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CAPÍTULO 1 - Nada melhor que uma entrada triunfal

Era dia primeiro de setembro, em um fim de tarde fresco de verão. Porém, mesmo perante
essa paz proporcionada por Yaradan, a confusão se tornara nítida no palácio imperial, o que
se é compreensível já que não é sempre que um evento deste tamanho acontecia. Os
pobres servos mal sabiam que suas dores de cabeça apenas se intensificariam com o caos
que viria ao cair da noite.

Aviso desde já, meus caros leitores, que é aqui onde as coisas começam a ficar
interessantes, ah, este foi um dia de tirar o fôlego! Lembro-me como se fosse ontem, o
salão Lírio do Vale estava cheio, nobres de todo o império estavam presentes, sem contar
os que vieram dos reinos vizinhos, como a realeza de Denzel. Todos reunidos para
prestigiar o aniversário de vinte anos da terceira e do quarto príncipe, ou melhor… sejamos
sinceros, estavam reunidos mais por serem extremamente sedentos de novidades do que
por qualquer outra razão.

Uma pequena banda tocava em algum canto, mas o som que reinava era o das vozes dos
convidados. Escute bem o que lhe digo, não há propaganda melhor para um baile do que
um evento que decidirá o futuro de toda uma nação. Todos falavam sobre a grande Disputa
do Trono que se aproximava, apostavam qual dos seis filhos participantes do imperador iria
se tornar o novo governante, estavam usando dessa festa para agregar mais informações
antes de suas conclusões finais.

Até esse ponto do evento haviam apenas quatro, dos famosos sete príncipes e princesas,
presentes no salão. O primeiro príncipe, Roman, que chamava a atenção com a habilidade
de esconder sua frieza por trás de um sorriso encantador; o segundo príncipe Thomaz, que
não podia ver uma pobre dama desavisada que já iria para cima como um cachorro em
época de acasalamento; também havia a segunda princesa, Haliana, sempre com seu
orgulho nas alturas e coberta das jóias e tecidos mais luxuosos vindos diretamente do
continente Cald, como ela amava ressaltar; e por último, mas não menos importante, tinha
Aaron que… bem, só era ele mesmo, ninguém sabia muito sobre o terceiro príncipe, apenas
que ele havia abdicado de seu direito ao trono e que construiu uma muralha em sua volta
que nem seus irmãos conseguiam ultrapassar.

Eles eram o foco principal, todos observavam-nos atentamente, cada fala, ação, até a forma
como mastigavam a comida, ninguém queria se dar mal por ter votado no príncipe errado
novamente. Isso persistiu até o arauto real elevar sua voz e dizer:

- Primeira princesa, Jeanine Hella Axwell, e seu acompanhante, o jovem duque,


Arthur Von Kirsten!

Como num passe de mágica, todo o salão silenciou e virou-se para a grande porta dupla no
alto da escadaria, a luz do lustre, que reproduzia lírios pendentes feitos de ouro, refletia na
madeira escura. Quando os guardas puxaram as maçanetas revelou-se um vestido leve,
comprido e preto como uma noite sem lua, com um decote em V revelando a pele branca
da princesa, mangas de tule preto saíam dos ombros e esticavam-se até os pulsos, saltos
pretos cravejados de pedrarias e cabelos negros e brilhantes… por mais que seja curioso
para muitos, todos já estávamos acostumados com isso, essa era sua cor, a princesa
sempre usara preto em eventos, a única coisa que fugia desta paleta monocromática era
seu clássico batom vermelho. O homem ao seu lado também não deixava a desejar quando
o assunto era beleza, o filho do duque era alto e charmoso, seus olhos da cor de safiras
encantavam quem os encarasse e seu cabelo ondulado era de um tom escuro de castanho,
assemelhando-se a mogno.

Eles caminhavam calma e elegantemente, se podia ouvir alguns sussurros dizendo, por
exemplo, como formavam um casal esplêndido, que os filhos seriam lindos, além de como a
primeira princesa tinha a postura de uma verdadeira imperatriz, sobre seus olhos dourados
como ouro derretido, e também havia quem a criticava duramente, em sua maioria, eram
aristocratas menores que tentavam achar defeitos na primogênita perfeita de Axwell.

Logo quando desceu o último degrau, Jeanine foi cercada por algumas dezenas de nobres
que zumbiam feito um enxame de abelhas.

- Podemos conversar um pouco sobre a proposta que lhe fiz, vossa alteza? - Indagou
conde Ludwick, com seu característico bigode que era tão grosso que fazia com que
todos duvidassem se era realmente um bigode ou um esquilo descansando em seu
rosto.

- Não o escute, princesa, sabe que nosso assunto é urgente e muito mais vantajoso! -
Disse outro homem.

- Tenho prioridade por minha posição, então me atenderá primeiro, certo, alteza? -
Uma idosa, que parecia ter cerca de uns 200 anos, falou rigidamente.

A primeira princesa mantinha uma expressão plena, enquanto o jovem duque ainda era
completamente ignorado, isso perdurou até que Jeanine levantou sua mão e imediatamente
todos se calaram.

- Sinto-me lisonjeada por tanta atenção, mas este não é o foco desse baile, estamos
aqui para parabenizar meus irmãos que logo chegarão. Por isso peço que aqueles
que têm assuntos a serem tratados comigo entrem em contato amanhã. Aqui
podemos conversar, mas nada de audiências. - Todos concordaram, logo se
afastaram e já começaram os comentários de descontentamento. Se percebeu, a
primeira princesa não deixou transparecer, até porque não é como se todas aquelas
pessoas fossem desistir de apoiá-la, era de conhecimento geral que aquela que
possuía a maior chance de sentar-se no trono era Jeanine. Poucos são os
corajosos, ou simplesmente estúpidos, que se arriscam a ficar contra ela.

Não se passaram nem dez minutos até que as portas do salão se abrissem novamente e a
voz estridente anunciasse a chegada das estrelas da noite:

- Sua majestade, o imperador, Claus Marcus Axwell 3°! E suas altezas reais, terceira
princesa, Mikaela Lucia Axwell, e o quarto príncipe, Michael Phillip Axwell! -
Imediatamente abriu-se um corredor entre os convidados, interligando o final da
escadaria aos pés do majestoso trono dourado. Enquanto o imperador passava, com
seus dois filhos logo atrás, todos curvaram-se, duques, condes, reis e príncipes,
ninguém exitou em abaixar sua cabeça perante o grande governante do império
Axwell.

Apenas após se sentar no trono que o imperador deu ordem para que levantássemos
nossas cabeças, sua aparência assemelhava-se demais com a da primeira princesa, com
seus cabelos pretos e lisos, afiados olhos dourados que observavam com atenção cada
canto do salão e uma postura invejável que exalava autoridade. O silêncio reinou no
ambiente, escutava-se apenas o ruído das respirações.

- Agradeço a todos aqui presentes nesta data tão importante, especialmente aos
príncipes e princesas imperiais. - Se sua aparência já fazia com que todos
tremessem, sua voz garantia que o temeriam. Era grossa e forte, dicção perfeita e
seu tom era como de um general de guerra - E aos meus queridos filhos que hoje
completarão seus vinte anos, quero parabenizá-los. - Mikaela e Michael
reverenciaram-se perante seu pai.

- Muito obrigada, pai. - A princesa falou primeiro.

- Obrigado, pai. - Seguiu Michael.

- Não há de quê. Agora, lembrem que isso é um baile, então peço que todos
aproveitem a festa. - A banda voltou a tocar, dando início a dança, é comum que o
aniversáriante escolhesse um acompanhante para o baile e dançasse com ele neste
momento, mas como eram gêmeos o príncipe e a princesa não escolheram ninguém
e dançaram entre eles. Isso foi uma boa jogada, já que Mikaela possuía a atenção
de muitos jovens nobres, e deixar com que eles ficassem aflitos por não saberem de
quem ela gostava era o passatempo favorito da princesa.

Os irmãos rodopiavam pelo salão, ambos com seus cabelos castanho claros e olhos de um
tom cinzento de azul, eles seriam idênticos se não fossem pelas roupas e pelo sinal de
nascença da princesa, uma marca que começava no canto da pálpebra de seu olho
esquerdo e descia até seu queixo. Houve uma época em que Mikaela escondia seu sinal
com várias camadas de maquiagem, mas quando completou seus 18 anos decidiu que não
se importaria mais com isso. "Se alguém vier falar algo eu pego meu sapato e enfio goela a
baixo do futre, sou uma princesa, dúvido que alguém me puniria por isso" falou para mim
quando a indaguei sobre, não toquei mais no assunto porque sabia que ela estava falando
sério, sem contar que tenho certeza que todos concordam que a marca consegue deixá-la
ainda mais harmoniosa.

A dança finalmente terminou e logo as conversas retornaram, cada príncipe e princesa


estava cercado de aristocratas interesseiros, tanto que mal pude cumprimentar Mikaela, que
fora minha amiga desde a infância. De repente comecei a escutar duras ofensas à minha
direita, com os sons dos instrumentos e as vozes cada vez mais altos, pouquíssimas
pessoas percebiam o que estava acontecendo, busquei controlar-me mas foi mais forte que
eu, então fui em direção a confusão. Quando cheguei dei de cara com o segundo príncipe
caído no chão com rosto machucado e o nariz sangrando, ao mesmo tempo que um rapaz
era segurado por outros jovens nobres enquanto lançava xingamentos cujo os quais me
recuso a reproduzir aqui.

- Só por que é um príncipe acha que tem o direito de fazer isso?! - Falou o homem
enquanto tentava ir para cima do príncipe novamente, logo percebi que se tratava de
Sebastian, o filho do marquês Lehner, o que é no mínimo curioso já que até alguns
dias atrás ele e Thomaz eram melhores amigos - Ela é minha irmã! - Berrou, e foi aí
que entendi. O segundo príncipe, sendo do jeito que é, havia transformado a filha do
marquês em outra de suas vítimas.

- Ela quis me beijar, não é como se eu tivesse a obrigado! - O segundo príncipe


bradou e levantou-se para ir para cima de Sebastian, estava pronto para o golpear
até que foi parado pelo primeiro príncipe.

- Você está maluco?! - Roman murmurou para que seu irmão escutasse, enquanto
segurava seus braços com força - Isso é um baile, não um campo de batalha! -
Falou para os dois, depois se aproximou mais do filho do marquês - Acho melhor
voltar para casa, Sebastian, independente do motivo você agrediu um membro da
família imperial. Por ter sido a única vez que fez algo do tipo, eu o perdoarei, mas na
próxima você sofrerá as consequências. - O rapaz arregalou os olhos, fechou suas
mãos em punhos e trancou sua mandíbula.

- Peço perdão pela confusão, vossa alteza. - As palavras saíram com dificuldade, mas
depois ele se retirou em direção a escadaria.

- Isso mesmo, é melhor você… Aí! - Thomaz foi violentamente arrastado por Roman
antes que pudesse terminar de falar, ele foi levado para longe do salão,
provavelmente para uma bronca que eu gostaria de ver. Havia alguns estilhaços de
vidraçarias espalhados pelo local da briga, sem contar uma mesa quebrada, os
servos logo se aproximaram e começaram a limpar as coisas.

Achei que esse seria o ápice da noite, mal esperava que diante desse cenário cada vez
mais interessante ocorreria algo ainda mais impressionante. O arauto real elevou sua voz
novamente, o que, de início, não chamou tanta atenção já que todos os príncipes,
princesas, representantes das nove família Primordiais e o próprio imperador já haviam
chego ao evento, mas foram algumas palavras chave que fizeram com que todos
direcionassem sua atenção a entrada do salão…

- A… a quarta princesa, Anneli Judith Axwell, e seu acompanhante, sir Alexis Kiefer! -
Falou gaguejando.

Uma sinfonia de queixos caindo, sons de surpresa e até mesmo uma taça, pertencente ao
quarto príncipe, estilhaçando-se no chão de mármore infestaram o lugar em uníssono.

E foi assim, sem usar nem mesmo uma única palavra, que a oitava filha do imperador,
aquela que só era lembrada como a princesa esquecida, roubou toda a atenção e
transformou a clássica Disputa do Trono em uma verdadeira guerra entre os herdeiros de
Axwell.

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