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“Quando acontecerá

o nosso próximo abraço?


E quando ergueremos
nosso próximo brinde?”
Raimundo Cassundé
Salve, parceiros!

E ste livreto que tens nas mãos reúne algumas poucas poesias de Raimundo
Cassundé. Umas em tom de galhofa, como A dieta da Raimunda, O Ôi
da goiaba, Dois gatos pingados, O Papudim, outras revelam a angústia do
poeta diante de sua partida tais como Banquete, Balada do Inferno, A Fila,
outras falam de amor (que sem dúvida bate no peito dos poetas de forma mais
pungente) como Ofídico Amor e Paisagem, algumas refletem delicadezas,
como Inda vou morar no Crato e Papo Canino. Ainda verás imagens do poeta
e alguns recortes de jornal, periódicos que Cassundé foi noticiado por seus feitos,
ou suas colaborações como escritor, pois além de profícuo compositor e poeta,
o professor era também jornalista. Boa parte do material
recolhido para a feitura deste impresso nos foi cedido pela
irmã do nosso aedo; Isabel Cassundé. Somos gratos por
isso. Que esta singela publicação possa aquecer nosso
coração e minorar as saudades de um cearense que deixa
uma obra musical e poética de extrema relevância para a
arte brasileira. Boa leitura!

2 o bardo raimundo cassundé


R aimundo Gonçalves Cassundé, nasceu
em Várzea Alegre em 05 de maio de
1950 e partiu em 13 de agosto, deste ano de
desgosto de 2023. Foi professor do curso
de música da Universidade Estadual do
Ceará e do Conservatório de música Alberto
Nepomuceno. Também exerceu a atividade
de Técnico em assuntos culturais na Secretaria
de Cultura do Estado do Ceará.
Cassundé foi sobretudo um grande
poeta. Trazia consigo uma poesia ora delicada,
ora sarcástica, mas sempre genial. Compositor
profícuo, participou de inúmeros festivais, por
vezes como compositor ou interpretando suas
próprias canções. Sua musicalidade complexa
e poesia finíssima, assim como seu vozeirão
grave partícipe de corais, o levou a diversos
festivais nacionais e internacionais em países
como Argentina e Cuba. Fez parcerias com
artistas de relevo tais como Stelio Valle,
Rodger Rogério, Chico Pio, Nonato Luiz,
Dedé Nunes, Aroldo Araújo, assim como
também teve suas canções interpretadas por
artistas do quilate de Davi Duarte, Cumpade
Barbosa e Simone Carvalho.

Suas influências iam de Beatles


a Bach, dos cantadores de feira do
Cariri a seu próprio pai, também
poeta, João Cassundé. Ouvia de
tudo, lia muito, escrevia mais ainda
e trazia o espírito, ainda que de
cima dos seus setenta anos, sempre
moço. Que a poética única de
Cassundé continue a ressoar através
dos séculos, que as artes cearenses
paguem o tributo merecido ao
nosso saudoso trovador e que
seu nome possa constar no rol de
grandes músicos e poetas que esta
terra deu ao Brasil.
Juliana Samara
o bardo raimundo cassundé 3
A Fila

Quis o destino que eu gastasse a vida


Em utopias vãs e degeneradas
Um dia Estrela
Outro dia Nada
Refém das armadilhas pervertidas

Entre infrações, subvenções e multa


Provei do mel e do fel
Do In e do out
Desci no gráfico
Desbotei o esmalte
Verniz que blinda a aura da conduta

Somando acertos
Subtraindo erros
Cantei o réquiem do meu enterro
E vi minha alma evaporar tranquila

Diz o epitáfio
Na minha catacumba;
Ele brincou
Gozou
Ejaculou
E pumba!
Pegou o beco
E deu lugar na fila

Fortaleza, 2020

4 o bardo raimundo cassundé


Papo Canino

Eu e o meu cachorro
Pelas calçadas pensando
Ele com seu faro humano
Eu puro instinto canino
Ele peralta e menino
Eu um buldog sisudo
Nós conversamos de tudo
Futebol, ração, destino

Reclamo que a vida é osso


Curva fechada e ladeira
Como se fosse coleira
Laçada no meu pescoço

Me arrastando feito bicho


De focinheira e gravata
Tô quase pra virar a lata
Eu que jamais catei lixo

Um mau tempo se avizinha


E com a pulga atrás da orelha
O bom senso me aconselha
Cuidado com a carrocinha

E ele latindo sorriu


A verdade mais infame
Quem nasceu sem pedigree
Tem que ralar pra curtir
Num bangalô de madame.
o bardo raimundo cassundé 5
Dois gatos pingados

Sem um pingo de dinheiro


Saí em busca do Pingo
E fiquei no pinga pinga
De segunda até domingo
Já me deu logo uma coisa
Mudou do preto pro azul
Sem nenhum pingo de dúvida
Que até roguei para os céus
Dizia: volte amanhã
Proteja o Maracatu
Ao pingo do meio dia
Lá se vinha eu na van
A moça trouxe um papel
Com o carimbo: Quitado
Fizesse sol ou respingo
E me deu um cheque pré
A lotação eu tomava
Inda por cima cruzado
E vinha no pinga pinga
Que o suor chega pingava
Com dez por cento a menos
De um tal de imposto cobrado
Só sei que com muito esforço
A assinatura, um garrancho,
Enfim, cheguei na Solar
Um risco e um pingo do lado.
E ele muito sorridente
Disse: vamo se limpar Fortaleza, setembro de 2008

6 o bardo raimundo cassundé


Livre arbítrio

Pôs o arbítrio pra mim dois caminhos;


Um enganoso, forrado de espinhos
Outro sedoso, com colcha de pétalas
Todo orvalhado com finas gotículas

Pus-me a andar ora num ora noutro


E nessa escolha, ariado e absorto
Fui conduzido a um falso perfume
Eis que percebo um sabor de azedume

Vejo então ao longe


Um cansado jardim
Na distração fui traído e por fim
Eis que o acaso me atrai e me puxa

Vi tratar-se então de um pobre canteiro


Num suspiro cansado e derradeiro
Cheio de rosas tontas, mortas e murchas.

o bardo raimundo cassundé 7


O tributo

Por que é que um dia é da caça


Outro dia da caça de novo
Não quero aqui desmerecer
Eu só quero entender o ditado do povo

Quem espera sempre alcança


Eu esperei, esperei, esperei
Me esfolei de trampar no trabalho
E a merreca foi sempre um salário
Defasado, murchado e precário
E ainda me faz de otário todo fim do mês

Água mole em pedra dura Dizem que é pura verdade


Tanto bate até que fura Acaba a tempestade começa a bonança
Mas olhe pra sociedade
Comigo foi uma roubada
Que a necessidade ameaça a esperança
Era uma pedra gigante
Mais de tonelada, encravada Mas eu com meu partido alto
Fincada no meio da estrada Batuco não calo
Nem se comoveu E cutuco no calo
Parada ficou A verba malsã do planalto
Nem se moveu Escorre no esgoto
E se prende no ralo

Dou a Cesar o que é de Cesar


Mas o Cesar embroma e lesa
É o cão brigando com a reza
Sem querer soltar o osso
E o povo até o pescoço
Num desprezo absoluto
Já tá gritando na praça
Nada vai ficar de graça
Seu ladrão pague o tributo.
8 o bardo raimundo cassundé
XipÓfagos

Amigos mesmo
De fato os são
Aqueles que nas trevas do escuro
Garimpam um pouco de brilho puro
E iluminam a estrada do coração

Não deixam nunca a porta fechada


São, na verdade, o côncavo e o convexo
Não poupam nunca o ósculo e o amplexo

E lhes dão tudo em troca do nada


Confortam com o riso
Se o pranto desaba
Tem sempre à mão o bálsamo à oferta
E a gratidão escancarada e aberta

Enfim, amigos digo


E afirmo sê-los
Os que conduzem o afeto até o âmago
Quanto mais só estão
Mais o são xipófagos.

o bardo raimundo cassundé 9


O Papudim

Por que será que esse moço tanto bebe?


Quando ele vem de longe E haja mel
A gente logo percebe Mais um burrim
Então quando ele fala Desce uma terça
Aproximando do meu rosto Olha o limão
Me vem logo uma vontade Traz a quartota
De pedir um tiragosto A pancada é tão violenta
Que o cabra não aguenta
Sua passada E empapuçado ele se entorta
É lá e cá cambaleando
Todo mundo diz O moço bebe tanto
Lá vem uma garrafa andando Que já come é com farinha
Birita que sai da linha
E o povo grita Eu tô pra ver tanto boneco
É Zé tonel é Zé pinguço
É Papudim Se treme todo
E ele se dana E vexado pula da rede
Tem os mais exagerados Sai correndo e mata a sede
Que não mede o palavreado Já no primeiro boteco
Chama logo é cu de cana
Oh povo pra beber
Se por acaso Tem nêgo bebo aí
O tempo fica mais cinzento Tem nêgo bebo aqui, bebo acolá
Ele diz já no momento Só tenho medo
O dia tá colonial É que a malvada da cirrose
Não deixe nenhuma dose
Pra nós comemorar.
Fortaleza, julho de 2020 A dieta da Raimunda
10 o bardo raimundo cassundé
A dieta da Raimunda

Raimunda tinha um problema


Por excesso de gordura
Devido a tanta fritura
E sua fome esgalamida

Atacava a geladeira
Com uma fúria destemida
De noite e de madrugada
Até que um dia Raimunda foi na balança
Seu prazer era a comida
Então se apavorou com a pança
E o tamanho da barriga
Seu prazer era a comida
Seu prazer era a comida
Daí pra frente Raimunda ligou o alerta
De noite e de madrugada
Começou nova dieta
Se deitava esparramada
E só quer verdura
E baixava o pau na comida
Ela só quer verdura
Ela só quer verdura
Começou nova dieta
E agora só quer verdura

No cardápio tem pepino


Tem cenoura de primeira
Haja muita mandioca
E até entra a macaxeira
Ela só quer verdura.

Fortaleza, 13 de julho de 2011

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Inda vou morar no Crato

Se eu fosse um moço bem rico


Eu me mudava do mato
Pegava e convidava Maria
E sua alegria
Pra ir morar no Crato

Lhe dava brinco e pulseira


Cordão de ouro e sapato
Sem me importar com os fuxicos
Nem dar ouvido aos boatos

Perfume, talco e lavanda


Vestido à moda Chanel
E eu no meu terno engravatado
Girando no carrossel

Se mais pudesse eu faria


Lhe dava logo uma rua
Ia no céu e trazia
Um trancelim só de estrelas
Um colar feito da lua

Mas entre ser pobre ou rico


Sou feliz também no mato
Nosso amor não muda um trisco
De um plano eu não desisto
Eu inda vou morar no Crato.

12 o bardo raimundo cassundé


O fÁdico Amor

A toxina ofídica do teu amor


Potencializa e inflama minha paixão
E mais e mais se estende e cada vez redobra
Como a ferir-me qual picada de cobra
Cravando fundo na alma do meu coração

Incansável insisto nesse intento repto


Meu desígnio é a busca é a caça ao tesouro
Que se dane o cansaço desse cansaço
Mesmo que eu desfaleça frágil em teu abraço
Remédio que me sara, me serve de soro.

Benfica 14 de julho de 2020

o bardo raimundo cassundé 13


Banquete

Abutres sobrevoam meu destino


Aplaudindo o meu último suspiro
E um réquiem mórbido em falsete
Sonoriza meu fúnebre banquete

Vísceras, vermes dão o tom do adeus


A minha biologia se extinguiu
E o fétido odor de um balé de pus
Me eleva alto
Até o plano de Jesus

Atado a um ataúde
Jaz a saúde
Malditos benditos me velam com velas
Assim, por fim, dá-se início ao fim

Vestido em um caixão
Fui morar no chão
Dá-se então a mais longa solidão
Longínqua e próxima
Dentro de mim.

Fortaleza, 23 de setembro de 2022

14 o bardo raimundo cassundé


Balada do Inferno

Mais uma vez, que desdita


Meu coração claudicou
Estava mal, por um fio
Lutando num desafio
Quando o médico auscultou

Oxímetro, estetoscópio, tensiômetro e outros mais


O pingo lento do soro
E o inferno torcendo em coro
Regido por Satanás
Clamou por meu óbito
Por vela preta e caixão
E eu contrito e resistente
Não subi nenhum batente
Pra sua decepção.

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Paisagem

Quem dera o tempo voltasse


Oh, minha mimosa musa
E eu novamente mirasse
Com permissão da imagem
Aquela bela paisagem
Que tens por baixo da blusa.

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Flores de plÁstico

Quando acontecerá o nosso próximo abraço?


E quando ergueremos nosso próximo brinde?
Exausto e recluso me abate o cansaço
Até que esse pavor mascarado se finde

Já chega de regar essas flores de plástico


E eu, nessa bolha on line, teatro cibernético
Minha introspecção se avizinha do drástico
Eu quero o beijo e o hálito humano e dialético

Se agacha no meu peito


O acorde enferrujado
Só ouço passarinho no relógio cuco
E eu vou de “live” em “live”
Largado e maluco
À espera que se abra a porta do passado
Que esconde na paisagem a vida em sensação
Nem sei quando se foi a última canção.

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Matério no jornal Diário do Nordeste. 3 de abril de 2011

N elson Augusto narra uma interessante arenga de samba e futebol na


reportagem “Goleada de Samba “de 3 de abril de 2011, do jornal Diário
do Nordeste. Cassundé compôs a canção “Samba de preto e branco”, quando o
time do Ceará ascendeu para a série A do campeonato brasileiro em 2009, e junto
com um time de sambistas coordenados por Tarcísio Sardinha, fizeram uma bela
gravação que louva o Ceará mas também cutuca o Leão ; “definitivamente o teu
rosnado, já não passa de um miado, tua juba não perturba mais ninguém”. O
que não se esperava era que um torcedor do Fortaleza zangado com a chacota,
também compositor, Dedé Nunes, desse uma resposta através do samba Carão
tricolor; “não fale do meu leão, volte pro seu canal, urubu sobrevoando mesa farta
como é? Acostumado a ovo não pode ver um filé!” . Apesar da rivalidade, os dois
eram bons amigos e fizeram composições juntos, dentre elas o samba”Pergunte
pro meu violão “.
18 o bardo raimundo cassundé
Samba de preto e branco

Tá claro em cada canto da cidade


Nossa incompatibilidade não termina por aqui
Você pousa de elite e eu sou da massa
Moro em Porangabussu
Você se esconde no Pici
Definitivamente o teu rosnado
Já não passa de um miado
Tua juba não perturba mais ninguém
Eu hoje faço samba de primeira
E tu viaja na terceira
De van, pau de arara e trem
É chato eu reconheço ser gostoso
Alvinegro glorioso
Ter o amor dessa galera
Respeita as cara e cai fora carniça
Tô na mídia sou notícia
No ranking dos vinte mais
Enquanto quem se arvora de fera
Tá na fila de espera e vai ficando mais pra trás
Um forte abraço que eu já vou
Vovô, Vovô, Vovô
Meu samba de preto e branco chegou quebrando tabu
Olha aí “nós na fita”
Na festa da América do Sul

No link, “Samba de preto e branco”, de Raimundo Cassundé


https://youtu.be/ZXc0K7TfRBE?si=UAJvKGwv-8FFOlcX

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Remorso

Olhando o retrovisor
Vejo a imagem do remorso
Corro mais e menos posso
Distanciar-me da dor

A dor que alerta e me mostra


Frisada e grifada em giz
O erro insano e infeliz
Que hoje é um fardo
Que trago nas costas

Inda bem, posso entender


Quanto mais a dor se tece
Mais lentamente se esquece
Desconfortando o viver

A reparação me acalma
E então, só por hoje e agora
Me perdoo a toda hora
Desconstruindo o meu trauma.

04 de junho de 2018

20 o bardo raimundo cassundé


O Ôi da goiaba

Só hoje é que eu voltei pra casa


No sol dessa manhã de quarta-feira
Na volta eu vinha mais pra lá do que pra

Que eu juro
Eu vi Jesus na goiabeira

Não sei se foi aquela panelada


Ou embaraço daquele pastel da feira

No ôi da goiaba
Até nasceu uma saliência
Que eu peço clemência
Pra Jesus na goiabeira.

Fortaleza, janeiro de 2023

o bardo raimundo cassundé 21


Escracho

Você na prepotência irônica


Do seu desacato
Vazia de elegância
Arrogante e no ato
Fez gato e sapato
Do meu coração

Charlou, de pequinique
Festa e ainda acendeu fogueira
Foi chegando no queixo Tire o cavalo da chuva
Na cara de madeira Que agora eu governo
Hasteando bandeira Vá com gato e sapato
E cheia de razão Pros quintos do inferno
Mercadoria falsa
Etiqueta boçal
Então no flagrante delito
Deste teu festejo Baixe o seu santo em outra encruzilhada
Entrei mais do que logo Se lambuza no escracho
Com uma ação de despejo Parada malhada
Pra retomar a posse Pra não cortar o barato
Do meu próprio chão Do meu carnaval

Você é o exemplo da picardia


Que rompe o exagero
Carne que cheira mal
Vencida e sem tempero
Pra ser mais sincero
Um zero à esquerda de um zero
Sobra de um aborto mental

Taíba, 24 de abril de 2014


22 o bardo raimundo cassundé
Adrenalina

Despojado
O amante surfa
Nas ondas esculturais
Do teu farto corpo

Manobras estonteantes e obscenas


Alimentam a adrenalina
Sob o sol dos mares macios

São backsides, cutbacks


legues completos em 360º
Um gemido arrepiante
Indescritível e quase música
É entoado no oceano do leito

O amante surfista
Havia entrado num tubo
Dropando até sumir
Num deslumbrante buraco negro
Até ser orgasticamente expelido
No brilho da areia do mar
Do oceânico e verde olhar;

Benfica, 07 de Novembro de 2019

o bardo raimundo cassundé 23


DiÁrio de um ateu

Meditei por sinagogas


Catedrais, mecas, mosteiros
Orando apelei pra Buda
Cantei ponto nos terreiros
Arrastando a minha cruz
Crente e à procura de luz
Na estrada me fiz romeiro

Fui buscar no taoísmo


Força no Yin e no Yang
Acendi meu menorá
Pra iluminar o amanhã
Flor de lótus no caminho
Vou com minha fé sozinho
Tendo a alma pura e sã

Reza, incelenças, novenas


terço e oração
Canto e me autoflagelo
Elevo o meu pensamento
E acaricio o tormento
A descrença é o lamento
Da minha fé, cega e vã

E assim buscando um supre-


mo,
enxergo dentro de mim,
uma luz calma e suave
de aroma doce e por fim
Na capela ou na mesquita
Ela, a penosa desdita
Ganha esperança e tem fim

Benfica 16/07/2020
24 o bardo raimundo cassundé
Pelas ruas do BenfIca

Caminhar pelas ruas do Benfica,


emoldurado em suas platibandas
Sob um sol generoso que se estica
Ora a brisa suave que me abranda

Numa roda de amigos camaradas


A conversa em poesia se revela
Debaixo das copas assombradadas
Eis porquê no Benfica a vida é bela

Ver o tempo escorrendo nas calçadas


Nas vielas, botecos, bares, becos
um pregão convidando a meninada

Qual flagrantes de um guache


ou de um ar-fresco
No Benfica a paisagem é perfumada
Pois tem cheiro as fachadas e arabescos

Benfica 23/07/2020

o bardo raimundo cassundé 25


Totalmente do Bem

Sou totalmente do bem


Que de bom tudo contém
Somente o bem me convém
Se for do bem digo amém
O mal jamais me detém

Onde tem bem tudo é zen


Se não, pergunte a quem tem
Pena que tem um porém
Tem gente que se entretém
Olhando o bem com desdém

Quem faz assim vive aquém


De ser um dia um alguém
Pernóstico se mantém
E esquece porém também
Que a vida é um vai e vem

E enquanto o peito retém


O ódio como refém
Vai prestar contas no além
Tostão, vintém por vintém
Disso não escapa ninguém
Sou totalmente do bem

26 o bardo raimundo cassundé


ORAÇÃO

Como conheço esses bares


Mesa por mesa
Copo por copo
Dose por dose
Também conheço o teu corpo
Pelo por pelo,
dedo por dedo,
poro por poro.
Como conheço os teus olhos, cílios
por cílios.
Eu sei de cada investida
das tuas pupilas.
Moro entre teus ardentes lábios
Durmo agachadinho e aquecido
dentro do encontro
dos teus suaves seios.
Porém antes, dito preces
Me desmancho em oração
pedindo por teu infinito
ajoelhado e contrito,
aos pés do teu coração.

o bardo raimundo cassundé 27


Bendito é olhar a chuva
Pelas frestas da janela
Que cai singela cheirando
Respingando a solidão
Que ficou no lugar dela.

Não sei se chove ou se chora


Nessa tarde cinza e fria
Ou se é alguma alegria
Gargalhando nuvem afora

Quem dera que fosse embora


Agora por entres os pingos
Dessa tarde de domingo
Esse vazio cruel

Que eu sairia desvairado


Sorrindo e dançando ao léo
Pela chuva nas calçadas
E depois de alma lavada
E a alegria molhada
Tirava o chapéu pro céu

Fortaleza, 16 de maio de 2005

28 o bardo raimundo cassundé


Sou da VÁrzea

Eu sou da Várzea
Minha casa, minha rua
Minha bela cajarana
Meu baião com piqui
É mais que certo
Meu arroz doce Que à noitinha ou lá pras tantas
Doce alfinim do amarelo Convém molhar a garganta
Onde o sorriso é mais E o destino é um bar qualquer
Onde é decreto sorrir
Flertando a moça
Só gente simples Que se coça de paixão
São Raimundos e Felipes E iluminar o calçadão
Vá pro Sanharol de jipe Colorido de mulher
Só pra vadiar
De manhãzinha
Olhar pro verde Inda brilha a estrela d’alva
Numa rede bem cheirosa E a bandinha toca a salva
Tirar dois dedos de prosa E toca fundo na emoção
Jogando histórias pro ar Que a Várzea toda
Acorda alegre e eu que o diga
Quem vai lá traz a cantiga
Grudada no coração.

Fortaleza, 24 de maio de 2005

o bardo raimundo cassundé 29


Nota no jornala
Diário do Nordeste
26de junho de 1998

30 o bardo raimundo cassundé


o bardo raimundo cassundé 31
Matéria no jornal
O POVO
21 de novembro de 1984

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34 o bardo raimundo cassundé
o bardo raimundo cassundé 35
Publicação independente realizada
pelos amigos, parceiros e admiradores em homenagem
ao poeta/compositor raimundo cassundé

Textos
juliana samara
poemas escolhidos por
juliana samara
chicão oliveira
eugênia siebra

produção
wladiza mesquista, juliana samara, chicão oliveira,
adriano kanu, daniel, john robson

projeto gráfico, capa e diagramação


andré dias

Tiragem: 111 exemplares

setembro de 2023

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