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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO (UFRPE)

COORDENAÇÃO GERAL DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA (EAD/UFRPE)

Pré-História

Iranilson Buriti de Oliveira

Volume 3

Recife, 2011
Universidade Federal Rural de Pernambuco

Reitor: Prof. Valmar Corrêa de Andrade


Vice-Reitor: Prof. Reginaldo Barros
Pró-Reitor de Administração: Prof. Francisco Fernando Ramos Carvalho
Pró-Reitor de Extensão: Prof. Paulo Donizeti Siepierski
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Prof. Fernando José Freire
Pró-Reitor de Planejamento: Prof. Rinaldo Luiz Caraciolo Ferreira
Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Profª. Maria José de Sena
Coordenação Geral de Ensino a Distância: Profª Marizete Silva Santos

Produção Gráfica e Editorial


Capa e Editoração: Rafael Lira, Italo Amorim e Arlinda Torres
Revisão Ortográfica: Marcelo Melo
Ilustrações:
Coordenação de Produção: Marizete Silva Santos
Sumário

Apresentação.................................................................................................................. 4

Capítulo 1 – A Paleoantropologia: contribuições para o saber historiográfico.................. 5

Considerações Iniciais sobre a paleoantropologia............................................................5

1º Momento – final do século XIX e primeiras décadas do século XX............................10

2º Momento – segunda metade do século XX...............................................................10

3º momento – a contemporaneidade............................................................................12

Procedimentos metodológicos da paleoantropologia....................................................13

Capítulo 2 – Nuances sobre a sexualidade humana na (Pré-) História............................ 20

Texto Complementar:.....................................................................................................34

Capítulo 3 – A religião entre morte e vida: o cuidado de si............................................ 39

Considerações Finais..................................................................................................... 60

Conheça o Autor........................................................................................................... 61
Apresentação
Este é o volume III do seu material de Pré-História. Até aqui, já vencemos importantes etapas. Estudamos
o volume I, o volume II, vimos textos complementares, respondemos exercícios, fizemos uma série de leituras
importantes e necessárias para a compreensão da escrita da história e da memória na Pré-História. No volume
I fizemos um panorama geral da Pré-História, desde a construção do conceito de Pré-História até os estágios de
desenvolvimento do homem na terra. No volume II, passeamos pelos períodos denominados de Paleolítico,
Neolítico e Idade dos Metais, além de apresentar um importante capítulo acerca da Arqueologia, um campo de
conhecimento muito significativo para o estudo, a pesquisa e a compreensão da Pré-História.
Neste volume, iremos estudar um conteúdo muito expressivo para a Pré-história. Para tanto, organizamos
o referido conteúdo em três capítulos, a saber: A paleoantropologia, a sexualidade na Pré-História e o cotidiano e as
práticas religiosas. No primeiro capítulo, você terá contato com a contribuição da paleoantropologia para o estudo
da Pré-História, no qual mostraremos como a interdisciplinaridade tem contribuído para a ampliação das pesquisas
sobre as origens do homem. Além disso, abordaremos como os fósseis são importantes fontes de pesquisa mediante
as quais os pesquisadores problematizam o comportamento do homem, tanto o antigo quanto o moderno.
No capítulo 2 - Nuances sobre a sexualidade humana na (Pré-) História - apresentamos a você, prezado (a)
estudante, um dos aspectos considerados mais humanos do homem: a sua sexualidade. Dessa maneira, veremos
a importância e significados da sexualidade no desenvolvimento histórico de hominização. Sobre este aspecto,
novamente sublinhamos a profunda peculiaridade de nossa espécie, haja vista que se não somos o único animal
sexuado, somos com certeza o mais sexual de todo o espetáculo da natureza, na medida em que a sexualidade
configura-se como uma das bases da hominização. Assim, objetivamos problematizar a elaboração da sexualidade
humana na Pré-História, relacionando-a com as práticas sexuais que ocorrem na contemporaneidade, bem como
analisar a formação das primeiras famílias e da construção do sentimento de afetividade entre os humanos.
No terceiro capítulo, intitulado “A religião entre morte e vida: o cuidado de si”, mostraremos como o
homem, desde o princípio, elaborou relações com o além, com a eternidade, com o outro lado da vida, construindo,
assim, um cuidado de si, um conhecimento sobre suas relações com a vida e com a morte. Este capítulo é um
momento dedicado para pensarmos nossas sensibilidades “ancestrais”, as maneiras de crer e as artes que
motivaram o surgimento da religião. Afinal, como vimos nos capítulos anteriores, o desenvolvimento da linguagem
foi primordial em relação à maneira de nossos primeiros humanos lidarem com o mundo a sua volta. Tudo passou
a ser ressignificado, visto por outros prismas, por outros olhares. A linguagem mudou a forma de o homem se
relacionar com a natureza, com o eterno, com o próprio homem. Portanto, nossos objetivos neste capítulo são:
a) analisar as práticas religiosas na Pré-História; b) compreender como homens e mulheres da Pré-História davam
significados à morte e problematizar como os rituais funerários contribuíram para o nascimento da religião.
Seja bem vindo à leitura e aos espaços de reflexão deste material!

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Capítulo 1 – A Paleoantropologia: contribuições
para o saber historiográfico

Objetivos:

1. Analisar a contribuição da paleoantropologia para o estudo da Pré-História.


2. Mostrar como a interdisciplinaridade tem contribuído para a ampliação das pesquisas sobre as origens do
homem.
3. Abordar como os fósseis são importantes para compreender o comportamento do homem moderno.
Talvez, você, estudante bastante interessado sobre as descobertas de vestígios pré-históricos, em algum
momento de sua vida tenha escutado os seguintes dizeres: “O paleoantropólogo fulano de tal achou ossadas em
tal lugar”. Sobretudo nos telejornais e outros programas televisivos afins, esta modalidade de notícia é bastante
ouvida. Mesmo o estudante que, ainda, não tenha um conhecimento aprofundado sobre o tema, é capaz de
deduzir que esse campo de saber trabalha com resquícios do que foi deixado pelo homem. O assunto deste capítulo
será fundamental em suas aulas de História, durante a sua prática profissional, pois a paleontologia, além de fazer
parte do conteúdo programático dos livros didáticos, está presente em nosso cotidiano brasileiro, pois a descoberta
de fósseis é cada vez mais frequente entre os pesquisadores brasileiros.
Não foi por acaso que me referi sobre as questões acima. Só fiz isso porque, neste capítulo de Pré-História,
você terá uma exposição mais apurada sobre a Paleoantropologia, com destaque para a sua história, sua trajetória
e suas principais descobertas. Isto porque conhecê-la é hoje fundamental, sobretudo em decorrência da suma
importância que desempenham suas contribuições para os estudos sobre a Pré-história. Sendo assim, vamos à aula!

Considerações Iniciais sobre a paleoantropologia


Antes de tudo, é preciso que você, aluno do curso de História, conheça sobre o que versa ou em que
consistem os estudos realizados pela paleoantropologia, de modo que possamos ter uma noção mais nítida
de sua importância para os estudos na área da Pré-história. Sendo assim, a paleoantropologia é um campo de
conhecimento que estuda os fósseis de hominídeos e os vestígios por eles produzidos e deixados, tais como
os seus instrumentos e objetos. Dito de outra forma, a paleoantropologia busca decifrar ossos e resquícios em
geral que foram deixados pelo homem e que representam sua existência, procurando analisá-los detalhadamente,
distinguir diferenças entre espécies, gêneros, tamanhos e outras variáveis.
Claro que esse processo nem sempre é tão fácil (como você verá a seguir). Entretanto, as dificuldades
são relativamente superadas através de um trabalho interdisciplinar, que visa auxiliar e dar maior suporte para as
análises paleoantropológicas. Do amplo corpo de saberes com que esta ciência busca dialogar, destacamos alguns
campos do conhecimento, tais como a:

» Geologia (área do conhecimento que estuda a Terra, sua composição, estrutura, propriedades físicas,
história e os processos que lhe dão forma).
» Genética (área da ciência biológica que estuda  a natureza química do material hereditário, ou seja, os
mecanismos de transferência das informações contidas nos genes, compartilhados de geração em geração).
» Lingüística (área do conhecimento que se dedica ao estudo da linguagem verbal humana).
» Anatomia (área da ciência biológica que se preocupa em estudar a estrutura e a organização dos seres
vivos, como os órgãos e os sistemas de funcionamento)
» Biologia (área do conhecimento que estuda os seres vivos)

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Pré-História

» História (área do conhecimento que se dedica ao estudo dos homens e suas


diversas e diferentes ações no tempo e nos espaços)
» Antropologia (área do conhecimento que estuda, principalmente, os costumes,
crenças, hábitos e aspectos físicos dos diferentes povos que habitaram e habitam o
planeta)
» Paleontologia (área do conhecimento dedicada ao estudo dos fósseis).
» Paleopatologia (área do conhecimento que estuda as doenças no passado)
» Paleodemografia (área do conhecimento que estuda das populações ancestrais).

Autores e Obras

Para complementar as informações acerca das ciências interdisciplinares, listamos alguns livros
e textos que podem ampliar o seu conhecimento:
ARSUGA, Juan L. O colar de Neandertal: em busca dos primeiros pensadores. São Paulo: globo,
2005.
BORGES, Vavy Pacheco. O que é História. São Paulo: Brasiliense, 2005.
MOREIRA, Ruy. O que é Geografia. São Paulo: Brasiliense, 2007.
ORLANDI, Eni P. O que é Linguística. São Paulo: Brasiliense, 2005.
SILVA, Gláucia. O que é Sociobiologia. São Paulo: Brasiliense, 2008.

Sobre a paleontologia, elencamos alguns artigos:


LOPES, Maria Margaret. Cenas de tempos profundos: ossos, viagens, memórias nas culturas da
natureza no Brasil. Hist. cienc. saude-Manguinhos, Set 2008, vol.15, no.3, p.615-634.
Lopes, Maria Margaret. Viajando pelo campo e pelas coleções: aspectos de uma controvérsia
paleontológica. Hist. cienc. saude, 2001, vol.8, p.881-897.
MELLO, Fernanda Torello de; MELLO, Luiz Henrique Cruz de and TORELLO, Maria Beatriz de
Freitas. A paleontologia na educação infantil: alfabetizando e construindo o conhecimento.
Ciênc. educ. (Bauru) [online]. 2005, vol.11, n.3, pp. 397-410.
SCHWANKE, C.; SILVA, M. A. J. Brincando de paleontólogo: levando paleontologia às séries
iniciais. In: ENCONTRO “PERSPECTIVAS DO ENSINO DE BIOLOGIA”, 2004, São Paulo. Caderno de
Programa e Resumos. São Paulo, 2004.

Para a interdisciplinaridade, é preciso reconhecer que toda disciplina ou campo do


conhecimento tem um começo. Por isso, se impõe o seguinte questionamento: quando a
paleoantropologia inicia suas atividades? Ora, muito do que sabemos sobre a pré-história é
produto do trabalho dos paleoantropólogos que, por meio de suas sistemáticas escavações,
coletam os fragmentos e vestígios pré-históricos, sempre buscando aprofundar suas
pesquisas para esclarecer a gênese da humanidade através da interpretação dos fósseis e
objetos por eles encontrados e datados.
Este processo de construção de um conhecimento paleoantropológico da
humanidade começa na segunda metade do século XIX e se estende por todo o século
XX, permanecendo na contemporaneidade, em que busca atualizar suas descobertas,
corroborando e/ou contradizendo teorias e concepções anteriormente levantadas. Situação
bastante comum no campo científico, e ainda mais corriqueiro no conhecimento da pré-
história, pois as constantes descobertas e reinterpretações acabam inviabilizando uma
explicação totalmente conclusiva sobre ela. Além do que, se todos os demais campos do
“saber” estão em constante aprimoramento, não poderíamos esperar que assim também
não fosse para o entendimento da pré-história humana.

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Pré-História

Nesse sentido, o marco fundador da Paleoantropologia é a descoberta, em 1857,


de um homem primitivo estudado pelo naturalista Johann Carl Fuhlrott e por Hermann Saiba Mais
Schaaffhausen1. Anteriormente, em 1848, foram encontrados os primeiros fósseis
neanderthais, próximo ao Estreito de Gilbratar, na Península Ibérica. Contudo, estas 1
Sobre este assunto,
descobertas não lograram alcançar a devida atenção. Essa relação com os primeiros vestígios você pode conferir:
PEREIRA, Paulo.
humanos, notabilizada pela recusa dos Neanderthais, não é aleatória. Ora, você deve está Paisagens Arcaicas,
se perguntando: por que este último acontecimento (e não o primeiro) é considerado o Rio de Mouro, 2004;
marco inaugural desta ciência? LOPES, Reinaldo José.
Encontros amorosos
Navegando pelo mundo, Darwin revolucionou ciência entre sapiens e
neanderthal in
Scientific American
No ano de 1831, o Almirantado britânico procurou um naturalista, o professor Henslow, para Brasil. Edição Abril de
acompanhar o capitão Robet Fitzroy em uma viagem ao redor do mundo, no navio H.M.S. Beagle, 2003. Disponível em:
a fim de fazer um levantamento dos recursos e da cartografia das costas setentrionais da América http://www2.uol.com.
do Sul, para posterior exploração. br/sciam/reportagens/
encontros_amorosos_
entre_sapiens_e_
No entanto, Henslow não aceitou o convite, mas indicou outro naturalista para realizar anotações, neanderthal.html
coletar e catalogar dados: Charles Robert Darwin (1809-1882). E assim, em dezembro de 1831, aos
22 anos, Darwin zarpou a bordo do H.M.S. Beagle.

Sua primeira parada, em janeiro de 1832, foi na Ilha do Cabo Verde. Enquanto a maioria da
população do navio dedicava-se a explorar a costa, Darwin ficava em terra, coletando material da
flora e da fauna, tão pouco conhecidas pelos europeus daquela época.
Darwin no Brasil

De Cabo Verde, a embarcação veio para Fernando de Noronha e, em fevereiro, aportou em Salvador.
Em abril, chegou ao Rio de Janeiro, onde Darwin permaneceu em terra, enquanto seu navio
retornava para Salvador para rever cálculos cartográficos. Ali realizou uma série de observações.

Em meados de 1835 ancoraram no Chile, em Valparaíso. Darwin fez uma expedição nos Andes,
chegou a mais de 1.000 metros de altitude e encontrou fósseis de conchas. Foi nesse momento que
ele pôde perceber que as adaptações aconteciam de acordo com cada ambiente: selvas brasileiras,
pampas argentinos e os Andes. A essa altura, Darwin já estava questionando a imutabilidade das
espécies, o conceito estático da Terra.

Tartarugas das Galápagos e tentilhões

No final do ano de 1835, a expedição chegou às ilhas Galápagos. Após as observações realizadas
durante a preparação para armazenamento dos espécimes coletados, Darwin percebeu que em
cada ilha do arquipélago de Galápagos existiam diferentes árvores, cágados e aves. Mas apenas
quando retornou à Inglaterra, consultando ornitólogos, percebeu que os tentilhões, pássaros que
ele havia coletado nas várias ilhas de Galápagos, eram de espécies diferentes.

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Pré-História

Assim, em 1837, ele passou a escrever suas primeiras notas sobre a origem das espécies. Foi aí que
Darwin passou a relacionar as adaptações ao meio ambiente à origem e evolução das espécies.
Em 1938, Darwin tomou contato com a obra de Thomas Malthus (1766-1834), “Ensaio sobre o
Princípio da População”. Nessa obra, o autor observa aumento numérico de indivíduos de uma
população a cada geração e a manutenção dos recursos alimentares, concluindo que tal fato levaria
a uma competição entre os indivíduos da população.

Considerando a variação de cada indivíduo de uma população, Darwin chegou à conclusão que
alguns estariam mais aptos que outros e assim venceriam essa competição pela sobrevivência.
Os indivíduos mais adaptados ao meio possuiriam variações vantajosas em relação aos outros
indivíduos que não as possuíssem. A esse processo Darwin denominou seleção natural.

Darwin e Wallace

Durante a década de 1840, consciente das implicações de seu trabalho sobre a tese da imutabilidade
das espécies e sobre os preceitos religiosos, Darwin estudou minuciosamente os mecanismos da
evolução, baseando-se na teoria da seleção natural, sem publicar suas ideias.

Em 1856 já estava escrevendo o livro “Natural Selection”, mas continuava resistente em expor suas
ideias para a comunidade científica. Até que em 1858 recebeu uma carta de um jovem naturalista
Alfred Russel Wallace (1823-1913) pedindo a apreciação de Darwin sobre as observações que havia
feito no arquipélago Malaio.

Nessa carta Wallace pede para Darwin enviar para Lyell Charles (1797 -1875) seu trabalho, apenas
se considerasse relevante. Logo esse material foi passado por Darwin para Lyell com o comentário
que Wallace havia resumido, de forma esplendorosa, o trabalho que Darwin vinha se dedicando
há 22 anos. Na carta, Wallace desenvolvera uma teoria de seleção natural idêntica a de Darwin.
Porém, como Darwin possuía muito material para apoiar suas ideias (tinha manuscritos com mais
de 15 anos), indicando quanto ele havia trabalhado sobre elas, Wallace reconheceu que Darwin
deveria ser conhecido como o autor principal da teoria. Sendo assim, publicaram, conjuntamente,
em 1858, a teoria na Sociedade Lineana de Londres.

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Pré-História

“A Origem das Espécies”

Com isso Darwin investiu no seu livro “A Origem das Espécies”, que se baseia na seleção natural
(processo da evolução proposto por Charles Darwin para explicar a adaptação e/ou especialização
dos seres vivos) e foi publicado em 1859. Esse foi o livro mais vendido daquele ano, com uma
tiragem de 1.250 exemplares. Apesar das provas detalhadas apresentadas nessa publicação, que
tornaram o conceito de evolução cientificamente respeitável, as ideias de Darwin encontraram
fortes oponentes, tanto na comunidade científica, quanto na religiosa.

Muitos cientistas acreditavam que a teoria era incapaz de explicar a origem da variação entre as
espécies e indivíduos de uma mesma espécie. As igrejas se sentiam afrontadas, pois as ideias de
Darwin, a princípio, contrariavam a criação divina.

Sua teoria passou a ser totalmente aceita pelo meio científico apenas no século XX, depois das
descobertas de Johann Gregor Mendel (1822 -1884), um monge austríaco que se dedicava à
botânica. Mendel descobriu a transmissão hereditária dos caracteres, a qual só ficou conhecida
no início do século XX quando outros botânicos que faziam pesquisas independentes encontraram
suas publicações na Sociedade de Brünn.

ABRÃO, Maria Sílvia. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/


ciencias/ult1686u43.jhtm> Acessado em: 24 jun 2011 (Adaptado
pelo autor)
É preciso compreender a importância dos escritos do naturalista Charles Darwin2, Atenção
em A origem das espécies, para que possamos entender esta mudança no que concerne
ao tratamento desses primeiros vestígios fósseis de nossos supostos antepassados pré- 2
Leia o Box sobre a
históricos e evolutivos. Antes de 1859, ano de publicação da mencionada obra, acreditava- viagem de Darwin ao
mundo, inclusive ao
se piamente na criação divina da humanidade. Quando Darwin divulga a sua tese sobre
Brasil, e a importância
a evolução dos seres vivos (de organismos simples para seres cada vez mais complexos) do mesmo para a
mesmo havendo a inicial rejeição (não é para menos, por tratar-se de uma teoria até hoje pesquisa na área da
polêmica) foi possível a especulação e a crítica sobre as concepções criacionistas vigentes paleoantropologia.

[veja a seção Saiba Mais], na medida em que as correlações feitas entre os fósseis, cada vez
mais evidentes, pareciam corroborar as concepções darwinistas e de seus seguidores.

Saiba Mais

Criacionismo e Evolucionismo: um profícuo debate

“No principio, criou Deus os céus e a terra...” (Gênesis 1:1). Assim começa o livro de Genesis,
o primeiro da Bíblia, narrando a criação do mundo por Iavé. Em outro trecho, o autor do livro
continua a descrição dos feitos: “Então, formou o senhor Deus ao homem do pó da terra e lhe
soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente3”. Este último versículo
Atenção
é uma narrativa suficiente para que você compreenda o posicionamento da Teoria Criacionista,
que entende que o homem foi originado da criação sobrenatural de um Ser divino. Essa tese tem
3
Gênesis 2:7
como adeptos, sobretudo, a população que apresenta vínculos para com as religiões monoteístas
como o Islã e o Judaísmo, além das que derivam do cristianismo, a exemplo do Catolicismo e do
Protestantismo.

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Pré-História

Quanto à Teoria Evolucionista, o que a mesma significa? Para compreendê-la, vamos voltar
um pouco no tempo e visitarmos o século XIX. Um grande cientista, chamado Charles Darwin,
começou a estudar as transformações das espécies. Em seus estudos, o mesmo concluiu que os
seres vivos são fruto de um longo e demorado processo de evolução, de desenvolvimento. O que
Darwin argumentava? Para ele, os homens e os demais seres vivos se transformaram de formas
mais simples para formas mais bem desenvolvidas. Mas não param por aí. Para esse cientista, as
espécies continuam evoluindo, sofrendo mudanças em sua forma de ser e viver. Como ocorreram
(e ocorrem) várias mudanças no meio ambiente, os seres vivos que conseguiram se adaptar aos
ciclos de transformações, estes sobreviveram e evoluíram, à proporção que iam sumindo da terra
os que não conseguiram se adaptar. Darwin denominou este processo de seleção natural das
espécies. Esta teoria é a mais aceita pela comunidade científica como a melhor explicação para a
adaptação das espécies.

A partir de então, paulatinamente, essas evidências começaram a adquirir outros


significados e as concepções darwinistas foram perdendo seu caráter irreal. Os vestígios
passam, então, a possuir maior importância, na medida em que eram agora pensados como
representações de experiências anteriores da humanidade. Sendo assim, tais condições
históricas nos permitem compreender que a prática da paleoantropologia surge enquanto
derivada dessa nova emergência. Nesse sentido, a trajetória da paleoantropologia pode ser
dividida em três momentos.

1º Momento – final do século XIX e primeiras


décadas do século XX
Passadas essas primeiras evidências, em 1886, Eugene Dubois encontrou na Ilha
de Java (Indonésia) um fóssil, conhecido como homem de Java, que, posteriormente,
seria classificado como sendo uma espécie de Homo erectus. Outra grande descoberta
ocorreu apenas em 1924, quando os alunos do professor Raymond Dart encontraram vasto
material fóssil numa caverna em Taung (República de Botswana). Após meses de exames,
Dart chegou à conclusão de que se tratava de uma espécie transitória entre o macaco e o
homem, conclusão na época nada aceita e que, somente a posteriori foi reconhecida como
parte da espécie Australopithecus Africanus.
Por essas primeiras descobertas você deve ter percebido que as escavações
iniciais (estou me referindo as que tiveram seus resultados publicados, pois é possível que,
no mesmo período, tenha havido outros achados em outros lugares), estão localizadas
territorialmente na Ásia. Isto é importante, na medida em que estas descobertas levaram
a conclusão de que a origem do homem seria asiática, o que era corroborado com a grande
Atenção leva de fósseis encontrados na China no início do século XX4. Uma demonstração disto é a
falta de credibilidade com que foram tratados os fósseis achados pelo amigo do professor
4
Material, aliás, Dart, Robert Broom, na África do Sul, durante a década de 1930, o que, por sua vez, o
perdido durante a II levou a cogitar a origem africana da humanidade, conclusão na qual ninguém acreditou no
Guerra Mundial.
momento.

2º Momento – segunda metade do século XX


No que toca à paleoantropologia, as décadas de 1940, 50 e 60 são marcadas pela

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Pré-História

forte atuação da família Leakey, composta pela naturalista Louis Leakey, sua esposa, a
antropóloga e arqueóloga Mery Leakey, e seu filho, Richard Leakey, futuro paleoantropólogo.
Com esta família em ação, esse campo do conhecimento se desenvolveu e se ampliou
consideravelmente, ao mesmo tempo em que o foco das pesquisas nesta área se deslocou
da Ásia para África, não por acaso, mas sim pelo consenso dos mencionados pesquisadores
sobre a origem africana da humanidade.
Partindo desse pressuposto, nas proximidades de Olduvai e Laetoli (Tanzânia) em
1948, o casal descobriu o Proconsul africanus (ver imagem acima). Já em 1959, encontrou
o Paranthropus boisei, um parente próximo do descoberto por Broon. Na década de 1960,
Mery e Louis Leakey encontraram os primeiros fósseis do Homo habilis (isso em 1962) e
um fóssil do Homo erectus (1965), além de terem realizado a catalogação de ferramentas
e objetos encontrados. O filho do casal, em escavações no Quênia na década de 1970,
encontrou o fóssil do que viria a ser o Homo rudolfensis.
Mas, sem dúvida, o grande acontecimento dessa fase para a paleoantropologia, bem
como para os conhecimentos relativos à pré-história, foi a descoberta de um fóssil de mais
de três milhões de anos pelo antropólogo Donald Johanson e sua equipe, em escavações
realizadas na Etiópia, no ano de 1974. Tratava-se do mais antigo dos ancestrais do homem,
o Australopithecus afarensis, daí a importância da descoberta naquele momento e a fama
que logrou alcançar o seu descobridor.
Denominada Lucy, a fêmea (após milhões de anos em processo de absorção
de minerais, o que permitiu sua conservação fóssil e o seu consequente exame) era um
indivíduo ereto, cujo processo de locomoção não dependia necessariamente da capacidade
cerebral, visto que o Johanson mostrou que ela apresentava um cérebro relativamente
muito pequeno, quase minúsculo, apenas 500 centímetros cúbicos, mais precisamente um
terço de nossa capacidade cerebral que é de 1300 centímetros cúbicos, distante, portanto,
da grande capacidade cerebral do homem moderno, a qual constitui de fato o seu diferencial
em relação aos demais seres vivos.
Com 1,05 m de altura e uma estrutura física que lhe permitia uma ótima sustentação
dos quadris aliada à locomoção ereta sem o auxílio de um cérebro volumoso, Lucy adquiriu
muita importância pelo fato de que, a partir dela e de sua ramificação pelo processo
evolutivo, ter sido aberta a possibilidade de conhecimento sobre os primeiros humanos e,
por conseguinte, acerca de nosso desenvolvimento cerebral.
Segundo o paleoantropólogo americano William Kimbel, Lucy pode não ter sido
necessariamente a primeira a andar de pé, mas por ser a mais antiga evidência conhecida
é considerado o marco. O mesmo pesquisador, em conjunto com Johanson, encontrou,
em 1994, um crânio masculino completo, chamado de o “filho de Lucy” pela diferença
temporal de 200 mil anos. Esse achado, junto com o de Lucy, sem dúvida, ajudou na
compreensão da espécie Afarensis, pois suas características físicas e anatômicas confirmam
seu pertencimento ao mesmo grupo, muito embora não seja tão fácil estudá-los pela
diversidade física e anatômica apresentada por ambos.
Isto porque, de acordo com paleoantropologia, os machos dessa espécie são bem
maiores que as fêmeas: elas com 1 metro e eles com aproximadamente 1,40 metro. Isso
levou ao descrédito sobre a existência da espécie Afarensis, já que esta diferença podia
justificar o argumento de que tais ossos seriam o resultado da mistura com ossadas de outras
espécies. Entretanto, a comprovação veio quando se verificou que a diferença na altura
entre sexos é comum a outras espécies do gênero Australopithecus, dimorfismo sexual
observado, inclusive embora de modo menos acentuado, entre os humanos modernos. A
constatação do zoólogo inglês Bernard Wood de que os machos afarensis apresentam maior
saliência no queixo, também ajudou na classificação do filho de Lucy como um afarensis e
na confirmação da existência desta espécie.

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Pré-História

Após essas constatações, os paleoantropólogos buscaram entender como essa


diferença de tamanho entre os sexos influenciava no cotidiano da espécie. Nesse sentido,
foi levantada a seguinte hipótese: as diferenças em tamanho seriam causa da forma de
acasalamento? Levando em consideração a forma de acasalamento dos macacos, nossos
“parentes” mais próximos, quando existe uma diferença de tamanho expressiva entre
os sexos um único macho copula com todas as fêmeas do bando, tendo uma relação,
portanto, poligâmica. Por outro lado, o inverso também é verdadeiro, ou seja, quando há
uma diferença mínima, há a cópula em pares se relacionando de forma um pouco mais
monogâmica.

Acerca da monogamia, do cuidado do corpo e de outros temas ligados ao sexo e à sexualidade,


você pode pesquisar em:

FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade. Vol. 1 Rio de Janeiro: Graal, 1993.

GREGERSEN, Edgar. Práticas sexuais: a história da sexualidade humana. Tradução de Antonio


Alberto de Toledo Serra e Edson Ferreira. São Paulo: Livraria Roca, 1983.

LOURO, Guacira Lopes. Gênero, educação e sexualidade. Petrópolis: Vozes, 1997.

TREVISAN, Rita. A sexualidade humana: uma visão histórico-social. Disponível em: http://www.
ritatrevisan.com.br/pdf/artigos/a-sexualidade-humana.pdf. Acessado em 27 jun. 2011.

Pensando a partir dessa linha de raciocínio, o Australopithecus afarensis e as demais


espécies desse gênero seriam polígamos. Claro que devemos considerar que nesse estagio
de desenvolvimento nossos supostos ancestrais respondiam às necessidades colocadas pela
natureza de forma mais semelhante aos macacos atuais. Corroborando este pensamento,
pesquisas mostram que a atual população humana é monogâmica e que a disparidade de
tamanho entre os sexos não é tão elevada. Acerca da monogamia, vários estudos abordam
essa temática, dentre os quais Rita Trevisan (a sexualidade humana: uma visão histórico-
social), Riane Eisler (O prazer sagrado: sexo, mito e a política do corpo) e Edgar Gregersen
(Práticas sexuais: a história da sexualidade humana)

3º momento – a contemporaneidade
Já mostramos nas linhas acima algumas descobertas recentes sendo que todas
foram importantes para a (re) afirmação da paleoantropologia enquanto um campo
do conhecimento fundamental aos estudos na área da pré-história. Dessa forma, seus
pesquisadores têm recebido apoio financeiro, muitas vezes privado e de instituições de
fomento à pesquisa, para viabilizar seus estudos nos mais diferentes lugares.
Hoje, as escavações, além de continuar sendo feitas na Ásia e África, se
estenderam a outros continentes como o americano. Desse incentivo, vasto material tem
sido descoberto e novas conclusões são elaboradas. Com isso, antigas constatações são
revisitadas, ressignificadas e reinterpretadas.
Conforme Thaís Fernandes, em 1980, no Quênia, ocorreu a descoberta do
mais antigo Australopiteco robusto. Na década de 1990, novos fósseis e vestígios foram
encontrados em outras regiões do Oriente Médio e da Geórgia. Entramos no século XXI com
pique total havendo importantes descobertas, ainda em processo de análise. Para você,
prezado (a) aluno (a) de Pré-História, ter uma noção do avanço das pesquisas, na Espanha foi
encontrada, por cientistas daquele país, uma mandíbula de um hominídeo adulto coletada

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Pré-História

em um sítio em Atapuerca. Junto a ela, foram identificados ferramentas de pedra e restos


de animais apresentando traços de atividade humana, datados aproximadamente em um
milhão de anos. Nesta região, as pesquisas vêm sendo realizadas desde a década de 1970.
(FERNANDES, 2008)

Procedimentos metodológicos da
paleoantropologia
Você acabou de ter acesso ao histórico do que vem pesquisando a
paleoantropologia, a “ciência dos ossos”, desde sua “fundação”. Todavia, a nossa discussão
não estaria completa, se não refletíssemos sobre como os paleoantropólogos procedem no
exercício de suas pesquisas, ou, mais objetivamente, no exame e classificação dos ossos e
vestígios por eles encontrados. Na seção abaixo (Saiba Mais), você encontrará referências
bibliográficas acerca dessas pesquisas paleoantropológicas:

Autores e Obras

ARSUAGA, Juan Luis. O Colard de Neandertal – Em busca dos primeiros pensadores. Rio de
Janeiro: Globo, 2005.
BURGIERMAN, Denis Russo. Meio sapiens, meio neandertal. Revista Super Interessante. Edição
144, setembro 1999.
DIAMOND, Jared. Armas, germes e aços. Rio de Janeiro: Record, 1997.
FOLEY, Robert. Apenas mais uma espécie. São Paulo: Edusp, 1993.
LEONARD, William. Alimentos e evolução humana: mudança alimentar foi a força básica para
sofisticação física e social. Revista Cientific American Brasil, edição n. 8, janeiro de 2003.
LOPES, Reinaldo José. Encontros amorosos entre sapiens e neanderthal. Revista Scientific
American Brasil, edição n. 11, abril de 2003.
MIDDLETON Chris. A aurora da humanidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: Abril Livros Ltda, 1993.

Como já foi analisada, a paleoantroplogia, assim como as demais ciências na


atualidade, não trabalha de forma isolada dos demais campos do conhecimento. Muito pelo
contrário, atua em parceria com outros campos. Nessa linha de raciocínio, são estabelecidos
diálogos interdisciplinares em que a paleoantroplogia é auxiliada pelos métodos utilizados
nas pesquisas realizadas por outras áreas de saber.
Para não comprometer a datação dos achados (e, portanto, para saber, do modo
mais preciso possível, de quando é e de quem é o vestígio encontrado) a paleoantroplogia
tem dialogado com os suportes oferecidos pelo conhecimento acumulado no âmbito da
geologia, com destaque para seus estudos a respeito das datações das rochas.
Ademais, ela aproxima-se do paleomagnetismo, ciência que estuda o campo
magnético das rochas para compreender as mudanças que ocorreram nos continentes
em épocas remotas. Este conhecimento auxilia a paleoantropologia na percepção das
condições em que viviam os nossos ancestrais no que diz respeito, por exemplo, ao processo
de locomoção de nossos antepassados pré-históricos ou no que concerne à relação entre
estágios evolutivos diferentes e condições naturais distintas.
Também merece ser mencionada a bioestatigrafia (classificação das diferentes
camadas de rocha com base no seu conteúdo fossilífero). Todos esses procedimentos são
denominados de datação relativa. É importante frisar que foram utilizados em conjunto

13
Pré-História

pelos pesquisadores espanhóis após coletarem o citado fóssil em Alpuerca, referido nas
linhas acima.
O método mais utilizado atualmente, conhecido como datação absoluta, consiste
na utilização do carbono 14, usado para datar substâncias orgânicas encontradas na
atmosfera terrestre. O carbono 14, descoberto pelo químico Willard Liby em 1947, é um
isótopo radioativo presente no tecido de todos os seres vivos: logo é uma substancia
orgânica. As pesquisas de Libby revelaram que a quantidade de carbono 14 no organismo
após a morte tende a declinar. Dessa forma, a medição do isótopo radioativo no fóssil
permite se estabelecer uma possível datação da morte.
Esta técnica, entretanto, quando aplicada a fósseis, só consegue ser conclusiva
quando estes possuem, no máximo, 70 mil anos, já que com o passar do tempo a substância
diminui até seu desaparecimento, quando já não é mais possível estabelecer uma datação
confiável por meio do método do carbono 14. Sendo assim, a datação de fósseis por meio
desta técnica é feita com base na quantidade de carbono 14 que, por ocasião da análise,
ainda contém.
Devemos ainda ressaltar que a tecnologia da informática em muito tem auxiliado
nas pesquisas paleoantropológicas, realizando reconstituições dos fósseis encontrados,
possibilitando a elaboração de uma imagem elucidativa dos materiais, tal como foi realizado
com Lucy e com tantos outros fósseis, inclusive com a “brasileira” Luzia, que você conhecerá
a seguir.
Concluímos assim, que o paleoantropólogo, ao descobrir um fóssil, se utiliza
de todos esses conhecimentos e procedimentos em conjunto, com a finalidade de
explicar os materiais fossilizados. Esse diálogo interdisciplinar elucida que o trabalho
paleoantropológico não é nada fácil, sendo definido (como no mais das vezes ocorre como
tantos outros campos do saber interessados no nosso passado pré-histórico) pela ausência
de estudos absolutamente conclusivos em maior frequência.
No capítulo seguinte, iremos continuar nossa jornada na Pré-História, no entanto,
o assunto abordado será ainda mais instigante do que este. Iremos falar da construção da
sexualidade, a descoberta do corpo como um campo de prazer, a vida sexual no cotidiano
pré-histórico, as contribuições do bipedalismo para a emergência de novas formas e artes
de se relacionar sexualmente. Porém, antes de fazer tais leituras, é necessária uma revisão
deste capítulo, seguida de algumas atividades.

Vamos Revisar?

Neste capítulo, você estudou um dos assuntos que muito tem contribuído,
atualmente, para o avanço das pesquisas acerca da Pré-História: a paleoantropologia.
Dessa forma, vimos que a paleoantropologia é um campo de conhecimento que estuda
os fósseis de hominídeos e os vestígios por eles produzidos e deixados, tais como os seus
instrumentos e objetos. Assim, a paleoantropologia busca decifrar ossos e resquícios em
geral que foram deixados pelo homem e que representam sua existência, procurando
analisá-los detalhadamente, distinguir diferenças entre espécies, gêneros, tamanhos e
outras variáveis. Este processo de construção de um conhecimento paleoantropológico da
humanidade começou na segunda metade do século XIX e se estendeu por todo o século
XX, permanecendo na contemporaneidade, em que busca atualizar suas descobertas,
corroborando e/ou contradizendo teorias e concepções anteriormente levantadas.

14
Pré-História

Saiba Mais

Para ampliar o seu conhecimento acerca dos nossos ancestrais, elencamos abaixo
as principais características dos Australopithecus:

Australopithecus afarensi: Desenterrado em 1974 por Donald Johanson em Hadar,


na Etiópia. Já andava com facilidade sobre os dois pés, mas passava a maior parte do
tempo em árvores. Comia frutas, raízes e sementes. Carne, só quando encontrava
restos deixados por outros animais. Usava ossos e pedaços de pau para se defender.
O Australopithecus afarensis tinha um cérebro minúsculo, mas andava de pé
como nenhum macaco seria capaz de fazer. O primeiro fóssil de Australopithecus
afarensis, desenterrado há 20 anos, na Etiópia, no norte da África, era uma fêmea,
recebeu o apelido de Lucy. (DIEGUEZ, Flávio. Revista Super Interessante, edição
082, 1994)
Paranthropus robustus: seus fósseis foram descobertos na África meridional em
1938. O desenvolvimento do P. robustus, especificamente nos atributos cranianos,
parecia indicar um “complexo de mastigação pesada”. Devido às características
essenciais associadas à linhagem robusta destes australopitecinos, o antropólogo
Robert Broom criou o gênero Paranthropus incluindo nele o P. robustus. Os
pesquisadores datam o Paranthropus robustus como tendo de 1 a 2,6 milhões de
anos. Suas principais características: tinha a parte superior dorsal larga, mandíbula
e músculos da mandíbula adaptados ao ambiente seco em que eles viviam.
Homo erectus: Foi achado pela primeira vez em 1890 na Ilha de Java, atual
Indonésia, por Eugène Dubois, um médico militar holandês. Já dominava o fogo
e caçava grandes animais. É  a primeira espécie reconhecida como humana que
emigrou da África para a Ásia e provavelmente para partes da Europa. Desapareceu
há 300.000 anos e deu origem ao Homo sapiens. Mas não se sabe direito como isso
aconteceu, pois os fósseis humanos mais antigos têm 100.000 anos. (Revista Super
Interessante, edição 144, set. 1999)
Homo habilis: Encontrado por Mary Leakey, em 1959, na região do Olduvai, na
Tanzânia. É o primeiro ancestral do homem a fabricar utensílios de pedra, que usava
com habilidade. Sua dieta ainda era basicamente vegetariana, mas não desperdiçava
uma chance de conseguir caça. Tinha o crânio muito mais desenvolvido do que o
dos hominídeos anteriores.
Homo rudolfensis: espécie humana fóssil descoberta em 1972 por Bernard Ngeneo,
em Koobi Fora, lado leste do Lago Rudolf (atualmente Lago Turkana), no Quênia. Sua
idade é estimada em 2 milhões de anos. Os Homo rudolfensis caracterizam-se pela
face mais aplainada e larga, dentes caninos mais largos e coroas mais complexas,
raízes e esmalte mais espessos. Além disso, sua compleição frágil certamente fazia
dele presa de outros carnívoros. Pela análise de seus ossos de animais associados
aos humanos, viviam num ambiente bem mais seco e amplo que as florestas onde
habitavam as espécies anteriores.
Paranthropus boisei ou Australopithecus boisei: é considerado como um dos
primeiros hominídeos que viveram no Leste da África, há cerca de 2 até 1 milhão de
anos atrás durante o estágio denominado Pleistoceno. O A. boisei tinha um crânio
altamente especializado à mastigação pesada, habitou os pastos secos da savana da
África Leste durante um período de 2,5 a 1 milhão de anos atrás.
Proconsul africanus: Encontrado em 1924 por Raymond Dart na África do Sul. Ao

15
Pré-História

contrário do afarense, não é tido pelos antropólogos como um antepassado nosso.


Sua linhagem provavelmente desapareceu sem deixar descendentes. (informações
extraídas de (Revista Super Interessante, edição 144, set. 1999)

Exercício

1. A pesquisa de materiais fossilizados apresenta-se como espaço de curiosidade


para muitas pessoas e já ganhou o mundo cinematográfico. Esse cotidiano já foi
por muitas vezes representado nas telas do cinema, uma importante fonte de
pesquisa para o historiador. Assim, para compreender a visão cinematográfica
Dica
acerca da Pré-História e do material fossilizado, escolha um dos vários filmes5 que
retratam algum aspecto das pesquisas paleoantropólogicas e faça uma resenha
5
Sugestão de filmes: sobre ele. Na sua resenha, procure perceber verossimilhanças e anacronismos no
Charles Darwin:
Creation, O Mundo que concerne às pesquisas, métodos e conclusões a respeito do conhecimento
Perdido, Jurassic Park, na área da Pré-história. Não esqueça de que sua análise deve ser crítico-reflexiva,
Fantasia, A Guerra do tornando importante considerar, também, o contexto histórico no qual o filme
Fogo, O Elo Perdido, A
Tribo da Caverna dos escolhido foi produzido. Após a elaboração de sua resenha, poste-a em um dos
Ursos. fóruns do ambiente virtual de aprendizagem. Com isso, você pode compartilhar seu
conhecimento com outros colegas do Curso, bem como possibilitar a socialização
de conhecimentos, estratégias e ferramentas.
2. A visita a um museu geralmente é um momento de muitas descobertas sobre o
passado. Com este objetivo, visite um museu de paleontologia ou de antropologia
mais próximo de sua casa ou mesmo a página eletrônica dos mesmos6 e faça
um inventário acerca dos elementos/objetos presentes que contribuem para a
compreensão da história do homem na terra. O inventário é uma metodologia de
pesquisa que consiste numa atividade de conhecimento para fins de identificação,
classificação e análise. Para fazer um inventário, você necessita:
a) Fotografar se possível, os objetos;
b) Descrever cada um dos objetos que você considera importante para o
assunto;
c) Organizar, tematicamente, cada assunto a ser abordado;
d) Elaborar o texto final.
3. Provavelmente algumas pessoas lhe perguntam sobre o curso que você está
fazendo na UFRPE. Muitas perguntas são feitas, tais como: você está gostando das
disciplinas? Qual a duração do seu curso? Qual a disciplina que está estudando
agora? Por isso, elabore um portfólio com textos e imagens mostrando o que você
aprendeu sobre Paleoantropologia. No portfólio, você deverá:
a) Colocar os elementos pré-textuais (capa, contracapa);
b) Eelaborar um índice;
c) Fazer uma introdução mostrando a importância do conteúdo para a
aprendizagem;
d) Elencar os trabalhos que você fez durante a disciplina (resenhas, artigos,
trabalhos individuais e/ou em grupos, comentários do professor, etc);
e) Apresentar uma rápida conclusão, mostrando de forma sucinta o que
aprendeu.

16
Pré-História

Jogo da trilha
Os jogos lúdicos, a exemplo do Jogo da Trilha, constituem um instrumento
significativo no desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem. A
disciplina de Pré-História, cujo conteúdo é pouco trabalhado nas escolas de ensino
fundamental e médio, necessita desse tipo de atividade para fixar conhecimento,
além de desenvolver suas competências e habilidades. O Jogo da Trilha, empregado
na disciplina de Pré-História, objetiva tornar mais atrativas as informações sobre
o conteúdo ministrado, contribuindo para a aquisição do conhecimento de forma
divertida e funcional, tornando-se, portanto, um eficiente instrumento para
estimular o interesse dos educandos. Some-se a isso, que você, prezado aluno,
será (ou talvez já seja) em breve professor de História, e necessitará de muitas
ferramentas para o cotidiano escolar.
Orientação geral:
De 2 a 4 participantes, ambos identificados pelo número do pino (em anexo). Todos
os pinos inicialmente ficam onde tem o nome “INÍCIO”, na trilha. Joga-se o dado e
prossegue o número de casas de acordo com o resultado do lançamento do dado.
Todas as vezes que o jogador “cair” na casa amarela tem que ler a legenda que revisa
o assunto e determina como o mesmo jogador tem que proceder (IMPORTANTE:
tem que ler independente do número de vezes que os jogadores ficaram na casa).
E assim sucessivamente, até que um dos jogadores chegue (ou passe) no nome
“FINAL” ganhando o jogo.

Legenda jogo da trilha


Assunto: Paleoantropologia
Casa Orientação
Paleoantropologia é um campo de conhecimento que estuda os fósseis de
03 hominídeos e os vestígios por eles produzidos e deixados, tais como os seus
instrumentos e objetos. Volte para o início.
Muito do que sabemos sobre a pré-história é produto do trabalho dos
07 paleoantropólogos que, por meio de suas sistemáticas escavações, coletam
os fragmentos e vestígios pré-históricos. Jogue outra vez.
Um grande acontecimento para a paleoantropologia, bem como para os
conhecimentos relativos à pré-história, foi a descoberta de Lucy. Um fóssil
10
de mais de três milhões de anos, em escavações realizadas na Etiópia, no
ano de 1974. Passe uma vez sem jogar.
Hoje, as escavações, além de continuar sendo feitas na Ásia e África, se
estenderam a outros continentes como o americano. Novas conclusões
13
são elaboradas com as descobertas. Com isso, antigas constatações são
revisitadas e reinterpretadas. Volte para a casa 5.
A Paleoantropologia, assim como as demais ciências na atualidade, não
trabalha de forma isolada dos demais campos do conhecimento. São
17
estabelecidos diálogos interdisciplinares com outras áreas de saber. Jogue
outra vez.
Para uma datação absoluta dos fósseis, o método mais utilizado atualmente
20
consiste na utilização do carbono 14. Passe para a casa 22.
A tecnologia da informática em muito tem auxiliado nas pesquisas
paleoantropológicas, realizando reconstituições dos fósseis encontrados,
25
possibilitando a elaboração de uma imagem elucidativa dos materiais. Passe
uma vez sem jogar.

17
Pré-História

A paleoantropologia busca dialogar com outros saberes, a exemplo da:


26 Geologia, Genética, Linguística, Anatomia, Biologia, História, Antropologia,
Paleontologia, Paleopatologia e a Paleodemografia. Volte 4 casas.
Divide-se a Paleoantropologia em três momentos: 1ª Momento - final do
30 século XIX e primeiras décadas do século XX; 2ª Momento - segunda metade
do século XX; e 3º momento - a contemporaneidade. Passe para a casa 34.
Os pesquisadores paleoantropológicos têm recebido apoio financeiro,
33 muitas vezes privado e de instituições de fomento à pesquisa, para viabilizar
seus estudos nos mais diferentes lugares. Volte para a casa 25.

O fóssil de Luzia, até agora, foi uma das maiores descobertas da


37
paleoantropologia brasileira e americana. Jogue outra vez.
Os sambaquis são importantes fontes para estudar os povos que viviam no
38
litoral brasileiro, antes da chegada dos europeus. Passe uma vez sem jogar.
A paleoantropologia busca decifrar ossos e resquícios em geral que foram
deixados pelo homem e que representam sua existência, procurando
42
analisá-los detalhadamente, distinguir diferenças entre espécies, gêneros,
tamanhos e outras variáveis. Passe para a casa 45.
A paleoantropologia muito tem contribuído, para o avanço das pesquisas
44
acerca da Pré-História no Brasil e no mundo. Passe uma vez sem jogar.
A paleoantropologia busca atualizar suas descobertas, corroborando e/ou
48 contradizendo teorias e concepções anteriormente levantadas. Adiante
uma casa.

Atenção

6
No Crato (Ceará), há um importante museu de paleontologia, enquanto no Recife existe o
Museu do Homem do Nordeste, com importantes aspectos da antropologia. Outros museus que
podem ser visitados são: Museu do Cangaço (Triunfo- PE), Museu Pinacoteca de Igarassu-PE,
Museu do Sertão (Petrolina-PE), dentre outros. Caso não seja possível visitar um museu em sua
estrutura física, pode acessar um museu virtual: Museu Virtual de Paleontologia da Universidade
de Califórnia-EUA (http://www.ucmp.berkeley.edu/index.php); Museu Nacional do Rio de Janeiro
(www.dinosvirtuais.museunacional.ufrj.br); Geopark Araripe – Museu de Paleontologia do Cariri
(http://www.geoparkararipe.org.br)

Para navegar...

Sites nos quais consultamos as imagens que aparecem neste capítulo:

http://amigadeestudantes.blogspot.com/2009/01/pre-historia-paleoantropologia-e-pre.
html. Acesso em 9 de março 2011.

(http://alogicadosabino.wordpress.com/2009/12/31/apanhado-do-ano-de-2009/

http://pre-historia-uni.blogspot.com/ Acesso em 9 de março 2011.

(http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.archaeologyinfo.com/images/
proconsul.jpg&imgrefurl=http. Acesso em 9 de março 2011.

18
Pré-História

http://corvuxcorvux.wordpress.com/2010/08/page/2/. Acesso em 9 de março 2011.

http://picasaweb.google.com/maicontri10/MARCASDOPASSADO?feat=blogg
er#5361102212265716034. Acesso em 9 de março 2011.

http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/junho/dia-do-paleontologo.php. Acesso em 9
de março 2011.
http://cafehistoria.ning.com/group/arqueologia?xg_source=activity. Acesso em 9 de
março 2011.

19
Pré-História

Capítulo 2 – Nuances sobre a


sexualidade humana na (Pré-) História

Objetivos

» Estudar a sexualidade humana na Pré-História.


» Relacionar as práticas sexuais na Pré-História com as que ocorrem na
contemporaneidade.
» Compreender como ocorria o “coito” entre homens e mulheres pré-históricos.
» Analisar a formação das primeiras famílias.
» Estudar a construção do sentimento de afetividade entre os humanos.
Neste capítulo, vamos estudar um dos aspectos considerados mais humanos do
homem: a sexualidade. Perdoem-me a redundância ou a repetição de termos, mas só o fiz
para enfatizar a importância da sexualidade no desenvolvimento histórico de hominização
que, como já vimos em outros “episódios”, o homem nos fez caminhar por uma vereda
evolutiva intensamente diferente da seguida por quaisquer outros seres vivos. Sobre este
aspecto, novamente sublinhamos a profunda peculiaridade de nossa espécie, haja vista
que se não somos o único animal sexuado, somos com certeza o mais sexual de todo o
espetáculo da natureza, na medida em que a sexualidade configura uma das bases da
hominização.
Mas você, caro estudante, poderá se interrogar: por que este assunto será
abordado em pré-história? Qual a importância do mesmo para a minha vida profissional?
Pois bem. A sala de aula é um ambiente no qual circulam vários conhecimentos. Nos ensinos
fundamental e médio, assuntos de outros componentes curriculares aparecem muitas vezes
na aula de História, sendo comentado pelos alunos. A sexualidade é um desses assuntos.
Estudado nas aulas de ciências ou de biologia, a sexualidade é um excelente tema para
as nossas discussões, até porque, no ensino básico, adolescentes e jovens estão vivendo
muitas transformações em seu corpo, em seus hormônios. Dessa maneira, o professor de
história pode tomar como ponto de partida a sexualidade hoje e abrir o debate sobre os
hominídeos, suas experiências sexuais, sua afetividade. A sexualidade, como veremos neste
capítulo, possui história. E algo muito importante a mostrar para as nossas turmas que a
maneira que nos relacionamos com o corpo, hoje, é bem diferente dos nossos ancestrais.
Então, vamos voltar para a pré-história para sabermos como os nossos antepassados se
relacionavam com o corpo? Você pode assistir com os seus alunos, para compreender a
sexualidade hoje, o vídeo-debate intitulado “Juventude e sexualidade (Ensino médio: entre
jovens e estudantes) que está no seguinte endereço: http://www.dominiopublico.gov.br/
pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=22216. O vídeo servirá de ponto inicial
para o debate sobre a sexualidade na pré-história.
Para mostrar as maneiras como os homens e mulheres da Pré-História pensavam
e se relacionavam com o próprio corpo, precisamos revisar um pouco o processo de
hominização. Para André Bourguignon, a hominização consiste na passagem do primata para
o humano, sendo caracterizada, dentre outras coisas, pelo desenvolvimento de uma forma
determinada de inteligência, incluindo o senso moral e uma profundidade introspectiva,
bem como pelo desenvolver de uma postura bípede. No tocante à inteligência, o homem
passou a refletir acerca das coisas a sua volta, ocorrendo uma passagem que estabelece
um novo estado da matéria viva, ou seja, a capacidade de raciocinar e de refletir como

20
Pré-História

um dos últimos estágios da matéria. (BOURGUIGNON, 1990, p. 187-189). Susana Regadas,


estudando as marcas específicas no processo hominização, comenta que a passagem do
primata ao hominídeo foi caracterizada por:

a) Posição ereta e locomoção bípede (hominídeos);


b) Libertação da mão e uso de utensílios, aumento do cérebro, organização superior
do sistema nervoso (associar, simbolizar, inventar);
c) Maior dependência da cultura do que do instinto;
d) Passagem do mero uso de sinais à utilização criativa de signos. (2007, p.289)
Como visto na imagem acima, um grupo de cientistas italianos encontrou dois
esqueletos com mais de cinco mil anos, na cidade de Mantova, norte da Itália. Pela primeira
vez, os arqueologistas tiveram a oportunidade de encontrar um enterro duplo com tão
longa data. Contudo, o que mais impressiona é que os esqueletos se encontram abraçados,
Atenção
sugerindo a última morada de um casal em união7.
Segundo parte dos especialistas, a exemplo de André Bourguignon, Timothy 7
Enamorados do
Taylor, e os arqueólogos Olga Soffer e J. M. Adovásio, pelo menos dois aspetos distinguem Neolítico. Disponível
a sexualidade humana das demais: sua natureza acíclica e sua intensidade acentuada. em: Fonte: http://www.
alunosonline.com.br/
Gostaria de acrescentar outro elemento a esta lista: a separação da sexualidade dos historia/enamorados-
objetivos puramente reprodutivos: do-neolitico.html
Acesso em 10 de junho
Esquematicamente, até a aparição do homem a sexualidade 2011.
e a reprodução mantêm-se quase confundidas; com a
hominização, em decorrência do descompasso entre a
sexualização neuropsíquica e a tardia maturação das gônadas,
necessária à reprodução, instaura-se uma possibilidade de
dissociação entre reprodução e sexualidade, que passa então
a poder se manifestar fora do domínio da reprodução, isto é,
nos do psiquismo e do comportamento, o que transforma
profundamente as relações entre os sexos e entre filhos e pais
(BOURGUIGNON, 1990, p. 187).
O livro O Sexo Invisível, escrito pelos arqueólogos Olfa Soffer e J. M. Adovásio,
em parceria com o jornalista Jake Page, traz novas leituras e interpretações acerca da
sexualidade na Pré-História, desconstruindo e criticando autores que relegam à mulher uma
condição passiva, apenas uma coadjuvante do homem, uma babá para os filhos ou uma
cozinheira de carne e vegetais. Estes autores lançaram mão de artefatos perecíveis, como
utensílios, cordas, restos de tecidos para escreverem artigos refutando teses tradicionais
da paleontologia, as quais, segundo eles, “atribuem às mulheres uma participação mais
passiva do que elas realmente tiveram nas sociedades primitivas” (RANGEL, 2009). Segundo
os estudiosos, seres humanos do sexo feminino participavam da vida cotidiana junto dos
homens, “caçavam, inclusive mamutes, e exerciam funções logísticas na organização dos
espaços comuns” (RANGEL, 2009). Além, disso, as mulheres também desempenhavam
papel fundamental no desenvolvimento de rudimentos de linguagem.

21
Pré-História

Sobre o bipedalismo, você pode aprofundar os seus conhecimentos a partir dos seguintes
materiais.

Livros:

COSTA, Otávio Barduzzi Rodrigues da. Sobre as causas evolutivas da cognição humana. Dissertação
(Mestrado em Filosofia). Universidade Estadual Paulista, 2009. Disponível em: http://www.
dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=166052. Acesso
em: 11 ago. 2011.

FERH, Ernts; REINNIGUER, Suzann-Viola.

Revista viver mente e cérebro. Duetto Editora SP-SP ed. 1 n.4, jan. 2005.

JOHANSON, D. C. & EDEY, M. A. Lucy: os primórdios da humanidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1981.

LEWIN, R. Evolução humana. São Paulo: Atheneu, 1999.

RIBAS, Guilherme. C. Considerações sobre a evolução filogenética do sistema nervoso, o


comportamento e a emergência da consciência. Revista Brasileira de Psiquiatria, v.28, p. 226-238;
2006.

RIBAS, Guilherme. C. As bases neuroanatômicas do comportamento: histórico e contribuições


recentes. Rev Brasileira de Psiquiatria, v.28, p. 63-71; 2007.

STANFORD, C. Como nos tornamos humanos. Rio de Janeiro: Elsevier/Campus, 2004.

Gostaria de chamar a atenção para o caráter não necessariamente reprodutivo


de nossa sexualidade. Contudo, quando aceitamos os desafios da história, nunca ficamos
satisfeitos em apenas descrever algo. Nosso espírito logo pede mais. Somos, então,
Atenção impelidos, enquanto historiadores que reconhecem seu dever, à análise, à investigação, à
explicação enfim.
8
Estro: conjunto
dos fenômenos que Para este caso fazemos a seguinte pergunta: o que levou a sexualidade humana a se
acompanham a diferenciar tanto dos demais seres vivos? Nesse sentido, pensamos que quando se tornou
ovulação das fêmeas bípede, o homem transformou também a sua forma de se relacionar sexualmente. Aí você
entre os mamíferos. Cf.
Dicionário on line de deve perguntar: mas como? O que uma coisa tem a ver com a outra? Então, veja bem:
Português.
Nos mamíferos quadrúpedes, o comportamento sexual do macho é quase
totalmente influenciado pelo estado de estro8 de sua respectiva fêmea. Como nestes
casos a vulva9 da fêmea é mais acessível ao macho, pois ela fica bem mais exposta do
Atenção
que nas humanas, este estado cíclico de ovulação incita seu desempenho sexual de forma
relativamente periódica, através de um complexo conjunto de estímulos de natureza visual,
9
Parte externa dos
mas, sobretudo, de ordem olfativa. Sendo assim, para a grande maioria dos mamíferos
órgãos genitais
femininos. Cf. quadrúpedes, a atividade sexual é relativamente cíclica e praticamente inseparável dos
FERREIRA, Aurélio objetivos reprodutivos da espécie. Abaixo, algumas imagens sugerem as diferenças dos
Buarque de Holanda. aparelhos reprodutivos de algumas espécies:
Miniaurélio Século
XXI Escolar: O No que diz respeito à atividade sexual dos primatas superiores, no entanto,
minidicionário da
percebemos algumas diferenças importantes quando as comparamos ao que se passa
língua portuguesa.
4 ed. Rio de Janeiro: com o restante dos mamíferos. Aqui já notamos um grau de complexidade maior nas
Nova Fronteira, 2000.p. relações sexuais. De certa forma, como demonstram as observações recentes feitas pelos
718. primatólogos de plantão, sua atividade sexual já apresenta alguns poucos elementos da

22
Pré-História

sexualidade humana.
Sendo assim, parece que eles configuram uma área de transição entre a
sexualidade cíclica e reprodutiva dos demais mamíferos e a nossa. Como, além disso, nosso
histórico evolutivo nos relaciona de forma direta aos primatas, vamos então considerá-los
brevemente por meio de uma citação tão sintética quanto esclarecedora:

[...] pode-se dizer que os primatas não humanos se diferenciam dos


outros mamíferos pelo fato de que a receptividade sexual das fêmeas
não é inteiramente cíclica, isto é, totalmente ligada á ovulação, e que
sua atividade sexual é em geral grande. [...] deve-se notar que entre
os primatas a sexualidade já começa a se dissociar de seu fim inicial, a
reprodução. [...] a receptividade não cíclica e a atividade sexual muito
acentuada marcam uma transição entre a sexualidade dos outros
mamíferos e a do Homo sapiens sapiens, em que ela ocupa um lugar
importante e radicalmente específico (BOURGUIGNON, 1990, p. 188-
189).
Contudo, se esta breve digressão à sexualidade animal é bastante reveladora sobre o
processo de hominização, ela impõe a pergunta que não desejamos deixar de responder: em
que reside a especificidade da sexualidade humana? Para responder a este questionamento,
nos valemos de um aspecto realmente definidor de nossa humanização. Estou me referindo
à passagem do quadrupedalismo para o bipedalismo, estudado, dentre tantos autores, por
David García Collin, no artigo “El Materialismo Histórico y Dialéctico aplicado al proceso de
Atenção
“hominización”, el surgimiento de las clases sociales y la civilización10”.
Ora, as transformações que esse desenvolvimento suscitou em nossa anatomia 10
“O materialismo
sexual, conforme podemos ver e ler nas imagens abaixo, repercutiram bastante sobre o histórico e dialético
relacionamento entre os sexos, conectando, dentro de uma mesma operação evolutiva, aplicado ao processo
de ‘hominização’, o
aspectos de natureza fisiológica e anatômica como os de ordem social e cultural. surgimento das classes
sociais e a civilização”
O bipedalismo, na medida em que modificou a posição dos órgãos sexuais,
transformou também o nosso comportamento sexual. Como isso aconteceu? Da seguinte
forma: como a genitália feminina passou a se localizar em um ponto mais “protegido” dos
olhares e narinas masculinos (menos exposta e mais longe da cabeça), os estímulos sexuais
olfativos, notadamente cíclicos, perderam parte de sua atratividade. Por isso, aos poucos
eles foram sendo substituídos por estímulos sexuais visuais que, como tal, teriam que ser
necessariamente mais permanentes. Em função disso, as relações sexuais entre nossos
antepassados pré-históricos se tornam cada vez menos periódicas, permitindo à sexualidade
humana se desvencilhar dos objetivos puramente reprodutivos.
Susana Regada, comentando as pesquisas feitas pelo pesquisador Owen Lovejoy, da
Universidade de Kent, nos Estados Unidos da América, descreve o bipedalismo como “uma
questão de sexo”, de fidelidade para com o ou a companheira, “reforçando a proposta de
que provavelmente os primeiros bípedes seriam monógamos – pelo menos no período de
gestação e enquanto a infância dos descendentes – para que a paternidade fosse garantida”
(2007, p.237).
E é aí que encontramos o verdadeiro “pulo do gato”. Ora, com isso, nossa
sexualidade vai perdendo seu significado exclusivamente fisiológico, para se tornar um
espaço de prazer, tornando possível não apenas que o sexo deixe de ser feito unicamente
visando à reprodução, mas também introduzindo nele um aspecto que distingue por demais
a sexualidade humana da dos outros seres vivos: o apego, a ternura, o amor, a afetividade,
o carinho.
Muito embora eu não discorde totalmente do aluno mais crítico (que por ventura
esboce o argumento de que não é possível saber o grau de afeto que permeia as relações

23
Pré-História

sexuais entre os demais seres vivos), ele há de concordar que, mesmo entre os primatas
superiores, qualquer que seja o nível hipotético de ternura que envolva um macho e
uma fêmea durante uma cópula, ele é infinitamente inferior ao que nós, seres humanos,
conseguimos desenvolver em nossas relações sexuais na contemporaneidade. Isto não
significa ser melhor ou pior, mas uma questão de criação/invenção de novos jeitos de amar,
de acariciar, de se relacionar com outro. Quanto a isto, somos responsáveis por novas
concepções nas artes de se relacionar com outro: o afeto, o carinho, a ternura, presente
muito mais nas relações pais-filhotes do que nas sexuais.
Para explicar isto, enfatizo uma transformação em nossas relações sexuais que é
difícil dizer se é mais da ordem da cultura do que da anatomia, porque, para mim, ambos
os fatores tiveram sua parcela de “culpa”. Refiro-me à substituição do coito dorso feminino
- ventre masculino, então predominante, pela possibilidade da relação sexual ventre contra
ventre. Com o desejo de explicar melhor a importância desta transformação para a inserção
do afeto na sexualidade humana, ofereço-lhes o sensível texto escrito por Bourguignon a
este respeito:

A partir de então, o ato reprodutor, impondo o decúbito, isto é, a


posição do repouso e do abandono, tornou-se, geralmente, uma
relação muito mais rica, muito mais complexa, que exige tempo, e uma
ocasião de comunicação íntima entre dois seres que se encaram. Os
olhares se falam, os lábios se unem, as mãos acariciam e se cerram,
os braços estreitam os corpos. Essa harmonia relacional transformou
o ato sexual numa fonte inesgotável de prazeres físicos e psíquicos
variados, que encontram seu acme no orgasmo dos dois parceiros.
Esse enriquecimento da troca deve ter se operado pouco a pouco ao
longo de todo o processo de hominização, até que ela assumisse - sem
dúvida após o aparecimento da linguagem articulada - a forma sob a
qual a conhecemos (BOURGUIGNON , 1990, p. 190).
Enfim, espero ter conseguido demonstrar a especificidade da sexualidade humana.
Ela nos transforma de seres sexuados para a espécie mais “sexual” que possa existir.
Depois, o processo evolutivo que tanto nos distinguiu sexualmente das demais espécies
dialogou bem de perto com a nossa hominização, sendo até difícil afirmar com segurança
quem influenciou quem: a sexualização produziu o homem moderno, ou a hominização
possibilitou a sexualidade humana?
Esta é, sem dúvida, uma pergunta difícil de responder. Se o (a) prezado (a)
estudante me permitir, creio que ambos os processos caminharam lado a lado nas veredas
de nossa história evolutiva, relacionando cultura e natureza, sociedade e biologia. Por outro
lado, dialogando e influenciando-se mutuamente, também nunca deixaram de estabelecer
conexões com outros elementos importantes para o surgimento do homem moderno, tais
como o desenvolvimento cerebral, a fabricação de artefatos, a linguagem e a arte. Ora se
assim não fosse, seria simples obra do acaso que parte das expressões artísticas (figurativas
e abstratas) datadas bem próximas ao aparecimento do homem moderno enfatize a
sexualidade como seu tema principal de representação? Eu creio que não.

Saiba Mais

A ciência admite que bipedalismo, cérebro grande e capacidade tecnológica não


foram exclusividades do Homo habilis, há cerca de 2 milhões de anos, nem mesmo que
foram eventos paralelos que possam distinguir e caracterizar uma única espécie. Para
o atual estágio do conhecimento, tem-se que o bipedalismo apareceu a primeira vez

24
Pré-História

no Sahelanthropus tchadensis, mais antigo fóssil de hominídeo encontrado, que teria


vivido há aproximadamente 7 milhões de anos; a capacidade tecnológica remontaria ao
Australopithecus garhi, há 2,5 milhões de anos; e o aumento considerável do cérebro teria
ocorrido apenas com o Homo habilis, há 2 milhões de anos, especialmente devido à inclusão
em sua dieta de carniça animal.
Os supostos acontecimentos da Pré-história, desta maneira, nada mais são do
que convenções estabelecidas pelos pesquisadores como verdade em um determinado
tempo e espaço. Convenções que podem ser mudadas com a transformação do cenário, a
descoberta de novos fósseis, a reclassificação de tantos outros, a invenção de novas espécies
para classificar ossos que não se enquadram nas espécies já inventadas e nomeadas, etc.,
dando lugar a outros enunciados que são estabelecidos enquanto verdade até que sejam
novamente renomeados e assim por diante. Um dos mais recentes exemplos consiste na
reclassificação do homem de Neandertal, antes considerado uma subespécie de Homo
sapiens, nomeado Homo sapiens neanderthalensis, e hoje considerado uma espécie distinta
da do Homo sapiens, nomeado agora tão somente de Homo neanderthalensis.
Adaptado de: AGRA, Giscard. A invenção da Pré-
História. Campina Grande: UFCG, 2009, p. 11-12)

Relações de Parentesco na Pré-História

Este capítulo não estaria “completo” se o mesmo não abordasse a questão do


parentesco e do surgimento da função social paterna. Isso por que estes dois aspectos
estão ligados às transformações que ocorreram em nossa sexualidade em meio ao processo
de hominização. Assim, a discussão sobre eles é importante na medida em que dialoga
com outras questões relevantes para a nossa abordagem: a da sexualidade humana; a da
instituição da função social paterna; a da inibição do incesto; e a da relação entre os sexos.
Ademais, sistemas de parentesco podem ser observados entre outras espécies, embora com
um grau de complexidade bem precário. Sendo assim, nos parece óbvio que os sistemas de
parentesco complexos que conhecemos hoje são elaborações culturais dos seres humanos
modernos. Abaixo, as imagens sinalizam para relações parentais na pré-história e na
contemporaneidade.

Sobre sistema de parentesco, você pode ampliar os seus conhecimentos pesquisando nos
seguintes materiais:

SILVA, Márcio. Linguagem e parentesco. Revista de Antropologia. vol.42 n.1-2 São Paulo,
1999. (A versão eletrônica está disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-
77011999000100009&script=sci_arttext)

SILVA, Márcio. Romance de primas e primos: uma etnografia do parentesco waimiri-atroari, tese
Manaus: Edufma, 2009.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. (org.). Antropologia do Parentesco: estudos ameríndios. Rio de


Janeiro: EdUFRJ, 1995.

Em primeiro lugar, cabe esclarecer qual a função de um sistema de parentesco.


Só assim, poderemos compreender por que nossos sistemas familiares se tornaram mais
complexos do que os dos demais animais. Sendo assim, podemos dizer que um sistema
de parentesco tem o objetivo de definir claramente a questão da filiação (quem é filho
de quem) e o tema da aliança (quem é “esposo/esposa” de quem ou, mais rusticamente,
a quem é autorizado fazer sexo com quem). Ambas as questões são fundamentais para a

25
Pré-História

normatização das relações sexuais humanas, diversificando-se em função da cultura e das


condições históricas e influindo diretamente sobre a questão da propriedade e dos papéis
sócio-sexuais.
Uma observação comparativa entre os sistemas de parentesco de outros animais
(especialmente dos primatas superiores) em relação aos nossos, permite identificar a
complexidade introduzida pela cultura neste âmbito. Sendo assim pode-se afirmar com
certa segurança que o Homem moderno acabou por formular sistemas de parentesco bem
mais complexos que os seus congêneres do reino animal, em função de dois elementos
chave.
Primeiro, ao contrário da maioria dos sistemas de parentesco que são possíveis
observar entre os primatas superiores, nós conseguimos congregar (em um único sistema)
tanto a definição clara da aliança quanto da filiação: ou seja, na maior parte de nossas
culturas, sabem-se quem é filho de quem e quem pode fazer sexo com quem, o que não
se observa no mundo animal, onde normalmente só um destes dois objetivos é alcançado
(ou se define a questão do acasalamento por meio de uma definição relativamente clara da
aliança, ou se logra resolver o problema da filiação, pela delimitação da descendência).
Em segundo, temos a introdução da linguagem no âmbito dos sistemas de
parentesco que, por meio da denominação da família, não apenas permite definir com
muito mais clareza os familiares, como também dota nossos sistemas de parentesco de
uma complexidade nunca antes vista (PINKER, 2002). Paremos por aqui quanto à questão
do parentesco. Isso porque, creio eu, estas breves considerações são suficientes para que
possamos compreender (talvez) a mais importante implicação de nossos complexos e
modernos sistemas de parentesco, que é a instituição definitiva da função social paterna em
algumas culturas.
Ora, você estudante há de concordar com o fato de que, ao contrário da
Atenção maternidade, cuja estruturação recebe o reforço de um elemento biológico tão forte quanto
à gravidez e o parto11, a paternidade é um pouco mais complexa de se definir. Isso acontece
porque não há uma ligação biológica mais visível que relacione de forma concreta pai e
11
Muito embora
devamos estar atentos filho, cenário ainda mais complexo na aurora da humanidade quando a monogamia ainda
para o fato de que não tinha a prevalência que possui hoje.
tanto a função social
de mãe quanto a de A intervenção paterna no cuidado com os filhos não é uma exclusividade humana.
pai, são construções Contudo, o nível a que ela alcança em nossa espécie realmente a diferencia de todas as
socioculturais, variando
assim conforme a
suas congêneres animais, de modo que não estaríamos errados ao supor que a intervenção
diferença cultural paterna dos humanos no cuidado com os filhos é tão intensa que configura uma noção de
e a diversidade das paternidade em outro nível do observado no restante da natureza.
condições sócio-
históricas. Quando tentamos explicar a paternidade entre os homens, observamos certa
convergência entre os dados fornecidos pelas análises culturais e pelos estudos biológicos.
Sendo assim, o nosso acentuado desenvolvimento cerebral tem como uma de suas mais
poderosas pressões seletivas as nossas dificuldades de adaptação orgânica e física ao meio:
como já vimos, ao contrário de outras espécies, nós conseguimos habitar todo o planeta por
que nossa adaptação evolutiva não se deveu unicamente ás nossas virtudes físicas, mas o
seu principal elemento viabilizador foi sem dúvida a nossa capacidade de produzir a cultura
e o meio que nos rodeia.
É claro que apenas com um desenvolvimento cerebral e intelectual como o que
experimentamos ao longo de nossa hominização, realmente sem par na história biológica
do planeta, nossa espécie pôde vencer suas limitações físicas e adaptar-se, melhor que
qualquer outra, aos mais variados ambientes: ao invés de garras afiadas ou peles adequadas
a certos ambientes, nosso processo de hominização nos dotou de uma capacidade cerebral
única, apta a nos fazer superar nossas aparentes limitações físicas por meio da elaboração

26
Pré-História

da cultura e da intervenção sobre o meio no qual vivemos.


O problema é que a necessidade de um acentuado desenvolvimento cerebral
entre os de nossa espécie acabou por prolongar demais a dependência que nossas crianças
têm em relação aos seus pais, e isto tanto em intensidade quanto em tempo. Sendo
assim, esta acentuada dependência dos filhotes em nossa espécie, acabou por estimular a
necessidade de uma intervenção paterna mais intensa na criação dos filhos, chegando ao
ponto de podermos falar em uma institucionalização da paternidade e não mais apenas em
intervenções curtas e esporádicas do macho em benefício de sua suposta prole.
Ao fator biológico, soma-se a dimensão cultural. Sim, porque à medida que os
grupos de caçadores e coletores iam cedendo espaço para os agricultores e criadores
de animais, outras relações com a propriedade vão sendo experimentadas por nossos
antepassados pré-históricos. Com a sedentarização progressiva dos grupos humanos, a
que se sucederá à gradual efetivação da lógica privativa de apropriação da terra, é possível
que nossos ancestrais tenham cada vez mais atentado para a importância de se preservar
a descendência e a linhagem, como forma de preservar os bens dentro da família. Nesse
ínterim, a monogamia com a presença constante do pai no seio familiar, pareciam meios
adequados para promover estes fins.
Por outro lado, grande parte dos especialistas admite que a mais intensa intervenção
do pai na criação dos filhos entre os de nossa espécie, acabou por ser muito bom do ponto
de vista evolutivo. Isso por que a intervenção paterna transtornou a relação que prevalecia
na natureza: a da mãe com o filho. Assim, os filhos de nossos antepassados pré-históricos
não teriam toda a vida para se adaptar a viver sem os cuidados da mãe, pois agora haviam
ganhado um rival à altura na luta pela atenção materna: o genitor tornado pai. Se por um
lado a criança perdia uma relação de exclusividade com a mãe que, apesar dos privilégios,
era muito pouco estimulante para o seu desenvolvimento psíquico, passava a viver em um
ambiente cujas pressões evolutivas eram mais propícias para o aperfeiçoamento de sua
autonomia.

Autores e Obras

A relação entre pais e filhos, numa perspectiva piagetiana, pode ser melhor estudada mediante
os seguintes materiais de apoio didático-pedagógico:
PIAGET, Jean. Os Procedimentos da Educação Moral. In Lino de Macedo (Org.).
Cinco estudos de educação moral. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1996.
_____ O juízo moral na criança. 2. ed. São Paulo: Summus, 1994.
_____. É possível uma educação para a paz? In: S. PARRAT-DAYAN e A. TRYPHON (Orgs.). Sobre
a pedagogia. C. Berliner (trad.). São Paulo: Casa do Psicólogo. 1998.
_____. Seis Estudos de Psicologia. Rio de janeiro: Forense-Universitária, 1986.
_____. Para onde vai a educação. 15. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1995.
PUIG, J. M. A construção da personalidade moral. São Paulo: Ática, 1998.
TOGNETTA, L. R. P. A construção da solidariedade: a educação do sentimento na escola.
Campinas: Mercado de Letras/ Fapesp, 2003.
VINHA, T. P. O educador e a moralidade infantil: uma visão construtivista. Campinas, SP: Mercado
de Letras/ Fapesp, 2000.
XYPAS, C. Piaget e a educação. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.

Outra questão que a discussão sobre a sexualidade humana na pré-história suscita

27
Pré-História

é a da proibição do incesto12. Digo isto apoiado no seguinte: a intensa sexualização dos seres
Atenção humanos acaba por estimular desejos sexuais incestuosos. Além disso, à medida que as
relações sexuais humanas passaram a dialogar com o afeto, mais presente nas relações entre
12
União sexual ilícita pais e filhos estas se tornaram cada vez mais erotizadas. Sendo assim, esta sexualização da
entre parentes criação dos filhos passou a configurar um importante problema, na medida em que dava
consanguíneos,
adotivos ou afins. Cf. margem ao estímulo de sentimentos incestuosos entre pais e filhos. Como este tipo de
FERREIRA, Aurélio relação sexual é extremamente danoso à espécie13, as sociedades e culturas humanas se
Buarque de Holanda. viram às voltas com a instituição de normas que interditassem a prática do incesto.
op. cit., p. 380.
Édipo e Fedra: o tema do incesto

A atração natural do filho pela mãe ou da filha pelo pai que, a partir de Sigmund Freud, passou
Atenção
a ser objeto de estudo da psicanálise, antigamente já fomentara a fértil imaginação dos gregos,
dando origem a vários mitos ou histórias fantásticas sobre relacionamentos endógamos. O mais
13
O incesto é
prejudicial porque famoso é o mito de Édipo: Jocasta, a esposa de Laio, rei de Tebas, informada pelo oráculo de Delfos
acaba privando a que o nascituro estava destinado a matar o pai e casar com a mãe, ordenou que um serviçal desse
variabilidade genética, fim ao bebê. Mas o criado ficou com dó, abandonando Édipo (o “dos pés atados”, como se fosse
condição fundamental
um franguinho) no campo. Criado por pastores, o belo jovem, quando ficou sabendo do oráculo,
para a sobrevivência de
qualquer espécie, na achando que era filho de Políbio e Peribeia, se afastou da casa dos pais putativos e, por ironia do
medida em que garante destino, foi parar na cidade de seus pais verdadeiros.
a sua capacidade
adaptativa. Cf.
BOURGUIGNON, André Ao chegar a Tebas, numa encruzilhada, teve uma altercação com um senhor de idade e acabou
op. cit., p. 197. matando o velho sem saber que Laio era o rei, seu pai. Ao entrar na cidade, enfrentou a Esfinge,
um monstro metade mulher e metade leão, que devorava os estrangeiros que não conseguissem
desvendar o enigma: “Qual é o animal que tem quatro pés de manhã, dois ao meio-dia e três à
tarde?”. Édipo respondeu: “é o homem”, pois na infância engatinha, depois anda e, quando velho,

28
Pré-História

usa a bengala. Vencido o desafio, o forasteiro é acolhido como herói e, porque acabara de ser
assassinado o rei Laio, lhe é ofertada a bela viúva Jocasta em casamento. Édipo casa com a rainha
de Tebas, sem saber que era sua mãe natural, e com ela tem quatro filhos.

Após longos anos de felicidade conjugal e de sábio governo, o rei tem que enfrentar uma terrível
desgraça: a cidade de Tebas sofre de uma misteriosa epidemia que dizima homens e animais.
Consultado o oráculo de Apolo, a resposta é de que a peste não cessaria enquanto o assassino do
rei Laio ficasse impune. Édipo ordena que se investigue o caso e o adivinho Tirésias esclarece que
o culpado é o próprio rei. Perante tal monstruosa revelação, Jocasta se suicida e Édipo fura seus
olhos e abandona a cidade.

O mito de Édipo foi explorado por escritores e artistas ao longo dos 25 séculos da
cultura ocidental. Mas a melhor representação ainda é a peça do dramaturgo Sófocles,
Édipo Rei, que remonta ao século V a.C. e foi submetida a diversas interpretações pelos
exegetas. Os versos da fala de Jocasta a Édipo: “Não tenha medo da cama de tua mãe:
Quantas vezes em sonho um homem dorme com a mãe!” inspiraram Freud na formulação do
famoso “complexo de Édipo”, onde o médico austríaco explica que o sonho é a realização disfarçada
de um desejo recalcado e que o seio materno é a primeira fonte de prazer do ser humano.

O que caracteriza o mito trágico é a coexistência dos contrários: Édipo é culpado, pois matara o
pai e casara com a mãe, mas, ao mesmo tempo, é inocente, pois não sabia. O motivo do inocente-
culpado tem sua explicação, pois a culpa não é individual, mas atávica: Édipo paga o preço de um
pecado cometido pelo seu progenitor. Narra o mito que Laio, o pai de Édipo, durante umas férias,
raptou, seduziu e abandonou o jovem Crisipo, filho do rei da Frigia, que acabou se suicidando.

O pai do rapaz amaldiçoou o raptor, pedindo aos deuses que ele nunca tivesse um filho; mas, caso
o tivesse, que ele fosse a causa da sua morte.

O mito de Édipo, que explora o tema do incesto, tem o seu equivalente feminino no mito de Electra,
que trata da atração da filha pelo pai, e de Fedra, que aborda relações sexuais entre membros da
mesma família. Electra é filha de Agamenão e Clitemnestra, soberanos de Micenas. Durante a longa
ausência do rei, que fora comandar a frota naval grega na Guerra de Tróia, a rainha se apaixona
pelo cunhado Egisto e juntos maquinam o assassinato de Agamenão, quando do seu regresso.
Electra ajuda o irmão Orestes a vingar a morte do pai, causando a morte da mãe adúltera e do tio
assassino.

29
Pré-História

A psicanálise, assim como apresentada por C. G. Jung, denomina “complexo de Electra” à atração
sexual não sublimada que uma filha possa sentir pelo próprio pai. Depois de uma fase de fixação
afetiva na mãe, quando da amamentação e na primeira infância, a menina pode passar a sentir um
sentimento mórbido pelo pai, em quem constrói a imagem do homem ideal. Electra simboliza a
tendência a um amor incestuoso da filha pelo pai, quando o sentimento de apego não é resolvido
de uma forma adequada, podendo causar neuroses. O mito de Electra, como o de Édipo, inspirou
muitas obras de arte dramática e plástica, através dos tempos.

A figura de Fedra, irmã de Ariadne, está ligada ao mito do pai Minos, rei de Creta, e de Teseu, o
maior herói de Atenas, famoso por inúmeras aventuras de luta e de amor. A façanha mais conhecida
foi sua vitória sobre o Minotauro, na ilha de Creta. Matou a socos a fera, fechada no Labirinto e
de lá conseguiu sair graças à ajuda da esposa Ariadne, que lhe deu um novelo de fio para marcar
o caminho de volta. Mas, ingrato, abandonou a jovem na ilha de Naxos, onde ela morreu de dor.
E pagou por isso, de acordo com a justiça cósmica. Já velho, Teseu casou com a cunhada mais
nova, Fedra, que enquanto o marido participava da expedição dos Argonautas, se apaixonou pelo
jovem enteado Hipólito. O rapaz, que tinha feito voto de castidade a Diana, deusa da caça, não quis
saber da madrasta. Sentindo-se repudiada, ela apela pela vingança: escreve uma carta ao marido,
acusando o jovem de assédio sexual. Hipólito é executado e Fedra se enforca.

O que mais impressiona no mito de Fedra, largamente representado na cultura ocidental, além
do alto grau de violência a que pode levar uma paixão louca não correspondida, é a maldade
possível no coração de uma mulher: ela acusa o rapaz justamente daquilo que ele não quisera fazer,
transformando a vítima num agressor. O mito de Édipo, como outros mitos, enquanto arquétipo de
ações humanas vive se repetindo continuamente ao longo da nossa existência.

Adaptado de:

D´ONOFRIO, Salvatore. Pensar é preciso: reflexões sobre filosofia, religião, literatura, política e
cidadania. Disponível em: http://acervodigital.unesp.br/handle/123456789/38658. Acessado em
3 jul. 2011, p. 10-12.

Isto é interessante porque as mais diversas espécies de animais possuem


mecanismos de inibição do incesto cuja base é biológica. Também no homem podemos
observar sutis mecanismos biológicos para evitar o incesto, os quais parecem tanto mais
imperceptíveis quanto mais avança nossa história cultural. Assim, é curioso que, para o
nosso caso, elementos de inibição biológicos e genéticos tenham recebido o apoio de
normas socioculturais para reforçar a proibição que paira sobre o incesto. É claro que estas
normatizações vão variar (dependendo da cultura, da sociedade e das condições históricas),
mas é muito difícil encontrar um único grupo humano no qual os mecanismos biológicos
que evitam o incesto não receberam o providencial reforço das proibições socioculturais.
Daí é que vem a seguinte pergunta: por que, entre nós, a cultura se somou à natureza
para proibir o incesto? Creio que dois elementos compõem uma tentativa de elucidar este
problema. Primeiro, o avanço de nossa história cultural tornou menos contundentes os
mecanismos biológicos que incidem sobre a questão. Segundo, o processo de hominização
estimulou os desejos incestuosos em dois aspectos: 1) prolongou o tempo de dependência
da criança em relação aos pais; 2) dotou a sexualidade humana de uma intensidade sem
igual, o que contribui para dissociar os desejos sexuais dos objetivos exclusivamente
reprodutivos, bem como para que o afeto e a sexualidade fossem congregados sob a mesma
égide, levando a ternura para as relações sexuais e erotizando as relações entre pais e filhos.
Como os elementos analisados no parágrafo anterior possuem íntima ligação com
a hominização, podemos afirmar que este processo (que configura o aparecimento do

30
Pré-História

homem moderno), com todas as transformações que suscitou, responde pelo incremento
sociocultural dos mecanismos biológicos de evitação do incesto entre nós. Isto porque a
hominização introduziu mudanças tão impactantes na cultura, na fisiologia, na anatomia
e na sexualidade humanas, que se fossem empregados apenas os mecanismos biológicos,
ou somente as proibições socioculturais, a interdição do incesto talvez não fosse alcançada,
arrematada pelas forças da hominização/sexualização de nossa espécie. Daí a necessidade
de congregar biologia e sociedade, cultura e natureza pelo bem da variabilidade genética da
espécie.
Enfim, a proibição do incesto e a instituição dos complexos e modernos sistemas
de parentesco, tiveram profundas implicações sobre a estruturação das sociedades e
das culturas humanas. Mas não só. Ambos os aspectos também incidiram sobre o nosso
desenvolvimento psíquico e cerebral, atuando até mesmo como eventuais pressões seletivas
para os da nossa espécie, na medida em que os constrangiam para um maior incremento de
sua autonomia, de suas capacidades cognitivas, de suas aptidões cerebrais e, por último,
mas não menos importante, de suas competências psíquicas (JARDIM, s/d).
Uma última questão relevante é a dominação feminina, principalmente no
que ela, historicamente, afetou as relações entre os sexos. A subjugação das mulheres é
outro elemento que distingue nossa espécie das demais. Mesmo que o estudante mais
atento lembre que em outras espécies, sobretudo entre os primatas superiores, também
predomine a dominação do macho sobre a fêmea, ele há de convir que o grau de
subjugação das mulheres nas diversas sociedades humanas atinge níveis jamais observados
na natureza. Nesta, na maioria dos casos, a força física garante a prevalência masculina;
entre nós, à disparidade física soma-se a cultura para garantir a subjugação da mulher ao
homem. Abaixo, as imagens representam duas vivências diferentes: a) a rendição feminina
ao masculino (imagem I); b) a luta das mulheres pela igualdade de gênero (imagem II).
Quando falo em “dominação masculina”, desejo que você, prezado estudante,
atente para o seguinte: a dominação da mulher pelo homem não tem nada de natural ou
biológica; é uma construção de ordem social, histórica e cultural, como analisam autores do
Fique por
porte de Guacira Lopes Louro (1997) e Michel Foucault (1991)14. Além disso, a “dominação
Dentro
masculina” não está inerente apenas ao sexo masculino, mas também ao feminino, como
assevera Pierre Bordieu (1999). 14
Acerca desse
importante teórico da
filosofia da história,
confira: http://
educacao.uol.com.br/
biografias/paul-michel-
foucault.jhtm

31
Pré-História

Minibiografia

Michel Foucault
Michel Foucault – um estudioso que ampliou nosso campo de discussão e nos fez problematizar
os saberes
Nascido em uma família tradicional de médicos, Michel Foucault frustrou as expectativas de seu
pai ao interessar-se por história e filosofia. Apoiado pela mãe, mudou-se para Paris em 1945,
onde foi aluno do filósofo Jean Hyppolite, que lhe apresentou à obra de Hegel.
Em 1946, conseguiu entrar na École Normale. Seu temperamento fechado o fez uma pessoa
solitária, agressiva e irônica. Em 1948, após uma tentativa de suicídio, iniciou um tratamento
psiquiátrico. Em contato com a psicologia, a psiquiatria e a psicanálise, leu Platão, Hegel, Marx,
Nietzsche, Husserl, Heidegger, Freud, Bachelard, Lacan e outros, aprofundando-se em Kant,
embora criticasse a noção do sujeito enquanto mediador e referência de todas as coisas, já que,
para ele, o homem é produto das práticas discursivas.
Dois anos depois, Foucault se licenciou em Filosofia na Universidade de Sorbone e no ano
seguinte formou-se em psicologia. Em 1950 entrou para o Partido Comunista Francês, mas
afastou-se devido a divergências doutrinárias. No ano de 1952 cursou o Instituto de Psychologie
e obteve diploma de Psicologia Patológica. No mesmo ano tornou-se assistente na Universidade
de Lille. Foucault lecionou psicologia e filosofia em diversas universidades, na Alemanha, na
Suécia, na Tunísia, nos Estados Unidos e em outras. Viajou o mundo fazendo conferências.
Em 1955, mudou-se para Suécia, onde conheceu Dumézil. Este contato foi importante para o
desenvolvimento do pensamento de Foucault. Conviveu com intelectuais importantes como
Jean-Paul Sartre, Jean Genet, Canguilhem, Gilles Deleuze, Merlau-Ponty, Henri Ey, Lacan,
Binswanger, etc.
Aos 28 anos publicou “Doença Mental e Psicologia” (1954), mas foi com “História da Loucura”
(1961), sua tese de doutorado na Sorbone, que se firmou como filósofo, embora preferisse ser
chamado de “arqueólogo”, dedicado à reconstituição do que mais profundo existe numa cultura
- arqueólogo do silêncio imposto ao louco, da visão médica (“O Nascimento da Clínica”, 1963),
das ciências humanas (“As Palavras e as Coisas”, 1966), do saber em geral (“A Arqueologia do
Saber”, 1969).
Esteve no Brasil em 1965 para conferência a convite de Gerard Lebrun. Em 1971 assumiu a
cadeira de Jean Hyppolite na disciplina História dos Sistemas de Pensamento. A aula inaugural
foi “a Ordem do discurso”. A obra seguinte, “Vigiar e Punir”, é um amplo estudo sobre a disciplina
na sociedade moderna, para ele, “uma técnica de produção de corpos dóceis”. Foucault analisou
os processos disciplinares empregados nas prisões, considerando-os exemplos da imposição, às
pessoas, e padrões “normais” de condutas estabelecidas pelas ciências sociais. A partir desse
trabalho, explicitou-se a noção de que as formas de pensamento são também relações de poder,
que implicam a coerção e imposição.
Deixou inacabado seu mais ambicioso projeto, “História da Sexualidade”, que pretendia mostrar
como a sociedade ocidental faz do sexo um instrumento de poder, não por meio da repressão,
mas da expressão. O primeiro dos seis volumes anunciados foi publicado em 1976 sob o título
“A Vontade de Saber”. Em 1984, pouco antes de morrer, publicou outros dois volumes: “O Uso
dos Prazeres”, que analisa a sexualidade na Grécia Antiga e “O Cuidado de Si”, que trata da Roma
Antiga. O Japão é também um local de discussão para Foucault. Várias vezes esteve no Brasil,
onde realizou conferências. Foi no Brasil que pronunciou as importantes conferências sobre “A
Verdade e as Formas Jurídicas”, na PUC do Rio de Janeiro.
Os Estados Unidos atraíram Foucault em função do apoio à liberdade intelectual e em função de
São Francisco, cidade onde Foucault pode vivenciar algumas experiências marcantes em sua vida
pessoal no que diz respeito à sua homossexualidade. Berkeley tornou-se um polo de contato
entre Foucault e os Estados Unidos.
Em 25 junho de 1984, em função de complicadores provocados pela AIDS, Foucault morreu aos
57 anos, em plena produção intelectual.
Disponível em: http://educacao.uol.com.br/biografias/paul-michel-foucault.jhtm Acessado em
4 jul. 2011. Veja também: ERIBON, Didier. Michel Foucault, uma biografia. São Paulo: Cia. das
Letras, 1990. (Adaptado pelo autor)

Grande parte do que conhecemos mediante as pesquisas dos cientistas sobre

32
Pré-História

as sociedades de caçadores e coletores nos indica que a mulher gozava de um status


semelhante ao do homem, haja vista seu papel importante no fornecimento de alimentos e
na geração/criação das crianças. Isto nos leva a crer que, com a sedentarização, advinda do
aperfeiçoamento das técnicas de agricultura e de domesticação de animais, é que tem início
o longo processo que resultará na dominação estrita da mulher pelo homem.
Este tema é inesgotável em poucas linhas. Não é esse o nosso objetivo esgotá-
lo. Apenas desejamos enfatizar a natureza sócio-histórica e cultural desta dominação, de
modo a combater as visões que a naturalizam, oferecendo algumas hipóteses sobre quais Atenção
razões levaram a este estado de coisas na relação entre os sexos15. Assim, gostaríamos de
apresentar dois elementos que talvez ajudem a esclarecer este processo. 15
Um autor que discute
este assunto é o Pierre
Primeiro, a progressiva subjugação das mulheres pelos homens guarda íntima
Bordieu, no livro “A
relação com o processo de sedentarização e efetivação do usufruto privado da propriedade. dominação masculina”,
Antes de tudo, preciso lhe esclarecer que quando falo de sedentarização, trato de cuja referência
sociedades de agricultores e criadores, nas quais os sistemas de parentesco que definiam a completa está no final
deste volume.
descendência pela linha materna (matrilinear) vão progressivamente cedendo espaço para
as famílias que definem o parentesco pela linhagem paterna (patrilinear). Assim, é possível
que a instituição da monogamia, como forma de garantir que a propriedade não fosse
repartida com membros externos à linhagem paterna (a referência ao filho “bastardo” pode
exemplificar o que eu estou tentando dizer), foi um primeiro passo rumo à dominação mais
feroz que viria depois.
Monogamia:

Costume ou prática segundo a qual uma pessoa, seja ele homem ou mulher, não pode ter mais
que um cônjuge. A monogamia se contrapõe a práticas tais como a poligamia (união conjugal de
um único indivíduo com vários outros simultaneamente) a poliginia (união conjugal de um único
homem com mais de uma mulher simultaneamente) e a poliandria (união conjugal de uma única
mulher com mais de um homem simultaneamente).

Cf. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. op. cit., p. 470, 542, 543 e 542.

Segundo, não podemos deixar de considerar o verdadeiro temor que a sexualidade


feminina parece suscitar no homem. Nesse sentido, parece até que o preço pago pelo
homem por uma sexualidade cada vez mais intensa, permanente e acíclica, dissociada dos
objetivos exclusivamente reprodutivos, fonte de prazeres e lócus do afeto, foi que ele passou
a viver com medo da sexualidade feminina. Não me refiro só ao medo do adultério. Trata-
se de algo mais complexo, que diz respeito aos mistérios, à curiosidade que paira sobre
a sexualidade da mulher tal qual ela aparece representada pelo imaginário masculino ao
longo da história: algo que parece fugir dos esquemas rígidos de classificação, que parece
perturbar o homem na medida em que não se permite controlar e compreender facilmente.
Portanto, não podemos supor que a subjugação da mulher pelo homem, que
felizmente vem sendo questionada nas últimas décadas, se deva a aspectos puramente
biológicos. O domínio que os machos mamíferos possuem sobre suas respectivas fêmeas
(em função de sua superioridade física) de modo algum se aproxima ou mesmo justifica
a subjugação estrita que o homem sedentarizado acrescentou a esta dominação. Talvez
a força física pudesse até explicar uma relativa prevalência em certos aspectos ou em
determinadas condições históricas. Contudo, apenas a cultura e a história podem esclarecer
a construção de uma dominação tão violenta quanto duradoura.
Assim, chegamos ao final deste capítulo, um momento tão rico de informações
sobre a nossa sexualidade. Mas temos outros assuntos tão importantes quanto este para
abordar e faremos isso no próximo capítulo, que discutirá os rituais de vida e de morte,

33
Pré-História

as práticas mágico-religiosas e os rituais que faziam parte do cotidiano do homem pré-


histórico. Porém, antes de você passar para o capítulo seguinte, sugiro que leia o texto
complementar e responda as atividades referentes à sexualidade.

Texto Complementar:

A divisão sexual de tarefas

Nos grupos precedentes à revolução agrícola já havia uma divisão sexual de tarefas: ao homem
cabia a caça e a preparação de todo o equipamento para a atividade, enquanto a mulher era a
coletora e a responsável pela educação dos filhos. Com as mudanças ocorridas com a agricultura,
o homem passa a derrubar os bosques e preparar a terra para a lavoura, enquanto a rotina da
lavoura fica nas mãos das mulheres. São elas que cuidam da casa, das crianças, da comida e da
colheita, submetidas à rotina massacrante dos dias iguais, que tolhem a criatividade e reduzem a
imaginação ao horizonte de suas vidas.

O homem não é o principal produtor. De resto já não o era antes. Vimos que a atividade de coleta
propiciava mais alimentos ao grupo que a caça, na maioria das vezes. O homem mantinha sua
importância pelo significado que a carne tinha, pela sua relativa raridade até. De uma forma ou
de outra, o homem era quem trazia alimentos para casa. Já nas sociedades agrícolas, a mulher era
quem semeava, colhia e preparava os alimentos, ficando os homens fora da produção direta.

Então, como é que eles mantinham sua dominação sobre as mulheres? Através de mitos, ritos e
instituições que institucionalizam seu poder virtualmente ameaçado. Por meio de crenças e cultos
perpetuava uma precedência social que já não corresponde ao papel masculino na nova economia
dos povos agrícolas. Força física para dissuadir e manipulação do sistema ideológico para manter e
reproduzir o poder foram armas do homem nas comunidades agrícolas.

Nas sociedades pastoris a dominação não precisava dessas sofisticações, uma vez que os homens
desempenhavam relevante papel no sistema produtivo. Como resultado, a mulher ficava numa
atitude mais submissa ainda.

A força do homem, que lhe dá condições melhores de guerrear – atividade frequente no Neolítico -,
faz com que sua precedência sobre a mulher se amplie. A diferença entre os sexos tem uma origem
biológica, mas vai adquirindo uma explicação histórica. Simone de Beauvoir costumava dizer que
ninguém nasce mulher, mas se transforma em mulher.

Ela não nega, é claro, que alguns seres humanos venham ao mundo com características físicas
diferentes de outros. É evidente que há a mulher objetiva, aquela que é mais fraca que o homem, que
fica menstruada, que engravida que dá à luz, que amamenta. Mas, se nessas características podem
estar plantadas as origens da diferença, esta se materializa na História, isto é, na prática cotidiana e
nos valores cristalizados, nos estereótipos e na manipulação do ideológico. Valorizar a carne sobre
o cereal, a derrubada da mata sobre o cultivo contínuo, resulta em sacerdotes masculinos e deuses
executivos machos assessorados por belas (e necessariamente puras) sacerdotisas.

A reprodução da desigualdade (qualquer que seja) continuará ocorrendo enquanto houver


dominadores interessados e dominados conformados e/ou ignorantes.

34
Pré-História

A sociedade neolítica estabelecia divisão de tarefas e não de trabalho, a chefia era um ônus e não
um privilégio, não havia extração de mais-valia. Mas, entre os iguais, os homens eram um pouco
mais iguais que as mulheres.

(PINSKY, Jaime. As primeiras civilizações. São Paulo: Contexto, 2001. p. 39 – 40.)

Saiba Mais

Curiosidades sobre o sexo na pré-história

por Marina Motomura e Gabriel Silveira


Na contemporaneidade, as revistas e livros sobre sexualidade estão presentes em
diversos suportes: bancas, livrarias, bibliotecas, internet, dentre outros. Há até mesmo
manuais de como se relacionar sexualmente com o parceiro. Mas será que posições sexuais,
masturbação, casamento, paquera, flertes são coisas da modernidade? Engana-se quem
pensa dessa forma. Os homens da Pré-História já distinguiam sexo de reprodução, usavam
cosméticos naturais para incrementar a paquera, faziam sexo em posições bem diferentes
e usavam, inclusive, métodos anticoncepcionais. Pelo menos é isso que indicam os estudos
feitos por arqueólogos baseados em objetos como estátuas, pinturas rupestres e outros
artefatos. “Chegar à verdade acerca da Pré-História é quase impossível. A arte pré-histórica,
grande parte da qual tem conteúdo sexual explícito, obviamente revela coisas sobre as quais
as pessoas pensavam, mas não pode refletir por completo o que realmente faziam”, afirma
o arqueólogo Timothy Taylor no livro A Pré-História do Sexo.
No referido livro, o arqueólogo aponta que métodos anticoncepcionais e a prática
da masturbação já faziam parte da rotina sexual, a exemplo de um das estátuas, de Malta,
que mostra uma mulher se masturbando de pernas abertas por volta de 4000 a.C. Outra
retrata um homem sentado  praticando o tal ato  em 5000 a.C. Acerca das práticas de
anticoncepção, os homens usam plantas medicinais há pelo menos 40 mil anos.
Uma imagem encontrada em Ur, na Mesopotâmia, datada de 3200 a.C., mostra
outras formas de relação sexual, como, por exemplo, a mulher por cima, posição também
encontrada em obras de arte da Grécia, do Peru, da China, da Índia e do Japão. A
poligamia era uma prática comum no Paleolítico, porém, no Neolítico, a monogamia passa
a ser predominante. Nessa época, os homens tornaram-se domesticadores de animais.
Observando o estilo de vida dos bichos e o papel do macho na procriação, os homens
passaram à monogamia.
Quando o homem virou bípede, o corpo passou a ter novos focos de atração sexual.
Os peitos das mulheres, únicas fêmeas entre os primatas que têm seios permanentemente
grandes, passaram a ser tão atrativos quanto as nádegas. Assim, o ser humano passou a ser
um dos poucos animais que fazem sexo cara a cara, enquanto outros bichos praticam o coito
por trás.
Para saber mais sobre esse assunto tão instigante, sugerimos o livro A Pré-história
do Sexo, escrito por Timothy Taylor e publicado pela Editora Campus Elsevier.

35
Pré-História

Vamos Revisar?

Este capítulo abordou um conteúdo muito importante e fundamental para a


compreensão da Pré-história: a sexualidade humana. Para tanto, dialogamos com o
“nascimento” das primeiras práticas sexuais entre os hominídeos, a atração entre os
sexos, a ocorrência do “coito” entre homens e mulheres pré-históricos e a formação das
primeiras famílias e da construção do sentimento de afetividade entre os humanos. Com a
mudança de quadrupedismo para o bipedalismo, verificamos que as relações sexuais entre
nossos antepassados pré-históricos se tornaram mais frequentes, permitindo à sexualidade
humana se desvencilhar dos objetivos puramente reprodutivos. Outro conteúdo estudado
por nós foi o relacionamento familiar. A discussão sobre essa temática foi (e continua
sendo) importante na medida em que dialoga com outras questões relevantes para a nossa
abordagem neste capítulo, quais sejam: a sexualidade humana; a instituição da função
social paterna; a inibição do incesto; e a relação entre os sexos.

Atividades

1. Imagine-se um historiador convidado a dar uma aula num curso de biologia sobre
o seguinte tema: a especificidade da sexualidade humana vista de uma perspectiva
histórica. Para tanto, o coordenador do curso sugeriu que você preparasse a aula no
portal do professor (www.portaldoprofessor.mec.gov.br). Sendo assim, planeje sua aula
e depois a publique no referido portal. Para tanto, você terá que, antes de editar
sua aula: a) se cadastrar no portal do professor; b) procurar, no referido endereço
eletrônico, o botão “espaço de aula”; c) escolher em seguida o botão “criar aula”;
d) escolher a opção “aula individual”; e) elaborar um título para sua aula. Feito
isso, você deverá seguir os passos e as normas para a construção de sua aula. Tudo
isso se encontra disponível no portal e você pode acessar utilizando as diferentes
opções: conteúdos multimídia, cursos e materiais e links. Qualquer dúvida sobre
a sua aula, você pode entrar em contato comigo, autor deste material, mediante o
email: iran.ch@ufcg.edu.br Sugerimos que este material seja postado em um dos
fóruns do ambiente virtual de aprendizagem. Com isso, você pode compartilhar seu
conhecimento com outros colegas do Curso, bem como possibilitar a socialização
de conhecimentos, estratégias e ferramentas.
2. Imagine-se na seguinte situação: você é um renomado pesquisador na área de
Pré-História e foi convidado a participar de uma mesa-redonda na qual estarão
presentes outros dois especialistas: um biólogo e um jurista. Cada um de vocês
deverá emitir o ponto de vista de seu respectivo saber sobre a interdição social
do incesto. Nesse sentido, faça uma pesquisa sobre o que a biologia e a legislação
brasileira dizem sobre esta questão16. Após isso, elabore um texto no qual estejam
presentes, respectivamente, os pontos de vista histórico, biológico e jurídico sobre
a interdição social do incesto. Sugerimos que este material seja postado em um dos
fóruns do ambiente virtual de aprendizagem. Com isso, você pode compartilhar seu
conhecimento com outros colegas do Curso, bem como possibilitar a socialização
de conhecimentos, estratégias e ferramentas.
3. Imagine-se uma hipotética partidária da causa feminista no Brasil da década de
1930. Elabore um texto, na forma de uma carta aberta, defendendo a igualdade de

36
Pré-História

direitos entre os sexos, por meio de argumentos históricos que demonstrem que a
subjugação feminina não é algo natural. De preferência pesquise outros elementos
que não só os dois aspectos abordados neste capítulo. Além disso, pesquise um
pouco sobre o movimento feminista brasileiro da década de 1930 e sobre as
condições históricas que caracterizavam o nosso país à época, para que seu texto
não se torne anacrônico, ou seja, não condizente com o período histórico estudado.
Sugerimos que este material seja postado em um dos fóruns do ambiente virtual
de aprendizagem. Com isso, você pode compartilhar seu conhecimento com
outros colegas do Curso, bem como possibilitar a socialização de conhecimentos,
estratégias e ferramentas.
4. Na plataforma virtual de aprendizagem, você irá fazer uma pesquisa em grupo
acerca da igualdade de direitos. Para tanto, cada aluno pesquisará na comunidade
em que o curso funciona sobre o assunto e depois postará os resultados no fórum
de discussão. Será um momento muito significativo para ampliar o conhecimento
sobre a temática. Elabore um roteiro de entrevista, escolha pessoas de cor, sexo,
segmento social e grau de instrução diferentes como amostragem. Como sugestão
de roteiro de entrevista, colocamos algumas perguntas:

Nome
Sexo
Cor
Endereço
Escolaridade

1. Você sabe quais são os seus principais direitos como cidadão brasileiro?
2. Já leu a Constituição de 1988 para compreender melhor os direitos do
cidadão?
3. Já se sentiu agredido em algum dos seus direitos? Se a sua resposta for sim,
em quais situações essas agressões ocorreram?
4. Você se considera um cidadão que sabe respeitar os direitos de outras
pessoas?
5. Qual seu posicionamento em relação ao direito de homens e mulheres
casarem com pessoas do mesmo sexo?

Atenção

16
Revistas e sites especializados no assunto: Revista de Biologia (http://www.ib.usp.br/revista/);
Revista de Biologia e Ciências da Terra ( http://eduep.uepb.edu.br/rbct/); Revista Brasileira de
Biologia (http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=0034-7108); Revista Eletrônica
de Biologia
(http://revistas.pucsp.br/index.php/reb); Revista de Biologia Neotropical
(http://www.revistas.ufg.br/index.php/RBN); SaBios-Revista de Saúde e Biologia
(http://revista.grupointegrado.br/revista/index.php/sabios2/); Revista dos Tribunais (http://
www.rt.com.br); Revista Igualdade (http://www.mp.pr.gov.br).

37
Pré-História

Para navegar...

http://www.mundoeducacao.com.br/historiageral/idade-dos-metais.htm

http://www.ethnologue.com

http://tipografos.net/escrita/antes-das-letras1.html

http://www.arqueologyc.hpg.ig.com.br

http://www.brasilescola.com

http://www.comciencia.br/reportagens/linguagem/bibliografia.htm

Para ler e pesquisar

» Revista Aventuras na História


» Revista Portuguesa de Arqueologia
» Revista dos Tribunais
» Revista Brasileira de Biologia
» Revista Estudos Feministas
» Revista Labrys
» Revista National Geografic

Para assistir...

“2001, uma odisseia no espaço”. Atentar para a postura bípede que é conquistada
por meio do encontro com uma pedra negra e polida, posicionada verticalmente.

38
Pré-História

Capítulo 3 – A religião entre morte e


vida: o cuidado de si

Objetivos

» Analisar as práticas religiosas na Pré-História.


» Compreender como homens e mulheres da Pré-História davam significados à
morte.
» Problematizar como os rituais funerários contribuíram para o nascimento da
religião.
“Na visão religiosa da realidade, todos os fenômenos apontam
para aquilo que os transcende, e esta transcendência influencia
ativamente, de todos os lados, a esfera empírica da vida
humana” (Peter Berger)
Neste capítulo, vamos pensar um pouco sobre alguns elementos que motivaram
o surgimento da religião. Afinal, como vimos nos capítulos anteriores, o desenvolvimento
da linguagem foi primordial em relação à maneira de nossos primeiros humanos lidarem
com o mundo a sua volta. Tudo passou a ser ressignificado, visto por outros prismas, por
outros olhares. A linguagem mudou a forma de o homem se relacionar com a natureza, com
o eterno, com o próprio homem. Wallace Barbosa, estudando as práticas religiosas na Pré-
História, mostra que compreender um momento “histórico à luz das relações criadas entre
a humanidade e as diversas manifestações do sagrado inerente a vida cultural” torna-se um
exercício importante “para a formação de uma visão histórica baseada em concepções para
além das interpretações materialistas17 da própria historiografia18”. Hiperlink

18
Fonte: http://www.
Atenção webartigos.com/
articles/41826/1/A-
Importancia-
do-Sentimento-
17
O materialismo histórico é uma tese defendida pelo marxismo, segundo a qual o modo de Religioso-na-Pre-
produção da vida material determina, em última instância, o conjunto da vida social, política e Historia/pagina1.
espiritual. O materialismo é um método de compreensão e análise da história, das lutas e do html#ixzz1PHFgQOfq
desenvolvimento político e econômico. Essa tese foi definida e utilizada pelo filósofo da história
Karl Marx, em obras como O 18 do brumário de Luis Bonaparte e O capital; por Friedrich Engels
na obra Socialismo utópico e socialismo científico, bem como por Rosa Luxemburgo e por Lênin.

Dessa forma, as relações entre o homem e as manifestações do sagrado possuem


um significado considerável naquilo que podemos entender como as premissas de uma
religiosidade. Sabemos que hoje este tema tornou-se delicado; vivemos num mundo
assentado sobre o consumismo por um lado, e sedento de sentido e cuidado por outro.
As pessoas anseiam a discussão sobre questões que dizem respeito às suas inquietações
existenciais e, por isso, desejam pensar a religião, mas nosso mundo não permite que a
crença religiosa se exerça plenamente. Assim, muitas vezes o homem religioso precisa
discutir com a ciência usando as peças do jogo dela, cada oração torna-se assim um campo
de batalha, e cada oferenda ao sagrado, um sacrilégio ao imperialismo da razão, como
discute Leonardo Boff, na obra Saber Cuidar (BOFF, 1999, P. 23-25).
É por conta desta configuração do nosso mundo, que creio que devemos discutir o
pensamento religioso na Pré-História para entender o que ele tem a nos revelar, a nos dizer,

39
Pré-História

a nos ensinar. A religiosidade tem essa capacidade de afetar o homem, de motivar debates,
Atenção de criar intrigas e embates, de construir laços... Enfim, de apresentar/revelar em nós (em
parte19) o humano e, ao mesmo tempo em que nos permite compreender, permite também
19
Referência a I explicar situações e percepções quem nem mesmo essa ciência consegue dar conta.
Coríntios 13:12 -
“Porque agora vemos Para que este encontro aconteça, entre o que escrevo e o que você lê, é preciso
por espelho em enigma, que façamos certo exercício de afastamento de nós mesmos, dos nossos valores e crenças,
mas então veremos
do que estamos sendo em nossa trajetória na vida. É preciso que este texto seja lido como
face a face; agora
conheço em parte, algo religioso, onde nos afastando de nós mesmos em certa medida, encontramo-nos
mas então conhecerei com outro si mesmo diferente do anterior, algo que nos trans-de-forma (LARROSA, 2002,
como também sou p.134). Por isso peço-lhe, caríssimo (a) aluno (a) de Pré-História, que quaisquer que sejam
conhecido”
as suas crenças (quer você acredite em vários deuses, em apenas um, ou em nenhum
deus), que pense comigo no que levou nossos antepassados da Pré-história a praticarem a
religiosidade, e em que medida isto nos diz algo sobre o que somos. Esse exercício se torna
fundamental para que você compreenda a premissa do que aqui denominamos da gênese
da religiosidade humana. Assim, juntos, vamos agora tentar fazer uma leitura das primeiras
relações de nossos ancestrais para com o mundo, visto por eles como sobrenatural, ou
melhor, cujas experiências cotidianas os levaram a atribuir certos elementos e características
para além das forças humanas.
Então, nada melhor do que começarmos a indagar sobre o significado do termo
religião. A palavra religião tem uma origem difusa. Entre os filólogos, o debate é constante,
por isso escolho aqui uma possibilidade de leitura mais próxima de nós, ocidentais. Nesta
perspectiva, a palavra religião viria do latim “religione”, se alia ao verbo “religare”, para
dar o sentido de “ação de ligar”. Assim, a religião, nessa possibilidade explicativa, pode ser
Hiperlink definida como o conjunto de ideias e práticas pelas quais o homem se liga ao divino ou
manifesta na sua vida alguma concepção de sagrado20.
20
Fonte: http://www.
mundodosfilosofos.
Ainda quanto ao significado da palavra religião, a mesma possui outras leituras,
com.br/mito.htm como por exemplo: o prefixo re faz alusão à ideia de retorno, a um movimento de volta,
Acessado em 14 de jun desta maneira adianta uma concepção presente em algumas religiões: de que, por algum
de 2011.
motivo, os seres humanos foram divinos e se afastaram deste modo de ser. A religião seria o
nosso esforço em voltarmos a sermos deuses.
Mas para ligar-se ao divino, ou mesmo re-ligar-se a este é preciso que antes algo seja
entendido como divino, que este algo seja assim nomeado. Então, o que chamar de divino?
Como se constituí sua identificação tendo em vista que esta acontece na diferenciação?
Indaga o escritor e historiador romeno Mircea Eliade: O sagrado só é sagrado por ser um
outro do profano? E o fenômeno religioso se limita a este ato de ligar e religar que a palavra
latina dar a ler, dito de outro modo, estaria o divino apenas fora de nós? (ELIADE, 1992,
p.13) Enfim... Para começar, vai ser no exercício de tentar entender alguns elementos que
motivaram essa possibilidade de inventar21 a religiosidade, que este texto se apresentará
daqui por diante, dividindo a vida entre nascimento e morte, ou na religião respondendo a
duas intensas questões: para onde vamos e de onde viemos?

Atenção

21
A Palavra inventar tornou-se nos últimos 20 anos um conceito bastante usado nos estudos
historiográficos. O uso da mesma não remete à noção que comumente usamos de invenção
como algo fantasioso, ele se refere ao fenômeno religioso enquanto uma produção humana.
Para além do que o mundo cientifico chama de natural e de sobrenatural, nós pretendemos
entendê-lo como algo praticado por pessoas, que experimentaram o mundo com as dimensões
que a sua cultura possibilitou.

40
Pré-História

Minibiografia

Mircea Eliade (1907-1986)


Escritor e historiador romeno nascido em Bucareste, Romênia, Mircea Eliade é considerado o
mais importante e influente especialista em história e filosofia das religiões, conhecido pelas
pesquisas que empreendeu sobre a linguagem simbólica das diversas tradições religiosas. De
uma família de cristãos ortodoxos, formou-se em filosofia pela Universidade de Bucareste
(1928) onde defendeu seu trabalho de mestrado sobre a filosofia na Renascença italiana, de
Marcilio Ficino a Giordano Bruno. Influenciado pelo humanismo na Renascença foi para a
Índia onde estudou sânscrito e filosofia hindu na Universidade de Calcutá e ainda e aprendeu
o hebraico e o parsi. Também estudou as filosofias do sudeste asiático, sob a orientação do
mestre Surendranath Dasgupta (1885-1952), professor emérito da Universidade de Calcutá e
autor de cinco volumes sobre a história da filosofia da Índia, Motilal Banarsidass (1922-1955).
De volta à Romênia (1932), doutorou-se no departamento de filosofia com a tese publicada em
francês, denominada Yoga: essai sur les origines de la mystique indienne (1933). Esta edição deu-
lhe reputação internacional e o levou a publicar outras obras sobre ioga e outros textos sobre
filosofia. Trabalhou como adido cultural e de imprensa nas representações diplomáticas romenas
em Londres e Cascais, Portugal. Após a Segunda Guerra Mundial (1945), durante a qual serviu na
legião romena na Inglaterra e Portugal, por suas convicções direitistas não voltou para a recém
Romênia comunista e estabeleceu-se em Paris, tornando-se professor de religião comparativa
na École des Hautes Études, na Sorbonne, enquanto escrevia em francês. Emigrando para os
Estados Unidos, estabeleceu-se definitivamente em Chicago, onde passou a lecionar história
das religiões na Universidade de Chicago (1956). Entre suas principais obras, caracterizadas
pela interpretação das culturas religiosas e a análise das experiências místicas, foram Imagens e
Símbolos (Editora Martins) e O Sagrado e o Profano (Editora Martins Fontes).
http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_2728.html.
Acessado em 11 ago. 2011. (Adaptado pelo autor)

O medo da morte

“Primeiro, as cores.
Depois, os humanos.
Em geral é assim que vejo as coisas.
Ou, pelo menos, é o que tento.
Eis um pequeno fato.
Você vai morrer.”
(Marcus Susak)
A epígrafe acima é a abertura do livro A Menina que Roubava Livros. Esta é uma fala
da morte que cumpre na obra uma dupla função. Por um lado, é a confissão de um segredo
da personagem morte, para provocar alguma aproximação entre esta e o leitor, a respeito
de como ela, a encarregada de levar as almas, se sente diante dos que permanecem vivos:

... são os humanos que sobram. Os sobreviventes. É para eles que


não suporto olhar, embora ainda falhe em muitas ocasiões. Procuro
deliberadamente as cores para tirá-los da cabeça, mas vez por outra,
sou testemunha dos que ficam para trás, desintegrando-se no quebra-
cabeça do reconhecimento, do desespero e da surpresa. (SUSAK, 2008,
p.9)
Na outra extremidade, a epígrafe também é uma prescrição à humanidade, que
o autor faz num duplo anúncio: o da nossa mortalidade, uma vez que a morte do outro é
a evidência do seu “nunca mais” e da nossa própria finitude enquanto seu igual, uma vez

41
Pré-História

que é no momento que o outro se torna um diferente de nós - por estar morto, que nos
identificamos como mortais por sermos também iguais a ele; e o da impotência frente à
morte do outro e da nossa própria morte, o quanto somos diminutos diante da natureza e
do tempo que, num minuto nos leva embora.
Então, concordamos com a personagem? Seja qual for a resposta, precisamos
admitir que é uma questão complexa e intensa. Será que é assim mesmo, impotência,
esfacelamento no tempo, e só? Como pensaram os homens pré-históricos a partir da
percepção da finitude e da brevidade da vida?
Vamos imaginar um grupo pequeno de pessoas na Pré-história que podemos
denominar “família”. Pensemos que aquela mulher a qual as crianças identificam como a
mãe, por tê-los cuidado desde pequenos, por ser a senhora que transforma as crianças em
adultos nos rituais de passagem. Numa certa noite, simplesmente não acorda do seu sono.
Por mais barulho que se faça, nada acontece. Elas resolvem dançar em torno dela, como era
de costume, pois, apesar de gostar da dança, não conseguia mais dançar com facilidade,
mas ela não sorri como costumava. Enquanto isso, os adultos haviam percebido o que
acontecera, e se dividiram em alguma parte da mata, junto a uma árvore. As mulheres vivas
pediam a árvore para que cuidasse de sua mãe enquanto retiravam os frutos maduros. Em
outro ponto da mata, os homens arrancavam uma árvore jovem de mangueira.
As crianças, já cansadas de dançar, ficam tristes. Por algum motivo a mãe estava
fria, dura, parecia uma pedra. Teria algum espírito maligno a transformado em pedra?
Os adultos retornam. Reúnem todas as crianças e carregam para a casa onde as deixam
amarradas. Somente após os rituais de passagem para a vida adulta eles saberão o que
acontecerá adiante. O corpo da anciã é levado ao rio e lavado pelas mulheres. Os homens,
em toda vida, nunca sabem o que se passa neste momento. Já de volta, o corpo da anciã
está vestido por uma pele de onça, o homem mais velho do grupo coloca-lhe um colar feito
de dentes do mesmo animal. No lugar da árvore jovem, a senhora é “plantada” na terra e
sobre a mesma a árvore jovem é replantada. Todos se reúnem em alegria e uma grande
festa acontece. As crianças são libertas, todos dançam em volta de uma grande fogueira
e comem as mangas colhidas na mangueira antiga. Caso alguma criança questione o que
aconteceu com a anciã, será dito que ela cansou de ser gente e resolveu ser uma árvore da
floresta, pois assim ela ia poder continuar junto ao grupo os alimentando com seus frutos.
Poderia ser esta ou outra história aqui contada. A questão é: o que acontece ao ser
humano quando ele se dá conta de que as pessoas morrem, de que aqueles com quem ele
viveu, que ele identifica como pais e irmãos morreram e nunca mais estarão conosco? E
então, como nomear esta angústia? Como superá-la?
Para compreender melhor esses questionamentos, a HQ (História em Quadrinhos)
abaixo poderá ajudá-lo (a) nesse sentido, pois mostra que as pessoas, desde o início, não
compartilham com as mesmas concepções sobre o pós-morte:
Dois caminhos se abrem a partir da percepção da finitude. Pouco a pouco, os
homens da Pré-História começam a perceber que a vida continuaria após a morte. Para eles,
os entes queridos viajariam para algum lugar no Céu, no Hades, em outros planetas, em
mundos que coexistiriam no nosso planeta, mas que são inacessíveis aos nossos sentidos.
No entanto, havia quem cresse em outras possibilidades. Dessa forma, o nosso estar-vivo
seria apenas uma fase do nosso ciclo de vivências. Ou, como no caso da história contada
acima, o que ocorre é uma mutação, o que era ser humano passa a ocupar outro lugar
no cosmos, seja de maneira identificável, seja num totem ou numa planta, seja de forma
totalmente impessoal, numa dissolução total no cosmos. O mundo (o mundo conhecido
por eles, pois as noções da Terra como um planeta é um saber do tempo moderno) seria
então um todo vivo. Morrer é, nesse caso, passar a ser outra manifestação da vida que
sempre existe em constante mutação (GAARDEN, 2005, p. 42). Sobre este assunto, Estevão

42
Pré-História

Bittencourt comenta:

As mais antigas sepulturas da pré-história datam de 80.000 a.C. (período


paleolítico inferior). Revelam a existência, no homem pré-histórico, de
espiritualidade e de senso religioso; com efeito, sepultando seus mortos, os
antigos julgavam que eles sobrevivam - o que está ligado à  crença em Deus
ou na Divindade, que assegura ao homem a vida póstuma. Assim, o senso
religioso, a fabricação de instrumentos de pedra lascada e a produção do fogo
são os primeiros sinais da inteligência humana sobre a face da Terra (1997, p.
444)

Saiba Mais

Os enterramentos humanos do Sítio do Alexandre, no Rio Grande do Norte,


merecem um destaque especial tanto pela quantidade de esqueletos exumados até 1996
(cerca de vinte e oito), como pela presença de um pequeno mobiliário fúnebre e material
lítico associado aos restos ósseos. Registrem-se, ainda, outras datações de 8, 6, 5, 4 e 2 mil
anos antes do presente, provenientes do mesmo sítio, além da importância que os rituais Hiperlink
funerários têm, hoje, para dar aos arqueólogos elementos para reconstituírem o modo de
vida das sociedades primitivas. 22
A imagem está
disponível em: http://
MACEDO, Helder Alexandre. A antiguidade do homem no Rio Grande do Norte. www.hojeemdia.com.
História do RN n@ WEB. Disponível em: http://www.cerescaico.ufrn.br/rnnaweb/ br/cmlink/hoje-em-dia/
minas/escavac-es-
historia/prehistoria/pre1.htm. Acessado em 11 ago. 2011.
encontram-corpos-
MARTIN, Gabriela. Pré-História do Nordeste. Recife: Editora da UFPE, 1999. da-pre-historia-em-
pains-1.168993 Acesso
em 11 ago. 2011

Um indício desse tipo de relação com a morte e o senso religioso pode ter sua maior
evidência no sepultamento destes. Podemos supor que, assim como os animais, a princípio
os seres humanos quando morriam decompunham-se, naturalmente no lugar onde
morreram. Por volta de aproximadamente 93.000 a.C. (data provável do primeiro túmulo
pré-histórico), os humanos do paleolítico superior passaram a enterrar seus mortos, e por
muito tempo este foi um fato que demarcava o nascimento da religião para a historiografia,
lia-se o fato de enterrar os mortos como evidência da crença na vida após a morte, como
assevera Steven Mither (2002, p. 279). A ideia de cuidar dos mais velhos, devido aos seus
conhecimentos e à memória que tinham da vida, pode ter começado neste contexto. Os
funerais sugerem respeito pelos membros da família ou da comunidade (REGADA, 2007, p.
187)
Em grande medida, esta é a evidência mais contundente que nos resta, diante do
pouco que ficou em decorrência do desgaste do tempo, no que concerne à religiosidade
em tempos pré-históricos. Mas não basta apenas enterrar os mortos: é preciso sepultá-los
para que isto seja lido como um signo religioso, uma prática ligada à religião (MITHER, 2002,
p. 284). O que demarca a diferença entre o enterrar e o sepultar é a existência de ritos de
sepultamento, ocasião em que, culturalmente, são elaborados e estabelecidos lugares para
os mortos – no túmulo, num outro mundo. Para os vivos, são também postos os lugares – os
de dançarinos, de sepultadores, de cultuadores, além do compromisso de, periodicamente,
realizar algum rito para os mortos, momento de dar um lugar aos mortos e a seus corpos.
Um exemplo disso são as sepulturas vikings. Nelas, os guerreiros eram sepultados
com suas armas, ornamentos e comida, pois a crença (nessa sociedade) era de que eles
iriam para o Valhala, um lugar onde os heróis lutam e morrem todos os dias, mas a noite eles

43
Pré-História

sempre ressuscitam (GAARDEN, 2005, p. 26). Com isso, podemos perceber que o mundo do
“além” tem uma relação muito próxima com a vida que se tem: assim, a “pós-vida” dos
guerreiros que gostam de guerrear é a guerra.
Vamos pensar a partir de dois exemplos: o considerado como o mais antigo ritual
de sepultamento de seres humanos modernos é o de Qafzeh, em Israel. Há duas cerimônias
Hiperlink do que se supõe serem uma mãe e uma criança23. A criança foi enterrada junto a um crânio
e aos chifres de um veado (MITHER, 2002, p.284). Outro exemplo podemos ver na descrição
23
http://www.amnh. do achado arqueológico abaixo:
org/exhibitions/
permanent/ Informação social na cultura material: O sepulcro de Sungir
humanorigins/
history/arrival.php. 15
/04/2011 Os sepulcros de Sungir, Rússia, remontam a 28 mil anos. São constituídos pelos túmulos de
um homem de sessenta anos e pelo sepultamento conjunto de dois adolescentes, de sexo
masculino e feminino. Cada um desses indivíduos foi adornado com milhares de contas de marfim
provavelmente anexadas às vestimentas. O arqueólogo Randall White estudou esses túmulos e
fornece as seguintes descrições:

O homem foi adornado com 2.936 contas e fragmentos dispostos em linhas encontradas em todas
as partes de seu corpo. Sua cabeça foi aparentemente coberta por um capelo adornado com conta
e varias dentes de raposa. Seus braços e antebraços foram ambos decorados por uma série (25
ao todo) de braceletes de marfim polido de mamute, alguns exibindo traços de tinta preta... Ao
redor de seu pescoço exibia um pequeno pingente liso de xisto, pintado de vermelho, mas com um
pequeno ponto preto em um dos lados... O que se presume ter sido um menino estava coberto
de contas em linha - 4.903 delas –de aproximadamente 2/3 do tamanho das contas do homem
embora exatamente do mesmo formato. Ao contrario do homem, no entanto, ele tinha em torno
de sua cintura – aparentemente os restos de um cinto decorado – mais de 250 caninos de raposa
polar. Sobre seu peito encontrava se um pingente de marfim escovado na forma de um animal.
Em sua garganta repousava um alfinete de marfim, aparentemente o fecho de algum tipo de capa.
Sob seu ombro esquerdo havia uma grande escultura de um mamute em marfim. À sua esquerda
repousava um segmento médio de fêmur humano muito robusto e extremamente polido cuja
cavidade medular estava preenchida de ocre vermelha. A sua direita... Via-se uma pesada lança
de marfim feita a partir de uma presa lamosa de mamute aprumada... Próximo a ela está um disco
entalhado de marfim disposto verticalmente no solo.

Aquela que presumivelmente era uma menina tinha 5.274 contas e fragmentos (com tamanho de
também aproximadamente 2/3 daquele das contas do homem) cobrindo seu corpo. Ela também
usava um cabelo de contas e trazia igualmente um alfinete de marfim em sua garganta, mas em
seu túmulo não se encontrava nenhum dente de raposa, nem trazia ela pingentes em seu peito.
Todavia, de ambos os seus lados, encontrava-se um número de pequenas “lanças” de marfim mais
apropriadas ao tamanho do seu corpo do que do menino que a acompanhava. Também ao seu lado
estão dois bastões furados feitos de chifre de veado, um dos quais decorados com trilhas de pontos
escovados. Finalmente, estava acompanhada por uma serie de três discos de marfim perfurados no
centro e treliça, semelhante àquela adjacente ao dos restos do presumido menino. (WHITE, apud.
MITHER, 2002, p. 289-92

Como nos diz o já mencionado Mithen: “Não podemos, é claro, reconstruir as


ideologias religiosas das primeiras sociedades do paleolítico superior. Mas podemos estar
certos de que são ideologias tão complexas quanto às dos Caçadores e coletores (2002,
p. 282)”. Seguindo essa perspectiva, a partir das descrições dos sepulcros construídos por
nossos antepassados pré-históricos, podemos interpretar alguns indícios de seu pensamento
religioso. Um primeiro elemento a ser levado em consideração é o sepultamento dos
indivíduos com objetos depositados em seus túmulos: ora, para que serviriam estes

44
Pré-História

objetos? Podemos supor que aqui estão as primeiras possibilidades de uma crença em uma
vida após morte.
Mas por que carcaças, ossos separados, esculpidos ou peles de animais? Como
nos mostra Mithen, a colocação de partes de animais dentro dos túmulos dos primeiros
humanos modernos implica que algumas associações estavam sendo feitas entre pessoas
e animais, provavelmente refletindo de alguma forma o pensamento totêmico. Mas o que
significa o pensamento totêmico? É uma forma de pensar a experiência humana, ou seja,
cada clã tem uma planta ou um animal como origem, como herói fundador. No totemismo
australiano, homens e não homens são os efeitos dos percursos das criaturas do sonho, - os
ancestrais comuns -, e as sementes dessas criaturas moram nos seres existentes, humanos
e não humanos, criando múltiplos laços transversais. O casamento ou união entre clãs
é o momento de equilíbrio entre esses laços. O pensamento totêmico foi estudado pelo
antropólogo Levi-Strauss e por outros pesquisadores que procuraram compreender como
Atenção
o homem constrói seus significados religiosos e como se relaciona com eles24.
Para entendermos melhor esta questão, basta pensarmos a imponência que os 24
O pensamento
animais tinham há 25 ou 30 mil anos atrás, diante do homem. O homem pequeno e frágil, totêmico pode ser
frente a uma natureza imensa, perigosa, percebe que os animais são muito mais fortes que melhor analisado na
seguinte obra: LÉVI-
ele. Portanto, associar-se a um animal, seria uma maneira de ser forte como ele, e este tipo STRAUSS, Claude. “Na
de ação só poderia acontecer através de rituais. direção do intelecto”.
In: O totemismo hoje.
Se havia uma crença de uma vida após a morte (o que apenas podemos conjeturar Lisboa: Ed.70, 1986.
por meio de hipóteses), ter a força de um animal junto a si, ou mesmo ser este animal em
outra “encarnação”, constituía possibilidades a considerar em um mundo no qual a vida
era conquistada todos os dias, e isto frente aos perigos do ambiente. No caso de Qafzeh, a
criança foi sepultada com o crânio e os chifres de um veado.

Ritos de passagem:

Um rito de passagem é um evento social que marca a mudança de estágio na vida de homens
e mulheres, crianças e adolescentes. É um elemento que fornece reconhecimento social, ou
confirmação pelos membros da comunidade, de que alguém mudou de status social.

Historicamente, quando era muito importante ter bebês e perpetuar a comunidade, o rito de
passagem que mudava uma pessoa de criança para adulto era muito importante. Mais importante
era aquele rito que reconhecesse a mudança de menina para mulher e, portanto, na idade de
casar-se e dar à luz.

Morte é uma importante transição biológica. O funeral é um rito de passagem que marca a transição
de ancião para ancestral, quem será considerado para manter o envolvimento na família, linhagem
e comunidade após a morte. Na teologia cristã, o falecido permanecerá à espera do retorno do
Messias para levantar todos da morte e enviar cada um deles para o céu ou para o inferno. Na
sociedade secular não há teologia aberta, mas uma vaga celebração de despedida ao falecido.

Fontes: BARTLE, Phil. Ritos de Passagem: Reconhecimento Público. Disponível em: http://www.scn.
org/mpfc/modules/mis-ritp.htm Acessado em 11 ago. 2011.

BÍBLIA SAGRADA. Versão NVI. Rio de Janeiro: Gospel Editora, 2008.

Assim, podemos pensar esta inserção de partes de animais no ritual de


sepultamento, pelo fato de que as crianças precisariam da força dos animais. Ou que, como
são recorrentes os rituais de passagem que as crianças não podem participar enquanto viva
(e isto para qualquer cultura), ela estaria levando consigo as partes do animal do qual irá
receber a força na outra vida. Ou ainda, que se transformasse neste animal que a matou.

45
Pré-História

Em ambos os exemplos de escavações de sepulcros, as pessoas foram sepultadas


juntas, o que pode permitir algumas leituras, tais como a importância que os sujeitos
pré-históricos atribuíram, no sepultamento, à colocação dos corpos juntos. Ora, eles não
foram simplesmente jogados numa vala ou buraco, mas dispostos em uma ordem, que não
sabemos ao certo o significado, mas que indica que houve um cuidado-ritual neste trabalho.
O fato de terem sido sepultados juntos permite supor a ideia de uma relação
familiar (não uma relação familiar como conhecemos atualmente no ocidente), ou que, no
limite, havia possivelmente um laço entre os sujeitos que foram sepultados. Especialmente
no caso de Sungir, é instigante a nossa interpretação o fato de que os corpos das crianças
estão sepultados junto ao do homem. Sendo assim, é impossível não perguntar: seria ele o
pai dos “adolescentes” de que nos fala Randall White no texto anteriormente mencionado?
Neste período as pessoas interpretavam as relações desta maneira? Infelizmente, não
sabemos.
Além disso, é impressionante o cuidado artístico com os adornos dos corpos,
a contagem das contas, a separação em tamanhos diferentes. O indício de separação ou
distinção sexual, pelo fato de a menina estar adornada de maneira diferente da do menino
e do homem, motiva-nos a pensar que, enquanto estavam vivos, essa prática também
acontecia, talvez, quem sabe, numa divisão sócio-sexual do trabalho.
Por integrarem, provavelmente, uma comunidade de caçadores, o menino tem
consigo uma lança e um fêmur humano, enquanto a menina possui um conjunto de lanças
pequenas, indicando que estes instrumentos seriam necessários na pós-morte. Mas por que
o homem não traz nenhuma arma consigo? Uma possível explicação para esta constatação
é a de que, talvez, a função dos jovens nesta comunidade fosse a de alimentar os adultos.
Outra possibilidade explicativa é a de que estes jovens morreram antes do cumprimento do
ritual que os transformariam em adultos e, por isto, necessitariam levar estes instrumentos
consigo para cumprir seu rito de passagem na outra vida. Ou ainda, que morreram por não
sobreviverem ao seu devido rito de passagem.
Contudo, por meio destas possibilidades explicativas, não superamos aqui o campo
das especulações. Sendo assim, o que podemos afirmar é muito pouco. No entanto, o que
mais importa na interpretação destes achados, é buscarmos perceber que estes povos
tinham uma preocupação/cuidado com seus mortos, e isto é, sem sombra de dúvidas, um
indício do fenômeno religioso.
No sentido em que a estamos pensando neste texto, a religião surge como uma
ordenadora do caos da vida, capaz de dar alguma resposta às nossas dúvidas existenciais e
estabelecer lugares de certeza diante das nossas angústias, de modo a tornar a realidade da
morte daqueles que amamos algo suportável/superável.
Frente ao desconhecido, a religião dá-lhe uma configuração humana. Estabelece o
mundo ordenado do cosmos (o lugar do humano) e o caos (o desconhecido). E mais: frente
ao que surge como desconhecido dentro do mundo do cosmos, como no caso da morte,
separa aquele que foi vivo, mas que já não é mais, dos que permanecem vivos, isto através
de rituais como o de sepultamento (ELIADE, 1992, p. 21).
Dito de outra maneira, a religião, por meio dos ritos de sepultamento, concede
“nomes” às coisas, coloca cada qual (vivos e mortos) nos seus devidos lugares. Ora, o ato
de nomear concede às pessoas a ideia de alguma estabilidade frente à instabilidade da vida.
Portanto, nomeia os mortos e os vivos como tal e, assim, dá-lhe seus respectivos lugares:
prepara os mortos para a outra vida e os vivos para seguirem com as suas, estabelecendo
uma ordem humana para “controlar” as forças muito maiores que estão na natureza.
Mas para além desse indício que nos conduz a compreensão de certa religiosidade
por parte de nossos ancestrais devemos atentar para outros. Não nos limitemos, portanto,

46
Pré-História

à relação do homem com a morte. Assim, devemos também pensá-lo na sua relação com
os demais elementos naturais. Por isso segue um pequeno texto complementar para que
possa ajudá-lo na reflexão a esse respeito.

Leitura complementar

A religião na vida do homem

Como nasceu a Religião?


Há quem diga que a religião não nasceu com o Homem, outros afirmam que foi
anterior ao próprio Homem. O Homem apareceu na Terra 10 milhões de anos atrás na forma
de Australopitecus, a primeira forma autêntica de Homem e posterior aos Ramaphitecus,
que foram os últimos homens-macacos. Nos primeiros milhares de anos, o Homem leva
uma vida similar a um animal, alimentando-se de raízes, plantas, caramujos, insetos.
A primeira ferramenta que descobre é sua própria mão e com seu uso inicia
uma lenta progressão para uma vida melhor. Do convívio com outros homens cria uma
comunicação mediante a linguagem e começa a se diferenciar dos outros animais.
Criam-se tribos, amplia-se sua base social e se desenvolve a observação da natureza,
começa a pensar em diversas situações que acontecem, tais como os sonhos, os fenômenos
atmosféricos, o nascimento de uma nova vida, as doenças e a morte.
As práticas religiosas são uma fase recente dentro da evolução do Homem. Digamos
que anterior a 200.000 anos o Homem careceu de todo sentimento religioso. A religião
existe, mas o Homem ainda não tem consciência dela. A resposta a essas suas preocupações
há de estar em um ser superior que não habita nossa comunidade.
O homem sente a necessidade de um Deus como um meio de atingir a imortalidade.
A existência de um Deus, mesmo que disfarçadamente, é de interesse pessoal do Homem
usando-o como seu protetor e para lhe garantir sua ressurreição. Sua primeira descoberta
como Ser superior e que lhe acompanha, inatingível, é o Sol. O Homem, animal racional,
tentou compreender o mistério do Sol; era seu amigo, pois durante o dia com a sua luz
facilitava-lhe a caça, protegia-o do frio, mas que, infelizmente, todos os dias era derrotado
pelas trevas e perecia, deixando-o totalmente inerme, sem defesa. O ocaso do Sol causou-
lhe receio e, provavelmente, medo. Amou a luz e temeu as trevas. Adorava o nascimento
do Sol e chorava sua desaparição. Este estado espiritual foi-se transmitindo por gerações.
E assim, desde a Antiguidade, o Sol foi considerado uma divindade e, como tal, adorado
pelo Homem. Povos históricos tais como os indianos, os persas, os gregos, os egípcios, os
romanos, os astecas e os incas, renderam-lhe homenagens e tributos. Em efeito, todos os
livros sagrados das primitivas religiões revelam que a teologia de todos os povos fundava-se
em que os astros, especialmente o Sol, eram os causadores de todos os bens e desgraças do
Homem, através da sua ação nas forças da natureza.
Fonte de luz e calor, o Sol foi proclamado Rei dos Céus e Soberano do Mundo.
A emocionante regularidade da sua brilhante aparição e seu ocaso ensinava os
Homens às verdades da vida, da morte e do renascimento. Era vencido pelo gênio
do Mal, representado pelas trevas, mas reaparecia novamente como renascido e
vencedor. Com esta morte e ressurreição alegórica, o Homem conhece pela primeira
vez, as vicissitudes da vida e o dogma glorioso, análogo como vida nasce da morte.
Pela adoração ou culto do Sol, o Homem chegou na Antiguidade com a concepção das
ideias mais sublimes sobre a divindade e a existência humana. É sabido que todos os deuses
solares (Horo, Mitra, Freyr, Baco, Adonis, Jesús, Huetsilopochtli, etc) nascem no solstício de
inverno e morrem no equinócio da primavera. Essa coincidência mostra que não se trata da
história de um Homem e sim de um herói de um mito solar.

47
Pré-História

O Homem começa a criar mitos, pequenos dramas para explicar e humanizar tais
ritos. Os mitos serviram no passado para expor certas verdades de forma que somente os
iniciados poderiam entender. O primeiro mito que o Homem conheceu é o Mito Solar. O
Sol representava o nascimento, a vida, a morte e a ressurreição. Assim, a religião católica
estabeleceu o nascimento de Jesus em 25 de dezembro, no solstício de Inverno (Hemisfério
Norte) quando a constelação da Virgem aparece no horizonte simbolizando que Ele nasce
de uma virgem. Logo, similar ao Sol, a Jesus pesa a todos os perigos que lhe ameaçam na sua
infância  e se levanta triunfante para proclamar sua doutrina. O Sol renasce na primavera e
cria uma nova vida na natureza que havia perecido no inverno. O Sol foi o início das religiões.
O sepultamento de cadáveres é outra consequência inequívoca de uma
manifestação religiosa. Começa no início da pré-história quando o Homem ainda não
conhecia a existência da alma. Pensa que o defunto continua vivendo em um lugar
desconhecido, por isso toma medidas que assegurem sua subsistência após a morte; seus
restos são pintados de vermelho relacionando à caça para subsistir simbolicamente com a
cor do sangue dos animais com que se alimentara.
A religião chega ao homem como uma concepção geral que cada povo vai adequando
aos seus costumes e crenças que lhe foram transmitidos pelos seus antepassados.
E o que é Religião? É o conjunto de crenças e dogmas acerca de uma divindade.
Todas as religiões possuem elementos em comum. Estes elementos são:
Animismo: a crença de que nas coisas vivem espíritos.
Magia: Obra por meio de causas naturais para ter efeitos sobrenaturais
Totem: a dependência dos homens com respeito aos animais e seu temor a bestas
de grande tamanho.
Tabu: palavra polinésia que significa “proibido”.
Culto dos antepassados: deve ter iniciado com a aparição dos mortos em sonhos.
Mitos: dramas para humanizar os ritos.
Alma: os gregos pensavam que a alma era um livro onde são escritas todas
as realidades e todas as leis. A Alma fica entre dois mundos, o visível e o oculto como
instrumento supremo do conhecimento.
CARTES, OMAR. A religião na vida do homem. Disponível em: <http://www.
guatimozin.org.br/artigos/relig_homem.htm > Acesso 10 junho 2011. (Adaptado por Iranilson
Buriti)

Saiba Mais

Sempre é bom aprofundar o nosso conhecimento sobre a temática estudada.


Assim, colocamos abaixo outro texto acerca do conteúdo que poderá ajudá-lo a ampliar a
discussão sobre a prática religiosa na Pré-História:

Dormir e não acordar!

Uma questão dirige-se mais diretamente ao individuo: ora os outros morrem, mas
não seria possível impedir a minha própria morte? E a partir desta questão desenvolveu-se
na história da humanidade uma larga busca que passa pela magia, a pedra filosofal, o santo
graal etc. numa milenar corrida na busca da imortalidade. O filósofo alemão Nietzsche, ao
interpretar o nascimento da filosofia e da ciência, argumenta que ambas nasceram deste

48
Pré-História

exercício humano de enfrentamento do medo da morte. Vejamos então uma possibilidade:


O sono é muito associado à morte desde a Pré-história. Estar acordado é entendido
como um estar vivo, enquanto estar dormindo, por sua condição estática, é mais próximo
do estar morto. É fácil entender isto, se pensarmos que os homens pré-históricos se
defrontavam com companheiros que aparentemente estariam dormindo, mas deste sono
não acordavam.
Desta maneira, em diversas tradições religiosas, para vencer o medo da morte, para
tornar-se um imortal, ou ainda para iniciar-se em uma função social no grupo, era preciso
sobreviver em uma vigília: vencer o sono era um signo da vitória sobre a morte. Algumas
tribos australianas, por exemplo, proíbem que os seus iniciados durmam por três dias ou
que se deitem antes do nascer do sol.
Atenção
Gilgamesh25, o herói de uma epopeia da Mesopotâmia, escrita antes dos textos
bíblicos, encontra e enfrenta seu irmão gêmeo selvagem Enkidu, e o vence em uma
25
Cf. Autor Anônimo.
batalha. Juntos, eles lutam contra um gigante, e Enkidu morre para salvar o irmão. Após
“Gilgamesh, Rei de
o sofrimento de ver o irmão morto, Gilgamesh passa a se preocupar com a sua própria Uruk: uma lenda
finitude, e a desejar a imortalidade. Para consegui-la, vai para a ilha de um ancestral mítico, bíblica”. São Paulo: Ars
chamado Utnapishtim. O seu desafio? (sim, pois sempre há um desafio para conquistar as Poética, 1992.
grandes coisas): para que alcançasse a imortalidade, Gilgamesh foi desafiado a permanecer
acordado por seis dias e seis noites. No entanto, não conseguiu, e assim, perdeu a chance
de ainda estar entre nós (ELIADE, 1994, p.116).
Vencer o sono também é um signo presente na tradição cristã. Na noite da captura
de Cristo pelo exército romano, no Getsêmani, Jesus permanece acordado, pede aos
Atenção
discípulos que orem com ele, mas eles, por três vezes, adormecem26. Neste caso, a noite
em Vigília é um instrumento para vencer o medo da morte. Ainda a respeito deste caso,
26
Referência ao texto
é curioso que o Cristo permanecesse acordado, mas não seus discípulos. Os humanos, os
bíblico encontrado
comuns, nestas narrativas religiosas, não conseguem vencer o sono e, por isso, não vencem no livro de Mateus,
nem a morte nem o medo dela (ELIADE, 1994, p.116). capítulo 26, versículos
de 36-46.

O corpo sagrado: a mulher e a origem da vida

Diz uma lenda Hindu, que a rainha Maya Devi (aquela que iria se tornar a deusa
Maya) estava grávida de dez meses. Os astrólogos diziam que este era um sinal de que a
criança que estava por nascer seria extraordinária. Como era comum na tradição, viajou
para a casa da mãe para ter seu bebê. Seu marido queria que fosse acompanhada de
um exército, mas ela não aceitou a proposta e viajou um dia antes do marcado. A lenda
continua, dizendo que Maya chegou ao bosque Lumbini, um dos lugares mais sagrados do
reino, quando a lua estava surgindo. Dizia-se também que veio à floresta não por mero
acidente, mas que o destino a guiou ate lá.
Ela queria visitar o bosque sagrado, porque lá havia uma enorme árvore, como Atenção
um grande pilar erguido para a deusa mãe. A premonição de Maya havia lhe dito que
esse nascimento seria sagrado. Ela agarrou-se ao tronco da grande arvore e deu a luz27 27
Existem muitas
versões desta história.
a seu filho que se chamaria Sidharta Gautama, aquele que mais tarde se tornaria o Buda.
Estamos optando pela
(CHOPRA, 2007, p. 12-13). proposta de Chopra,
que tenta aproximar-se
Esta narrativa oferece alguns elementos importantes para entendermos o
de uma versão humana
surgimento das religiões, de um modo geral, e de seu aparecimento durante a Pré-história, da história de Buda.
mais especificamente. A princípio, em boa parte das mitologias dos heróis das religiões, as Noutras versões, ele
teria sido tirado por
manifestações de deus na terra se dão através do corpo de uma mulher. Essa constatação
Brama do Flanco de sua
nos diz muito sobre a maneira como os homens pré-históricos entendiam a vida, a morte e Mãe, sem dor alguma.

49
Pré-História

a religião. Entre os animais, viam-se as fêmeas dando à luz aos filhotes; entre os humanos,
sabia-se que era por meio das mulheres que as crianças nasciam. Nesse sentido, as
primeiras respostas para a questão de nossa origem não poderiam ser buscadas em outra
“fonte” que não fossem as mulheres. Elas, por muito tempo (no paleolítico pelo menos)
foram entendidas como seres sagrados: ora a conexão com o divino, ora a própria divindade
(MURARO, 2000).
Maya Devi foi a um bosque sagrado, onde havia uma árvore, “um pilar erguido
à grande mãe”. Esta é uma passagem que tem muito a nos dizer e a qual temos muito
a perguntar: por que um bosque sagrado? E o que é um bosque sagrado? Por que uma
árvore? E por que esta seria também um pilar erguido à grande mãe? O que significa um
pilar? E a Grande Mãe, quem seria esta?
Para entendermos isto, vamos pensar um pouco com Mircea Eliade. Em seu livro
“O Sagrado e o Profano” nos mostra que para as religiões “o espaço não é homogêneo: o
espaço apresenta roturas, quebras; há porções de espaço qualitativamente diferentes de
outras” (1992, p.17). Sendo assim, na perspectiva de Eliade, existem lugares onde o divino
se manifesta: estes são os lugares sagrados. Portanto, o bosque em questão é um destes
lugares sagrados.
A natureza, especialmente entre os homens pré-históricos (embora não
exclusivamente entre eles), foi entendida como divina e, dentro dela, foram “recortados”
(no sentido de selecionados) certos lugares para serem sagrados. O bosque não é um lugar
como os outros dentro do cenário conhecido pelo homem. É visto como um lugar onde
o divino se manifesta através do esplendor das árvores. É um ambiente onde tudo está
encadeado e em movimento. Nele, cada coisa ocupa o seu devido lugar numa organização
magnífica que a ciência chama de ecossistema. Assim, o bosque já seria um lugar propício
para um acontecimento como o que iria se seguir, pois sagrado, sublime e maravilhosamente
ordenado.
No bosque em questão, há uma árvore. E especialmente as árvores são lidas por
diversas culturas como lugares cósmicos, onde o movimento de vida, morte e renascimento
acontece constantemente; onde os seres morrem, os frutos nascem, a vida ocorre. Como
nos mostra o mesmo Eliade:

A imagem da árvore não foi escolhida unicamente para


simbolizar o Cosmos, mas também para exprimir a Vida, a
juventude, a imortalidade, a sapiência. Além das árvores
cósmicas, como Yggdrasff, da mitologia germânica, a história
das religiões conhece Árvores da Vida (Mesopotâmia), da
Imortalidade (Ásia, Antigo Testamento), da Sabedoria (Antigo
Testamento), da juventude (Mesopotâmia, Índia, Irã), etc.
Em outras palavras, a árvore conseguiu exprimir tudo o que o
homem religioso considera real e sagrado por excelência, tudo
o que ele sabe que os deuses possuem por sua própria natureza
e que só raramente é acessível aos indivíduos privilegiados, os
heróis e semideuses. (1992, p. 73)
Aqui, encontramos outro ponto de intersecção entre a religião, o sagrado e as
mulheres. Muraro nos diz que entre as comunidades de coletores e caçadores, foram as
mulheres que conseguiram observar os movimentos da natureza; foram as primeiras a lidar
com as plantas e a buscar nelas possibilidades de cura para as doenças, como vimos no
Volume II de Pré-História. Sendo assim, é bem possível que as árvores que eram lidas como
sagradas, fossem aquelas que tivessem alguma capacidade especial como a cura de doenças
(2002, p. 14). Sim, pois é importante atentarmos que no mundo pré-histórico, assim como
em quase todas as culturas que diferem da modernidade, não há uma separação entre a

50
Pré-História

razão e a fé, entre a religião e o saber: nestas sociedades, tudo isso está bastante ligado,
constituindo, por vezes, expressões do sagrado (DURKHEIM, 2000, p. 8).
Mas, nestes casos, a árvore é bem mais que só uma árvore: é um pilar erguido
em reverência à “grande mãe”. Interpretamos isso como a demarcação de um território no
centro do mundo. Em termos de culto ou reverência religiosa, quando um pilar é colocado,
normalmente, serve para possibilitar a comunicação da terra com o céu e para estabelecer
este lugar como ponto de referência. A partir e em torno dele, todo o restante da devoção
pode acontecer (veja o exemplo da Caaba para os mulçumanos, o Muro das Lamentações
para os judeus, o Golgóta para os cristãos, dentre outros28). Atenção

As igrejas cristãs, por exemplo, durante o surgimento das cidades, é a principal 28


A este respeito
edificação a ser construída. A partir dela (pensada e construída como o centro daquele consulte ELIADE,
mundo que a cidade constitui) é que todo o resto é feito (CAMPBELL, 1987). Além disso, Mircea. Op. cit., 1992.
colocar um pilar é uma maneira de pedir permissão e proteção para a ocupação do p. 21.
território. Entre os povos nômades do paleolítico, isto era extremamente importante para a
segurança do grupo, na medida em que sob aquelas condições históricas (como em outras
tantas culturas em maior ou menor grau do que o observado entre nossos antepassados
pré-históricos) a ajuda dos céus era sempre imprescindível.
Por fim, pela leitura da narrativa sobre o nascimento de Sidharta Gautama, ficamos
sabendo que o pilar em questão foi erguido em devoção à grande mãe. Mas quem seria
esta? Quando começamos nossa conversa, falamos que especialmente os homens pré-
históricos enxergavam nas mulheres a origem da vida. Nessa mesma perspectiva, a força
que deu origem a tudo não poderia ser diferente. Nessa linha de pensamento, acredita-se
que uma Grande Mãe, a partir de si mesma, teria feito brotar manifestações diferentes de
vida, do mesmo modo como as mulheres dão à luz (cotidianamente) a sujeitos diferentes
delas mesmas.

Chamada hoje de Vênus, esta é uma estatueta


que representa a dimensão divina da fertilidade
Feminina. Esta é conhecida como a Vênus de
Willendorf. Tem cerca de 10 cm de altura e
data entre 24 e 22 mil anos; foi descoberta no
sítio arqueológico do paleolítico situado perto
de Willendorf, na Áustria e hoje está exposta no
Museu de História Natural de Viena. Imagens
disponíveis em: http://news.bbc.co.uk/hi/
spanish/misc/newsid_7548000/7548568.stm

Existem outras características que ligam as mulheres às grandes mães. Elas têm
seus ciclos de vida bem mais definidos que os dos homens. Assim, o próprio ciclo menstrual
feminino, ao convergir com o ciclo da lua, permitia aos homens pré-históricos enxergarem
a possibilidade de que, na natureza, após a morte, o nascimento acontece de novo, através
sempre das mulheres.
Seguindo essa linha de raciocínio, cada fase da lua pode ser associada a uma fase
da vida da mulher: a lua nova representaria sua fase de menina; a lua crescente estaria
vinculada à sua juventude; a lua cheia expressaria sua fase fértil da gravidez; enquanto a
lua minguante a representaria anciã. Como na história que estamos trabalhando, não é por
acaso que, ao chegar ao bosque, a lua estava surgindo.
Assim, embora não esteja definida a fase da lua, a entrada de Maya Devi no bosque
sagrado tem a resposta imediata no céu por meio de um signo divino: a lua. É como se os
céus abençoassem o seu ato, aceitando a sua entrada no campo sagrado. E como se a lua
fosse uma companheira de Maya Devi, assim como de todas as mulheres, as únicas capazes

51
Pré-História

de gestar vidas diferentes das suas.


A grande mãe não seria, contudo, uma divindade distante. Ela é representada como
a terra em diversas cosmogonias. Portanto, sepultar alguém nestas culturas é devolvê-lo a
terra para que ela o faça renascer. Do mesmo modo que o parto configura o ato de receber
da terra um novo ser humano (ELIADE, 1992, p.71).
Mãe, terra, mulher, sagrado, natureza e divino se misturam numa teia de
significados que envolvem a fertilidade, a origem da vida e a sua manutenção, constituindo
a principal rede de sentidos que conformou a religião na Pré-história e que influenciou
bastante o surgimento das religiões que se seguiram.

Vamos Revisar?

Neste capítulo, dedicamos especial atenção a como homens e mulheres da Pré-


História cuidavam de si, preocupando-se com a vida após a morte e com os elementos
sagrados. Estudamos que, desde os mais remotos dias, somos sedentos por significados
e por entendermos o que acontece a nossa volta. Diferente dos animais, não nos basta a
conquista dos recursos elementares para a manutenção da existência. Como nos diz Rubem
Alves, no seu livro “O que é a Religião”, “Nem só de pão vive o homem, ele vive também
de símbolos” (1999). Sendo assim, as divindades nos são apresentadas enquanto produção
humana, enquanto energia fundadora do mundo capaz de anunciar e expressar o que é
divino, o sobrenatural, o sublime, o transcendente. Este assunto é fundamental para
compreendermos nossa relação com a eternidade hoje em dia, pois estamos envoltos por
símbolos, cores e rituais que procuram ligar a terra à eternidade.

Atividades

1. A webquest é uma ferramenta pedagógica muito útil na resolução de tarefas. Além


disso, a webquest auxilia no aprendizado e estimula o aluno a pesquisar, a resolver
problemas, a interpretar fontes e buscar novas informações sobre o assunto
em pauta. Dessa forma, visite a webquest “a religião: entre a morte e a vida”
( http://www.webeducacional.com/webquest/webquest/soporte_mondrian_w.php?id_
actividad=2381&id_pagina=1), elaborada para este capítulo de Pré-História e siga as
orientações da mesma.
2. O cordel é um estilo de composição que, usado pedagogicamente, contribui para
a fixação da aprendizagem, para o desenvolvimento da leitura e da escrita. Assim,
use a sua imaginação e elabore um cordel narrando a relação entre as mulheres e
a divindade na Pré-história. Depois de confeccionado, sugerimos que este material
seja postado em um dos fóruns do ambiente virtual de aprendizagem. Com isso,
você pode compartilhar seu conhecimento com outros colegas do Curso, bem
como possibilitar a socialização de conhecimentos, estratégias e ferramentas. Outra
opção interessante é a elaboração de um blog no qual você pode divulgar o seu
cordel e outros materiais pedagógicos que você produziu durante esta disciplina. Se
tiver dificuldade de confeccionar o seu blog, peça ajuda ao professor executor.
3. Elabore uma lista com os principais fatores que, em seu entendimento, motivam
o nascimento da religião. A seguir, construa uma narrativa mítica onde estejam

52
Pré-História

inseridos. Lembre-se de pesquisar alguns mitos religiosos fundadores para que


você tenha uma noção da estrutura deste tipo de narrativa. Após a elaboração,
sugerimos que este material seja postado em um dos fóruns do ambiente virtual
de aprendizagem. Com isso, você pode compartilhar seu conhecimento com
outros colegas do Curso, bem como possibilitar a socialização de conhecimentos,
estratégias e ferramentas. Publique, também, em seu blog pessoal.
4. Com base na HQ (História em Quadrinho) deste capítulo, apresente o seu ponto de
vista acerca da vida após a morte. Para tanto, você pode pesquisar no livro “O livro
das religiões”, de Jostein Gaarden, disponível para pesquisa em http://pt.scribd.com/
doc/2088322/Jostein-Gaarder-O-Livro-das-Religioes

Quiz

O QUIZ é uma ferramenta educativa muito utilizada nas escolas e em outros


ambientes para testar nossos conhecimentos sobre determinados assuntos. O QUIZ
apresenta-se na sala de aula ou em outros ambientes educativos como um tipo de material
didático importante para estimular a autonomia e os diferentes estilos de aprendizagem
dos educandos, auxiliando-os na construção de aprendizagens significativas. Desta forma,
elaboramos o jogo didático abaixo, e desafiamos você a respondê-lo sem consultar o texto
nem outra pessoa. Respondê-lo sozinho: é esse o seu desafio. Preparado? Então vamos
começar!

1. Qual a origem e o respectivo significado do termo religião?


a) Hebraica/direcionar-se
b) Grega/conduzir
c) Latina/ligar-se
2. Qual das religiões abaixo enfatiza a ideia de retorno da vida em diferentes
possibilidades existenciais?
a) Catolicismo
b) Budismo
c) Hinduísmo
d) Islamismo
3. A partir de que evidências os historiadores cogitam a possibilidade da premissa da
prática entendida como religião na pré-história?
a) Infinidade da vida/sepultamentos
b) Finitude/decomposição
c) Brevidade/túmulos
4. Qual a relação entre os adornos pessoais encontrados com os fósseis sepultados na
pré-história?
a) Continuidade da vida no pós-morte
b) Continuidade de algo inacabado
c) Aquisição de força
d) Aquisição de poderes sobrenaturais
5. O pensamento totêmico é notável no homem moderno. Que sentido os
pesquisadores atribuem ao termo quando o relacionam ao período pré-histórico?

53
Pré-História

a) Animal que assume atributos humanos


b) Humanos com atributos de animal
c) Trocas de atributos entre humanos e animais
6. Dentre os fatores abaixo, qual deles se apresentou de suma importância para a
possibilidade do surgimento do pensamento de crença no homem moderno?
a) Melhoramento dos sentidos
b) Desenvolvimento da linguagem
c) Aumento do cérebro
d) Desenvolvimento do bipedalismo
7. A religião e sua prática na Pré-história podem ser concebidas como?
a) Ordenadora do caos, estando o homem diante da certeza
b) Ordenadora do caos, estando o homem diante das incertezas
c) Ordenadora do caos, estando o homem diante da infinitude da vida
8. Que importância os mitos desempenham na prática religiosa de nossos primeiros
humanos?
a) Explica e desumaniza os ritos
b) Explica e humaniza os ritos
c) Explica e dá ênfase sobrenatural aos ritos
9. Qual a relação do desafio de Gilgamesh e a morte quando comparada à percepção
do homem moderno para o sono?
a) O sono como aquele que fortalece para um despertar glorioso
b) O sono como representante da morte como algo inevitável
c) O sono que possibilita a imortalidade
10. Qual das religiões abaixo não enfatiza a mulher enquanto corpo sagrado
a) Catolicismo
b) Islamismo
d) Budismo
e) Protestantismo
f) Hinduísmo

54
Pré-História

Gabarito do QUIZ

1. c
2. c
3. c
4. b
5. b
6. b
7. b
8. b
9. b
10. b

55
Pré-História

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Para navegar...

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http://www.arqueologyc.hpg.ig.com.br

http://www.brasilescola.com

http://www.comciencia.br/reportagens/linguagem/bibliografia.htm

Para ler e pesquisar...

Revista Aventuras na História


Revista Portuguesa de Arqueologia
Revista dos Tribunais
Revista Brasileira de Biologia
Revista Estudos Feministas
Revista Labrys
Revista National Geografic

58
Pré-História

Para assistir...

“Lara Croft: Tomb Raider” (2001)


“Avatar” (2010)

59
Pré-História

Considerações Finais
Chegamos ao fim de mais uma etapa nos estudos da Pré-História, de mais um
momento importante para refletirmos sobre o que aprendemos com cada um destes
capítulos. O fim de um livro como este não significa que o conhecimento sobre esse assunto
foi esgotado. Pelo contrário, há muitas informações a respeito desse conteúdo que não
foram abordadas neste espaço. Ficará o desafio de você, como estudante do Curso de
História, mergulhar em outros cenários de pesquisa, em outras geografias do conhecimento
em busca de novos textos sobre paleoantropologia, acerca das sexualidades na Pré-História
e dos rituais religiosos que cercavam o cotidiano dos homens pré-históricos. Para tanto,
não fique acomodado com apenas este livro. Busque enciclopédias, paradidáticos, sites
postados neste material ou indicados pelos professores, enfim, existem muitos outros
lugares de aprendizagem, de leitura, de pesquisa que você poderá conhecer e se apaixonar.
A Pré-História, como você viu, é um lugar temporal apaixonante, uma fase da nossa história
passada que nos atrai cada vez que lançamos o nosso olhar para ela.
Dessa forma, quero desafiá-lo a refletir novamente sobre que você aprendeu ao
estudar cada capítulo e pesquisar os assuntos sugeridos. Que novos conhecimentos foram
incorporados aos outros saberes que você já possuía? Que novas expressões, vocábulos
e curiosidades você assimilou ao longo das leituras? Que novas descobertas foram
feitas mediante as atividades propostas? Assim, utilizo este espaço das considerações
finais para compartilhar com você alguns princípios que são fundamentais para o nosso
desenvolvimento como estudante, como pesquisador, como aluno do curso História. São
eles:

1. O saber é uma busca constante. Por mais que conheçamos sobre o assunto,
devemos diariamente renovar as nossas leituras, elaborar novas pesquisas,
conversar com outras pessoas, tirar dúvidas com os tutores ou professores.
2. O exercício da escrita constitui um momento privilegiado para todos nós. Quanto
mais escrevemos, mais aprendemos a escrever. Portanto, sinta-se estimulado
a desenvolver cada exercício proposto neste livro. Apesar de estar dando esse
“conselho” nas considerações finais, um lugar não muito apropriado para falar de
escrita, meu objetivo é mostrar para você que escrever deve fazer parte de sua
rotina, de seu habitus cotidiano. Portanto, se você não fez alguma das atividades
propostas, volte ao capítulo, releia as informações e, depois, responda cada uma
das atividades, pois esta atitude é fundamental para o seu crescimento intelectual.
3. No próximo volume, faça anotações sobre suas dúvidas e, quando necessário,
retorne a este material e reveja cada capítulo, revendo os boxes e os textos
principais. A segunda leitura de um texto nos permite ver e ler coisas que não
enxergamos durante a primeira leitura. Portanto, reler os capítulos é um exercício
fundamental para compreendermos melhor as ideias e sugestões do autor.
Conforme o educador espanhol Jorge Larossa, quando você ler, torna-se um autor
também!
Espero ter contribuído com o seu crescimento intelectual e despertando em você o
interesse por este assunto tão importante para a compreensão da História. Encontraremos-
nos no Volume seguinte.

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Pré-História

Conheça o Autor

Iranilson Buriti

Iranilson Buriti possui graduação em História pela Universidade Federal da Paraíba


(1994), mestrado em História pela Universidade Federal de Pernambuco (1997), doutorado
em História pela Universidade Federal de Pernambuco (2002) e pós-doutorado em História
das Ciências e da Saúde na Casa de Oswaldo Cruz - Rio de Janeiro. Atualmente é pesquisador
do CNPq e membro do conselho editorial da Revista Mneme (1518-3394) e da Revista de
Humanidades da Universidade de Fortaleza. É professor Associado I da Universidade Federal
de Campina Grande. Foi coordenador do Curso de Mestrado em História da UFCG. Faz parte
do quadro de avaliadores institucionais e de curso do BASIs/INEP/MEC. Autor de livros
didáticos na área de História. Tem experiência na área de História e de Pedagogia.

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Pré-História

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