13. Convento de Nossa Senhora do Carmo. Olinda. Pernambuco. Delma Paz.
Domínio Público. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Olinda-ConventoNSNeves1.jpg

Foi apenas no ano de 1588 que ocorreu a fundação do convento


carmelita da vila de Olinda (Figura 13). Deste templo, saíram os
primeiros missionários da ordem para cristianizar os silvícolas de
vários locais do Brasil onde ergueram outros templos. Os séculos XVII
e XVIII se constituíram na época de maior crescimento da Ordem.
Os religiosos se fixaram nas principais regiões econômicas do Brasil,
onde a população mais abastada concedia esmolas e doações para

38
sua manutenção e sustento. Gradativamente, a Ordem Carmelita
foi construindo um grande patrimônio composto por casas, templos
religiosos, fazendas e engenhos tornando – se assim parcialmente Atenção
independentes do Estado português. Esse fato, porém, não alterou os 20
Um cânone é um
conjunto de regras
propósitos da ordem que não eram dessemelhantes aos das outras
ou modelos que são
três. estabelecidos sobre um
determinado assunto,
principalmente no que diz
respeito às artes visuais.
Sobre o artista/artesão no universo
da produção de espaços e imagens no
Brasil colonial
Refletindo sobre a condição do artista/artesão que não estava ligado Pesquise...
diretamente às ordens religiosas verificamos que, de uma forma São Francisco recebendo
geral, ele costumava ser autodidata ou então era orientado pelos a Estigma (chagas),
século XVII. Anônimo.
religiosos, nos moldes da tradição ibérica. O Barroco originou uma
vasta produção de imagens sacras, disseminadas por todo o litoral
e em algumas regiões do interior do Brasil. Parte integral da prática
religiosa, a estatuária devocional encontrava espaço tanto no templo
como no domicílio privado. Artesãos influenciados pelo barroco
europeu faziam santos, objetos e móveis sacros e operavam muitas Atenção
vezes reproduzindo o sistema das Guildas medievais. 21
Uma tábua votiva é um
recurso de origem popular
A produção de imagens muitas vezes obedecia à cópia de modelos de para agradecer um
livros sacros ou a esquemas consagrados por uma tradição anônima. milagre recebido do santo
de devoção. Elas se
O artífice, depois de algum tempo, procurava reproduzir os tmétodos destacam do ex-voto por
de representação utilizados em outras imagens já consagradas pelo conterem texto e imagem
no mesmo espaço.
costume. Nesse caso a linguagem barroca nos chega remotamente
uma vez que essa tradição (que se tornou popular) muitas vezes
aconteceu à margem dos cânones20 estabelecidos associados a uma
escola ou estilo, no caso o Barroco.

Estabelecendo um paralelo entre a produção artística de Portugal e a Atenção


do Brasil durante o período colonial e tomando por base as análises 22
Naif, no texto, diz
sobre o estatuto do artista no mundo colonial, pode-se afirmar que respeito à uma produção
poucos eram aqueles que se dedicavam a grandes trabalhos de artística cujo autor não
teve qualquer preparo
pintura. Para a grande maioria dos artífices o mercado de trabalho acadêmico e, portanto,
estava ligado à confecção de pequenas imagens de santos ou apresenta um resultado
onde falta elementos
de tábuas votivas21. Esses trabalhos ofereciam a possibilidade presentes na produção de
de sobrevivência com atividades que aconteciam em paralelo à artistas eruditos.
construção das igrejas e mosteiros.

É esse elemento popular e inculto, tantas vezes naif22 que foi o

39
responsável por boa parte da produção colonial, já que os artistas
com preparo sólido eram poucos e os artesãos autodidatas ou com
pouco estudo eram a grande maioria dos criadores. Pelo menos nos
primeiros dois séculos de colonização. Segundo Pietro Maria Bardi
(1989, p. 17): “geralmente se classifica toda essa escultura de madeira
no anonimato do artesanato, a arte da produção sem autor, confiadas
a mestres aperfeiçoados num setor, permanentemente hábeis num
mesmo serviço.“

O resultado do cruzamento da produção das ordens , dos artífices


anônimos e da mão de obra indígena e africana requisitadas vai
gerar o hibridismo instigante e particular do barroco colonial brasileiro
onde elementos estilísticos importados juntam-se à tradições culturais
adaptadas gerando o efeito cenográfico dessas construções sacras
que representam e consolidam o poder da Igreja aliado ao Estado. A
pintura e a escultura resultante dessa mestiçagem estilística e social
vão ser elementos fundamentais para a obtenção do efeito pretendido.

Para a obtenção de uma leitura mais fácil por parte do público alvo
esses produtores, em sua maior parte, anônimos e silenciosos
trabalharam em alguns temas principais: o Antigo Testamento com
os seus personagens e patriarcas hebreus; o Novo Testamento
centralizado no Cristo e em sua doutrina de salvação; a iconografia
das autoridades da Igreja, dos mártires, santos e santas e por
fim o tema ligado para o imaginário da mãe de Jesus (Figura 14).
Ainda segundo Bardi (1989, p. 22): “a variedade das obras reproduz
as figuras repetindo constantemente os esquemas convencionais,
notando-se raramente interpretações individualistas”. Ou seja: poucos
artistas marcaram a produção barroca colonial introduzindo um estilo
pessoal.

A influência da religião católica na colônia, que permaneceu hermética


em relação a outros credos, proporcionou o controle estatal e clerical
no melhor estilo da Idade Média. Enquanto os artistas holandeses da
corte de Mauricio de Nassau em Pernambuco realizavam notáveis
documentos da terra e da gente local através da técnica requintada
e minuciosa do Barroco próprio dos países baixos tornando-se
os realizadores das primeiras e grandes obras profanas da pintura
brasileira, os humildes artesãos, lusos e nativos, continuaram a
reproduzir o imaginário católico. O pensamento livre e laico não
deveria florescer na colônia e o mais humilde santeiro contribuiu para
isso.

40
Figura 14. Nossa Senhora e o Bendito Fruto, João de Deus e Sepúlveda, têmpera sobre
madeira, c. 1777; Medalhão secundário, forro da nave, Igreja de Nossa Senhora da
Conceição dos Militares, Recife, Pernambuco. Domínio Público. Fonte: http://commons.
wikimedia.org/wiki/File:Sepulveda-NossaSenhoraEOBenditoFruto.jpg?uselang=pt

Personagens que aparecem no capítulo


●● Tomé de Souza foi o primeiro governador do Brasil. Nasceu em
1515, na cidade de Rates, Portugal, e faleceu no mesmo país em
29 de janeiro de 1579. Foi designado primeiro governador-geral do
Brasil em 1549.

●● O padre Manuel da Nóbrega, missionário jesuíta, Nasceu em


Portugal em 1517. Fez os estudos em Salamanca e em Coimbra.
Ingressou na Companhia de Jesus. Em 1549 veio para o Brasil
na expedição de Tomé de Sousa. Ele participou da fundação das
cidades de Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo e, enquanto
escritor deixou duas obras: Cartas do Brasil e Diálogo da
Conversão do Gentio.

●● José de Anchieta nasceu nas Ilhas Canárias, colônia de Portugal,


em 1534. Chegado à colônia em 1553 com a Companhia de Jesus.
O chamado “Apóstolo do Brasil” foi o primeiro intelectual a atuar no
país. Em tupi, português, espanhol e latim, ele escreveu poemas
líricos, dramas, cartas sobre filologia, além de ter sido o primeiro
e maior educador religioso europeu a catequizar os índios em sua
própria terra natal, o que também lhe deu o título de “Patrono dos
Professores”.

●● Frei Henrique de Coimbra foi um missionário franciscano

41
conhecido no Brasil por ter vindo na frota de Cabral e celebrado
a primeira missa na então Terra de Vera Cruz, posteriormente
chamada Brasil. Ele nasceu em Coimbra, Portugal, em 1645 e
faleceu em Olivença em 1532.

Revisão
A ocupação colonial do continente americano deu-se a partir e ao longo do litoral
Atlântico pelos portugueses, e a partir do Caribe, de noroeste para o sudoeste, ao longo
da costa pacífica, pelos espanhóis. Na América portuguesa, com poucas exceções,
essa ocupação territorial obedeceu a um esquema mais espontâneo tendo, como base,
locais estratégicos para a defesa do território. Na América espanhola os modelos vinham
prontos da metrópole obedecendo aos traçados “em grelha” que eram próprios da
Renascença.

Além da ocupação laica promovida pelas duas Coroas, também chegaram à América
diferentes ordens religiosas católicas, num período em que a Igreja passava pela Contra-
Reforma e que, portanto, necessitava de novos fiéis. Dessa forma, sucessivamente, elas
aportaram na América. Inicialmente aqui se instalaram os Jesuítas. Depois foi a vez dos
Beneditinos, Franciscanos e Carmelitas. O objetivo era a catequese e a dominação. Os
religiosos contribuíram para isso. A servidão, a miscigenação ou a dizimação fizeram
parte da substituição do código cultural nativo pelo europeu conquistador. O resultado foi
a introdução de novos costumes e comportamentos.

A reprodução do imaginário europeu foi a tônica do processo iconográfico barroco


brasileiro inicial. Os nativos e africanos repetiam o modelo estabelecido sem reflexão.
A produção de imagens muitas vezes obedecia à cópia de modelos de livros sacros ou
a esquemas consagrados por uma tradição anônima. O artífice procurava reproduzir os
métodos de representação utilizados em outras imagens já consagradas pelo costume.
Entretanto, após tempo e exercício, esse mesmo artesão vai introduzir elementos de
seu entorno e de sua cultura. Dessa forma, a mera cópia passa a ganhar um status
criativo. O resultado desse cruzamento de linguagens dos artífices anônimos , da mão
de obra indígena e africana requisitadas, vai gerar o hibridismo instigante e particular do
barroco colonial brasileiro onde elementos estilísticos importados juntam-se à tradições
culturais adaptadas gerando uma nova forma de expressão, original, que vai caracterizar
o barroco feito nas américas.

Estabelecendo um paralelo entre a produção artística de Portugal e a do Brasil durante


o período colonial e tomando por base as análises sobre o estatuto do artista no mundo
colonial, pode-se afirmar que poucos eram aqueles que se dedicavam a grandes
trabalhos de pintura ou escultura. Para a grande maioria dos artífices o mercado de
trabalho estava ligado à confecção de pequenas imagens de santos ou tábuas votivas
que ofereciam a possibilidade de sobrevivência com atividades que aconteciam em
paralelo à construção das igrejas e mosteiros.

Esse artesão popular e inculto, tantas vezes naif, foi o responsável por boa parte da
produção colonial, já que os artistas com preparo sólido eram poucos. Dessa forma, é
graças a esse artesão anônimo que nos chega o espírito de sua época: o retrato de um
mundo onde o processo de mestiçagem está em plena efervescência.

42
Atividades Práticas
O professor deve pedir ao aluno que faça uma pesquisa procurando imagens de
características populares e anônimas envolvendo pintura ou escultura. Deve-se
determinar o número de imagens. Sugiro que duas são suficientes. Após essa ação o
aluno deverá justificar sua escolha discorrendo sobre elas e colocando o máximo de
informações encontradas em sua pesquisa. Essa atividade pode ser pedida através de
fórum onde seria colocada a imagem matriz e as demais localizadas.

43
44
Capítulo 3

O Barroco Tropicalista

Objetivos
●● Compreender o processo de mestiçagem;

●● Observar seus reflexos na cultura brasileira;

●● Visualizar a introdução de elementos híbridos na linguagem barroca desenvolvida


neste momento estudado no universo imagético brasileiro;

●● Considerar as diferenças em relação ao modelo original importado da Europa


referencial.

Sobre o processo de mestiçagem e a


produção de uma estética
Inicialmente vamos pensar um pouco sobre o que vem a ser
mestiçagem. O que seria? O que caracterizaria um processo de
mistura de vários referenciais culturais dentro de um mesmo espaço
físico e temporal? Várias são as teorias a respeito. Podemos refletir
sobre algumas? Como ele se processaria?

Segundo Marc Jimenez (2007, p. 36) uma estética de mestiçagem


é “uma estética fundada sobre o reconhecimento das identidades,
dos particularismos culturais e das diferenças, a fim de melhor fundi-
los em uma síntese”. Ou seja: um resultado de informações culturais
diversas que se cruzaram em um mesmo espaço social gerando uma
cultura híbrida e que não implicaria na superioridade de nenhuma.

Considerando sobre mestiçagem Icleia Borsa Cattani (2007, p. 37) Saiba Mais
assim se posiciona colocando que: “Uma estética da mestiçagem (...) 23
Alteridade é um
é uma estética fundada sobre o reconhecimento das identidades, dos conceito/estado que
parte da premissa de
particularismos culturais e das diferenças, a fim de melhor fundi-los que o homem existe a
em uma síntese original e inédita”. Ou seja: essa síntese pode ser partir da ideia do outro
e dele depende. A partir
gerada a partir de interações entre várias influências de uma obra
da admissão do outro é
única, um momento único, importante e original. possível admitir o coletivo,
o mundo tendo como
Já para outros teóricos essa proposta cai no universo da ficção. A embasamento um olhar
diferenciado da visão
mestiçagem acarretaria uma perda de identidade e uma negação da
unilateral de si mesmo.
alteridade23. Desta forma, mestiçagem cultural seria o estabelecimento

45
de elementos vindos de zonas diferentes, heterogêneos uns em
relação aos outros e cujo resultado é sempre (ou resulta sempre)
uma tentativa de dominação por parte da cultura hegemônica24,
que não necessariamente é a mais interessante ou mais forte, mas a
que possui armas - inclusive econômicas - de maior poder de fogo e
destruição.

Para Roger Toumson, por exemplo, (1998 apud Dominique Berthet,


2007) uma das funções da mestiçagem seria “borrar a lembrança”.
Ou seja: diluir o código cultural dos povos não hegemônicos que se
misturam transformando-o em qualquer coisa amorfa que responda a
uma orientação do dominador. O esquecimento de sua própria cultura
implica em uma aceitação mais rápida do colonizador.

Mistura de seres humanos de origem diversa (indígenas, europeus e

Saiba Mais africanos), o Brasil colonial traz em seu DNA esse universo mestiço
onde o código branco (hegemônico) prevaleceu como parâmetro a ser
24
Uma cultura
hegemônica é aquela seguido pelas demais raças participantes desse exemplo de cultura
que se sobrepõe as mestiça. Essa realidade brasileira, posteriormente, serviu inclusive
demais culturas no
tempo ou no espaço de motivo para a alegação da impossibilidade de construção de uma
baseada na supremacia nação civilizada a partir de uma população fartamente mestiça, com
econômica e militar ou em
presença preponderante do negro em sua composição. Uma nação
sua própria capacidade
de sobrevivência por bárbara e, portanto, inferior a partir da inexistência de uma “pureza”
apresentar um grau de racial. No processo de afirmação da cultura brasileira essa ressalva
desenvolvimento mais
pronunciado. vai estar presente inclusive na elaboração de seu imaginário. Mas
isso é assunto para os próximos volumes nos quais abordaremos
o segundo reinado e sua tentativa de criar uma imagem branca e,
portanto “civilizada” do país.

Essa visão começou a mudar a partir da década de trinta do século


XX com o surgimento, em 1933, da obra Casa Grande e Senzala
do escritor pernambucano Gilberto Freyre. O livro do sociólogo
nordestino marcou uma verdadeira revolução na valorização da
mestiçagem na formação da sociedade brasileira. Apesar do olhar
ainda conservador de Freyre que envolvia a ideia de um mestiço que
funcionaria como uma prova do caráter benévolo da escravidão e da
sociedade patriarcal/feudal açucareira através da amenização das
relações sociais antagônicas entre senhor e escravo; no Brasil o fato
representa o início do reconhecimento da nossa miscigenação como
um dado positivo na construção de uma cultura.

O traço conservador – quase reacionário – freyreano reside na


exaltação da figura do senhor patriarcal nordestino, o branco. E,

46
mesmo que o autor não lhes esconda as mazelas morais e a violência
lhe dá um caráter benevolente de pai de família. O mais importante,
entretanto, é que ele se posiciona contra a ideologia racista vigente
e canta a miscigenação como elemento chave da conquista do
trópico. É o ideólogo da mestiçagem. Esquece a violência do estupro
e liricamente louva o branco português que ao se entregar à luxúria
com índias e negras, estabeleceu um aspecto mais democrático da
dor nas relações étnicas do Brasil.

O fato é que (como resultado dos dois primeiros séculos de


colonização), a população brasileira foi formada por colonos brancos,
escravos negros, índios aculturados e mestiços. Uma sociedade
agrícola voltada para o comércio externo, para a propriedade feudal e
baseada no trabalho escravo. Essa realidade definiu seu perfil no qual
as múltiplas influências culturais se cruzam e interagem, mesmo no
terreno minado da dominação do europeu.

Foi um processo que teve por base uma população europeia imigrante
que se reproduziu socialmente excluindo e dizimando o contingente
indígena e marginalizando o negro escravizado. Foi, portanto,
desse código mestiço dominado, de forma hegemônica, pela cultura
europeia branca que se gerou as primeiras manifestações artísticas
coloniais. Ou seja: dentro do contexto de um processo histórico
construído a partir da mistura de diversos grupos sociais que se
influenciaram mutuamente (mesmo que com a imposição dos valores
de um determinado grupo sobre os outros) envolvendo valores éticos
e morais, noções de certo e errado, de bem e de mal, concepções
religiosas e hierarquia social e, naturalmente, partidos estéticos.

Ao adotar como visão de si mesmo a ideologia de seus dominadores,


o artista mestiço pode optar pela traição de tudo que nele não era
parte do espelho/modelo da Europa reproduzindo o ideário, o
estupro, imposto pelos dominadores brancos ou (mesmo que de
forma inconsciente) romper com essa realidade se voltando para
a construção de uma proposta alternativa em busca de um caráter
próprio sobrevivente. O barroco mestiço seria, portanto, o resultado
desse somatório de influências passivas e ativas que se processou na
América portuguesa e espanhola. É através dessas particularidades
que ele vai encontrar seu caráter único que o diferencia do modelo
erudito europeu.

47
Sobre o Barroco mestiço brasileiro
(ou barroco tropical) na sociedade
canavieira colonial nordestina
Nas vilas açucareiras nordestinas do Brasil colonial, como já
estudamos anteriormente, o universo de concepções e valores foram
definidos, a priori, pela cultura da Igreja Católica, da monarquia e da
fidalguia ibérica. A Igreja aliada ao Estado ditava as regras no Novo
Mundo.

Dessa forma (e em tais circunstâncias) foi definido, por assim dizer,


um sistema de valores de caráter oficial. Esse sistema deveria ser
encontrado vigorando hegemonicamente inclusive no imaginário
importo à colônia. Entretanto, essas noções e conceitos estabelecidos,
aceitos e incorporados oficialmente por escravos, forros, índios
aldeados e mestiços (grupos cujas influências deveriam ser de
ordem periférica e, mesmo, marginal) nem sempre sobreviveram
com seu caráter “puro”. Elas (as noções) se adaptaram e passaram
a se constituir em um novo vocabulário. Uma leitura com um caráter
híbrido, mestiço.

Quando, esmiuçamos a cultura e as condições de vida nas vilas


açucareiras da América portuguesa colonial verificamos que esses
grupos, com o passar do tempo, passaram a lidar com uma lógica
própria. Embora a lógica dominante branca tenha permanecido mais
forte no imaginário colonial (a partir inclusive do fato da sobrevivência
de um maior número de registros sobre ela) elementos das outras
culturas que se cruzaram naquele momento sobreviveram. Ou seja:
é do mundo barroco ibérico em transição cujo objetivo era o controle
da massa urbana (inclusive pela dominação cultural) que se gerou
Saiba Mais essa nova estética barroca. Os remanescentes indígenas e africanos
geraram um novo conjunto de valores que nem sempre se coadunava
25
Economia açucareira
é o resultado da decisão com a cultura oficial pregada pela Coroa e pela Igreja. Portanto,
portuguesa de explorar a insistimos: no universo cultural colonial o dinamismo das relações
cana-de-açúcar no Brasil.
Os lusitanos já tinham entre os vários grupos sociais contemplou a coexistência de heranças
aprimorado técnicas de culturais diversas.
produção do produto nas
ilhas de Cabo Verde e Dessa forma, o imaginário barroco que se processou já no início
de Madeira. No Brasil, a
plantação foi viabilizada da colonização, na fase da economia açucareira25 nordestina,
por meio de três apesar de moldado nos padrões ibéricos, foi reinterpretado pelas
elementos fundamentais:
diversas identidades participantes. Resultado: um barroco tropical
o trabalho escravo, a
monocultura e a grandes (ou tropicalista) que o ciclo do ouro mineiro, com suas características
propriedades. próprias, continuou a produzir e a aperfeiçoar.

48
Grande parte dos teóricos em História da Arte considera a linguagem
barroca brasileira própria desse ciclo (o do ouro) que aconteceu no
século XVIII. A nosso ver (e apoiada também por outros estudiosos
do assunto) a arte dos séculos anteriores, o imaginário da sociedade
de economia açucareira não pode ser isolado da linguagem barroca
uma vez que ele possui características típicas desse estilo. E que
característica são essas? Sua grandiloquência representacional
religiosa ibérica, sua teatralidade, seu vocabulário didático e sua
temática sacra imperante. Assim, através do trabalho de artistas
negros e mestiços, remanejado e reinterpretado, o Barroco já estava
presente nesse período da colônia.
Atenção
26
Leões de Fô são
Visitando igrejas no cenário do Nordeste podemos ver exemplos entidades guardiães dos
templos no Oriente.
dessa mistura de conceitos e signos. Abacaxis e cajus, por exemplo,
substituem frutas e flores europeias na Igreja da Guia na Paraíba
enquanto que mascarões africanos juntamente com Leões de Fô26
e figuras de características indígenas guardam as portas de adros
franciscanos naquele estado.

Sereias (Iaras)27 e cocares fazem parte do imaginário da talha que


reveste altares em Pernambuco e anjos mulatos nos olham dos
Pesquise...
Figuras Indígenas.
forros das igrejas daquele estado, pintados pela mão do artífice João Pedra Calcária. Convento
de Deus Sepúlveda. Ou seja: elementos culturais de origem ibérica de Santo Antônio.
foram reinterpretados ao mesmo tempo em que a mitologia dos povos
mestiços e de suas culturas originais foi inserida neste vocabulário
sacro católico acrescentando, aos códigos barrocos ibéricos, seus
próprios elementos culturais.

Lembrete
Anotações sobre elementos próprios 27
Iara é um personagem
do folclore brasileiro
do barroco tropical substituindo ou também chamado de
adaptando-se ao código hegemônico “mãe d’água”. É uma
sereia morena de cabelos
ibérico negros e olhos castanhos.
Segundo Darcy Ribeiro (1995, p. 27) a configuração cultural do Brasil Seu habitat é nos rios
do norte do Brasil. Atrai
formou-se destribalizando os índios, desafricanizando os negros e os homens com seu
deseuropeizando os brancos. Nessas circunstâncias, nada tinha um canto e os leva para as
profundezas dos rios.
valor definitivo que sobrevivesse de forma pura, não contaminada.
Corresponde a várias
O patrimônio artístico cultural barroco brasileiro é um reflexo dessas entidades das mitologias
condições coloniais. humanas. Nós já a
encontramos nas sereias
traiçoeiras de Homero em
Na pluralidade marcante de manifestações artístico-culturais
seu livro A Odisseia.
brasileiras (incluindo arquitetura, artes plásticas, escultura, dança,

49
música e literatura, por exemplo) podemos perceber a força do código
não hegemônico mestiço se opondo (ou melhor, adaptando-se) a
imposição cultural branca. Isso se deve também pelo recrutamento da
mão de obra que gerou configurações típicas, locais. Segundo Carla
Mary da Silva Oliveira (1994):

A partir do século XVII, entretanto, a mão-de-obra


empregada era quase totalmente indígena ou
mestiça na América Central e nos Andes, negra
e principalmente mulata no Brasil. Esta presença
maciça de uma mão-de-obra local na realização da
arquitetura, da ornamentação interna e externa e,
depois, na feitura de imagens e pinturas acabou
por colorir com uma contribuição peculiar a arte que
se fazia no continente. Quase todos os importantes
artistas da época colonial no Brasil eram mulatos
ou tinham a “infâmia do mulato” no sangue.

Além da mão de obra característica, o modelo também foi adaptado,


remanejado. Dessa forma, tornaram-se comuns os resultados
híbridos nas representações através da utilização constante de
modelos mestiços para a representação de figuras bíblicas, santos ou
personagens do credo católico. Apesar de todas as limitações alguns
artífices driblaram, portanto, o constante copiar trazendo à tona as
influências alheias ao vocabulário imposto.

Já nas primeiras Missões jesuíticas aparece a presença do elemento


popular e inculto. Na reprodução do imaginário católico destinado à
catequese. Uma produção realizada quase que exclusivamente por
índios ou de parceria com os padres catequistas (Figura 15).

Figura 15. Anônimo. Cristo Açoitado. Século XVII. Museu de Arte Sacra de Pernambuco.
Domínio Público. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:230718_88-olinda-maspe.jpg

50
No Nordeste açucareiro a presença de elementos culturais mestiços
destaca-se em algumas igrejas como é o caso do conjunto
arquitetônico franciscano dedicado a Santo Antônio em João Pessoa,
Paraíba que, mesmo sendo do século posterior, é um exemplo
marcante dessa mistura de linguagens. Destacam-se, no adro
daquela construção, em seu espaço laico desde Leões de Fo (cuja
presença pode ser ligada a missionários vindos de Macau) à figuras
portadoras de traços indígenas e africanos. Pesquise...
Interior em talha
Serge Gruzinsky em seu livro O Pensamento Mestiço (2001), da Matriz de Nossa
considera a noção de mestiçagem diretamente ligada a de identidade, Senhora da Conceição
o que implica na sobrevivência de um ou mais imaginários, mesmo concluída em 1710. Minas
Gerais.
que estes estejam sob dominação hegemônica. Isso gera o espaço
de fronteira entre as culturas, no caso as que formaram o universo
colonial brasileiro que pode ser exemplificado nesse conjunto
arquitetônico específico.

Essa sobrevivência da uma identidade marginal em uma iconografia


dirigida pela igreja católica significa que além dessa instituição não ter
conseguido manter o controle desejado sobre o imaginário colonial,
uma sobrevivência identitária se processou e resultou em imagens
híbridas com uma carga de originalidade única.

A explicação para essas imagens fugitivas das regras de reprodução


da iconografia religiosa, portanto, vai além da escassez de artífices e
artistas com formação profissional satisfatória. Esse seria apenas um
dos aspectos que teriam contribuído para o aparecimento de imagens
nos espaços religiosos onde elementos nativos e africanos (quer
antropomorfos quer fitomorfos) se misturam ao imaginário importado
da Europa. Sobreviver em um espaço hostil também se situa no
âmago da questão.

Esse fenômeno de mestiçagem como forma de sobrevivência


identitária aparece em outras construções religiosas. Segundo a
pesquisadora Carla Mary da Silva Oliveira (2010):

Na Igreja de Nossa Senhora da Conceição dos


Militares do Recife, por exemplo, os medalhões
pintados no forro pelo artífice pardo João de Deus
e Sepúlveda (século 18), por volta de 1777, trazem
exemplos dessa estratégia de inserção do caráter
mestiço em cenas hagiográficas de clara inspiração
tridentina. No medalhão central, em torno de Nossa
Senhora da Conceição, aparecem vários anjinhos,
como de praxe acontecia quando se representava

51
essa invocação da Virgem, mas há lá ao menos
um deles de pele evidentemente mais escura, ao
lado esquerdo da imagem. Em outro medalhão
secundário no mesmo forro, a Virgem aparece
numa imagem extremamente incomum, com o
ventre descoberto, mostrando seu rebento divino
antes do nascimento, e lá também aparece um
anjo mulato a seu lado, trazendo o emblema dos
jesuítas. Em ambas as pinturas os traços faciais
de Maria aproximam-se do tipo físico mestiço, com
lábios carnudos e cabelos ondulados.

Percebe-se então, através destes exemplos e de incontáveis


outros, a presença do mulato, do mestiço registrando e registrando-
se etnicamente no imaginário produzido sob encomenda para as
ordens religiosas. Dessa forma, a identidade mestiça abriu caminho
na sociedade em formação colonial se mostrando enquanto um fato
artístico político enquanto forma (consciente ou não) de resistência
cultural e gerando uma linguagem nova já presente no ciclo da cana-
de-açúcar: o barroco tropicalista. E ninguém melhor para afirmar essa
característica mestiça e de certa forma orgulhosa do povo brasileiro
que Darci Ribeiro em seu livro O povo Brasileiro (1995, p. 453):

Nós, brasileiros, somos um povo em ser, impedido


de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito,
já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou
pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos
nos fazendo. Essa massa de nativos oriundos da
mestiçagem viveu por séculos sem consciência
de si, afundada na ninguendade. Assim foi até se
definir como uma nova identidade étnico-nacional,
a de brasileiros.

E é na contemporaneidade que essa consciência de povo mestiço,


de hibridismo cultural aflora. Mas, nos princípios da colônia, o artesão
santeiro, de forma inconsciente, já projetava sua consciência mestiça
trazendo para o modelo importado sua contribuição e seu traço. A
nossa própria identidade nacional é mestiça e um produto do próprio
processo de encontro, miscigenação, sincretismo e identificação
étnico-nacional.

Sobre os artistas citados no capítulo


●● João de Deus Sepúlveda: De uma família de artistas, João de
Deus Sepúlveda é o pintor pernambucano mais importante do Séc.

52
XVIII. Deve ter nascido no primeiro terço do século, era também
músico e parece ter seguido a carreira militar, pois é referido às
vezes em documentos como “Tenente João de Deus Sepúlveda”.
Sua obra mais antiga de que se tem notícia é a série de pinturas
sobre a vida de Santa Teresa, na Igreja de Santa Teresa da Ordem
Terceira de Nossa Senhora do Carmo em Recife, objeto de três
contratos firmados entre o artista e a irmandade em 1760-61.
Poucos anos depois, a 14 de junho de 1764, Sepúlveda firmou
novo contrato, agora com a Mesa da Irmandade de São Pedro,
para realizar a pintura do enorme forro da Igreja de São Pedro
dos Clérigos, em Recife, trabalho esse ao qual se dedicou pelos
próximos quatro anos, e que tem por tema São Pedro Abençoando
o Mundo Católico. (Fonte: José Roberto Teixeira Leite in LEITE,
José Roberto Teixeira. Dicionário crítico da pintura no Brasil. Rio
de Janeiro: Artlivre, 1988).

Revisão
Uma estética de mestiçagem é o resultado do cruzamento de elementos culturais vindos
de zonas diferentes e heterogêneos uns em relação aos outros. O Brasil, enquanto
mistura de seres humanos de origem diversa (indígenas, europeus e africanos), forma
um universo mestiço onde o código branco prevaleceu como parâmetro a ser seguido
pelas demais raças participantes.

Nesse processo histórico, construído a partir da mistura de diversos grupos sociais, que
se influenciaram mutuamente mesmo com a imposição dos valores de um determinado
grupo sobre os outros envolvendo valores éticos e morais, noções de certo e errado,
de bem e de mal, concepções religiosas e hierarquia social (e naturalmente, partidos
estéticos), formou-se uma linguagem barroca particular: o também chamado barroco
mestiço ou barroco tropical.

Ao adotar como visão de si mesmo a ideologia de seus dominadores, o artista mestiço


teve dois caminhos: optar pela reprodução do ideário imposto pelos dominadores brancos
ou romper com essa realidade se voltando para a construção de uma etnia alternativa em
busca de um caráter próprio sobrevivente. O barroco mestiço seria, portanto, o resultado
desse somatório de influências, passivas e ativas, que se processou na América
portuguesa e espanhola.

Nas vilas açucareiras nordestinas do Brasil colonial foi definido um sistema de valores
oficial que se estendia ao imaginário imposto à colônia. Entretanto, esses conceitos
hegemônicos foram adaptados por artistas/artesãos emergentes de um grupo constituído
por escravos, forros, índios aldeados e mestiços. Essas influências deveriam ser de
ordem periférica, entretanto, elas passaram a construir, por vezes intuitivamente, suas
próprias noções de valores estéticos, valores esses de caráter mestiço. Ou seja: no
universo cultural colonial o dinamismo das relações entre os vários grupos sociais gerou
um hibridismo cultural que contemplou a coexistência de heranças culturais diversas.

Essa sobrevivência de identidades marginais em uma iconografia dirigida pela igreja

53
católica significa que alem dessa instituição não ter conseguido manter o controle
desejado sobre o imaginário colonial, a sobrevivência cultural se processou dentro das
circunstâncias de então.

A explicação para essas imagens fugitivas das regras de reprodução da iconografia


religiosa é sempre explicada como o resultado da escassez de artífices e artistas com
formação profissional satisfatória. Mas, de fato, esse seria apenas um dos aspectos
que teriam contribuído para o aparecimento de imagens nos espaços religiosos onde
elementos nativos e africanos (quer antropomorfos quer fitomorfos) se misturam ao
imaginário importado da Europa.

No Nordeste açucareiro a presença de elementos culturais mestiços destaca-se


em algumas igrejas como é o caso do conjunto arquitetônico franciscano dedicado a
Santo Antonio em João Pessoa, Paraíba e da Igreja de Nossa Senhora da Conceição
dos Militares do Recife. Ambos os exemplos apresentam resultados mestiços em suas
esculturas, talhas e pinturas.

Atividades Práticas
A partir desse texto de Darci Ribeiro extraído do livro O povo Brasileiro, o professor
deverá propor como atividade que os alunos o leiam e formulem um texto próprio sobre a
mestiçagem brasileira e suas implicações no imaginário da colônia.

A assunção de sua própria identidade pelos brasileiros, como de resto por qualquer
outro povo, é um processo diversificado, longo e dramático. Nenhum índio criado na
aldeia, creio eu, jamais virou um brasileiro, tão irredutível é a identificação étnica, Já
o filho da índia, gerado por um estranho, branco ou preto, se perguntaria quem era, se
já não era índio, nem tampouco branco ou preto. Seria ele o protobrasileiro, construído
como um negativo feito de sua ausência de etnicidade? Buscando uma identidade
grupal reconhecível para deixar de ser ninguém, ele se viu forçado a gerar sua própria
identificação.

O negro escravo, enculturado numa comunidade africana, permanece, ele mesmo, na


sua identidade original até a morte. Posto no Brasil esteve sempre em busca de algum
irmão da comunidade longínqua com quem confraternizar. Não um companheiro, escravo
ou escrava, como ele próprio, mas alguém vindo de sua gente africana, diferente de
todos os que via aqui, ainda que eles fossem negros escravos.

Sobrevivendo a todas as provações, no trânsito de negro boçal a negro ladino, ao


aprender a língua nova, os novos ofícios e novos hábitos, aquele negro se refazia
profundamente. Não chegava, porém, a ser alguém, porque não reduzia jamais seu
próprio ser a simples qualidade comum de negro na raça e de escravizado. Seu filho,
crioulo, nascido na terra nova, racialmente puro ou mestiçado, este sim, sabendo-se
não-africano como os negros boçais que via chegando, nem branco, nem índio e seus
mestiços, se sentia desafiado a sair da ninguendade, construindo sua identidade. Seria,
assim, ele também, um protobrasileiro por carência.

O brasilíndio como o afro-brasileiro existiam numa terra de ninguém, etnicamente


falando, e é a partir dessa carência essencial, para livrar-se da ninguendade de não-
índios, não-europeus e não-negros, que eles se veem forçados a criar a sua própria

54
identidade étnica: a brasileira.

O português, por mais que se identificasse com a terra nova, gostava de se ter como
parte da gente metropolitana, era um reinol e esta era sua única superioridade inegável.
Seu filho, também, certamente, preferiria ser português. Terá sido assim, até o português,
por mais que se identificasse com a terra nova, gostava de se ter como parte da gente
metropolitana, era um reinol e esta era sua única superioridade inegável.

Terá sido assim, até que aqueles mamelucos e índios e aqueles negros mestiçados
ganhassem entidade, como identificação coletiva para que o mazombo deixasse de
permanecer lusitano.

55
56
Capítulo 4

A glória e a interrupção
da linguagem barroca

Objetivos
●● Estudar o processo do apogeu barroco no Brasil. Observar a realidade sócio-
econômica responsável pela sua glória;

●● Conhecer alguns artistas/artesãos do período;

●● Compreender as circunstâncias políticas provocadoras da substituição do imaginário


barroco pelo Neoclassicismo.
Saiba Mais
28
Cariatides são colunas
(ou simples elementos de
Sobre o apogeu da linguagem barroca sustentação) encontradas
na arquitetura persa,
no Brasil grega e romana (como
as do templo Erectéion
A linguagem barroca testemunhou a realidade colonial em seus vários
em Atenas) esculpidas
ciclos de riquezas, proporcionados pela produção de açúcar, fumo em forma de mulher,
e madeiras nos séculos XVI e XVII e pela atividade de mineração ou da metade do corpo
humano ou animal e que
durante todo o século XVIII e princípios do XIX. Ela se comportou de servem como suporte
forma relacionada com o espaço econômico para o qual foi produzida. de vigas e telhados. Na
forma masculina eles são
Atuando como veículo de catequese e de controle estatal, o imaginário chamados de atlantes,
barroco se refletiu, portanto, nas regiões que mais se destacaram terminologia que se deriva
na produção de riquezas. Nesses locais o barroco foi rico, suntuoso de Atlas (da mitologia
grega) que sustentou o
mesmo, manifestando-se em toda a sua glória material. Nas outras mundo em cima das suas
regiões do país, em determinados locais que não se destacaram costas.
pela riqueza agrícola ou mineral, ele (o barroco) foi modesto, mesmo
humilde. Entretanto, em ambos os casos o estilo prestou tributo à fé
católica e ao poder do Estado.

O Brasil rico (da cultura açucareira e, principalmente, da mineração)


teria que produzir, naturalmente, um barroco rico. As construções de Atenção
Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco são exemplos da 29
Estilo maneirista pode
utilização dos recursos coloniais para a exaltação da fé e do poder do ser considerado como
Estado, gerando as variadas formas de sustentação e de enfeites tais uma supervalorização da
originalidade individual
como anjos e cariatides28 em meio ao dourado das talhas. em uma obra artística
(muitas vezes artificial).
Para o fiel, olhar o interior das edificações era constatar o poder
religioso /temporal, em sua magnificência. Olhar para cima das

57
construções, por sua vez, significava vislumbrar uma ideia de céu, de
uma dimensão paralela a qual ele (o fiel) tinha acesso por momentos
Saiba Mais e para onde podia se projetar na companhia de anjos, da virgem e de
30
O rococó é um outros membros da corte celeste.
movimento artístico
francês que gerou um Ricamente representado nas igrejas o Barroco brasileiro colonial
estilo que se espalhou
pela Europa. Pode misturou, na arquitetura, os estilos maneirista29, barroco e
ser considerado como rococó30 de inspiração europeia e seu apogeu estilístico se encontra
uma variação laica do
exatamente no ciclo do ouro nas Minas Gerais onde ele, isolando-
barroco que se libertou
da temática religiosa. se mais das influências brancas, procurou um caminho específico,
Ele representa o poder próprio, mestiço.
absolutista e sua
decoração exagerada No que diz respeito à pintura barroca daquele momento de glória, o
simboliza esse poder e os
seus excessos. Um bom primeiro historiador, artista e intelectual brasileiro Manuel de Araujo
exemplo do estilo rococó Porto Alegre já dela fala quando, escreve diversos artigos, entre
é o palácio de Versailles.
eles Memória sobre a Antiga Escola Fluminense, publicado no ano
de 1841. Foi a primeira vez que se reconheceu a qualidade da arte
produzida no Brasil antes da chegada da Corte portuguesa fugitiva de
Bonaparte (1808) e dos artistas franceses comandados por Le Breton
em 1816.

Porto Alegre resgatou e reverenciou o pintor mais antigo do Rio de


Janeiro, frei Ricardo do Pilar (beneditino de origem holandesa), a
quem comparou a Giotto e Cimabue. Ele também tirou do anonimato
Atenção alguns artistas nascidos no Rio de Janeiro, entre os quais José de
31
A Semana de Arte Oliveira e seu discípulo João Francisco Muzzi. Outro personagem
Modena de 1922 revisto por ele no universo barroco brasileiro foi o mestre João de
aconteceu no Teatro
Municipal de São Paulo Souza e seu aluno: o mulato e ex-escravo Manoel da Cunha e Silva.
articulada por intelectuais Falando sobre Mestre Valentim, outro artista barroco por ele resgatado
e artistas daquela cidade
e do Rio de Janeiro.O do anonimato, ele nos diz:
objetivo do encontro era
Seria difícil há quinze anos [cerca de 1840] fazer
chamar a atenção da
sociedade e do mundo da o elogio deste artista, sem desafiar os ânimos
arte para uma atualização daqueles que seguiram a escola chamada clássica,
necessária com as aquela que foi propagada por Winkelmann e
vanguardas artísticas
Raphael Mengs, exemplificada por David, Pompeu
europeias. A SAM
pretendeu causar impacto Battoni, Percier e Fontaine, e exagerada por
no meio paulistano Camuccini, Valadier e Benvenuti.
funcionando como uma
espécie de espetáculo. Ou seja, além do anonimato notório entre os artistas barrocos,
Entretanto, foi necessário
um certo tempo para que os poucos que foram gradativamente sendo resgatados com a
as linguagens artísticas construção de uma História da Arte nacional estavam antes dele
brasileiras se adaptassem
esquecidos e mal vistos com a introdução do vocabulário Neoclássico
aos novos tempos e
movimentos europeus. no início do século XIX. O próximo resgate dessa cultura barroca
colonial interrompida pela chegada da corte e dos artistas franceses

58
vai acontecer entre os modernistas que tomaram parte da tão
comentada Semana de Arte Modena de 192231.
Saiba Mais
Se a pintura, anônima ou não, conduziu o fiel a uma iconografia que 32
A pedra sabão
o enlevava, a talha representou a escultura ligada à arquietetura (também chamada
(Figura 16), a decoração luxuosa, a simbologia do poder. Ela foi uma de pedra de talco) é
o nome dado a uma
expressão artística barroca comum juntamente com a produção de rocha também chamada
imagens de culto. Alguns nomes são conhecidos como por exemplo: de esteatito. Contém
minerais como magnesia,
Mestre Valentim e Machado de Castro que atuaram no Rio de Janeiro
clorita e quartzo. É uma
ou Felix Pereira e Manoel Inácio da Costa que atuaram na Bahia. rocha não muito dura
e é encontrada em
cores que vão de cinza
a verde. Parece ser
oleosa ou saponácea.
Daí sua designação de
pedra-sabão. Existem
grandes depósitos no
estado de Minas Gerais. A
pedra sabão foi bastante
utilizada pelo mestre
barroco alcunhado de
Aleijadinho.

Saiba Mais
33
Um esteio é uma peça
de madeira, ferro etc., que
serve para segurar ou
escorar alguma coisa.
Figura 16. Interior da Igreja de São Francisco. Salvador. Bahia. Ben Tavener. Domínio
Público. Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Igreja_de_S%C3%A3o_Francisco_
(Salvador)_01.jpg?uselang=pt

Na escola mineira destaca-se aquele que Germain Bazin definiu


como o Michelangelo brasileiro: Antonio Francisco Lisboa,o
Aleijadinho, de quem falaremos posteriormente. A pedra sabão32 agiu
nesse momento de glória barroca como o material por excelência da
linguagem escultórica. Saiba Mais
34
Baldrames são as
A utilização da pedra nas construções coloniais do seculo XVIII vigas que ficam ao nível
permitiu uma maior dinamicidade bem como uma maior resistência do solo. Os baldrames
amarram entre si as
ao tempo. Porém, ela só foi utilizada onde existia o material. Em bases dos pilares e o topo
Ouro Preto, Mariana e Congonhas, por exemplo. Na maioria das das estacas.
edificações, principalmente as religiosas (que mais se destacaram),
a madeira fez as vezes da pedra. Os esteios33 e os baldrames34 de
barauna35 e aroeira36 garantem até hoje a estabilidade das igrejas

59
existentes. Graças a estas madeiras duríssimas foi possivel a
construção dos grandes templos que perduram até nossos dias.
Saiba Mais Se o aspecto exterior arquitetônico do barroco religioso brasileiro
35
Baraúna é uma é simples, mesmo em seu apogeu, essa condição contrasta com a
árvore de grande
porte cujo termo tupi riqueza interior. Muitas vezes na ânsia de ver a edificação erguida
é ybirá-uma (madeira a comunidade não dava chance para grandes elaborações e
preta). Uma árvore que
fornece uma madeira elocubrações arquitetônicas sobretudo nos núcleos populacionais
escura e extremamente distantes. Entretanto, uma vez erguido o prédio, o seu interior era alvo
resistente e que, por
de todas as atenções. A abundância de madeira e de mão de obra
sua vez, também foi
bastante empregada barata foram a chave da suntuosidade dos interiores barrocos (Figura
nas edificações coloniais 17). O tempo que faltou para o exterior sobrou para o interior. Nas
brasileiras.
palavras de Lourival Gomes Machado (1978, p. 121):

Já aludimos ao contraste entre a fachada e o


interior da Matriz de Antonio Dias. De um modo
geral essa é a nota curiosa de todas as igrejas
do complexo ouro-pretano. Barroco perdulário no
interior, severidade áustera do lado de fora.

Saiba Mais Assim se comporta o barroco brasileiro em sua fase áurea, no século
36
Aroeira é uma madeira XVIII, quando ele se unifica e se aclimata ao contexto nacional. Pobre
tida na prática como a por fora e cheio de fausto por dentro. Ele representa uma expressão
de mais alta resistência
ao apodrecimento e ao artística que conseguiu amadurecer e se adaptar ao ambiente de um
ataque de cupins. Foi país mestiço, tropical e colonizado. Utilizando-se recursos materiais
bastante utilizada nas
e humanos regionais e se constituindo em momentos de pura
edificações de nossos
primeiros tempos originalidade em sua grande carga de força expressiva.
coloniais e algumas
construções resistem por
conta de seu emprego.

Figura 17. Santuário do Bom Jesus de Matosinhos. Minas Gerais. Halleypo. Domínio Público.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Congonhas_santuario_matosinhos.jpg

60
O ciclo do ouro como agente
catalizador e unificador do barroco
brasileiro
No final do século XVII, as exportações do açúcar brasileiro
(produzido nos engenhos do nordeste) começaram a diminuir.
Com preços mais baixos e boa qualidade, o mercado consumidor
europeu passou a dar preferência para o açúcar holandês produzido
na América Central. Portugal ficou de repente em uma situação de
buscar novas fontes de renda. Atenção
37
O feudalismo foi um
Os bandeirantes proporcionaram essa renda alternativa com a sistema de organização
descoberta de minas de ouro nas regiões que hoje correspondem a social que aconteceu
durante a Idade Média
Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Desbravadores, eles realizaram
desenvolvendo-se em
o sonho português das riquezas minerais até então não realizado. um período que engloba
Foi quase um milagre. Num dia a região era um espaço povoado por da crise do Império
Romano, à formação
algumas tribos indígenas e alguns meros aventureiros de passagem dos reinos bárbaros e a
isolados e desprestigiados por uma metrópole sem o menor interesse desagregação do império
Carolíngio. O feudo era a
em suas terras distantes dos portos. No outro, ela acordou com a unidade produtiva básica
histeria do ouro que acabava de ser descoberto. Jazidas com uma e ele se apresenta de
forma um tanto quanto
quantidade de ouro nunca imaginada. Enfim o tão sonhado ouro
complexa podendo
fora achado nos fins daquele século XVII. E era muito, muito ouro, apresentar muitas
opulentas minas que mudaram a realidade econômica do Brasil de variações. Compreende
desde vastas regiões
então. onde encontramos
vilas e cidades em seu
A corrida do ouro se iniciou. Com ela chegou uma mistura de interior, até “fazendas”
pessoas heterogêneas que se encontraram em um mesmo ambiente, ou, mesmo, pequenas
porções de terra. As
impulsionadas pelo poder do ouro. Isso deu início a uma nova relações hierarquizadas
sociedade. Brancos portugueses, negros escravos, índios e outros entre o senhor feudal e
o servo compreendiam o
imigrantes e aventureiros se misturaram formando um variado
trabalho braçal servil por
mosaico cultural. parte deste e a proteção
armada, naqueles tempos
Até então vigorava no Brasil a rígida sociedade dos engenhos cujos inseguros, por parte do
senhor.
princípios eram ditados pelos seus senhores nos moldes de um
feudalismo37 sobrevivente nos trópicos. Eram os donos das grandes
fazendas de açúcar. Uma sociedade hierarquizada e com pouca
mobilidade social38. A efervescente sociedade do ouro, baseada
na riqueza proveniente da mineração, tinha características mais Saiba Mais
democráticas. Os seus padrões de conduta não eram tão rígidos 38
Mobilidade social
e a ascensão social era mais fácil. Um escravo, por exemplo, bem é a passagem de um
sucedido no garimpo poderia comprar sua carta de alforria e, tornando- indivíduo de uma classe
social para outra. Ela se
se um homem livre, poderia contar mesmo com a possibilidade de processa teoricamente no
enriquecimento. mundo ocidental.

61
A combinação da vida urbana com a atividade mineradora criou novos
ofícios, desenvolvendo uma nova camada social: a classe média.
Gente de atividades variadas. Eram escultores, músicos, tropeiros,
pintores, marceneiros, alfaiates, entalhadores, advogados. Profissões
liberais. O feudalismo deu lugar a uma burguesia urbana e emergente.

A coroa portuguesa lucrava mais com a cobrança de taxas e impostos


com essa “corrida do ouro”. Quem encontrava o minério na colônia
deveria pagar o “quinto”. Este imposto era cobrado nas Casas
de Fundição (órgão do governo português), que derretia o ouro,
transformava-o em barras (com o selo da coroa portuguesa) e retirava
20% (um quinto) para ser enviado para Portugal.

Com a exploração do ouro, a região Sudeste desenvolveu-se muito,


enquanto o Nordeste começou a entrar em crise. Neste contexto, a
coroa portuguesa resolveu mudar a capital da colônia de Salvador
para o Rio de Janeiro. Era uma forma de deixar a capital do país
mais próxima do novo polo de desenvolvimento econômico facilitando
assim o escoamento de riquezas para a metrópole. 

Nas regiões auríferas, várias cidades cresceram e muitas surgiram


neste período. Os povoados eram os embriões das futuras urbes. A
vida dinamizou-se aumentando as atividades comerciais, sociais e
de trabalho. Teatros, escolas, igrejas e órgãos públicos foram criados
nestas cidades. Vila Rica (atual Ouro Preto), Mariana, Tiradentes
e São João Del Rey foram algumas das povoações que mais se
desenvolveram naquela época.

Atenção Apesar do ouro brasileiro ser de aluvião39 e assim ter se esgotado


39
Ouro de aluvião era, com relativa rapidez (ele se exauriu no decorrer de um século)
encontrado aflorando à acredita-se que, até 1760 aproximadamente, o fluxo de extração (de
superfície, na forma de
pequenos grãos. Era forma abundante) manteve-se. Só depois iniciou-se o processo de
garimpado em bateias e decadência.
comercializado, muitas
vezes ainda bruto. Era A euforia gerada pela descoberta do ouro derivou em um estado
o chamado ouro em pó.
Não se constituia em uma psicológico de onipotência para a metrópole. O ouro fluia da terra e
jazida perene. tudo era bom para Portugal. Politicamente (e economicamente) este
estado de coisas levou a metrópole portuguesa a assinar com a
Inglaterra o lamentável tratado de Methuen no início do século XVIII.
Este tratado foi negociado com Portugal pelo agente ingles John
Methuen. Atraves dele Portugal aboliu os embargos para a importação
dos tecidos ingleses (em plena revolução industrial inglesa). O efeito
foi devastador para a economia portuguesa, pois a produção textil
inglesa (melhor e mais barata) não permitiu o desenvolvimento

62
industrial lusitano.

O ouro brasileiro/português contribuiu dessa forma para o sucesso


industrial inglês, o eterno aliado/credor de Portugal que vivendo do
ouro e depois dos diamantes brasileiros, de forma extrativista (como
havia vivido do Pau Brasil), teve sua época de glória , situação que se
refletiu naturalmente no patrimônio artístico da colonia e da metrópole.

Nesse ambiente tornou-se possível o surgimento de um movimento


artístico e cultural sem precedentes no Brasil. As vilas se tornam
prósperos redutos urbanos, onde floresceu uma rica arquitetura. As
artes tomaram impulso. O barroco mineiro se desenvolve, amadurece
e adquire características próprias. Ele nos impressiona hoje por
seu esplendor, sua força e dramaticidade. É uma arte de fervor
religioso, teatral e que encontrou em Minas o cenário perfeito para se
estabelecer.

É a glória, o apogeu barroco. O século XVIII, mesmo com a


decadência da exploração deste ouro de aluvião, vai conhecê-lo. No
início do XIX, entretanto, as condições políticas internacionais, sobre
as quais falaremos posteriormente vão proporcionar a interrupção e a
decadência dessa linguagem que se afirmava. Ela vai ser substituída,
gradativamente, pelo neoclassicismo francês já quase em desuso na
Europa referencial.

A vasta maioria do legado barroco brasileiro está na arte sacra:


estatuária, pintura e obra de talha para decoração de igrejas ou para
culto privado. Apesar de sua importância, boa parte da arquitetura e
das obras de arte barrocas do Brasil se encontram em mau estado
de conservação. A necessidade de restauração e conservação
condicionam sua sobrevivência.

O Aleijadinho e Mestre Ataide: uma


síntese do apogeu do barroco/rococó
colonial
O início da história do artista perde-se no tempo e na lenda. Não se
sabe sequer ao certo a data exata de seu nascimento. Consta que
Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho, nasceu
por volta de 1730 na cidade de Vila Rica. Pouco se sabe com certeza
sobre sua vida que ainda se encontra (em termos biográficos) bem
mais no campo da fantasia que no da investigação científica. O fato
é que a principal fonte de informações sobre este artista mineiro

63
barroco é uma nota biográfica escrita somente cerca de quarenta e
quatro anos depois de sua morte.

Praticamente todos os dados hoje disponíveis sobre sua vida são


derivados de uma biografia escrita em 1858 por Rodrigo José Ferreira
Bretas que se baseou em documentos e depoimentos de indivíduos
que haviam conhecido pessoalmente o artista. Entretanto, seus
dados carecem de uma comprovação científica. No que diz respeito
a sua obra poucas possuem documentação. Grande parte levantada,
baseia-se em critérios de semelhança estilística com as poucas peças
documentadas.

De acordo com as parcas informações seu biotipo seria o de um


mulato de estatura baixa, corpo cheio e mal configurado. É o seu
retrato falado, não muito original no universo mestiço brasileiro.

Seu apelido deve-se à enfermidade da qual ele foi portador a partir de


1777. Ela teria sido causada por uma doença sexualmente transmitida.
Talvez por ter negligenciado a cura do mal no seu começo, ou pela
força do mesmo, Antônio Francisco perdeu todos os dedos dos pés e
sofria continuamente de fortes dores. Sobre essa doença misteriosa
também se fala de que ela poderia ter sido reumatismo ou mesmo
lepra. São conjecturas. O fato é que em 1788 o artista mudou-se de
Ouro Preto em busca de um clima menos úmido ou talvez fugindo
dos tumultos que aconteciam na cidade devido a escassez do ouro
que vinha em queda perturbando a todos. Ninguém sabe nada, em
definitivo, sobre esse artista hoje famoso, que passou a História da
Arte brasileira.

Toda sua obra: talha, projetos arquitetônicos, relevos e estatuária, foi


realizada em Minas Gerais. Especialmente nas cidades de Ouro Preto,
Sabará, São João Del Rey e Congonhas. Hoje ele é considerado
pela crítica brasileira (quase em consenso) como o maior expoente
do barroco brasileiro. Sobre ele assim se manifesta Pietro Maria Bardi
(1989, p. 42):

O Mestre é de um temperamento indiscutível,


um caráter individual distinguindo-se de modo
particular, sintetizador de toda a precedente mas
anônima arte dos artifices que aqui trabalhavam
imitando a maneira imaginária convencional.

De fato o Mestre (Aleijadinho), escultor, arquiteto e entalhador


imprime sua marca em sua obra. Entretanto, a pergunta permanece:
como esse artista (que apesar das parcas informações supõe-se

64
pobre e talvez autodidata) chegou a esse nível de uma produção
artística tão peculiar? Como, afinal, um artífice40 brasileiro pôde
desenvolver peças tão marcantes no deserto de informações que era Saiba Mais
o Brasil colonial? 40
Um artífice é um
operário especializado
Sabe-se (ou supõe-se) que o conhecimento que ele tinha de desenho, em uma determinada
atividade e que exerce
de arquitetura e de escultura foi obtido de seu pai e talvez com sua atividade sem uma
o desenhista e pintor João Gomes Batista, que na corte do Rio de formação sistemática
mas, na maioria das
Janeiro recebera as lições artista Vieira que trabalhava como abridor
vezes, através de
de cunhos na casa da fundição de ouro daquela capital. Ou seja: conhecimento adquiridos
nenhuma informação acadêmica, mas um conhecimento repassado de um mestre que o toma
como discípulo.
na melhor tradição das Guildas medievais.

Alguns teóricos atribuem ao isolamento das cidades da zona de


mineração essa individualidade. Sem maiores contatos, os artistas
da região das minas debruçaram-se mais sobre si mesmos. Antonio
Francisco Lisboa foi o maior exemplo. É uma boa explicação. Afinal,
Aleijadinho saiu uma única vez de Minas Gerais, para uma viagem ao
Rio de Janeiro, onde resolveu questões burocráticas. Mas ela (essa
explicação) não descarta a ideia da planta que floresce em lugares
improváveis. Também não exclui a possibilidade de que o artista-
artesão tenha visto por lá muitas das peças produzidas no nosso
litoral de influência mais direta portuguesa.

No que diz respeito ao mistério de um talento sem explicações


acadêmicas, o Aleijadinho não é o único exemplo desse fato. No
Brasil, algumas décadas depois no interior mais isolado do Nordeste
brasileiro, na longínqua cidade de Areia nas serras da Paraíba, outro
artista brasileiro, Pedro Américo, também pode ser referência para
a compreensão deste processo de criação espontânea. Ele já era
um talento nato em sua infância embora o conhecimento acadêmico
posterior o tenha conduzido por caminhos diversos do artista mineiro.
De acordo com Zaccara, (2011, p. 23), Américo:

Filho de Daniel Eduardo de Figueiredo (pequeno


comerciante que gostava de tocar violão para
seu lazer), e de Feliciana Cirne de Figueiredo, ele
era membro de uma família que parece ter uma
inclinação especial para as artes: Manuel de Cristo
Grangeiro e Melo seu avô, organizou em 1847 a
primeira Banda de Música, seu tio Tristão Granjeiro
de Almeida e Melo, regeu a Banda de Música
da cidade durante 30 anos e seu irmão, Aurélio
de Figueiredo, também pintor, foi enviado na
adolescência para o Rio de Janeiro onde seguiu os

65
passos do irmão mais velho. Américo manifestou
cedo sua vocação artística. Seus primeiros
desenhos, sobre as paredes da loja de seu pai,
impressionavam os seus frequentadores. O garoto
também escrevia e atuava em peças teatrais para
as quais desenhava a publicidade. Uma criança
especial no interior profundo do Brasil do século
XIX.

Ou seja, apesar das circunstâncias, ou até por elas, alguns talentos


individuais transcendem seu meio independentemente de formação
artística preliminar. Se o artista paraibano não tivesse contado
com a realidade de uma academia que sistematizaria seu ensino,
provavelmente seria mais um mestre santeiro no interior profundo do
Brasil.

O fato é que a carreira de mestre de arquitetura e escultura do artista


mineiro desenvolveu-se com características idiossincráticas. Dessa
forma, Aleijadinho, através de sua obra, se sobrepôs a todos os
artistas do gênero de sua época, da linguagem barroco-rococó. Ou,
pelo menos, é o mais discutido e reverenciado deles na atualidade.

Seu primeiro trabalho, (ainda na oficina de seu pai) foi o risco para o
chafariz do Palácio dos Governadores de Vila Rica, atual Ouro Preto,
feito em 1752. Somente em 1761 seu nome aparece novamente como
autor de outro trabalho: um busto feminino para o chafariz do Alto da
Cruz de Vila Rica (construído por seu pai), no qual se vê pela primeira
vez, na região, uma escultura realizada em pedra-sabão.

A primeira obra cuja autoria lhe é verdadeiramente atribuída data


de 1766. Trata-se do risco para a capela da Ordem Terceira de São
Francisco de Assis da Penitência, em Ouro Preto. Também é de sua
autoria o risco dos altares laterais, que só foram executados, bem mais
tarde, em 1829. Como em outras obras arquitetônicas posteriores do
artista, o espaço se caracteriza pelo dinamismo da composição. Sua
ligação com um vocabulário rococó aparece na decoração exterior
e interior com a utilização de figuras de anjos, elementos vegetais,
conchas, laços de fitas e guirlandas esculpidos em madeira e pedra-
sabão.

Muitos trabalhos de escultura reconhecidos como criações do artista


mineiro não possuem registro confirmando a sua autoria. Isso se
deve, entre outras coisas, à sua condição de mulato, pobre, muitas
vezes obrigado a aceitar contratos como artesão diarista e não como
mestre. Essa condição também deve ter contribuído para o seu

66
esquecimento durante o século XIX juntamente com a implantação do
vocabulário neoclássico francês.

Até o início do século 20, o mineiro de Vila Rica não passava (para os
críticos e o mundo intelectual brasileiro) de mais um artesão habilidoso
do século 18. A partir da década de 1920, seu nome deixa a lista dos
trabalhadores manuais e esquecidos para ganhar o status de artista e
de gênio. Por conta dos criadores do movimento modernista brasileiro
ele assumiu a condição de símbolo de uma identidade verde-amarela.
O crítico modernista Mário de Andrade empenhava-se em afirmar sua
genialidade e sua nacionalidade.

Entretanto, o renome internacional do mestre veio através do


intelectual francês Germain Bazin que – conservador do museu do
Louvre, em Paris, em seus livros A arquitetura religiosa barroca no
Brasil (1956) e Aleijadinho e a escultura barroca no Brasil (1963) – foi
o intelectual que conseguiu o fato de divulgar o trabalho do artesão
mineiro pouco conhecido anteriormente além de chamar a atenção
para as obras a ele atribuídas. Segundo Bazin (1963, p. 11):

Como arquiteto e ornamentista, o Aleijadinho trouxe


o galardão supremo ao barroco português. Como
escultor, se erigiu formas grandiosas das quais
a civilização portuguesa não oferecia nenhum
equivalente, não foi por espírito de revolução, mas,
ao contrário, pelo despertar das forças criadoras
que dariam à civilização luso-brasileira o grande
artista-poeta que, depois de Nuno Gonçalves, ela
não soube mais produzir.

Antônio Francisco Lisboa teve a oportunidade de realizar algumas de


suas obras (consideradas primas nos tempos em que vivemos) em
pleno momento de instabilidade social e econômica gerada pela crise
da exploração dos recursos minerais que se esgotavam. Em 1796, ele
Lembrete
iniciou os trabalhos no santuário de Bom Jesus dos Matosinhos, em
41
A cenografia barroca
criava todo um clima
Congonhas do Campo, Minas Gerais. Para esse espaço ele concebeu teatral para gerar empatia
66 figuras referentes aos Passos da Paixão. Esculturas em madeira com o espectador. A
igreja, quer na ação de
e de tamanho natural. Elas foram executadas por vários artesãos sob catequese, quer na de
a sua supervisão tendo o próprio artista esculpido somente algumas recuperar fiés através
da contra-reforma,
figuras principais.
muito se utilizou deste
artifício. A técnica foi
Em 1800 o artista foi convocado e contratado para os 12 profetas de bastante desenvolvida
pedra-sabão que ocuparam o adro do santuário. Os profetas podem visando a recaptura dos
fiéis evadidos graças a
ser vistos como um exemplo importante de cenografia barroca41 que
reforma protestante.
o artista propõe com seus recursos autodidatas (Figura 18).

67
Figura 18. Profeta Ezequiel. Antônio Francisco Lisboa. Minas Gerais. Domínio Público.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:EzequielProfeta.jpg

Quando se finalizou esse trabalho de confecção das esculturas dos


profetas, em 1805, o então requisitado e conhecido artista passou
a trabalhar cada vez mais raramente. Nos últimos tempos de vida
situam-se os altares de São João e Nossa Senhora da Piedade
(1807) e de Santa Quitéria e Santa Luzia (1808-1809) para a capela
de Nossa Senhora do Carmo, em Ouro Preto, bem como o risco da
fachada da matriz de Tiradentes, Minas Gerais feito em 1810.

Para termos a dimensão do impacto que seu trabalho passa a ter no


século XX nada como rememorar as palavras de Mário de Andrade
(1984, p. 41):

O Brasil deu nele o seu maior engenho artístico,


eu creio. Uma grande manifestação humana. (...).
Era de todo o único que se poderá dizer nacional,
pela originalidade das suas soluções. Era já um
produto da terra, e do homem vivendo nela, e era
um inconsciente de outras existências melhores de
além-mar: um aclimado, na extensão psicológica
do termo. (...). De fato Antônio Francisco Lisboa
profetizava para a nacionalidade um gênio plástico
(...). É a solução brasileira da Colônia. É o mestiço
e é logicamente a independência.

O século XVIII também viu surgir uma solução brasileira na pintura.


Exemplo dessa aclimatação ao contexto nacional, ele é (juntamente
com Aleijadinho) uma das duas figuras mais célebres do barroco

68
nacional. Trata-se de Mestre Ataíde (Figura 19) que, como o
Aleijadinho, conseguiu amadurecer e se adaptar ao ambiente de um
país tropical e dependente da Metrópole, ligando-se aos recursos
e valores regionais e constituindo-se em um dos primeiros grandes
momentos de originalidade nativa.

Figura 19. Mestre Ataide. O Batismo de Cristo (detalhe), Catedral de Mariana. Domínio
Público. Fonte: http://www.wikipaintings.org/en/mestre-ataide/baptism-of-christ

A marca de Manoel da Costa Ataíde, está evidenciada em diversas


pinturas e afrescos nos tetos e laterais de Igrejas mineiras. Fiel à
temática religiosa, seus santos, anjos e demais personagens tinham
como principal característica os inconfundíveis traços mestiços, bem
brasileiros. Ele buscava inspiração na Bíblia, nos missais e nos livros
piedoso que chegava da Europa, mas procurava personificar os
personagens com modelos retirados de seu entorno.

Como Aleijadinho e Ataíde, os principais artistas do barroco eram


considerados simples artesãos e homens de ofício. Com uma maioria
de mulatos eles, no máximo, conseguiam autorização oficial para
trabalhar. Somente os brancos e os bem estabelecidos recebiam o
título de mestre de ofício. Alguns pintores, pedreiros, carpinteiros,
arquitetos e entalhadores de grande criatividade e habilidade foram,
mais tarde, considerados artistas.

Pouco se sabe sobre sua vida e formação artística e nem todas


as suas criações estão documentadas, mas Ataíde deixou obra
considerável, espalhada em várias cidades mineiras. Contemporâneo
e parceiro de trabalho de Antônio Francisco Lisboa, Manuel da
Costa Ataíde era filho do capitão português Luiz da Costa Ataíde e

69
de Maria Barbosa de Abreu, de naturalidade possivelmente também
portuguesa. Nasceu na freguesia de Mariana e consta que sua família
era de condição modesta.

Poucas informações existem sobre sua formação. Sabe-se que ele foi
militar e que, artista, pode ter sido aluno de João Batista de Figueiredo
ou frequentado outros mestres estabelecidos na região de Minas.
Quem sabe iniciou, no melhor, estilo medieval, seus estudos numa
corporação de ofícios. O fato é que o pintor é responsável (além do
legado de um patrimônio respeitavel de pinturas) pela introdução de
um vocabulário onde as feições mestiças de seus personagens são o
reflexo do povo brasileiro.

Sobre algumas escolas barrocas


brasileiras

Anotações sobre a Escola Fuminense de


Pintura
Escola fluminense de pintura é o nome que se dá aos pintores em
Saiba Mais atividade na cidade do Rio de Janeiro no século XVIII. A designação
foi criada por Manuel de Araujo Porto-Alegre, considerado o pai da
42
A Missão Artística
de 1816 é o nome dado História da Arte Brasileira. Porto-Alegre escreveu sua Memória sobre
à equipe de artistas a antiga escola de pintura fluminense, que se constitui no primeiro
franceses recrutados
pelo regente D. João VI ensaio sobre a História da Arte brasileira que se conhece. Ele queria
através do embaixador chamar a atenção para certa unidade na produção pictórica no Rio
do Brasil em Paris, o
marquês de Marialva. Ela de Janeiro do século XVIII e assim mostrar que existia uma produção
foi constituída de artistas nativa antes da chegada dos artistas franceses da Missão de 181642.
descontentes com a
Restauração francesa. Até hoje, a historiografia ainda não conseguiu preencher as lacunas
De credo bonapartista,
eles não se sentiam
referentes a essa dita escola. Continua sendo difícil dar detalhes
mais a vontade (nem biográficos e estabelecer ligações entre os pintores. Por causa disso,
tinham mais mercado a composição do grupo varia um pouco de autor para autor. Vamos
de trabalho) sob o novo
regime. Chefiados por utilizar seu criador original como referência. Para Porto-Alegre os
Joachim Le Breton eles membros da referida escola eram oito: Frei Ricardo do Pilar (pintor
chegaram ao Brasil em
1816 com o objetivo sacro, um dos primeiros a atuar no Brasil e o mais antigo conhecido
inicial de fundar um Liceu a produzir no Rio de Janeiro), João Francisco Muzzi, João de Souza,
de Artes e Ofícios que,
Manuel da Cunha, Leandro Joaquim, Raimundo da Costa e Silva,
devido a questões de
ordem política, derivou Domiciano Pereira Barreto e José Vidal.
na posterior Academia
Imperial de Belas Artes do
Rio de Janeiro.

70
Anotações sobre a Escola Baiana
Os principais centros produtores do imaginário religioso setecentista
foi a Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Paraíba, Rio de Janeiro
e Maranhão. Aí, nesses centros urbanos, se formaram escolas
regionais, com características técnicas e formais específicas. A Bahia
abrigou uma escola bem desenvolvida e daí o seu estaque no cenário
barroco brasileiro.

Salvador, antiga capital, conservou o prestígio de centro do poder


político e administrativo até a transferência da capital para o Rio de
Janeiro, em 1763. A cidade foi um dos mais importantes pólos do
barroco brasileiro.

Entre as escolas brasileiras de imaginário barroco, a Bahia tem uma


produção remarcável. Não poderia ser de outra forma, tratando-se do
mais antigo e principal centro da administração religiosa na Colônia e
sede do primeiro bispado, instituído em 1554.

A condição de principal centro religioso do país rendeu a Salvador,


entre outros benefícios, uma situação de destaque na produção e
comércio de artigos religiosos. Ou seja: neste universo a confecção de
imagens sacras para o ritual católico ocupou uma posição destacada.
Foi uma produção em série que satisfazia o mercado de outras
regiões e que deixou uma marca, um estilo, no imaginário barroco
baiano.

Cerca de vinte escultores em atividade em Salvador no século


XVIII e outros tantos no século XIX atuaram naquela cidade. Entre
eles se sobressaiam nomes como o de Félix Pereira Guimarães e
de Francisco das Chagas (o Cabra) artista conhecido de forma oral
em Salvador. Quase nada se sabe sobre a vida daquele que o povo
apelidou de “O Cabra” além de seu nome e de seu apelido. Poucas
informações documentais. Entre os raros documentos figura o contrato
com a Ordem Terceira do Carmo de Salvador para a confecção de
três imagens da paixão do Cristo firmado em 1758.

No que diz respeito ao escultor Félix Pereira Guimarães, nascido


em Salvador por volta de 1736, onde também morreu em 1809, tudo
leva a crer que tenha sido o artista de seu ramo de maior destaque
naquela cidade na segunda metade do século XVIII. Entre as obras a
ele atribuídas figura o São Pedro esculpido em 1785 para o altar-mor
da igreja da Ordem Terceira do Carmo.

Outro artista importante da escola baiana é Manoel Inácio da Costa,

71
tido como discípulo de Félix Pereira Guimarães, caracterizando assim
a existência de uma escola. Ele nasceu em Salvador por volta de
1763 e morreu em 1857, com mais de 90 anos. Entre as obras que
lhe são atribuídas está o Senhor do Bom Caminho (Cristo Crucificado)
da Igreja do Pilar de Salvador, executado em 1834.

É, entretanto, indicado como chefe da escola baiana de escultura, o


mulato Bento Sabino dos Reis que, por sua vez, teve como discípulo
Domingos Pereira Baião, autor de grande número de imagens. A
maioria desses artistas ainda não foi estudada bem como é grande
a quantidade de trabalhos anônimos que constituem a produção
barroca baiana.

Anotações sobre a Escola Mineira


Minas teve a peculiaridade de ser uma área de povoamento mais
recente e peculiar, dadas as condições geográficas e formação
socio-econômica. Dessa forma pôde-se construir em estéticas mais
diferenciadas do resto do país. A região das Minas Gerais no período
colonial teve uma importância especial por sua riqueza e por ter sido
a meca do Brasil aventureiro e lugar de interesse da metrópole por
suas grandes jazidas de ouro e diamantes.

O ecletismo de seus habitantes tornaram a região eminentemente


urbana que se processou, segundo Lourival Gomes Machado
(1978:125), “através de uma “evolução urbana que acabou por soldar
um ao outro os núcleos primitivos (por sua vez alimentados pelos
arraiais dos primeiros anos de exploração mineira)”.

O barroco desenvolvido em Minas teve expressões importantes


na arquitetura, escultura e pintura. Na arquitetura destaca-se os
mestres Antônio Francisco Lisboa (o Aleijadinho) Pedro Gomes
Chaves, Antônio Pereira de Sousa Calheiros e Francisco de Lima
Cerqueira, entre outros. Suas características estilísticas distintas,
mais claramente expressas na arquitetura religiosa, se destacam nas
igrejas que proliferaram em grande número em todas as suas cidades.

Essas características distintas (do barroco do resto do Brasil) se


expressam em Aleijadinho. Juntamente com Cerqueira eles se
tornaram os arquitetos mais importante da região e de todo o barroco
brasileiro. O estilo também é chamado por alguns teóricos de
barroco-rococó ou simplesmente rococó. Suas obras são a súmula
das novidades que distinguem o barroco em Minas Gerais. Ou seja:

72
plantas que fugiam ao esquema básico do retângulo, aparecendo
como polígonos de formas ovais, campanários que ganham mais
independência em relação ao corpo da igreja e aberturas mais amplas
e com desenhos variados. Você Sabia?
43
Uma pintura
No que diz respeito à pintura, Mestre Ataíde é considerado um dos ilusionista diz respeito
maiores nomes e um divisor de águas na história do barroco mineiro. a um artifício do período
barroco utilizado pelo
Sobre seu aprendizado artístico supõe-se que o pintor tenha sido artista geralmente nos
aluno de mestres estabelecidos na região como João Nepomuceno tetos das igrejas. Também
chamada de trompe l ´oeil
Correia e Castro ou Antonio Martins de Silveira. Mestre Ataide
(engana o olho) ela quer
fez parte da terceira geração de pintores mineiros e seu trabalho transportar o espectador
aconteceu quando a riqueza do ouro e dos diamantes chegava ao fim. para a ideia de uma
dimensão superior na
O artista tornou-se notório por sua pintura de tetos. Pinturas qual os santos e os anjos
o esperam. A perspectiva
ilusionistas43, emolduradas por guirlandas e anjos. Elas mostram utilizada transporta o
cenas bíblicas, mártires e cenas do Cristo e de sua mãe. Ataide olhar para um “céu”
povoado de membros de
teve uma grande influência sobre os pintores de sua região. Teve sua corte.
alunos e seguidores que continuaram a fazer uso de seu método
de composição. Documentos da época fazem frequentemente
referências a ele como professor de pintura.

Na escultura atuaram artifices e artistas portugueses em seus


princípios. Entretanto, por volta de 1770, a produção regional passou
a ter características próprias. Alguns traços têm sido apontados como
típicos de Minas Gerais tais como uma maior individualidade nos
padrões e um maior dinamismo.

Um dos primeiros mestres de identidade conhecida em Minas Gerais


foi Francisco Xavier de Brito, de influencia marcante em toda a região
e que teria influenciado o próprio Aleijadinho, embora este seja de
longe o nome mais lembrado na escola mineira de escultura. Apesar
de uma atual maior notoriedade do Aleijadinho, outros artistas
escultores, entalhadores e pintores trabalharam com mérito no
barroco das Minas Gerais. O próprio Aleijadinho fez discípulos. Entre
eles seu meio-irmão o padre Félix Antônio Lisboa, o Mestre Piranga,
Mestre Cajuru, Mestre Sabará e Mestre Barão de Cocais cujas obras
estão sendo recentemente rastreadas.

Trabalhando dentro de uma sistema semelhante ao das Guildas


medievais, o conhecimento dos ofícios era passado de mestre para
aprendiz ou auxiliar. Muitos outros mestres e aprendizes devem ter
trabalhado e produzido na região. Eles estão sendo investigados.
Como exemplo dessas ações temos Garcia de Sousa, Vicente
Fernandes Pinto, Antônio da Costa Santeiro, Bento Sabino da Boa

73
Morte e Valentim Correia Paes. Mas as pesquisas ainda são raras e
incompletas e só o tempo e o desenvolvimento de uma consciência
Saiba Mais de pesquisa do nossso patrimônio cultural pode preencher essas
44
Um retábulo é uma lacunas.
construção de madeira,
mármore ou de outro
material usado para essa
função que fica por trás
ou em cima do altar de Sobre o Rococó
uma igreja. Normalmente O Rococó nasceu em Paris no reinado de Luis XV entre 1723 e 1774.
ele contém um painel
pintado ou esculpido em
Já ultrapassado na França ele continuou a ser vivido em outros países
baixo relevo. europeus como a Alemanha, a Áustria, e os países da península
ibérica e da Europa Central. A terminologia Rococó deriva-se da ideia
de conchas e seixos (rocailles). Como o termo barroco é explicado
pela associação com uma pérola de formato irregular. Foi um estilo
decorativo que ilustrou o momento de fausto e de superficialidade da
corte francesa pré-revolução.

No século XVIII, se ele se voltava mais para o mundo laico na Europa.


No Brasil, colônia portuguesa, o estilo se revelou, além de tardiamente,
com mais inspiração religiosa. Ele aconteceu principalmente na região
Saiba Mais das Minas Gerais. É chamado por alguns teóricos de barroco-rococó.
45
Um capitel é a peça
que fica na extremidade Junta arquitetura, pintura e escultura. Como características
superior de uma coluna. peculiares nós podemos ver que nele, por exemplo, os retábulos44
Está dividida em dórico,
são estruturados a partir de colunas com fuste45 liso ou estriado
jônico ou coríntio. Divisão
esta que remonta a arte e encimadas por capitéis46 coríntios que são sobrepostos por
grega. O capitel definia entablamentos entalhados em retículas. A pintura passa a ocupar
a ordem arquitetônica da
construção. todo o forro com grandes cenas ilusionistas, em perspectiva, que se
integram à estrutura arquitetônica ampliando monumentalmente a
noção de espaço interno. Ela sugere ao observador a ilusão de que
o teto se abre para uma visão celestial, rompendo assim o espaço
arquitetônico do templo.

No Brasil o estilo aparece principalmente em Minas Gerais. Em Ouro


Preto, Manuel da Costa Ataíde se aproximou do ilusionismo próprio
do Rococó com a pintura do forro da Igreja de São Francisco de Assis.
Saiba Mais A utilização de conchas, guirlandas, vasos, flores, mascarões, figuras
46
Um fuste é a própria humana e do culto católico angélicas faz com que o observador
coluna, um elemento tenha a tendência de percorrer todo o espaço e seja direcionado
vertical de apoio. O
por tais elementos ao tema central. Apesar de no Brasil o Rococó
fuste pode ser decorado
por caneluras (estrias não ter as mesmas motivações políticas e sociais ele também traz
finas). Também pode essa necessidade de decoração, de excesso de luxo, de riqueza e
ser decorado com cenas
variadas. de tempo para sua execução. Trabalham essa linguagem os mestres

74
Francisco Xavier de Brito e Antonio Francisco Lisboa. O estilo foi
substituído pelo Neoclássico.

O declínio do estilo Barroco e


a implantação do vocabulário
Neoclássico
Com a vinda para o Brasil da família real, em 1808, começou uma
nova era para a colônia mais rica de Portugal. A chegada da família
real portuguesa em terras brasileiras mudou a vida de sua principal
colônia que se tornaria, em 1815, a sede do Reino Unido do Brasil,
Portugal e Algarves. Era necessário, antes de qualquer coisa,
entretanto, dar uma nova feição de reino à colônia mantida isolada e
ignorante.

Fugitiva das tropas imperialistas de Napoleão Bonaparte a corte


portuguesa buscou refúgio além mar. Entretanto a sua presença
na capital da colônia, logo elevada à condição de sede do império
português, exatamente pela situação de pólo de desenvolvimento
em que o fato se constituía, tornou-se um chamariz para todos. As
atenções e os recursos eventuais voltaram-se para a capital enquanto
foi se estabelecendo, aos poucos, um processo de decadência, não
só econômica, mas também social, nos centros de mineração.

No continente europeu os tempos haviam mudado e a Revolução


Francesa tudo transformara. A partir dessa realidade, o estilo barroco
perdeu seu habitat, seu clima e suas condições psicológicas e sócio-
econômicas de desenvolvimento. A França era o referencial do mundo
ocidental e a arte ali produzida se aplicava como parâmetro para o
resto da Europa.

Portugal não fugiu a esse fascínio e nem bem medidas básicas foram
tomadas em relação ao novo status da antiga colônia (tais como
solucionar alguns problemas infraestruturais mais comprometedores)
o olhar do regente voltou-se para as artes. Para atualizar mais
uma vez o vocabulário artístico brasileiro com o europeu convidou-
se os representantes (já em desgraça na própria França onde o
estilo Neoclássico já estava sendo substituído pelo Romantismo
e Napoleão, o causador da fuga da família real, estava prisioneiro)
do neoclassicismo francês para introduzir essa nova linguagem no
país. Foi a chamada Missão Artística de 1816, composta de artistas
daquele país que haviam caído em desgraça com a Restauração.

75
Em 26 de março de 1816 aportou no Rio de Janeiro um grupo de
artistas franceses, liderados por Joachim Lebreton, secretário
recém-destituído do Institut de France. Também descontentes com a
desgraça de Napoleão vieram com ele o pintor histórico Jean Baptiste
Debret, o pintor de gênero Nicolas Antoine Taunay e seu irmão
o escultor neoclássico Auguste Taunay. Vieram ainda o arquiteto
Grandjean de Montigny e o gravador de medalhas Charles-Simon
Pradier entre outros. O objetivo inicial era a criação de uma Escola
de Artes e Ofícios, mas que após vários percalços que estudaremos
em outra oportunidade criou-se a primeira Academia de Arte no Reino
Unido de Portugal, Brasil e Algarves que posteriormente recebeu o
nome de Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro.

Urgia esquecer o luxo faustoso do ciclo do ouro bem como o atraso


da colônia (agora capital) em relação aos parâmetros europeus. O
barroco passou então a ser esquecido e mesmo difamado, aqui e
alhures, sendo tido como uma arte decadente, de mau gosto, feia.
O seu clima, atmosfera e espírito estavam superados no plano da
política, religião, e da economia.

Aqui chegando, a Missão Artística Francesa encontrou uma arte


distinta dos originários modelos portugueses. Os artistas, todos de
origem popular, mestiços em sua maioria, eram vistos pelas camadas
superiores como simples artesãos. O fato de eles terem conseguido
quebrar a uniformidade do modelo importado barroco de importação
apresentando contribuição no sentido de estabelecer uma produção
artística brasileira não foi levado em consideração.

Dessa maneira nada mais natural de que uma concepção de arte


popular, ligada ao inculto, ao bárbaro, ao primitivo, ao colonial, ser
substituída por uma estética artística de origem burguesa politicamente
em sintonia com as próprias mudanças que se processavam na
Europa onde os excessos absolutistas pertenciam a um passado.
Por outro lado o instinto novidadeiro provinciano contribuiu para
a ideia lisonjeira de que essa atualização estilística fazia com que
arte burguesa, pela primeira vez, se tinha um estilo artístico em
sintonia com o que estava acontecendo na Europa hegemônica. A
sistematização do ensino artístico em um contexto onde até então
havia vigorado o sistema medieval das Guildas foi pouco a pouco
introduzindo um novo vocabulário em terras brasileiras.

Nesse clima de superação de um momento por outro, no Brasil,


muita coisa caiu em ruínas pelo abandono e muito mais foi destruído

76
friamente por conta da visão estética da época bem como por conta
da eterna falta de memória que ainda acomete a cultura brasileira.
Dessa forma, o acervo artístico barroco quando sobreviveu deveu-se
ao esquecimento ou a sorte. Nos locais onde urgia a reurbanização
ele foi impiedosamente destruído e, mesmo entre as ordens religiosas
mais conservadoras, o patrimônio não restou incólume. Alguns bispos
resolveram “atualizar” seus altares e edificações e muita construção
barroco foi substituído pelo estilo neoclássico então em moda e muitos
párocos de pequenas províncias trocaram seus santos barrocos
pequenos e “velhos” de madeira por obras imensas e reluzentes em
gesso.

Não vamos aqui analisar o que de bom trouxe esse novo momento
para a antiga colônia. Para isso temos outro espaço, outro capítulo
da História da Arte Brasileira. Vamos apenas tomar emprestado as
palavras de Pietro Maria Bardi (1989, p. 24) para colocar rapidamente
o que analisaremos depois:

Com Aleijadinho ainda em cena, imaginou-se o


convite à Missão para remediar as demais práticas
religiosas, tentando se adaptar ao que a Europa
estava desenvolvendo no recinto cultural, sabendo-
se que Portugal tinha barrado qualquer iniciativa,
até a mais modesta, conseguindo manter os povos
conquistados na escuridão da ignorância.

Nesse sentido a Missão Artística Francesa foi um avanço no que diz


respeito a abertura colonial para o mundo exterior. Por outro lado,
de qualquer jeito os santeiros continuaram a produzir ainda durante
algum tempo até que a academia tomou conta do mercado e a
linguagem barroca foi solenemente esquecida até que os modernistas,
com os nativos apoiados no olhar estrangeiro de Blaise Cendrals, se
interessaram pelo patrimônio em ruínas.

Algum tempo depois isso se repetiu novamente quando Germain


Bazin resgatou o imaginário barroco colonial e apontou o Aleijadinho
como um Michelangelo tropical. Sobre esse olhar modernista Cristina
Ávila Santos (1986, p. 173) comenta em seu artigo Modernismo em
Minas literatura e artes plásticas: um paradoxo, uma questão em
aberto: “O francês Blaise Cendrals, especialmente, vai se identificar
profundamente com Minas, com sua arte barroca ainda pouco
louvada, e especialmente com Aleijadinho”. Em síntese: no Brasil é
sempre o olhar estrangeiro que nos faz olhar para nós mesmos. Uma
relação de centro e periferia que se perpetua aos dias que correm.

77
Sobre os artistas citados no capítulo
●● Manuel de Araújo Porto Alegre: Pintor, caricaturista, arquiteto,
crítico e historiador de arte, professor e escritor, ele nasceu em
Rio Pardo – Rio Grande do Sul em 1806 e faleceu em Lisboa,
Portugal em 1879. No Brasil teve aulas com Debret e Grandjean de
Montigny, ambos membros da Missão Artística Francesa de 1916.
Em 1831 acompanhou Debret em seu retorno a Europa. Em Paris,
frequentou o ateliê do Barão Jean-Antoine Gros (1771 - 1835) e
a École National Superiéure des Beaux-Arts. Ele fundou e dirigiu
os periódicos denominados Minerva Brasiliense (1843) e Lanterna
Mágica (1844) que foi primeira revista ilustrada com caricaturas.
Dirigiu também a revista Guanabara (1849). Considerado o
fundador da história e da crítica de arte brasileira Porto Alegre
escreveu diversos artigos, como Memória sobre a Antiga Escola
Fluminense, publicado no ano de 1841. Diretor da Academia
Imperial de Belas Artes, entre 1854 e 1857, promoveu uma série
de reformas no currículo e nos métodos de ensino da academia.
Em 1860 iniciou uma carreira diplomática no exterior e, no ano
de 1874, o imperador D. Pedro II conferiu-lhe o título de Barão de
Santo Ângelo.

●● Joachim Lebreton (ou Le Breton), nasceu na França em 1760 e


faleceu no Rio de Janeiro em 1819. Professor e administrador, no
contexto da Revolução Francesa, ele tornou-se membro do Institut
de France e Secretario Perpétuo das Belas Artes do Ministério do
Interior. Com a Restauração foi afastado de seu cargo e aceitou
convite de Marialva para chefiar a equipe francesa que viria
trabalhar no Brasil e que aqui chegou em 1816. Faleceu no Brasil
deixando órfãos os outros membros que o acompanharam a essa
viagem para terras desconhecidas.

●● Frei Ricardo do Pilar: O religioso nasceu em Colonia, Alemanha


em 1635 e faleceu no Rio de Janeiro em 1700. Transferiu-se para
o Brasil na segunda metade do século XVII. O nome do artista
é citado pela primeira vez nos registros da ordem beneditina da
cidade do Rio de Janeiro. Durante o período em que residiu no
Brasil responsabilizou-se pela execução de um grande número de
pinturas para a ornamentação de edificações religiosas entre as
quais as do Mosteiro de São Bento na cidade do Rio de Janeiro.
Manuel de Araujo Porto-Alegre o coloca como precursor da Escola
Fluminense de Pintura.

●● Giotto de Bondone: O artista renascentista nasceu na Itália em

78
1267 e lá faleceu em 1337. Foi discípulo de Giovanni Cimabue, o
maior pintor da Itália no fim do século XIII. Revolucionou a pintura
ao criar a noção de tridimensionalidade bem como pelo fato de
assumir a autoria de suas criações. Abandonou a rigidez bizantina
e dotou suas figuras de volume e sentimento, expressando assim,
por meio da arte, o humanismo próprio da Renascença.

●● Cimabue (Bencivieni di Pepo): O artista nasceu por volta de 1250


em Florença. Desde a infância interessou-se pelo desenho. Num
momento em que a arte italiana estava estática e voltada para um
estilo bizantino, Cimabue conseguiu renová-la levando-a para uma
dimensão moderna. Cimabue morreu, em 1302, possivelmente em
Pisa, Itália.

●● José de Oliveira Rosa: Pintor da chamada Escola Fluminense de


Pintura, trabalhou no Rio de Janeiro onde nasceu (cerca de 1690)
e faleceu em 1769. Sabe-se que pintou um grande painel alegórico
para a sala de audiências do Palácio dos Vice- Reis e retratos e
painéis para várias igrejas.

●● João Francisco Muzzi: artista italo-brasileiro nasceu na Itália, no


século XVIII, em data desconhecida. Lá morreu em 1802. Pintor
e cenógrafo foi talvez aluno de José de Oliveira Rosa estando na
Escola Fluminense de Pintura citada por Manuel de Araujo Portro-
Alegre.

●● João de Souza Pintor da Escola Fluminense de Pintura. Nasceu


e morreu no século XVII no Brasil. Pouco se sabe sobre ele.
Pesquisas estão sendo feitas para elucidar sua vida bem como seu
trabalho.

●● Manuel da Cunha e Silva: O artista nasceu no Rio de Janeiro


em 1737 onde faleceu em 1809. Segundo alguns autores ele era
escravo. Sua habilidade precoce para a arte fez com que seu
senhor lhe permitisse ter aulas com o pintor João de Souza. Após
um período de aperfeiçoamento em Lisboa retornou ao Rio onde,
ajudado, comprou sua alforria e abriu um cirso de pintura. Foi pintor
de temas religiosos e retratista.

●● Valentim da Fonseca e Silva: O artista foi mais conhecido como


Mestre Valentim. Nasceu em Minas Gerais em 1745, falecendo
na cidade do Rio de Janeiro em 1813. Ele foi um dos principais
artistas da colônia atuando como escultor, entalhador e urbanista
na cidade do Rio de Janeiro. Em 1748, foi levado por seu pai a
Portugal, onde aprendeu o ofício de escultor e entalhador. Retornou

79
ao Rio de Janeiro e, por volta de 1770, abriu uma oficina no centro
comercial. Pertenceu à Irmandade dos Pardos de Nossa Senhora
do Rosário e de São Benedito.

●● Jacques Louis David: o artista nasceu em Paris em 1748 e faleceu


em 1825. Discípulo de Joseph-Marie Vien, artista que propunha o
retorno à antiguidade clássica. Em 1774, David ganhou o Prêmio
de Roma, que lhe permitiu uma permanência de vários anos
naquela cidade. Logo se tornou o mais entusiasta defensor do
neoclassicismo, influenciado pela contemplação dos monumentos
antigos e pelas doutrinas de dois alemães: o pintor Änton Raphael
Mengs e o historiador Johann Joachim Winckelmann. AA pintura
neoclássica de David dominou o panorama artístico francês
durante quase meio século, fazendo com que ele, acima das
contingências políticas, fosse o pintor oficial da revolução francesa
e, depois, do regime de Napoleão Bonaparte. Seu lado político
também se destacou. Ele, adepto incondicional das ações dos
revolucionários chegou, durante o período do terror, a desenhar a
ida para a guilhotina de Maria Antonieta.

●● Johan Joachim Winkelmann, nasceu na Alemanha em 1717 e


faleceu em 1766. Historiador de arte alemão e arqueólogo. Teve
profunda influência sobre o surgimento do movimento neoclássico
no final do século XVIII. Foi o fundador da arqueologia moderna
e com seus escritos despertou o olhar ocidental para o belo ideal
que só seria encontrado na estatuária Greco clássica.

●● Anton Raphael Mengs: o pintor nasceu na Alemanha em 1728


e faleceu em Roma em 1779. Filho de pintor tornou-se um dos
mais respeitados pintores de sua época e um dos precursores
do Neoclassicismo. Foi inicialmente pintor da corte em Dresden,
mas partiu para Roma onde se tornou célebre. Posteriormente foi
convidado para trabalhar em Madri onde se tornou pintor do rei.

●● Pompeo Girolamo Batoni: o artista italiano nasceu na cidade de


Lucca em 25 de janeiro de 1708 e faleceu em Roma em 1787.
Mudou-se para Roma em 1727 onde tornou-se discípulo de
Sebastiano Conca. Já no início da década de 1740 ele recebeu
suas primeiras encomendas. Foi bastante prestigiado como
profissional em Roma.

●● Charles Percier, foi um arquiteto, decorador de interiores e


designer francês de estilo neoclássico. Nasceu em 1764 e faleceu
em 1838. Teve uma parceria com Fontaine amigo dos tempos
de estudante. Juntos, eles foram os inventores e os proponentes

80
principais dos monumentos hoje chamados estilo diretório ou estilo
Império.

●● Pierre François Léonard Fontaine: colega de Percier ele foi


também um arquiteto frances e design de interiores. Nasceu em
Pontoise, França, em 20 de setembro de 1762 e faleceu em Paris
em 10 de outubro de 1853. Foi o grande desenhista (junto com
Percier) do Estilo Império.

●● Vincenzo Camuccini: pintor italiano neoclássico, o artista nasceu


em 1771 e faleceu em 1844. Nasceu em Roma e foi educado
por seu irmão Pietro que era um restaurador. Foi discípulo de
Domenico Vorvi. Até os trinta anos, dedicou-se principalmente a
copiar antigos mestres. Trabalhou em Munique e em Paris além de
Roma.

●● Giuseppe Valadier: o artista foi um dos grandes nomes do estilo


Neoclássico na Itália onde nasceu em Roma em 14 de abril de
1726. Foi arquiteto, design, urbanista, professor e arqueólogo.
Ensinou arquitetura na Academia de San Lucca.

●● Benvenuti, Pietro: pintor da escola neoclássica italiana o artista


nasceu em 1769 e faleceu em 1844. É o autor dos famosos
afrescos do Palácio Pitti.

●● Joaquim Machado de Castro, nasceu em Coimbra, Portugal em


1731 e morreu em Lisboa em 1822. Foi um renomado escultor
barroco português.

●● Felix Pereira Guimarães, foi um dos principais escultores barrocos


baianos. Nasceu em 1734 e faleceu em 1809. Entre seus trabalhos
estão as estátuas de São João e Santa Maria Madalena, para a
Igreja dos Carmelitas. Pertenceu a uma família de renomados
artistas baianos. Tudo leva a crer que tenha sido o escultor de
maior destaque em Salvador na segunda metade do século XVIII.
Entre as obras que lhe foram atribuídas, documentalmente, figuram
as imagens de São João e Maria Madalena, executadas em 1777-
78 para a Ordem Terceira do Carmo.

●● Manuel Inácio da Costa considerado por alguns teóricos como


o maior escultor baiano do Século XVIII, Manuel Inácio da Costa
(1763 – 1857) esculpiu imagens em madeira pintadas. São a ele
atribuídas esculturas como o “Cristo” (Museu de Arte Sacra); “São
Pedro de Alcântara” que se encontra na Igreja de São Francisco e
“São Domingos” (1833), Igreja da Ordem Terceira.

●● Michelangelo Buonarroti (Miguel Ângelo di Lodovico Buonarroti

81
Simoni), nasceu na cidade de Capresse, Itália, no dia 6 de
março de 1475. Teve por mestre, Domenico Girlandaio que
posteriormente encaminhou-o para a cidade de Florença, para
aprender na escola patrocinada pelo mecenas Lorenzo de
Médici. Michelangelo trabalhou e viveu em pleno ambiente físico
e cultural do Renascimento italiano. Seu temperamento irônico e
sua impaciência com a mediocridade e com a lentidão dos colegas
lhe valem hostilidades. Lourenço de Medici, também chamado
de o Magnífico, morreu em 1492. Michelangelo deixou o palácio.
Escultor, ele fez poucas obras de pintura. Em 1505, Michelangelo
foi chamado a Roma pelo Papa Júlio lI. Deve responder a novo
capricho de Júlio II: decorar a Capela Sistina. Resolveu pintar
não só a cúpula da capela, mas também suas paredes. É
considerado um dos maiores escultores do mundo com obras
como o Davi (em Florença) ou a Pietà (em Roma), de sua autoria
que são a expressão máxima do Renascimento italiano. Pintor por
necessidade produziu obras primas. Morreu em Roma em 1564.

●● Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho Nasceu em Vila Rica,


atual Ouro Preto, Minas Gerais, em 1730 e faleceu em 18 de
novembro de 1814. Filho natural de Manuel Francisco da Costa
Lisboa, arquiteto português e de uma escrava de nome Isabel. Ele
somente foi libertado na ocasião de seu batismo. Escultor, arquiteto,
entalhador. É considerado o mais importante artista brasileiro do
período colonial. A principal fonte documental sobre o Aleijadinho
é uma nota biográfica escrita, em 1858, por Rodrigo José Ferreira
Bretas. Segundo esse primeiro biografo o conhecimento que o
garoto nascido escravo (e depois alforriado por seu pai) tinha de
desenho, arquitetura e escultura foi obtido junto ao seu pai ou (e)
com o pintor que vivia na região das minas João Gomes Batista.
Toda sua obra, entre talha, projetos arquitetônicos, relevos e
estatuária, foi realizada em Minas Gerais onde viveu e morreu.

●● João Gomes Batista Medalhista e pintor português. Quase nada


se sabe desse artista que ficou na história como possível professor
de Aleijadinho. Apenas que era empregado como abridor de
cunhos na casa da fundição de ouro em Vila Rica, Minas Gerais.

●● Pedro Américo de Figueiredo, nasceu em Areia, Paraíba em


1843 e faleceu em Florença, Itália, em 1903. Pintor, desenhista,
professor, caricaturista, escritor. Antes de completar dez anos
acompanhou como desenhista auxiliar, a expedição científica do
naturalista francês Jean Jacques Brunet pelo interior do Nordeste

82
do Brasil. Mudou-se, patrocinado pelo imperador Pedro II, para o
Rio de Janeiro, onde estudou no Colégio Pedro II. No ano seguinte,
conseguiu se matricular na Academia Imperial de Belas Artes.
Entre 1859 e 1864, com bolsa concedida pelo imperador estudou
na Escola Nacional Superior de Belas Artes de Paris, França.
Mais ou menos durante esse período ele também se formou em
ciências pela Universidade de Bruxelas onde passou em concurso
para lente daquela instituição. Foi professor posteriormente da
Academia Imperial de belas Artes onde ensinou as disciplinas
Desenho Figurado e Estética, História da Arte e Arqueologia.
Viveu entre Florença (Itália) e Brasil, ficando a maior parte de
sua vida naquela cidade italiana. Pintor, arqueólogo, escritor,
poeta, caricaturista, professor, político e homem de ciências ele
encarnou o ideal do intelectual do século XIX. Seu trabalho em
pintura obedece ao Romantismo já decadente na Europa, mas
revolucionário no Brasil. Um de seus trabalhos mais conhecidos é
Independência ou Morte, feito para o Salão de Honra do Museu do
Ipiranga e que atualmente está no Museu Paulista da Universidade
de São Paulo. A maioria de suas obras históricas, que serviram
para a solidificação de uma imagem civilizada do Brasil durante o
segundo reinado, se encontra no Museu de Belas Artes, no Rio de
Janeiro.

●● Mestre Ataide (Manoel da Costa Athaide), nasceu em Mariana


em Minas Gerais em 1762 e faleceu naquela cidade em 1830.
Pintor, dourador, entalhador. É considerado importante artista do
barroco mineiro. Suas obras mais destacadas são as pinturas na
Igreja da Ordem Terceira de São Francisco de Assis de Ouro
Preto, realizadas entre 1801 e 1812; e as do forro da capela-
mor da Igreja Matriz de Santo Antônio na cidade de Santa
Bárbara, de 1806; o painel A Última Ceia, no Colégio do Caraça,
executado em 1828; a pintura do forro da capela-mor da Igreja
Matriz de Santo Antônio, na cidade de Itaverava, de 1811, e a do
forro da capela-mor da Igreja de Nossa Senhora do Rosário de
Mariana, de 1823.

●● Leandro Joaquim: Artista da Escola Fluminense de Pintura


estabelecida por Porto Alegre, Leandro Joaquim teria, segundo
Teixeira Coelho, sido aluno de João de Souza. Pintor e arquiteto,
ele apresentou um projeto para a reconstrução do Recolhimento
do Parto. Também segundo Coelho, não é impossível que tivesse
sido cenógrafo no Teatro de Manuel Luís. É autor de três pinturas
que pertenceram à Igreja do Morro do Castelo e que hoje se

83
encontram, respectivamente, na Igreja de São Sebastião, do painel
de Nossa Senhora da Boa Morte (na igreja de igual nome) e do
Retrato de Dom Luís de Vasconcelos entre outros trabalhos.

●● Raimundo da Costa e Silva, também membro da Escola


Fluminense de Pintura, ele atuou no Rio de janeiro no século XVIII.
Pintor, escultor e entalhador ele aprendeu seu ofício com seu pai.
Deixou obras de escultura no Convento de Santa Tereza e na
Capela do Livramento. Como pintor deixou obras em várias igrejas.
Entre elas: a de Nossa Senhora Mãe dos Homens, Ordem Terceira
do Carmo e a de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte.

●● Domiciano Pereira Barreto: membro da Escola Fluminense de


pintura. Citado por Manuel de Araujo Porto-Alegre. Pouco se sabe
sobre sua biografia. Atuou no Rio de janeiro durante o século XVIII.

●● José Vidal: O artista, atuante no Rio de Janeiro no século XVIII,


também fez parte da Escola Fluminense de Pintura levantada por
Porto Alegre. Sua obra ainda vem sendo pesquisada.

●● Manuel Dias de Oliveira Brasiliense (O Romano): Pintor e


professor, o artista nasceu na Vila de Santana do Macacu, Rio de
Janeiro, a 22 de dezembro de 1763 e faleceu em Campos, no Rio
de Janeiro, a 25 de abril de 1837. No Rio de Janeiro, começou
a aprender ourivesaria, mas a preteriu pelo desenho. Foi para
Portugal, patrocinado por um mecenas português, onde estudou.
Aperfeiçoou-se em seguida com Pompeo Battoni, na Academia de
San Lucca de Roma de onde lhe vem o apelido de “O Romano”.
Foi professor e especializou-se em naturezas mortas e trabalhos
decorativos. Com a chegada dos artistas franceses, da colônia
de Lebreton (1816), a sua notoriedade sofreu seriamente. A
sistematização do ensino no país dentro dos moldes franceses,
não contribuiu para a permanência de outro tipo de formação.

●● José Leandro de Carvalho: Pintor da antiga Escola Fluminense


de Pintura, nasceu em Muriqui, Distrito de Itaboraí, em torno de
1770 e faleceu no Rio de Janeiro em 1889. Desde jovem mostrou
sua vocação artística o que o fez dirigir-se para o Rio de Janeiro,
onde começou a estudar desenho com um artista chamado
Manuel Patola. O início de sua carreira foi como pintor de painéis
para igrejas. Fez retratos da corte portuguesa no Rio de Janeiro
(Dona Maria e D. João VI). Pintou cenário para o teatro São João
e trabalhou em um retrato da família real e temas sacros para o
Mosteiro de São Bento.

84
●● Francisco das Chagas (o Cabra), quase nada se sabe sobre este
artista da escola baiana. Seu nome está mais ligado à tradição oral
em Salvador que o situa como um mulato, escultor e talentoso.
Como informação documental pode-se citar um contrato com a
Ordem Terceira do Carmo datado de 1758 para a confecção de
três imagens da paixão de Cristo. Seu nome está mais ligado ao
imaginário baiano que a um estudo documental.

●● Bento Sabino dos Reis, nascido em Salvador no século


XVIII, faleceu em 1843 na mesma cidade. Segundo o artista
e pesquisador Manoel Querino, é de autoria do artista mulato
algumas imagens da Ordem Terceira do Carmo, Igreja de São
Francisco, Matriz de Santana, Igreja de São Francisco de Paula e
Convento da Soledade. Seria dele também a imagem que iniciou,
em Salvador, a devoção ao Senhor dos Passos dos Humildes. Ou
seja, este artista da escola baiana é também um dos muitos quase
anônimos que trabalharam no barroco colonial brasileiro.

●● Domingos Pereira Baião: O artista, escultor da escola baiana,


nasceu em Salvador em 1826 e lá faleceu em 1871. Discípulo
de Bento Sabino dos Reis ele é autor de um grande número
de imagens espalhadas em igrejas de Salvador e do interior do
Estado.

●● Pedro Gomes Chaves Engenheiro militar, trabalhou como


arquiteto em Minas Gerais. Introduziu inovações importantes na
Matriz do Pilar em Ouro Preto, tais como uma planta retangular,
mas cuja talha interna redefine o espaço na forma de um decágono.

●● Antônio Pereira de Sousa Calheiros: arquiteto português, da


cidade de Braga. Não se tem a data exata do seu nascimento.
António Pereira de Sousa Calheiros encontrava-se no Rio de
Janeiro no ano de 1732, ou 1733. Do Rio de Janeiro mudou-se
para Minas Gerais. Suas obras mais conhecidas são as igrejas do
Rosário dos Pretos (de Ouro Preto) e S. Pedro dos Clérigos, de
Mariana.

●● Francisco de Lima Cerqueira, nasceu em Portugal em data


desconhecida de onde veio para o Brasil e foi exercer sua profissão
de arquiteto em Vila Rica. São do ano de 1771 os registros de
seus mais antigos trabalhos ali realizados: as obras do pórtico,
dos arcos do coro e do lavatório da sacristia da Igreja de N. S.
do Carmo. Foi contratado epela Vila de São Joao del Rey para a
construção da Igreja de São Francisco de Assis, que teve início em
1742 e foi finalizada em 1749. Para esta edificação, ele elaborou

85
novos riscos e executou entalhes em cantaria que a tornaram
um dos monumentos barroco-rococó mais importantes do Brasil.
Permaneceu a maior parte de sua vida naquela cidade sendo o
responsável pelas obras das igrejas de São Francisco e Nossa
Senhora do Carmo.

●● João Nepomuceno Correia e Castro: pintor da Escola Mineira,


o artista nasceu na cidade de Mariana em data desconhecida e
faleceu no mesmo local em 2 de janeiro de 1795. Trabalhou com
pintura e decoração nas igrejas barrocas de Minas Gerais. Suas
primeiras obras registradas foram realizadas na Igreja Nossa
Senhora do Rosário e na Sacristia do Santuario do Bom Jesus de
Matosinhos. Também fez o projeto dos altares laterais da Igreja
da Ordem terceira de Nossa senhora do Carmo situada em Ouro
Preto. Dentro da hierarquia docente da escola mineira ele ensinou
dois outros mestres: Francisco Xavier Gonçalves e Bernadino de
Sena.

●● Antônio Martins da Silveira: artista de nascimento e morte


desconhecidos, ele foi um pintor brasileiro do século XVIII. Seus
trabalhos conhecidos estão localizadas nas igrejas de Nossa
Senhora das Merces e Perdões em Ouro Preto e na Ordem Terceira
de Nossa Senhora do Carmo, em Mariana. Também encontramos
trabalhos de sua autoria no Seminário Menor e Capela de Nossa
Senhora da Boa Morte em Mariana, Minas Gerais.

●● Francisco Xavier de Brito: escultor e entalhador barroco de origem


portuguesa o artista nasceu em Lisboa em data desconhecida e
faleceu em Ouro Preto em 1751. Foi responssável pela confecção
de diversas talhas para igrejas barrocas da região.Entre elas
podemos citar: a talha feita para seis altares da Igreja da ordem
terceira de São Francisco da Penitência no Rio de Janeiro (que
ele fez logo quando chegou ao Brasil, entre 1735 e 1738, antes
de se mudar para Minas gerais). Em Minas ele executou talha
para a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, Igreja Santa
Ifigênia (Ouro Preto e Igreja Matriz de Nossa senhora do Pilar. Sua
obra caracteriza-se pela presença de incontáveis querubins que
rodeiam os medalhões.

●● Felix Antonio Lisboa: meio Irmão de Antonio Francisco Lisboa, o


Aleijadinho. Seu pai Foi um dos grandes mestres construtores na
Vila Rica. Nasceu em 11 de junho de 1755. Logo após o falecimento
do pai de ambos, o Aleijadinho recebeu a incumbência de cuidar
do seu irmão mais novo e o iniciou na profissão de mestre santeiro

86
fazendo-o seguir também a carreira eclesiástica. Foi ordenado
em 1778. Em 1787 executou os riscos da talha da Capela Mor da
Igreja do Carmo em Mariana, Minas Gerais. No início de 1800, o
Padre Félix se encontrava no povoado de Bacalhau onde várias
obras suas se encontram documentadas. Entre elas as imagens
de São Pedro e São Paulo, Nossa Senhora das Dores e as duas
imagens do Bom Jesus de Matosinhos.

●● Mestre Piranga, seu verdadeiro nome permaneceu desconhecido.


A identidade de Mestre Piranga intriga pesquisadores há décadas.
Atuou na igreja de São Francisco de Assis, em Mariana. Entalhador.
As peças de Mestre Piranga foram encontradas no vale do rio
Piranga, em Minas Gerais. “Mestre” poderia revelar a função que
exerceria naquela estrutura de ofício.

●● Mestre Cajuru (Mestre do Cajuru): O Mestre do Cajuru trabalhou


na Comarca do Rio das Mortes, possivelmente na 2ª metade do
século XVIII. De identidade desconhecida faz parte dos mestres
que estão sendo pesquisados por estudiosos do barroco mineiro.

●● Mestre de Sabará, também sem maiores dados biográficos o


mestre se destaca para os estudiosos do barroco (e pela equipe do
IPHAN) por ter sido uma espécie de discípulo do Aleijadinho. Várias
de suas imagens ainda se encontram na Igreja de São Francisco
em Minas Gerais, entre as quais a padroeira Nossa Senhora dos
Anjos, o orago são Francisco e um Senhor Morto extremamente
expressivo.

●● Mestre de Barão dos Cocais: outro mestre que recebeu possíveis


influências de Aleijadinho e que faz parte da Escola Mineira.
Trabalhou possivelmente na hoje cidade Barão dos Cocais e daí
seu nome. Poucas pesquisas existem envolvendo seu trabalho.

●● Garcia de Souza: mestre escultor de Minas Gerais. Pouco se sabe


sobre ele. Algumas obras começam apenas a serem identificadas
pelas pesquisas atuais. Como com seus colegas artesãos, ainda
perdura a condição de anonimato ou de insuficiência de dados
documentais.

●● Vicente Fernandes Pinto: mestre escultor que trabalhou em


Minas Gerais. Como tantos outros escultores barrocos brasileiros
ele ainda vem sendo pesquisado pelos poucos estudiosos
interessados nesta área de estudos.

●● Antônio da Costa Santeiro: mestre escultor do barroco mineiro,


atuando em Minas Gerais. Sua obra e sua vida estão sendo

87
pesquisados. Consta que foi um dos autores do Órgão da Matriz
de Santo Antônio de Tiradentes.

●● Bento Sabino da Boa Morte: escultor da Escola Mineira viveu


e trabalhou em Araxá para onde teria chegado em fins do século
XVIII proveniente de São João del Rey. Faleceu em 1857. Na
Igreja de São Sebastião, naquela cidade, existem 12 imagens
documentadas de sua autoria.

●● Valentim Correia Paes, nasceu na atual cidade de Tiradentes em


Minas Gerais. Escultor da Escola Mineira tem imagens em São
João del Rey documentadas de sua autoria. Não foi um homem de
posses.

●● Blaise Cendrals Pseudônimo de Frédéric Sauser, foi um


escritor francês de origem suíça que nasceu em 1887 e faleceu
em 1961. Crítico, fundador de revistas, poeta e romancista, Blaise
Cendrars viveu em São Petersburgo, Nova Iorque, Londres e na
Suíça, visitou grande parte do mundo, combateu na Segunda
Guerra Mundial sendo, enfim, um dos poetas mais cosmopolitas
do nosso tempo. No Brasil exerceu importante papel junto ao
grupo modernista envolvido com a Semana de Arte Moderna de
1922. Viajando a Minas com o grupo se interessou pelo patrimônio
barroco brasileiro chamando a atenção dos modernistas para a
sua importância e o seu esquecimento.

Revisão
A linguagem barroca testemunhou a realidade colonial em seus vários ciclos de riquezas,
proporcionados pela produção de açúcar, fumo e madeiras nos séculos XVI e XVII e
pela atividade de mineração durante todo o século XVIII e princípios do XIX. Atuando
como veículo de catequese e de controle estatal, este imaginário barroco se refletiu nas
regiões brasileiras que mais se destacaram na produção de riqueza. As construções
de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco são exemplos da utilização dos
recursos coloniais para a exaltação da fé e do poder do Estado.

No final do século XVII, entretanto, as exportações do açúcar brasileiro (produzido


nos engenhos do Nordeste) começaram a diminuir. Urgia nova fonte de renda. Os
bandeirantes proporcionaram a descoberta de minas de ouro nas regiões que hoje
correspondem a Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. O tão sonhado ouro por fim fora
achado nos fins daquele século XVII.

A corrida do ouro se iniciou. Com ela uma mistura de pessoas heterogêneas que se
cruzando em um mesmo ambiente deu início a uma nova sociedade. Uma sociedade
burguesa formada por brancos portugueses, negros escravos, índios e outros imigrantes
e aventureiros.

88
Nas regiões auríferas, várias cidades cresceram e muitas surgiram neste período. A
vida dinamizou-se aumentando as atividades comerciais, sociais e de trabalho. Teatros,
escolas, igrejas e órgãos públicos foram criados. Vila Rica (atual Ouro Preto), Mariana,
Tiradentes e São João Del Rey foram algumas das cidades que mais se desenvolveram
nesta época. Nesse ambiente tornou-se possível o surgimento de um movimento artístico
e cultural sem precedentes no Brasil. É a glória, o apogeu barroco.

Nesse contexto alguns nomes de artistas se destacam. Entre eles o de Antônio Francisco
Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho, que nasceu por volta de 1730 na cidade de Vila
Rica. Pouco se sabe com certeza sobre sua biografia. Praticamente todos os dados hoje
disponíveis sobre sua vida são derivados de uma biografia escrita em 1858 por Rodrigo
José Ferreira Bretas, que baseou seus dados biográficos em documentos e depoimentos
de indivíduos que haviam conhecido pessoalmente o artista. Toda sua obra, entre talha,
projetos arquitetônicos, relevos e estatuária, foi realizada em Minas Gerais, especialmente
nas cidades de Ouro Preto, Sabará, São João Del Rey e Congonhas. É considerado pela
crítica brasileira quase em consenso como o maior expoente do barroco colonial brasileiro.

O barroco no Brasil, uma vez que aconteceu em várias regiões formou várias escolas.
Entre elas destacam-se as escolas do Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais. Entende-se
como escola a passagem e troca do conhecimento entre os artífices que trabalharam em
uma determinada região.

No Rio de Janeiro desenvolve-se a Escola Fluminense de Pintura que é o nome que


se dá aos pintores em atividade na cidade no século XVIII. A designação foi dada por
Manuel de Araujo Porto-Alegre, considerado o pai da História da Arte Brasileira.

Segundo Porto-Alegre os membros da referida escola eram oito: Frei Ricardo do Pilar,
João Francisco Muzzi; João de Souza; Manuel da Cunha, Leandro Joaquim, Raimundo
da Costa e Silva, Domiciano Pereira Barreto e José Vidal.

Salvador, que, antiga capital, conservou o prestígio de centro do poder político e


administrativo até a transferência da capital para o Rio de Janeiro, em 1763 foi um dos
mais importantes polos do barroco brasileiro. Uma produção em série que satisfazia o
mercado de outras regiões deixou uma marca, um estilo no imaginário barroco baiano
e as suas oficinas se caracterizava pelo excelente nível técnico. Havia cerca de vinte
escultores em atividade em Salvador no século XVIII e outros tantos no século XIX
atuaram naquela cidade.

Minas teve a peculiaridade de ser uma área de povoamento mais recente, e pôde-se
construir estéticas mais particular. O barroco desenvolvido em Minas teve expressões
importantes na arquitetura, escultura e pintura. Na arquitetura destaca-se os mestres
Antônio Francisco Lisboa (o Aleijadinho) Pedro Gomes Chaves, Antônio Pereira de
Sousa Calheiros e Francisco de Lima Cerqueira entre outros.
No que diz respeito à pintura, Mestre Ataíde é considerado um dos maiores nomes e
um divisor de águas na história do barroco mineiro. Sobre seu aprendizado artístico
supõe-se que o pintor tenha sido aluno de mestres estabelecidos na região como João
Nepomuceno Correia e Castro ou Antônio Martins de Silveira.

Na escultura atuaram artífices e artistas portugueses em seus princípios. Entretanto


por volta de 1770 a produção regional concentra características próprias. Por exemplo:
alguns traços têm sido apontados como típicos de Minas Gerais tais como uma maior
individualidade nos padrões e um maior dinamismo.

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Outras escolas barrocas também estão sendo identificadas, embora de forma lenta, por
pesquisadores. A Escola Pernambucana e a Paraibana recebem bastante atenção nos
últimos tempos.

Com a vinda para o Brasil da família real, em 1808, começou uma nova era na
colônia mais rica de Portugal. Fugitiva das tropas imperialistas de Napoleão
Bonaparte. A corte portuguesa buscou refúgio além-mar em sua colônia mais rica.

Os tempos mudavam no continente europeu e a Revolução Francesa tudo transformava.


A partir dessa realidade, o estilo barroco perdeu seu habitat, seu clima, suas condições
psicológicas e sócio-econômicas de desenvolvimento. A França tornou-se o referencial
do mundo ocidental e a arte ali produzida, O Neoclássico, se aplicava como parâmetro
para o resto da Europa e, com a chegada da família real, para o Brasil.

Em 26 de março de 1816 aportou no Rio de Janeiro um grupo de artistas franceses,


liderados por Joachim Lebreton, secretário recém-destituído do Institut de France.
Também descontentes com a desgraça de Napoleão vieram com ele o pintor histórico
Jean Baptiste Debret, o pintor de gênero Nicolas Antoine Taunay e seu irmão o escultor
neoclássico Auguste Taunay. Vieram ainda o arquiteto Grandjean de Montigny e o
gravador de medalhas Charles-Simon Pradier entre outros. O objetivo inicial era a criação
de uma Escola de Artes e Ofícios, mas que após vários percalços que estudaremos em
outra oportunidade criou-se a primeira Academia de Arte no Reino Unido de Portugal,
Brasil e Algarves que posteriormente recebeu o nome de Academia Imperial de Belas
Artes do Rio de Janeiro.

Com a chegada desses artistas introduziu-se o ensino sistemático artístico no país bem
como o vocabulário Neoclássico que vai ser introduzido de forma oficial substituindo,
pouco a pouco, a linguagem dos mestres barrocos.

Atividades Práticas
Sugerimos que o professor introduza a imagem ao lado (Figura 10) no ambiente virtual
(fórum) e provoque o debate entre os alunos no sentido de trocar informações sobre
características da pintura barroca presente no teto pintado por Manuel da Costa Ataíde,
o autor.

Figura 10. Manuel da Costa


Ataíde. Afresco no teto da
igreja de São Francisco
de Assis na cidade de
Ouro Preto. Minas Gerais.
Domínio Público. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/
Ficheiro:Ataide-teto.jpg

90
Considerações Finais
A linguagem importada da Europa hegemônica barroca se estabeleceu
na colônia lusa sob o signo de uma Igreja aliada ao Estado. Essa
linguagem difundiu-se através das ordens religiosas que chegaram
às terras americanas com o objetivo de catequizar os povos que ali
habitavam, mas não deixaram de participar, ativamente ou não, de
seu genocídio.

O barroco enquanto estética foi empregado na confecção das


primeiras imagens destinadas ao culto público ou particular. Com o
tempo, dentro de uma cultura mestiça, ele (o barroco) se aclimatou
juntando elementos africanos e indígenas aos europeus. Isso tornou
única, sincrética, especial à estética barroca que passou a inspirar
a produção brasileira que se desenvolveu, principalmente, nos locais
do território brasileiro que se caracterizaram pela maior produção de
riquezas, a saber: o Nordeste com sua produção açucareira, Minas
Gerais com o ciclo do ouro e dos diamantes e no Rio de Janeiro que
se tornou polo escoador das riquezas coloniais para a metrópole
portuguesa.

Várias escolas se formaram na produção desse barroco também


chamado de tropical. Destacam-se as escolas fluminense,
Baiana e mineira. Entretanto, essa produção anônima vem sendo
gradativamente cada vez mais estudada e esses estudos servem não
só para sistematizar a história da arte em relação a esse período no
Brasil como também para conscientizar a população da importância
do seu patrimônio cultural e artístico.

A glória, o apogeu do barroco se deu no século XVIII quando ele


reuniu características próprias a partir do modelo inicial importado. A
síntese desse processo pode ser exemplificada através das figuras
de Aleijadinho e de Manuel Ataíde.

Nesse momento, porém, motivações políticas externas levaram a


corte portuguesa a se refugiar no Brasil o que fez com que a antiga
e estagnada colônia passasse à condição de Reino Unido a Portugal
e Algarves. Enquanto capital desse novo reino era necessário que se
processassem benfeitorias nos mais diversos campos.

As artes receberam a atenção do regente que importa através de


sua diplomacia em Lisboa e Paris um conjunto de artistas franceses
descontentes com a derrota de Napoleão Bonaparte. É a chamada

91
Missão Artística Francesa de 1816. Esses artistas, de vocabulário
neoclássico, foram responsáveis pela sistematização do ensino
artístico no país com a criação da Academia Imperial de Belas Artes.
É o declínio do Barroco e a ascensão do Neoclássico em terras
brasileiras.

92
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Conheça a Autora

Madalena Zaccara
Madalena Zaccara é doutora em História da Arte pela Université
Toulouse II, França; professora associada do Departamento de
Teoria da Arte e Expressão Artística da Universidade Federal de
Pernambuco; Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em
Artes Visuais UFPE-UFPB; líder do Grupo de Pesquisa Arte Cultura e
Memória; Membro e Coordenadora Regional da Associação Nacional
dos Pesquisadores de Artes Plásticas (ANPAP). Madalena é autora
de vários livros e artigos publicados no Brasil e no exterior.

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