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Copyright © 2011 Aluízio A.

Silva

VINHA Editora

Editora associada à ASEC – Associação Brasileira de Editores Cristãos

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do autor. A violação dos Direitos Autorais (Lei nº 9610/98) é crime estabelecido
pelo artigo 48 do Código Penal.

Impresso no Brasil

Printed in Brazil

2011
21 Dias com Jesus no Monte
Categoria: Vida cristã / Devocional / Jejum

Copyright © 2011 Aluízio A. Silva


Todos os direitos reservados

1ª edição outubro de 2011


Edição e preparação de texto Aline Monteiro
Revisão Thaís Teixeira Monteiro
Projeto gráfico e diagramação Michele Araújo Fogaça
Capa Robson Júnior

Os textos das referências bíblicas foram extraídos da versão Almeida Revista e


Atualizada (Sociedade Bíblica do Brasil), salvo indicação específica.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Silva, Aluízio A., 2011


21 Dias com Jesus no Monte / Aluízio A. Silva. – Goiânia: VINHA
Editora, 2011
ISBN: 978-85-98512-58-5
1: Vida cristã 2: Devocional 3: Jejum 4: Título
 CDD : 230/240

Índice para Catálogo Sistemático:


1: Vida cristã: Devocional: Jejum 230/240

Editado e publicado no Brasil por:


VINHA Editora
Av T-3, Qd. 43, Lt. 20, Andar 3, Ed. Videira, Setor Bueno, CEP: 74.215-110
Goiânia–GO–Brasil
Telefone: (62) 3251-0440 — www.vinhaeditora.com.br
Índice

1º Dia - A natureza do povo do Reino – Parte 1 7


2º Dia - A natureza do povo do Reino – Parte 2 21
3º Dia - A influência do povo do Reino 29
4º Dia - A lei do Reino 43
5º Dia - A lei do Reino a respeito do homicídio 51
6º Dia - A lei do Reino e o adultério 63
7º Dia - A lei do Reino e o juramento 73
8º Dia - A lei do Reino a respeito do perverso 81
9º Dia - A espiritualidade do Reino: as esmolas 95
10º Dia - A espiritualidade do Reino e a oração 105
11º Dia - Como orar no Reino 111
12º Dia - A espiritualidade do Reino: o jejum 123
13º Dia - O povo do Reino e seus bens 137
14º Dia - O povo do Reino e as riquezas 147
15º Dia - O povo do Reino e a ansiedade 161
16º Dia - A vida no Reino: Não julgueis 171
17º Dia - A vida no Reino: peça, busque e bata 181
18º Dia - A vida no Reino: os dois caminhos 191
19º Dia - Advertências sobre os falsos profetas 199
20º Dia - Condições para entrar no Reino 207
21º Dia - O crente prudente e o insensato 215
1º Dia

A natureza do povo do Reino


– Mateus 5.1-12 – Parte 1

Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e, como


se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; e
ele passou a ensiná-los, dizendo: Bem-aventurados
os humildes de espírito, porque deles é o reino dos
céus. Bem-aventurados os que choram, porque serão
consolados. Bem-aventurados os mansos, porque
herdarão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e
sede de justiça, porque serão fartos. Bem-aventurados
os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão
a Deus. Bem-aventurados os pacificadores, porque
serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os
perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino
dos céus. Bem-aventurados sois quando, por minha
causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo,
disserem todo mal contra vós. Regozijai-vos e exultai,
porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim
8 21 dias com Jesus no Monte

perseguiram aos profetas que viveram antes de vós.


(Mt 5.1-12)
Toda nação tem sua constituição, todo povo tem leis que regem
seus relacionamentos e comportamentos, e o mesmo acontece no
reino de Deus. Nós, cristãos, também temos uma constituição, co-
nhecida como “O Sermão do Monte”. A declaração da constituição
do reino dos céus está registrada nos capítulos 5, 6 e 7 do evangelho
de Mateus, nos quais mergulharemos a partir de agora.
O primeiro trecho do Sermão do Monte trata da natureza do
povo do Reino. Contudo, antes de falarmos sobre esse assunto,
precisamos deixar dois pontos bem claros a respeito desse sermão.

a. Ele foi endereçado aos discípulos


Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte; e, como
se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; e ele
passou a ensiná-los... (Mt 5.1,2)
Há uma questão antiga a respeito do Sermão do Monte que
tenta definir a quem ele foi destinado: aos gentios, aos judeus ou à
igreja? Entretanto, esse versículo deixa bem claro que a constituição
do Reino não foi dada para a multidão, mas aos discípulos.
Vemos que, embora a multidão estivesse presente, o Senhor Jesus
se dirigiu aos discípulos. O Sermão do Monte, portanto, não foi
endereçado nem aos judeus do Velho Testamento nem aos gentios
sem Deus, mas aos discípulos do Novo Testamento que, mais tarde,
foram chamados de cristãos.
Isso significa que a mensagem do Reino não é para conduzir à
salvação, mas para orientar aqueles que já foram salvos. Ninguém
pode ser salvo por nenhuma das obras de justiça ensinadas por Je-
sus. Antes, somos salvos pela graça, mediante a fé. Entretanto, uma
vez salvos, somos conduzidos a um estilo de vida de outro reino,
o reino dos céus.
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 1 9

Somente aqueles que nasceram de novo estão aptos a praticar


a lei do reino dos céus. O homem natural, em seu próprio esforço
humano, não consegue cumprir o padrão elevado do Reino. Os
preceitos do Reino estão acima da ética e da capacidade humana
de cumpri-los. Se para ser salvo alguém tivesse que praticar todo
o Sermão do Monte, ninguém jamais conseguiria alcançar a salva-
ção. Mas, depois que somos salvos pela graça, o mesmo Deus que
faz exigências vem habitar em nós para nos capacitar a cumprir
Sua vontade.
A lei do Reino é para ser praticada hoje pelos cidadãos do Reino.
Não é algo que praticaremos no futuro, após a morte, nem para ser
vivido por pessoas extraordinárias. Todo aquele que nasce no Reino
precisa se familiarizar com a nova lei transmitida pelo Senhor.

b. Foi proferido no monte


O segundo ponto é que o decreto da constituição do Reino foi
feito em cima de um monte. Na Palavra de Deus, os acidentes ge-
ográficos são simbólicos, e o monte possui um sentido espiritual.
Grandes acontecimentos da Palavra de Deus ocorreram em
algum monte:
™™ A arca pousou sobre o monte Ararat;
™™ Abraão ofereceu Isaque sobre o monte Horebe;
™™ A lei foi dada no monte Sinai;
™™ A bênção e a maldição eram proferidas sobre os montes
Ebal e Gerizim;
™™ Jesus foi transfigurado num monte, morreu no monte do
Calvário e vai voltar no monte das Oliveiras.
O monte nos fala de uma posição para receber a revelação de
Deus. Se desejamos conhecer a Deus e seus princípios, precisamos
sair do vale da incredulidade e do mar da morte e subir ao monte
da revelação do Senhor.
A constituição do Antigo Testamento foi dada em um monte, e
a do Novo Testamento também. No Sinai havia trovões, relâmpagos
10 21 dias com Jesus no Monte

e a aparência era tão estarrecedora que as pessoas tinham medo e


não se aproximavam (Hb 12.18-20). No Novo Testamento, vemos
Jesus como uma grande luz atraindo as multidões (Mt 4.25).

A natureza do povo do Reino


A primeira seção do Sermão do Monte trata da natureza do povo
do reino dos céus. Não trata de um padrão para pessoas excepcionais,
mas para todo o povo de Deus. Entretanto, o cristianismo atual
tornou-se algo fora do padrão e a maioria dos cristãos não está no
nível do povo do Reino, pois aqueles que vivem como cidadãos do
Reino são tidos como excepcionais.
Os nove aspectos da natureza dos filhos do Reino são acompa-
nhados da expressão “bem-aventurado”, que no original é “maká-
rios” e significa “feliz”.

1. São humildes de espírito


Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles
é o reino dos céus. (Mt 5.3)
O reino dos céus aqui não é uma questão de salvação, mas de
qualificação, de ser achado qualificado diante de Deus para assentar-
-se no trono e julgar as nações.
A primeira qualidade dos cidadãos do Reino é ser humilde de
espírito. Porém, para ver melhor o que é essa virtude, primeiro
precisamos esclarecer o que ela não é.
Muitas vezes, a humildade de espírito é confundida com pobre-
za material, mas ela não é isso. Não há mérito algum na pobreza.
Muitos pensam que Deus ama mais o pobre do que o rico, o que é
um engano, pois Deus ama a todos igualmente. A diferença é que
o rico tem recursos e não precisa buscar a Deus, mas o pobre, não
tendo a quem recorrer ou clamar, só pode clamar a Deus. Por isso,
com o passar do tempo, a pobreza adquiriu nuances espirituais e
passou a ser identificada como uma dependência de Deus. Contudo,
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 1 11

independentemente de nossa condição financeira, quando reconhe-


cemos que não temos a quem recorrer e então clamamos ao Senhor,
estamos sendo humildes de espírito. Na verdade, a primeira condição
para ser salvo é essa necessidade espiritual. Quem não precisa não
clama, e quem não clama não recebe a bênção de Deus.
Ter humildade de espírito não é ser culturalmente ignorante,
ser aquele tipo meio tolo, ingênuo e simplório, que é facilmente
enganado. Hoje em dia, a expressão “pobre de espírito” tomou até
um sentido depreciativo.
A humildade de espírito também não é uma virtude natural.
Ninguém nasce humilde de espírito, pois isso não é uma carac-
terística de personalidade. Não é supressão da personalidade nem
autossacrifício.
Em primeiro lugar, ser humilde de espírito é ser livre do orgulho.
O pobre de espírito é como aquele pecador que subiu ao monte para
orar com o fariseu. Certa vez, Jesus contou uma parábola sobre um
publicano e um fariseu que subiram ao monte para orar. O fariseu
olhava para o publicano e dizia: “Oh, Deus! Obrigado porque não
sou como esse pecador aqui ao meu lado, mas sou fiel, dou meu
dízimo, vou ao culto todos os domingos e sou um marido honesto”.
E o publicano, de cabeça baixa, batia no peito e dizia: “Oh, Deus!
Tem misericórdia de mim porque sou pecador”. Jesus disse que este
desceu do monte justificado dos seus pecados porque era humilde de
espírito (Lc 18.10-14). Assim, ser humilde de espírito é reconhecer
nossa necessidade absoluta de Deus. Nada temos a oferecer e nada
a reivindicar diante de Deus.
Jesus disse que foi enviado aos quebrantados de coração (Is 61.1).
Do mesmo modo, a humildade de espírito também está ligada à
contrição. Mas a primeira característica do homem que entra no
Reino é um coração contrito e quebrantado.
Porque assim diz o Alto, o Sublime, que habita a eter-
nidade, o qual tem o nome de Santo: Habito no alto
12 21 dias com Jesus no Monte

e santo lugar, mas habito também com o contrito e


abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos
e vivificar o coração dos contritos. (Is 57.15)
Humilde de espírito é aquele que reconhece sua debilidade,
sua limitação e sua pobreza espiritual. Exatamente o oposto da
igreja de Laodiceia, que julgava ser rica e abastada e não precisar
de coisa alguma.
Pois dizes: Estou rico e abastado e não preciso de coisa
alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável,
pobre, cego e nu. (Ap 3.17)
Uma palavra importante que devemos considerar é “espírito”.
Ser humilde de espírito é ter o espírito vazio de si mesmo, das coi-
sas do mundo, das paixões pelas coisas do mundo, e procurar ser
cheio de Deus.
Quem é humilde de espírito aprende com qualquer um, ouve
de qualquer um. Não é como algumas pessoas que, como costumo
dizer, têm o complexo de Adão. São pessoas que acham que Deus
quer iniciar tudo com elas. Então, elas não aprendem com ninguém
porque, segundo pensam, Deus iniciará do zero com elas. Isso é
uma tolice! Sempre digo a meus discípulos para subirem em meus
ombros e irem além de onde eu fui, fazerem além do que eu fiz.
Em minha opinião, Isaac Newton foi um dos maiores gênios
que a humanidade já viu. Certa vez, alguém lhe perguntou como
ele conseguiu chegar tão alto. E ele, como um homem de Deus,
disse: “Eu simplesmente subi nos ombros daqueles que vieram
antes de mim”.

2. Choram por causa da tristeza segundo Deus


Bem-aventurados são os que choram, porque serão
consolados. (Mt 5.4)
Como já vimos, a expressão “bem-aventurado” no original
significa “feliz”, mas não no sentido de que tudo vai bem, de que
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 1 13

não há problemas. Ela expressa uma sensação de realização de que,


independentemente de estar tudo bem, somos bem-aventurados.
Por isso o Senhor disse algo paradoxal: “Felizes são os que choram!”
Em outras palavras: “Felizes são os infelizes!”
Em primeiro lugar, esse não é um choro por coisas naturais.
Não é feliz o que chora porque o pai ou a mãe morreu. Não é feliz
o que chora porque perdeu o emprego, nem porque assistiu a um
filme romântico. Também não é o choro de lamento pelo infortú-
nio. Não é um choro por coisas naturais, mas é o choro causado
pelo arrependimento, pela consciência da condição de pecado; é o
choro por causa da injustiça.
Sabemos que Jesus chorou. A Bíblia não diz que Ele sorriu, mas
afirma que chorou.
Quando ia chegando, vendo a cidade, chorou e dizia:
Ah! Se conheceras por ti mesma, ainda hoje, o que é
devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus olhos.
(Lc 19.41,42)
O Senhor chorou de compaixão, chorou por ver a dor dos ou-
tros. Do mesmo modo, devemos chorar ao andar na rua e ver que
nós sabemos o caminho, mas há muitos que ainda estão com os
olhos vendados. Devemos chorar porque vemos a aflição, a dor e
a opressão que o diabo traz na vida das pessoas. Esse é o choro que
será consolado. Quando o Senhor vier, enxugará de nossos olhos
toda lágrima. Ele enxugará as lágrimas daqueles que choraram por
causa do pecado, daqueles que, chorando, disseram: “Deus, muda-
-me ou leva-me”.
Paulo nos diz que existe uma tristeza segundo a carne e outra
segundo Deus. Os que choram e são felizes são aqueles que choram
por causa da tristeza segundo Deus.
Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento
para a salvação, que a ninguém traz pesar; mas a tristeza
do mundo produz morte. (2Co 7.10)
14 21 dias com Jesus no Monte

Não é qualquer choro, porque muitos conseguem chorar sem


nem mesmo estar contristados. O choro segundo Deus não tem
aparência de piedade. É aquele que vem sem depressão ou melan-
colia. É triste, mas sem ser miserável. É sóbrio, mas não sombrio.
É grave, mas nunca frio e distante.
No final, sabemos que o Consolador limpará de nossos olhos
toda lágrima. Hoje, todavia, é uma época de choro. Estamos apenas
saindo e chorando enquanto semeamos para a vida eterna, quando,
então, colheremos os frutos da glória de Deus.
Pois o Cordeiro que se encontra no meio do trono os
apascentará e os guiará para as fontes da água da vida.
E Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima. (Ap 7.17)
Quando tudo o mais falhar, experimente chorar! Ouvi a história
de um pai que já havia tentado tudo para que seu filho mudasse:
brigas, ameaças, corte de mesada... Tentou tudo e não conseguiu
nada. Até que um dia ele chegou chorando para o filho e disse:
— Fiz tudo por você e não resolveu. Agora, a única coisa que
posso fazer é chorar por você. Por favor, não vá por esse caminho
de morte.
Hoje ele conta que aquelas lágrimas mudaram a vida de seu filho.
Lágrimas têm o poder de mudar histórias! Se quisermos mudar
a terra, temos que tocar o céu. Não há outra maneira de mudá-la.

3. São mansos
Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.
(Mt 5.5)
Mansidão não é indolência ou complacência. Também não é
aquela gentileza natural e polida que aprendemos em casa. Manso
é aquele que é humilde de espírito, quebrantado, que chora diante
de Deus. Após chorar diante do Senhor, a pessoa se torna dócil para
com os outros e mansa de coração.
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 1 15

Jesus mesmo se declarou manso, gentil e atencioso, mas devemos


rejeitar toda imagem dEle que evoque uma figura fraca e efeminada.
Ele é manso, é gentil, porém forte em Deus.
Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecar-
regados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo
e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de
coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o
meu jugo é suave, e o meu fardo é leve. (Mt 11.28-30)
Manso é aquele que não esmaga a cana quebrada. Não esmaga
os outros porque ele mesmo tem uma percepção correta de si mes-
mo. Ao se ver como é, torna-se manso, tolerante e paciente para
com os outros.
Não esmagará a cana quebrada, nem apagará a torcida
que fumega; em verdade, promulgará o direito. (Is 42.3)
Muitas vezes, nos humilhamos diante de Deus e nos declaramos
miseráveis pecadores diante dEle, mas, se saímos à porta e alguém
nos chama de miserável pecador, perdemos o controle. Aceitamos
falar da nossa condição diante de Deus, mas não a reconhecemos
diante dos homens. Essa hipocrisia é fruto da falta de mansidão.
O homem manso é aquele que fica pasmo ante o fato de os
homens pensarem tão bem a respeito dele e o tratarem de maneira
bondosa. O mundo hoje pertence aos arrogantes, aos valentes e
aos fortes, mas o Senhor diz que a terra, por fim, será dos mansos,
gentis e dóceis.

4. Têm fome e sede de justiça


Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça,
porque serão fartos. (Mt 5.6)
Ter fome e sede é uma condição básica para o crescimento.
Para Deus se manifestar, é necessário haver fome por mudança e
transformação na própria vida, na família, no trabalho e em todas
as circunstâncias que nos cercam. Ausência de fome denota doença
16 21 dias com Jesus no Monte

espiritual. Contudo, não basta ter fome, é preciso ter sede também.
Isso nos fala de uma “santa obsessão” espiritual. Fome e sede pro-
fundas nos levam a sentir dor, a não dormir e a nos angustiarmos
por causa do clamor que suscitam.
Na Palavra de Deus, a justiça tem pelo menos três aspectos: a
justiça para com Deus, a justiça moral e a justiça social. Devemos
clamar por todas elas. O homem de Deus, o cidadão do reino de
Deus, tem fome e sede de justiça em todos os níveis. Primeiro ele
clama por justiça para com Deus, para poder se achegar diante dEle
e ser aceito. Essa é a justificação pela fé no sangue de Jesus, que já
nos lavou de todo pecado. A justiça para com Deus é a justificação,
um relacionamento certo com Ele. É levar o homem a se reconhecer
pecador e receber a salvação e a justiça de Cristo.
Mas há também a justiça moral, aquela relacionada com a con-
duta, com o caráter que agrada a Deus. Não a justiça do fariseu, que
era exterior, mas a justiça interior, do coração e das motivações. É
quando buscamos mudança em nossos relacionamentos. Quando
chegamos a tal ponto de desespero é que as coisas são mudadas e
nossa fome e sede são saciadas.
O terceiro aspecto da justiça é a justiça social, que se refere à
luta pela libertação do homem da opressão e da tirania da falta de
oportunidades iguais para todos. É a promoção dos direitos civis, da
justiça nos tribunais, da integridade nos negócios, da ética na política
e no governo, da honra no lar e nos relacionamentos familiares. Esse
é um contexto em que o evangelho afeta profundamente todos os
níveis da sociedade, levando-a a uma genuína mudança. Ao ver o
noticiário, diante de tanta tragédia e desigualdade, nos resta clamar
para que venha o reino de Deus, de paz e justiça. E isto temos que
proclamar com realidade: justiça para com Deus, para conosco e
para com o próximo. Nosso coração deve queimar por isso.
Nossa fome e sede de justiça devem incluir todos esses três ní-
veis de justiça.
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 1 17

Precisamos ter fome do próprio Senhor Jesus, não de bênçãos


ou de experiências espirituais. Ter fome da justiça de Deus, da Sua
santidade. A maior causa do “raquitismo espiritual” que acomete
muitos crentes é a falta crônica de apetite e sede espiritual.
Certa vez, um jovem aproximou-se de um homem muito usado
por Deus e lhe disse que gostaria de ser seu discípulo. O homem
de Deus concordou, com a condição de que antes eles fizessem um
batismo para iniciarem o discipulado. Então, o homem de Deus
levou o garoto a um rio e o mergulhou na água, como se fosse
batizá-lo, mas segurou o jovem debaixo d’água. Depois de algum
tempo, quando o jovem já se debatia violentamente, quase se afo-
gando, o homem de Deus o tirou da água. O jovem, ofegante, mal
conseguia falar, mas recriminou o homem de Deus perguntando
por que ele queria matá-lo.
— Eu não queria matar você — respondeu ele. — Queria ape-
nas testá-lo. Responda-me sinceramente: o que você mais desejou
quando estava debaixo d’água?
O jovem respondeu sem hesitar:
— Ar! Mais que tudo na vida, eu desejei o ar.
O homem de Deus, então, lhe disse:
— Quando você desejar Deus como desejou o ar, você terá o
que eu tenho e fará o que eu faço.
E então o despediu.

5. São misericordiosos
Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão
misericórdia. (Mt 5.7)
O que tem fome e sede de justiça clama por punição e juízo,
mas o misericordioso clama por perdão. Aqui está o equilíbrio.
Após haver punição e justiça, ele clama por aqueles que estão sendo
julgados, condenados e rejeitados.
18 21 dias com Jesus no Monte

O misericordioso é aquele que é duro consigo, mas tolerante


com o outro. É correto consigo e não sai do padrão de Deus, mas
sabe oferecer perdão e misericórdia ao pecador. Aquele que é corre-
to consigo bem poderia atirar a primeira pedra, mas ele não o faz;
antes, ele ama, perdoa e é gracioso.
A misericórdia é diferente da graça. Misericórdia é quando Deus
não nos dá o que merecemos, e graça é quando Deus dá o que não
merecemos. É interessante que, quando temos fome e sede de jus-
tiça, podemos nos tornar implacáveis no castigo e na punição dos
injustos, mas Jesus vem em seguida e nos conduz à misericórdia.
Existe uma sequência nas bem-aventuranças. Primeiro temos de
ser humildes de espírito e reconhecer nosso pecado diante de Deus.
Uma vez que o reconhecemos, choramos contritos por causa de
nosso pecado. Esse reconhecimento de pecado e o quebrantamento
nos fazem mansos para com Deus e os homens, pois vemos a nossa
real condição espiritual.
Contudo, não ficamos apenas lamentando os pecados passados,
passamos a ter fome e sede da justiça e santidade de Deus e, nesta
busca, nos tornamos misericordiosos com aqueles que ainda não
entraram no processo. Os que têm fome e sede de justiça clamam
por castigo, mas os misericordiosos oferecem perdão. A misericórdia
está ligada à compaixão. O Senhor Jesus é o exemplo de alguém
misericordioso e compassivo, como vemos nos versículos abaixo:
Vendo ele as multidões, compadeceu-se delas, porque
estavam aflitas e exaustas como ovelhas que não têm
pastor. (Mt 9.36)
Desembarcando, viu Jesus uma grande multidão, com-
padeceu-se dela e curou os seus enfermos. (Mt 14.14)
E, chamando Jesus os seus discípulos, disse: Tenho
compaixão desta gente, porque há três dias que per-
manece comigo e não tem o que comer; e não quero
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 1 19

despedi-la em jejum, para que não desfaleça pelo


caminho. (Mt 15.32)
Aproximou-se dele um leproso rogando-lhe, de joelhos:
Se quiseres, podes purificar-me. Jesus, profundamente
compadecido, estendeu a mão, tocou-o e disse-lhe:
Quero, fica limpo! (Mc 1.40,41)
A misericórdia se manifesta no perdão. Aquele que é misericor-
dioso sempre perdoa.
Assim também meu Pai celeste vos fará, se do íntimo
não perdoardes cada um a seu irmão. (Mt 18.35)
...e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos
perdoado aos nossos devedores. (Mt 6.12)
2º Dia

A natureza do povo do Reino


– Mateus 5.1-12 – Parte 2
(Cont. sequência do capítulo anterior)

6. São limpos de coração


Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão
a Deus. (Mt 5.8)
Os fariseus se preocupavam muito com a aparência exterior,
mas Deus olha o coração. Há indivíduos que por fora não parecem
bons religiosos ou crentes piedosos que servem a Deus, mas em seu
coração agradam ao Senhor.
A grande questão para Deus não é tanto a mente ou a conduta,
mas o coração. Somos limpos de coração quando rejeitamos a hi-
pocrisia. O limpo de coração está livre da falsidade, é inteiramente
sincero. Deus quer um coração limpo e puro.
Há uma diferença entre estar limpo e ser puro. A limpeza está
ligada à sujeira, e a pureza, à mistura. Limpo é o que rejeita a sujeira
do pecado, e puro é o que não tem lugar em seu coração para mais
22 21 dias com Jesus no Monte

nada, ele é inteiro para o Senhor e tudo o que ele quer é agradar o
Pai. Ele não busca reconhecimento humano, mas a aprovação do
céu. Devemos buscar um coração limpo, mas também um coração
puro. Precisamos ser limpos e puros de coração.
Existem coisas que não são sujas, mas que tornam nosso coração
misturado e impuro. Somos limpos de coração quando rejeitamos a
contaminação e a impureza, e Jesus, certamente, estava enfatizando
o fato de que a verdadeira pureza é no íntimo, no coração, e não
meramente exterior e cerimonial como ensinavam os fariseus.
Os limpos de coração verão a Deus, e ver a Deus aponta para a
revelação de Deus hoje. Se desejamos conhecer a Deus, precisamos
de um coração limpo, pois a recompensa para um coração limpo
é poder ver a Deus, ter revelação em seu espírito. Muitos querem
ver a Deus nas circunstâncias, mas só aqueles que são limpos de
coração podem enxergá-lo por trás de tudo, conseguem perceber
a mão de Deus conduzindo-os. Além disso, sabemos que tudo o
que está oculto será manifesto diante dos olhos de Deus. Assim, os
limpos de coração não temem porque eles não têm nada a esconder.
A verdadeira riqueza está aonde Jesus chega, o verdadeiro des-
canso existe onde Jesus está; só com Ele podemos dormir seguros e
fartos. O bem-aventurado é aquele que tem uma vida com sabor.
De nada adianta ter dinheiro e não ter fome, ter uma bela cama e
não ter sono. Mas com o Senhor, podemos ter plena satisfação em
tudo. Quem é limpo de coração mantém o foco na presença do
Senhor e não se deixa embriagar pelas coisas do mundo.

7. São pacificadores
Bem-aventurados os pacificadores, porque serão cha-
mados filhos de Deus. (Mt 5.9)
Em primeiro lugar, somos bem-aventurados porque o Senhor
Jesus entrou em nossa vida e nos tornou filhos de Deus. Agora, os
projetos fazem sentido e os sonhos ganham significado.
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 2 23

A sequência natural de um homem justo, misericordioso e limpo


de coração é que ele se torna um pacificador. O Senhor continua:
“Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos
de Deus”. Uma coisa é ser filho de homem, mas outra coisa é ser
filho de Deus e ser reconhecido como tal.
Jesus disse que não veio trazer paz, mas espada. O que Ele queria
dizer com isso é que o conflito seria o resultado inevitável da sua
vinda, até mesmo dentro da família.
Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer
paz, mas espada. Pois vim causar divisão entre o homem
e seu pai; entre a filha e sua mãe e entre a nora e sua
sogra. Assim, os inimigos do homem serão os da sua
própria casa. (Mt 10.34-36)
Entretanto, fica mais que explícito que jamais deveríamos nós
mesmos procurar o conflito ou sermos responsáveis por ele. Ao con-
trário, somos chamados para pacificar, buscar a paz e a reconciliação.
A ordem bíblica é clara: “Aparte-se do mal, pratique o que é bom, bus-
que a paz e empenhe-se por alcançá-la” (1Pe 3.11). Isso nem sempre
depende de nós, mas a Palavra do Senhor diz: “Se possível, quanto
depender de vós, tende paz com todos os homens” (Rm 12.18).
Ser pacificador é diferente de ser apaziguador. Paz é diferente de
apaziguamento. Apaziguamento é quando buscamos paz a qualquer
preço. Não podemos abrir mão da justiça, da verdade e da Palavra
de Deus para ter paz com os homens. Se renunciarmos a nossos
valores e ocultarmos nossa fé para termos paz com os homens, já
não somos dignos de sermos chamados discípulos do Senhor.
A verdadeira paz tem um preço. Às vezes haverá a dor do pe-
dido de desculpas à pessoa que prejudicamos, ou de repreender a
pessoa que nos prejudicou. A falsa paz pode ser alcançada com um
pedido de desculpas sem arrependimento ou retratação, com um
perdão barato. Porém, somente será um pacificador aquele que co-
loca o Príncipe da Paz dentro de si, pois só há paz onde o Príncipe
da Paz reina.
24 21 dias com Jesus no Monte

8. São perseguidos por causa da justiça


Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça,
porque deles é o reino dos céus. (Mt 5.10)
Podemos pensar que uma pessoa que demonstra esses traços da
natureza dos que são do Reino será sempre amada e querida, mas
não é assim que acontece. O Senhor diz que, uma vez que vivamos
assim, o resultado é que seremos perseguidos por causa da justiça.
Essa não é uma perseguição que se sofre por fazer algo errado,
por fanatismo, por defender uma causa, doutrina, denominação ou
uma visão. É ser perseguido por causa da justiça, da integridade,
da santidade. Bem-aventurados são esses, porque não aceitam fazer
concessões. As bem-aventuranças descrevem o quadro de um cren-
te vencedor, de um discípulo vencedor, e é certo que tal discípulo
sempre será perseguido.
Sabemos que os falsos profetas são aprovados por todos. Mas o
Senhor disse em Lucas 6.26: “Ai de vós, quando todos vos louvarem!
Porque assim procederam seus pais com os falsos profetas”. Essa expres-
são “ai de vós” é o exato oposto de “bem-aventurados”. Portanto,
é como se Jesus dissesse: “Ai de vós quando forem unanimidade,
quando passarem e todos os elogiarem, sem ninguém os criticar ou
caluniar”. A popularidade e a unanimidade estão para o falso profeta
assim como a perseguição e a crítica estão para o servo de Deus.
Quando buscarmos ser pacificadores, seremos perseguidos. Na
medida em que tivermos fome e sede de justiça e clamarmos por
justiça no caráter, nas instituições e nos relacionamentos, sofreremos
discriminação. Se formos limpos de coração, amantes da pureza e
não aceitarmos a maldade, inevitavelmente seremos incompreen-
didos. Por tentarmos trazer a paz entre os homens ou entre estes e
Deus, repentinamente começamos a ser maltratados e mal interpre-
tados, porque veem em nós alguém duro, implacável, que os está
julgando e condenando. É inevitável que haja perseguição, pois
teremos que confrontar pessoas.
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 2 25

Por isso, não podemos nos assustar se nos caluniarem, ao con-


trário, devemos nos alegrar. Se estivermos sendo perseguidos por
causa da justiça, somos bem-aventurados. Mas devemos ter cuidado
para não sermos perseguidos por causa da nossa injustiça ou porque
somos malandros. Só é bem-aventurado aquele que é perseguido
injustamente, quando notoriamente procuram motivos contra ele.
É assim que a igreja do Senhor deve ser.
Assim como são nove os dons do Espírito, descritos na primeira
carta de Coríntios, e nove os frutos do Espírito, listados no livro
de Gálatas, também são nove as bem-aventuranças mencionadas
pelo Senhor.
Uma pessoa deve ficar alegre quando for demitida porque desco-
briram que ela serve a Jesus. Deus não impedirá que isso aconteça.
Ao contrário, ela será perseguida, terá prejuízo, perdas nos negócios,
será discriminada e deixada de lado por causa de sua fé em Jesus.
O mundo é contra Deus e será contra os servos de Deus também.
Há um poder espiritual nos ares que tenta nos impedir de servir a
Jesus. O inimigo quer trancar nossa boca, nos constranger e perse-
guir para impedir que falemos.

9. São perseguidos por causa do Senhor


Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos
injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem
todo mal contra vós. (Mt 5.11)
Devemos ficar felizes quando nos chamarem de loucos, fanáti-
cos, radicais, presunçosos ou intolerantes. Todo aquele que quiser
seguir Jesus fielmente será perseguido. Em 2 Timóteo 3.12, Paulo
diz que “todos quantos quiserem viver piedosamente em Cristo
Jesus serão perseguidos”. Aquele que nunca foi perseguido deve se
preparar, pois ainda será.
As bem-aventuranças pintam um quadro do discípulo de Cristo,
do vencedor. Ele é humilde de espírito, reconhece sua pobreza es-
piritual e chora por causa dela. Isso o torna manso e gentil em seus
26 21 dias com Jesus no Monte

relacionamentos. Mas, longe de se conformar com seu pecado, ele


tem fome e sede de justiça, anseia crescer em Deus e em Sua santi-
dade. Seu relacionamento com Deus faz dele alguém misericordioso
para com os outros e puro de coração, sincero e transparente para
com todos. Assim, ele procura ser um pacificador, um reconcilia-
dor, mas ninguém lhe agradece os esforços; antes, ele é hostilizado
e perseguido por causa da justiça que defende e por causa do Cristo
a quem segue.
Portanto, ser perseguido será a consequência natural daqueles que
praticarem as bem-aventuranças anteriores. Há muitos que se dizem
cristãos em nossos dias, mas só é cristão aquele que anda seguindo
as pegadas do Senhor Jesus, aquele que segue após Ele. Esse, sim,
é um cristão vencedor que receberá a recompensa e reinará com o
Senhor. A recompensa é diferente da salvação. A recompensa é para
quem busca essas virtudes.
Há muitos crentes, mas são poucos os que são perseguidos por
causa da justiça. Certa vez, um amigo pastor me contou que foi a
uma repartição pública e, chegando lá, encontrou um irmão. Ao
vê-lo, espontaneamente o cumprimentou bem alto com a paz do
Senhor. O irmão ficou muito sem graça e pediu ao pastor que fa-
lasse baixo, dizendo que ninguém ali sabia que ele era crente e que
estava se preparando para lhes contar. O pastor, então, lhe disse que
ele era um “agente secreto de Deus”, pois nem o diabo sabia que ele
era crente. Esses “agentes secretos do Reino” provavelmente nunca
serão perseguidos.
A sequência das bem-aventuranças é algo extraordinário! Somen-
te Deus poderia ter falado algo tão maravilhoso assim. Primeiro Ele
disse: “Bem-aventurados são os humildes de espírito”, porque tudo
começa quando nos humilhamos e nos curvamos diante de Deus,
reconhecendo que precisamos dEle, que neste universo infinito
somos como um cisco, quase invisíveis. Ser humilde de espírito é
reconhecer o quanto somos pequenos e o quanto o Senhor é grande.
A natureza do povo do Reino – Mateus 5.1-12 – Parte 2 27

Ao nos colocarmos diante dEle e enxergarmos nossa condição,


choramos. Porém, o Senhor diz que felizes são os que choram, por-
que serão consolados. Se estivermos chorando por causa do nosso
pecado, seremos consolados, porque há perdão no sangue do Se-
nhor Jesus. E, quando choramos, logo vem o quebrantamento que
nos torna dóceis e mansos para recebermos a instrução do Senhor.
Agora já não vivemos mais num estado de contrição e con-
templação, apenas observando nossa condição e nosso pecado.
Ao contrário, caminhamos para buscar de Deus, e então o Senhor
diz: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça”, sede de
crescer, fome de conhecer mais a Deus. Somos bem-aventurados
porque seremos fartos, teremos em abundância.
Todavia, quando temos fome de justiça, tendemos a ser muito
radicais e implacáveis, então o Senhor nos diz que “Bem-aventurados
são os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia”. Porque
temos fome e sede de justiça, receberemos justiça, mas devemos ter
o cuidado de exercer também a misericórdia.
Uma vez que caminhamos em misericórdia, o Senhor diz que
os limpos de coração são bem-aventurados, porque verão a Deus.
Não é simplesmente ser limpo exteriormente, em sua conduta e
reputação, mas é ser limpo no íntimo, no caráter, é ser limpo para
com Deus. Não é aquele que olha para um lado e outro a fim de
ver se alguém está observando o que ele está fazendo, mas é alguém
que olha para cima, pois sabe que Deus tudo vê. Ele não se prende
somente ao exterior, mas teme a Deus, que vê o interior do coração.
3º Dia

A influência do povo do Reino


– Mateus 5.13-16

Vós sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido,


como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta se-
não para, lançado fora, ser pisado pelos homens. Vós
sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade
edificada sobre um monte; nem se acende uma candeia
para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador, e
alumia a todos os que se encontram na casa. Assim
brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que
vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que
está nos céus. (Mt 5.13-16)
Jesus iniciou o sermão falando da natureza do povo do Reino.
Então, passou a tratar da influência desse povo sobre o mundo. Para
mostrar o poder da influência do crente, Jesus usou duas analogias:
o sal e a luz. O sal aponta para o caráter interior, e a luz, para a
conduta exterior.
30 21 dias com Jesus no Monte

1. O sal da terra
Somente será sal da terra aquele que possuir as nove caracterís-
ticas mencionadas nas bem-aventuranças. Quem não as tem não
pode ser sal, pois não consegue exercer influência alguma nem tem
poder algum em sua vida. Mas uma vez que essas características se
manifestem, então podemos ser o sal da terra.
O sal aponta para nosso caráter e possui características bem espe-
cíficas, as quais Jesus usou para nos ensinar. O Senhor fez analogia
com o sal porque, baseados na experiência, podemos dizer que o
sal tem pelo menos cinco características:

a. Dá sabor
Em primeiro lugar, o sal tem a função de dar sabor à comida.
Conforme o ensino de Jesus, nós, os cristãos, damos sabor a este
mundo. Quando a igreja está manifestando a natureza santa do Rei-
no, ela empresta seu sabor para tornar este mundo mais agradável.
Todavia, se nosso comportamento for igual ao daqueles que
estão lá fora, não fará diferença alguma. Não se trata de tentar dar
sabor contando piadas e nada tem a ver com a falsa alegria. Natu-
ralmente, queremos ter graça, mas, acima de tudo, desejamos ser
canais da graça de Deus. Esse sabor é a presença do Espírito Santo
de Deus dentro de nós. Aonde chegamos, essa vida se manifesta e o
ambiente muda completamente. Quando há vida e o povo de Deus
se aproxima das outras pessoas, elas percebem que nossa presença
muda o ambiente ao seu redor.
O ato de salgar não é feito individualmente. Deus nunca planejou
isso. Seu propósito é coletivo: a igreja como um corpo, manifestando
um grande poder de influência. Jesus disse: “vós sois o sal da terra”,
não “vós sois os sais”. “Vós sois” é plural, mas “o sal” é singular.
Portanto, concluímos que o trabalho não é feito um por um, mas
nós, juntos e em unidade, reunidos na comunhão e vinculados em
amor, possuímos o poder de ser o sal; o poder de fazer diferença
e dar sabor à vida das pessoas. Uma pessoa sozinha não dá sabor,
A influência do povo do Reino – Mateus 5.13-16 31

mas quando nos reunimos, as pessoas chegam e sentem um sabor


diferente entre nós. Quando a igreja se reúne, o sal se manifesta
dando sabor para quem se aproxima e se mistura ali. Contudo, esse
sabor só poderá ser percebido na comunhão, no relacionamento e
no ambiente.

b. Produz sede
Em segundo lugar, o sal nos leva a ter sede. Basta observar como
uma comida salgada nos dá sede. Lembro-me de um comercial de
refrigerante que mostrava um homem que vinha caminhando no
deserto e se aproximava de um bar com aparência e expressão de
alguém que estava com muita sede. Porém, em vez de pedir água,
ele pedia batatas fritas e as mastigava com a boca seca. O objetivo
do comercial era, de fato, provocar uma sensação de sede em quem
via a cena, mas traduzia muito bem o que significa sentir sede.
Quando manifestarmos a natureza das bem-aventuranças, as
pessoas que estão próximas a nós começarão a sentir anseio e sede
por conhecer o Senhor. Além disso, pessoas sedentas e famintas
parecem nos contagiar. Assim, aqueles que têm fome e sede de
justiça, inevitavelmente, contagiarão outros com sua fome e sede.
Quando a igreja é absolutamente diferente do mundo, ela atrai as
pessoas para Deus.
A sede é uma experiência básica da vida, e o propósito do sal
deve ser despertar a sede por Deus nas pessoas. Normalmente, as
pessoas nem pensam em Deus, mas um belo dia, algumas decidem
participar de uma reunião conosco. Então, vendo o louvor, ouvin-
do a Palavra e sentindo o ambiente, são despertadas e sentem uma
grande sede de Deus. Só o fato de estarem na reunião as expõe ao
desejo por algo celestial, e assim começam a ter um forte interesse
por Deus. Isso é o sal salgando e provocando a sede pelo Senhor.
Podemos ver o sal atuando quando pessoas se envolvem conosco
e são influenciadas a beberem da preciosa água do Espírito. Só bebe
32 21 dias com Jesus no Monte

da água viva quem tem sede, e é o sal que desempenha a função


de gerar sede.
As pessoas não querem meramente mudar de religião, mas, se
sentirem sede, perceberão sua necessidade de Deus. O que precisa-
mos é de crentes cheios do Espírito que simplesmente sejam sal na
boca das pessoas, levando-as a sentirem sede de Deus.

c. Preserva da deterioração
Em terceiro lugar, a função do sal é preservar da deterioração e
impedir o apodrecimento. O sal foi colocado no mundo para impe-
dir que ele se deteriore. Estamos aqui para impedir que este mundo
apodreça de vez. Essa é a nossa função. A carne não é culpada por
apodrecer, por isso jamais devemos condenar o mundo lá fora. É
normal esperar que a carne exposta ao sol e às impurezas venha a
apodrecer. As estruturas sociais vão se deteriorando a cada dia. Por
essa razão, nossa função e propósito nunca deve ser condenar e jul-
gar. Enquanto o sal da terra estiver aqui, haverá esperança de vida
para quem está no mundo.
Se a sociedade está corrompida e apodrecida, o primeiro motivo é
a presença de pouco sal. Não podemos culpar a carne por apodrecer.
Deus colocou o sal no mundo, mas se ele está apodrecendo, talvez o
problema esteja no sal, que não está cumprindo seu propósito. Nos
dias de Jesus, o sal era o único meio de preservar a comida. E hoje,
se o mundo está apodrecendo, em grande parte a responsabilidade
é da Igreja, que não está salgando.
Mais uma vez, não podemos pensar no sal individualmente,
mas corporativamente. Perdemos nossa expressão e relevância
quando buscamos uma espiritualidade individualista, que é uma
das atitudes mais destrutivas dentro da igreja. A vida cristã não
pode existir de maneira isolada e solitária. A melhor definição para
solidão é “não ter propósito”, é arrogantemente desprezar a todos,
colocando-se como muito bom para ser colocado junto de alguém.
A influência do povo do Reino – Mateus 5.13-16 33

A vida cristã genuína somente pode ser vivida em comunidade,


através de relacionamentos.
Há pessoas que se equivocam e pensam que viverão para Deus
isoladas em um quarto, sem ter contato com ninguém. Alguns cren-
tes presumem que serão mais consagrados se não tiverem contato
com outras pessoas. Acham que crescer em Deus é se trancar, se
isolar e não ter comunhão com mais ninguém. Não conversam nem
dirigem a palavra aos outros, pois imaginam que, se mantiverem
esse contato, perderão a unção. Isso é espiritualidade individualista.
Essa é a espiritualidade do monge trancafiado em um mosteiro. É
simplesmente um sal que foi guardado e privado de salgar.
A verdadeira espiritualidade é do corpo, não do membro. Não se
pode dizer que o corpo está saudável quando um dos membros está
doente, pois a saúde é sempre algo do corpo completo. Como dizem
os filósofos, ela é holística, um sistema completo. Quando dizemos
que estamos bem, não nos referimos a um membro isoladamente,
mas a todo o corpo. E quando um só membro está mal, dizemos
que estamos doentes ou passando mal, pois, se um dos membros
está doente, todo o corpo sofre.
Pensar na espiritualidade de maneira individual é um grande
mal – eu estou bem, mas a igreja está mal. Essa individualidade
é um câncer terrível que destrói a igreja. O câncer é diferente dos
vírus – os vírus são as setas enviadas pelo diabo – e, se usarmos o
escudo da fé, não precisaremos temê-los. O problema do câncer
é que ele não tem uma causa externa. Ele se constitui de células
“preocupadas apenas consigo mesmas”, tão “egoístas” que sugam
todos os nutrientes para si. O resultado é que se transformam num
grande tumor que não para de crescer até destruir todo o corpo.
Esse câncer é a célula individualista.
Dentro de uma igreja ou comunidade, podem existir alguns
tipos de câncer. Essa doença se desenvolve quando pensamos que
nossa espiritualidade não tem nada a ver com a espiritualidade do
outro. Contudo, se fazemos parte de uma igreja doente, também
34 21 dias com Jesus no Monte

estamos doentes. Não tem sentido alguém dizer que está bem se
sua igreja vai mal. Se, de alguma forma, um membro está bem e
sua igreja vai mal, então ele é o câncer. Se nossa igreja não está bem,
devemos dizer que não estamos bem porque nossa igreja está mal.
Se a igreja não está manifestando vida e não há graça fluindo, então
precisamos urgentemente buscar a Deus. Alguém com essa atitude
é uma pessoa que cresceu e aprendeu que o estar bem ou mal não
é uma questão individual e isolada. Nenhum membro está bem
ou mal isoladamente. Se um membro não está bem, então todo o
corpo sente.
Vivemos numa sociedade individualista, onde basta olhar os
muros altos ao redor das casas para ver como é possível uma pessoa
viver sem manter contato algum com os vizinhos. Essa mesma men-
talidade se reflete no meio cristão, no qual há pessoas que preferem
pensar na igreja como um lugar onde o que importa é somente
“eu e Deus e nada mais”. Para elas, talvez nem fosse necessário nos
reunirmos, pois poderíamos fazer tudo sozinhos, mas não é assim.
A verdadeira espiritualidade é exercida em grupo, em comunidade,
pois somos a Igreja, o Corpo de Cristo.
Essa é a razão de sermos uma igreja em células. Não escolhemos
essa forma para crescermos numericamente, mas por entendermos
que a verdadeira espiritualidade implica em relacionamentos con-
sistentes, nos quais exista prestação de contas, vínculos e funciona-
lidade, ao lado de pessoas escolhidas e também amadas por Deus.
Para estarmos bem, nosso grupo também precisa estar bem.
Gosto da visão de célula porque ela dá uma percepção clara de
corpo. Célula é uma terminologia da biologia e anatomia e dá o
entendimento claro de um vínculo. No entanto, na célula não po-
demos ser o sal da terra de maneira eficiente. Nela somos apenas o
sal dentro do saleiro. O lugar de ser sal é lá fora. Também ninguém
é sal sozinho, pois um só grão de sal não produz efeito algum. O
sal é corporativo e orgânico. Nós também somos um organismo e,
como igreja, vamos salgar e impedir que a sociedade se degenere
A influência do povo do Reino – Mateus 5.13-16 35

totalmente. Enquanto estivermos aqui, o mundo não vai apodrecer,


mas depois de sermos arrebatados, ele certamente se deteriorará.
Certamente é a presença do sal que tem impedido a manifestação
do anticristo. Crentes vencedores são o sal da terra. São eles que
impedem que a podridão dos germes do inferno venha carcomer a
sociedade. “Com efeito, o mistério da iniquidade já opera e aguarda
somente que seja afastado aquele que agora o detém” (2Ts 2.6).

d. Arde quando colocado sobre a ferida


Vimos que o sal é para dar sabor, despertar sede e preservar da
deterioração. Mas há ainda uma quarta função: o sal causa ardência.
Quando colocado numa ferida, ele gera um ardor insuportável, mas
pode levar à cura.
Nós que somos igreja temos a grande tarefa de passar o sal na
ferida do mundo. Evangelizar nem sempre é festa. Aqueles a quem
estamos evangelizando nem sempre vão sorrir para nós. Na verdade,
às vezes vão chorar, mas é necessário passar o sal da Palavra, o sal
da verdade, o sal do evangelho, pois, para ser curada, a ferida do
pecado precisa receber o sal da Palavra sobre ela.
Quando o evangelho é verdadeiramente pregado, o sal arde.
Assim, se quisermos pregar o evangelho para as pessoas, teremos de
esfregar o sal em suas feridas para haver cura pelo arrependimento.
Quando alguém ferido recebe o sal justamente na carne exposta,
um ato reflexo de revidar com aspereza e revolta pode acontecer.
Mas não devemos desanimar; ainda que as pessoas não entendam,
é para o bem delas que passamos o sal da Palavra que cura a ferida
do pecado. Estamos limpando e higienizando a infecção espiritual
que está matando a pessoa.
O sal é para arder e o verdadeiro evangelho sempre arde e inco-
moda, por isso precisamos arder na sociedade. Com todas as suas
feridas, a sociedade precisa perceber a presença da Igreja como o
sal, caso contrário, ela (a Igreja) terá perdido completamente sua
função e somente servirá para ser pisada pelos homens.
36 21 dias com Jesus no Monte

e. É o sinal da aliança
Em Levítico 2.13, o Senhor disse: “Toda oferta dos teus manjares
temperarás com sal; à tua oferta de manjares não deixarás faltar o sal
da aliança do teu Deus; em todas as tuas ofertas aplicarás sal”.
No Velho Testamento, todo o povo vinha trazer ofertas a Deus
e uma delas era a de manjares, que envolvia o prazer de conhecer e
ter comunhão com Deus. Essa oferta se relacionava especificamente
com a gratidão e a adoração. O nome manjar aponta para algo ape-
titoso que promove muito prazer. Ela era uma oferta de comunhão
com Deus e não podia ser oferecida sem a presença do sal.
A Palavra de Deus também diz que no perfume e no incenso
usados no Tabernáculo deveria haver sal. No incenso, que simboliza
a oração, ele era um ingrediente que não podia faltar. Isso certamente
nos mostra a necessidade de nos achegarmos a Deus com sede de
Sua presença. A intimidade da aliança é reservada para aqueles que
têm fome e sede do Senhor.
Há uma relação íntima entre a aliança com o Senhor e ser o sal
da terra. Nesse caso, é verdadeiro dizer que teremos tudo de Deus
quando Ele tiver tudo de nós. Quando Deus tem tudo de nós, então
podemos desfrutar da aliança que é ter tudo de Deus.

2. O sal pode perder o sabor


Mas Jesus diz, no verso 13, que o sal pode perder o sabor. A
eficácia do sal tem uma condição: conservar sua salinidade. O sal é
um elemento químico, o cloreto de sódio, que na realidade nunca
perde sua propriedade salina, nunca deixa de ser sal nem perde o
sabor, porque é estável. Todavia, ele pode ser misturado a outras
substâncias impuras tornando-se, então, inútil e até mesmo perigoso.
Precisamos entender o que Jesus quis dizer com o fato de o
sal perder o sabor. Na verdade, o sal pode perder sua propriedade
e utilidade e tornar-se até perigoso quando é misturado a outras
substâncias. Quando misturado com outro elemento químico, ele
A influência do povo do Reino – Mateus 5.13-16 37

pode se transformar num veneno mortífero. Daí o Senhor dizer


que, neste caso, ele não serve para mais nada. Portanto, o que faz o
sal perder o sabor é a mistura.
A mistura nos fala daquela diferença peculiar que existe entre nós
e o mundo, entre os nossos valores e os valores do mundo, entre o
nosso comportamento e o comportamento do mundo. Quando essa
diferença desaparece, perdemos o sabor. Se a fronteira que separa
as coisas de Deus das coisas do mundo não está bem definida, nos
tornamos o sal que perdeu o sabor. Se não há diferença clara entre
a igreja e o mundo, então somos o sal que está perdendo o sabor.
Temos sido advertidos com uma verdade muito séria: “O mundo
tem se tornado tão ‘igrejeiro’ e a igreja tem se tornado tão mundana
que, em muitos casos, é difícil fazer a distinção entre os dois”.
Não vos ponhais em jugo desigual com os incrédulos;
porquanto que sociedade pode haver entre a justiça
e a iniquidade? Ou que comunhão, da luz com as
trevas? Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou
que união, do crente com o incrédulo? Que ligação
há entre o santuário de Deus e os ídolos? Porque nós
somos santuário do Deus vivente, como ele próprio
disse: Habitarei e andarei entre eles; serei o seu Deus,
e eles serão o meu povo. (2Co 6.14-16)
Nessa passagem, Paulo faz uma distinção clara e nos exorta a
estabelecer uma separação nítida do mundo e seus costumes. Deve-
mos ser pessoas nitidamente reconhecidas como alguém que serve a
Deus. Não se trata de ser alguém que apenas se veste diferente, que
pode ter um cabelo ou roupa diferente, mas ainda ter um coração
perverso. Nós seremos reconhecidos como discípulos se amarmos
uns aos outros e não meramente pelo cabelo diferente. Portanto, não
é uma questão exterior e sim do coração. As questões fundamentais
em Deus devem envolver nossos padrões de valores, de pensamentos
e nosso estilo de vida.
38 21 dias com Jesus no Monte

Se aquilo que fazemos em nada difere do que o mundo faz,


então somos um sal que perdeu o sabor. Se nossa vida não tem di-
ferença da vida das pessoas do mundo, somos o sal sem propósito.
Se estivermos frios e vazios da vida do Espírito, somos inúteis para
Deus. Se estivermos em busca do que os mundanos estão buscando,
então nos tornamos um deles. As pessoas no mundo só estão atrás
do dinheiro, e se nós também estivermos em busca disso, é porque
somos exatamente como eles. No mundo, o lema é “cada um por
si e Deus por todos”, e se praticarmos a mesma coisa, então nos
transformaremos no sal imprestável. Quando nossa mentalidade é
“igreja, igreja; negócios à parte”, novamente nos tornamos iguais
ao mundo e, se não houver arrependimento em nossa vida, o fim é
“sermos pisados”. Se ainda estamos competindo para ter o melhor
carro, não há diferença entre nós e as pessoas do mundo.
Se não andamos em mansidão, não temos fome e sede de justiça,
não possuímos um desejo de ver o mover de Deus, não somos pa-
cificadores, então somos um sal que perdeu o sabor. Perder o sabor
não significa perder a salvação ou afastar-se do Senhor, mas perder
a diferença peculiar com o mundo.
Na verdade, nunca deixaremos de ser sal. Se fomos salvos, é
impossível deixarmos de ser filhos de Deus. Mas o fato de sermos
salvos não significa que não haverá problemas com nossa vida. A
salvação não garante imunidade da disciplina de Deus. Somos sal
e não deixaremos de sê-lo ao perder o sabor. Todavia, seremos um
sal misturado, mundano, a respeito do qual o Senhor diz que “para
mais nada presta, senão para ser pisado pelos homens”.
Lembrai-vos da mulher de Ló. (Lc 17.32)
E a mulher de Ló olhou para trás e converteu-se numa
estátua de sal. (Gn 19.26)
Houve apenas uma mulher na Bíblia da qual Jesus mandou que
nos lembrássemos: a mulher de Ló, cuja história todos nós certa-
mente conhecemos. Antes de destruir Sodoma e Gomorra, quando
A influência do povo do Reino – Mateus 5.13-16 39

o anjo estava tirando de lá a família de Ló, no meio do caminho, ela


olhou para trás e virou uma estátua de sal. O sal que perdeu o sabor
é como esta mulher que virou apenas uma estátua de sal. Olhar para
trás é pensar: “Viver em Sodoma era tão bom! Ah, como eu gostava
dos ‘filmes’ e das festas de lá! Como eu gostava das empresas, do
trabalho e do lazer! Como era bom o ‘shopping center’ de Sodoma!”
O sal misturado não serve para nada: nem para Deus nem para
o mundo. Esse sal é desprezado, impuro. É o famoso crente morno,
que pode ser vomitado por Deus a qualquer momento. Ele não des-
fruta realmente dos prazeres do mundo e também não desfruta da
glória que há na casa de Deus. Ele fica no meio do caminho. Não
tem sabor, não serve para nada, porque ninguém coloca estátua de
sal na comida. Estátua de sal é somente uma curiosidade.
Quando perdemos o sabor, não servimos para mais nada, nem
para Deus nem para o mundo. Ficamos a meio caminho, como a
mulher de Ló, que não morreu em Sodoma nem desfrutou do pleno
livramento do Senhor.
O sal é certamente bom; caso, porém, se torne insípido,
como restaurar-lhe o sabor? Nem presta para a terra,
nem mesmo para o monturo; lançam-no fora. Quem
tem ouvidos para ouvir, ouça. (Lc 14.34-35)
Esse texto mostra que o destino do sal misturado é ser lançado
fora e ser pisado pelos homens. Ser lançado fora demonstra tribu-
lação e tratamento, mas também aponta para ser deixado de fora
do reino dos céus (Lc 14.35). Ser pisado pelos homens é ser tratado
como poeira inútil. Portanto, essa passagem deixa claro que, quando
Jesus vier para reinar, esse cristão será desqualificado, pois foi alguém
que não manifestou o padrão nem o caráter das bem-aventuranças
de um cidadão que é genuinamente do reino do céu. Será deixado
de fora e não reinará com Cristo.
Muitos perguntam onde essa pessoa será deixada ou onde ficará,
mas não se trata do local físico. Não devemos pensar no milênio
como uma questão meramente geográfica, pois o que terá valor
40 21 dias com Jesus no Monte

verdadeiro será a questão da posição e da honra. Alguns serão hon-


rados e outros não. Alguns crentes serão elogiados e outros repreen-
didos publicamente. Alguns ganharão posição de reconhecimento
e reinarão com o Senhor. Não devemos nos preocupar com o local
geográfico, mas em receber o elogio da boca do Pai.
Naquele dia, Deus elogiará apenas o sal que for bom: o que salga,
que desperta sede, que dá sabor, que impede a deterioração e que
arde; o sal da aliança do Senhor. Esse sal tem um valor precioso,
pois cumpre sempre o propósito de Deus. Os homens que são esse
sal sempre expressarão a Deus e glorificarão Seu nome.

3. A luz do mundo
Enquanto o sal tem, principalmente, uma ação negativa de
matar os germes e preservar da corrupção, a luz tem uma função
positiva de iluminar e dissipar as trevas. Assim, Jesus chama Seus
discípulos para exercerem uma influência dupla no mundo: como
sal, devemos impedir a propagação do mal; e como luz, promover
a propagação da verdade, da beleza e da bondade.
O mundo jaz nas trevas e o Senhor, sendo a luz do mundo,
nos enviou para também sermos luz. A ilustração que o Senhor
usou foi de uma cidade sobre o monte. Não é uma questão de ser
luz individualmente, mas de cada igreja ser uma cidade sobre um
monte. Só podemos verdadeiramente ser luz se estivermos unidos
e vinculados como Igreja.
Assim como ao falar do sal, a Palavra do Senhor nesse texto não
foi para pessoas individualmente, mas para a Igreja enquanto corpo.
Nenhum de nós pode ser sal ou luz adequadamente sozinho. Ele
disse “vós sois a luz do mundo” e não “vós sois as luzes do mundo”.
Como já foi mencionado, toda espiritualidade individua-
lista é um câncer. O maior perigo para a igreja não são os ví-
rus lançados pelo maligno, mas os cânceres produzidos entre
nós mesmos. O câncer são células do corpo que se importam
A influência do povo do Reino – Mateus 5.13-16 41

apenas consigo e vivem em função de destruir as células nor-


mais. Assim, a verdadeira espiritualidade não é uma questão
individualista, mas do corpo. Não dizemos apenas que nossos
ouvidos são saudáveis ou que nossos olhos são bons. A saúde é
uma questão que envolve todo o corpo. Se nos separarmos da
igreja local ou participarmos de uma igreja doente, não pode-
remos ser sal ou luz do mundo apropriadamente.
Quando pensamos na analogia da luz, precisamos ter em mente
três características básicas da luz:
™™ A luz dissipa as trevas;
™™ A luz é direção e rumo;
™™ A luz representa lucidez, clareza e esclarecimento.

4. A luz pode ser escondida


Assim como o sal pode perder o sabor e deixar de salgar, a luz
também pode ser escondida e perder sua utilidade. O Senhor Je-
sus mostrou que existem quatro situações em que nossa luz pode
ser escondida:

a. A luz pode ser escondida debaixo do alqueire


Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a ci-
dade edificada sobre um monte; nem se acende uma
candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no
velador, e alumia a todos os que se encontram na casa.
(Mt 5.14,15)
O alqueire era uma espécie de cesto usado para guardar grãos,
equivalente ao nosso jacá. O alqueire, portanto, está relacionado
com a comida e o sustento do dia-a-dia.
Esconder a luz debaixo do alqueire significa que estamos
embriagados com as necessidades físicas e ansiosos quanto ao
nosso sustento.
42 21 dias com Jesus no Monte

b. A luz pode ser escondida debaixo da cama


Também lhes disse: Vem, porventura, a candeia para ser
posta debaixo do alqueire ou da cama? Não vem, antes,
para ser colocada no velador? (Mc 4.21)
Naturalmente, a cama nos fala de duas coisas: ociosidade
e sensualidade. Essas duas coisas são dois de nossos piores
inimigos. Quando nos envolvemos com elas, não podemos
resplandecer apropriadamente.

c. A luz pode ser escondida debaixo do vaso


Ninguém, depois de acender uma candeia, a cobre com
um vaso ou a põe debaixo de uma cama; pelo contrário,
coloca-a sobre um velador, a fim de que os que entram
vejam a luz. (Lc 8.16)
O vaso nos fala das vaidades e cuidados da vida. Muitas vezes,
estamos mais preocupados com a aparência exterior, em detrimento
do coração.

d. A luz pode ser colocada num lugar escondido


Ninguém, depois de acender uma candeia, a põe em
lugar escondido, nem debaixo do alqueire, mas no vela-
dor, a fim de que os que entram vejam a luz. (Lc 11.33)
O lugar escondido nos fala do medo e da timidez para testemu-
nhar do Senhor. Nós nos escondemos e nos ocultamos com medo
da rejeição e da perseguição.
O alvo final de ser uma brilhante luz é que os homens vejam as
nossas boas obras e glorifiquem ao Pai que está no céu. Ao mencio-
nar “Pai”, Jesus nos faz saber que o Sermão do Monte é para pessoas
salvas e regeneradas que têm Deus como Pai (Jo 1.12; Gl 4.6).
As boas obras são o comportamento do povo do Reino por meio
das quais os homens podem ver a Deus. Nossa luz são as nossas
obras e essa luz é uma expressão de Deus na terra.
4º Dia

A lei do Reino
– Mateus 5.17-20

Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não


vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade
vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou
um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra.
Aquele, pois, que violar um destes mandamentos, posto
que dos menores, e assim ensinar aos homens, será con-
siderado mínimo no reino dos céus; aquele, porém, que
os observar e ensinar, esse será considerado grande no
reino dos céus. Porque vos digo que, se a vossa justiça
não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais
entrareis no reino dos céus. (Mt 5.17-20)
A expressão “reino dos céus” é repetida inúmeras vezes no Sermão
do Monte e em todo o livro de Mateus. Por isso, antes de tudo,
precisamos ter clareza de que o reino dos céus mencionado aqui
não se trata do céu propriamente dito.
Quando a Palavra de Deus nos fala de salvação e vida eterna,
isso aponta para o céu. Receber Cristo como Senhor e Salvador nos
44 21 dias com Jesus no Monte

faz participantes da vida eterna e, então, somos destinados ao céu.


Esta grande salvação é uma questão resolvida de uma vez por todas
e para sempre, como um dom gratuito de Deus em Cristo Jesus.
Somos salvos pela fé e não por obras, e isso não vem de nós, mas é
um dom de Deus.
Sendo assim, o que vem a ser este reino dos céus? Watchman
Nee afirma que há pelo menos três aspectos sobre o reino dos céus
mencionado em Mateus: a aparência, a realidade e a manifestação.

Aparência
A aparência do Reino é mencionada nas parábolas encontra-
das no capítulo 13 do Evangelho de Mateus. O reino dos céus é
semelhante “ao homem que saiu a semear” e “a uma mulher que
colocou fermento na farinha”. A semelhança aponta para a apa-
rência do Reino e está relacionada a tudo o que se parece com o
cristianismo, tem nome de cristianismo, mas não tem sua reali-
dade, apenas sua aparência.

Realidade
A realidade do Reino está dentro de todo aquele que nasceu de
novo. Por um lado, o reino dos céus tem uma aparência, mas por
outro lado, tem uma realidade que é traduzida pela lei do Reino em
nosso interior, pelo Espírito Santo que nos foi dado para manifestar
as realidades desse Reino. Por isso, hoje, ninguém pode dizer que o
reino dos céus está aqui, ali ou em qualquer outro lugar. Hoje ele
não é visível, mas está dentro de nós, em nosso espírito.
Interrogado pelos fariseus sobre quando viria o reino
de Deus, Jesus lhes respondeu: Não vem o reino de
Deus com visível aparência. Nem dirão: Ei-lo aqui!
Ou: Lá está! Porque o reino de Deus está dentro de
vós. (Lc 17.20,21)
A lei do Reino – Mateus 5.17-20 45

Manifestação
A manifestação do reino dos céus acontecerá no dia em que o
Senhor Jesus voltar para estabelecer Seu governo e reinar sobre a
terra por mil anos. Essa manifestação é nossa viva esperança, segundo
o que Ele prometeu. Aguardamos com expectativa a manifestação
visível do reino dos céus na volta do Senhor Jesus e precisamos
pregar e anunciá-la.
O que temos nos capítulo 5 a 7 de Mateus é a constituição do
reino dos céus. Hoje ela está presente na realidade do Reino em
nós, e, no futuro, será plenamente visível na manifestação do Reino.
A constituição do reino de Deus certamente deve tratar da
questão da Lei. O povo de Deus, no Velho Testamento, tinha a Lei
e os profetas. Os Dez Mandamentos são como um resumo da Lei.
O Senhor Jesus não veio para dar uma nova lei, mas para cumprir
e elevar as exigências dela. A Lei é eterna e deve ser uma referência
para todos nós, mas o padrão do povo do Reino é muito superior
ao padrão da lei de Moisés.
Por exemplo, certa vez, um irmão me procurou para falar que
o dízimo era ordenança do Velho Testamento e que jamais deverí-
amos estar presos ao padrão da lei. Minha resposta foi a seguinte:
— Então vamos lá. Jesus disse: “Ouviste o que foi dito: ‘Não
matarás!’ Eu porém vos digo que se alguém se irar sem motivo, já é
réu do inferno. Ouviste o que foi dito: ‘Não adulterarás!’ Eu porém
vos digo que qualquer que olhar para uma mulher com intenção
impura já adulterou com ela”. Agora, complete a frase para mim:
“Ouviste o que foi dito: de toda a vossa renda trarás o dízimo para
o Senhor, eu porém vos digo...”
O silêncio pairou no ar, como a resposta de alguém que esperava
um padrão inferior ao da Lei, mas creio que essa resposta precisa ser
muito superior à Lei. Aquele que diz que o dízimo é da Lei porque
deseja dar mais que 10% procede de Deus, mas quem diz isso por-
que não quer dar coisa alguma procede do maligno.
46 21 dias com Jesus no Monte

O reino dos céus não é uma questão de cumprir normas, mas


de excedê-las, de subir ao padrão da nobreza do Reino celestial.

1. O cumprimento da Lei (vv. 17-20)


O Senhor não veio para revogar a Lei, mas para cumpri-la e
até excedê-la. Ninguém jamais cumpriu a Lei, mas Jesus veio para
cumpri-la cabalmente.
Sobre a Lei, precisamos entender que não precisamos mais de-
corar os mandamentos, pois o Espírito virá como uma voz a nos
dizer “este é o caminho, andai por ele”. Todo aquele que procura
o pastor fazendo uma pergunta sobre algo que é errado já sabe a
resposta. Por isso, sempre levo as pessoas a orar e a perguntarmos
juntos para o Senhor se aquilo que elas desejam fazer é pecado ou
não. Depois de orar, deixo que a própria pessoa me responda se é
ou não a vontade de Deus, pois se for alguém nascido de novo, já
tem a lei de Deus dentro de si.
Certa vez, uma irmã me procurou para perguntar se é pecado
ir ao Paraguai. Como quem não entendia o que ela queria dizer,
respondi que não, obviamente. Então ela “esclareceu” que queria
saber se é pecado ir até lá comprar produtos para revender aqui.
Imediatamente, convidei-a para orar e perguntarmos juntos ao Es-
pírito Santo sobre isso, pois Ele falaria com ela.
Na verdade, a resposta já estava evidente dentro dela, e tudo o
que ela queria era colocar o pastor como cúmplice e participante de
algo a respeito de que ela já tinha uma restrição clara dentro de si.
Alguns pastores, no desejo de ajudar, se comprometem diante do
Reino, pois instruem as pessoas violando as leis do reino dos céus.
A lei de Moisés era dividida em três partes: mandamentos, ju-
ízos e ordenanças. O Senhor Jesus cumpriu completamente cada
uma delas.
A lei do Reino – Mateus 5.17-20 47

a. Os mandamentos
Os mandamentos eram os princípios básicos da Lei, eles tradu-
zem o espírito da Lei e estão resumidos nos Dez Mandamentos.
Todavia, nós sabemos que existem mais de quatrocentos manda-
mentos na lei de Moisés, e Jesus cumpriu todos eles.
Todos pecaram, isto é, violaram alguns ou todos os manda-
mentos da Lei. Todavia, Jesus Cristo, o Justo, veio cumprir todos
os mandamentos da Lei sendo fiel em todas as coisas. Ao cumprir
os mandamentos, Ele os ampliou e os ensinou a Seus discípulos,
estabelecendo nova Lei: “Ouviste o que foi dito, não matarás... eu
porém vos digo, aquele que se irar contra seu irmão está sujeito a
julgamento. Ouviste o que foi dito, não adulterarás, eu porém vos
digo, aquele que olhar para uma mulher com intenção impura, já
adulterou com ela”. Esses são padrões mais elevados da nova Lei,
a lei do Reino, que não revoga a antiga, antes, a cumpre e amplia.
Para cumprirmos o mandamento da lei do Reino, sendo este
um padrão alto de moral e estilo de vida, precisamos depender do
poder do Espírito de Deus. O mesmo Senhor que nos dá manda-
mentos também nos capacita a cumpri-los por meio dEle mesmo.
Somente o próprio Senhor Jesus e todos quantos creem e vivem
nEle podem cumprir e guardar os mandamentos da lei do Reino.
Jamais poderemos guardar este “novo mandamento”, senão pelo
Espírito de Deus.

b. Os juízos
Caso alguém quebrasse algum dos mandamentos da Lei, havia
um juízo: “olho por olho, dente por dente e vida por vida”. Este
juízo variava de uma simples restituição até a própria morte por
apedrejamento. Por exemplo, se um homem matasse seu vizinho,
deveria pagar com a própria morte. O filho que amaldiçoasse o
pai e a mãe deveria ser apedrejado, e seus pais eram os primeiros
a fazer isso. Aqueles que falam em guardar a Lei não sabem o que
48 21 dias com Jesus no Monte

estão dizendo, pois deveriam também cumprir o juízo e receber a


punição da mesma.
Como Jesus cumpriu os juízos da Lei?
Quando morreu na cruz, Ele levou todo o juízo e a maldição que
a lei prescrevia, sofrendo sobre si a punição da Lei no lugar daqueles
que a violaram. Ele foi punido em nosso lugar, tomando sobre Si,
isto é, em Seu corpo, o juízo da Lei sobre o pecado.
Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele
próprio maldição em nosso lugar (porque está escrito:
Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro).
(Gl 3.13)

c. As ordenanças
Alguns pecados não eram punidos, mas podiam ser expiados
pelo sangue de animais. Para isso a lei prescrevia o sacerdócio, os
sacrifícios, as festas e o templo. Cada um desses aspectos eram or-
denanças da Lei que apontavam para Jesus e se cumpriram nEle.
Ele era o cordeiro e o próprio sacerdote, além de ser nosso sábado,
a própria arca da aliança e o templo. Ele é o Cordeiro de Deus que
tira o pecado do mundo.
Hoje, nos dias do Novo Testamento, a Lei não foi revogada ou
considerada errada, mas cumprida. Tendo sido cumprida, o prin-
cípio básico de nosso viver já não é a Lei, e sim a fé.
Por outro lado, Jesus aumentou as exigências da Lei. Tomemos
como exemplo o assassinato. A velha lei dizia para não matar (Ex
20.13), mas nada dizia a respeito de ficar irado. Se alguém matas-
se, a lei seria aplicada, mas não importava o quanto se irasse, a lei
nunca o condenaria.
Contudo, as novas exigências da lei do reino dos céus são muito
superiores. Jesus disse que aquele que se irar com seu irmão está
sujeito a julgamento. Não estamos mais debaixo da lei de Moisés,
e sim da graça que nos fará cumprir a antiga lei e ainda excedê-la.
A lei do Reino – Mateus 5.17-20 49

2. A condição para entrar no Reino


Há um princípio estabelecido no reino dos céus que nos fala de
exceder o padrão da Lei, é um novo princípio da lei do Reino que
cumpre e excede a antiga lei. As expressões “ouviste o que foi dito”
e “eu porém vos digo” nos mostram que o Senhor não veio revogar
a Lei, mas cumpri-la e excedê-la.
Jesus disse:
Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em
muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino
dos céus. (Mt 5.20)
Exceder a justiça dos fariseus é condição para entrar no reino dos
céus, ou seja, participar do Reino no milênio. Esta justiça excedida,
que nada mais é que o próprio Sermão do Monte, no final será o
linho finíssimo com o qual nos vestiremos nas bodas do Cordeiro
(Ap 19.7-8).
Para sermos salvos, precisamos nascer de novo. Mas para rece-
bermos a recompensa do Reino, precisamos viver uma vida superior
de justiça e moral, respondendo à lei do Reino pela fé no Filho de
Deus, andando no Espírito de Cristo que em nós habita.
Devemos observar ainda que, no reino dos céus, alguns serão
considerados grandes, e outros, pequenos ou mínimos. Sermos
grandes ou pequenos no Reino depende de guardarmos até os me-
nores mandamentos da Lei. Por exemplo, aqueles que são dizimistas
estão fazendo algo semelhante ao que um fariseu faz. Se desejarem
andar no padrão do Reino, deverão exceder no dízimo. Em relação
à fidelidade conjugal, precisam guardar até seus olhos e coração.
No caso da mansidão, devem se livrar de toda ira, não apenas do
crime e da agressão.
Somos convidados hoje a fazer parte do povo do reino dos céus,
guardando e vivendo esta lei superior: a lei do reino dos céus.
5º Dia

A lei do Reino a
respeito do homicídio
– Mateus 5.21-26

Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e:


Quem matar estará sujeito a julgamento. Eu, porém,
vos digo que todo aquele que sem motivo se irar contra
seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir
um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do
tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao
inferno de fogo. Se, pois, ao trazeres ao altar a tua ofer-
ta, ali te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa
contra ti, deixa perante o altar a tua oferta, vai primeiro
reconciliar-te com teu irmão; e, então, voltando, faze
a tua oferta. Entra em acordo sem demora com o teu
adversário, enquanto estás com ele a caminho, para que
o adversário não te entregue ao juiz, o juiz, ao oficial de
justiça, e sejas recolhido à prisão. Em verdade te digo
que não sairás dali, enquanto não pagares o último
centavo. (Mt 5.21-26)
52 21 dias com Jesus no Monte

Nesse texto, Jesus novamente está mostrando o padrão exceden-


te da constituição do reino dos céus ao dar um novo nível para a
Lei. Sempre que diz “Eu, porém, vos digo...”, Ele está excedendo o
mandamento anterior.

1. O contraste entre a lei de Moisés e a


nova lei do Reino
A velha lei era o mandamento para não matar. Ao dizer “ouviste
o que foi dito”, Jesus confirma a velha lei, mas ao prosseguir dizen-
do “eu, porém, vos digo”, é a nova lei sendo promulgada. Como o
próprio Jesus disse, Ele não estava revogando a lei, mas ampliando-a.
Enquanto a velha lei dizia apenas para não matar, a lei do Rei-
no mostra que o pecado da ira pode ter diferentes níveis. Vejamos
cuidadosamente a sequência desse pensamento. O primeiro nível
é irar-se sem motivo contra o irmão. O segundo nível é desprezá-
-lo, proferindo um insulto contra ele. O terceiro nível é condenar
o irmão chamando-o de tolo.
Sabemos que nem toda ira é errada, pois no Evangelho de Mar-
cos vemos que Jesus ficou irado. Portanto, nem toda ira será julga-
da, mas Jesus mostra que alguns tipos de ira ofendem a Deus e o
irmão. Na carta de Paulo aos Efésios, ele nos diz que não devemos
nos irar ao ponto de pecar, e que existe um limite de tempo para
nossa raiva: até o pôr do sol.
Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa
ira... (Ef 4.26)
Jesus colocou a ira no mesmo nível do assassinato porque o que
Deus olha é o coração. Muitas vezes, não chegamos a matar ape-
nas porque nossa posição ou envolvimento físico nos impedem de
consumar o ato, mas o pensamento e o desejo da morte já foram
concebidos em nosso coração.
A lei do Reino a respeito do homicídio – Mateus 5.21-26 53

2. O julgamento
Jesus disse que quem proferir um insulto a seu irmão estará su-
jeito a julgamento do tribunal, e quem lhe chamar de tolo estará
sujeito ao inferno de fogo.
Alguns perguntam se essa mensagem realmente é para nós que
aceitamos Jesus e já somos salvos, pois não sabem ou não concordam
com o fato de que os salvos também serão julgados. O Sermão do
Monte é, sim, para nós que conhecemos o Senhor e queremos fazer
Sua vontade. Pensar que a salvação nos exime de julgamento é um
engano, pois a Palavra de Deus afirma que haverá um julgamento
para aqueles que aceitaram o Senhor Jesus.
Porque importa que todos nós compareçamos perante
o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo
o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo.
(2Co 5.10)
Neste texto de 2 Coríntios, está claro que todos seremos julgados;
contudo, nós, os salvos, não para a perdição nem para a condenação,
mas para recebermos a recompensa ou disciplina segundo o bem
ou o mal que tivermos feito.
A ira é progressiva, como Jesus mostra no sermão, e temos que
cortá-la desde o começo: alguém que, sem motivo, se irar contra
seu irmão está sujeito a julgamento, assim como o que proferir um
insulto. E qualquer que chamar “tolo” está sujeito ao inferno de fogo.
Como já vimos, o Senhor diz para não matar, mas nem toda ira
é pecado. O próprio Deus se ira e, no capítulo 21 de Mateus, temos
o relato de uma ocasião em que Jesus ficou irado – quando chegou
ao templo, virou a mesa dos cambistas e disse que não fizessem da
casa de Seu Pai um covil de salteadores (Mt 21.13). Sabemos que
Jesus se irou, e também que Ele não pecou; portanto, há uma ira
que é pecado e outra que não é.
Em sua carta aos Efésios, lemos o seguinte conselho do apóstolo
Paulo: “Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira” (Ef
54 21 dias com Jesus no Monte

4.26). Ele diz que há situações em que é legítimo ficarmos nervosos


ou irados, mas essa ira não pode ir muito longe. Quando resolve-
mos chamar alguém de tolo, proferir insultos, ela se torna pecado.
Jamais devemos proferir insultos, palavras negativas de morte ou
de maldição contra alguém. Particularmente, sou contra até mesmo
colocar apelidos nas pessoas porque, em algumas circunstâncias,
determinados apelidos podem ser um insulto. Reconheço que exis-
tem apelidos carinhosos, mas muitos são frutos de rancor e inveja.
Outra situação em que a ira se torna pecado é quando o sol se
põe sobre ela. Ira que demora a sair vira alimento para demônios.
Temos até o pôr sol para resolver nossa ira. Depois disso, ela se
torna algo demoníaco. É como comida com validade vencida, se
transforma em morte. O rei Saul é um exemplo de ira guardada e
amanhecida (1Sm 10.6-10). A Bíblia conta que Davi saiu para a
guerra e venceu, então as mulheres começaram a cantar que Saul
havia vencido seus milhares, mas Davi, seus dez milhares. Saul não
gostou daquilo. Ficou com despeito e inveja e o resultado foi uma
ira incontida.
A inveja é maligna, e há uma ilustração que mostra bem como
ela age. Certa vez, perguntaram a um homem de Deus o que era
inveja, e ele respondeu com uma história: “Certo dia, Deus disse a
uma pessoa que faria a ela o mesmo que fez a Salomão. Assim, ela
poderia pedir o que quisesse e Ele lhe daria. Só havia uma condi-
ção: tudo o que ela pedisse também seria dado, porém em dobro,
a seu irmão. Ela pensou, pensou e então pediu: “Quero ficar cego
de um olho”.
A Bíblia mostra que a ira de Saul durou até o dia seguinte, e o
resultado dessa demora foi que um demônio entrou nele. Como
isso é sério! A ira é alimento de demônios. Se ela durar mais de um
dia, já não é algo natural. Torna-se uma questão espiritual.
As coisas espirituais são sempre assim. Tomemos como exemplo
a bebida alcoólica: a primeira experiência com a bebida acontece por
A lei do Reino a respeito do homicídio – Mateus 5.21-26 55

curiosidade, vontade, ou porque alguém oferece; a segunda, porque


a pessoa gostou da primeira e ficou com desejo; mas na terceira vez,
a pessoa bebe porque um demônio entrou em sua vida.
Precisamos entender que é apenas um processo. No começo,
fazemos por um motivo qualquer. Depois, passamos a fazer por-
que temos um desejo. Mas, por fim, não conseguimos parar mais
porque nos tornamos escravos de um demônio. Portanto, se a ira
tem tomado conta de nossa vida, ela se torna nossa característica,
uma marca registrada. Existem pessoas iracundas, que vivem mal
humoradas. Isso é algo espiritual.
Problemas espirituais normalmente geram atitudes despropor-
cionais. Assim, se diante de um pequeno problema temos uma
grande ira, isso é sinal de que pode haver um demônio agindo por
trás dessa situação.
O Reino, portanto, não é uma questão de não matar, mas de
controlar os ímpetos de nossa ira.
Para cada nível de pecado apresentado pelo Senhor nesse texto
há um julgamento. O Senhor Jesus usou o sistema judeu de julga-
mento como ilustração porque toda a Sua audiência era de judeus.
Assim, no primeiro nível há o julgamento da porta da cidade, pois
era costume dos judeus ter um juiz à porta das cidades para julgar
as causas. Por isso, o Senhor disse que todo aquele que sem motivo
se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento. No segundo
nível, o Senhor disse que quem proferir um insulto contra o irmão
estará sujeito ao julgamento do tribunal, que se refere ao sinédrio, à
suprema corte dos judeus. Por fim, o terceiro nível é o julgamento
de Deus representado pelo lago de fogo.
Os crentes do Novo Testamento, contudo, serão julgados pelo
tribunal de Cristo, onde todo pecado não confessado e abandona-
do será julgado. Porém, todo pecado confessado e abandonado é
lavado pelo sangue de Jesus e dele não há memória diante de Deus.
56 21 dias com Jesus no Monte

Muitos textos no Novo Testamento ensinam claramente que os


crentes serão julgados.
Porque importa que todos nós compareçamos perante
o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo
o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo.
(2Co 5.10)
Tu, porém, por que julgas teu irmão? E tu, por que
desprezas o teu? Pois todos compareceremos perante
o tribunal de Deus. Assim, pois, cada um de nós dará
contas de si mesmo a Deus. (Rm 14.10,12)
Porque de nada me argúi a consciência; contudo, nem
por isso me dou por justificado, pois quem me julga é
o Senhor. Portanto, nada julgueis antes do tempo, até
que venha o Senhor, o qual não somente trará à plena
luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará
os desígnios dos corações; e, então, cada um receberá o
seu louvor da parte de Deus. (1Co 4.4,5)
Manifesta se tornará a obra de cada um; pois o Dia a
demonstrará, porque está sendo revelada pelo fogo; e
qual seja a obra de cada um o próprio fogo o provará. Se
permanecer a obra de alguém que sobre o fundamento
edificou, esse receberá galardão; se a obra de alguém se
queimar, sofrerá ele dano; mas esse mesmo será salvo,
todavia, como que através do fogo. (1Co 3.13-15)
Porque o Filho do Homem há de vir na glória de seu
Pai, com os seus anjos, e, então, retribuirá a cada um
conforme as suas obras. (Mt 16.27)
E eis que venho sem demora, e comigo está o galardão
que tenho para retribuir a cada um segundo as suas
obras. (Ap 22.12)
Ora, nós conhecemos aquele que disse: A mim pertence
a vingança; eu retribuirei. E outra vez: O Senhor julgará
A lei do Reino a respeito do homicídio – Mateus 5.21-26 57

o seu povo. Horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo.


(Hb 10.30,31)
Todos esses textos mostram que, embora salvos para sempre e
perdoados por Deus, os crentes estão ainda sujeitos a julgamento do
Senhor, não para perdição, mas para disciplina, caso desrespeitem a
lei do Reino. Entretanto, quando pecamos contra a lei do Reino e
confessamos nosso pecado, somos perdoados e limpos pelo sangue
do Cordeiro (1Jo 1.7-9).
Essas palavras de Jesus no Sermão do Monte foram endereçadas
aos discípulos, aos salvos, pois a palavra “irmão” é usada no exemplo
indicando que se trata de filhos de Deus. E uma vez que o julga-
mento é mencionado nele, não podemos dizer que os cristãos não
serão julgados de forma alguma.
Os presbiterianos e episcopais seguem o pensamento de João
Calvino, que ensinou que a salvação é predestinada e, consequen-
temente, os salvos jamais poderão perecer. Por outro lado, os me-
todistas e pentecostais seguem o ensino de Jacobus Arminius, que
enfatizava a importância do livre arbítrio. Vendo, a partir da Bíblia,
que muitos crentes caem da fé, os arminianos defendem que um
crente pode perder sua salvação.
Embora pareça que Calvino tenha prevalecido em sua base bí-
blica, é preciso dizer que os arminianos têm também a sua base. Os
calvinistas são mais bíblicos, mas os arminianos são crentes mais
vigilantes e fiéis. E precisamos das duas coisas: um terreno sólido
na Palavra e uma vida correta sobre a rocha. Então, é necessário
colocar os dois pensamentos juntos e deixar que a própria Escritura
decida a questão.
O Senhor disse: “Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão...”
(Jo 10.28). E cremos que, de fato, um crente não pode perder
sua salvação. Mas muitos, por causa dessa segurança, tornaram-
-se crentes relapsos e pecaminosos. Certamente, Deus disciplinará
cada um deles, pois se há julgamento é porque haverá recompensa
58 21 dias com Jesus no Monte

ou disciplina conforme as obras de cada um. Se houver boas obras


haverá recompensa, havendo obras ruins, haverá disciplina.
Porque importa que todos nós compareçamos perante
o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo
o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo.
(2Co 5.10)
Alguns receberão recompensa, e outros, disciplina.
Aquele servo, porém, que conheceu a vontade de seu
senhor e não se aprontou, nem fez segundo a sua vonta-
de será punido com muitos açoites. Aquele, porém, que
não soube a vontade do seu senhor e fez coisas dignas
de reprovação levará poucos açoites. Mas àquele a quem
muito foi dado, muito lhe será exigido; e àquele a quem
muito se confia, muito mais lhe pedirão. (Lc 12.47,48)
O texto de Lucas nos mostra não somente a possibilidade de
perda da recompensa, mas também de açoites.
Se a obra de alguém se queimar, sofrerá ele dano; mas
esse mesmo será salvo, todavia, como que através do
fogo. (1Co 5.15)
Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora,
à semelhança do ramo, e secará; e o apanham, lançam
no fogo e o queimam. (Jo 15.6)
Como pode alguém sofrer dano pelo fogo sem ter nenhum tipo
de sofrimento? Não permanecer no Senhor e ser lançado fora ou no
fogo são experiências de disciplina e punição diante de Deus. Se um
crente cai em pecado e não se arrepende, poderá ser disciplinado
por Deus. Um pecado na vida de um ímpio e na vida de um crente
não é diferente, é igualmente pecado.

3. A condição para se ofertar a Deus


No Velho Testamento, exigia-se apenas que a oferta fosse apro-
priada, mas agora o ofertante também precisa ser qualificado. A
A lei do Reino a respeito do homicídio – Mateus 5.21-26 59

primeira condição para isso é que, antes de ofertarmos, precisamos


nos reconciliar com nosso irmão.
Nos versos 23 e 24 o Senhor diz: “Se, pois, ao trazeres ao altar a
tua oferta, ali te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra
ti, deixa perante o altar a tua oferta, vai primeiro reconciliar-te com
teu irmão; e, então, voltando, faze a tua oferta”.
O altar mencionado por Jesus era um móvel do átrio do templo
(Ex 27.1-8; 1Rs 8.64) no qual todos os sacrifícios e ofertas eram
oferecidos. No templo havia o altar de holocausto onde os judeus
traziam suas ofertas de manjares e ofertas pacíficas, relacionadas à
comunhão com Deus e a uma atitude de gratidão. A oferta era dife-
rente do sacrifício pelo pecado. O sacrifício tratava do pecado diante
de Deus, enquanto a oferta era para ter comunhão com o Senhor.
Muitos pensam nessa oferta citada por Jesus apenas como o di-
nheiro que ofertamos ao Senhor, justamente por ser a única oferta
que fazem, e acham que se trata do momento em que a entregamos
durante o culto. Contudo, hoje não temos mais na vida da Igreja
um templo e um altar como aquele. Sei que muitos ainda têm uma
herança templista e acreditam que o púlpito é um altar, mas agora
nós somos o templo do Senhor. Portanto, o que o texto está dizendo
é que, quando formos ter comunhão com Deus e nos lembrarmos
de que nosso irmão tem alguma coisa contra nós (pelo contexto,
entendemos que essa “alguma coisa” citada no verso 23 se refere à
ira do verso anterior), se nesse momento nos lembrarmos de nosso
pecado, devemos parar o que estamos fazendo e, primeiro, nos re-
conciliarmos com nosso irmão. Somente depois, voltamos e fazemos
nossa oferta, pois antes de ofertar, precisamos ter a nossa consciência
limpa. Deus não permitirá que entremos em Sua presença sem que
haja essa reconciliação.
Na primeira parte do verso 25, lemos: “Entra em acordo sem
demora com o teu adversário, enquanto estás com ele a caminho”. Por-
tanto, a segunda condição é que devemos nos reconciliar com nosso
irmão enquanto estamos com ele a caminho, ou seja, enquanto nós
60 21 dias com Jesus no Monte

dois ainda estamos vivos. Precisamos entrar em acordo antes que


um de nós morra.
Todo pecado pode ser lavado pelo sangue de Jesus, contanto que
seja confessado e abandonado. Todavia, há aqueles que exigem re-
conciliação e até restituição, mas não podem mais ser completamen-
te resolvidos, pois pecamos contra alguém que já partiu para estar
com o Senhor. Obviamente, não temos como pedir perdão e ajustar
nossas contas, por isso tais pecados terão que ser julgados diante de
Deus. Assim como o clamor de Abel contra Caim chegou a Deus,
o clamor dessa pessoa estará diante do Senhor e seremos levados a
julgamento no “tribunal de Cristo” para sermos julgados por Deus.
Precisamos levar isso muito a sério, pois a Bíblia diz que “horrível
coisa é cair nas mãos do Deus vivo”. Alguns não têm temor de Deus
e pensam que Ele não se posiciona nem disciplina, mas não podemos
cometer esse erro. Nosso Deus é soberano e governa sobre tudo e
todos. Portanto, devemos entrar em acordo sem demora com nosso
irmão enquanto estamos a caminho, enquanto ainda estamos vivos
ou antes que Jesus volte. Como não sabemos quando morreremos
ou quando Jesus voltará, devemos resolver hoje.
Na segunda parte do verso 25, o Senhor completa: “para que o
adversário não te entregue ao juiz, o juiz, ao oficial de justiça, e sejas
recolhido à prisão. Em verdade te digo que não sairás dali, enquanto não
pagares o último centavo”. Isso significa que haverá um julgamento
das mínimas coisas que serão requeridas de nós. Por isso, tenhamos
uma vida correta diante de Deus, para que, naquele dia, possamos
receber elogios e não disciplina.
No dia do julgamento dos filhos de Deus, alguns serão elogiados
e outros disciplinados, pois não há nada que esteja escondido que
não venha a ser manifesto naquele dia, e o que fizemos em oculto
dentro da casa será proclamado nos telhados. Por isso, é melhor
confessarmos hoje os nossos pecados, porque naquele dia eles serão
expostos e julgados diante de todos. O julgamento será individual,
mas acontecerá publicamente. Assim, o elogio será dito em público,
A lei do Reino a respeito do homicídio – Mateus 5.21-26 61

mas a repreensão e a disciplina também. Elogio é algo bom, e fica


ainda melhor quando é feito diante de outras pessoas. Poder ouvir
Deus nos dizendo “servo bom e fiel” será a nossa glória, e ficará
registrado diante de todo o mundo que somos servos fiéis.
Estamos aqui para cumprir um propósito, um chamado divino.
Por isso, não podemos brincar, precisamos ter temor. Deus é Santo e
sem santidade ninguém verá o Senhor. Devemos ter temor de guar-
dar mágoa, de dar lugar à ira, de insultar nosso irmão, de proferir
palavras tolas que chegarão aos ouvidos de Deus. Antes de olharmos
para um lado e para o outro, para ver se alguém está vendo o que
estamos fazendo, devemos olhar para cima, pois Deus está olhando.
Todos prestaremos contas diante de Deus, por isso devemos entrar
em acordo com nosso adversário e resolver hoje o problema.
Muitos têm orado e pedido algo a Deus, mas nada tem aconte-
cido. Talvez esse seja o motivo. Não adianta tentar receber as coisas
de Deus sem fazer o que a Palavra diz!
Sabemos que a ilustração de ser entregue à prisão está relaciona-
da ao tribunal de Cristo, por ocasião de Sua volta (2Co 5.10; Rm
14.10). Todo crente será julgado e alguns serão disciplinados. Ser
lançado na prisão significa que não poderemos viver gloriosamente
como aqueles que seguem o Cordeiro onde quer que Ele vá (Ap
14.4). Não devemos deixar nenhuma questão para ser tratada na era
vindoura porque, então, as coisas serão muito mais sérias e difíceis.
6º Dia

A lei do Reino e o adultério


– Mateus 5.27-32

Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém,


vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com
intenção impura, no coração, já adulterou com ela. Se
o teu olho direito te faz tropeçar, arranca-o e lança-o de
ti; pois te convém que se perca um dos teus membros,
e não seja todo o teu corpo lançado no inferno. E, se a
tua mão direita te faz tropeçar, corta-a e lança-a de ti;
pois te convém que se perca um dos teus membros, e
não vá todo o teu corpo para o inferno. Também foi
dito: Aquele que repudiar sua mulher, dê-lhe carta de
divórcio. Eu, porém, vos digo: qualquer que repudiar
sua mulher, exceto em caso de relações sexuais ilícitas,
a expõe a tornar-se adúltera; e aquele que casar com a
repudiada comete adultério. (Mt 5.27-32)
O Senhor Jesus, ao conceder a constituição do Reino, não tinha
a intenção de revogar a lei do Velho Testamento, mas de cumpri-la.
E não apenas isso, Ele quis excedê-la. De acordo com o padrão dessa
64 21 dias com Jesus no Monte

nova lei, “qualquer que olhar para uma mulher, com intenção impu-
ra, já adulterou com ela”. Obviamente, é muito mais difícil cumprir
esse novo padrão, pois ele não trata somente do comportamento
exterior, mas principalmente da intenção do coração.

1. A respeito do adultério
a. Deus olha a intenção do coração
Quando Jesus diz “qualquer que olhar”, o que Ele condena não
são aqueles pensamentos repentinos e não intencionais que assaltam
nossa mente; antes, trata-se de algo intencional.
Nem todo pensamento que nos vem à mente é pecado, porque
há aqueles que nos assaltam independentemente da nossa vontade.
Certamente isto já ocorreu com todos nós: não queremos pensar em
algo, mas determinado pensamento insiste em vir à nossa mente.
Há um ditado muito verdadeiro que diz o seguinte: “Você não pode
impedir um pássaro de pousar em sua cabeça, mas pode impedi-lo
de fazer um ninho”.
Precisamos entender a diferença entre esses dois momentos. O
pássaro representa os pensamentos que vêm do diabo – neste caso,
pensamentos de lascívia e impureza – e não há como impedir que
eles pousem em nossa cabeça. Mas, assim que pousarem, devemos
enxotá-los, porque permitir que pássaros façam o ninho, isso sim,
já é uma escolha nossa.
Por não compreenderem isso, muitas pessoas desistem de sua
guerra contra o pecado e deixam que o inimigo produza derrota em
sua vida. Em meio à caminhada cristã, elas são surpreendidas por
algum pensamento impuro e dizem: “Ah! Agora já pequei mesmo,
então vou desistir”. Mas espere um pouco! Elas não pecaram ain-
da! Não é porque um pensamento impuro veio à mente que houve
pecado. O pecado é deixar que ele permaneça ali. Por isso, quando
pensamentos assim nos assaltam, o que temos de fazer é tomar o
controle de nossa mente e rejeitar aquela sugestão.
A lei do Reino e o adultério – Mateus 5.27-32 65

Ao contrário do que muitos presumem, é possível ter controle


sobre os pensamentos. Muitas pessoas imaginam que a mente é uma
parte meio descontrolada, que tem vida própria. Porém, assim como
temos controle sobre nossas mãos, nossos pés ou qualquer outro
membro do nosso corpo, podemos também manter nossa mente
sob controle. A mão não sai por aí batendo em todo mundo, nem
os pés saem andando por onde querem, fora de controle. Não é
assim que funciona com o corpo nem com a mente.
A verdade é que temos controle. O problema é que nem sempre
queremos exercê-lo. E por que não? Simplesmente porque concluí-
mos que é algo que não está causando mal a ninguém, pois acontece
apenas em nossa mente, é algo só nosso. Porém a preocupação do
Senhor não é apenas com a aparência, pois Deus elevou o padrão,
e agora Ele olha o coração. O temor agora não é mais de homens,
mas de Deus – Ele está vendo o que estamos pensando, todas as
maquinações de nossa mente.
A segunda coisa que o Senhor menciona é a intenção – essa é
uma palavra-chave neste texto. Intenção não é tentação, e sim um
estágio desta. Toda tentação passa por um processo que envolve
quatro estágios: atenção, instinto, desejo e, por último, intenção.
Portanto, a intenção é diferente da tentação, do desejo e do instinto.
Para entendermos melhor esses estágios, vamos usar uma ilus-
tração bem simples. Suponhamos que Deus tivesse dito que não
deveríamos comer pizza. Mas o diabo quer nos levar a pecar, então
ele coloca uma pizza perto de nós, bem bonita e cheirosa, e fica sus-
surrando em nossos ouvidos para olharmos aquela pizza e sentirmos
todo o seu aroma: o cheiro de queijo derretido com orégano, tomate,
etc. Seu primeiro alvo é chamar nossa atenção, depois, despertar
nossos instintos. E é o que acontece. Olhamos a pizza, sentimos o
cheiro, mas não saímos de perto. Nossa boca, então, se enche de
saliva, pois um instinto físico foi despertado e não temos controle
sobre ele. A glândula salivar produzirá saliva independentemente
de querermos ou não, pois isso acontece com todos os instintos
66 21 dias com Jesus no Monte

naturais de nosso corpo. Contudo, infelizmente, nesse momento


muitos concluem que já pecaram e desistem de lutar. Mas isso
não é verdade, pois o corpo foi despertado, mas ainda não houve
pecado. A ação do diabo pode ser cortada neste ponto. Podemos
simplesmente nos afastar da mesa onde está pizza e sair correndo,
pois esta é a melhor estratégia para vencer o pecado: correr dele
como fez José na casa de Potifar. O problema é que não corremos,
e o maligno, então, continua o processo da tentação.
Depois do instinto, o próximo estágio é o desejo. O diabo diz
para olharmos a pizza, chegarmos perto, pois ela pode ser nossa se
quisermos. Então, começamos a desejá-la e pensar o quanto que-
ríamos comer aquela pizza. Porém, ainda não pecamos, estamos à
beira do precipício e falta muito pouco para cairmos, mas estamos
apenas sendo tentados, e ser tentado não é pecado. Continuamos
tendo a chance de correr, mas já está mais difícil, pois as pernas já
estão meio fracas, não queremos mais correr e precisamos pedir
ajuda. O problema é que muitos desistem neste ponto, concluindo
que já pecaram. Porém, ser tentado não é cometer pecado. Algumas
vezes, a tentação é tão grande que sentimos os músculos pulando,
tamanho o desejo, mas podemos resistir ao pecado. Podemos resistir
à tentação simplesmente porque não há tentação além das nossas
forças (1Co 10.13).
Quando é que o desejo se torna pecado, então? Isso acontece
quando olhamos e dizemos para nós mesmos: “Vou comer essa
pizza”. Então andamos em direção à pizza com a “intenção” de
comê-la. E mesmo que, no meio do caminho, apareça um irmão e
fiquemos constrangidos em continuar a fazer o que pretendíamos,
já pecamos, pois tínhamos a intenção, já saímos com destino cer-
to, premeditadamente com a intenção de comer a pizza. Se houver
intenção, já houve o pecado.
Para Deus o que vale é a intenção. Se alguém saiu de casa para
matar alguém, mas não matou porque a bala falhou, ou porque
não soube usar a arma, ou não encontrou a vítima, para Deus, ele
A lei do Reino e o adultério – Mateus 5.27-32 67

já matou. Aquele que já saiu de casa para ir a um motel com al-


guém, mas furou o pneu do carro, esqueceu o dinheiro em casa ou
aconteceu algum impedimento no meio do caminho, para Deus,
já pecou. O que Deus olha é a intenção.
Existe uma sequência da tentação e, se a alimentarmos, acaba-
remos nos queimando. Não se brinca com fogo.

b. Precisamos ser radicais com o pecado (v.29)


Naturalmente, o Senhor não deseja que nos mutilemos, mas Ele
usa uma ilustração forte para mostrar o quanto devemos ser radicais
com aquilo que nos leva a pecar. Precisamos pagar o preço sendo
radicais no que se refere à santidade e à pureza.
Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a
morte; mas, se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do
corpo, certamente, vivereis. (Rm 8.13)
Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prosti-
tuição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a
avareza, que é idolatria; por estas coisas é que vem a
ira de Deus sobre os filhos da desobediência. (Cl 3.5,6)
Se um amigo me faz pecar, eu abandonarei tal amizade, porque
é melhor ir para o céu sem o amigo do que ir para o inferno com
ele. Se a banca de revista me faz pecar, eu não entrarei mais em uma
banca; se um namorado me faz pecar, eu terminarei o namoro, e
assim por diante.
Será que o Senhor está querendo que cortemos os braços, as per-
nas, arranquemos os olhos ou até que sejamos castrados? Será que
o Senhor está falando literalmente aqui? Mutilação física seria um
caminho para a santidade? Não! Deus não quer que nos mutilemos.
Ele está usando uma ilustração para mostrar o quanto devemos ser
radicais com tudo o que nos leva a pecar – sejam pessoas, situações,
locais etc. Seja lá o que nos fizer pecar, devemos cortar de nossa vida,
pois não se brinca com o pecado.
68 21 dias com Jesus no Monte

Muitas vezes, não rompemos um relacionamento que está nos


afastando de Deus por temermos ofender a pessoa. Porém, convém
mais agradar a Deus, e é melhor ofender a pessoa do que a Deus,
pecando contra Ele.
Existem coisas que são preciosas para nós, e queremos muito ficar
com elas, mas o Senhor nos diz para pagarmos o preço da santidade,
pois a pureza tem um preço. Muitos não conseguem praticar isso,
porque ainda não foram libertos. Esta palavra não é para alguém
que nunca recebeu e confessou Jesus como seu Senhor e Salvador.
Para viver nesse padrão, é preciso primeiro ter um poder especial
dentro de si, o poder que temos pelo Espírito Santo de Deus. É Ele
quem nos capacita. Se o Espírito Santo ainda não habita em nós,
não há como vencermos o pecado, porque isso está além da força
e da capacidade humana.
O Senhor está mostrando que o padrão do Reino é este – a
santidade –, e ele tem um preço. Deus está olhando o íntimo do
coração e não o exterior. Evidentemente, Deus olha para a intenção
do coração, mas é claro que as consequências da consumação do ato
são muito maiores. Diante de Deus, basta a intenção, mas diante dos
homens, os atos têm consequências. Ao guardarmos nosso coração,
seremos também guardados das terríveis consequências do pecado.
Certa vez, aconselhei uma moça que contraiu o vírus HIV numa
única relação sexual. Ela tinha 22 anos e era virgem, mas resolveu
ceder à tentação de ter um contato físico mais íntimo com seu na-
morado. O resultado é que, lamentavelmente, ela contraiu o vírus, e
agora só Deus pode curá-la. Nada disso precisaria ter acontecido. O
ato pecaminoso tem consequências e Deus quer nos guardar delas.
É bom lembrarmos que o sexo não é pecado; o que é pecado
é o sexo na hora errada com a pessoa errada. A Palavra do Senhor
tem padrões para a vida sexual, que é para ser vivida no casamento,
debaixo de uma aliança. Todo contato sexual produz uma marca
na vida, na alma da pessoa. Cada homem que se aproveita de uma
mulher, que a usa apenas para satisfazer seus desejos egoístas, produz
A lei do Reino e o adultério – Mateus 5.27-32 69

marcas em sua vida que ela talvez jamais assumirá para ninguém.
Mas o ato sexual é algo tão íntimo que, quando usado indevidamen-
te, machuca e deixa sequelas. Nenhuma mulher ou homem sai do
ato sexual como entrou, pois vínculos espirituais são estabelecidos.
Deus quer o melhor para nós, e a vontade dEle para nós é a pureza
e a santidade.

2. A respeito do divórcio (vv. 31,32)


As leis que dizem respeito ao homicídio e adultério foram am-
pliadas, mas as que tratam do divórcio, do juramento, de resistir ao
perverso e de amar nosso inimigo foram todas mudadas.
O Senhor tornou a lei do Reino excedente. Por exemplo: não
matar tornou-se não se irar; não adulterar tornou-se não olhar com
intenção impura. Contudo, esta lei Jesus mudou. A lei de Moisés
dizia que qualquer homem que quisesse repudiar sua mulher, des-
se a ela a carta de divórcio. O Senhor, porém, disse que “qualquer
que repudiar sua mulher, exceto em caso de relações sexuais ilícitas,
a expõe a tornar-se adúltera; e aquele que casar com a repudiada
comete adultério” (Mt 5.32). O divórcio não é o padrão de Deus,
não é o que está no coração dEle. Na verdade, Jesus nem está aqui
homologando o divórcio, mas dizendo que a pessoa que caiu em
adultério já quebrou a aliança do casamento, então, o divórcio pode
acontecer. Existe uma tolerância ao divórcio pelo simples motivo de
que algumas pessoas são promíscuas e infiéis, outras são violentas
ou vivem dominadas por vícios diversos. Em casos assim, o divórcio
pode ocorrer.
Nesse ponto, Jesus nos mostra qual era a verdadeira intenção de
Deus quanto ao casamento desde o princípio. Deus criou uma mu-
lher para um homem e, ao se tornarem uma só carne, não deveria
haver retorno. O Senhor não homologa o divórcio. Casamento não
é brincadeira. No capítulo 19, Jesus explica em detalhes:
Então, respondeu ele: Não tendes lido que o Criador,
desde o princípio, os fez homem e mulher e que disse:
70 21 dias com Jesus no Monte

Por esta causa deixará o homem pai e mãe e se unirá


a sua mulher, tornando-se os dois uma só carne? De
modo que já não são mais dois, porém uma só carne.
Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.
Replicaram-lhe: Por que mandou, então, Moisés dar
carta de divórcio e repudiar? Respondeu-lhes Jesus:
Por causa da dureza do vosso coração é que Moisés vos
permitiu repudiar vossa mulher; entretanto, não foi
assim desde o princípio. (Mt 19.4-8)
Os judeus haviam desenvolvido o divórcio ao ponto que um
homem podia divorciar-se de sua esposa por motivos fúteis, como
não ser uma boa cozinheira. Mas Jesus mostra a seriedade do casa-
mento e sua indissolubilidade.
Perguntaram a Jesus se Deus havia mudado de ideia, uma vez
que havia permitido o divórcio na época de Moisés, e agora o Se-
nhor lhes dizia que não podiam mais se divorciar. Então, o Senhor
lhes respondeu que Deus não mudou de ideia, porque não foi as-
sim desde o princípio. Deus não quis o divórcio em época alguma,
mas porque eles eram tão duros de coração, tinham um coração de
pedra, Deus abriu uma concessão. Contudo, a partir de então, Ele
estava lá para trocar esse coração, tirar o coração de pedra e colocar
no lugar um coração de carne, por isso, não precisariam mais se
preocupar, porque o divórcio não era mais necessário. Até mesmo
em caso de adultério, a vontade de Deus não é o divórcio, ainda que
Ele o permita. Mesmo quando há traição, não é Sua vontade que o
divórcio aconteça, e sim que haja perdão. A concessão do divórcio
não é maior que a lei do perdão. Todos podem ser perdoados.
O divórcio só é aceito se um dos cônjuges cometer adultério e
não se arrepender, mas continuar na prática do pecado. Caso haja
arrependimento, o princípio maior é o do perdão e da reconciliação
(Lc 17.3,4; Mt 6.14,15).
Se o cônjuge traído perdoar, mas o outro não mudar de compor-
tamento, a separação pode acontecer. Mas se o que aconteceu foi um
A lei do Reino e o adultério – Mateus 5.27-32 71

acidente, um episódio único, e o cônjuge que traiu se arrependeu e


nunca mais fez isso de novo, o melhor é o perdão e a reconciliação
para manter o casamento. O Senhor diz que, no princípio, quando
Deus criou o homem, Ele criou um homem para uma mulher. Por-
tanto, o casamento não foi inventado pelo homem, mas por Deus;
ele é uma instituição divina.

a. Somente em caso de adultério


O Senhor deixou a possibilidade do divórcio em caso de adulté-
rio. Devemos observar que a lei do perdão é superior, e a parte que
ofendeu deve ser perdoada. Contudo, se não houve arrependimento
nem abandono do pecado, o divórcio é permitido. Todavia, deve
ficar bem claro que não foi aberta a possibilidade para um segundo
casamento. O divórcio pode acontecer quando o cônjuge se torna
promíscuo, mas não há segundo casamento.
Paulo é muito claro quando diz: “Ora, aos casados, ordeno, não
eu, mas o Senhor, que a mulher não se separe do marido (se, porém, ela
vier a separar-se, que não se case ou que se reconcilie com seu marido);
e que o marido não se aparte de sua mulher” (1Co 7.10,11).
Os filhos de Deus jamais deveriam se divorciar. Por isso os sol-
teiros devem ser muito cautelosos quando forem se casar, sem se
deixarem ser motivados por meros desejos ou romantismo, mas
estando certos da aprovação do Senhor.
Há um ditado que diz que “o amor é cego, mas o casamento
abre os olhos”. Contudo, precisamos mudá-lo. Na verdade, antes
do casamento devemos ter os olhos bem abertos e considerar toda
a situação detalhadamente, mas depois de casados, precisamos ser
“cegos” para os defeitos e deficiências de nosso cônjuge, conside-
rando-o o melhor cônjuge do mundo.
7º Dia

A lei do Reino e o juramento


– Mateus 5.33-37

Também ouvistes que foi dito aos antigos: Não jurarás


falso, mas cumprirás rigorosamente para com o Senhor
os teus juramentos. Eu, porém, vos digo: de modo
algum jureis; nem pelo céu, por ser o trono de Deus;
nem pela terra, por ser estrado de seus pés; nem por
Jerusalém, por ser cidade do grande Rei; nem jures pela
tua cabeça, porque não podes tornar um cabelo branco
ou preto. Seja, porém, a tua palavra: Sim, sim; não,
não. O que disto passar vem do maligno. (Mt 5.33-37)
Até este ponto o Senhor Jesus não estava mudando, mas am-
pliando a Lei. A lei de Moisés dizia: “Ouviste o que foi dito, não
matarás...”, mas Ele declarou: “Eu porém vos digo, qualquer que se
irar...” Na verdade, Jesus estava colocando a nova lei num padrão
muito mais excelente. Ele não anulou o não matarás, apenas o co-
locou em um patamar superior. A Lei dizia: “Não adulterarás...”,
mas o Senhor acrescentou: “Eu porém vos digo, qualquer que olhar
para uma mulher com intenção impura, já adulterou com ela”. Ele
74 21 dias com Jesus no Monte

também não anulou nem alterou o mandamento da lei que dizia


para não adulterar, apenas o colocou num padrão mais alto.
Contudo, na questão do juramento, vemos o Senhor Jesus
mudando algo. Ele disse: “Também ouvistes que foi dito aos antigos:
Não jurarás falso, mas cumprirás rigorosamente para com o Senhor
os teus juramentos. Eu, porém, vos digo: de modo algum jureis”.
Certamente, o que está sob a mira do Senhor Jesus é a questão da
mentira. Por causa da mentira, tornou-se necessário o juramento,
mas na comunidade do Reino, a sinceridade e a verdade tornaram
o juramento desnecessário.
Sabemos que o diabo é o pai da mentira, e nós agora somos ci-
dadãos do reino de Deus e não temos mais a mentira como hábito
em nossa vida. Ela não faz mais parte dos nossos relacionamentos.
Somos sinceros e honestos. Nossa palavra é simples: é sim, sim, não,
não; o que passar disso é coisa do maligno.
Há alguns anos, dois pesquisadores entrevistaram milhares de
pessoas e publicaram suas descobertas em um livro chamado O dia
em que a América disse a verdade. Dos entrevistados, 91% disseram
que mentem com frequência; 86% disseram que mentem para os
pais regularmente; 75% disseram que mentem para os amigos;
69% disseram que mentem para os cônjuges e 50% disseram que
frequentemente mentem que estão doentes quando são convoca-
dos pelo chefe para trabalharem. Diante de um quadro assim, não
é de admirar que as pessoas usem o recurso do juramento para dar
credibilidade a suas palavras.
Uma agência de propaganda fez uma pesquisa para saber sobre
o que as pessoas mais mentem. Em primeiro lugar ficou o peso,
em segundo lugar ficou a renda e, em terceiro, a idade. Mas o mais
intrigante nessa pesquisa foi o fato de as pessoas não se importarem
com a mentira. É algo que aceitamos. Não nos incomoda. Não fi-
camos mais chateados quando alguém exagera, falsifica, fabrica ou
distorce a verdade.
A lei do Reino e o juramento – Mateus 5.33-37 75

Ainda hoje as pessoas usam juramento como forma de atestar


aquilo que estão dizendo, mas na verdade, o juramento só com-
prova nossa falta de credibilidade. O fato de ter que acompanhar
uma afirmação com uma frase do tipo “eu juro por tudo o que é
mais sagrado”, ou “eu juro pela Bíblia Sagrada”, ou “eu juro por
Deus! Pode cair um raio na minha cabeça”, somente mostra que
nossa palavra não é digna de confiança. O juramento é uma con-
fissão patética de nossa desonestidade. Por que achamos necessário
introduzir nossas promessas com alguma fórmula de impacto como
“eu juro por tudo o que é mais sagrado”? O único motivo é porque
sabemos que as nossas simples palavras não são dignas de crédito.
O juramento só demonstra nossa falta de credibilidade e que
nossa palavra não tem valor algum. Mas as pessoas pensam que, fa-
zendo um juramento, darão maior peso a ela. Contudo, ao contrário,
estão mostrando de fato que sua palavra não tem peso nem valor.
Alguns tomam o ensino de Jesus sem compreender o espírito
do que Ele está dizendo. A ideia é que não devemos rechear nossas
afirmações e promessas com juramentos tolos que trarão maldições
sobre nós caso não os cumpramos. Mas, por causa dessa ordenança,
alguns se recusam a fazer juramentos em formaturas e até mesmo
diante do juiz. Essas são situações solenes que exigem uma palavra
a mais, não para aumentar a credibilidade, mas por causa do peso
e da seriedade do que se está fazendo. Sei que para a maioria das
pessoas uma cerimônia de formatura não tem sentido algum, mas
na verdade, para Deus todo juramento tem valor. Uma cerimônia de
formatura é o momento em que as pessoas começam uma carreira
profissional. Erguer a mão e fazer um juramento ali não é errado
nem pecaminoso. O alvo do Senhor é remover os juramentos dos
nossos relacionamentos pessoais, pois quem faz juramento a todo
instante, em toda circunstância, faz algo abominável diante de Deus.
Outra situação quando fazemos juramento é no casamento.
Quando os noivos estão diante da igreja fazendo uma aliança, eles
fazem um juramento, são juras de amor, votos de amor eterno.
76 21 dias com Jesus no Monte

Isso é feito para mostrar a seriedade e a solenidade do casamento,


portanto, não é algo errado.
Os juramentos estão intimamente relacionados com os votos.
A vontade de Deus é que não juremos ou façamos votos, mas, se
os fizermos, naturalmente deveremos cumpri-los à risca. Jesus não
quis proibir totalmente o juramento, mas ele deve ser usado apenas
em situações públicas e solenes. Nesse sentido, o juramento de um
formando ou dos noivos em um casamento é válido.
Quando um homem fizer voto ao SENHOR ou
juramento para obrigar-se a alguma abstinência, não
violará a sua palavra; segundo tudo o que prometeu,
fará. (Nm 30.2)
Em Deuteronômio lemos que quando fizermos algum voto ao
Senhor, não devemos demorar a cumprir.
Quando fizeres algum voto ao SENHOR, teu Deus,
não tardarás em cumpri-lo; porque o SENHOR, teu
Deus, certamente, o requererá de ti, e em ti haverá
pecado. (Dt 23.21)
Muitas pessoas têm feito votos a Deus na igreja. É comum ou-
virmos alguém dizendo que está desempregado, e se o Senhor lhe
abrir uma porta de emprego, dará o primeiro salário como oferta
a Ele. Contudo, a porta se abre, o emprego vem, a pessoa recebe o
primeiro salário, mas simplesmente se esquece de dar a oferta. Ela
ficou desempregada por muito tempo, muitas dívidas se acumula-
ram, e agora ela não pode dar um salário inteiro. Por isso é melhor
que não se faça voto com Deus. Não precisamos fazer voto algum
para Deus nos ouvir, não temos que fazer barganha com Ele. Para
que o Senhor atenda nossa oração, basta pedirmos. Jesus disse que
“todo o que pede, recebe”. Essa é a promessa do Senhor; não temos
que fazer voto algum.
A lei do Reino e o juramento – Mateus 5.33-37 77

Conta-se que um rico empresário jazia em seu leito de morte. Seu


pastor veio visitá-lo e lhe falou sobre o poder de cura de Deus, e orou
por ele. Quando o pastor terminou sua oração, o empresário disse:
— Pastor, se Deus me curar, vou doar um milhão de reais para
a igreja.
Milagrosamente, o empresário ficou melhor e, dentro de poucas
semanas, saiu do hospital. Vários meses depois, o pastor se deparou
com o empresário na calçada e disse:
— Sabe, quando você estava morrendo no hospital, prometeu
dar à igreja uma oferta de um milhão de reais caso fosse curado.
Até o momento ainda não recebemos a oferta.
— Eu disse isso? — respondeu o empresário. — Acho que isso
mostra o quanto eu realmente estava doente!
Mas o que fazer quando alguém faz um voto sem pensar? Agora
é tarde demais, não há retratação de votos diante de Deus. Uma vez
comprometido, está obrigado pelo que falou e não há retratação. É
por isso que o Senhor disse para não jurarmos nem fazermos votos.
Um voto não cumprido é espaço para o diabo em nossa vida.
Fazer um voto não é necessariamente pecado, porque o próprio
Deus fez juramentos. Em Hebreus 6.1-6, lemos que Deus, que-
rendo fazer uma aliança e não tendo ninguém superior por quem
jurar, jurou por si mesmo. Quando Ele fez aliança com Abraão,
Ele mesmo fez o juramento. Se o próprio Deus fez um juramento,
deduzimos que não seja errado nem pecado fazê-lo, entretanto, se
o fazemos de maneira precipitada, nisso pecamos.
Pessoas que fazem juramento o tempo todo tomam o nome de
Deus em vão, o que é muito sério. Uma das razões para não fazer-
mos juramentos é porque jurar é tomar o nome de Deus em vão.
Quando alguém diz: “Juro por Deus”, está pecando contra Deus
ao tomar o Seu nome em vão. Precisamos ter cuidado com o nome
do “Senhor Jesus Cristo”, com expressões e palavra santas. Não
78 21 dias com Jesus no Monte

devemos transformá-las em gírias tolas, levianas e sem sentido, mas


pronunciá-las apenas quando for algo absolutamente sério.
Por causa da leviandade dos juramentos, nossas palavras, afirma-
ções e promessas vão perdendo o valor com o tempo. Essa é a causa
por que muitos não têm autoridade espiritual. Nossa autoridade
está baseada em nossa vida de oração, mas está muito mais baseada
em nossa retidão. Se formos pessoas que quando dizem sim é sim,
o diabo nos respeitará, mas se nosso sim quer dizer talvez ou mais
ou menos, o diabo não nos respeitará, pois nossa vida é incoerente.
Jesus mostrou que não precisamos mais fazer votos ou juramen-
tos, pelos seguintes motivos:

a. Não temos o controle de coisa alguma


Não devemos jurar pelos céus nem pela terra porque eles não são
nossos. Não devemos jurar nem mesmo pela nossa cabeça, porque
não podemos tornar um cabelo branco ou preto. Nada disso está
sob o nosso controle. Não somos ninguém nem controlamos nada.
Não possuímos o controle de nada, portanto, não temos poder
nem autoridade para jurar sobre coisa alguma, pois não podemos
controlar nenhuma circunstância ou situação.

b. Nossas palavras devem ser poucas e simples


O Senhor disse que nossas palavras devem ser simples e claras:
sim, sim e não, não. Os mentirosos são muito falantes, cheios de
razões e desculpas, mas o que fala a verdade é simples e breve.
O grande problema está em tentar provar aquilo que afirmamos.
Sempre que dizemos algo e as pessoas insistem em nos pedir provas
do que falamos, estamos entrando em terreno minado. A partir desse
ponto, o que vier é do maligno e não de Deus. O desconfiado que
exige provas e juramentos não é digno de confiança, nem aquele
que fala demais tentando convencer os outros com muitas palavras.
Precisamos ser simples e confiantes no “sim” e no “não” que nos é
A lei do Reino e o juramento – Mateus 5.33-37 79

dito. O Senhor ainda diz, como lemos no verso 37, “Seja, porém, a
tua palavra: Sim, sim; não, não. O que disto passar vem do maligno”.
Tomemos o casamento como exemplo. Suponhamos que a es-
posa comece a ter desconfianças, a apresentar um comportamento
meio paranóico, e passe a ter ciúmes do marido. Quando ela lhe
pergunta se ele a ama, o marido responde que sim, mas ela lhe
pede que prove seu amor. No momento em que ela pede a prova,
um demônio entra no casamento. Tudo porque foi além do sim.
O marido já havia dito que a amava, e isso deveria ser suficiente,
mas ela nunca achava que era o bastante, sempre queria algo mais.
Assim, todas as vezes que queremos algo além do sim e do não em
nosso casamento, o diabo tem espaço para entrar.
Certa vez, alguém disse que o ponto de interrogação é uma
serpente se contorcendo. Toda vez que duvidamos da palavra do
outro e exigimos algo mais, o diabo entra em cena. Isso sempre
acontece quando pedimos que alguém prove ou jure. É por isso que
expulsamos demônio o tempo todo e parece que nunca vencemos
o diabo. O casamento continua mal e não entendemos onde está o
problema. Precisamos fechar as brechas por onde a serpente entra.
E fazemos isso praticando o que a Palavra de Deus diz, incluindo
fazer com que nossa palavra seja simples, seja sim, sim e não, não.
Não acrescentando algo mais.
Pessoas que não acreditam em nosso sim e em nosso não, que-
rem nos forçar a falar além do que precisamos. Mas aquelas que
são verdadeiras são simples e diretas. Quanto mais mentirosa, mais
conversadora; quando alguém está mentindo, sempre fala muito.
Há algum tempo vi uma encenação muito interessante mostran-
do como a verdade é, algumas vezes, inacreditável. A ideia é mostrar
como é difícil acreditar na verdade e mais fácil crer em uma mentira.
A situação era a seguinte:
Um casal estava em seu carro e, ao mexer no porta-luvas, a esposa
encontrou uma roupa íntima feminina. Já imaginando mil coisas,
80 21 dias com Jesus no Monte

ela perguntou ao marido como aquilo tinha ido parar lá. O marido
não sabia e, então, devolveu a pergunta para a esposa. Ela, certa de
que ele estava se fazendo de desentendido, insiste em saber o que
era aquilo. Ele continuava negando, dizendo que de fato não sabia
de onde aquela peça havia vindo. Mas, para a esposa desconfiada,
aquele “não sei” era muito pouco. Nesse momento, a cena voltava
ao início, com a mulher abrindo o porta-luvas e encontrando a
roupa íntima. E o marido, agora mentindo dizia:
— Olha, amor, isso aí é o seguinte: dei carona para uma colega
de trabalho e ela estava com uma sacola muito grande. Quando ela
foi entrar no carro, a sacola se rasgou e ela deixou cair essa roupa.
Porém, eu só vi depois que ela saiu, então, peguei a peça e coloquei
no porta-luvas para me lembrar de entregar a ela depois.
E a esposa acreditou, porque foi uma mentira plausível, muito
mais fácil de acreditar do que na verdade. As pessoas querem acre-
ditar em algo, por isso existe a mentira. Se for apenas o sim e o não,
isso não serve, é muito simples, é muito pouco. Devemos nos lem-
brar, porém, que somos o povo do sim e do não. E isso deve bastar.
8º Dia

A lei do Reino a
respeito do perverso
– Mateus 5.38-48

Ouvistes que foi dito: Olho por olho, dente por dente.
Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso; mas, a
qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também
a outra; e, ao que quer demandar contigo e tirar-te a
túnica, deixa-lhe também a capa. Se alguém te obrigar a
andar uma milha, vai com ele duas. Dá a quem te pede
e não voltes as costas ao que deseja que lhe emprestes.
Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás
o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai os vossos
inimigos e orai pelos que vos perseguem; para que vos
torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer
o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos
e injustos. Porque, se amardes os que vos amam, que
recompensa tendes? Não fazem os publicanos também
o mesmo? E, se saudardes somente os vossos irmãos,
que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o
82 21 dias com Jesus no Monte

mesmo? Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o


vosso Pai celeste. (Mt 5.38-48)

1. Com respeito a resistir ao perverso (vv. 38-42)


Esta foi mais uma lei mudada pelo Senhor. O preceito anterior
era olho por olho e dente por dente. Mas a nova lei é não resistir
ao perverso.
Naturalmente, o princípio da lei chamado “lei de talião” era jus-
to e foi aplicado por Jesus em outras partes do Sermão do Monte,
como quando Ele disse para não julgarmos a fim de não sermos
julgados. Embora esse preceito ainda seja válido nos tribunais, ele
não pode reger nossas relações pessoais.
O que o Senhor trata aqui é do revide e da vingança. Por esse
trecho das Escrituras, o Filho de Deus e o Sermão do Monte têm
sido tão exaltados. Mas também por esses mesmos versículos, muitos
têm desistido do caminho da fé por não conseguirem entender o
significado desses versos. Consideram-nos tão profundos, tão ele-
vados e tão difíceis que acreditam não se aplicarem a eles.
Nesse texto, assim como fez a respeito do juramento, Jesus está
falando sobre algo mais elevado. A ênfase do Senhor Jesus é na
questão da vingança. É o sentimento mais básico e mais sutil que
assola o nosso coração, pois a vingança se baseia no senso de justiça
interior. Há um sentimento de justiça e há também um espírito
maligno de justiça. Mas, existe um sentimento de justiça maligno?
Sim, um sentimento que não produz justiça de Deus, mas que
produz a vingança e, com ela, uma espiral crescente de violência.
Violência sempre atrai vingança, e vingança sempre atrai violência.
Esse mecanismo nunca cessa! Sempre terá alguém desejando vingar-
-se de quem agiu com violência.
Em Romanos 12, Paulo retoma esse mesmo ensino e coloca a
situação de forma mais dramática e mais fácil de compreendermos
o que Jesus tinha em mente a respeito do assunto.
A lei do Reino a respeito do perverso – Mateus 5.38-48 83

Não torneis a ninguém mal por mal; esforçai-vos por fa-


zer o bem perante todos os homens; se possível, quanto
depender de vós, tende paz com todos os homens; não
vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira;
porque está escrito: A mim me pertence a vingança; eu
é que retribuirei, diz o Senhor. Pelo contrário, se o teu
inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-
-lhe de beber; porque, fazendo isto, amontoarás brasas
vivas sobre a sua cabeça. Não te deixes vencer do mal,
mas vence o mal com o bem. (Rm 12.17-21)
Não estamos entre aqueles que pagam o mal com o mal. Alguém
disse uma grande verdade: “Pagar o bem com o mal é maligno. Pagar
o bem com outro bem é apenas humano, mas pagar o mal com o
bem é divino, e somente os filhos de Deus são capazes de fazê-lo”.
O Sermão do Monte não foi escrito para as pessoas do mundo.
O Evangelho de Deus não é para este mundo. Ele não funciona
para as pessoas deste mundo porque é impossível ser praticado pelo
esforço humano. Para isso, precisamos de um poder especial do Es-
pírito Santo. O Sermão do Monte, ou o Evangelho do Reino, foi
escrito para aqueles que se tornaram filhos de Deus, que nasceram
de novo e agora são capazes de praticar a Palavra de Deus, e ela diz:
“Não torneis a ninguém mal por mal. Esforçai por fazer o bem pe-
rante todos os homens, se possível quanto depender de vós, tende
paz com todos os homens. Não vos vingueis de vós mesmos, mas
dai lugar a ira (de Deus)”.
Em sua primeira epístola, Pedro retomou esse assunto:
Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que
também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos
exemplo para seguirdes os seus passos, o qual não co-
meteu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca;
pois ele, quando ultrajado, não revidava com ultraje;
quando maltratado, não fazia ameaças, mas entregava-se
àquele que julga retamente. (1Pe 2.21-23)
84 21 dias com Jesus no Monte

Nós somos filhos do Rei e fomos criados para ter um compor-


tamento nobre, não medíocre ou mesquinho. O comportamento
daqueles que não são nobres é baseado em seu orgulho e em seu
ego. Eles não suportam ficar em débito com alguém, ou que qual-
quer pessoa fique em débito com eles. Não toleram ser maltratados,
pois não podem se sentir inferiores. Por isto revidam, para não se
sentirem inferiores em relação ao outro. Quando alguém lhes faz o
bem, imediatamente retribuem o bem recebido. Não porque sejam
nobres, mas porque não desejam nem aceitam ficar em débito com
alguém. Esse é o padrão do mundo, e jamais deve acontecer entre
aqueles que vivem no reino de Deus, na Igreja do Senhor. Fomos
transportados para o reino da luz, e nesse reino tudo funciona de
maneira muito diferente.
Sabemos o que foi dito: “...darás vida por vida, olho por olho,
dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura,
ferimento por ferimento, golpe por golpe” (Ex 21.23-25). Mas também
sabemos que Deus não prescreveu essa lei no Antigo Testamento
para homologar a vingança, pois esse não é o padrão dEle. O Senhor
fez isso apenas para limitar e impedir que uma pessoa cometesse
um erro e fosse punida além do que seria devido ou justo. Assim, se
alguém ferisse o olho de outra pessoa, não poderia receber a morte
como punição; ele teria seu próprio olho ferido. Por outro lado,
também não se podia apenas furar o olho daquele que matou um
homem. A pena deveria ser proporcional ao crime: olho por olho
e vida por vida. Se alguém quebrasse o dente de um homem, ele
teria seu próprio dente quebrado, não poderia ser morto por causa
de um dente. A lei de Moisés apenas estabelecia uma relação justa
entre o crime e sua punição.

a. Ao que bater numa face


Eu porém vos digo: não resistais ao perverso: mas, a qualquer
que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra. (Mt 5.39)
A lei do Reino a respeito do perverso – Mateus 5.38-48 85

A atitude mais injuriosa e insultante que poderia acontecer a um


oriental era alguém lhe dar um tapa no rosto. Essa era a suprema
ofensa, talvez semelhante ao ato de cuspir no rosto de um de nós
hoje. O fato em questão não era exatamente o dano físico, mas o ex-
tremo insulto da honra que um tapa no rosto causava a um homem.
Como cidadãos do Reino, não retribuímos um insulto com outro
insulto. Uma pessoa nascida de novo é capaz de suportar quantos
insultos vier a sofrer. Jamais revidaremos na medida daquele que
nos ofende, porque somos nobres. Não devemos nos nivelar pelo
padrão rasteiro daqueles que ainda estão nas trevas, mas andar no
padrão daqueles que estão no reino da luz.
Certa vez ouvi uma história que me chamou a atenção:
Um pregador sempre pregava em uma praça, mas as pessoas
nunca se convertiam. Então alguém lhe perguntou por que ele não
parava de pregar, pois estava claro que as pessoas não queriam mudar
de vida. Ao que ele respondeu:
— Sabe por que não paro de pregar? Porque no dia em que eu
parar de pregar, isso vai significar que as pessoas é que terão con-
seguido me mudar.
Sabe por que pregamos? Porque há uma ética que não é daqui
– ela está acima do que é humano, é sobrenatural. Para praticar
tal ética, é necessário possuir uma nobreza celestial, é preciso ser
filho de Deus. O Senhor nos chamou para a nobreza e não deseja
que revidemos mal por mal. Quando alguém nos insulta, devemos
colocar brasas vivas sobre sua cabeça, não pagar na mesma moeda.
Essa palavra não está se referindo aos covardes que, de tão me-
drosos, não conseguem revidar uma ofensa física. Não é uma ques-
tão de passividade, mas um reflexo da grandeza da dignidade que
os filhos de Deus devem possuir. Fazemos isso por acreditar num
padrão de vida superior.
86 21 dias com Jesus no Monte

Jesus usou três ilustrações para mostrar a aplicação desse prin-


cípio na vida prática, e no exemplo da bofetada, a ênfase não está
na violência, mas na forma insultuosa como a pessoa foi tratada.
Jesus ensina que um discípulo aceita um insulto após o outro sem
revidar com injúrias. A força de um homem não é medida pelo
que ele é capaz de fazer, mas pelo que ele é capaz de suportar. Dar
a outra face é algo que deve vir de dentro e não ser fruto de algum
medo ou covardia.

b. Ao que demandar contigo


...e, ao que quer demandar contigo e tirar-te a túnica,
deixa-lhe também a capa. (Mt 5.40)
Ao usar a ilustração da túnica, a ênfase aqui é a demanda. Jesus
diz que nesse caso seus discípulos não reagirão com violência contra
aqueles que, sem direito, reclamam nos tribunais a posse do que
lhes pertence.
Em I Coríntios, Paulo diz que dentro da igreja devemos até
mesmo sofrer o dano e o prejuízo.
O só existir entre vós demandas já é completa derrota
para vós outros. Por que não sofreis, antes, a injustiça?
Por que não sofreis, antes, o dano? (1Co 6.7)
Jesus está tratando de questões dentro do contexto da igreja.
Portanto, dentro do reino de Deus, nosso padrão é sofrer o preju-
ízo. No mundo existem governos, Estados, e toda desavença deve
ser resolvida nos tribunais. Esse é o padrão para nossas demandas
com pessoas lá fora. Mas não é assim dentro do reino de Deus. Na
igreja, as demandas entre os irmãos não devem ser resolvidas nos
tribunais, nem devemos resolver as desavenças insultando uns aos
outros. Não resolvemos as coisas de maneira mesquinha ou medío-
cre. Entre o povo de Deus, as questões são resolvidas com nobreza e,
se for necessário para o bem do Reino, devemos nos dispor a sofrer
o dano e o prejuízo.
A lei do Reino a respeito do perverso – Mateus 5.38-48 87

Isso pode até parecer loucura, mas é exatamente o padrão que


Jesus ensinou. Infelizmente, no Brasil, os evangélicos transformaram
o cristianismo em algo pequeno e rasteiro. Ninguém fala da profun-
didade do padrão do Novo Testamento. As pessoas estão interessadas
apenas na conquista de bênçãos. Amam falar da prosperidade e de
ganhar dinheiro, mas ninguém fala da ética dos relacionamentos
segundo o padrão do Reino.
Dentro da igreja, as pessoas não falam do altíssimo padrão do
reino de Deus. Não falam da maneira de lidar com o dinheiro,
nem relacionam Deus e Seu padrão aos próprios negócios. Não são
sensíveis ao Espírito Santo quanto ao trato nos relacionamentos e
muito menos valorizam um padrão de vida cristã elevado. Assim,
transformamos o evangelho em algo barato – talvez porque quei-
ramos atrair as pessoas diminuindo o preço desse evangelho, mas
esse é um tremendo engano. Deus não mudou o evangelho. Esse é o
evangelho do Reino, é a constituição do reino de Deus, é a maneira
de vivermos, é o padrão de vida que Deus espera de nós.

c. Se alguém te obrigar
Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele
duas. (Mt 5.41)
A questão abordada é quando uma autoridade nos obriga a fazer
um trabalho ou serviço forçado.
Naquela época o Império Romano dominava, e os soldados
romanos tinham o direito estabelecido por lei de obrigar um cida-
dão a carregar seus equipamentos ou até a trabalhar gratuitamente.
Então, o Senhor Jesus ensinou que, se isso acontecesse, eles não
deveriam resistir.
Trazendo para o contexto atual, se alguém quiser nos obrigar
injustamente a fazer algo, não devemos resistir, mas concordar
em fazer imediatamente, pois esse é o padrão do reino de Deus.
O Senhor não sugere que sejamos cúmplices de governos tiranos,
88 21 dias com Jesus no Monte

injustos ou totalitários, mas que quebremos a espiral de violência


contra as pessoas.
Certa vez, li sobre um lavrador que plantava arroz na Malásia,
país com muitas regiões montanhosas, onde, para plantar, os agri-
cultores cortam os montes formando platôs parecidos com grandes
escadarias. E, para irrigar a lavoura, é necessário bombear a água
até os grandes platôs que ficam mais acima. Um irmão que possuía
um desses platôs e o equipamento necessário para fazer a irrigação,
todos os dias regava sua plantação com muita água. Porém, por
muitas noites, um dos vizinhos que tinha um platô abaixo do seu,
usando de esperteza, furava um buraco no platô do irmão e, assim,
irrigava o seu próprio platô.
Como a situação não mudava, aquele irmão levou o assunto para
a igreja a fim de que os irmãos o ajudassem a resolver o problema. O
irmão confessou que não suportava mais e seu ímpeto era de agre-
dir e brigar com esse vizinho mau caráter. Ele desejava justiça, mas,
antes de qualquer atitude, decidiu ouvir o que os irmãos entendiam
que o Espírito Santo queria que ele fizesse. Assim, os irmãos oraram
por aquela questão e esta foi a conclusão: ele deveria comprar mais
um equipamento de irrigação e, quando bombeasse água para seu
platô, deveria também bombeá-la para o platô vizinho. Se possível,
antes de irrigar a própria plantação, deveria irrigar a outra.
Assim ele decidiu e fez, sem dizer nada ao vizinho. Perplexo com
aquela atitude, o vizinho perguntou ao irmão porque ele estava fa-
zendo aquilo, dando-lhe a oportunidade de testemunhar de Jesus.
O vizinho desonesto foi profundamente tocado e não pôde resistir,
entregando, então, sua vida ao Senhor Jesus.
Somente aquele que é filho de Deus tem a capacidade de agir
assim, e são atitudes como essa que nos fazem diferentes do resto
do mundo. Processar o vizinho e entrar numa demanda apelando
para os tribunais seria o que qualquer pessoa comum faria. Mas, de
nós, espera-se que excedamos a justiça do homem natural.
A lei do Reino a respeito do perverso – Mateus 5.38-48 89

Em São Paulo, um irmão viveu uma situação parecida. Sua


vizinha, sempre que varria o quintal, juntava seu lixo e jogava no
quintal dele. Então, todos os dias, seu quintal ficava cheio do lixo
jogado por ela. Até que, certo dia, percebendo o momento em que
ela estava fazendo isso, tomou a decisão de “ajuntar brasas vivas”
sobre a cabeça daquela mulher. Vendo que, por ser de estatura bai-
xa, ela precisava subir em um banquinho para jogar o lixo, foi até
onde a vizinha estava e lhe disse que ele mesmo jogaria o lixo em
seu quintal. Ela nem precisaria ter o trabalho ou correr o risco de
cair do banquinho e se machucar, pois todos os dias ele faria isso
por ela, com prazer e sem ressentimentos.
Apesar de parecer irônico, o fato é que essa atitude chocou
tanto aquela mulher que ela mudou seu comportamento diante
da situação. Ela esperava que, em resposta à sua atitude, o homem
discutisse e brigasse, mas ao invés disso, ele mesmo pegou todo lixo
que ela havia juntado e jogou em seu próprio quintal. Ao verem
isso, as pessoas diziam que ele era louco. E a verdade é que as regras
do nosso Reino realmente são loucas aos olhos das pessoas deste
mundo, pois nosso padrão é muito elevado.
Se algo assim nos parece impraticável ou difícil demais, é hora
de lembrarmos que, se já confessamos o Senhor Jesus como nosso
Senhor e Salvador, temos uma natureza nova dentro de nós e somos
desafiados a agir de acordo com ela. Há uma revolução maior a ser
realizada, e precisamos começar a colocar brasas vivas sobre a cabeça
das pessoas que se opõem a nós.
Muitos de nós estão pensando em mudar o mundo, mas, antes
de tentar fazer isso, devemos começar mudando nossa própria casa.
Isso só acontece quando se tem disposição para mudar a si mesmo
em primeiro lugar. Quantos, por exemplo, têm coragem de dizer
ao pai, à mãe e aos irmãos que os amam?
Quando criança, uma de minhas filhas tinha uma tática para
me acalmar: quando ela percebia que eu iria discipliná-la, antes que
eu tomasse qualquer atitude, ela se voltava para mim com muita
90 21 dias com Jesus no Monte

doçura e dizia: “Papai, eu amo tanto você! Deixa eu te beijar?” A


outra, depois de ser disciplinada, sentava-se em meu colo e me fazia
carinhos. Uma criança com essa esperteza torna a situação de qual-
quer pai muito difícil! E as crianças agem assim porque a natureza
nos ensina que há uma maneira de agir com uma nobreza maior.
Sabemos que revidar e nos vingar não trará aquilo que desejamos.
Se for preciso haver vingança, deixemos que o Senhor faça isso.

d. Se alguém te pedir
Dá a quem te pede e não voltes as costas ao que deseja
que lhe emprestes. (Mt 5.42)
O contexto bíblico desta passagem pressupõe que o pedido é feito
com violência ou sem direito legal. Voltar a outra face ao agressor,
deixar a capa ao que a exige ou andar a segunda milha com quem
nos obriga prova que o povo do Reino tem o poder para sofrer e
ser manso em vez de resistir.
Não existe aqui a insinuação para sermos covardes ou omissos,
mas para termos a determinação de não revidar, retaliar ou retribuir
na mesma moeda.
A ideia desse contexto não é apenas de alguém que pede, mas
literalmente de uma pessoa que está extorquindo dinheiro de nós;
alguém que, de alguma maneira, está nos roubando. Assim, o Senhor
diz que devemos dar o que o outro está pedindo e não lhe virar as
costas. Se alguém está pedindo emprestado e temos o recurso, não
devemos lhe negar o empréstimo, nem cobrar juros.
Este é o padrão: não vencer o mal com o mal, mas com o bem!
Se não temos agido assim, precisamos decidir mudar o padrão de
nossas atitudes.
Se a esposa é áspera, fala alto e muito, o marido deve responder
com brandura, falando baixo e com calma. Quanto mais irritante ela
for, mais ele deve surpreendê-la. Os homens geralmente são ásperos,
todavia, eu tomei a decisão de mudar e confesso que em casa eu
A lei do Reino a respeito do perverso – Mateus 5.38-48 91

venço o mal com o bem. Toda vez que faço algo errado ou percebo
que não tenho feito o melhor, planejo chegar em casa não de mãos
vazias: compro um bom presente para aplacar a ira que meu erro
causou. Em vez de revidar toda reclamação gerada por meus erros,
procuro restituir o mal dando presentes. E posso testemunhar que
isso funciona muito bem.
No casamento, podemos escolher vencer o mal com o bem,
fazendo sempre o oposto do que o cônjuge espera receber em troca
de uma atitude ruim. Por exemplo, se há uma situação na qual o
que se espera é uma explosão de ira, podemos responder com uma
atitude de brandura em dobro. Devemos aproveitar todas as opor-
tunidades de surpreender e corresponder além das expectativas do
que estão presumindo a nosso respeito. Mas muitos casamentos
não têm prosperado porque não há entre os casais a disposição de
praticar a Palavra de Deus.
Os quatro exemplos dados por Jesus tocam no verdadeiro cerne
do problema que é o nosso sentimento de justiça e vingança. Existe
um espírito de justiça que nos impede de perdoar o agressor, mas a
vontade de Deus é que não sejamos apegados a coisa alguma, nem
ao dinheiro, nem aos bens e nem àquilo que consideramos ser o
mais certo.
Os pais da igreja primitiva enxergavam nesse texto de Mateus
5.38-48 nove degraus da paciência e do autocontrole:
™™ Não tomar qualquer iniciativa perversa;
™™ Não se vingar do mal;
™™ Ficar quieto;
™™ Sofrer a injustiça;
™™ Conceder ao malfeitor mais do que ele exige;
™™ Não odiá-lo;
™™ Antes, devemos amá-lo;
™™ Fazer o bem; e, finalmente,
™™ Orar a Deus em benefício de quem nos ofende.
92 21 dias com Jesus no Monte

2. Com respeito aos inimigos (vv. 43-48)


Se o que fazemos é igual ao que todos no mundo fazem, então
não estamos vivendo de acordo com as leis do Reino. Precisamos
ser nobres e agir com nobreza, pois agora somos filhos do Rei. Não
há mais lugar em nós para comportamentos medíocres e atitudes
mesquinhas que desonram nossa posição de filhos de Deus.
O Sermão do Monte não foi escrito para aqueles que ainda não
nasceram de novo. Somente os filhos com a natureza regenerada
têm o poder de praticar os padrões elevados do Reino. Seguindo o
princípio de cumprir e até exceder a Lei, Jesus diz não ser suficiente
amar o próximo, precisamos também amar nossos inimigos: “Amai
os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem”.
A atitude prática do amor é esta: se alguém bater em nossa face,
devemos dar-lhe a outra; se alguém entrar em demanda conosco,
permitamos que o outro vença; se alguém nos forçar a andar uma
milha, andemos espontaneamente duas milhas; se alguém nos pedir
algo, devemos dar com alegria o que foi pedido.
A ordem do Senhor é orarmos pelos que nos perseguem, pois
isso nos leva a praticar o nível mais elevado de amor no reino de
Deus. Não se trata daquela oração que mais parece uma reivindi-
cação de vingança, mas de um pedido de amor para que o Senhor
abençoe o perseguidor.
Imaginemos um chefe que persegue um funcionário cristão de
maneira implacável. De repente, o filho desse chefe adoece com
câncer. Qual deve ser a atitude desse funcionário? Apenas traduzir
a situação como um ato soberano da justiça divina sobre o “chefe
perverso”? Se fizer isso, ele não estará cumprindo a lei do reino de
Deus nem agindo como filho do Pai celeste. Um filho de Deus en-
tende que seu Pai faz chover não apenas sobre os bonzinhos, mas
também sobre os maus. Deus faz chover sobre a terra de ímpios e
feiticeiros. Nosso Pai celeste não faz o bem apenas para aqueles que
o buscam. Ao contrário do que muitos crentes imaginam, Ele faz o
A lei do Reino a respeito do perverso – Mateus 5.38-48 93

bem a todos sem exceção. Portanto, esse seria um bom momento


para que o funcionário orasse pela cura do filho do chefe, pagando
o mal com o bem.
Devemos orar por todos os que nos perseguem, clamando ao
Pai por misericórdia. Lembremo-nos de que Deus nos constituiu
como sacerdotes que amam os bons e os maus. Podemos ter a atitude
tremenda que Jesus teve lá na cruz. Ele olhou para a multidão e,
vendo a maldade deles, disse: “Pai, se eles soubessem o castigo que
isso custaria, certamente não estariam agindo assim. Pai, perdoa-
-lhes, pois eles não sabem o que estão fazendo, estão cegos e são
ignorantes”. Isso sim é orar de verdade!
Precisamos aproveitar as grandes oportunidades de impressionar
a Deus, orando como Jesus orou pelos seus inimigos e perseguidores.
Devemos orar também para que Deus renove nossa capacidade de
sermos cidadãos autênticos do Reino e para que Ele nos ensine a
prática do amor genuíno de maneira elevada.

a. Agir como filhos do Pai celeste


Jesus espera que tenhamos a atitude de amar, orar e saudar
aqueles que nos perseguem, pois o Pai trata a todos com a mesma
generosidade, os bons e os maus, e nossa misericórdia não pode ser
apenas para aqueles que merecem, mas para todos.
Havia uma menina que tinha uma coleção muito grande de
bonecas amontoadas em sua cama. Certo dia, um hóspede em sua
casa lhe perguntou se ela gostava de bonecas. A menina, então, cheia
de amor e carinho por suas bonecas, o levou até o quarto para lhe
mostrar a coleção inteira a fim de que ele a conhecesse e admirasse.
Depois de ver tudo, o hóspede lhe perguntou:
— Qual dessas bonecas você mais ama?
A menina hesitou, então disse:
— Você promete que não vai rir se eu disser?
94 21 dias com Jesus no Monte

Ele apenas sorriu, e a menina pegou uma boneca esfarrapada,


com um nariz quebrado, a maior parte do cabelo arrancada, sem
um braço e uma perna, e confessou:
— Esta é a que mais amo.
— Por quê? — perguntou o visitante surpreso.
— Porque se eu não a amasse, ninguém mais o faria.

b. Sermos perfeitos como o Pai celeste


No verso 48, o Senhor diz que precisamos ser perfeitos. Mas,
nesse contexto, ser perfeito não significa não ter defeito nem cometer
mais pecados ou não errar mais. No Velho Testamento, o Senhor
disse ao povo de Israel: “Sede santos porque eu Sou Santo”. No
Novo Testamento, ao dar agora a constituição do Reino, o Senhor
Jesus diz: “...sede vós perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste” (v. 48).
A ordem do Senhor é para sermos perfeitos como nosso Pai. Se
somos filhos e temos a mesma natureza do Pai, isso se torna possí-
vel para nós. Vemos com clareza que essas regras são somente para
quem é filho, pois aqueles que não o são, certamente não consegui-
rão praticá-las. Antes de ter a capacidade de praticar esse padrão,
é necessário nascer de novo e ter dentro de si a semente de Deus.
Somente aqueles que a possuem estarão aptos a viver esse padrão
de vida tão elevado.
Pelo contexto, podemos ver que ser perfeito não se trata de não
ter mais pecado, e sim ter a prática tão elevada do amor como algo
vivo em nossas vidas. Precisamos ser perfeitos em amor.
Retribuir o bem com o mal é maligno; retribuir o bem com o
bem é humano, mas retribui o mal com o bem é divino.
9º Dia

A espiritualidade do
Reino: as esmolas
– Mateus 6.2-4

Quando, pois, deres esmola, não toques trombeta


diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas
e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em
verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.
Tu, porém, ao dares a esmola, ignore a tua mão esquerda
o que faz a tua mão direita; para que a tua esmola fique
em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompen-
sará. (Mt 6.2-4)
No capítulo 6 do Evangelho de Mateus, o Senhor começa a es-
tabelecer o padrão da espiritualidade do Reino. Logo no primeiro
versículo, Ele nos diz para não buscarmos fazer nada para sermos
vistos ou glorificados pelos homens. Daí até o verso 18, Jesus esta-
belece o padrão no tocante a dar e receber algo de Deus. Ele institui
a regra sobre dar esmolas e sobre a oração e o jejum, mostrando que
nossa espiritualidade é regida por três princípios:
96 21 dias com Jesus no Monte

™™ A motivação: devemos evitar exercer justiça com o objetivo


de sermos vistos pelos homens;
™™ A existência de dois tipos de recompensa: a humana e a
divina. A recompensa humana é o elogio e a glória que re-
cebemos dos homens. A divina é o elogio que receberemos
da boca de Deus. Todavia, não podemos ter o louvor dos
homens e o de Deus. Quando escolhemos um, perdemos
o direito de receber o outro;
™™ A existência de dois momentos para a recompensa: no pre-
sente e no futuro. A recompensa humana é recebida aqui, no
presente. Contudo, nem sempre recebemos a recompensa
de Deus neste momento, pode ser que a recebamos somente
no futuro, depois que partirmos.
É certo que receberemos uma recompensa por tudo o que fi-
zermos, incluindo a esmola, a oração e o jejum. Assim, essas regras
estabelecidas por Jesus visam alcançar principalmente dois tipos de
pessoas: os hipócritas e os carnais cheios do ego.
O hipócrita é aquele que não possui a experiência real e forja
uma aparência diante das pessoas apenas para impressioná-las. Ele
até admira os padrões divinos ensinados na Palavra de Deus, mas
seu coração é distante e indiferente a Deus, e ele não está disposto
a pagar o preço de viver dentro desses padrões. É uma pessoa que
chega a ter a aparência de piedade, mas não possui nenhuma reali-
dade de vida genuína com Deus. Muitas vezes, o hipócrita consegue
ganhar a admiração dos homens, mas jamais a de Deus.
Fico muito preocupado quando recebo muitos elogios dos ho-
mens: muito elogio humano significa pouco ou nenhum elogio de
Deus; muito reconhecimento humano, pouco reconhecimento de
Deus. O Senhor Jesus não foi muito elogiado pelos homens. Por
isso, nos parece que o melhor é ser perseguido e injuriado pelos ho-
mens, pois esse pode ser um grande sinal de que estamos andando
pelo caminho correto, o que agrada a Deus.
A espiritualidade do Reino: as esmolas – Mateus 6.2-4 97

Uma pessoa carnal, por outro lado, tem a experiência real, ver-
dadeiramente está orando e ofertando de coração a Deus, mas cai
na tentação de ser vista praticando sua espiritualidade superior.
O hipócrita é dissimulado e falso, mas o carnal é sincero e deseja
honestamente agradar a Deus. Ora de coração, mas quando per-
cebe que alguém está observando, fica cheio de si, e assim perde a
recompensa. Certamente é sincero e está orando mesmo, todavia,
perde o que poderia receber de Deus. Esse é o tipo de pessoa que
deseja honestamente influenciar e ganhar vidas para o reino de Deus,
mas também deseja ser reconhecida por homens pelo trabalho que
faz. Gosta de estar no pedestal e não perde a oportunidade de ficar
em evidência.
Precisamos ser cuidadosos com nossas atitudes, pois Deus abo-
mina a religião humana. É exatamente o que Jesus fala em Ma-
teus 15: “Esse povo me honra com os lábios, mas o coração está longe
mim”. Na espiritualidade do Reino, o que conta não é a aparência,
mas a realidade do coração. Se há honestidade em nosso coração,
Deus ouve nossa oração, mesmo que o exterior seja estranho e a
aparência externa seja imprópria. Ainda que não tenhamos uma
linguagem bonita e apresentável, se o coração for sincero, Deus
ouvirá nossa oração.
Muitos possuem um estilo religioso bem peculiar e sempre gos-
tam de orar com voz impostada. Outros já têm um estilo de oração
mais despojado e espontâneo, que talvez até escandalize alguns.
Porém, na verdade, Deus não está em busca de linguagem exterior
e sim de um coração intenso e cheio de sinceridade, por isso Ele
certamente ouve uma oração como essa e talvez não ouça a oração
cheia de formalidade religiosa.
Infelizmente, somos muito cheios da aparência da religião.
Quantas vezes fechamos os olhos apenas para parecer que estamos
orando? Fechar os olhos não significa nada para Deus! Nem uma
vez encontramos nos evangelhos a informação de que Jesus fechou
os olhos para orar. Ao contrário, diz-se que Ele ergueu os olhos para
98 21 dias com Jesus no Monte

o Pai e para o céu. Geralmente, quando vemos alguém orando de


olhos abertos, pensamos que aquela oração não tem valor ou que ele
nem está orando. Isso acontece porque somos fariseus e, para nós,
somente tem valor aquilo que tem a aparência exterior da religião.
Infelizmente, os evangélicos são propensos a serem fariseus,
porque sabem a Palavra e não a praticam. Os maiores fariseus estão
sentados nos bancos de mogno das igrejas evangélicas: oram bo-
nito, ouvem ministrações bonitas, mas o coração deles está longe
de Deus. O Senhor está procurando pessoas que O amem e não
pessoas cheias de rituais e aparência religiosa. Não são os gestos ou
a cara piedosa que fazemos quando oramos que vão recomendar
nossa oração diante de Deus.
A religião olha a aparência: roupas, pregação e discurso boni-
tos, hinos harmônicos e voz impostada. Deus olha a realidade do
coração. Não que devamos ser irreverentes com as coisas de Deus.
Ao contrário, se estamos fazendo para Deus, vamos dar o melhor
que podemos oferecer – falaremos palavras de poeta e oferecemos
língua de poderoso escritor –, entretanto, nada disso tem valor se
nosso coração não for totalmente intenso para Deus.
As palavras ego e carne não são usadas nesse trecho do evangelho,
mas o Senhor expõe nossa carnalidade na questão de ofertar, orar
e jejuar. O povo do Reino vive numa atitude vazia de si mesmo,
buscando a satisfação de Deus e não a aprovação dos homens.
Há um tipo de atitude que tem se tornado comum em nossos
dias, com a qual também precisamos ter cuidado. Refiro-me àqueles
que são honestamente pecadores, isto é, pensam que seu pecado é
justificado desde que eles não tentem se esconder, mas sejam in-
teiramente honestos em seu erro. Erroneamente pensam que estão
livres do pecado, contanto que não sejam hipócritas sobre isso, já
que a pior forma de pecado é a hipocrisia.
Contudo, transparência e honestidade em assumir o pecado, sem
arrependimento, somente o tornam mais desprezível ainda e não
A espiritualidade do Reino: as esmolas – Mateus 6.2-4 99

atenuam em nada suas consequências. Por exemplo, dois homens


que assaltam um banco juntos, um usando máscaras e outro não,
receberão a mesma sentença; ambos serão presos e permanecerão
na prisão pelo mesmo tempo. Honestidade e sinceridade nesse caso
não têm valor para a justiça.
Nossa vida espiritual, portanto, é caracterizada por duas coisas:
honestidade de coração e rejeição do exibicionismo. De nada adian-
ta o reconhecimento das pessoas se nossa oração não for ouvida,
se nossa pregação não alcançar o coração de quem a ouve porque
não passa de palavras bonitas, porém vazias, que não vêm de Deus.
É por essa razão que Jesus abominava a atitude dos fariseus, pois
gostavam de fazer as coisas apenas para serem vistos e impressionar
aqueles que os viam fazendo.

1. Com respeito às esmolas (vv. 2-4)


A esmola é uma prática cristã que não foi abolida. A própria lei
de Moisés prescrevia que o pobre deveria ser ajudado.
Livremente, abrirás a mão para o teu irmão, para o
necessitado, para o pobre na tua terra. (Dt 15.11)
Creio que a orientação sobre a esmola é colocada junto com a
oração porque ambas têm o poder de atingir o céu quando feitas
ou de fechá-lo quando não praticadas.
O que tapa o ouvido ao clamor do pobre também
clamará e não será ouvido. (Pv 21.13)

a. Não toques trombeta


Quando pois deres esmola, não toques trombeta diante
de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas
ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade
vos digo que eles já receberam a recompensa. (Mt 6.2)
Tocar trombeta é fazer uma encenação para ser visto. A exorta-
ção de Jesus é contra o hipócrita que faz algo exclusivamente com
100 21 dias com Jesus no Monte

o fim de ser visto, e também contra o crente que quer aparecer. Há


pessoas que são sinceras, mas exibicionistas.
Certa vez, ouvi a história de um monge asceta do Oriente. Esse
homem, tido como santo, cobria-se de cinzas como um sinal de
humildade e, regularmente, sentava-se em uma esquina importante
de sua cidade. Quando os turistas pediam permissão para tirar a foto
dele, o místico arrumava suas cinzas para dar a melhor imagem da
sua miséria e humildade. A religião humana não é nada mais do que
uma arrumação cuidadosa de “cinzas” para impressionar o mundo
com uma humildade e suposta devoção. O problema, obviamente,
é que essa humildade é uma farsa, e a devoção é a si mesmo, não a
Deus. Tal religião nada mais é do que um jogo de fingimento, um
jogo em que os escribas e fariseus do tempo de Jesus eram mestres.
Porque sua religião era apenas uma encenação e um escárnio do
modo verdadeiro de viver revelado por Deus a seu povo. A maior
parte das denúncias de Jesus foram direcionadas a eles.
Ao dizer para não tocarmos trombeta, Jesus estava fazendo men-
ção ao toque especial de trombeta que anunciava o momento de
ofertar no templo, pois infelizmente existem pessoas que só ofertam
se, de alguma maneira, mostrarem que elas ofertaram. Pessoas assim
não ofertam para ajudar quem recebe, e sim para usufruir e obter
algum prazer pessoal – o que é mórbido. Porém, não é essa uma
atitude do reino de Deus.
Há crentes que são honestos com Deus, mas foram pegos na
armadilha do ego e da vaidade pessoal. Não é somente o hipócrita
que tem vaidade, muitos crentes são vaidosos e gostam de aparecer.
São honestos e ofertam para o Senhor, mas perdem a bênção, pois já
receberam a recompensa dos homens; foram pegos no laço do ego e
da carne. Todo aquele que anda pela carne e pelo ego é dominado
pelo desejo do exibicionismo.
Há muitas maneiras sutis de chamar a atenção. Muitos dizem
que não querem aparecer, mas há momentos em que até essa ati-
tude é uma maneira de aparecer mais que os outros. Por exemplo,
A espiritualidade do Reino: as esmolas – Mateus 6.2-4 101

muitas vezes uma pessoa que vai a uma festa e fica todo o tempo
sozinha e isolada em um canto está apenas querendo aparecer. Ela
certamente desperta a preocupação dos anfitriões que ficam à sua
volta, tentando fazer algo para que ela se sinta à vontade, apesar de
ela dizer que está confortável e apenas deseja ficar sozinha. Ora, sua
atitude mostra que a única coisa que deseja é chamar a atenção e
aparecer, pois alguém que deseja ficar só nunca deveria ir a uma festa.
Outras vezes estamos reunidos com vários irmãos e recebemos
a direção de orarmos individualmente. Um dos irmãos, em vez de
seguir a direção e orar, resolve ler a Bíblia. Essa atitude mostra cla-
ramente a motivação de aparecer e chamar a atenção.

b. Ignore a mão esquerda o que faz a mão direita


A mão esquerda ignorar o que faz a mão direita não significa
que a oferta deva ser dada de forma inconsciente ou irracional, mas
deve ser dada sem a pessoa que dá se preocupar consigo mesma. A
esmola é para o pobre ou para a igreja e não para a satisfação íntima
de quem dá.
Todo carnal é exibicionista, gosta de ser visto e reconhecido, e o
Senhor está falando principalmente a quem dá com essa intenção.
Essas pessoas possuem um desejo insaciável de mostrar que ofer-
taram e exibir o valor ofertado. São esses os que mais querem ser
paparicados e, se o pastor não faz isso, saem da igreja argumentando
que seu esforço e trabalho não são reconhecidos. Tais pessoas gostam
de ter destaque e querem estar sempre em evidência. Mas não deve
ser assim no reino de Deus. Deus vê todas as coisas e a recompensa
deve vir dEle, não dos homens.
Tu, porém, ao dares esmolas, ignore a tua mão esquerda
o que faz a tua mão direita; para que a tua esmola fique
em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompen-
sará. (Mt 6.3)
Ninguém é obrigado a dar, mas segundo o padrão do reino de
Deus, a mão direita não sabe o que faz a esquerda. Não devemos
102 21 dias com Jesus no Monte

tocar trombeta, contar para todos, nem dar testemunho de quanto


ofertamos com a intenção de impressionar os irmãos. Pode até ser
que nosso testemunho estimule outros a ofertar generosamente, mas
já teremos recebido a recompensa pela nossa atitude. Nisso não há
acepção de pessoas, só o fato de contarmos esse tipo de testemunho
já nos faz perder a recompensa de Deus.

c. Dar em secreto
Tudo o que fazemos deve ter a motivação certa e a atitude certa,
apenas uma delas não basta. A motivação certa é dar como quem
dá para Deus, e a atitude certa é dar em secreto para ser visto ape-
nas pelo Pai.
Se desejamos a recompensa de Deus, devemos praticar a Palavra
e ficar em silêncio. Mas se o que queremos é a recompensa humana,
então podemos falar e divulgar o que fizemos. Porém, não podemos
nos esquecer de que existem apenas dois tipos de recompensa, a
humana e a divina, e não se pode ter as duas. Precisamos escolher
qual delas queremos.
Entretanto, dar em secreto não significa que teremos de ofertar
sempre às escondidas, o que em algumas circunstâncias é impossível.
É apenas uma questão de atitude do coração. Deus olha o coração e
conhece a motivação de cada um. Ainda que em algumas situações
seja impossível ofertar em secreto, Deus sabe que a motivação do
nosso coração não é mostrar aos homens o que estamos fazendo,
mas honrá-lo e reconhecê-lo como soberano sobre todas as coisas.

d. A recompensa
Já vimos que existem duas recompensas, a humana e a divina, e
que não podemos ter as duas. Se buscarmos a recompensa humana,
perderemos a recompensa de Deus.
Precisamos buscar sempre o que é de Deus. Muitos não recebem
de Deus nas reuniões, por exemplo, porque vão apenas para aprender
teologia ou doutrina, conhecimento humano, mas não buscam ou
A espiritualidade do Reino: as esmolas – Mateus 6.2-4 103

não desejam ser tocados por Deus através de Sua Palavra. Porém,
ser tocado pelo Senhor é que faz toda a diferença, e esse é o padrão
dEle para as reuniões da igreja. Assim, se reunião após reunião nada
nos toca, algo está errado conosco ou com a reunião que temos fre-
quentado. Um dos dois está inteiramente fora do padrão. Mas, Deus
é bom e, se nosso coração for totalmente do Senhor, Ele nos tocará
onde quer que estivermos, até mesmo nos lugares mais improváveis.
O segredo é decidirmos sempre tocar nas vestes do Senhor. Na
história da mulher hemorrágica, todos encostavam em Jesus, mas
somente ela tocou nEle de maneira especial, e essa atitude fez fluir
algo dEle para ela. Da mesma forma, muitas pessoas erguem as
mãos num culto, mas poucas tocam o céu. Muitos cantam, mas
poucas músicas tocam o trono de Deus. Muitos ouvem pregações,
mas poucas pessoas são genuinamente tocadas por Deus, pois isso
implica em ter um coração voltado para Ele, um coração que clama,
se humilha e O busca profundamente. Se desejamos o toque da mão
de Deus, devemos nos guardar de exercer nossa justiça diante dos
homens de maneira religiosa.
10º Dia

A espiritualidade do
Reino e a oração
– Mateus 6.5-8

E, quando orardes, não sereis como os hipócritas; por-


que gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos
das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade
vos digo que eles já receberam a recompensa. Tu, porém,
quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta,
orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê
em secreto, te recompensará. E, orando, não useis de
vãs repetições, como os gentios; porque presumem que
pelo seu muito falar serão ouvidos. Não vos assemelheis,
pois, a eles; porque Deus, o vosso Pai, sabe o de que
tendes necessidade, antes que lho peçais. (Mt 6.5-8)
Muitos cristãos são iludidos, procurando direção de Deus em
homens, geralmente o pastor ou um “vaso ungido”. Infelizmen-
te, buscam gurus que possam guiar a vida deles e, por isso, estão
sempre à procura de uma resposta exterior. Porém, a resposta do
106 21 dias com Jesus no Monte

Senhor para nós está em cultivar uma vida pessoal de oração, um


relacionamento vivo e pessoal com Deus.
Algo que ensinamos em nossa igreja local é que cada irmão
deve orar com seus líderes antes de qualquer aconselhamento para
tomada de decisões. Antes de tudo o que formos fazer, estimula-
mos nossos irmãos a aprender a obter respostas em Deus através da
oração. Normalmente, depois de orarmos, nosso aconselhamento
será apenas para confirmar a direção que o próprio Espírito já co-
municou ao irmão.
Como já vimos, uma das coisas que o Senhor mais abomina é a
religião vazia e exibicionista. Deus abomina quando fazemos uma
oração apenas para cumprir uma obrigação religiosa ou um hábito.
E isso acontece nas muitas orações nos cultos, ou antes das refeições,
quando podemos ver faces piedosas sem realidade interior ou olhos
fechados por mera religiosidade.
Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração
está longe de mim. (Mt 15.8)
No Sermão do Monte o Senhor nos dá o padrão de como deve
ser a vida íntima de oração no Reino.

1. Não com o fim de ser visto


O primeiro princípio do Reino em relação à oração é que não
devemos orar para que os homens vejam, como se esse fosse o nosso
objetivo principal. Ainda que, ao orarmos, possamos ensinar aos
irmãos, sendo modelo para eles. Por exemplo, em nossa igreja, os
irmãos oram andando, pois sempre nos viram orar assim. Sempre
oro andando para vencer a sonolência, mas alguns irmãos hoje o
fazem pelo exemplo que viram em nós.
A oração que busca o louvor do homem obtém a recompen-
sa dos homens, mas não uma resposta do Pai. Contudo, há uma
recompensa para a oração daqueles que o fazem para serem vistos
pelo Pai, que vê em secreto.
A espiritualidade do Reino e a oração – Mateus 6.5-8 107

2. Entra em teu quarto


O segundo princípio que temos aqui é entrar em nosso quarto.
Naturalmente, entrar no quarto pode ou não ter um significado
literal, pois Jesus também tinha o hábito de orar a sós em lugares
retirados, e Paulo nos exorta a orarmos em todo lugar.
Quero, portanto, que os varões orem em todo lugar,
levantando mãos santas, sem ira e sem animosidade.
(1Tm 2.8)
A palavra usada por Jesus em Mateus 6.6 e traduzida como quar-
to é “tameon”, também usada para referir-se ao lugar onde eram
guardados os tesouros no templo. Por isso, podemos dizer que existe
uma relação entre oração e riqueza espiritual.
Contudo, mais importante que o quarto é a instrução para “fe-
char a porta”. Não importa o lugar onde estivermos, ali pode ser
nosso quarto, desde que fechemos a porta para os ruídos e preocu-
pações da vida diária.
Quando nos voltamos para Deus, focando nossa mente no Es-
pírito, neste momento “entramos no quarto” e “fechamos a porta”.
Não tem como orar de forma efetiva sem focar a mente e o cora-
ção em Deus. Uma das maneiras que uso para me ajudar a fluir
em oração é eliminar todo ruído e distração colocando algumas
canções de louvor e adoração. A música também me ajuda a guar-
dar minha privacidade com o Senhor. Outra maneira é dar alguns
brados de louvor.
Cada pessoa tem sua maneira de “fechar a porta”. Há irmãos que
gostam de orar debaixo de uma árvore no bosque; outros, quando
estão viajando de carro, gostam de parar na beira da estrada para
orar; outros até mesmo fazendo exercícios se concentram mais para
focar o coração em Deus. Mas o mais importante deste princípio é:
eliminar toda distração e concentrar-se em Deus.
108 21 dias com Jesus no Monte

3. Não use de vãs repetições


O terceiro princípio que vemos sobre a oração trata do conteúdo.
Não devemos usar de vãs repetições. Notemos que a ênfase aqui é
sobre “vãs” e não sobre “repetições”; é sobre usar palavras vazias em
um mero ritual, sem conteúdo interior, quando presumimos que
Deus nos ouvirá por causa da quantidade de vezes que falamos,
como uma reza decorada repleta de palavras mágicas. Até mesmo
alguns crentes usam expressões como “em nome de Jesus”, “amém”
e outras mais, sem aplicar o coração e a fé. Usam como uma mera
repetição de frases feitas, enquanto Deus olha o que flui do coração.
Alguns dizem não saber orar, mas o que Deus espera é que fale-
mos com Ele usando nossas próprias palavras, abrindo a Ele o que
aflige nosso coração.
A questão não é a repetição, pois temos o exemplo do próprio
Senhor Jesus, que repetiu sua oração no Getsêmani por três vezes
com as mesmas palavras.
Deixando-os novamente, foi orar pela terceira vez,
repetindo as mesmas palavras. (Mt 26.44)
Paulo fez o mesmo em relação ao espinho em sua carne, pedindo
repetidas vezes que Deus o removesse.
Por causa disto, três vezes pedi ao Senhor que o afastasse
de mim. (2Co 12.8)
Se não pudéssemos repetir orações, não poderíamos orar o Sal-
mo 136!

4. Não faça relatórios, mas pedidos


Há um principio que tenho aprendido com Deus e quero ensinar
aqui. Não devemos, jamais, fazer relatórios para Deus, como uma
lamúria e reclamação do que nos sucedeu. Em vez disso, devemos
fazer pedidos específicos diante das circunstâncias. Por exemplo,
quando dizemos “Senhor, estamos perecendo!”, estamos apenas
A espiritualidade do Reino e a oração – Mateus 6.5-8 109

fazendo um relatório, mas, quando dizemos “Senhor, salva-nos!”,


estamos fazendo um pedido.
Relatórios de nossas necessidades são apenas lamúrias sem o
revestimento da fé, e sem fé é impossível agradar a Deus. Por outro
lado, pedidos específicos honram a Deus e são recompensados com
resposta. Lamuriar, lamentar a sorte, muitíssima gente o faz, toda-
via, aqueles que creem fazem pedidos específicos, com intensidade
e perseverança, reconhecendo que somente Ele é Deus.
Embora Deus, o nosso Pai, conheça nossas necessidades, ainda
precisamos pedir-lhe, pois todo o que pede recebe (Mt 7.8). Quando
pedimos, estamos reconhecendo nossa limitação e fraqueza e reco-
nhecendo que Ele é a fonte de tudo e o nosso supridor.
Alguns não fazem pedidos específicos para Deus, numa atitude
de não importunar o Senhor, como uma falsa piedade. Mas isso,
na verdade, é incredulidade. Aquele que crê pede, recorre a Deus,
mesmo sabendo que Ele sabe de todas as coisas. O Senhor deseja ser
galardoador de todo aquele que O busca. Precisamos tomar, hoje
mesmo, a decisão de não lamuriar ou fazer relatório, mas começar
a pedir ao Pai. Fechar a porta e clamar intensamente, apresentan-
do o pedido de suprimento para cada uma de nossas necessidades.
11º Dia

Como orar no Reino


– Mateus 6.9-15

Portanto, vós orareis assim: Pai nosso, que estás nos


céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino;
faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu; o
pão nosso de cada dia dá-nos hoje; e perdoa-nos as
nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos
nossos devedores; e não nos deixes cair em tentação;
mas livra-nos do mal pois teu é o reino, o poder e a
glória para sempre. Amém! Porque, se perdoardes aos
homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos
perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens as
suas ofensas, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas
ofensas. (Mt 6.9-15)
Diferentemente do que muitos religiosos imaginam, na oração
do Pai Nosso, o Senhor não está, ensinando uma reza para ser repe-
tida de maneira mecânica. Antes, sua intenção é nos dar um modelo
ou padrão a ser seguido em nossas orações.
112 21 dias com Jesus no Monte

Precisamos entender que a Palavra de Deus tem poder, ela é como


uma espada de dois gumes: quando a liberamos em fé através da
oração, há poder para transformar circunstâncias, resistir ao diabo
e liberar a vontade de Deus.
A oração do Pai Nosso deve ser usada como um roteiro para
nossas orações diárias, no qual cada um dos pontos é tomado não
como uma frase mágica, mas como um princípio espiritual a ser
observado. Quando orarmos, devemos seguir os seguintes pontos:

1. Pai nosso que estás no céu


Um judeu não podia chamar Deus de Pai, mas nós, pela fé em
Cristo, somos feitos filhos de Deus e podemos entrar com ousadia
na presença de Deus, chamando-o de Pai. Para o mundo Ele pode
ser o Senhor Deus, mas para nós ele é nosso Pai.
Precisamos aprender a ter comunhão diária com o Pai bondoso,
amoroso e cheio de graça que temos. Ter intimidade com Deus signi-
fica ter intimidade com Sua graça para conosco. Fomos transforma-
dos em filhos e, por isso, podemos chamá-lo de Pai. Todos os dias,
estamos diante de um Deus que está olhando para nós e sorrindo,
assim como um pai se alegra com sua criança. Ainda que outros
não vejam nada de especial em nós, o Pai está vendo e se alegrando!
Paulo diz que devemos até chamá-lo de “paizinho” ou “papaizi-
nho”, numa intimidade profunda com Deus.
Porque não recebestes o espírito de escravidão, para
viverdes, outra vez, atemorizados, mas recebestes o
espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba,
Pai. (Rm 8.15)
A cada dia, devemos chamar nosso Deus de Pai, papaizinho, e
confessar que confiamos e descansamos nEle.

2. Santificado seja o teu nome


Santificar é separar, é colocar o nome de Deus acima de todo
nome. Mas qual é o nome de Deus?
Como orar no Reino – Mateus 6.9-15 113

No Velho Testamento, Ele se revelou a Moisés como o “Eu Sou”.


É como se Ele dissesse: “Eu sou tudo aquilo de que você necessita”.
Essa expressão no hebraico é “Jeová” (a pronúncia correta é desco-
nhecida, e alguns dizem Javé, outros Yaweh).
Existem sete nomes redentivos de Deus no Velho Testamento
e, ao orarmos, devemos santificar um deles, de acordo com nossa
necessidade. Por exemplo, se alguém está enfermo, deve santificar
o nome “Jeová Rafá”, que significa “O Senhor é nossa cura”.
Na Bíblia, o nome retrata a natureza da pessoa, e sabemos que
Deus não pode negar Seu nome. Por isso, nossa fé é no nome do Se-
nhor. Quando o santificamos, honrando, exaltando e confessando-o
bem alto, somos abençoados.
Quando Deus se manifesta em favor do Seu povo, Seu nome é
expresso, e os sete nomes redentivos de Deus encontrados no Velho
Testamento são:
™™ Jeovah-Rafá – “Eu sou o Senhor que te sara” (Ex 15.26;
1Pe 2.24; Is 53.4,5);
™™ Jeovah-Nissi – “O Senhor, nossa bandeira” (Ex 17.8-15);
™™ Jeovah-Shalom – “O Senhor, nossa paz” (Jz 6.24; Jo 14.27);
™™ Jeovah-Ra’ah – “O Senhor, meu pastor” (Sl 23.1);
™™ Jeovah-Tsidkenu – “O Senhor, nossa justiça” (Jr 23.6;
2Co 5.21);
™™ Jeovah-Shamah – “O Senhor está ali” (Ez 48.35; Hb 13.5;
Sl 23);
™™ Jeovah-Jireh – “O Senhor que provê” (Gn 22.14; Fp 4.19)
™™ Jeovah-Makadesh – “O Senhor que nos santifica” (Lv 20.8;
Hb 13.12; 1Co 6.9-11).
Quando o Senhor diz: “Eu Sou”, está abrangendo todos esses
significados e muitos mais.
Santificamos o nome do Senhor quando o invocamos, segundo
a nossa necessidade, e confiamos que temos nEle a Sua provisão.
Reconhecendo que “todas as nossas fontes estão no Senhor Jeovah”.
114 21 dias com Jesus no Monte

3. Venha o teu reino


Precisamos pedir para que o Reino venha. O Reino, ou o gover-
no de Deus, precisa se manifestar em nossa vida pessoal, em nossa
família, em nossa igreja e em nossa nação.
Sabemos que, depois da queda do diabo, a terra caiu debaixo
de sua mão usurpadora. O homem foi criado para tomar de volta
a terra, mas ele caiu e a terra foi legalmente colocada debaixo do
domínio maligno. Então Jesus veio para estabelecer Seu reino na
terra. O reino de Deus, hoje, está restrito ao nosso interior, mas
vem a hora em que Cristo reinará sobre toda a terra e, nesse dia, a
vontade de Deus será feita na terra como é feita no céu.
Haverá um tempo em que Cristo voltará, distribuirá o galardão
aos crentes vencedores, aplicará disciplina aos derrotados e juízo
aos ímpios. Nesse tempo Ele estabelecerá Seu reino por mil anos a
partir de Jerusalém. Assim, todos quantos desejam esse reino e oram
“venha o teu reino”, estarão prontos para aqueles dias.

4. Faça-se a tua vontade


Ser um discípulo é seguir a vontade do mestre. Estar no Reino
é se submeter à vontade do Rei soberano. Muitos crentes ainda go-
vernam as próprias vidas e fazem tudo de acordo com seu próprio
pensamento. Mas precisamos orar todos os dias para conhecer e
fazer a vontade de Deus em todas as áreas de nossa vida.
Conta-se que um homem chegou a uma tribo perguntando se
poderia ser o rei deles. Porém, eles disseram que aquele homem
jamais havia feito coisa alguma por eles. Como, portanto, poderia
ser seu rei? O bom homem, então, começou a curar os doentes
que lá estavam, prosperar os necessitados, resolver os problemas
de relacionamentos, etc. Depois de ter feito tantas coisas, voltou a
perguntar se poderia ser seu rei. Contudo, respondeu-lhe o povo:
— Mas, agora que está tudo tão bem, para que precisamos de
um rei?
Como orar no Reino – Mateus 6.9-15 115

Essa história nos fala muito da realidade de alguns cristãos em


nossos dias, que desejam todas as bênçãos de um Salvador, mas
jamais se comprometem em se tornarem servos do Senhor e Rei.
Contudo, a oração que abala os céus e faz tremer a terra é a dos cren-
tes vencedores que oram e clamam pela vontade de Deus, ainda que
esta seja contrária à sua. Precisamos orar todos os dias para conhecer
e fazer a vontade de Deus em todas as áreas de nossa vida, pois estes
são os que estarão sempre prontos a obedecer à vontade do Rei.

5. O pão nosso de cada dia dá-nos hoje


O pão aqui pode significar tanto o suprimento material como o
espiritual. Sabemos que o Rei não deseja que nos preocupemos com
o dia de amanhã, por isso Ele orienta para pedirmos o pão a cada dia.
Um pastor britânico, George Müller, que cuidava de vários orfa-
natos, levantando recursos puramente pela fé, jamais pedia dinheiro
para homem algum e, somente pela oração, sustentou dezenas de
orfanatos ao longo de seu ministério. Certa vez, um de seus orfa-
natos estava sem recurso algum e nenhum alimento para o café da
manhã dos garotos que lá viviam. Quando perguntado por seus
obreiros sobre o que fazer em tais condições, ele recomendou que
todos fossem para o refeitório normalmente. Ele, então, dirigiu a
oração matinal dizendo:
— Pai, sempre soubemos que és fiel, e Sua provisão de cada dia
dá-nos hoje. Obrigado pelo lanche desta manhã.
Assim que terminou sua oração, a campainha do orfanato tocou.
Era o entregador de pães e leite! O pneu de sua charrete havia furado
ali em frente e, se não entregasse naquele lugar todos os pães e o
leite, perderia todo o produto. E, ao recebê-lo, os obreiros disseram:
— Estávamos esperando por você!
É tão bom experimentar o melhor de Deus, ainda que isso ve-
nha com muitas emoções, pois muitos de nossos pedidos o Senhor
trará na última hora!
116 21 dias com Jesus no Monte

Precisamos entender que Deus se preocupa com nosso supri-


mento. Não existe nada tão grande que Ele não possa fazer, assim
como não há nada tão pequeno para nós que também não seja
importante para Ele.

6. Perdoa-nos como nós perdoamos


A única barreira que o Senhor colocou para nossas orações é
guardarmos rancor e ressentimento. Quando falta perdão, faltam
respostas de Deus para as orações feitas. Na oração que Jesus nos
deixou como modelo, o perdão aparece de forma condicional: rece-
bemos perdão se nós mesmos perdoarmos. Portanto, Deus não pode
responder orações de pecadores não perdoados. O fator de bloqueio
das respostas de Deus às orações é o pecado e, na vida de um cristão,
a falta de perdão é um dos problemas mais graves. E a questão é: se
não perdoamos os outros, também não somos perdoados.
Mas, por que isso acontece? O perdão de Deus não é pela graça?
O problema é que, quando relutamos em perdoar, estamos dizendo
que somos justos e não precisamos suportar aquela ofensa. De um
modo sutil, dizemos que somos melhores do que Deus. Ele é absolu-
tamente santo e perdoa o pecador arrependido. Parece exagero, mas
quando nos recusamos a perdoar, estamos declarando que somos
tão justos que temos o direito de cobrar a ofensa de nosso irmão.
Assim, quando nos declaramos justos, nosso pecado fica retido, e
Deus só pode perdoar pecadores arrependidos.
Se Deus nos perdoa, também devemos perdoar. Quando nos
declaramos justos e sem pecado, saímos da posição de necessitados
da graça de Deus e então não podemos ser perdoados.
Depois que Adão pecou, Deus não lhe deu um simples tapinha
nas costas e disse: “Vamos, lá! Está tudo bem! Vamos esquecer esse
pecado e começar tudo de novo”. Foi preciso que Jesus viesse, se
fizesse homem e morresse porque, sendo Deus justo e completamen-
te santo, Ele não pode simplesmente esquecer o pecado. A Palavra
de Deus diz que a alma que pecar morrerá. Esse é o veredicto de
Como orar no Reino – Mateus 6.9-15 117

um Deus santo sobre o pecado. Como todos nós somos pecadores,


carentes do perdão de Deus, somos obrigados a perdoar também.
Existe um demônio que atua produzindo no homem um pro-
fundo sentimento de justiça que culmina em vingança. É fácil ob-
servar como esse espírito opera quando vemos um filme de ação.
Na trama, o vilão faz todas as atrocidades para despertar em nós um
senso de justiça e vingança. Então, por causa desse espírito, quando
o mocinho apronta todas, nós o justificamos. Chamo-o de espírito
de justiça e de vingança, ou seja, o oposto do Espírito de Deus, que
é de perdão, paciência e amor. O diabo está moldando esta geração
com um espírito de vingança; todavia, temos que andar no Espírito
de perdão e, para isso, precisamos entender que ele não é daqui, é
do reino dos céus.
Não podemos fazer justiça porque nós mesmos não somos san-
tos. Sendo todos pecadores, não temos o direito de cobrar justiça de
quem quer que seja. Por isso nosso perdão é meramente esquecer o
erro do outro. Quando decidimos não perdoar, também não somos
perdoados, pois o perdão de Deus é somente para aquele que se de-
clara pecador. Ao negar o perdão, estamos nos declarando justos, e
assim perdemos a justificação que vem de Deus. Por isso o Senhor
disse que, se não perdoarmos, também não seremos perdoados.
Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas,
também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não
perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso
Pai vos perdoará as vossas ofensas. (Mt 6.14,15)
Porque fomos livremente perdoados, liberamos também gra-
ciosamente o perdão sobre os outros. Deste modo, não guardamos
ressentimentos, mesmo que justificáveis, nem esperamos o arrepen-
dimento do outro para só então perdoá-lo.
A falta de perdão nos mantém em escravidão, em primeiro lu-
gar, porque o ressentimento causa uma série de enfermidades. Em
segundo lugar, porque ele produz fortalezas espirituais: a amargura,
por exemplo, é mais que ressentimento, é uma fortaleza espiritual, é
118 21 dias com Jesus no Monte

um ressentimento antigo alimentado dia-a-dia. E, por fim, o ressen-


timento nos torna escravos da pessoa que nos ofendeu. Passamos a
viver em função das lembranças dolorosas e não conseguimos tirar
a pessoa de nossa mente.

O que fazer quando ofendemos alguém?


No Sermão do Monte, o Senhor falou primeiro a respeito da-
quele que causou uma ofensa.
Se, pois, ao trazeres ao altar a tua oferta, ali te lembra-
res de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa
perante o altar a tua oferta, vai primeiro reconciliar-te
com teu irmão; e, então, voltando, faze a tua oferta.
Entra em acordo sem demora com o teu adversário,
enquanto estás com ele a caminho, para que o adversário
não te entregue ao juiz, o juiz, ao oficial de justiça, e
sejas recolhido à prisão. Em verdade te digo que não
sairás dali, enquanto não pagares o último centavo.
(Mt 5.23-26)
Como já vimos, ser recolhido à prisão pode ter vários significados.
Primeiro, significa que se não resolvermos o problema com nosso
irmão e ele morrer, permanecerá uma pendência para ser resolvida
no dia do julgamento. Portanto, devemos sair da zona de conforto,
ir ao encontro do irmão ofendido e buscar reconciliação.
A prisão também pode simbolizar a manifestação de uma série
de doenças físicas e mentais, que podem ser os verdugos em nossas
vidas, ou se tornarem correntes que aprisionam. Certamente, a falta
de perdão é uma base para o estabelecimento de fortalezas malignas
em nossa vida.

Fui ofendido. O que devo fazer?


Se teu irmão pecar [contra ti], vai argui-lo entre ti e ele
só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. (Mt 18.15)
Como orar no Reino – Mateus 6.9-15 119

Antes de tudo, não devemos comentar com outras pessoas a


respeito de nossa mágoa ou ressentimento. Isso pode nos prejudicar
e nos impedir de decidir pelo perdão. Não podemos fazer compa-
rações injustas para tentar explicar a falta de perdão. Em vez disso,
devemos comparar nossa vida com a de Jesus, perguntando-nos o
que Ele faria em nosso lugar quanto ao perdão. Se formos discípulos
de Jesus, certamente perdoaremos.
Jesus disse que se um irmão pecar contra nós e se arrepender,
devemos perdoá-lo quantas vezes for necessário. Não devemos es-
perar que ele se arrependa para, só depois, o perdoarmos. Jesus e
Estevão perdoaram seus algozes antes que houvesse qualquer arre-
pendimento, pois o perdão não é liberado pela razão, é muito mais
uma decisão.
Tanto o ofensor quanto o que foi ofendido devem buscar a recon-
ciliação, tomando essa iniciativa, independentemente de quem errou.
Acautelai-vos. Se teu irmão pecar contra ti, repreende-
-o; se ele se arrepender, perdoa-lhe. Se, por sete vezes
no dia, pecar contra ti e, sete vezes, vier ter contigo,
dizendo: Estou arrependido, perdoa-lhe. (Lc 17.3,4)
Devemos perdoar sempre, mas há situações em que a pessoa pre-
cisa reconquistar a posição e a confiança. O perdão é aplicável em
qualquer situação, mas a restauração da posição somente acontece
quando há arrependimento e mudança de vida.
Por exemplo, se empresto mil reais a um irmão, e ele, depois
do prazo combinado para pagamento, começa a me evitar, fugir de
mim e, quando o chamo para acertar as contas, ele me diz que, por
ser pastor, não posso cobrar de minha ovelha, e por isso não me
pagará. Neste caso, eu o perdoarei, mas quando ele precisar de um
empréstimo novamente, antes de lhe emprestar algo, checarei se
houve arrependimento genuíno, pois, apesar de tê-lo perdoado, se
ele não se arrepender, não preciso voltar a lhe fazer um empréstimo.
Contudo, se a atitude dele for outra, se ele me pedir perdão pelo
atraso no pagamento e explicar que pagará quando puder, por mais
120 21 dias com Jesus no Monte

absurdo que pareça, neste caso devo perdoar, e até mesmo emprestar
de novo, se perceber que houve mesmo arrependimento.
Geralmente, julgamos as outras pessoas pelas ações, mas nós
mesmos pelas intenções. Queremos que todos entendam que não
foi nossa intenção aquele erro, mas ignoramos as justificativas dos
outros. Em geral, exigimos justiça para os outros, mas queremos
misericórdia para nós mesmos.

Liberando o perdão
O perdão é uma decisão e não um sentimento. Quando resol-
vermos perdoar, os sentimentos virão. Há determinadas atitudes
que ninguém pode tomar por nós, uma delas é nos arrepender, a
outra é perdoar. Nessas duas questões de nossa vida, somos nós que
devemos agir e mais ninguém. Devemos abandonar todo sentimen-
to de justiça própria, reconhecer que somos pecadores, sem exigir
vingança nem planejar retaliação, e simplesmente nos colocarmos
nas mãos do Juiz de toda a terra.
Precisamos pedir a Deus para nos mostrar como Ele vê o agressor
e liberar a bênção de Deus sobre ele, decidindo nunca mais nos lem-
brarmos da ofensa nem mencioná-la para outros. Em uma atitude
de fé, pela vontade de Deus, devemos decidir perdoar e abençoar
o ofensor, mesmo que tenhamos ficado profundamente ofendidos.

7. Não nos deixe cair quando tentados


Somente aqueles que se reconhecem frágeis orarão desta maneira.
Devemos orar para o Senhor nos guardar de roubar o patrão, de
ceder ao adultério ou à fornicação. Quantos casos temos ouvido a
respeito de roubo no trabalho, especialmente em repartições públi-
cas! Sabemos de funcionários que levam canetas, papel higiênico,
saem mais cedo e outras coisas semelhantes. Criticam o roubo dos
políticos, mas fazem o mesmo em seu trabalho.
Quando temos uma atitude de arrogância, como se fôssemos
incapazes de cair, como se nenhuma dessas coisas do mundo nos
Como orar no Reino – Mateus 6.9-15 121

atraísse, jamais oraremos para Deus nos guardar. Quanto mais


crescemos no reino de Deus, mais devemos orar para que o Senhor
nos guarde das tentações – pois elas virão – e clamar para sermos
guardados do pecado e do escândalo.
Se pensarmos que podemos suportar qualquer coisa e vencer
qualquer luta, então não oramos. Sabemos que Jesus foi tentado
e testado e nós o seremos da mesma forma. Mesmo sendo pastor,
vivendo uma vida separada para Deus, não quero passar uma ima-
gem errada para os irmãos de que não sou tentado, pois preciso
orar a cada dia para que o Senhor não me deixe cair em tentação.

8. Livra-nos do mal
Neste ponto precisamos entender que estamos inseridos numa
verdadeira guerra espiritual. Por um lado, sabemos que o diabo é o se-
dutor e tentador, e por isso oramos para não cairmos quando tentados.
Por outro lado, reconhecemos que o inimigo é o destruidor e
ele tentará de todas as formas destruir nosso conforto, nossa alegria,
nossa vida, família e tudo o mais. Precisamos orar constantemente
pedindo a proteção de Deus.
Sempre oro para o Senhor me guardar do motorista imprudente,
do roubo, do assalto e de todo mal que possa suceder a mim e aos
meus. Assim, estou fazendo o que Jesus me orientou a fazer, pois
vivemos em um mundo mau e estamos suscetíveis aos ataques do
inimigo que está no mundo. Não me refiro a uma atitude neurótica
de achar que tudo pode ser uma tragédia, mas precisamos entender
que estamos no mundo. Jesus orou para que fôssemos guardados do
mal e nos ensinou que deveríamos também orar por isto.

9. Teu é o reino, o poder e a glória


Reino, poder e glória são tudo o que o homem natural anda
buscando. Eles são a expressão do nosso ego, que quer ser deus, e
por isso precisamos entregar tudo a Deus.
122 21 dias com Jesus no Monte

O Reino nos fala de bens, riquezas, respeito e reconhecimento.


Todo homem procura essas coisas e até mesmo fica ofendido quando
não alcança esse objetivo. Todos queremos construir um reinozinho
pessoal, pensando que com isso encontraremos a realização.
Poder é aquele desejo íntimo de mandar, de ter a primazia, de
ter a realização de ser obedecido pelos outros. O poder também
nos fala de dons e capacidades – podemos fazer certas coisas que os
outros não podem. Isso nos faz sentir felizes e realizados.
E por fim, um ponto realmente crucial do ego: o elogio e a glória.
Há um desejo íntimo em todo homem de ser louvado, reconhecido
e admirado. Ao orar “Tua é a glória” somos libertos a cada dia deste
desejo íntimo do ego.
A vida de cruz consiste em abrir mão do reino, do poder e da
glória. Este modelo de oração é para aqueles que estão andando
em liberdade do pecado, do diabo e de si mesmos. Nós cantamos
e dizemos que a força, a glória, a sabedoria, o poder e a majestade
pertencem a Deus porque todos, inconscientemente, estamos bus-
cando essas coisas. Precisamos declarar, dia após dia, que tudo isso
pertence a Deus.
Esta é a parte de louvor e adoração dentro do modelo da oração
do Pai Nosso. Toda oração deve terminar em louvor e adoração a
Deus, em uma atitude de reconhecimento daquilo que não somos
e do que Deus é. Reino, poder e glória pertencem somente a Deus.
É a adoração genuína que trata definitivamente com o ego e a in-
dependência do homem.
12º Dia

A espiritualidade
do Reino: o jejum
– Mateus 6.16-18

Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como


os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de
parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo
que eles já receberam a recompensa. Tu, porém, quando
jejuares, unge a cabeça e lava o rosto, com o fim de não
parecer aos homens que jejuas, e sim ao teu Pai, em
secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.
(Mateus 6.16-18)
Este trecho do Sermão do Monte continua tratando da espiri-
tualidade no reino de Deus. No primeiro versículo o Senhor diz
para nos guardarmos de exercer a nossa justiça diante dos homens.
Em outras palavras, o que nós fazemos no reino de Deus, não o
fazemos para os homens.
Qual o motivo de tentarmos agradar os homens? Agradar a nós
mesmos, alimentar nosso ego. O texto não menciona o ego, mas é
124 21 dias com Jesus no Monte

ele que está em evidência, que deseja aparecer, que deseja a glória.
É o nosso ego que quer o reino, o poder e a glória.
Uma vez que nosso eu e nosso orgulho desejam essas coisas, o
Senhor nos fala que não é possível servir a Deus sem negar a si mes-
mo, esse é o princípio que percebemos nas entrelinhas. Todo aquele
que deseja ser visto pelos homens precisa negar a si mesmo, ou seja,
primeiro deve guardar-se de exercer sua justiça diante dos homens.
De outra sorte, disse Jesus, não terá galardão junto ao Pai Celeste.
O Senhor promete galardão para três ações: orar, dar esmolas
e jejuar. Dar é a primeira expressão da espiritualidade do reino de
Deus no Novo Testamento. Ninguém pode dizer que é espiritual
sem dar algo para alguém. Nosso Pai é um doador. A Bíblia diz que
Deus amou o mundo de tal maneira que deu Seu Filho Unigêni-
to, isto é, deu tudo o que tinha, o máximo que podia dar. Deste
modo, se quisermos nos tornar semelhantes a nosso Pai Celeste
e viver de acordo com os padrões do Reino, a primeira coisa que
devemos fazer é dar. Todavia, não podemos nos esquecer de dar
sem a intenção de sermos vistos pelas pessoas. Caso contrário, não
ganharemos galardão.
Como já vimos, há dois tipos de galardão, o de Deus e o dos
homens, e ambos se aplicam ao ato de dar esmolas, à oração e, como
veremos a partir de agora, ao hábito de jejuar. Muitos carregam
conceitos errados a respeito do jejum, mas quero esclarecê-los aqui.
Em primeiro lugar, o jejum não é simplesmente ficar sem comer.
Isso é dieta ou greve de fome, mas não é jejum. Ele também não é
algum tipo de penitência praticada por fanáticos, nem algo para ser
feito apenas por monges que vivem trancados em algum mosteiro.
Falando de maneira simples, o jejum é a abstinência de comida para
um propósito espiritual.
No capítulo 6 de Mateus, quando Jesus dava a constituição do
Reino, Ele falou de três coisas que todo discípulo deveria fazer e
ensinou a maneira correta de fazê-las. Ele disse:
™™ “Quando deres...” (v. 2);
A espiritualidade do Reino: o jejum – Mateus 6.16-18 125

™™ “Quando orardes...” (v. 5); e


™™ “Quando jejuardes...” (v. 16).
Ofertar, orar e jejuar são as três dobras de uma corda espiritual
que não pode se romper (Ec 4.12). Essas três coisas, quando prati-
cadas juntas, produzem solidez na vida do discípulo.
Todos concordam com a oração, alguns ofertam, mas poucos
cristãos realmente possuem a disciplina do jejum. Precisamos apenas
nos lembrar de que Jesus, que podia todas as coisas, teve de jejuar,
muito mais nós teremos de fazê-lo para romper as cadeias espirituais.
É interessante que todos os crentes enfatizam a necessidade de
contribuir e de orar, mas a maioria ignora a importância do jejum.
Contudo, Jesus colocou estas três atitudes juntas: contribuição,
oração e jejum.
No verso 16, o Senhor diz: “Quando jejuardes, não vos mostreis
contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim
de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já
receberam a recompensa”. A recompensa da qual o Senhor fala aqui
é o elogio. Aqueles que fazem questão de mostrar aos outros que
estão jejuando e obtêm os elogios que tanto buscaram, esses já re-
ceberam a recompensa.
Não é fácil identificar um hipócrita, mas o Senhor nos dá al-
gumas pistas:
™™ Vive buscando o louvor dos outros, em vez de agradar ao
Senhor (Mt 6.2,5);
™™ Veste-se com aparência de justiça, mas seu coração não está
ali (Mt 15.7, 23.25,27);
™™ Tem uma visão legalista da vida cristã e de como os outros
devem vivê-la (Mt 23.23);
™™ É seletivo em sua obediência a Deus (obediência seletiva é
desobediência) (Mt 23.23; Lc 6.46);
™™ Está mais interessado em criticar e condenar do que em
aprender a verdade (Lc 11.53,54);
126 21 dias com Jesus no Monte

™™ Reconhece as falhas dos outros, mas não a sua própria (Lc


6.41,42);
™™ Rebaixa os outros para se sentir melhor consigo mesmo
(Pv 11.9);
™™ Tem cauterizada a própria consciência. Pecado e castigo já
não podem afetá-lo (1Tm 4.2; Jó 36.13);
™™ Professa ser salvo, mas, em seu coração, ele sabe a verdade
(Mt 7.21-23).
Tu, porém, quando jejuares, unge a cabeça e lava o
rosto (v. 17)
Quando jejuavam, os fariseus ficavam tristes, deixavam os ca-
belos desarrumados, não escovavam os dentes e deixavam a “cara
amassada”. Mas Jesus disse que devemos fazer diferente. Naquela
época, as pessoas ungiam a cabeça com óleo, mas hoje podemos
usar um gel nos cabelos, o que dará uma aparência renovada, lavar
o rosto, as mulheres podem se maquiar, tudo para evitar a aparência
de que estamos em crise.
Normalmente, admiramos mais a espiritualidade de João Batista
do que a do próprio Senhor Jesus. Quando encontramos alguém
que não come quase nada, se veste de forma austera e vive recluso,
logo concluímos que se trata de alguém espiritual. Mas o nosso pa-
drão é a espiritualidade de Jesus. Quem olhava para o Senhor não
via nEle aquele comportamento tido como o mais espiritual. Os
evangelhos dizem que Ele foi chamado de beberrão e comilão pelos
fariseus. E o motivo é bem claro: João Batista morava no deserto,
mas Jesus morava numa casa normal; João comia gafanhoto com
mel silvestre, Jesus comia peixe, carne e tomava vinho; Ele também
aceitava convites para festas de casamento e, certamente, não ficava
no cantinho, carrancudo, mas participava da festa e se divertia; João
Batista usava roupa de pêlo de camelo, mas Jesus se vestia tão bem
que, quando morreu, os soldados sortearam suas vestes.
Jesus tinha uma espiritualidade que contrariava os fariseus. A
Bíblia não diz que Ele era alegre, mas podemos deduzir que sim,
A espiritualidade do Reino: o jejum – Mateus 6.16-18 127

pois ela conta que as crianças pulavam em cima dEle a ponto de os


discípulos terem de proibi-las. E como todos nós sabemos, crianças
não pulam em cima de alguém carrancudo e amuado, com aparência
de espiritual. Se Jesus fosse assim, as crianças ficariam longe dEle,
mas Ele era uma pessoa amável e afável. Porém alguns, quando re-
solvem ser espirituais, tornam-se carrancudos e severos.
Quando me converti, me ensinaram que rir era algo carnal, então
eu ficava sério. Mas aquilo era uma tortura para mim, porque sou
risonho por natureza. Mas, como aprendi que homens de Deus eram
sérios, era assim que eu vivia. Não saía da minha boca nenhuma
palavra que não fosse para edificação (e “destruição” também). Eu
achava que isso era ser espiritual. Coisas de criança na fé.
Há tempo e lugar para tudo. Por isso, quando quisermos jejuar,
devemos ficar em casa e não ir jejuar na casa do vizinho nem em
alguma festa. Tudo tem seu tempo e lugar. Festa é para festejar, e se
não quisermos ser rudes, e de certa forma até agressivos com aqueles
que estão festejando, é melhor ficarmos em casa. A espiritualidade do
Reino não agride porque ela é equilibrada. Aqueles que a possuem
fazem o que devem fazer, na hora e no lugar adequados.
No Reino, o Senhor olha o coração e não o exterior. Portanto,
ao jejuarmos, devemos lavar o rosto, ungir a cabeça, vestir uma boa
roupa e manter o semblante alegre para que ninguém precise per-
guntar se estamos bem. Isso faz parte da verdadeira espiritualidade.
Obviamente, isso não significa que tudo o que nós fizermos
precisa ser em oculto. Esse não é o padrão de Deus. O Senhor não
quer que oremos somente trancados no quarto. O apóstolo Paulo
nos orienta: “Quero, portanto, que os varões orem em todo lugar, le-
vantando mãos santas...” (1Tm 2.8 – grifo nosso). “Em todo lugar”
inclui as casas, as praças, as ruas... Há momentos em que oramos
em público, outros em que toda a igreja é convocada a jejuar por
alguns dias, e o Senhor não quer que nos escondamos ou nos pri-
vemos disso. O que Ele quer é que não façamos essas coisas com a
128 21 dias com Jesus no Monte

intenção de sermos elogiados pelos homens. O Senhor está olhando


nossa intenção, nosso coração.
O coração do homem é enganoso. Ele pode nos levar a fazer
muitas coisas apenas pelo desejo de aparecer, de ficar sempre em
evidência, ser visto, elogiado, colocado acima dos demais. Isso é
obra do ego. É uma praga maligna que o diabo injetou em nós.
...com o fim de não parecer aos homens que jejuas, e
sim ao teu Pai, em secreto; e teu Pai, que vê em secreto,
te recompensará. (v. 18)
A Bíblia não menciona que os discípulos de Jesus jejuavam, e
eles não o faziam. Mas sabemos que os discípulos dos fariseus e de
João jejuavam. Em Mateus lemos:
Vieram, depois, os discípulos de João e lhe pergunta-
ram: Por que jejuamos nós, e os fariseus muitas vezes,
e teus discípulos não jejuam? Respondeu-lhes Jesus:
Podem, acaso, estar tristes os convidados para o casa-
mento, enquanto o noivo está com eles? Dias virão,
contudo, em que lhes será tirado o noivo, e nesses dias
hão de jejuar. (Mt 9.14,15)
Dos três assuntos tratados por Jesus no Sermão da Montanha
com respeito à vida espiritual, há dois que ninguém questiona. O
primeiro é contribuir. Todos reconhecem que devem ofertar. O
segundo é orar. Ninguém diz nada contra a oração. Mas o jejum,
este sim é resistido. Há várias desculpas usadas pelas pessoas para
não jejuar.
Alguns dizem que jejum é um hábito do Velho Testamento. Mas
orar e contribuir também são.
Outros dizem que é da Idade Média. Mas, assim como o jejum,
a pregação e até o púlpito também são e ninguém diz nada.
Dizem que jejum era coisa de fariseu, mas os discípulos de João
também jejuavam.
A espiritualidade do Reino: o jejum – Mateus 6.16-18 129

Outros afirmam que o que importa no Novo Testamento é o co-


ração, e o jejum é físico. Ora, Deus olha o coração, mas precisamos
trazer nosso corpo como um sacrifício vivo (Rm 12.1).
Todos temos mil desculpas para não jejuar, mas precisamos
entender que Jesus não aboliu o jejum. A Palavra menciona três
pontos, formando então um tripé, mas se faltar um deles, não há
como se manter de pé. O fato é: não há cristianismo bíblico sem
jejum genuíno.

O jejum é a vontade de Deus


A Palavra de Deus nos mostra algumas práticas às quais o jejum
está associado:
™™ Renúncia – Certamente, temos muito a renunciar. Preci-
samos abrir mão dos desejos da carne para que o espírito
prevaleça. Jejuar é entrar na morte para que a vida de Deus
possa fluir;
™™ Disciplina – Não há cristianismo sem disciplina, e o jejum
faz parte de nossa vida cristã. Mortificar a carne é essencial
para aqueles que desejam caminhar com o Senhor. Não po-
demos pensar que orar ou ofertar são suficientes. Do mesmo
modo como Jesus não ordenou, mas nos deu orientações a
respeito da oração e das ofertas, Ele o fez a respeito da prática
do jejum, e disse que quando partisse chegaria o tempo em
que nós teríamos que jejuar, e esse tempo chegou;
™™ Humilhação (Sl 35.13 e Is 58.3-5) – No linguajar do Ve-
lho Testamento, sempre que alguém se humilhava diante
de Deus, o fazia com panos de saco e com cinzas na cabeça.
Hoje as cinzas e o pano de saco não são mais necessários,
mas Jesus não aboliu o jejum;
™™ Arrependimento (Ne 9.1,2; Jn 3.5; Dn 9.2 e At 9.9) –
Todas as vezes em que a Bíblia menciona que alguém se
arrependeu, essa pessoa o fez com o jejum;
130 21 dias com Jesus no Monte

™™ Oração (Ex 24.18; 2Cr 20; Et 4.16; Ed 8.21; Mt 4.1,2;


At 13.1-3 e 14.23) – Mais do que qualquer outra prática, o
jejum está associado à oração. Jejum é oração intensificada;
™™ Frutificação – Não há mover de Deus sem a disposição de
entrar na morte, pois para que outros tenham vida, alguém
tem que morrer, e jejum é um tipo de morte. Muitos querem
ter fogo do céu, mas não querem jejuar. Querem o poder de
Deus, querem ver almas se converterem, mas não querem
jejuar. O jejum tem o poder de mudar realidades, de trazer
mover e avivamento.
O jejum possui um grande poder espiritual. Creio que ele é como
uma bomba atômica dada pelo Senhor para destruir as fortalezas
espirituais do diabo e liberar um grande reavivamento espiritual e
uma grande colheita em todo o mundo.

Tipos de jejum
Valnice Milhomens nos dá uma classificação de alguns tipos de
jejum apresentados na Palavra de Deus, todos envolvendo absti-
nência de alimento.

O jejum absoluto
É o jejum em que nos abstemos de comer e beber. A Bíblia
não menciona jejum absoluto de mais de três dias, pois esse é o
tempo máximo que o ser humano pode viver sem água. Portanto,
biblicamente, o jejum absoluto não pode ultrapassar três dias. Eu,
particularmente, recomendo apenas um dia, das 6 horas da manhã
às 6 da tarde.
Em todos os casos de jejum absoluto, as pessoas envolvidas
estão enfrentando alguma crise que as lança numa busca de Deus
tão intensa, que o desejo de comer e beber facilmente desaparece.
É uma experiência de necessidade muito intensa.
Paulo é um exemplo disso. No caminho de Damasco encontra-
-se com o próprio Cristo, que se revela a ele e o confronta. Assim,
A espiritualidade do Reino: o jejum – Mateus 6.16-18 131

diante de uma experiência tão sobrenatural, ele se entrega totalmente


ao jejum e à oração.
Esteve três dias sem ver, durante os quais nada comeu,
nem bebeu. (At 9.9)
Ester é outro exemplo, como podemos ver a seguir:
Vai, ajunta a todos os judeus que se acharem em Susã,
e jejuai por mim, e não comais, nem bebais por três
dias, nem de noite nem de dia; eu e as minhas servas
também jejuaremos. Depois, irei ter com o rei, ainda
que é contra a lei; se perecer, pereci. (Et 4.16)

O jejum normal
O tipo mais comum é o jejum normal. Um exemplo desse tipo
é o jejum de Jesus, sobre o qual lemos que Ele não comeu, mas a
Bíblia não afirma que Ele não tenha bebido. Diz que Ele teve fome,
mas não que tenha tido sede. Daí concluirmos que Ele bebeu, pois
água não é alimento. Podemos viver sem comer por até 40 dias,
pois o corpo usa suas reservas armazenadas, porém não sem beber.
Naturalmente, o período desse tipo de jejum pode ser menor do
que quarenta dias.
Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e
foi guiado pelo mesmo Espírito, no deserto, durante
quarenta dias, sendo tentado pelo diabo. Nada comeu
naqueles dias, ao fim dos quais teve fome. (Lc 4.1,2)
Quando há um jejum sem água, a Bíblia sempre menciona que
a pessoa não comeu nem bebeu. E como já vimos, a Bíblia não cita
um jejum sem água por mais que três dias. Concluímos, portanto,
que o jejum normal, ou comum, é abstinência de alimento, mas
não de água.
Não existe qualquer referência bíblica que possa sugerir que o je-
jum envolva abstinência do sono. A Bíblia faz distinção entre vigílias
e jejuns (2Co 6.5,11.27). Se a abstinência do sono fosse necessária
132 21 dias com Jesus no Monte

ao jejum, a menos que houvesse uma intervenção sobrenatural,


ninguém poderia dedicar-se a períodos mais longos de jejum, pois
o corpo exige sono antes mesmo de água e alimento.

O jejum sobrenatural
Temos referências a jejuns absolutos prolongados, mas que cer-
tamente são de caráter sobrenatural, pois naturalmente as pessoas
não poderiam ter sobrevivido. O primeiro deles é o de Moisés. Por
duas vezes, praticamente sem intervalo, ele esteve por quarenta dias
e quarenta noites na presença de Deus no monte, durante os quais
não comeu nem bebeu.
Subindo eu ao monte a receber as tábuas de pedra, as
tábuas da aliança que o SENHOR fizera convosco,
fiquei no monte quarenta dias e quarenta noites; não
comi pão, nem bebi água. Prostrado estive perante o
SENHOR, como dantes, quarenta dias e quarenta
noites; não comi pão e não bebi água, por causa de todo
o vosso pecado que havíeis cometido, fazendo mal aos
olhos do SENHOR, para o provocar à ira. Dt (9.9,18)
Moisés estava na real presença de Deus, envolvido por Sua glória,
e certamente em suspensão de sentidos. Não era um jejum natural,
como aquele que fazemos e como o que Jesus fez.
Outro caso é o de Elias. Sua jornada para o monte Hore-
be parece ter sido feita em um período de jejum absoluto de
quarenta dias. Se assim aconteceu, também deve ter sido uma
experiência sobrenatural.
Levantou-se, pois, comeu e bebeu; e, com a força
daquela comida, caminhou quarenta dias e quarenta
noites até Horebe, o monte de Deus. (1Re 19.8)
Uma caminhada tão longa por um deserto abrasador, em jejum
absoluto, seria suicídio. Mas o alimento e a bebida que o anjo lhe
trouxe habilitaram-no a tal proeza.
A espiritualidade do Reino: o jejum – Mateus 6.16-18 133

É interessante notar o paralelo entre esses dois representantes da


Velha Aliança. Moisés, o que trouxe a Lei, e Elias, seu restaurador
(Ml 4.4-6; Mc 9.12). Ambos passaram por um jejum sobrenatural,
tiveram o fim de sua vida terrena de modo sobrenatural, bem como
uma reaparição sobrenatural com Cristo no monte da transfiguração.

O jejum parcial
O jejum parcial fala de uma dieta restrita, da abstinência de
alguns alimentos apenas. O exemplo clássico é o jejum de Daniel.
Naqueles dias, eu, Daniel, pranteei durante três sema-
nas. Manjar desejável não comi, nem carne, nem vinho
entraram na minha boca, nem me ungi com óleo algum,
até que passaram as três semanas inteiras. (Dn 10.2,3)
Trata-se de um jejum parcial. Não se diz qual a sua dieta, e
supomos que talvez fosse a mesma do início de sua carreira na Ba-
bilônia: legumes para comer e água para beber. O fato é que não
comeu manjares deliciosos.
Existe um valor muito grande neste tipo de jejum e, no caso de
Daniel, ele culminou com uma tremenda visitação de um anjo de
Deus que lhe trouxe uma revelação indispensável à nossa compre-
ensão das batalhas que se travam nas regiões celestes.
No Novo Testamento, encontramos João Batista com uma dieta
bastante restrita: gafanhotos e mel silvestre. Neste caso, ele levou
uma vida em jejum parcial.
O jejum parcial permite muitas variações, incluindo casos em
que um único tipo de alimento pode ser usado durante todo o
período de jejum.

A duração do jejum
Quanto à duração do jejum, na Bíblia vemos que ele pode durar
desde uma noite até quarenta dias:
134 21 dias com Jesus no Monte

™™ Uma noite – o período em que Dario jejuou quando Daniel


foi lançado na cova dos leões (Dn 6.18);
™™ 1 dia – Esdras e seu povo, junto ao rio Ava, na Babilônia,
antes de seu regresso a Jerusalém (Ed 8.21-23);
™™ 3 dias – Ester e os judeus em Susã, diante do decreto de
Hamã para exterminar a nação (Et 4.3);
™™ 21 dias – Daniel, orando e clamando por seu povo, bus-
cando revelação de Deus (Dn 10.2,3);
™™ 40 dias – Moisés no monte com Deus, por duas vezes, re-
cebendo as tábuas da Aliança e intercedendo pelo povo em
pecado (Êx 24.18; 34.28; Dt 9.9,18).
Aqueles que nunca jejuaram não devem começar com jejuns
prolongados logo de uma vez. O melhor é começar jejuando até
meio-dia; depois, da meia-noite até as 6 da tarde; em seguida, por
24 horas e ir aumentando gradualmente. Porém, não devemos ficar
sem jejuar. Todo aquele que se diz cristão tem que praticar o que
o Senhor diz no Sermão do Monte, e Ele fala a respeito do jejum.
Mesmo que não entendamos as razões e implicações de tudo
isso, devemos jejuar. Mas não como um sacrifício, uma barga-
nha para comprar a bênção de Deus, nem como uma penitência
para agradá-Lo ou ser aceito por Ele. O jejum não é para isso,
mas para disciplinar o corpo, intensificar a oração e liberar fé. O
jejum não é para Deus, mas para nós. Deus não ganha nada com
nosso jejum; quem ganha somos nós. Portanto, nossa atitude no
jejum é fundamental.
Fazer jejum sem uma mudança de vida e de comportamento
também não adianta. Isso é apenas parar de comer. Temos que aban-
donar o pecado, andar em santidade, disciplinar nossos hábitos do
dia-a-dia: cuidar do que dizemos, lemos, assistimos e aonde vamos.
O tempo de jejum está associado também à santificação e se-
paração para Deus. Portanto, não aconselho alguém a fazer jejum
absoluto trabalhando. O jejum parcial é possível, apesar de não ser
A espiritualidade do Reino: o jejum – Mateus 6.16-18 135

o melhor. Contudo, se não tivermos alternativa, podemos fazê-lo


trabalhando mesmo.
Em minha opinião, nesse caso, o melhor é fazer o jejum no final
de semana, iniciando na noite de sexta-feira e encerrando no almo-
ço de segunda-feira. O efeito será tremendo, principalmente se nos
fecharmos no quarto e nos separarmos para Deus, lendo a Palavra,
sem televisão nem literatura que não procede de Deus. Certamente
o Senhor nos recompensará com bênçãos e um galardão.
Portanto, este é o padrão da espiritualidade do Novo Testamento:
a atitude interior, não a aparência exterior. Não devemos fazer nada
com o fim de sermos vistos pelos homens, mas por Deus.
Por outro lado, não devemos julgar ninguém segundo as apa-
rências. Não conhecemos o coração das pessoas, apenas a aparên-
cia exterior. Portanto, cabe apenas ao Senhor julgar nossas ações
e intenções.
13º Dia

O povo do Reino e seus bens


– Mateus 6.19-24

Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra,


onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões es-
cavam e roubam; mas ajuntai para vós outros tesouros
no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões
não escavam, nem roubam; porque, onde está o teu
tesouro, aí estará também o teu coração. São os olhos a
lâmpada do corpo. Se os teus olhos forem bons, todo o
teu corpo será luminoso; se, porém, os teus olhos forem
maus, todo o teu corpo estará em trevas. Portanto, caso
a luz que em ti há sejam trevas, que grandes trevas serão!
Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de
aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a
um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e
às riquezas. (Mt 6.19-24)
Quantas vezes nós sofremos consequências, perdas e danos des-
necessários por não conhecermos as leis de nosso país? Certa vez,
eu e minha esposa nos envolvemos em um acidente de carro e uma
138 21 dias com Jesus no Monte

pessoa ficou ferida. Então, tive que pagar algumas despesas, mas
não sabia que o DPVAT, seguro obrigatório que todo proprietário
de veículo paga no país, cobria aquelas despesas. Sofri perdas por
causa da ignorância.
E não é diferente no reino espiritual. Quando deixamos de co-
nhecer a constituição do reino dos céus, perdemos muitas coisas
e sofremos consequências. A Bíblia nos diz que erramos por não
conhecer as Escrituras nem o poder de Deus. Mas, ao estudar a
constituição do Reino declarada no Sermão do Monte, podemos
ter acesso a esse conhecimento – sendo livres da ignorância – e ser
um povo que é chamado para reinar em vida.
Neste trecho do Sermão do Monte, o Senhor trata da questão
dos bens e das riquezas. Deus está muito interessado tanto na área
particular quanto na esfera pública de nossa vida. A particular está
ligada à oração e ao jejum, que devemos fazer para Deus, que vê em
secreto e nos recompensará. É uma vida íntima e particular com o
Senhor, que somente Ele conhece. A área pública envolve o nosso
testemunho, trabalho e a maneira como lidamos com o dinheiro.
Jesus nos advertiu para fugirmos da hipocrisia religiosa, mas igual-
mente deseja que fujamos do materialismo do mundo secular.
Em Apocalipse, lemos que “Eles, pois, o venceram por causa do
sangue do Cordeiro e por causa da palavra do testemunho que deram...”
(Ap 12.11). A palavra do testemunho não é somente a que é falada,
mas também a palavra vivida e encarnada. Ou seja, nossa vida pre-
cisa falar mais do que nossas palavras. Estudos mostram que 90%
do que aprendemos vem daquilo que vemos, 9% através do tom
de voz e 1% do conteúdo. Portanto, o que somos fala muito mais
do que o que dizemos. Por isso o Senhor está tão preocupado em
falar sobre nosso testemunho em nossa vida pública.
Jesus nos advertiu para fugirmos da hipocrisia religiosa, mas
Ele também quer que fujamos do materialismo do mundo e das
coisas seculares desta vida. A Bíblia nos ensina que ser é muito mais
O povo do Reino e seus bens – Mateus 6.19-24 139

importante do que ter. Contudo, vivemos dias em que tudo gira


em função do ter.
Para vencer o mundo, nós precisamos amar a Deus em primeiro
lugar. Quanto ao diabo, devemos resistir a ele pela fé. Do peca-
do, devemos fugir. Mas, no que diz respeito ao mundo, a única
maneira de vencê-lo é amando a Deus e buscando Seu Reino em
primeiro lugar.
Um dos piores inimigos que temos é o mundo. Muitas vezes as
coisas do mundo não são vistas como pecado, mas têm o poder de
tomar nosso coração e tornar-se o centro de nossa vida, tomando o
lugar de Deus e se tornando um grande problema.
O Senhor nos mostra que estamos diante de duas esferas: a terra
e o céu (vv. 19-21); duas condições físicas, luz e trevas (vv. 22-23);
dois senhores, Deus e as riquezas (v. 24); e duas preocupações, nosso
corpo e o reino de Deus (vv. 25-34). Não podemos nos esquecer
de que jamais devemos tentar navegar com os pés em duas canoas.

1. A questão do tesouro (vv.19-21)


Não creio que nesse ponto o Senhor Jesus ensinasse o ascetismo
franciscano do voto de pobreza. É da vontade de Deus que tenhamos
conforto e suprimento. O Senhor tem o melhor para seus servos,
e a Bíblia nos diz que Jesus veio para nos dar vida em abundância.
No livro de Isaías lemos que, se quisermos e ouvirmos a Deus, co-
meremos o melhor desta terra. E Deus não mudou. Ele continua
querendo que comamos o melhor da terra que Ele criou para nós.
Sendo assim, precisamos esclarecer algumas práticas que o Senhor
não estava proibindo.
Em primeiro lugar, não há maldição alguma em termos bens e
propriedades. A Bíblia jamais proíbe o crente de ter propriedades
como casa e carro.
Em segundo lugar, o Senhor não está proibindo economizar ou
fazer provisão para dias difíceis, nem fazer seguro de vida. O crente
140 21 dias com Jesus no Monte

que não faz provisão para sua família é pior que o incrédulo (Pv 6.6-
8; 1Tm 5.8). Prudência não é incredulidade. No livro de Provérbios,
o Senhor nos manda considerar a formiga, que no verão trabalha
e ajunta para que no inverno tenha o que comer. Assim, sabemos
que ter uma provisão não é errado. A vida é uma alternância de
tempos de vacas magras e tempos de vacas gordas. Quem é sábio
se prepara para os dias de luta.
Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus
caminhos e sê sábio. Não tendo ela chefe, nem oficial,
nem comandante, no estio, prepara o seu pão, na sega,
ajunta o seu mantimento. (Pv 6.6-8)
O Senhor não quer que desprezemos as coisas boas que Ele nos
dá em Sua criação, mas que desfrutemos delas. Tudo foi feito para
nós. Nesse trecho do sermão, Jesus não nos proíbe de gozarmos
das bênçãos da criação de Deus. Na verdade, o que preocupa o
Senhor é nosso coração. Ele quer que desfrutemos, mas que não
coloquemos o coração nas coisas materiais. Podemos ter bens, mas
eles não podem nos ter.

a. Não acumular tesouro na terra


O Senhor proíbe a seus discípulos a acumulação egoísta de bens
e uma vida extravagante e luxuosa. Podemos gozar do melhor que
Ele nos der, mas não devemos ter o coração nas riquezas desta vida,
como desejar ter torneiras folheadas a ouro, achar que ser abenço-
ado é ter um carro importado ou coisas desse tipo. Podemos ter o
melhor de Deus sem ter um coração egoísta.
Não adianta acumular tesouros aqui. Nossa vida na terra é pas-
sageira, mas a vida que recebemos de Deus é eterna. Chegamos sem
nada a este mundo, e daqui não levaremos coisa alguma, a não ser
os tesouros que acumulamos para desfrutar na glória. A Palavra do
Senhor diz que nossas obras nos acompanham, e certamente os
filhos que geramos em Deus serão nossa coroa e tesouro naquele
dia (Ap 14.13; 1Ts 2.19).
O povo do Reino e seus bens – Mateus 6.19-24 141

Creio que o Senhor também quer mostrar o real valor das coi-
sas. De que adianta ter um colchão caríssimo e não ter sono para
dormir nele? Ter dinheiro para comer comidas refinadas todos os
dias, mas não ter apetite? De que adianta ter um carro luxuoso, mas
não ter paz para estacioná-lo em qualquer lugar? Muitas vezes nesse
capítulo, o Senhor menciona a recompensa e, certamente, esses são
os tesouros que devemos acumular no céu.
Se existe algo que poderemos levar conosco para o céu são as
almas que ganhamos e os atos de justiça que praticamos. Fazendo
essas coisas aqui, estaremos acumulando tesouros para nós no céu.
Certa vez, ouvi uma história que ilustra bem essa exortação feita
por Jesus. Muitas pessoas sonham em morar em grandes mansões
no céu, e havia dois homens, ambos crentes, um muito rico e outro
menos abastado. O primeiro estava ajuntando tesouros aqui na ter-
ra, investindo seu dinheiro, construindo e adquirindo propriedades
aqui. O outro não era rico, mas sempre investia o que tinha no
reino de Deus, fosse tempo ou dinheiro, contribuindo com mis-
sões e as obras da igreja. Ao fim de algum tempo, os dois homens
morreram. O que investia no Reino e não era tão rico, chegando
ao céu, encontrou de fato uma grande mansão esperando por ele.
Ficou agradecido e entrou para sua casa celestial. O outro homem,
ao chegar lá, foi levado pelos anjos até sua casa, que não passava de
um barraco muito simples. Assustado, perguntou ao anjo:
— É isso o que você tem para mim? Eu que morava em uma
casa maravilhosa na terra, com muitos quartos, banheiros, suítes e
salas, agora vou morar aqui?
— Olhe, meu querido, – respondeu o anjo – não posso fazer
nada. Construímos a casa aqui com o material que cada pessoa
manda de lá, e isso foi o que você mandou da terra para o céu du-
rante sua vida.
Nossa recompensa no céu está intimamente relacionada com
a questão das riquezas desta vida. Tudo depende de onde temos
142 21 dias com Jesus no Monte

acumulado nosso tesouro. Acumular tesouro no céu significa fazer


algo na terra que tenha repercussão no céu. Quando investimos
o que temos para contribuir com a obra, para salvar vidas, nosso
investimento será revertido em tesouros no céu, assim como Jesus
disse ao jovem rico:
Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende os teus
bens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu; depois,
vem e segue-me. (Mt 19.21)

b. O coração segue o tesouro


O Senhor Jesus disse: “...onde está o teu tesouro, aí estará também
o teu coração” (Mt 6.21). Precisamos enviar nosso tesouro para o céu
a fim de que também o nosso coração esteja lá. E o tesouro deve
chegar ao céu antes de nós. Assim, se desejamos que nosso coração
esteja no céu, devemos levar nosso tesouro para lá enquanto ainda
estamos neste mundo.
Essa é uma questão muito séria, pois é muito difícil alguém
dizer que de fato tem um coração em Deus se seu bolso também
não estiver nEle. A igreja não está atrás do dinheiro de ninguém, e
muito menos Deus precisa do nosso dinheiro. A Bíblia diz que Ele
é o dono do ouro e da prata; Ele pode todas as coisas e tudo está no
domínio de Suas mãos. Mas Deus está interessado em nosso coração.
Em lugar algum a Bíblia menciona que o próprio Jesus repre-
enderá algum demônio, pois Ele nos deu autoridade sobre todos
os poderes das trevas e somos nós que devemos repreendê-los.
Contudo, existe um demônio em especial que, segundo a Bíblia,
o próprio Deus é quem vai repreender: o devorador, um demônio
que está relacionado ao dinheiro e que, creio eu, deve ser o pior,
para necessitar que o próprio Deus o repreenda.
Quantas vezes temos sido envolvidos pelas coisas desta vida?
Quantas vezes ficamos embriagados com o ter coisas? Precisamos
vigiar. A única coisa que levaremos daqui são as vidas que geramos.
O dinheiro que ganhamos serve apenas para os dias que vivemos
O povo do Reino e seus bens – Mateus 6.19-24 143

aqui, e jamais devemos fazer dele o nosso tesouro, nem depositar


nossa confiança em coisas materiais, porque todas elas passarão. Só
o que não passa é a vida de Deus, é o que construímos nEle.
É tempo de voltarmos nosso coração para Deus, de nos guar-
darmos e fugirmos das garras de Mamom, que é o deus da riqueza,
“convertendo” nosso bolso e nossas riquezas a Deus e, acima de
tudo, amando somente o Senhor, profundamente. Quem ama este
mundo não pode amar a Deus.
É importante lembrarmos que a questão não é o quanto ofer-
tamos, mas o quanto obedecemos. Ninguém deve nos dizer com
quanto devemos contribuir com o reino de Deus, pois é o Espírito
Santo quem fala ao nosso coração. E, quando Deus falar, temos que
ser obedientes para que assim ajuntemos tesouro no céu, onde a traça
e a ferrugem não corroem. E certamente Deus está preparando um
lugar maravilhoso para aqueles que têm ajuntado tesouro no céu e
não têm se vendido ao deus deste século.

2. A visão (vv. 22-23)


Jesus diz que os olhos podem ser bons ou maus. Naturalmente,
Ele não estava se referindo ao órgão físico, mas à nossa visão, que
é a luz do nosso corpo. No original, a palavra “bom” poderia tam-
bém ser traduzida como “simples”. Assim, poderíamos dizer que se
os olhos forem simples, todo o corpo será luminoso, pois os olhos
dão luz ao corpo.
Quando falamos da visão, há três aspectos que precisamos con-
siderar: foco, desejo e atitude.

a. Foco
Não podemos focalizar duas coisas ao mesmo tempo, se o fizer-
mos, ficaremos paralisados. Porém, se focalizarmos nossa atenção
em apenas um alvo, poderemos nos mover tranquilamente em
direção a ele.
144 21 dias com Jesus no Monte

Ter o corpo em trevas significa não poder enxergar para andar


ou fazer coisas. Assim, se tentarmos focalizar as coisas deste mundo
e, ao mesmo tempo, as coisas do céu, fatalmente cairemos. Este é
o motivo pelo qual muitos crentes têm caído, porque estão dividi-
dos, sua visão já não é mais simples e objetiva; estão empacados e
não podem se mover para crescer ou avançar nas coisas de Deus,
pois estão olhando ao mesmo tempo para Deus e para o dinheiro.

b. Desejo
Na Palavra de Deus, o coração está intimamente ligado aos
olhos. Por isso o Senhor trata desta questão imediatamente após
falar do coração.
Visão é o desejo ardente de nosso coração, é aquilo que nos im-
pulsiona. E o Senhor nos mostra que não devemos direcionar nosso
desejo para ter coisas por um motivo bastante simples: se desejarmos
as coisas do reino de Deus, estaremos na luz, mas se o nosso desejo
estiver no dinheiro, então estaremos em trevas e veremos em nós a
raiz de todos os males.
Porque o amor do dinheiro é raiz de todos os males; e
alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos
se atormentaram com muitas dores. (1Tm 6.10)

c. Atitude
Nossa atitude está sempre de acordo com nossa visão. Portanto,
se a visão for o dinheiro, enxergaremos tudo como um meio para
obtê-lo; veremos um cifrão em cima de cada pessoa ou coisa. Se a
atitude for má, toda a nossa vida será trevas. Muitos casamentos
estão em trevas porque o marido vê a mulher como objeto, e muitas
mulheres veem o marido como um zero à esquerda. Infelizmente,
também há pastores que veem suas ovelhas como meio para alcan-
çarem seus alvos pessoais, como cifrões, etc.
O povo do Reino e seus bens – Mateus 6.19-24 145

Assim, podemos concluir que ter olhos bons é olhar para uma
direção só, o reino de Deus, desejá-lo em primeiro lugar e ter uma
atitude de ver todas as pessoas e coisas como Deus as vê. Da mesma
maneira, se os olhos forem maus, estaremos em trevas e seremos
cegos. Por isso devemos ter em mente a visão espiritual, pois onde
não há visão, o povo se corrompe.
Não havendo profecia [ou visão], o povo se corrompe;
mas o que guarda a lei, esse é feliz. (Pv 29.18 – acrés-
cimo do autor)
É preciso que tenhamos a visão e o conhecimento de Deus e
de Sua obra. E isso é fruto de revelação do Espírito Santo ao nosso
espírito recriado, como vemos na seguinte passagem:
...para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da
glória, vos conceda espírito de sabedoria e de revelação
no pleno conhecimento dele, iluminados os olhos do
vosso coração, para saberdes qual é a esperança do seu
chamamento, qual a riqueza da glória da sua herança
nos santos e qual a suprema grandeza do seu poder para
com os que cremos, segundo a eficácia da força do seu
poder. (Ef 1.17-19)
Essa visão é básica e nos permite avançar no conhecimento de
Deus, mas precisamos também ter uma visão da obra de Deus,
conhecer aquilo que Deus deseja fazer. Alguns conhecem a Deus,
mas nada entendem da Igreja. E sem uma revelação do que é a
Igreja, sua natureza e importância, o que fazemos é apenas um
trabalho humano.
Alguns não são totalmente cegos, mas sua visão é turva. É como
se tivessem um tipo de catarata que os impede de ver com clareza e
à longa distância. Isso aponta para a necessidade de termos clareza
de meios e fins, da nitidez e do alcance da visão. Devemos ter uma
percepção clara e precisa da visão da igreja, pois quando nossa visão
é curta ou nublada, limitamos Deus e Seu poder, restringindo Sua
146 21 dias com Jesus no Monte

ação aos limites do que somos capazes de ver. Deus quer agir nesta
geração, e para isso Ele procura homens que não O limitem com
uma visão estreita.
A respeito dos judeus, Paulo diz que “até hoje, quando é lido
Moisés, o véu está posto sobre o coração deles” (2Co 3.15). Esse véu os
impede de ver, assim como uma mancha nos olhos.
14º Dia

O povo do Reino
e as riquezas
– Mateus 6.24

Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de


aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a
um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e
às riquezas. (Mt 6.24)

Neste trecho Jesus explica que, além da escolha entre dois te-
souros e duas visões, há uma escolha ainda mais radical: entre dois
senhores, Deus e Mamom. A palavra traduzida aqui como riquezas,
no original é “mamom”, um termo de origem hebraica que significa
dinheiro, riqueza ou bens materiais. Portanto, o veredicto do Senhor
é claro: não podemos servir a Deus e a Mamom. Contudo, muitos
tentam esta conciliação impossível:
™™ Servem a Deus aos domingos e a Mamom durante a semana;
™™ Servem a Deus com os lábios e a Mamom com o coração;
148 21 dias com Jesus no Monte

™™ Servem a Deus na aparência e a Mamom na realidade;


™™ Dão a Deus uma parte de sua vida, mas a maior parte
a Mamom.
Existem situações nas quais o dinheiro pode ser usado de maneira
correta, mas precisamos estar atentos, pois ele também pode se tor-
nar uma maldição em nossa vida. Mamom é mais que as riquezas,
é um deus concorrente do próprio Deus verdadeiro, e podemos
fazer dele nossa fonte.
Vejamos algumas características de um deus e, portanto, de
Mamom também.

a. É fonte de provisão
Em primeiro lugar, um deus é aquele que nos dá segurança, e
as pessoas se sentem seguras com o dinheiro, mas não apenas com
Deus. Isso mostra quem realmente é o deus da vida delas. Se tiverem
dinheiro, sentem-se seguras. Mas se precisarem depender de Deus
pela fé, ficam completamente ansiosas.

b. Exige consagração
Uma segunda característica de um deus é que ele exige consagra-
ção e separação. É notório o quanto se exige integridade e transpa-
rência daqueles que lidam diretamente com o dinheiro. Isso acontece
porque Mamom é um deus que exige separação e dedicação a ele.
Para mostrar que não servia a esse deus, Jesus escolheu Judas −
que era ladrão − para ser Seu tesoureiro. É como se Ele dissesse a
Mamom que estava lhe dando o pior.

c. Exige honra
Um deus sempre exige o melhor, e com Mamom não é diferen-
te. É fácil perceber isso ao olharmos os executivos: eles são sempre
os mais capazes e mais bem treinados dentro da sociedade. Se al-
guém tão preparado se torna um pastor, todos ficam abismados. Se
O povo do Reino e as riquezas – Mateus 6.24 149

mandarmos alguém se preparar tanto para servir a Deus, as pessoas


ficarão escandalizadas, mas todos acham normal que os melhores
sirvam a Mamom.
Um deus também determina o valor das coisas. Assim, no rei-
nado de Mamom, aqueles que têm dinheiro, sentem que têm valor;
caso contrário, se sentem sem importância. Para eles, a autoestima é
proporcional ao dinheiro em sua carteira. Se isso acontece conosco,
podemos estar certos de que servimos a Mamom, pois quem sabe
que carrega o Filho de Deus dentro de si possui outra postura.

d. Exige temor
Um deus exige temor de seus adoradores, e a maneira como
Mamom governa é por meio do medo e da ansiedade. Com receio
de ficar sem dinheiro e passar necessidade, as pessoas vivem ator-
mentadas pelo medo de Mamom. Por que as pessoas perdem o sono
à noite? Sobre o que elas ficam pensativas e, muitas vezes, ansiosas?
Isso acontece porque o dinheiro controla a maioria das pessoas.

e. Exige obediência e submissão


A principal característica de um deus é que ele é quem governa.
Sempre que tenho a oportunidade de entabular uma conversa com
alguém, gosto de começar perguntando o que a pessoa faz e se gosta
de sua profissão. Na maior parte das vezes, a resposta é um veemente
não. E quando pergunto o motivo de continuar fazendo o que não
gosta, a resposta é sempre esta: dinheiro. Ao responderem assim,
tais pessoas estão demonstrando quem é o senhor delas. Quando
dizem que trabalham por dinheiro, estão na verdade afirmando que
o dinheiro é seu senhor e é a ele que servem.
É o dinheiro quem tem decidido tudo na vida das pessoas. É
Mamom quem decide:
™™ Quantos filhos devem ter;
™™ Quando devem se casar;
150 21 dias com Jesus no Monte

™™ Se devem ou não ir a uma conferência abençoada;


™™ Se podem ou não ofertar;
™™ Qual profissão devem seguir;
™™ Como devem tratar cada pessoa;
™™ Como devem fazer a obra de Deus.
Nunca deveríamos trabalhar por dinheiro, pois fomos planeja-
dos para trabalhar para Deus. Portanto, o dinheiro deve ser nosso
servo, é ele quem tem que trabalhar por nós, e nós devemos servir a
Deus. Devemos trabalhar por uma visão, por um chamado de Deus.
Se fomos chamados para fazer algo, então façamos pela direção de
Deus e não simplesmente por causa do dinheiro.

f. Exige adoração
E, por fim, a última característica de um deus é que ele exige
adoração. A maioria de nós talvez diga que nunca adorou a Ma-
mom, contudo, fazemos isso não com palavras, mas com atitudes.
Parece duro, mas muitas vezes nossa atitude poderia ser traduzida
em uma oração assim: “Mamom, como te desejo! Se estás comigo,
fico feliz! Mas, quando te vais, meu coração fica ansioso. Tudo faço
para te ter e não há sacrifício grande demais que eu não faça por
ti! Tu és a minha alegria e satisfação, minha segurança e proteção”.

Ministros e mordomos
Todos nós somos ministros e mordomos, mas vivemos tempos
difíceis. É muito comum ligarmos a TV e vermos um pregador
dizendo às pessoas que, se elas se tornarem cristãs e plantarem uma
semente financeira, prosperarão por causa da bênção de Deus. Logo
depois, começa um novo programa e outro pregador diz que, para
alguém se tornar cristão, precisa renunciar a tudo o que tem para
que Deus possa abençoá-lo. Um fala sobre prosperidade, outro
sobre pobreza, e ambos usam as Escrituras como base. Quem está
certo, o que prega a prosperidade ou o que prega a renúncia a tudo?
O povo do Reino e as riquezas – Mateus 6.24 151

Prosperidade ou pobreza, o que é biblicamente correto?


Com respeito ao assunto do dinheiro, existem basicamente três
posições no meio evangélico.

a. Teologia da pobreza
Aqueles que têm essa convicção desdenham das posses materiais.
Eles não são materialistas e consideram as posses como um tipo de
maldição. Seu texto favorito na Palavra de Deus é Lucas 18.22,
no qual o Senhor mandou o jovem rico vender tudo o que tinha e
dar aos pobres. Eles dizem que suas necessidades serão supridas se
tiverem uma atitude de despreocupação, assim, não se preocupam
em prosperar porque buscam o reino de Deus em primeiro lugar.
Tais pessoas acreditam que a pobreza é a vontade de Deus para a
igreja hoje, que o Reino é para os pobres e os que se tornam pobres
se apoderam dele.

b. Teologia da prosperidade
O ponto de vista dos teólogos da prosperidade é que a prospe-
ridade é uma recompensa para os justos. Eles consideram as posses
uma bênção de Deus, e sua escritura favorita é Lucas 6.38: “dai, e
dar-se-vos-á...”. Basicamente, seguem o princípio da semeadura e
colheita, ensinando que, se temos uma necessidade, devemos semear
e Deus nos suprirá em abundância. Seu conceito de prosperidade é
que eles são os donos daquilo que possuem. Para eles, a pobreza não
é a vontade de Deus, antes, trata-se de uma maldição. São preocu-
pados com dinheiro e têm uma vida direcionada para consegui-lo.

c. Teologia da mordomia
É um equilíbrio entre as duas visões, pegando o melhor de ambas.
A perspectiva da mordomia é que a prosperidade é um privilégio e é
dada em variadas proporções. Provavelmente, a parábola dos talentos
é a melhor base para aqueles que creem na mordomia, pois para eles
o ponto central não é o que renunciamos nem o que receberemos,
mas o que temos recebido. A oferta é dada na proporção do que
152 21 dias com Jesus no Monte

se tem recebido. Eles se veem como mordomos de Deus e não se


consideram donos daquilo que possuem. Basicamente, buscam por
sabedoria e procuram ser encontrados fiéis diante de Deus.
Agora, qual das posições é a correta? Antes de responder a essa
pergunta, gostaria de mostrar quatro problemas tanto com a teologia
da pobreza quanto com a teologia da prosperidade.

O problema com a teologia da pobreza


1. Presume que qualquer pessoa bem-sucedida financeiramente
é desonesta
Na verdade, quando os adeptos dessa teologia veem um irmão
rico, assumem uma de duas posições: presumem que a riqueza foi
adquirida de forma desonesta ou julgam a pessoa dizendo que se
ela realmente amasse a Deus, teria dado o dinheiro para missões.
Tais pessoas precisam ler Provérbios 22.2, onde está escrito: “O
rico e o pobre se encontram; a um e a outro faz o Senhor”.

2. Exagera na questão da obra sacrificial


Normalmente, fazem grandes sacrifícios ministeriais e costumam
dizer que Deus os ama porque renunciaram a tudo. Pensam que
quanto mais renunciarem, mais espirituais serão. Mas a verdade é
que Deus não nos ama mais quando renunciamos ou sacrificamos
algo, tampouco nos tornamos mais espirituais porque somos pobres.
Tais pessoas se tornam bastante arrogantes em sua espiritualidade,
colocando-se como padrão para as demais.

3. É extremamente ingênua
Comumente, as pessoas que seguem a teologia da pobreza são
missionários. Tais pessoas são ingênuas porque não percebem que se
todos renunciassem a tudo, não haveria ninguém para sustentá-las.
Elas dependem do sustento de outros que não renunciaram a tudo.
O povo do Reino e as riquezas – Mateus 6.24 153

4. Pode se tornar um estilo de vida manipulador


Pessoas que creem na teologia da pobreza podem, inconsciente-
mente, manipular outras pessoas. Como elas não têm recursos, estão
sempre prontas a falar de suas necessidades pessoais e da obra. Nor-
malmente, pedem oração por suas necessidades, mas na esperança
de que alguém ouça e as ajude. Tornam-se sempre dependentes e,
eventualmente, se transformam num peso para os amigos.

O problema com a teologia da prosperidade


1. Vê a prosperidade como um sinal da aprovação de Deus
Normalmente, os adeptos dessa teologia pensam que se alguém
tem prosperado é porque tem a aprovação de Deus, ou seja, aquele
que é abençoado prospera. São arrogantes a respeito da bênção de
ter do mesmo modo que os da teologia da pobreza são arrogantes
por terem renunciado a tudo. Ambos se apóiam na justiça própria,
julgando-se merecedores da bênção de Deus.

2. É uma teologia que produz culpa


Nada produz mais culpa em um cristão do que lhe dizer que, se
ele realmente servisse a Deus, seria próspero e rico. Sob esse prisma,
alguém que passa por uma luta financeira pode concluir que não
serve a Deus ou não está debaixo de Sua bênção, pois faz uma seme-
adura e nunca colhe o prometido, enquanto outros testemunham
do que receberam. Assim, concluem que não fazem o bastante nem
possuem fé o suficiente para agradar a Deus.

3. Estimula motivações erradas


Precisamos ser cuidadosos com nossa motivação porque podemos
acabar tentando fazer negócios com Deus. É possível que uma pessoa
simplesmente sirva a Deus porque alguém lhe fez a promessa de que
Ele a faria rica ou que receberia cem vezes mais a oferta que deu.
154 21 dias com Jesus no Monte

4. Nega a soberania de Deus


O pensamento é que, depois de algum tipo de transação com
Deus, Ele será obrigado a abençoar uma pessoa porque lhe deve
alguma coisa. Mas o Senhor não deve nada a ninguém. Tudo o que
Ele faz é baseado em Sua graça.
Assim, podemos dizer que a teologia da pobreza tem alguns pon-
tos maravilhosos, pois diz, basicamente, para cuidarmos do pobre e
do necessitado. Por outro lado, a teologia da prosperidade também
tem algo bom, pois nos diz para sermos um canal das bênçãos de
Deus e semear na vida de outros.
Também não podemos dizer que a teologia da pobreza está erra-
da quando diz que o discípulo do Senhor precisa renunciar a tudo
quanto tem para segui-Lo. E precisamos concordar com a teologia
da prosperidade no aspecto de que, se pudermos escolher, é melhor
ser rico do que ser pobre.
Contudo, a mordomia toma o melhor dos dois. Essa teologia
não pergunta a que renunciamos e nem o que receberemos, ela
simplesmente pergunta o que temos feito com o que recebemos de
Deus. Aquele que é mordomo sabe que precisa administrar correta-
mente o que tem recebido e que o Senhor pode requerer dele 10%
ou tudo. Ele é generoso por obediência e não por desejar receber
algo em troca da parte de Deus.

Princípios de mordomia
1. Deus é o dono de tudo (v. 14)
O Senhor somente nos pede que administremos Seus bens. É
exatamente esse o motivo pelo qual falamos de responsabilidade,
pois não temos de fato coisa alguma, mas tudo pertence ao Senhor.
O primeiro princípio que precisamos aprender como discí-
pulos é que temos um Senhor, algo absolutamente vital para ser
entendido quando tratamos da questão financeira. Sem submissão,
nunca prosperaremos.
O povo do Reino e as riquezas – Mateus 6.24 155

A Bíblia afirma categoricamente que Deus é o dono de tudo.


Ao Senhor pertence a terra e tudo o que nela se contém,
o mundo e os que nele habitam. (Sl 24.1)
A Bíblia revela até mesmo os itens específicos possuídos por
Deus, como está escrito em várias passagens:

Também a terra não se venderá em perpetuidade, por-


que a terra é minha... (Lv 25.23)

Minha é a prata, meu é o ouro, diz o Senhor dos Exér-


citos. (Ag 2.8)

Pois são meus todos os animais do bosque, e as alimárias


aos milhares sobre as montanhas. (Sl 50.10)

Então, a terra pertence ao Senhor, assim como o ouro e a prata,


e até os animais do campo. Deus é o Criador de todas as coisas, e
tudo Ele mantém pelo Seu poder.

Sabendo que Jesus é o Senhor, então devemos reconhecer que


Ele é o dono de nossa vida, de nossa casa, de nossos filhos e de
todos os nossos bens. Tudo que temos e somos pertence a Ele. Pri-
meiro porque foi Ele quem criou. Segundo porque Ele, depois de
ter criado, ainda comprou de volta pela redenção da cruz. E, como
se tudo isso não bastasse, em terceiro lugar tudo é dEle porque um
dia Lhe entregamos nossa vida.

Contudo, não podemos nos esquecer de que prestaremos contas


diante do Senhor daquilo que fizemos com o que é dEle. O Senhor
é o dono de nossa vida e, se quisermos ser cristãos vencedores e
discípulos genuínos de Jesus, devemos transferir a Ele a posse, o
domínio de tudo o que temos e somos.
156 21 dias com Jesus no Monte

a. Deus tem o direito de fazer o que quiser com o que Ele


tem nos dado
E disse: Nu saí do ventre de minha mãe e nu voltarei;
o SENHOR o deu e o SENHOR o tomou; bendito
seja o nome do SENHOR! (Jó 1.21)
O proprietário tem o direito, e o mordomo ou servo tem a res-
ponsabilidade. O proprietário define quanto deseja dar a cada um
de seus servos, e os servos devem prestar contas a seu senhor daquilo
que têm recebido.
Às vezes achamos que não é muito justo alguns receberem mais
que outros, mas não devemos discutir como o Senhor administra
aquilo que é dEle.

b. Os recursos de Deus são para alcançar os propósitos dEle


Mordomia é o uso dos recursos de Deus para o cumprimento de
Seus propósitos. Deus nos deu recursos e precisamos usá-los para
que Seu propósito na terra seja alcançado.
A teologia da pobreza não tem para dar, a teologia da prosperi-
dade dá para ganhar mais, mas os mordomos dão porque receberam
de Deus e entendem o propósito dEle.

2. Toda decisão financeira é uma decisão espiritual


Alguns imaginam que são submissos ao Senhor porque dão o
dízimo. Evidentemente, devolver o dízimo é importante, mas não
traduz completamente nossa submissão a Deus. O que fazemos
com os 10% é importante, mas também é importante saber o que
fazemos com os 90% restantes.
Muitos reclamam dizendo não entender por que não prospe-
ram, mesmo sendo dizimistas fiéis. Contudo, não se trata apenas
do dízimo, mas do que se faz com o restante do que se ganha. Al-
guns presumem que, pelo fato de terem entregado o dízimo, estão
liberados para fazerem o que quiser com o resto do dinheiro. A
O povo do Reino e as riquezas – Mateus 6.24 157

verdade porém é que o dízimo não é a única parte que pertence a


Deus: tudo é dEle. Todo o nosso salário é do Senhor. Se temos casa,
ela é de Deus, assim como nosso carro, nossa vida, nossos filhos...
Tudo pertence a Ele.
Cem por cento do que ganhamos, e não apenas dez, precisam
ser gastos debaixo da direção de Deus, porque não nos pertencem
realmente. Precisamos depender totalmente de Deus. Muitos estão
atolados em dívidas porque acham que podem gastar o que sobrou
– após devolverem o dízimo – como bem entender, sem orar e saber
a vontade de Deus.
Obviamente, isso não significa que temos de dar 100% da nossa
renda para a igreja. Deus quer que a mantenhamos conosco, mas
Ele deseja que sejamos mordomos fiéis. O dinheiro que julgamos
ter na verdade pertence a Deus, portanto somos apenas mordomos,
administradores que cuidam do que pertence a Ele. O problema é
quando lidamos com o dinheiro como se ele fosse nosso, e não de-
pendemos de Deus para nos dar direção na hora de gastar ou investir.
Não se pode disfarçar a mordomia. Nosso talão de cheques revela
no que realmente cremos sobre ela. Um crente pode fingir orar, ler
a Bíblia, e pode até fingir em seus relacionamentos, mas não conse-
gue disfarçar sua generosidade no dar. Talvez por isso muitos sejam
excessivamente sigilosos sobre suas ofertas.
A maneira como lidamos com o dinheiro nesta terra determina
se seremos ou não vencedores. Em Mateus 25 vemos que a recom-
pensa pelo que os servos fizeram aqui foi uma posição no Reino. Se
formos fiéis nas riquezas terrenas, ganharemos as riquezas celestiais.

a. Dinheiro e bens são uma ferramenta eficiente que Deus


usa em nossa vida
Deus procura ter nossa atenção, e isso normalmente acontece
quando passamos por uma crise financeira. Deus usa as questões
financeiras para nos ensinar e nos levar à maturidade. No meio da
158 21 dias com Jesus no Monte

tribulação, alguns dizem que ela é um ataque do diabo, outros dizem


que abriram uma brecha espiritual em sua vida, mas os mordomos
perguntam o que o Senhor quer lhes ensinar com isso.

b. Dinheiro e bens são bons testes


É um teste para nós saber se o Senhor pode nos confiar mais ri-
quezas. É interessante que os servos que multiplicaram seus talentos
receberam mais do Senhor. Ele, portanto, olha como lidamos com
o dinheiro para nos confiar mais recursos.
Além disso, a forma como lidamos com o dinheiro hoje vai deter-
minar o que receberemos do Senhor no Reino. John Maxwell conta
que, quando pastoreava uma igreja local, um homem em sua igreja
veio a ele com um problema financeiro. Aquele homem costumava
ganhar 200 dólares por semana e dava fielmente seu dízimo de 20
dólares. Mas agora estava ganhando 10 vezes mais que isso e estava
tendo problemas para conseguir dar o dízimo correspondente. Além
disso, não lhe parecia justo dar tanto, enquanto a maioria dava um
valor que nem sequer chegava perto disso. John Maxwell então o
convidou para se colocar de joelhos e orar sobre isso, proferindo a
seguinte oração:
— Senhor, meu irmão está tendo problemas para obedecer-Lhe,
e seu problema começou quando o Senhor passou a abençoá-lo tan-
to financeiramente. Por isso, Senhor, eu Lhe peço que providencie
circunstâncias em sua vida que possam reduzir seu salário de volta
ao valor com o qual ele costumava ser fiel, para que ele possa mais
uma vez obedecê-Lo!
Ao ouvir isso, o homem deu um pulo e disse:
— Oh, não! Eu posso dar o dízimo, eu consigo dizimar!

c. Dinheiro e bens são uma forma eficiente de testemunho


Não somos conhecidos como cristãos por causa de nossa pobreza
ou de nossa prosperidade, mas pela nossa atitude com relação ao
O povo do Reino e as riquezas – Mateus 6.24 159

dinheiro. Se formos generosos e amorosos, ou avarentos e ganan-


ciosos, isso testemunhará a respeito de nossa realidade espiritual.

3. A quantidade não é o mais importante


Não importa quantos talentos temos, se muitos ou poucos, o
que Deus olha é como lidamos com o que temos recebido. Tanto
o que tinha cinco como o que tinha quatro dobraram seus talentos
e foram igualmente elogiados pelo Senhor e considerados fiéis.
Algumas vezes, aqueles que receberam menos são os mais testa-
dos e se desculpam dizendo que não têm o suficiente. O rico não
dá porque pensa que o valor é alto demais, e o pobre não dá porque
pensa que vai lhe faltar. Deus olha a fidelidade, não o valor.

4. Mordomia requer ação


Algumas pessoas costumam dizer que mordomia é mais que
dinheiro, e que ofertam quando dão seu tempo e seus talentos.
Contudo, há um conceito que devemos guardar bem: mordomia
é mais do que dinheiro, mas nunca menos. Servir a Deus implica
mais do que dar dinheiro, mas nunca menos. Servir a Deus implica
em muitas coisas, mas nunca menos do que ofertar. Quem diz que
serve a Deus e não oferta está, na verdade, se enganando.
15º Dia

O povo do Reino
e a ansiedade
– Mateus 6.25-34

Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida,
quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo
vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a
vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que
as vestes? Observai as aves do céu: não semeiam, não
colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai
celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito
mais do que as aves? Qual de vós, por ansioso que
esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua
vida? E por que andais ansiosos quanto ao vestuário?
Considerai como crescem os lírios do campo: eles não
trabalham, nem fiam. Eu, contudo, vos afirmo que nem
Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer
deles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que
hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais
a vós outros, homens de pequena fé? Portanto, não vos
162 21 dias com Jesus no Monte

inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que beberemos?


Ou: Com que nos vestiremos? Porque os gentios é que
procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe
que necessitais de todas elas; buscai, pois, em primeiro
lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos
serão acrescentadas. Portanto, não vos inquieteis com o
dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados;
basta ao dia o seu próprio mal. (Mt 6.25-34)
Deus tem nos chamado para ajuntar um tesouro no céu. Ele
tem nos convocado para termos um só Senhor e não dois. Temos
aprendido que nossos olhos devem estar focados em Deus e não
nas riquezas, porque não é possível focar duas coisas ao mesmo
tempo. Agora, o Senhor Jesus quer tratar da ansiedade que muitas
vezes toma nosso coração, pois ela é uma questão de ambição e faz
parte do mesmo contexto de juntar tesouro nos céus e de ter os
olhos em Deus.
O versículo 25 inicia com a expressão “por isso, vos digo”, ligan-
do-o ao versículo anterior. Assim, para entendermos melhor essa
conexão, precisamos ler esse trecho junto com o anterior: “Ninguém
pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar
ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir
a Deus e às riquezas. Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa
vida...” (Mt 6.24,25).
Um versículo está ligado ao outro, e todo o texto se relaciona
com a questão de servir a Deus e servir às riquezas. Vivemos uma
vida ansiosa porque estamos interessados na ambição e somos atra-
ídos por ela. E quando temos uma vida cheia de ambições naturais,
vivemos ansiosos, porque a ansiedade é o resultado da ambição que
toma conta do nosso coração.
Jesus considerou que todo ser humano está buscando algo, e
é natural que todos tenham alvos na vida, ambições pelas quais
lutar. As pessoas querem estudar, se formar, se casar, ter filhos, um
trabalho e um ministério na obra de Deus. Tudo isso é correto. O
O povo do Reino e a ansiedade – Mateus 6.25-34 163

errado é quando esses alvos começam a produzir em nós ansiedade,


e as ambições da vida começam a nos atormentar. Não há nada de
errado em ter alvos na vida, tudo depende daquilo em que estamos
colocando nossa atenção.
A ambição é a engrenagem que move o ser humano. É tudo o
que impele, motiva e dá direção à nossa vida, e pode ser positiva ou
negativa. Se a ambição tem como alvo o reino de Deus, é positiva,
mas se é uma ambição simplesmente natural pelas coisas desta vida,
então se torna algo negativo. Quando temos uma ambição negativa,
ela se transforma em ansiedade e angústia.
Podemos ter ambições em Deus e ambições por sucesso ou di-
nheiro. Em função disso, o Senhor coloca a escolha entre buscar o
reino de Deus e a sua justiça, ou buscar as riquezas e a segurança
deste mundo. No que temos colocado nossa ambição? Qual é nos-
sa razão de viver? No que temos gastado nossa vida? O que temos
buscado? Qual é o motivo da nossa ansiedade? Conseguir roupa e
comida? O Senhor Jesus nos diz que não vale a pena vivermos an-
siosos por coisas desta vida, porque a nossa ambição deve ser pelo
reino de Deus. É ele que deve estar no centro do nosso coração.
O Senhor Jesus nos deu a base para vencermos a ansiedade.
Vejamos alguns pontos:

1. O valor real das coisas (v. 25)


No verso 25, o Senhor diz que a vida é mais que o alimento, e
o corpo é mais que a veste. Em outras palavras, não devemos nos
preocupar com aquilo que não é importante. A vida e o corpo é
que são importantes.
Penso que o Senhor quer que vivamos num nível acima do
terreno. Os animais é que vivem em função de comer, beber se
reproduzir e morrer. Nós precisamos transcender.
O Senhor quer que tenhamos a atitude correta. Se os nossos
olhos forem bons, enxergaremos a vida e não o alimento, o corpo
164 21 dias com Jesus no Monte

e não a roupa. Nossa visão determina nossa prioridade. Não pode-


mos devotar nossa existência à busca do conforto e do bem-estar.

2. O valor que temos para Deus (v. 26)


O segundo argumento usado pelo Senhor para vencer a ansieda-
de é entender o valor que temos para Deus. Jesus disse que valemos
muito mais que as aves. Portanto, se Deus cuida delas, cuidará de
nós também. Quando não compreendemos nossa importância para
o Senhor, nos afogamos em ansiedade e angústia. Mas precisamos
entender que não há nada tão pequeno em nossa vida que não seja
importante para Deus.
Por que vivemos com medo do dia de amanhã? Por que nos pre-
ocupamos se conseguiremos pagar a escola de nossos filhos, colocar
comida em casa, ter roupa para vestir? Se Deus dá vestimenta para
uma planta, quanto mais para nós! Se todos os dias um passarinho
ganha de Deus o que comer, quanto mais Seus filhos!
O valor das coisas é o preço que pagamos por elas. E o preço pago
por nós foi o inestimável sangue de Jesus! Por isso, jamais podemos
dizer que não temos valor. Somos muito preciosos para Deus, pois
se não fosse assim, Jesus não teria morrido por nós. Se um só dentre
nós fosse o único pecador do mundo, Ele ainda assim morreria por
este porque, para Deus, uma vida vale mais do que o mundo inteiro.
E é por isto não precisamos ficar ansiosos: Ele cuidará de nós.
Deus cuidará de nossa comida e de nossas vestes. Temos um Deus e
Pai zeloso que cuida de nós! Não precisamos mais viver angustiados
e preocupados, porque não há nada tão grande que Ele não possa
fazer por nós, nem tão pequeno que não seja importante para Deus.

3. Reconheça a inutilidade da ansiedade (v. 27)


Ficarmos ansiosos em nada muda a situação, pois nossa ansiedade
não pode acrescentar um côvado sequer à nossa vida. A ansiedade
não paga as contas, não conserta carro, não restaura casamento. Ela
O povo do Reino e a ansiedade – Mateus 6.25-34 165

não arruma emprego nem cura doenças. A ansiedade não produz


coisa alguma. Portanto, ela é completamente inútil.
De que adianta ficarmos ansiosos, correndo de um lado para
outro tentando resolver tudo de uma vez, muitas vezes sem saber
o que fazer, e não alterar em nada a situação? Tudo o que temos de
fazer é nos acalmar, orar e esperar, pois Deus cuidará de nós!

4. Vencemos a ansiedade pela fé (vv. 28-30)


Precisamos reconhecer que a ansiedade é pecado, pois ela é fruto
da incredulidade. Jesus disse que o ansioso é um homem de pequena
ou nenhuma fé. O incrédulo e ansioso chama Deus de mentiroso,
agredindo Seu caráter, pois pensa que o Senhor está mentindo quan-
do diz que cuida de nós. Ele acha que Deus vai deixá-lo na mão.
Se Deus cuida dos pardais, certamente cuidará de nós também.
Se Ele veste os lírios, nos vestirá também, mas simplesmente não
acreditamos nisso e ficamos desesperados por causa da ansiedade
e da preocupação. Começamos a murmurar dizendo que não
conseguiremos sustentar nossa casa, que morreremos junto com
toda a nossa família ou cairemos na miséria, mas isso é incredu-
lidade. Se conhecêssemos a Deus, se conhecêssemos Aquele que
supre todas as necessidades, não teríamos motivos para ficarmos
ansiosos ou preocupados.
A Bíblia mostra que um dos nomes de Deus é EU SOU, isto
é, EU SOU tudo de que você precisa. Ele é o Deus que provê
tudo para nossa vida, mas se não acreditamos no que a Palavra
diz, estamos chamando Deus de mentiroso. Contudo, se Ele fa-
lou, é certo que se fará, porque a Bíblia diz que em todas as Suas
promessas temos no próprio Deus o sim. Por isso, não podemos
duvidar da Palavra de Deus. Não duvide de Deus. Se tivermos fé,
venceremos a ansiedade.
166 21 dias com Jesus no Monte

5. Vencemos a ansiedade conhecendo Deus


como “Pai” (vv. 31,32)
É precisamente no Sermão do Monte que Jesus nos revela Deus
como Pai. Até então, um judeu não se referia a Ele desta maneira.
Para eles, Deus era Deus apenas.
Se virmos Deus apenas como Senhor, jamais seremos livres
da ansiedade, pois quando quebrarmos alguma lei, alguma regra,
pensaremos que não merecemos receber dEle coisa alguma; nunca
veremos o Pai de misericórdia que nos ama mesmo quando somos
falhos, que nos ama apesar de nós.
Com um pai, entretanto, tudo é diferente. Mesmo o filho pró-
digo teve o cuidado de seu pai quando precisou e recorreu a ele.
Somos filhos amados de Deus e, se confiarmos, Ele cuidará de nós.
Ficamos ansiosos porque o tempo todo achamos que Deus não
cuidará de nós simplesmente porque não merecemos. De fato, não
merecemos, mas Ele é nosso Pai e nos ama mesmo assim. Posso
entender isso através de minha própria atitude como pai. Eu não
amo minha filha porque ela merece, mas porque ela é minha filha.
Eu não guardo minha filha apenas quando ela faz as coisas certas.
Ela pode ter feito tudo errado, mas não vou deixar ninguém tocar
nela, mesmo que esteja errada. Ela pode ter me maltratado, mas
não vou deixar de amá-la.
Para vencermos a ansiedade, precisamos saber que Deus não é
apenas nosso Deus, mas também é nosso Pai. Um Pai de amor que
nos ama incondicionalmente, que nos aceita do jeito que somos,
com nossas falhas e erros. Ele nos ama e quer cuidar de nós, não
porque merecemos ou fazemos tudo certo, mas porque Ele é nosso
Pai de amor.
Se desejamos vencer a ansiedade, precisamos ver Deus como Pai,
pois tê-lo apenas como Deus nos coloca numa posição de temor
e insegurança, afinal não sabemos se porventura temos quebrado
Seus princípios e se estamos fora de Sua vontade.
O povo do Reino e a ansiedade – Mateus 6.25-34 167

6. Vencemos a ansiedade buscando em


primeiro lugar o reino de Deus (vv. 33,34)
No verso 33, o Senhor faz a promessa de que se buscarmos o
reino de Deus e a sua justiça, as outras coisas nos serão acrescentadas.
O que vive debaixo dos desejos de dinheiro e segurança paga o
preço da ansiedade e da angústia; enquanto quem busca o Reino
encontra a libertação da ansiedade, pois vive sob a providência do
Deus que sustenta sua vida e o supre em tudo.
O Senhor diz que temos de buscar o Reino e a justiça. O Reino
é tudo o que está relacionado à Igreja e ao serviço a Deus hoje e
também à sua manifestação futura, quando Cristo vier para reinar.
Buscar o Reino é buscar ser qualificado para reinar com Cristo.
Creio também que o Reino aqui se refere a uma esfera de paz e
alegria, sem ansiedade, como mencionado em Romanos. Buscar o
Reino é buscar a paz que guarda nosso coração.
Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas
justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo. (Rm 14.17)
A justiça, por outro lado, é um conceito mais amplo e está rela-
cionado a buscar a justiça em nossa vida pessoal e no mundo que
nos rodeia.
O Senhor ensinou a orar pedindo o pão de cada dia, portanto,
querer o pão não é errado, e sim fazer disso a prioridade de nossa
vida. A prioridade é buscar o reino de Deus. Há pessoas que re-
almente têm suas prioridades invertidas, e é fácil perceber como
os cristãos fazem isso quando se trata de alimento espiritual. Eles
amam todos os programas da igreja, não perdem um retiro ou uma
festa e adoram shows com cantores evangélicos. Contudo, não os
vemos nos dias normais, quando poderiam receber o verdadeiro
alimento espiritual.
O Senhor deseja acrescentar todas as outras coisas em nossa
vida. Não é, portanto, que não queiramos ter um carro melhor ou
168 21 dias com Jesus no Monte

uma casa mais espaçosa, a questão é que deixaremos isso nas mãos
de Deus. Cuidaremos dos negócios dEle e Ele cuidará dos nossos.
O conceito de buscar o reino de Deus em primeiro lugar é algo
que tem sido mal interpretado no decorrer da história. Existem três
compreensões erradas que precisamos evitar:
™™ Os crentes não estão isentos de ganhar a própria vida. Não
podemos ficar sentados esperando, dizendo que Deus pro-
verá, sem fazer nada. Temos de trabalhar. Paulo disse que
quem não trabalha também não coma (2 Ts 3.10);
™™ Os crentes não estão isentos de sua responsabilidade para
com outros. Deus espera que ajudemos nosso irmão e
até que sejamos instrumentos dEle para provisão na vida
dos outros;
™™ Os crentes não estão isentos de serem prudentes e precavi-
dos. Usar colete salva-vidas em um barco no meio de uma
tempestade é prudência e não incredulidade. Não é erra-
do fazer previsão para uma aposentadoria na velhice nem
fazer seguro de vida. O errado é andar ansioso e colocar o
coração no dinheiro;
™™ Os crentes não estão isentos de dificuldades. Estar livre
de preocupação não é estar livre de dificuldades. Embora
Deus vista a erva, Ele não impede que ela seja queimada.
Nenhum pardal cai sem a permissão do Pai, mas os pardais
caem e são mortos.
Jesus disse que basta ao dia seu próprio mal, portanto, teremos
problemas. Tudo acontece pela permissão do Pai celeste, mas Ele
cuida de nós em meio ao que não entendemos.
A Bíblia diz que se buscarmos o reino de Deus e a sua justiça,
todas as coisas nos serão acrescentadas. Não podemos ter dúvidas,
pois a Bíblia diz que, ainda que sejamos infiéis, Ele permanece fiel.
Se gastarmos nossa vida com as coisas do Senhor, veremos o quanto
Ele nos suprirá, o quanto Deus cuidará de nós. A Palavra do Senhor
diz que se servirmos e obedecermos a Deus, Suas bênçãos virão
O povo do Reino e a ansiedade – Mateus 6.25-34 169

sobre nós e nos alcançarão. Muitos têm passado a vida a correr atrás
das bênçãos, mas a Bíblia mostra o contrário. Segundo a Palavra,
as bênçãos correrão atrás de nós quando corrermos atrás de Deus.
Se temos nos sentido cansados, é porque temos corrido atrás da
pessoa errada, temos corrido atrás das coisas desta vida. A Bíblia
nos ensina que o nosso trabalho é descansar em Deus, pois aos Seus
amados o Senhor dá enquanto dormem. Não que vivamos dor-
mindo, mas vivemos uma vida no descanso de Deus. Trabalhamos
mas, apesar disso, não colocamos nossa confiança no trabalho nem
no dinheiro, pois confiamos que temos um Pai que cuida de nós.
O que devemos fazer é descansar em Deus, tirar toda ansiedade
que tem afligido nosso coração com as coisas desta vida, buscar o
que é de Deus e deixar que Ele nos tome nos braços como um Pai
de amor. Assim dormiremos em paz, porque Ele cuidará de nós.
16º Dia

A vida no Reino:
Não julgueis
– Mateus 7.1-6,12

Não julgueis, para que não sejais julgados. Pois, com


o critério com que julgardes, sereis julgados; e, com a
medida com que tiverdes medido, vos medirão tam-
bém. Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão,
porém não reparas na trave que está no teu próprio? Ou
como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar o argueiro do
teu olho, quando tens a trave no teu? Hipócrita! Tira
primeiro a trave do teu olho e, então, verás claramente
para tirar o argueiro do olho de teu irmão. Não deis aos
cães o que é santo, nem lanceis ante os porcos as vossas
pérolas, para que não as pisem com os pés e, voltando-
-se, vos dilacerem. [...] Tudo quanto, pois, quereis que
os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles;
porque esta é a Lei e os Profetas. (Mt 7.1-6, 12
172 21 dias com Jesus no Monte

1. Não julgueis, para que não sejais julgados


Antes de falarmos sobre o julgamento, precisamos falar sobre o
que não é julgamento. Muitas pessoas pensam que jamais podemos
emitir opiniões sobre coisa alguma, ou que toda exortação é um tipo
de julgamento. Isso é um equívoco. Precisamos diferenciar nosso
discernimento e nossa avaliação do julgamento a respeito do qual
o Senhor está falando.

a. Discernimento espiritual não é julgamento


Embora o Senhor não tenha vindo para julgar, sabemos que Ele
chamou os fariseus de hipócritas. Se Ele não veio para julgar, como
poderia fazer isso? (Mt 23.1-13). Em suas epístolas, Paulo chama
os coríntios de carnais e crianças espirituais. Contudo, sabemos que
tanto Jesus quanto Paulo não estão julgando, apenas demonstrando
discernimento e percepção espiritual.
O Senhor Jesus disse para não julgarmos, mas precisamos com-
preender que isso não significa que não podemos emitir opinião,
ou fazer uma exortação em certas circunstâncias. Certa ocasião,
Paulo fala a respeito de Demas e de Alexandre, o latoeiro, como
homens mundanos (2Tm 1.15; 4.10,15), e ele, igualmente exortou
a não julgar.
Portanto, nada julgueis antes do tempo, até que venha
o Senhor, o qual não somente trará à plena luz as coisas
ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios
dos corações; e, então, cada um receberá o seu louvor
da parte de Deus. (1Co 4.5)
Porém o homem espiritual julga todas as coisas, mas ele
mesmo não é julgado por ninguém. (1Co 2.15)
Em João 7.24, Jesus coloca o padrão de julgamento: não devemos
julgar segundo a aparência, mas segundo a reta justiça. O Senhor
até espera que julguemos, mas da forma correta.
A vida no Reino: Não julgueis – Mateus 7.1-6,12 173

Não julgueis segundo a aparência, e sim pela reta jus-


tiça. (Jo 7.24)
Por um lado, a Bíblia diz que não devemos julgar, mas por outro,
diz que o homem espiritual julga todas as coisas, mas por ninguém
é julgado. Apesar de parecer, a Bíblia não está em contradição,
precisamos compreender qual é a maneira correta de abordarmos
cada situação.

b. Avaliar pessoas e situações de acordo com a Palavra


não é julgamento
O discernimento não é algo sempre interior. Às vezes temos de
dizer o que vemos. Paulo resistiu a Pedro face a face (Gl 2.11-21),
e Jesus fez o mesmo quando nos advertiu a não dar pérolas a porcos
e coisas santas a cães. Como saber quem é porco e cão se não fizer-
mos uma avaliação? Se não possuirmos discernimento espiritual,
não temos como saber quem são os porcos.
Um pai está apenas tendo discernimento quando percebe a in-
fantilidade do filho que briga com o outro por causa de um lugar
no banco no carro. Jesus, quando chamou os fariseus de hipócritas,
estava tendo um discernimento espiritual da religiosidade exterior
daqueles homens. Paulo podia avaliar os crentes coríntios porque
sabia que eles ficavam bêbados na ceia, eram facciosos e vaidosos
a respeito de dons. Não podemos corrigir erros se não houver per-
cepção e discernimento.
Mas as pessoas dizem que não temos direito de julgá-las quan-
do precisamos exortá-las. Fico imaginando se um fariseu dissesse
a Jesus que Ele não poderia julgá-lo dizendo que era um sepulcro
caiado. Mas é claro que podia! Isso não é julgamento, é apenas a
constatação de um fato.
Por outro lado, precisamos ser cuidadosos quando alguém nos
procura para falar do problema de outros. Se alguém nos consulta
a respeito de outra pessoa, temos de avaliar os seguintes pontos:
174 21 dias com Jesus no Monte

™™ Há alguma ligação entre essas pessoas?


™™ A consulta é apenas por fofoca?
™™ Há alguma razão específica e plausível?
Se as respostas a essas perguntas forem satisfatórias, podemos falar
sobre o assunto com ela. Contudo, nunca devemos compartilhar
problemas com quem não pode ajudar. A fofoca se enquadra no
julgamento que o Senhor condena. Mas se a pessoa em questão for
um amigo, filho ou parente que está fazendo algo errado, e queremos
um conselho para poder ajudá-lo, então isso não é um julgamento,
é apenas uma avaliação para ajudar o outro.

c. Julgar é atuar como juiz


Em primeiro lugar, julgar é atuar como juiz. Nós não podemos
atuar como juízes, pois fomos chamados para exercer misericórdia.
Um juiz não pode exercer misericórdia, apenas fazer cumprir a letra
da lei, trazendo justiça.
Nós, porém, fomos chamados para exercer misericórdia, e não
podemos ser juízes e exercer misericórdia ao mesmo tempo.
Essa é uma questão muito séria porque a Bíblia diz que, com a
medida que medirmos, seremos medidos. Esse é o principio da se-
meadura e da ceifa. Tudo o que você e eu plantarmos, colheremos.
Se julgarmos as pessoas com braço de ferro, naquele Dia, também
seremos julgados com braço de ferro. Mas se escolhermos exercer
misericórdia, que é não dar ao outro o que ele mereceria, então
Deus nos julgará com misericórdia.
Não podemos agir como juízes que não podem exercer misericórdia.

d. Julgar é ser crítico


Muitas ações são muito próximas do pecado. Um exemplo é
a ira: até podemos nos irar, mas a ira está muito próxima de se
tornar pecado. Assim é o discernimento, pois ele pode virar crítica
e julgamento.
A vida no Reino: Não julgueis – Mateus 7.1-6,12 175

Não nos julguemos mais uns aos outros; pelo contrário,


tomai o propósito de não pordes tropeço ou escândalo
ao vosso irmão. Eu sei e estou persuadido, no Senhor
Jesus, de que nenhuma coisa é de si mesma impura,
salvo para aquele que assim a considera; para esse é
impura. (Rm 14.13,14)
Um só é Legislador e Juiz, aquele que pode salvar e fazer
perecer; tu, porém, quem és, que julgas o próximo?
(Tg 4.12)

e. Com a medida que medirmos seremos medidos


No segundo versículo de Mateus 7, Jesus mostra o princípio da
semeadura e da ceifa. Existem leis de semeadura e para isso não há
acepção de pessoas:
™™ Sempre colhemos a mesma espécie que semeamos. Se plan-
tarmos julgamento e crítica, é isso que colheremos, mas se
plantarmos amor e misericórdia, alcançaremos misericórdia;
™™ Sempre colhemos mais do que semeamos. Se resolvermos ser
severos com os outros, receberemos severidade ainda maior.
Sempre pensamos nas leis da semeadura quando falamos de
dinheiro, mas a Palavra do Senhor é para todos os tipos de
palavras que proferimos e atitudes que tomamos. Palavra são
sementes, assim, palavras de julgamento e condenação são
semeadas quando proferidas. Palavras e atitudes repetidas
são como sementes regadas: quando germinarem, trarão
um resultado muito maior do que o que foi semeado. A
Palavra do Senhor diz que se plantarmos ventos, colheremos
tempestades (Os 8.7);
™™ Nunca colhemos no mesmo momento em que plantamos.
Sempre existe um tempo de espera. E este é o problema de
muitos: simplesmente se esquecem de toda semeadura que
fizeram e, quando chega a colheita, se consideram vítimas
do mundo. Mas, pela graça de Deus, podemos arrancar uma
176 21 dias com Jesus no Monte

semente que já foi semeada antes de germinar. Podemos


fazer isso pelo arrependimento e pela confissão.
Sabemos que nosso Deus é um Deus justo. No futuro, no
trono de julgamento, Ele nos julgará segundo a justiça. Entre-
tanto, apesar de haver justiça no trono de julgamento, também
haverá misericórdia.
Se mostrarmos misericórdia para com outros, o Senhor será mi-
sericordioso para conosco. Se formos implacáveis para com outros,
tão justos e intransigentes com as falhas e fraquezas dos outros, o
Senhor tratará conosco apenas com justiça naquele Dia.
Em Lucas 6.37 lemos que se não julgarmos, não seremos julga-
dos; se não condenarmos, não seremos condenados; se perdoarmos,
seremos perdoados. Alguns cristãos são mesquinhos demais e, ao
criticarem os outros, apontam para cada erro cometido. Contudo,
no futuro, Deus tratará com eles da mesma maneira com que tra-
tam com os outros.
Portanto, a Bíblia diz que a misericórdia triunfa sobre o juízo (Tg
2.13). Há algo sobre o que o juízo não pode triunfar: o fato de uma
pessoa mostrar misericórdia para com os outros por toda a sua vida.
Não estamos livres de erros, contudo, se mostrarmos misericórdia
para com os outros hoje, Deus nos tratará da mesma maneira.
Quando chegar o tempo do julgamento, haverá alguns contra
os quais nem mesmo o Senhor do juízo será capaz de levantar coisa
alguma. Isso não significa que o homem possa propositadamente
alterar o mandamento de Deus. Significa apenas que, se formos
misericordiosos com os outros enquanto vivermos na terra, Deus
será misericordioso conosco. Nossa misericórdia hoje triunfará sobre
nosso juízo amanhã.
A forma como tratamos os outros será a mesma forma como o
Senhor nos tratará. Esta graça é justa. Nossa maneira de tratar os
outros moldará um vaso, com o qual Deus medirá o julgamento
para nós.
A vida no Reino: Não julgueis – Mateus 7.1-6,12 177

Porque o juízo é sem misericórdia para com aquele que


não usou de misericórdia. A misericórdia triunfa sobre
o juízo. (Tg 2.13)
Aqueles que não usam de misericórdia para com os outros se-
rão julgados sem misericórdia, mas para aqueles que a usam, ela
triunfará sobre o juízo. Nossa misericórdia excederá o juízo. Que
fato maravilhoso!

f. Por que julgamos?


O crítico é sempre um hipócrita, disse Jesus. Ele tem uma trave
em seu próprio olho, mas quer tirar o cisco do olho do outro. Tal-
vez o cisco que ele vê no outro seja a sobra da trave que está nele.
Este comportamento é chamado na psicologia de mecanismo
de projeção. Tendemos a ver no outro aquilo que já existe em nós,
mas não admitimos. Vemos no outro porque já temos em nós mes-
mos. Portanto, quem somos determina como vemos os outros e a
vida, e determina o que fazemos. Por isso, quando julgamos a outra
pessoa, estamos apenas condenando a nós mesmos, porque nosso
julgamento apenas revela o que somos.
A base da projeção é o desejo de nivelar por baixo. É preciso
sujar o outro para ficarmos todos iguais. Por ter tantos pecados,
queremos que os outros também tenham. Esse é o julgamento do
diabo, é carnal e maligno. Deus não aceita esse tipo de atitude e é
isso o que Jesus está condenando.
Mas a projeção não é a única causa do julgamento, existem
muitas outras que levam uma pessoa a se tornar crítica e até ferina.
A mais comum delas é o orgulho, a atitude de se achar sempre me-
lhor que os outros. Quando somos cheios de justiça própria, nos
tornamos duros e implacáveis com o outro.
Outra causa do julgamento é a inveja. O invejoso sempre denigre
e diminui o outro. Quando nos falta o autoconhecimento, quando
não percebemos nosso próprio pecado, nos tornamos cheios de
178 21 dias com Jesus no Monte

julgamento. Sempre digo que aquele que possui um espelho de ver-


dade em casa é sempre misericordioso e tolerante, porque se enxerga.
Mais uma forma muito frequente de julgamento no meio dos
crentes é o que chamamos de teologia torta. Pensamentos do tipo
“amigos de Jó” nos levam a críticas injustas, como dizer que “só
quem é pecador pode sofrer tanto assim”. Ou ainda a opinião dos
bárbaros sobre Paulo, mostrada no livro de Atos:
Quando os bárbaros viram a víbora pendente da mão
dele, disseram uns aos outros: Certamente, este homem
é assassino, porque, salvo do mar, a Justiça não o deixa
viver. (At 28.4)
É triste que muitas pessoas sejam julgadas como pecadoras
porque passam por lutas e tribulações. Em muitos meios evan-
gélicos, se alguém fica desempregado, logo é julgado como um
infiel que não dá o dízimo. Esse é o julgamento maligno e cruel
que o Senhor condena.
Em João 7.24 Jesus esclarece a ordem de não julgar mostrando
que não devemos fazê-lo segundo a aparência, mas podemos julgar
segundo a reta justiça.
Por fim, a principal de todas as causas é a falta de amor. Quem
ama procura enxergar o melhor no outro. Certamente, jamais fala-
mos mal de alguém por quem estamos orando.
Acima de tudo, porém, tende amor intenso uns para
com os outros, porque o amor cobre multidão de pe-
cados. (1Pe 4.8)

2. Não deis pérolas a porcos (v. 6)


a. Quem são os cães e porcos?
Na Palavra de Deus, cães e porcos são animais imundos e, neste
texto, simbolizam aquelas pessoas mencionadas na segunda epístola
de Pedro: elas conhecem o evangelho, mas não são salvas.
A vida no Reino: Não julgueis – Mateus 7.1-6,12 179

Pois melhor lhes fora nunca tivessem conhecido o caminho da


justiça do que, após conhecê-lo, volverem para trás, apartando-se do
santo mandamento que lhes fora dado. Com eles aconteceu o que
diz certo adágio verdadeiro: O cão voltou ao seu próprio vômito;
e: A porca lavada voltou a revolver-se no lamaçal. (2Pe 2.21,22)
Cães apontam para aqueles que conhecem a doutrina, mas não
possuem a realidade.
Acautelai-vos dos cães! Acautelai-vos dos maus obreiros!
Acautelai-vos da falsa circuncisão! (Fp 3.2)
Fora ficam os cães, os feiticeiros, os impuros, os assas-
sinos, os idólatras e todo aquele que ama e pratica a
mentira. (Ap 22.15)

b. O que são as pérolas?


As pérolas são nossas experiências espirituais e apontam para o
que Deus tem feito em nossa vida. Antes de compartilhar o evan-
gelho com alguém, precisamos ver se a pessoa está apta para avaliar
o valor da pérola que estamos lhe dando.
Por outro lado, de acordo com o contexto, as pérolas são também
críticas apropriadas que fazemos visando o bem. Tais exortações são
apenas para irmãos e não para porcos e cães, pois, por não enten-
derem nossa intenção, estes podem até se voltar contra nós e nos
dilacerarem. Algumas vezes, alguém enviado por Deus se aproxima
para falar de algo que está errado em sua vida e eles entendem como
ofensa. Assim, em vez de ouvirem e avaliarem, revidam e agridem.
A ilustração é óbvia: não devemos compartilhar coisas espirituais
com quem não tem condições de apreciar-lhes o valor. Não devemos
contar experiências íntimas para pessoas incrédulas, não devemos
chorar para o ímpio nem dar o que é santo para impuros e profanos.
17º Dia

A vida no Reino:
peça, busque e bata
– Mateus 7.7-11

Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei, e abrir-


-se-vos-á. Pois todo o que pede recebe; o que busca
encontra; e, a quem bate, abrir-se-lhe-á. Ou qual
dentre vós é o homem que, se porventura o filho lhe
pedir pão, lhe dará pedra? Ou, se lhe pedir um peixe,
lhe dará uma cobra? Ora, se vós, que sois maus, sabeis
dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais vosso
Pai, que está nos céus, dará boas coisas aos que lhe
pedirem? (Mt 7.7-11)
Jesus mencionou a oração por várias vezes no Sermão do Monte.
Isso acontece porque ela não pode ser praticada na força natural,
somente pelo Espírito. O assunto da oração é sumamente impor-
tante justamente porque é pela oração que recebemos o poder para
vivermos no padrão do Reino.
182 21 dias com Jesus no Monte

Creio que esta é a promessa mais extraordinária dita por Jesus


no Sermão do Monte: “todo o que pede recebe”. Isso é garantia
de suprimento para todas as nossas necessidades! Vejamos alguns
princípios da oração respondida no Sermão do Monte.

1. Ser específico
Primeiramente, devemos formar uma imagem do que queremos
para depois nos expressarmos com palavras objetivas. Ou seja, pri-
meiro definimos o que queremos de Deus e então pedimos a Ele
de forma simples e clara. Muitas pessoas se achegam para orar, mas
nem sabem exatamente o que desejam receber de Deus.
Alguns querem parecer espirituais e dizem nunca pedir coisa
alguma ao Senhor, mas isso não é espiritualidade, é tolice. Alguns
agradecem de forma religiosa, dizendo “obrigado porque têm tan-
to a agradecer e tão pouco a pedir”. Atitudes assim passam a ideia
de que o Senhor não quer que peçamos, ou mesmo de que pedir é
atitude de crianças imaturas. Mas, felizes são as crianças que pedem
muito ao Pai, pois serão atendidas.
Nada do que pedirmos estará além do que Deus pode realizar.
Portanto, se pedirmos alguma coisa em harmonia com Sua Palavra
e Sua vontade, podemos ter certeza de que Ele nos responderá.
Nossa necessidade é um conta-gotas, mas a provisão de Deus é um
oceano. Assim, estimulo todos a pedirem e pedirem muito, a encher
o coração de santos desejos celestiais e pedi-los a Deus. O Senhor é
honrado com nossos pedidos e é glorificado quando responde nossas
orações. Devemos, portanto, ser específicos, mas sempre em linha
com a Palavra de Deus e com o Espírito. Se pedirmos algo fora da
Palavra, não temos como receber.
Cobiçais e nada tendes; matais, e invejais, e nada po-
deis obter; viveis a lutar e a fazer guerras. Nada tendes,
porque não pedis; pedis e não recebeis, porque pedis
mal, para esbanjardes em vossos prazeres. (Tg 4.2,3)
A vida no Reino: peça, busque e bata – Mateus 7.7-11 183

Por outro lado, sabemos que a promessa é clara: “todo que pede
recebe...” (v. 8).

2. Pedir-buscar-bater
O primeiro e talvez mais importante princípio da oração res-
pondida chama-se necessidade. Quando existe uma necessidade
inadiável ou um desejo profundo, nossa oração será muito mais
intensa e, consequentemente, mais poderosa. É preciso querer e
pedir a Deus. A sequência pedir-buscar-bater fala de um desejo
ardente no coração. Na verdade, Deus somente se deixa achar por
aqueles que o buscam de todo o coração.
Se não precisarmos, não devemos pedir. Será perda de tempo,
pois nada acontecerá. Deus não nos dará algo de que não precisamos.
Se orarmos por algo hoje, e amanhã já tivermos esquecido o que
oramos, é porque não estávamos precisando ou desejando realmente
aquilo. Quando não precisamos, não buscamos nem batemos. Há
pessoas que pedem muitas coisas, mas a cada dia pedem algo dife-
rente. Na verdade, elas nem se lembram da oração que fizeram no
dia anterior, porque o que pediram não era importante.
Mas como é que a necessidade se manifesta? Ela se manifesta em
forma de pressão, essa é a palavra-chave. A pressão é uma situação
vital para nosso crescimento e para nossa oração. Não há como falar
sobre pedir algo a Deus se não houver pressão, pois é ela que gera
uma oração de poder.
Todo motor a combustão funciona basicamente com a pressão.
O combustível explode no motor, que canaliza a pressão resultante
para que o carro ande. Sem essa pressão, o motor não funciona e
o carro não anda. Do mesmo modo, às vezes o que falta em nossa
oração é a pressão que gera poder, e ela não passa de uma lamúria
para Deus. Como já vimos, a oração sem poder se torna um rela-
tório de nossos problemas e isso não funciona.
184 21 dias com Jesus no Monte

Podemos também usar o exemplo de uma panela de pressão.


Quando ela está cheia de água, com a tampa fechada e sobre o
fogo, essa água ferve e produz vapor, que por sua vez gera pressão.
Quanto mais tempo ela permanecer assim, mais a pressão aumen-
tará, tornando-se cada vez mais poderosa e cozinhando qualquer
alimento colocado dentro dela. Contudo, se a panela estiver aberta,
o vapor escapa, não gera pressão e nada disso acontece.
Fazendo uma analogia com a panela de pressão, podemos dizer
que existe um tipo de cristãos que chamaremos de “panela aberta”
e outro que chamaremos de “panela fechada”. O primeiro é aquele
que passa pelo fogo, mas não gera pressão.
Suponhamos que um irmão fique desempregado. O fogo vem,
e ele então vai orar, pedindo a Deus um emprego. Quinze dias se
passam e o emprego não vem. Então ele volta a orar, pedindo ao
Senhor que abra uma porta. Ao completar um mês, o emprego não
vem, e ele diz que o Senhor não quer que ele trabalhe, e que talvez
queira que ele viva de outra maneira. Esse é o crente “panela aberta”,
que não suporta pressão e, por isso, não vai até o final com Deus.
Ele arruma um escape e a pressão vai embora, perdendo a chance
de conhecer, aprender e receber algo de Deus.
Por outro lado, o crente “panela fechada” é aquele que aproveita
a pressão para obter poder. Ele ora durante uma semana pedindo
a Deus um emprego. Depois de 15 dias ele não ora como antes,
mas é mais intenso. Passa-se um mês e o emprego não vem. Então
ele já não ora, geme, falando com Deus que não abre mão daquele
emprego. No final de dois meses, ele não só ora como faz vigília; já
não jejua, mas perde o apetite, e clama ao Senhor: “Ou o Senhor
faz, ou eu morro!” O que aconteceu com a oração desse homem
neste período? Ela cresceu em poder e intensidade.
É justamente este o significado de pedir-buscar-bater. É simples-
mente uma sequência de intensidade. Começamos pedindo, mas
se a resposta demora, passamos a buscar com mais intensidade e, se
ainda assim nada acontece, começamos a bater desesperadamente.
A vida no Reino: peça, busque e bata – Mateus 7.7-11 185

Essa é a oração que encontra resposta. Pode ser que demore 15 dias,
6 meses ou 1 ano para que Deus faça algo em nossa vida. O tempo
de fogo varia, mas não podemos desistir. Não podemos abrir a tampa
e buscar caminhos alternativos, pois o Senhor irá conosco até o fim.
Buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes de
todo o vosso coração. (Jr 29.13)
Antes de orar, temos que ter pressão interior para buscar de
todo o coração. O problema é que brincamos de orar e, por isso,
não crescemos nem avançamos. As pessoas começam a pedir hoje
e amanhã esquecem tudo. Nem se lembram do que pediram, pois
estão brincando com Deus e, dessa forma, não recebem nada dEle.
A maioria de nós corre da pressão. Há um pânico terrível e sem-
pre queremos fugir dela. Porém, quando a pressão vier, devemos
nos alegrar, pois é neste momento que teremos a chance de ver o
poder de Deus agindo. Quando vier a pressão, não precisamos sair
correndo, e sim orar e jejuar cada vez mais intensamente, porque
assim nossa oração terá muito poder. A verdadeira petição é aquela
que é fruto de poder em nossa vida e na de nossos irmãos.
Não há vitória sem lágrimas, não há poder sem pressão. Muitos
querem o poder de receber, de ouvir, de frequentar uma reunião,
mas quando correm das circunstâncias ao redor e perdem a opor-
tunidade de ver a operação do poder genuíno em sua vida, perdem
a chance de ver o milagre de Deus. Para vermos o milagre de Deus
em nossa vida, precisamos aprender a pedir-buscar-bater.

3. A oração é para sermos tratados e tratar


com Deus
A oração é um meio pelo qual conhecemos a Deus. Uma coisa
é conhecer a Bíblia, outra é conhecer a Deus. Naturalmente, quan-
do conhecemos a Bíblia, também estamos conhecendo algo sobre
Deus. Todavia, existe uma maneira prática de conhecer a Deus:
através da oração.
186 21 dias com Jesus no Monte

O salmista apresenta duas maneiras básicas de conhecermos


a Deus: através de Seus caminhos e de Seus feitos: “Manifestou os
seus caminhos a Moisés, e os seus feitos, aos filhos de Israel” (Sl 103.7).
Caminhos nos falam de princípios que, por sua vez, nos falam dos
propósitos e da vontade de Deus, registrados na Palavra. Portanto,
o conhecimento de Deus é proporcional ao conhecimento dos
princípios da Palavra e do agir de Deus em nossa vida. Se Deus não
está agindo em nós, provavelmente estamos perdendo uma grande
chance de conhecê-Lo melhor.
Por outro lado, é possível conhecer apenas os caminhos ou os
princípios de Deus. Alguns irmãos querem conhecer somente as
Escrituras; outros, só o poder de Deus. Na prática, temos visto que a
corrente dos que se restringem ao conhecimento das Escrituras tem
produzido um povo frio, metódico e teórico, enquanto a corrente
dos que buscam só o poder tem gerado um povo legalista e místico.
Precisamos de equilíbrio. Precisamos conhecer tanto os cami-
nhos quanto os feitos, ou seja, tanto as Escrituras quanto o poder.
E fazemos isso através da oração.
Suponhamos que certo irmão precise muito de um carro para
trabalhar. Então, ele começa a orar pedindo um carro e não desiste
(muitos não conhecem o poder de Deus porque desistem; inter-
pretam o silêncio dEle como uma resposta negativa). Este irmão
persevera em oração, pois quer respostas. Ele não desanima, pois
quer ver o poder de Deus em ação. Contudo, os dias transformam-
-se em semanas e as semanas em meses, e ele continua orando pelo
carro. Então, pergunta ao Senhor se há algo impedindo a resposta
à sua oração. Deus então lhe responde que sim, há mágoas em seu
coração, e primeiro ele precisa resolver essa questão; depois, terá o
que pede. O irmão entra em contrição e quebrantamento diante
de Deus e, por um momento, até se esquece do carro. A prioridade
agora é resolver a questão da mágoa. Então, depois de obedecer ao
Senhor, Ele responde sua oração.
A vida no Reino: peça, busque e bata – Mateus 7.7-11 187

Qual a circunstância mais importante desse processo? A bênção


material ou a revelação sobre o caráter de Deus? É óbvio que, ao
ganhar o carro, o irmão cresceu um pouco mais no conhecimento
de Deus. Agora ele sabe como é o Deus que ouve e responde à ora-
ção, como é o Deus provedor, abençoador, galardoador. E ao lidar
com seus sentimentos sombrios – mágoa, ressentimento, falta de
perdão, hostilidade e amargura – ele finalmente entendeu que Deus
não aceita nem convive com essas atitudes malignas. Ele compre-
endeu que, ao resolvê-las e extirpá-las de si mesmo, suas orações
se alinharam com a vontade de Deus. E isso significa que, a partir
de agora, sempre que apresentar a Deus qualquer súplica, antes de
tudo ele sondará o próprio coração à procura desses sentimentos
cuja presença bloqueia o mover de Deus em sua vida.
Depois de algum tempo, aparece uma nova necessidade e o
irmão começa a orar novamente. Como da vez anterior, ele não
insistirá mais em sua teimosia. Ao contrário, se prostrará diante do
trono, pedindo ao Senhor para lhe mostrar se há alguma mágoa
ou ressentimento em seu coração e para que Deus forme nele o
caráter de Cristo. Então, o Senhor lhe diz para dar mais atenção a
seu relacionamento conjugal, pois quando há problemas entre ele
e a esposa, a oração de ambos é obstruída, nem chega diante do
Senhor. O irmão prontamente vai até a esposa, ajoelha-se ao lado
dela, assume o próprio pecado e lhe pede perdão. Essa atitude sara
qualquer mágoa no coração da esposa e desbloqueia as orações do
esposo. O irmão, assim, aprende mais uma importante lição: se ele
estiver mal com sua esposa, também estará mal com Deus.
Contudo, esse amado irmão ainda tem muito que aprender. Ele
continua orando em busca de outros alvos espirituais e, ao final de
uma semana, não se contém mais e abre o coração para o Senhor,
perguntando o que Ele deseja tratar em sua vida. E Deus lhe diz que
há pecados não confessados ainda. Que Sua mão não está encolhida,
nem Seu ouvido está surdo; porém, esses pecados fazem separação
entre Deus e ele. O irmão pergunta quais são esses pecados, e o Es-
pírito Santo então mostra cada um deles, levando-o a se arrepender
188 21 dias com Jesus no Monte

e pedir perdão em nome de Jesus. Essas palavras movem o coração


de Deus e, no mesmo instante, Ele ordena a um anjo que leve a
resposta à oração de Seu filho. Quanta coisa ele aprendeu desta vez!
E sempre que agir assim, aprenderá algo novo.
Vários são os motivos pelos quais não oramos: negligência, cora-
ção endurecido, insubmissão, etc. No entanto, na verdade, muitos
irmãos não se dispõem a orar porque temem serem confrontados
por Deus. Não estão dispostos a renunciar sua própria vontade e
submeter-se ao tratamento de Deus. Muitos de nós começamos a
orar e nada acontece. Então paramos com a oração porque, em nossa
opinião, Deus não quis nos ouvir, mas isso não é verdade. Deus é
bom! Ele é fiel! Ele ouve as orações! O problema certamente não
é com Ele, e sim conosco. Nós não quisemos ouvi-Lo, porque Ele
queria tratar nosso pecado, e não estávamos dispostos a obedecê-Lo.
Na vida espiritual, há certas coisas que temos de aprender sozi-
nhos. Não é nada misterioso, mas se não passarmos por elas, jamais
aprenderemos. Enquanto Deus não tratar diretamente conosco,
nunca aprenderemos. O que conhecemos de Deus deve ser resul-
tado de uma experiência com Ele, e não apenas de termos ouvido
sobre isso. Uma coisa é aprender teoricamente; outra é aprender
através da experiência.

Algumas distorções sobre a oração


Usando o mesmo Sermão do Monte, no qual vemos tantas
orientações sobre oração, algumas pessoas parecem enxergar justa-
mente o contrário: um desestímulo para orar. Os argumentos mais
comuns são:

A oração é descabida
Alguns dizem que se o Pai sabe todas as nossas necessidades antes
de pedirmos, então para que orar? Além do mais, os pais humanos
não esperam que seus filhos lhes peçam para então poderem dar a
A vida no Reino: peça, busque e bata – Mateus 7.7-11 189

eles. Então, esta verdade se aplica muito mais a Deus, que é bom
(Mt 5.45).
A resposta a essa questão é que Deus espera que Lhe peçamos,
não porque não saiba nem porque fique relutante. Ele está pronto
a dar, mas quer saber se estamos prontos a receber. Deus espera
que reconheçamos nossa necessidade e então, em humildade, re-
corramos a Ele.

A oração é inútil
Jesus disse que o Pai celeste abençoa os maus e os bons e faz
chover sobre ambos. Ora, se os ímpios possuem coisas de Deus
sem precisar orar, então para que orar? A resposta aqui é que existe
uma diferença entre as dádivas de Deus como Criador e suas dá-
divas como Pai. É verdade que Ele dá certas coisas quer oremos ou
não, creiamos ou não, como o sol, a chuva, o ar, a capacidade de
ter filhos, etc. Mas os dons da redenção são diferentes. As bênçãos
espirituais resultantes da salvação dependem de invocarmos e crer-
mos em Deus (Rm 10.12,13).

A oração não funciona


Muitas pessoas pedem e não recebem, clamam a Deus, mas
parece que Ele não as ouve.
Precisamos entender que as promessas de Jesus no Sermão do
Monte não são incondicionais. Se não nos dispusermos a cum-
prir as condições de Deus, não podemos esperar resultados em
nossas orações.
18º Dia

A vida no Reino:
os dois caminhos
– Mateus 7.13,14

Entrai pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o


caminho que conduz para a perdição, e são muitos os
que entram por ela), porque estreita é a porta, e aper-
tado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos
os que acertam com ela. (Mt 7.13,14)
Eu sou a porta. Se alguém entrar por mim, será salvo;
entrará, e sairá, e achará pastagem. (Jo 10.9)
A porta do aprisco sobre a qual Jesus fala no Evangelho de João
refere-se à salvação, à porta da graça. Mas a porta mencionada no
Evangelho de Mateus é a porta do Reino. Não nos parece que a
porta da graça seja estreita, além do mais, o contexto do Sermão
do Monte não é evangelismo. Jesus está ensinando para salvos, para
Seus discípulos, ainda que a multidão tenha se aproximado para
ouvir Suas palavras. Portanto, as duas portas e os dois caminhos
citados no Sermão se referem às coisas do Reino, não da salvação.
192 21 dias com Jesus no Monte

Muitas pessoas gostam de tomar apenas as partes da Bíblia que


consideram interessantes, ignorando as outras. Mas a Palavra de
Deus ensina que devemos conhecer todo o conselho do Senhor.
Em Atos 20.27, o apóstolo Paulo diz que anunciou todo o conselho
de Deus, ou seja, precisamos compreender toda a Palavra de Deus.
A salvação é gratuita, não é pelas obras ou por merecimento,
não depende de nada que tenhamos feito ou de quem sejamos, ela
é um dom de Deus:
Porque pela graça sois salvos, por meio da fé, e isto não
vem de vós, é dom de Deus; não vem das obras, para
que ninguém se glorie. (Ef 2.8,9)
Se a salvação dependesse das obras, a morte de Jesus teria sido
em vão, conforme o ensino da Palavra de Deus em Gálatas:
Não anulo a graça de Deus; pois, se a justiça é mediante
a lei, segue-se que morreu Cristo em vão. (Gl 2.21)
A Palavra de Deus nos mostra também que a vontade do Senhor
é que todo homem seja salvo, e que na casa do Pai existem muitas
moradas (1Tm 2.4; Jo 14.2). Certamente, Deus não se enganou e
fez muitas moradas para que apenas poucas pessoas fossem morar
no céu. No livro de Apocalipse, João diz que vê uma multidão in-
contável de pessoas salvas, como a areia do mar (Ap 7.9). Muitas
pessoas serão salvas, porque é muito simples receber a salvação:
Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e,
em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre
os mortos, serás salvo. (Rm 10.9)
Porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor
será salvo. (Rm 10.13)
O tempo que Deus leva para salvar alguém é o mesmo que a
luz da lâmpada leva para acender quando apertamos o interruptor.
Quando o Senhor vê alguém clamando a Ele de todo o coração,
entra como um raio na vida dessa pessoa e ela é salva imediatamente.
A vida no Reino: os dois caminhos – Mateus 7.13,14 193

Jesus disse que no céu há muitas moradas, mas, em Mateus


7.14, está escrito que são poucos os que acertam o caminho para
a vida, poucos os que entram pela porta estreita. Então, temos um
problema aqui. João viu uma multidão incontável de pessoas em
Apocalipse, inumeráveis como a areia do mar, salvas, com vestes
brancas e palmas nas mãos. Mas em Mateus lemos que poucos são
os que acertam o caminho da vida. Será que existe uma contradição?
Não! A Bíblia não está se contradizendo.
O texto de Mateus 7 não se refere à salvação, como muitos ensi-
nam. Tradicionalmente, as pessoas usam esse texto para dizer que o
caminho estreito leva ao céu e o caminho largo leva para o inferno.
Mas a porta da graça não é estreita. Ela é como os braços da cruz,
aberta para tantos quantos quiserem. Todos os que confessarem
Jesus como Senhor serão salvos.
Portanto, ser salvo é uma coisa, mas reinar com o Senhor no
milênio é outra bem diferente. Uma coisa é ser um crente vence-
dor que manifesta a vida de Deus, ser um daqueles que receberão
o galardão no Dia do Senhor, que receberão uma coroa da glória.
Para esses, certamente, a porta é estreita.
A salvação não depende de penitência ou sofrimento algum,
mas o Reino, às vezes, implica em sofrimento e privação. Para ser
salvo não é preciso ser solteiro nem fazer voto de castidade, mas Je-
sus disse que “...há eunucos de nascença; há outros a quem os homens
fizeram tais; e há outros que a si mesmos se fizeram eunucos, por causa
do reino dos céus” (Mt 19.12). Ninguém ousa dizer que para ser salvo
é preciso dar tudo o que se tem aos pobres, mas Jesus disse que “é
mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar
um rico no reino de Deus” (Mt 19.24). Em outras palavras, a porta
do Reino é estreita.
É dessa porta e desse caminho que Jesus fala em Mateus 7. Por
essa porta estreita, muitas vezes somente a pessoa passa; seu tesouro
tem que ficar de fora. Essa é a porta do Reino. Não se trata de salva-
ção; pois, na verdade, muitos ricos são salvos, mas poucos reinarão
194 21 dias com Jesus no Monte

porque muitos deles amam demais o dinheiro. Reinar não é o mesmo


que ser salvo. Muitas pessoas pensam que aceitaram Jesus e agora vão
ganhar um galardão no céu. Isso não é verdade, ninguém ganhará
um galardão porque aceitou Jesus. Galardão é uma recompensa,
mas a salvação é um presente de Deus. É completamente de graça.
O Reino, porém, depende de mérito para se receber.

a. Duas portas
A porta do Reino é estreita como o fundo da agulha por onde
um rico não pode entrar. É tão estreita que não podemos trazer nada
conosco ao passar por ela. Temos de deixar para trás o pecado, a
ambição egoísta e até mesmo a família, os amigos e os bens se for
necessário. A porta estreita é como um pedágio, pois se passa apenas
um de cada vez. Jesus disse que se alguém quiser ser Seu discípulo,
precisa negar a si e tomar a cruz. Depois disso, precisa trilhar esse
caminho estreito.
No passado, as cidades eram cercadas por muros nos quais havia
portões e portas de entrada. Todos os dias, ao pôr do sol, por segu-
rança os portões da cidade eram fechados. Então quando os ricos
chegavam com seus camelos cheios de cargas preciosas, não tinham
como entrar. Contudo, havia uma porta bem pequena que ficava
do lado do portão da cidade. Era tão pequena que nela passava ape-
nas um homem e, mesmo assim, de lado. Portanto, o camelo não
conseguia passar e tinha que ficar do lado de fora. Porém, como as
pessoas traziam muita carga, não queriam de forma alguma deixar
o camelo de fora, com medo de perder toda aquela riqueza. Por
isso não entravam, ficavam de fora, pois davam mais valor à carga
do que à própria vida. Foi isso o que Jesus quis dizer ao falar que
é muito difícil um rico entrar no Reino, pois ele não quer deixar
de fora seus bens. A porta estreita fala disso, da disposição de abrir
mão de bens, pessoas, conforto e de outras coisas que até podem
ser legítimas, para seguir o Senhor.
A vida no Reino: os dois caminhos – Mateus 7.13,14 195

A porta estreita nos fala de vivermos uma vida cristã pelos pa-
drões do Sermão do Monte. Entrar pela porta estreita é não amar o
dinheiro, é ser manso, é ser humilde de espírito, é chorar com fome
e sede de justiça, é ser perseguido e injuriado por causa da verdade.
Essa é a porta estreita, e esse é o caminho apertado.
Algumas vezes, abriremos mão de coisas legítimas, como um bom
prato de comida, para poder jejuar. Deixaremos de dormir para fazer
uma vigília de oração. Temos o direito de comer e dormir todos
os dias, mas às vezes, o Senhor requererá isso de nós. Poucos estão
dispostos a entrar em oração e jejum, a negar a si mesmos. Isso é a
porta estreita, e não são muitos os que entram por ela.
Para entrar por essa porta, temos que deixar de lado o pecado,
a ambição, o egoísmo. Muitas vezes, temos que deixar de lado até
mesmo família, filhos, amigos e bens. Quando trilhamos o cami-
nho estreito, descobrimos que amar a Deus implica em sacrifícios.
São poucos os que acertam com essa porta. Contudo, o Senhor
disse que se alguém quiser ser Seu discípulo, deve negar a si mesmo,
tomar sua cruz e segui-Lo pelo caminho estreito. Jesus falou que se
alguém amar mulher, filho, filha, pai e mãe mais do que a Ele, não
é digno dEle. Essa é a restrição da porta estreita.

b. Dois caminhos
E lhe pediu cartas para as sinagogas de Damasco, a fim
de que, caso achasse alguns que eram do Caminho,
assim homens como mulheres, os levasse presos para
Jerusalém. (At 9.2)
Visto que alguns deles se mostravam empedernidos e
descrentes, falando mal do Caminho diante da multidão,
Paulo, apartando-se deles, separou os discípulos, passan-
do a discorrer diariamente na escola de Tirano. (At 19.9)
A palavra “caminho” usada nesse texto é a mesma usada em Atos
9.2; 19.9 e 19.23, portanto, indica “vida cristã”.
196 21 dias com Jesus no Monte

Esse caminho é estreito, o que aponta para a restrição da lei do


Senhor, que é até mais restrita que a lei de Moisés. O caminho es-
treito fala da restrição da lei superior do reino de Deus, de servir a
Deus em níveis elevados. Precisamos passar pela porta estreita, mas
depois devemos continuar trilhando o caminho estreito. Alguns
chegam a entrar pela porta, mas desistem da caminhada.
Podemos dizer que o caminho do Reino é estreito para o munda-
no, mas para nós é amplo e espaçoso. Não é pesado para quem quer
servir por amor ao Senhor. Nosso serviço a Deus não pesa porque
o Espírito Santo vive essa vida por nós. O caminho só é apertado
para quem quer viver uma vida larga, mas, para aqueles que foram
conquistados pelo Senhor, esse caminho é largo o suficiente. O que
nos capacita a continuar no caminho estreito é o poder de Deus
residente em nós.
A vida cristã é isto: Cristo vivendo em nós, manifestando-se
através de nós à medida que O deixamos viver essa vida em nós.
O caminho estreito certamente nos fala de renúncias. Há coisas
que outros crentes fazem, mas nós, como vencedores, não fazemos.
Outros podem ir a qualquer lugar, ouvir qualquer música e assistir
a qualquer filme, mas o vencedor está andando no caminho estrei-
to. Esse é o preço. Contudo, naquele dia, o vencedor receberá a
recompensa, e escutará do Senhor: “Servo bom e fiel, venha reinar
comigo, venha receber a coroa”. Nosso esforço não é em vão!
Quando optamos por praticar os princípios do Sermão do Mon-
te, estamos entrando no caminho estreito e, quando seguimos por
ele, podemos esperar perseguição e lutas.
Ora, todos quantos querem viver piedosamente em
Cristo Jesus serão perseguidos. (2Tm 3.12)
Precisamos deixar a porta larga e o caminho espaçoso, que é
o caminho segundo o pensamento do mundo. Gosto sempre de
dizer que, se o mundo ainda não nos persegue, é porque ainda
somos amigos dele. No dia em que deixarmos de ser amigos do
A vida no Reino: os dois caminhos – Mateus 7.13,14 197

mundo e formos completamente dedicados ao Senhor, certamente


seremos perseguidos.
Deus nos chamou para uma vida sobrenatural, para sermos ima-
gem e semelhança dEle e para manifestar Sua glória na terra, para
experimentar os poderes celestiais em nossa vida. Jesus disse que,
se crermos, faremos obras maiores do que as que Ele fez, mas isso
é para quem é sério com Deus, para quem quer viver uma vida na
restrição do caminho, que deseja se desgastar na única chance que
tem para servir a Deus nesta vida.

c. Duas consequências
Como o Sermão do Monte não trata de salvação, cremos que
a palavra “perdição” aqui tem o mesmo sentido da consequência
daquele que edificou a casa sobre a areia nos versos 24 a 27, ou
ainda dos crentes que edificaram com madeira, palha e feno em 1
Coríntios 3.10-15. O resultado em ambos os casos é ruína porque
tomaram o caminho largo.
Na verdade, a palavra “perdição” aqui pode ser também traduzida
como “ruína”. E é exatamente esta a consequência de quem edifica
sobre a areia ou usando madeira, palha e feno: a ruína. Não é uma
questão de perder a salvação, mas de ter uma vida cristã derrotada.
Deus tem nos chamado para uma vida vitoriosa, para passar
pela porta estreita e trilhar o caminho apertado. Sabemos que em
Cristo Jesus somos mais que vencedores, mas, na prática, nem to-
dos os que tiveram uma experiência de novo nascimento têm ex-
perimentado uma vida vitoriosa. Entretanto, nós fomos chamados
para experimentar essa vida de vitória em nossos dias. O Senhor
nos tem chamado para uma vida sobrenatural, mas sabemos que
isso é resultado de uma decisão de cooperar com Deus e praticar,
de fato, os princípios do reino de Deus que aprendemos no Ser-
mão do Monte. Como verdadeiros cidadãos do Reino, entramos
no caminho apertado, passamos pela porta estreita, mas também
provamos dos poderes celestiais em nossa vida.
19º Dia

Advertências sobre
os falsos profetas
– Mateus 7.15-20

Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam


disfarçados em ovelhas, mas por dentro são lobos rou-
badores. Pelos seus frutos os conhecereis. Colhem-se,
porventura, uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos?
Assim, toda árvore boa produz bons frutos, porém a
árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa
produzir frutos maus, nem a árvore má produzir frutos
bons. Toda árvore que não produz bom fruto é cortada
e lançada ao fogo. Assim, pois, pelos seus frutos os
conhecereis. (Mt 7.15-20)
Para compreendermos quem são os falsos profetas, primeiro
precisamos entender quem são os profetas. E, baseado em no que
Pedro diz em sua segunda epístola, sabemos que os profetas eram
homens que falavam movidos pelo Espírito Santo.
200 21 dias com Jesus no Monte

Porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por


vontade humana; entretanto, homens santos falaram da
parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo. (2Pe 1.21)
Portanto, se profeta é alguém que fala movido pelo Espírito
de Deus, o falso profeta é alguém que fala algo da parte de outro
espírito, que não é o de Deus. Os falsos profetas são homens que
parecem ser de Deus, mas não falam da parte do Senhor nem são
movidos por Seu Espírito.
Sabemos que muitas pessoas têm se levantado para fazer do
evangelho fonte de lucro, aproveitando-se da fé das pessoas para
ganhar dinheiro. Contudo, nós não precisamos ser enganados por
eles porque a Bíblia nos ensina a identificar tanto o verdadeiro pro-
feta quanto o falso. Se aprendermos, seremos guardados dos homens
enganadores movidos por espíritos malignos, os quais a Bíblia diz
que se levantariam nos últimos dias.
Se quisermos ser um povo do Reino, temos não apenas que
aprender a entrar pela porta estreita e andar pelo caminho apertado,
mas também discernir quem são os que estão trilhando esse cami-
nho. Através de nossas faculdades mentais e espirituais, a Bíblia diz
que podemos discernir não apenas o bem, mas também o mal. O
homem de Deus, o crente vencedor, é aquele que tanto sabe ouvir
a voz de Deus como também discernir quando o diabo está agindo
disfarçado de anjo de luz.

a. A advertência
Os cães e os porcos que não podem receber as pérolas são fáceis
de serem identificados, mas os lobos estão disfarçados e normal-
mente só os reconhecemos depois que o estrago já foi feito. Esses
falsos profetas possuem vestes de cordeiro, ou seja, uma aparência
religiosa, mas por dentro são lobos devoradores. Têm aparência
religiosa, mas sem realidade interior.
Advertências sobre os falsos profetas – Mateus 7.15-20 201

Alguns deles, na verdade, se apresentam em nome do Senhor,


assim como Jesus nos advertiu que fariam: “Porque virão muitos em
meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo, e enganarão a muitos” (Mt 24.5).
Eles virão em nome de Cristo, que significa “Ungido”, se dizendo
o Cristo. E hoje, vemos muitos que se apresentam em nome de
Jesus e afirmam ser “o ungido” de Deus para estes dias. Por isso,
precisamos ser muito cuidadosos.
Frequentemente, encontramos pessoas que falam da parte de
Deus, dão glória e aleluia, falam em línguas e ensinam em nome
de Jesus. Essas pessoas cantam as mesmas músicas que nós, falam as
mesmas coisas que nós e são capazes até mesmo de nos fazer chorar,
mas no final de suas preleções, aparece a adoração a ídolos e santos.
Alguns ficam mesmo confundidos porque eles falam em línguas,
profetizam, expulsam demônios e falam de Jesus, mas tudo isso
contaminado pela idolatria. Parece que têm a aprovação de Deus,
mas não podemos nos enganar, pelos frutos nós os conheceremos.

b. O teste
Lobos se disfarçam, mas árvores não. Se desejarmos conhecer a
árvore, devemos observar o fruto, que aponta para a conduta em
primeiro lugar. Assim, o Senhor nos ordena a olhar não a aparência
religiosa, mas a conduta.
Normalmente, ficamos muito impressionados com a pregação
e a retórica. Gostamos do pregador saltitante e emotivo que, aos
gritos, declara sua mensagem. Mas esse não é o fruto que precisamos
observar. Devemos ver o casamento dele, a criação de seus filhos, a
forma como ele lida com o dinheiro e seus negócios. A árvore pode
parecer uma figueira, mas somente saberemos no tempo dos frutos.
E isso é algo que ninguém pode esconder por muito tempo. Em
algum momento, o que está oculto será revelado.
Imagino até que alguns pregadores nem tenham a intenção de
enganar ninguém, mas eles mesmos estão enganados e enganam a
si mesmos. Por isso, precisamos também observar nossos próprios
202 21 dias com Jesus no Monte

frutos. Se tudo o que procede de nós é maldade e pecado, precisamos


ter a honestidade de buscar uma experiência genuína de conversão
e mudança de vida. Precisamos observar os frutos que brotam em
nossa própria conduta.
Porém, uma vez que esses falsos profetas são mestres, podemos
concluir que seus frutos são também seus ensinamentos. Pelo ensino
dos falsos profetas podemos reconhecê-los.
Observando o contexto dos dois caminhos e das duas portas,
podemos dizer que o falso profeta é aquele que torna o caminho
estreito em uma estrada larga, e a porta estreita em uma passagem
ampla e espaçosa.
A Bíblia ensina que uma massa pode ser pura, mas se colocarmos
nela uma pequena medida de fermento, toda ela será levedada. Do
mesmo modo, existem pessoas que falam e ensinam coisas do evan-
gelho, mas seu ensino é misturado com fermento. Vemos pessoas
ensinando em nome de Deus e até falando um conteúdo bíblico,
mas cheio da mistura da idolatria. Cantam para Jesus, mas no final
oram a Maria, que era uma mulher de Deus, mas morreu e não
pode interceder por nós. A Bíblia declara que há um só Deus e um
só mediador entre Deus e os homens: Cristo Jesus. Não há dois.
Precisamos deixar de ser crianças na fé e prestar atenção nos
frutos, não dando ouvidos a qualquer voz nem sendo levados por
todo vento de doutrina. É preciso ver o que a pessoa vive.
Outro fator que nos impressiona muito é o crescimento. Não
podemos nos enganar, a obra de Deus cresce, mas a do maligno
também. Não é por acaso que a serpente mostrada em Gênesis se
tornou o grande dragão de Apocalipse 12. Existem dois tipos de
crescimento, por isso, não devemos nos deixar enganar por um pre-
gador que tem muitos seguidores. Eles podem ser apenas agregados
e não filhos regenerados pelo Espírito.
Em tempos de intensa guerra espiritual, precisamos ser cautelo-
sos e cheios de discernimento espiritual. É fácil guerrear quando o
Advertências sobre os falsos profetas – Mateus 7.15-20 203

inimigo se opõe a nós de forma visível e acintosa. A guerra, porém,


torna-se muito mais perigosa quando o inimigo parece estar do nosso
lado, nos tecendo elogios. Até parece que o inimigo desistiu de se
opor e tornou-se um de nós. Esse fato pode ser visto na História da
Igreja, no quarto século, quando Constantino tornou o cristianismo
a religião oficial do Império Romano. A igreja explodiu. Da noite
para o dia, todo o Império foi agregado a ela. Parecia o sinal de uma
grande vitória da Igreja, mas era tudo aparente; o que parecia ser
uma bênção foi, na realidade, uma maldição e uma derrota.
O crescimento experimentado pela Igreja naquela época foi apa-
rente, não foi real. Jamais podemos confundir frequência dominical
com discipulado, mudança de religião com mudança de vida.
No capítulo 13 do Evangelho de Mateus, temos duas parábolas
proféticas ditas por Jesus (na verdade, todas as sete proferidas nesse
capítulo são proféticas): a parábola do grão de mostarda e a do fer-
mento. Ambas apontam para o crescimento irreal da Igreja, e são
uma advertência para que não caiamos no mesmo erro.
Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus
é semelhante a um grão de mostarda, que um homem
tomou e plantou no seu campo; o qual é, na verdade,
a menor de todas as sementes, e, crescida, é maior do
que as hortaliças, e se faz árvore, de modo que as aves
do céu vêm aninhar-se nos seus ramos. (Mt 13.31,32)
Historicamente, essa parábola foi interpretada como um sinal
do crescimento da Igreja que, sendo uma pequena semente, veio a
se tornar uma grande árvore, e as aves seriam as pessoas cansadas
que encontram pouso na Igreja. O problema dessa interpretação
é que ela violenta todo o contexto e a lógica bíblica. Em primeiro
lugar, Deus determinou que cada semente reproduza segundo a
sua espécie, mas o grão de mostarda, que é uma hortaliça, veio a se
transformar em uma grande árvore. Houve aqui uma degeneração
na sua constituição, uma aberração da natureza.
204 21 dias com Jesus no Monte

No mesmo capítulo 13 de Mateus, no verso 19, Jesus disse que


as aves do céu são demônios. Por uma questão de coerência com o
contexto, temos que admitir que as aves que vêm se aninhar na árvo-
re são também demônios. A maior parte dos comentaristas bíblicos
concorda que essa parábola se cumpriu na Igreja Católica, mas eu
pergunto: somente na Igreja Católica? A igreja romana prostituiu-
-se em todos os lugares onde entrou. Para agradar os orientais que
veneram os mortos, ela criou o dia dos mortos; para conciliar o
paganismo, criou o Natal, que originalmente era a festa do sol. Em
todos os lugares há o sincretismo para que ela possa crescer, atingin-
do o fim proposto sem, no entanto, valorizar os meios pela ótica de
Deus. Mas esse é um crescimento degenerado e o resultado é que
a igreja que o pratica torna-se ninho de demônios. Precisamos ser
cautelosos para, em nosso desejo de crescimento, não incorrermos
nesse mesmo erro.
Isso acontece quando somos conciliadores com o sistema do
mundo: quando procuramos a aprovação e o elogio de todos;
quando queremos ser modernos e contextualizados; quando não
queremos ser chamados de caretas e nos moldamos para agradar
aos homens. Tudo em nome do crescimento.
Disse-lhes outra parábola: O reino dos céus é seme-
lhante ao fermento que uma mulher tomou e escondeu
em três medidas de farinha, até ficar tudo levedado.
(Mt 13.33)
Na segunda parábola, o Senhor nos fala de uma massa que
cresceu, mas não aumentou seu peso, apenas inchou. Essa pará-
bola também tem sido interpretada de forma positiva pela Igreja,
no decorrer dos séculos, como sendo o seu crescimento. A Igreja
seria o fermento, e a massa, este mundo que será levedado, ou seja,
influenciado pela Igreja.
É interessante essa interpretação. O problema é que o fermen-
to é algo negativo em toda a Bíblia, portanto, por que somente
nessa parábola seria positivo? Definitivamente, Deus abomina o
Advertências sobre os falsos profetas – Mateus 7.15-20 205

fermento (1Co 5.6-8; Gl 5.9; Êx 13.7; Mt 16.6). Creio que o


fermento na massa também aponta para o crescimento, porém,
um crescimento aparente, sem consistência e sem realidade. Creio
no crescimento, busco o crescimento, mas quero somente aquele
que vem de Deus e não o que vem por meio do fermento. Esta
é a tática do diabo contra a Igreja nestes dias: iludir alguns com
um crescimento sem consistência.
Quanto ao fermento nessa parábola, quero enfatizar quatro
sentidos: aparência, facilidade, impureza e pecado.

Aparência
O primeiro sentido do fermento é a aparência. Ele faz com que
a massa cresça e isso nos impressiona. Entretanto, se enfiarmos o
dedo na massa, ela murcha. Todo aquele volume era só aparência.
Por isso, precisamos ser cautelosos para edificar a Igreja e não mo-
vimentos; um corpo e não uma organização; um edifício espiritual
e não um depósito de material de construção. De que adianta dizer
que temos tantas células se elas não tiverem consistência e realidade?
Não queremos agregados, queremos gerar filhos genuínos, transfor-
mados pelo poder de Deus.

Facilidade
O fermento faz com que a massa se torne macia e fácil de ser
absorvida. Um pão sem fermento é duro e consistente, difícil de
ser comido. Vivemos uma época perigosa, em que o evangelho vem
perdendo sua profundidade e tornando-se algo diluído e superfi-
cial, sem a intensidade devida ao Espírito. Preocupam-me aqueles
pregadores que têm diluído tanto a mensagem que nem sei se ainda
pregam mesmo o evangelho. Uma mensagem assim produz cren-
tes inconsistentes, que buscam eternamente um evangelho fácil e
de bênçãos, e se escandalizam quando são chamados para tomar a
cruz. Muitos não geram discípulos porque tiraram a cruz de sua
mensagem para não tornar o pão duro de comer.
206 21 dias com Jesus no Monte

Impureza
Se colocarmos algo sujo dentro de um copo de leite, ele talhará
imediatamente. Toda impureza é levedo, é fermento. Devemos
buscar o crescimento, mas precisamos tomar cuidado com a per-
missividade, com a leviandade, com a impureza; com as coisas que
vêm travestidas com a graça barata e a falsa liberdade de Cristo.

Pecado
O último e mais evidente sentido do fermento, segundo as Escri-
turas, é que ele é um tipo do pecado. O fermento, no final, é cheio
de morte. Ele é feito da própria massa, envelhecida e apodrecida.
Portanto, o mais perigoso nessa busca do crescimento da Igreja é
que esse fermento foi feito da própria Igreja, só que envelhecida
e deteriorada. Quando algo velho e apodrecido entra na Igreja,
leveda tudo.
Nem sempre o fruto numérico é sinal de que o profeta é de Deus.
Precisamos ser muito cautelosos.
20º Dia

Condições para
entrar no Reino
– Mateus 7.21-23

Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no


reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai,
que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me:
Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado
em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios,
e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes
direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos
de mim, os que praticais a iniquidade. (Mt 7.21-23)
A primeira condição para entrar no Reino é ser salvo, e na carta
aos Romanos, Paulo diz que a salvação é obtida ao invocarmos o
nome do Senhor.
Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e,
em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os
mortos, serás salvo. Porque com o coração se crê para
justiça e com a boca se confessa a respeito da salvação.
208 21 dias com Jesus no Monte

Porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor


será salvo. (Rm 10.9,10,13)
Todavia, não basta ser salvo para entrar no Reino. É preciso tam-
bém fazer a vontade de Deus. Invocar o Senhor é para a salvação,
mas fazer a vontade do Pai é para a recompensa.

Fazer coisas para Deus, ou fazer a vontade


de Deus?
A segunda condição para entrar no Reino é conhecer e fazer a
vontade de Deus. Não é simplesmente sair fazendo algo para Deus,
e sim a vontade dEle. Existe uma enorme diferença entre os dois.
Aqueles que querem fazer algo para Deus presumem, baseados em
seu gosto pessoal ou nas necessidades das pessoas, o que devem fazer.
É por isso que as pessoas mencionadas no texto curaram enfermos
e expeliram demônios. Elas fizeram coisas para Deus.
Contudo, fazer a vontade de Deus é algo bem diferente. Para
isso, é preciso se submeter ao Senhor e esperar que Ele dê a direção.
Não fazer o que se gosta mais ou se acha mais apropriado, antes,
é fazer apenas aquilo que foi designado pelo Senhor. O fato de
determinadas pessoas não fazerem a vontade de Deus nos mostra
que não são servos do Senhor. Fazem coisas para Deus, mas não são
servos. A vida cristã não é uma questão de fazer coisas para Deus,
mas de obedecer a Ele.
Algumas pessoas nos pressionam para fazermos vários tipos de
obras boas e louváveis. Alguns nos pedem para criarmos um trabalho
de recuperação de toxicômanos, outros pedem um trabalho com
crianças de rua e insistem nos mais diferentes tipos de ministério.
Tudo isso é muito bom, mas nós somos servos e queremos fazer
somente o que for da vontade de Deus. Faremos apenas aquilo que
temos certeza de que Ele nos chamou para fazer.
Condições para entrar no Reino – Mateus 7.21-23 209

Deus é o Senhor da Igreja, e nós somos apenas servos, não os


senhores. Deus é nosso dono e é Ele quem dá a direção e a visão da
obra. E é sobre isso que vivemos e edificamos.
Aqueles homens mencionados pelo Senhor praticaram a iniqui-
dade, ou seja, não fizeram a vontade de Deus, fizeram apenas alguma
coisa para Deus, sem se preocupar em conhecer Sua vontade. Não
devemos pensar que iniquidade é apenas uma questão de adultério,
roubo e mentira. A Bíblia nos fala de um padrão muito mais eleva-
do, um relacionamento de intimidade com Deus, de conhecê-Lo
e ser conhecido por Ele.
A iniquidade nesse contexto significa “correr fora das regras”.
Por exemplo, quando um atleta vai correr, ele tem sua própria raia.
Então, mesmo que esteja ganhando a corrida, se estiver correndo
fora de sua raia, ele poderá ser desqualificado e perder a corrida.
Assim, a iniquidade também está em fazer a obra de Deus fora das
regras, fora dos padrões de Deus, achando que os fins justificam os
meios, e então vale tudo. Iniquidade consiste em querer fazer a obra
de qualquer jeito, a qualquer custo, segundo o seu próprio enten-
dimento, sem se preocupar com a vontade de Deus. É como um
soldado que vai para a guerra, mas não obedece ao seu comandante,
desrespeita as normas do exército e, apesar de estar na guerra, age
de maneira independente.
A compreensão comum é que essas pessoas citadas por Jesus não
eram convertidas, contudo, eram homens que profetizavam e faziam
milagres em nome do Senhor. Assim, podemos observar algumas
evidências de que essas pessoas mencionadas no texto de Mateus 7
são crentes, não ímpias:
™™ O Sermão do Monte foi proferido aos crentes, aos discípulos;
™™ O Sermão não ensina como ser salvo, uma vez que os ou-
vintes já eram salvos;
™™ Esta seção não trata de fé, mas de conduta, de obras, e sa-
bemos que ninguém é salvo por obras;
210 21 dias com Jesus no Monte

™™ A expressão “naquele dia” deve se referir ao tribunal de


Cristo, que será o julgamento dos crentes, não ao grande
trono branco, que será o julgamento dos ímpios. Ela tem o
mesmo significado que encontramos em 2 Timóteo 1.12,18;
4.8. Hoje, estamos no dia do homem, mas vem o dia do
Senhor (1Co 4.6; 2Co 5.10);
™™ Essas pessoas invocam o nome do Senhor e, portanto, de-
vem ser salvas;
™™ Elas fazem suas obras no nome do Senhor, contudo,
fora da vontade do Senhor, sem respeitar Suas regras
(Nm 18.1; Lv 10);
™™ Entrar no Reino deve ser entendido segundo o ponto de
vista dos discípulos: não como a salvação, mas a participação
no reino do Messias.
Existem as pessoas que são salvas, mas não se importam com
a vontade de Deus. Ganharam a salvação, mas escolheram andar
pela porta larga e pelo caminho largo da vontade própria. Contu-
do, também existem aqueles que até querem fazer algo para Deus,
como expulsar demônios e fazer milagres, mas não se importam em
conhecer a vontade do Senhor para eles. Querem fazer algo para
Deus, mas não o que Ele mandou que fizessem. Nenhum destes
reinará com Cristo, nem o relaxado nem o presunçoso que quer
fazer a obra de Deus segundo o seu próprio entendimento, sem se
preocupar com a vontade do Senhor.

Conhecer a Deus e ser conhecido por Ele


A Bíblia nos revela uma verdade muito séria: apesar de uma pes-
soa ter a vida eterna, ela ainda pode ser rejeitada no reino dos céus.
Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! Entrará no
reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu
Pai que está nos céus. (Mt 7.21)
Nesse versículo, vemos que as pessoas se referem a Jesus como
Senhor, mostrando que de fato elas O conhecem. Contudo, sabemos
Condições para entrar no Reino – Mateus 7.21-23 211

que conhecer o Senhor nos garante a salvação, mas ser conhecido


por Ele nos garante a recompensa do Reino.
Algumas pessoas, embora tenham sido salvas, não procuram
fazer a vontade de Deus. Fazem algo para Ele, mas não entrarão no
Reino porque nunca tiveram a postura de servo que deseja cumprir
a vontade de seu Senhor. Nos versículos 22 e 23, Jesus nos explica
essa questão em forma de profecia, mostrando que haverá muitos,
não somente um ou dois, que não farão a vontade de Deus.
Muitos, naquele dia hão de dizer-me: Senhor, Senhor!
Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e
em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome
não fizemos muitos milagres? Então lhes direi explici-
tamente: Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os
que praticais a iniquidade. (Mt 7.22,23)
Como vimos, a expressão “naquele dia” refere-se ao julgamento
do tribunal de Cristo, apontando para um acontecimento futuro.
Infelizmente, hoje, muitos vivem dentro da igreja debaixo de ce-
gueira espiritual, sem luz sobre suas obras e a verdadeira edificação
da Igreja. Contudo, naquele dia, eles terão luz e verão o quanto
estavam errados, e muitos dirão perante o Senhor: “Não temos nós
profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios,
e em teu nome não fizemos muitos milagres?”.
Dentro de uma só frase, a expressão “em teu nome” é mencionada
três vezes, provando que estas pessoas conhecem o Senhor. O fato de
dizerem “Senhor, Senhor”, prova que são cristãs. Elas não somente
profetizam, expulsam demônios e fazem milagres, mas fazem isso
no nome do Senhor. Por isso nos surpreendemos quando o Senhor
diz: “Então lhes direi explicitamente: Nunca vos conheci”.
Muitos acham que tais pessoas não são salvas, mas se não fossem,
a palavra do Senhor aqui não teria significado, pois esse capítulo de
Mateus é a conclusão do Sermão do Monte, dirigido aos discípulos.
Jesus estava lhes dizendo que eles não deveriam chamá-lo de Senhor
apenas com a boca, mas se O chamassem assim, deveriam também
212 21 dias com Jesus no Monte

fazer a vontade do Pai. Portanto, se o Senhor estivesse falando acerca


de pessoas não salvas, essa palavra perderia totalmente o significado.
O Senhor está fazendo uma advertência a Seus discípulos, pes-
soas salvas, e, portanto, os adverte dando exemplos de salvos. Tenho
duas filhas e também uma empregada em minha casa. Não teria o
menor cabimento dizer à minha filha que, assim como a emprega-
da se comportou mal e a despedi, se ela não se comportar, farei o
mesmo a ela. Essa é uma situação absurda, pois a posição de filha
é muito diferente da posição de empregada. Mas a situação muda
completamente quando digo a minha filha que sua irmã se com-
portou mal e foi disciplinada, e espero que ela se comporte bem
para que eu não tenha de discipliná-la como fiz com sua irmã. Esta
é uma posição coerente. Como pai, preciso tomar uma irmã como
exemplo para advertir a outra. Uma criada não pode ser usada para
comparação. Assim, não existe motivo para o Senhor usar os não
salvos como exemplo para mostrar aos discípulos que eles precisam
fazer a vontade de Deus.
O que o Senhor Jesus está dizendo é que existem muitas pessoas
que são filhas de Deus, O chamam de Senhor e têm realizado muitas
obras. Apesar disso, elas estão excluídas do Reino. Por essa razão,
aqueles que O seguem devem ser cuidadosos e fazer a vontade de
Deus, pois somente assim os discípulos saberão que, embora rea-
lizem muitas obras, se não fizerem a vontade de Deus, receberão a
mesma punição. O Senhor estava advertindo-nos de que somente
os que fazem a vontade de Deus podem entrar no Reino. Àqueles
que confiarem em suas próprias obras para se achegarem diante de
Deus, o Senhor Jesus dirá: “Nunca vos conheci”.
Pode nos parecer estranho o fato de nosso Deus, que é onisciente,
afirmar não conhecer tais pessoas. O que isso significa? Como já
dissemos, conhecer o Senhor nos garante a salvação e essas pessoas
conheciam o Senhor, mas ser conhecido por Ele é diferente. Em 2
Coríntios 8.3 lemos: “Mas, se alguém ama a Deus, esse é conhecido
por ele”. Em outras palavras, o Senhor somente conhece aqueles que
Condições para entrar no Reino – Mateus 7.21-23 213

O amam. Somos salvos por crer e não por amar a Deus. Contudo,
uma vez que cremos para a salvação, precisamos amar o Senhor para
ter o encargo de fazer Sua vontade e sermos por Ele conhecidos.
O Senhor conclui dizendo: “Apartai-vos de mim, os que praticais
a iniquidade”. Precisamos ter o cuidado de lembrar que o Senhor
não lhes disse para se apartarem da vida eterna. Como já vimos, o
termo iniquidade, no original, nos fala de pessoas que não seguem
regras, não guardam a lei ou não aceitam regulamentos. Aos olhos
de Deus, fazer o mal não significa apenas fazer coisas más. Alguns
oferecem fogo, mas é fogo estranho e isso é iniquidade. Outros fa-
zem coisas espirituais, mas nunca se importam com os princípios e
regras da Palavra de Deus, que é Sua vontade revelada. Os que fazem
a obra movidos pelo próprio ego não terão parte no reino dos céus.
Esse trecho do Sermão do Monte nos mostra a importância das
obras de um cristão e a grande diferença existente entre fazer obras
para Deus e fazer a vontade de Deus. Nada pode substituir a vontade
de Deus. A Bíblia nos mostra claramente que uma pessoa, após crer
no Senhor, embora nunca vá perder a vida eterna, pode perder seu
lugar na recompensa do Reino. Se não fizermos a vontade de Deus,
mas, em vez disso, agirmos de acordo com nossa própria vontade,
seremos excluídos do Reino. Deus quer que primeiro obedeçamos
à Sua vontade e depois que trabalhemos.
21º Dia

O crente prudente
e o insensato
– Mateus 7.24-27

Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras


e as pratica será comparado a um homem prudente
que edificou a sua casa sobre a rocha; e caiu a chuva,
transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram
com ímpeto contra aquela casa, que não caiu, porque
fora edificada sobre a rocha. E todo aquele que ouve
estas minhas palavras e não as pratica será comparado
a um homem insensato que edificou a sua casa sobre a
areia; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram
os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, e
ela desabou, sendo grande a sua ruína. Quando Jesus
acabou de proferir estas palavras, estavam as multidões
maravilhadas da sua doutrina; porque ele as ensinava
como quem tem autoridade e não como os escribas.
(Mt 7.24-27)
216 21 dias com Jesus no Monte

Até aqui, o Senhor tratou de várias questões como as duas por-


tas, os dois caminhos, os falsos profetas e o contraste entre o dizer
ser do Senhor e o fazer a vontade de Deus. Neste último trecho,
o contraste é entre o “ouvir” e o “fazer”. Através da ilustração de
dois construtores que edificaram suas casas sobre a rocha ou sobre
a areia, o Senhor quer mostrar a diferença entre o crente prudente
e o insensato.

1. O alicerce
Embora o Senhor Jesus seja a rocha sobre a qual nos firmamos,
nessa ilustração, a rocha é a prática da Palavra de Deus, é fazer a
vontade do Pai. Portanto, o problema colocado aqui não é uma
questão de ouvir, mas de praticar. Assim, fica evidente que o Senhor
somente será rocha sob nossos pés se levarmos a sério Sua Palavra.
Nesse sentido, a areia na qual o crente insensato edificou sua casa
aponta para ao menos três coisas. Em primeiro lugar, para uma
vida cheia de ouvir, mas sem uma prática consistente. São pessoas
que, semana após semana, ouvem a Palavra, mas nunca mudam de
comportamento. Estão sempre esperando que algo sobrenatural
aconteça e as leve a praticar a Palavra.
Sabemos que o poder do Espírito nos capacita a viver a Pala-
vra de Deus, mas nada acontecerá a menos que haja em nós uma
disposição resoluta de praticar o que já aprendemos. Em segundo
lugar, a areia aponta para os conceitos humanos. Nossos conceitos
e opiniões nunca são um alicerce seguro para edificarmos coisa al-
guma. O problema é que muitos acreditam mais em suas ideias do
que naquilo que a Palavra de Deus diz. Contudo, mesmo quando
não compreendemos completamente, precisamos obedecer, crendo
que o mandamento do Senhor é rocha debaixo de nossos pés.
Em terceiro lugar, a areia aponta para os métodos naturais. Para
tudo o que fazemos, existe a maneira de Deus e a maneira carnal
do homem.
O crente prudente e o insensato – Mateus 7.24-27 217

Há uma grande diferença entre esses dois tipos de alicerces.


O problema é que, enquanto se está construindo, não há como
perceber a diferença de uma casa edificada na rocha e a que é feita
sobre a areia. Tampouco um observador poderia diferenciar as duas
casas, pois a diferença está apenas no alicerce, que não pode ser vis-
to facilmente. Enquanto as paredes estão sendo erguidas, mesmo
uma base de areia pode suportá-las, mas quando vierem os ventos
e a tempestade é que a estrutura daquela construção será exigida.
Somente diante dos problemas, ataques e testes é que a realidade
será checada. E tudo o que é abalável cairá.
Às vezes, as pessoas nos procuram, aos prantos, porque seu casa-
mento ruiu. Porém, se caiu é porque o alicerce foi construído sobre
a areia, não tinha estrutura e precisava mesmo cair. Sei que parece
estranho dizer isso, mas é melhor cair para que possa ser reconstru-
ído, só que, desta vez, em uma base sólida, sobre a rocha da Palavra
de Deus. É melhor que a casa caia para que fique manifesto o erro
dos métodos humanos.
É muito triste vivermos iludidos pensando que nossa casa está
sólida. Por isso, é bom que venham as inundações para checar nossa
realidade. É melhor ruir do que viver enganado. Na verdade, não
existe um meio de mudar o alicerce de uma construção, o único
caminho é a demolição e a reconstrução numa base correta. É por
isso que a edificação do Senhor em nossa vida sempre começa com
a demolição do que foi construído sem o alicerce da Palavra.
Em Apocalipse 21.19, a Bíblia mostra a construção da nova
Jerusalém. Lá, vemos que Deus coloca pedras preciosas em seu fun-
damento, ou seja, em seu alicerce. O que Deus mostra neste texto
é que Ele não se preocupa apenas em erguer uma edificação, mas
também em colocar riquezas em seu alicerce. Uma obra prevale-
cente tem que ser edificada na prática e nos ensinos dos apóstolos.
Jesus não está comparando crentes com descrentes, mas crentes
com crentes. Ambos estão edificando, porém, um está edificando
com base na Palavra de Deus, na prudência, na prática do que tem
218 21 dias com Jesus no Monte

aprendido, enquanto o outro somente segundo o seu próprio en-


tendimento. Ambos os edificadores ouvem a Palavra de Deus, mas
apenas o prudente pratica.

2. O teste
O ensino do Senhor nos mostra que essas edificações foram
testadas, assim como toda obra certamente será testada um dia. Ob-
servamos que os dois construtores são crentes, vão à igreja, ouvem
as pregações e cantam corinhos. Assim, não há como distingui-los
apenas pela aparência. Mas a Palavra de Deus nos mostra que um
teste virá sobre a vida de todo homem, de todo pastor, de todo crente,
de toda igreja e de todo aquele que diz servir a Deus. Apenas uma
tempestade, ou uma inundação, ou mesmo uma ventania revelará
a verdade. Uma tempestade de crises e calamidades revela que tipo
de crente somos, pois o vencedor não se distingue totalmente do
derrotado até que venham as provações.
Tudo o que é abalável, que não tem firmeza e estrutura, deve ser
abalado em nossa vida. A Palavra do Senhor diz que os que confiam
no Senhor são como o monte Sião, que nunca se abala (Sl 125.1).
Muitas pessoas se entristecem quando veem, por exemplo, sua vida
financeira em ruínas, mas isso não é totalmente ruim, pois é assim
que descobrimos que nossas finanças estavam edificadas na areia, e
agora podemos construí-la na rocha da prática da Palavra de Deus.
De tudo o que possuímos, somente é digno de confiança aquilo
que pode suportar o teste das provações. Toda tribulação é um teste,
e dependendo de como respondemos, seremos promovidos a lugares
mais altos dentro do plano de Deus.
As provações vêm para que a Palavra e a vida de Deus possam
ser checadas e confirmadas em nós. Depois de ouvir uma palavra
sobre paciência, por exemplo, Deus permitirá circunstâncias para
que nossa paciência seja testada. Às vezes oramos por algo, mas Deus
nos testará para ver se realmente desejamos o que estamos pedindo,
ou para que as verdadeiras motivações se manifestem.
O crente prudente e o insensato – Mateus 7.24-27 219

É fato que, depois de pregar, ensinar ou aconselhar, seremos


checados por Deus para vermos a realidade das nossas palavras. O
Senhor disse que a realidade de nossa casa espiritual será checada
pela tempestade, pelas inundações e pelas ventanias.

a. E caíram as chuvas...
A chuva nos fala da obra de Deus em nós, do que vem de cima,
do céu.
Na Bíblia, a chuva pode significar três coisas: o poder do Espírito
(Os 6.3; Jl 2.23), as bênçãos do céu (Ez 34.26) e o juízo de Deus.
Creio que esse terceiro sentido cabe exatamente no contexto de
Mateus 7.24-27: a chuva aqui aponta para as tribulações que vêm
segundo a vontade de Deus para nos testar. Sabemos que o dilúvio
foi uma inundação enviada por Deus como juízo. Em Sodoma e
Gomorra choveu fogo e enxofre da parte de Deus. No Egito, por
ocasião das dez pragas, choveram pedras do céu. E no caso de Elias,
sabemos que ele fez cessar e depois cair a chuva sobre a terra.
A chuva, portanto, nos fala dos testes que Deus mesmo permite
para checar nossa realidade. Sabemos que a tendência de muitos
é atribuir ao diabo todos os problemas e infortúnios que lhes so-
brevêm, mas sabemos também que o Senhor trata com Seu povo.
Se depois de repreender e orar a respeito de algo parece que nada
mudou, talvez seja o caso de pensar na possibilidade de ser um teste
que procede de Deus.
Todos nós já experimentamos resistência espiritual, e sabemos
que muitas vezes elas procedem do maligno e devemos nos opor a
elas. Contudo, a Palavra do Senhor também diz que Deus resiste ao
soberbo (1Pe 5.5). Quando temos arrogância e soberba em nosso
coração, nós oramos, mas o próprio Deus nos resiste. A vida espi-
ritual é complexa e felizes são aqueles que possuem discernimento
para perceberem a origem de seus problemas.
220 21 dias com Jesus no Monte

b. Transbordaram os rios...
As chuvas caem do céu, mas os rios correm na terra, o que nos
fala da vida à nossa volta. Este teste aponta para as pessoas que nos
cercam e são usadas como instrumentos de Deus para nos tratar.
O cônjuge, o chefe, os filhos, os vizinhos e os parentes consti-
tuem um arranjo divino que em alguns momentos são como uma
inundação que checa nossas estruturas. Nós até pensamos que não
merecíamos conviver com pessoas tão difíceis assim. A verdade,
porém, é que precisamos delas. A convivência com essas pessoas
nos afeta tanto porque tem algo em nós que precisa ser mudado e
ainda não aceitamos ser confrontados neste ponto. É muito pro-
vável que ninguém teria a coragem de nos confrontar, então Deus
providenciou alguém para fazer isso.

c. Sopraram os ventos...
A Palavra nos ensina também que os ventos soprarão. Na carta
aos Efésios, Paulo nos fala dos demônios que atuam nos ares, e os
ventos nessa ilustração nos falam dos ataques dos demônios.
Nos quais andastes outrora, segundo o curso deste mun-
do, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito
que agora atua nos filhos da desobediência. (Ef 2.2)
...porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne,
e sim contra os principados e potestades, contra os
dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças
espirituais do mal, nas regiões celestes. (Ef 6.12)
Deus, então, permite que venham pressões com o propósito de
testar a estrutura de nossa casa espiritual. Se o que temos edificado
ruiu é porque não estava na rocha, porque aqueles que estão edifi-
cados em cima da obediência não podem ser abalados.
Os que confiam no SENHOR são como o monte Sião,
que não se abala, firme para sempre. (Sl 125.1)
O crente prudente e o insensato – Mateus 7.24-27 221

O ataque de demônios também é um teste em nossa vida porque


tudo está debaixo do controle de Deus, até mesmo os demônios.
Nada em nossa vida acontece sem a permissão de Deus. O Senhor
nos manda orar por nossos inimigos e abençoar quem nos persegue.
É assim que aprendemos a ser vencedores. Ora, como vamos orar
por nossos inimigos e abençoar quem nos persegue se não tivermos
inimigos nem perseguidores?
O inimigo que está ao nosso lado, aquela pessoa que nos per-
segue, é apenas um teste para que possamos aprender a orar por
nossos inimigos e abençoar quem está nos perseguindo. Através
disso, nos qualificaremos para reinar com Cristo no milênio. Deus
é bom! Ele não tem prazer em nosso sofrimento. O que Ele quer é
que cresçamos e sejamos qualificados. O problema é que somos re-
sistentes por causa do pecado, e Deus quer trabalhar em muitas áreas
de nossa vida, mas se Ele fizer tudo de uma vez, não suportaremos.
A vida cristã não é automática. Ela é um caminho, um processo.
E em cada etapa desse processo, Deus espera nossa resposta e nosso
posicionamento. Portanto, os testes são necessários para nos che-
car e nos fazer avançar. Se os homens vierem contra nós, devemos
amá-los, abençoá-los e orar por eles. Se o diabo nos atacar, devemos
resistir, não retroceder, e ele fugirá de nós. Se quisermos ser homens
e mulheres de Deus, aprovados e qualificados, precisamos aceitar o
agir de Deus em nossa vida.

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