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O vocábulo prova, no senso comum, é usado para indicar tudo que nos pode
convencer de um fato. No âmbito jurídico, a prova é o meio através do qual as partes levam
ao conhecimento do juiz a verdade dos fatos que elas querem provar como verídicos.
O Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao Processo do
Trabalho, nos termos do art. 769 da CLT, dispõe, em seu art. 332, que “todos os meios legais,
bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis
para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa”. (grifo da autora)
Ademais, o art. 852-D da CLT assevera que “o juiz dirigirá o processo com
liberdade para determinar as provas a serem produzidas, considerado o ônus probatório de
cada litigante [...].”(grifo da autora). Insta frisar que o referido artigo está previsto na CLT, na
seção II-A, referente ao rito sumaríssimo, contudo, a doutrina e jurisprudência já é pacífica no
entendimento da sua aplicação aos demais ritos processuais da justiça obreira.
O ordenamento jurídico pátrio não limita as possibilidades de convencimento
do juiz, não há um rol taxativo, haja vista que o Direito busca sempre a verdade real. A única
restrição feita é a exigência de que esses mecanismos probatórios sejam legais e moralmente
legítimos.
Portanto, a prova pode assumir diversas modalidades, ampliando-se o seu
conceito. Neste entendimento, Carlos Henrique Bezerra Leite afirma que “[...] prova, nos
domínios do direito processual, é o meio lícito para demonstrar a veracidade ou não de
determinado fato com a finalidade de convencer o juiz acerca da sua existência ou
inexistência.”1
A real finalidade da prova é formar a convicção do juiz em torno dos fatos
relevantes à relação processual. Percebe-se, portanto, que seu escopo é convencer o julgador
acerca do merecedor do provimento judicial favorável, através de uma decisão justa e
devidamente fundamentada.
O ordenamento jurídico brasileiro adota o princípio do livre convencimento
motivado do juiz, consagrado no art. 131 do CPC e no art. 765 da CLT. O referido princípio
1
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2008, p.554.
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concede uma maior liberdade ao julgador, o qual poderá avaliar a prova da maneira que mais
lhe convier. Não há um engessamento acerca dos meios de prova em relação aos quais o juiz
possa se valer para alcançar a verdade dos fatos alegados pela partes. O Direito busca a
verdade real e o juiz é o seu intérprete e aplicador.
O art. 335 do CPC/73 vaticina que “em falta de normas jurídicas particulares, o
juiz aplicará as regras de experiência comum subministrada pela observação do que
ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o
exame pericial.”
Por conseguinte, constata-se que o julgador possui autonomia para escolher os
meios de prova que mais lhe convier e valorá-las de forma discricionária. Obviamente, que tal
conduta deve ser fundamentada e dentro dos parâmetros legais.
Neste diapasão, Chaim Perelman leciona que “o poder de apreciação do juiz,
ao qual cumpre inevitavelmente recorrer quando são vagos os termos da lei, desempenha um
papel essencial quando se trata de evitar as conseqüências iníquas ou socialmente indesejáveis
da lei, em sua aplicação a certos casos particulares.”2
O julgador, no momento da apreciação judiciária, busca a verdade real para o
alcance da mais lídima justiça. Assim, razões não há para limitar-se a apresentação de meios
de provas elencados na lei; primeiro, por este rol não ser taxativo e, segundo, pela busca da
satisfação justa da tutela jurisdicional.
Neste contexto, vale analisar os meios que comprovam a existência da
discriminação indireta na relação laboral. Ela é uma forma de segregação que se reveste de
aparente legalidade e pode se consubstanciar de maneira intencional ou não intencional. Na
primeira, a prova pode ser facilitada por meio de testemunhas ou documentos. A segunda, por
sua vez, possui óbices probatórios consideráveis, razão pela qual o seu enfoque probatório há
que ser dado nos seus efeitos ou resultados.
Assim, em virtude da amplificação dos tipos de prova concedida pelo Código
de Processo Civil, aplicado, na hipótese, de forma subsidiária ao Direito do Trabalho, nos
termos do art. 769 da CLT, a discriminação indireta pode ser provada por todos os meios
legais e morais possíveis.
A discriminação indireta é a forma mais danosa de segregação dos indivíduos,
pelo seu caráter dissimulado e, muitas vezes, não intencional. Portanto, não há razões para a
existência de óbices à sua comprovação, desde que este meio probatório seja legal e moral.
2
PERELMAN, Chaim. Ética e Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 487.
53
3
GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa & princípio constitucional da igualdade: O Direito como
instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 24.
54
A realidade fática é muito mais díspare do que tutela a ordem jurídica. Assim, a
teoria do impacto desproporcional é de suma relevância para a constatação da discriminação
indireta e seu combate.
Em decorrência das peculiaridades da discriminação indireta, o intérprete do
Direito deve desenvolver sua sensibilidade para detectar a violação do princípio da igualdade,
até mesmo na hipótese da conduta se adequar à lei, que num primeiro olhar demonstra-se
legítimo, mas em cuja aplicação redunda um propósito ilegal de exclusão de certos indivíduos
ou categorias de pessoas.
A teoria do impacto desproporcional é imprescindível para o ordenamento
jurídico brasileiro. Note-se que persiste o mito da democracia entre todos os indivíduos, sem
distinção de raça, cor, sexo, origem, idade, quando, na verdade, o cotidiano está eivado de
práticas discriminatórias, mesmo que de forma não intencional.
Em caráter exemplificativo, ressalta-se que há discriminação quando apenas
estão disponíveis aos negros os Equipamentos de Proteção Individual mais inferiores; quando
é fornecido apenas aos ocupantes de determinado cargo, preenchido por homens, a realização
de curso profissionalizante; quando o acesso dos deficientes físicos ao refeitório só é possível
no seu ambiente mais degradante, dentre outras práticas.
Em face desta situação, observa-se que as condutas estão revestidas de aparente
legalidade. A constatação da discriminação indireta apenas é possível através da análise do
impacto que estas condutas causam na sociedade, o que se torna extremamente relevante, em
virtude da proteção dos indivíduos e da sociedade que o direito objetiva.
Salienta-se que a referida teoria já se vislumbra presente no ordenamento
jurídico pátrio. Toda norma proibitiva, que é positivada, alcança a previsão legal em
decorrência do impacto que a conduta proibida desencadeia na sociedade. Consequentemente,
razão não há para não ser utilizada a referida teoria para combater práticas discriminatórias
que violam o princípio constitucional da igualdade e que, conforme já demonstrado
oportunamente, são proibidas no ordenamento.
Em suma, constata-se que a análise do impacto desproporcional da conduta
discriminatória é meio idôneo para a comprovação da discriminação indireta, devendo ser
aceita como meio de prova para o combate jurisdicional desta.
Joaquim B. Barbosa Gomes, referindo-se a discriminação indireta, assegura
que “nesse caso, a discriminação somente exsurgirá após a análise dos resultados disparatados
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obtidos com a aplicação da norma aos casos concretos, os quais apontarão um favorecimento
desproporcional e desarrazoado de um grupo em detrimento de outro."4
Portanto, é por meio da teoria do impacto desproporcional que se pode provar a
existência da discriminação indireta e combatê-la, o que se torna imprescindível em virtude de
seu caráter extremamente danoso à sociedade.
Acrescenta-se que a constatação de que a prática desencadeou um impacto
desproporcional na sociedade, causando-lhe desequilíbrio e discrepâncias, pode ser feita por
diversos mecanismos. Contudo, a estatística é o meio mais eficaz, haja vista sua acentuada
repercussão e conveniência, sendo utilizada em diversas searas como forma de busca pela
verdade real dos fatos.
4.3. A ESTATÍSTICA.
A palavra estatística deriva do latim status, que significa ESTADO. Tal origem
se justifica em virtude de a estatística envolver, no princípio, a compilação de dados e gráficos
que descreviam vários aspectos de um estado ou país, com objetivos militares, tributários, de
recenseamentos, dentre outros.
Na antiguidade, a estatística era utilizada de maneira ainda incipiente,
mormente, para a contagem populacional com o escopo de serem obtidas informações acerca
dos habitantes, riquezas e poderio militar dos povos, para o efetivo controle governamental.
Na Idade Média, a difusão de doenças endêmicas e o crescimento desordenado
dos povos, o que poderia afetar significativamente o poderio militar e político de qualquer
nação, incentivaram a utilização da estatística para o armazenamento de informações sobre
batizados, casamentos e funerais.
Em virtude do desenvolvimento econômico dos séculos XVI e XVIII, as
nações, com aspirações mercantilistas, começaram a coletar informações estatísticas
referentes a variáveis econômicas tais como: comércio exterior, produção de bens e de
alimentos.
Hodiernamente, parte significativa das informações propaladas pelos meios de
comunicação provém de pesquisas e estudos estatísticos, objetivando proporcionar aos
indivíduos uma maior certeza e segurança em relação ao mundo que o circunda.
Portanto, constata-se que a estatística é uma ciência indispensável para a
análise do contexto sócio-político e econômico no qual se encontram os indivíduos e sua
compreensão, possibilitando a aquisição segura de seus índices.
A Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE, vinculada ao Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE é um órgão do Governo Federal brasileiro que
trata da estatística no âmbito nacional. Ela assim a conceitua:
O que modernamente se conhece como Ciências Estatísticas, ou simplesmente
Estatística, é um conjunto de técnicas e métodos de pesquisa que entre outros
tópicos envolve o planejamento do experimento a ser realizado, a coleta qualificada
dos dados, a inferência, o processamento, a análise e a disseminação das
informações.6
6
ESCOLA NACIONAL DE CIÊNCIAS ESTATÍSTICAS. O que é Estatística. Disponível em:
<http://www.ence.ibge.gov.br/estatistica/default.asp>. Acesso em: 15/10/2009.
58
7
ESCOLA NACIONAL DE CIÊNCIAS ESTATÍSTICAS. O que é Estatística. Disponível em:
<http://www.ence.ibge.gov.br/estatistica/default.asp>. Acesso em: 15/10/2009.
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de renda, divulgados e analisados pela mídia, são reflexos da aplicação da estatística no nosso
cotidiano. Todos esses índices propiciam aos governantes indícios acerca da realidade do país
e, por conseguinte, embasam a criação e aplicação de medidas sociais e políticas, com o
escopo de trazer o equilíbrio social e atenuar as discrepâncias entre os indivíduos.
A estatística revela um retrato da sociedade, fornecendo as evidências
necessárias à implementação e ao controle de políticas de desenvolvimento viáveis e efetivas.
Ela identifica, cientificamente, os problemas sociais oriundos da concentração de renda, das
marginalizações, da discriminação, dentre outros, fornecendo meios para o alcance da
harmonização social.
Em virtude da significativa indispensabilidade da estatística no contexto atual,
a Organização das Nações Unidas juntamente com a Comissão Européia, a Organização para
a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento, o Fundo Monetário Internacional e o Banco
Mundial, percebendo a importância da estatística para o mundo, fundaram, em novembro de
1999, a Parceria em Estatística para o Desenvolvimento no Século 21 (PARIS21).
Esta parceria objetiva desenvolver uma cultura baseada em evidências e
implementação de políticas que servem para melhorar a governabilidade e a eficácia do
governo em reduzir a pobreza e alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.10
A PARIS21 é uma parceria internacional que promove um uso mais adequado
de dados estatísticos a fim de reduzir a pobreza e cumprir os Objetivos de Desenvolvimento
do Milênio. Para ela, sem dados de base e sem informações sobre as tendências, é difícil
engrenar uma estratégia de desenvolvimento com objetivos bem definidos.
Os dados estatísticos fornecem uma base sólida acerca daquilo que se pretende
provar. As organizações modernas estão se tornando cada vez mais dependentes de dados
estatísticos para obter informações essenciais sobre seus processos de trabalho e
principalmente sobre a conjuntura econômica e social.
O Ministro do Planejamento e Desenvolvimento Nacional da Quênia,
referindo-se à importância da estatística, afirma:
Um componente essencial de qualquer programa de desenvolvimento são os dados.
Sem dados, os esforços de um país no sentido de planear o crescimento e o bem-
estar futuros da sua população não têm como estar fincados na realidade e, por
conseguinte, podem ser gravemente prejudicados11
10
Disponível em < http://www.paris21.org/pages/about-paris21/presentation/presentation/>. Acesso
em16/10/2009.
11
Apud PARCERIA EM ESTATÍSTICA PARA O DESENVOLVIMENTO NO SÉCULO 21. Avaliar a
redução da pobreza: a importância da estatística no desenvolvimento mundial. Disponível em:
<http://www.paris21.org/documents/2575.pdf.>. Acesso em 16/10/2009.
61
12
SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. A discriminação indireta. Revista da Academia de Letras Jurídicas da
Bahia. a. 3, n. 4. Salvador, p. 70, jan./dez., 2000.
13
GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa & princípio constitucional da igualdade: O Direito como
instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 31.
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de empregadas mulheres, em uma ambiente de trabalho composto por mais de 1.000 obreiros.
Por conseguinte, constata-se que a conduta do empregador, mesmo que não intencional,
desencadeia um impacto desproporcional na sociedade, haja vista que a maioria da população
daquele contexto está sendo preterido pelo empregador. Este impacto desproporcional apenas
pode ser provado com esta análise estatística.
Ressalta-se que a estatística que serve de prova para a discriminação indireta
não é aquela baseada numa análise empírica leviana ou descompromissada, tampouco
referente a dados que apresentem diferenças irrelevantes entre o contexto social e o ambiente
de trabalho do contratante, que não gerem um efetivo impacto inverso na sociedade.
A estatística, a qual figura como mecanismo probatório da referida
discriminação, é aquela pautada em dados seguros, numa análise exaustiva do contexto social
e da necessidade real do contratante em manter o seu quadro laboral naquelas condições
díspares. Ademais, leva-se em consideração a dimensão do contratante e a sua atividade
laboral, bem como, as características dos indivíduos do contexto avaliado.
Analisa-se o elemento estatístico juntamente com os demais fatores sócio-
político e econômico do contexto avaliado. Há um estudo seguro e responsável, respaldado na
busca pelo mínimo de incerteza e na análise dos demais fatores existentes e do dinamismo
humano.
Assim sendo, o alcance de dados estatísticos, realizado através de estudos
confiáveis, seguros e compromissados conduzem a quase totalidade da certeza do resultado
alcançado, com uma margem ínfima de erros. Logo, é meio idôneo para provar a existência da
discriminação indireta.
No Brasil, não há uma previsão expressa da possibilidade de ser utilizada a
estatística como mecanismo probatório da discriminação indireta. Mas permite esta utilização
de maneira implícita, seja com a presença de um conceito amplo de prova, seja com a
valorização da estatística nas diversas ciências.
Corroborando com este pensamento, Maurício Correia de Mello afirma que “o
fato de não existir em nosso País nenhuma orientação expressa nesse sentido não impede que
a estatística também seja usada aqui como meio de prova pois, evidentemente, as estatísticas
produzidas pelos órgão oficiais são idôneas e não há ilicitude na sua utilização.”14
Imperioso ressaltar que, no Brasil, há inúmeros dados estatísticos que
demonstram a existência da discriminação no ambiente de trabalho, seja em relação ao sexo, a
MELLO, Maurício Correia de. A Prova da Discriminação por maio da Estatística. Revista do Ministério
14
cor, a idade, a nacionalidade. Contudo, não há evidências empíricas que apontem a sua
inexistência. Assim, parece prudente ser levado em consideração a presença desses dados
estatísticos e observar, de maneira mais aprofundada, a sua relevância e fidelidade em face da
realidade circundante.
Na esteira deste entendimento, vale colacionar a reflexão de Daniel Sarmento:
O que ainda não existe no país, e deve ser estimulado, é a cultura de análise
empírica, inclusive estatística, sobre a forma de aplicação de normas aparentemente
neutras do ponto de vista étnico-racial, mas que são freqüentemente empregadas de
forma não-igualitária, em desfavor dos negros. Os resultados obtidos nessas coletas
de dados possibilitarão, em muitos casos, não apenas a punição dos culpados e a
reparação dos danos materiais e morais infligidos às vítimas das discriminações. 15
19
GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa & princípio constitucional da igualdade: O Direito como
instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 200, p. 32.
20
OIT, Manual de capacitação e informação sobre gênero, raça, pobreza, e emprego: guia para o leitor. Módulo
2 – A questão racial, pobreza, e emprego no Brasil: tendências, enfoques e políticas de promoção de igualdade.
Brasília: OIT, 2005, p. 20. Disponível em <http://www.oitbrasil.org.br/info/downloadfile.php?fileId=168>.
Acesso em 25.09.2009.
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referidos dados servem de base para o governo federal realizar políticas públicas de atenuação
das diferenciações, intervindo no contexto sócio-econômico brasileiro. Portanto, são cruciais
para o desenvolvimento do país. Do mesmo modo, entende-se plausível e imprescindível a
utilização dos dados estatísticos pelo Poder Judiciário, como meio de prova da discriminação
indireta.
Conforme leciona Maurício Correia de Mello, “a questão da discriminação
pode ser bem mais simples do que parece, bastando para ao menos minorá-la uma mudança
de enfoque jurídico-científico.”26
Em suma, a discriminação indireta poderá ser provada através de diversos
mecanismos probatórios, como a prova testemunhal, a prova documental. Mas, mormente,
pela estatística e pela teoria do impacto desproporcional, são apresentadas inúmeras hipóteses
de diferenciação ilegítima, evidenciando a disparidade entre o ambiente de trabalho e o
contexto social que o circunda.
Portanto, elas são mecanismos probatórios idôneos para a evidência da
discriminação indireta e seu consequente combate na esfera de todos os poderes públicos,
principalmente, quando ela se perfaz mediante práticas não intencionais, dificultando a sua
prova.
aplicação da igualdade. Recai, por conseguinte, sobre a direito à igualdade, uma presunção
iuris tatum, cabendo prova em contrário, visto que possibilita-se a diferenciação legítima.
Assim, a regra geral é que os contratantes tratem seus trabalhadores de maneira
equânime, devendo apresentar um fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do
trabalhador de ser tratado de maneira igualitária.
Desse modo, observa-se que basta que o trabalhador demonstre que houve uma
efetiva diferenciação no ambiente de trabalho, mesmo que seja um mero indício, para que
recaia em face do contratante o ônus de provar a legitimidade da referida diferenciação.
Este é o entendimento da súmula 06 do TST, inciso VIII, que assevera que “é
do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação
salarial.”
A pessoa considerada discriminada deverá apresentar fatos que permitam deduzir
“indícios racionais” de discriminação fundada em sexo e o empregador deverá
destruir a presunção, apresentando o motivo capaz de justificar o tratamento
desigual. Exigir-se prova cabal da discriminação ou da intenção de discriminar,
inviabiliza o reconhecimento da igualdade de oportunidades e de tratamento no
emprego.27
favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for
ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. (grifo da autora)
Na relação obreira, a hipossuficiência é corolário lógico do contrato de
trabalho. Portanto, vislumbra-se a possibilidade da inversão do ônus da prova quando o
julgador entender relevante. Carlos Henrique Bezerra Leite assevera que “atualmente, parece-
nos não haver mais dúvida sobre o cabimento da inversão do ônus da prova nos domínios do
direito processual do trabalho.”28
Na seara da discriminação indireta, evidencia-se que deverá ser declarada a
inversão do ônus da prova, para que o contratante prove que não há a disparidade ilegítima,
em virtude do direito à igualdade do trabalhador ser a regra e por haver autorização legal para
esta inversão.
Ademais, acrescenta-se que outro argumento plausível fundamenta a aplicação
da inversão do ônus da prova numa lide, na qual se aduz a discriminação indireta. É o
chamado princípio da aptidão para a prova. Por ele, o ônus de produzir a prova deve ser
atribuído a quem tem os meios para fazê-lo, independentemente de se tratar de fato
constitutivo, modificativo, impeditivo ou extintivo do direito da outra parte.
Na relação laboral, o contratante, de regra, possui uma enorme vantagem na
capacidade de produção de provas sobre atitudes discriminatórias, principalmente quando esta
é indireta. Ele é o detentor da documentação relativa aos vínculos obreiros que compõe seu
ambiente de trabalho, tendo acesso a dados fundamentais para o deslinde da querela, os quais
pode dispor ou omitir em juízo sem a ciência da parte contrária. Além disso, o contratante tem
maior condições de angariar testemunhas e poder econômico para se cercar de inúmeros
mecanismos probantes.
O contratante discriminado possui significativos óbices na produção da prova
da prática discriminatória, seja pela dificuldade de acesso a documentos e a testemunhas, seja
pela própria situação humilhante e hipossuficiente na qual se encontra. Tal exigência fere,
inclusive, o direito fundamental de acesso à justiça.
Portanto, defende-se que o onus probandi deve ser dirigido a quem possui
condições de satisfazê-lo. Na discriminação indireta, é evidente que a parte discriminada
possui condições limitadas de provar a conduta discriminatória, devendo o ônus probatório
recair sobre o suposto discriminador.
Em relação ao tema, Firmino Alves Lime afirma:
28
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2008, p.562.
71
Exigir da parte mais fraca a prova da discriminação, ainda mais de forma cabal e
irrefutável [...], chega a ser cruel para a parte que foi vítima de discriminação.
Importa em denegação do acesso à própria justiça por um aspecto formal da
legislação instrumental e vem a ser um mecanismo de perpetuação das
discriminações existentes neste país, caracterizado por tantas diferenças sociais.29
29
LIMA, Firmino Alves. Mecanismos antidiscriminatórios nas relações de trabalho. São Paulo: Ltr, 2006, p.
280.
30
Súmula 212 do TST: O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de
serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui
presunção favorável ao empregado.
31
Súmula 338 do TST: Jornada de trabalho. Registro. Ônus da prova.
[...]
III – Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de
prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a
jornada da inicial se dele não se desincumbir.
72
32
Texto original: (k) Burden of proof in disparate impact cases
(1) (A) An unlawful employment practice based on disparate impact is established under this subchapter only if-
(i) a complaining party demonstrates that a respondent uses a particular employment practice that causes a
disparate impact on the basis of race, color, religion, sex, or national origin and the respondent fails to
demonstrate that the challenged practice is job related for the position in question and consistent with business
necessity;