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A MORTE
AOS 24 ANOS
CAPA: Fotocrom Artes Gráficas Ltda
COMPOSIÇÃO: Fabricio G. Dillenburg
EDIÇÃO: Siegfried Ellwanger
REVISÃO: Georges A. Laperche
ISBN: 85-7246-003-9
CATALOGAÇÃO NA FONTE
CDU 920.91
840-312.6
Os Editores.
algozes continuam na glória, co
bertos de medalhas.
Tudo isso foi o que me deci
diu e ajudou á escrever este li
E
vra, como um alerta, um testemu
•screvo este livro pensando, nho para a história, contra estes
sobretudo, nos jovens da França e criminosos que, depois de têr im
na ignorância em que foram manti posto à França sua ditadura tingi_
dos por mais de quarenta anos. da de sangue, querem obrigar ■ aos
Ignorância esta que consta mais moços, do presente e do futy_
tei pessoalmente, nas diversas vi ro, a escutar apenas as suas fal
agens que fiz a meu pais durante sidades.
os últimos anos e, também, pelas Espero que a juventude me er±
visitas que tivemos a satisfação, tenda e, comigo, exclame:
sempre imensa, de receber aqui no -Nunca mais!
Brasil.
Grande parte desta juventude
"Atrás dos verdadeiros resis
sequer havia nascido na época dos
tentes, infiltram-se os falsos.
acontecimentos que aqui narrarei.
Vimos os F.F.S. (Força Fran
Nada sabem de todos os crimes que
cesa de Setembro) fazerem leilão
sujaram a França, naqueles negros
barato do seu patriotismo.
anos. Tudo foi deles escondido.
Vimos os oportunistas, os a-
Foi por causa deste desconhe
proveitadores, virarem a casaca.
cimento que decidi escrever este
Os exploradores do patriotis
livro, como um protesto contra os
mo são confundidos com os que só
criminosos que, depois de impor à
viveram, só sofreram, pela pá
França sua ditadura sangrenta,que_
tria."
rem obrigar aos franceses, nasci
dos e ainda por nascer, a ouvir Valdimir d'Omerson,
forte!
tos, defendendo seus privilégios,
Confundidos! E por quê? sem falar nos seus bolsos.
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mo com seus milhares de combaten_ esta era a melhor política a se
tes. guir.
É decepcionante ver que um
aventureiro, um senhor dono de Assistimos a algo interessar!
grande cinismo, achando-se supe te alguns meses mais tarde.Chega
rior, com sua propaganda lançada ram de Inglaterra centenas de mi
aos quatro ventos, conseguiu le lhares de soldados e marujos,sen
var milhares de homens a pensar do que estes últimos haviam aban
que ele era o salvador. donado seus navios nos portos in
Sinistro, de Londres De Gau^ gleses, onde tinham se refugiado,
lie mandava-nos ordens absurdas: não tendo mais a posibilidade de
- "Agricultores! - dizia - sair de lá. Todo o corpo expedi
Deixai vosso trigo no campo. Não cionário de NARWIK ao norte da No
deveis trazê-lo a sede da fazen ruega foi chamado com urgência de
da, pois os alemães apoderar-se- volta para a França no começo da
ão dele!" ofensiva alemã, mas foram obriga
Uma política no estilo quan dos a desembarcar em solo britâ
to pior, melhor. Para quem esta nico, pois a França já estava in
va longe, distante das consequên_ vadida.
cias, parecia bastante razoável. Todo este contingente negou-
Ninguém seguiu tais ordens, se a continuar combatendo, inclu
criminosas. Os agricultores dig sive os milhares de soldados que,
nos não poderiam aprová-las,pois saindo de Dunkerque, seguiram as
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Os patriotas seguidores fié A rádio Gaullista de Londres
is do lema "antes de mais nada, d espalhava insultos e mentiras dia
meu bolso" eram muitos. De Gaulle riamente. Eram feitas em conjunto
e seus parceiros mostraram-nos co_ por ingleses e franceses simpati
mo pode-se usar meios inimaginá— zantes de De Gaulle. Ao que pare
veis para alcançar este ponto. ce, rapidamente eles esqueceram o
Minha consciência revolta-se ocorrido em Mers-el-Kelir, o por
por isso, mas as deles recusam-se to militar na Argélia onde a fro
a reconhecer tal postura. Por fim ta francesa havia sido escondida,
isto acabou causando a morte de mi_ a fim de evitar sua tomada pelos
lhares de compatriotas. alemães.
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As bombas inglesas caíam - "Neste caso, todo o contin^
sobre os navios antes mesmo de al_ gente do exército francês seria o
guém emitir qualquer sinal de ata traidor da pátria, o "vendido", e
que, matando mais de dois mil ma não só o da África do Norte. Uma
rinheiros franceses, indefesos ao lástima..."
fator surpresa de nossos próprios Em Campei, havia um estudan
"aliados". Apesar do fato ser he te super-dotado, a quem chamava—
diondo e de extrema traição, a re_ mos "Tras-Bourg". Após ter deixa
conciliação foi bastante rápida.. do a escola, seu único trabalho a
Nessa época, não havia mui realizar era descer a estrada de
tos aparelhos de rádio na pequena Mascens e parar na casa de seus
cidade, e todos os dias nos encoj2 primos, na praça da igreja, con
travamos, seis ou sete amigos, na tinuar até o armazém Pariot, com
casa da viúva Bouchet. Parisiense prar o necessário e subir novameri
aposentada há muitos anos, a viu te a rua. Isso foi o que lhe va—
va ligava seu rádio e deixava-nos leu o apelido de "Tras-Bourg". Fa
ouvir o que nos era proibido pe lando a respeito da colocação da
los alemães: Londres, com suas in_ rádio Gaullista, saiu-se com esta
findáveis notícias, repletas de resposta formidável:
verdades, mas também salpicadas e - "Os soldados passaram por
sujas de mentiras. uma lavagem cerebral".
Pouco a pouco, ia ficando ir_ Olhando-o de frente, disse —
ritado com os insultos que os fo lhe:
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poderíamos nós fazer? Fugir em es^ uma medida tão nobre.
cala total, em massa? As autoridades da ocupação a_
lia no campo, passava fome muitas ram sem piedade seus próprios ir
vezes. As pequenas regalias, o su_ mãos.
para aliviar a fome dos franceses necer mercadorias para seus negó
e das centenas de milhares de pri_ cios fraudulentos com os alemães.
aos prisioneiros nos campos ale seu tráfico com as tropas nazis—
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panhado de seus amigos da resis— ticos, antes que o pós-guerra nos
tência falsa. trouxesse esfregões de aço e piás
tico.
Depois da chegada das tropas Enfim, após algumas ameaças,
americanas começaram os bailes e "le fil de Ia buchoniere" colocou
as festas populares que, durante seu revólver no meu nariz, amea-
a ocupação alemã, eram praticameri çando-me de morte, chamando-me
te proibidos. Pètainiste e colaboracionista.
Em um desses bailes, que te Amigos se interpuseram e ele
ve lugar numa antiga escola muni se acalmou.
cipal no centro da vila, fui pro Pouco depois, fui com um gru_
vocado por um F.F.I. (Força Fran po de amigos beber uns copos de
cesa do Interior, composta de jo sidra em nossa adega, situada pojj
vens que, após a retirada dos ger^ cos metros da escola. Bebemos al
mânicos, sentiam-se cheios de "co guns bolees tranqüilamente e vol
ragem" para lutar). Não havendo o tamos para o baile.
inimigo, lançavam seu ódio contra Ao entrar no salão, vi o ca
os próprios compatriotas. Este j£ bo sentado num banco, do outro la_
vem, que me provocou, era de Mas- do da sala. Ao seu redor, alguns
cent, município próximo a Campei. conhecidos meus. Um estava com a
Corajoso, fantasiado de cabo com mão sobre o ombro dele; como que
uma farda conseguida sabe Deus on_ o recriminando, a outra mão, li
de, d revólver bem à vista, pare vre, erguia um dedo em riste so
cia um cowboy americano. bre a face do jovem. Em seguida o
Apesar de conhecê-lo, de vis_ rapaz levantou-se e saiu,cabisbai_
ta, há vários anos, não lembrava, xo, para não mais aparecer.
e não lembro, seu nome. Apenas re_ Posteriormente, vim a saber,
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como nos quatro anos de guerra. nal do racionamento, depois que a
Os açougueiros matavam à noi_ guerra acabou.
te; comprávamos, então, mais car Tivemos poucos soldados ale
ne do que o necessário, já que o mães alojados em Campei. Um ou d£
futuro era incerto, e não sabía is dias apenas, em toda a guerra.
mos se a teríamos no dia seguinte Mas, em Mascent, Maure de Bretag-
Também devíamos comê-la sem muita ne e no campo de Coetquidan, eles
demora, pois as geladeiras eram u_ estavam em grande número.
ma raridade. Muitos deles procuravam che
Os agricultores, como ocor gar às fazendas, no campo, a fim
ria antes da guerra, continuavam, de encontrar alimentos. Não só pa
sem oposição, a levar uma certa ra levar aos seus colegas, mas pa_
quantia de trigo para o moinho, a ra enviar às suas famílias, na A-
fim de produzir uma farinha como lemanha. E, geralmente, encontra
jamais- houve, branquíssima. Antes vam muito mais do que poderiam es_
da guerra a farinha não era assim perar.
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- "Diga a eles que não tem"- migos! Que carnificina!
nós lhe avisávamos. 0 lugarejo em que vivíamos a
- "Mas eles sabem que temos." tanto tempo iria conhecer, no £
- "E você deve continuar di no de 1944, crueldades piores que
zendo que não temos!" Monterfil e outros lugares, de eu
As tropas alemãs, sempre, jos acontecimentos falarei mais ja
mostraram-se corretas com a popjj diante.
lação e, dificilmente, procura Havia na cidadezinha algumas
riam intimidar a uma mulher. Fa mulheres que, em lembrança à rev£
lo, é claro, da população civil, lução de 1789, chamávamos "as tri
e só dela, não dos falsos resis cotenses".
tentes, que quando estavam cer Fomos, porém, demasiados ge
tos da não existência do perigo, nerosos com a denominação que de
atiravam nos soldados alemães co_ mos a elas. Eram da pior espécie,
vardemente, pelas costas. com suas agulhas, e também suas £
Durante toda a guerra, eu es_ diadas línguas, ferinas. Enlamea
condi armas de combate: dois fu ram mais de uma pessoa honesta, ejn
zis Mauser, herdados do conflito tregando-as por qualquer motivo,
anterior, bem engraxados e em bom qualquer coisa, que as importunas
estado. Um dos fuzis pertenceu a se.
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de dentro, como tais. Isso foi me seus crimes.
dito por um de seus amigos, muito Eram muito corajosos quando,
falador. Se bem que nem foi necej; armados, atacavam fazendinhas is£
sário, pois suas açSes provaram o ladas, pilhando, torturando, ma
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sem exceção, vivíamos sob tensão, migo completamente desarmado, ain
sob o terror. da deu a ordem de levantar os bra_
- "Quem está aí?"- perguntei ços! Será que ele tinha medo que
-"O que quer?" eu fosse um grande campeão de ka-
- "Polícia! Abra a porta!" - ratê?
responderam-me. Como poderia eu pensar, que
Não era hora para a polícia, se dirá querer, que canalhas des
e minhas dúvidas se dissiparam: £ se tipo lutassem contra nossos in
ram os terroristas da falsa resis vasores? Como essa gente,desse ti
tência. po, poderia defender nosso país?
Todos os dias os jornais nos Eu o olhei por alguns segun
davam notícias das visitas notur dos e, sem pensar em nada, fechei
nas e dos ataques dos terroristas a porta de novo, jogando-me para
da resistência."Atacaram a fazen o lado, atrás da coluna que sepa
da de X, massacrando três pessoas rava a porta da janela.
Em Y, queimaram os pés de duas mu Uma fração de segundo depois
lheres, para obrigá-las a mostrar a metralhadora crepitava. Não é a
onde estavam as economias da casa mais agradável das experiências,
e roubá-las. Depois, atearam fogo afirmo, servir de alvo à uma me
aos galpSes da fazenda." tralhadora.
Era um verdadeiro horror nos Sabia que o dedo dele estava
campos. no gatilho, no instante em que fe
Eu adivinhei, sem muito es— chei a porta. Tê-la fechado, in-
forço, frente a quem me encontra continenti, foi o que me salvou.
va. Cinqüenta ou mais projéteis,
Mesmo assim, com a consciên lançados contra a casa, perfura
cia tranqüila, pensando que gran ram portas e janelas, transformar^
des desgraças são reservadas para do tudo numa verdadeira peneira.
os outros, resolvi abrir a porta. Pensando que eu havia ficado
Um grande herói estava lá, a estendido, morto, atrás da porta,
metralhadora debaixo do braço, a- o "herói" foi juntar-se ao restar^
pontada para mim. te da turba, que ficara no centro
Mesmo esperando algo, não i- da pequena vila.
maginei esta cena. Certamente voltariam,mais ce_
Ele tinha os olhos pequenos, do ou mais tarde, para acabar seu
meio fechados, fazendo-me lembrar trabalho, sua ocupação patriótica
um mongol. Nada tranqülilizador,o de roubar e pilhar.
homem era, sem dúvida, um terro— Aproveitei sua saída para fu
rista. gir.pelo jardim que ficava atrás
- "Mãos ao alto!" - ordenou- da casa.
me. Meu pai, meu irmão, nossa ern
Armado, em minha frente, co pregada, fizeram a mesma coisa,di.
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rigindo-se à casa de Manuel, nos policiais. Ao contrário, aconse—
so amigo. Contudo, naquele momen lháva-nos a Jião fazê-lo.
to, eu nada sabia deste fato. - "Já passou".- dizia - "Es
Cheguei ao centro da vila e tá terminado, e não falemos mais
procurei por um telefone, para a- nisso".
visar à delegacia de polícia, que Estava ao lado dos terroris
ficava em Maure de Bretagne, cin tas, ajudando-os a encobrir seus
co quilômetros distante de minha crimes. Comentavam em Campei, que
casa. Porém, logo dei-me conta do ele teria pago muito dinheiro aos
erro que cometia. Primeiro, a po terroristas para ser deixado em
lícia não viria; que poderiam e- paz. Ele podia pagar bem, já que
les fazer contra as metralhadoras nos anos de ocupação tinha enchi
dessa gente? Não tinham vocação do os bolsos. Pagou caro, podia
para a morte. E mais: o telefone, esquecer.
vam constantemente serem nossos a^ nido por dinheiro; para mim, por
migos, mas que, na realidade, mari consciência. Não era fácil esque
davam os assassinos à nossa casa, cer o que estava acontecendo.
no meio da noite. Dizia a mim mesmo que jamais
Tive claramente essa impres deveria tomar esse caminho.
são, que mais tarde veio a se con_ Dirigí-me, então, à estrada
firmar. Isso, então, devo à famí de Mascent. Não havia percorrido
lia dos falsos "barões", que rece_ trinta metros," quando ouvi o baru_
biam os alemães de braços abertos lho de uma pequena tropa que se a_
A uns vinte metros do local zas, que conhecia muito bem, sem
juntou à nós, para dar queixa aos balho eles teriam realizado! Mas,
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isto, era muito perigoso! fazenda que, meses, mais tarde,eu
Estava ansioso, pensando em quase fui morto, asfixiado por um
minha família, sem saber que eles gás.
também tinham conseguido ficar em Mareei, o filho de Augusto,
um lugar seguro, à salvo. veio pedir-me ajuda para dinami
Após um certo tempo, resolvi tar uma camada de pedras, que ele
voltar para casa, para saber como tinha encontrado a doze metros de
ficaram as coisas após minha saí profundidade, quando cavava um p£
da precipitada. ço na sua fazenda.
Procurei chegar pela frente. Resolvi ajudá-lo e, dias de
Sendo uma noite muito escura, pu pois, fui à sua casa para fazer o
de salvar minha vida novamente. serviço.
Encontrava-me a uma distân— Após ter preparado tudo, des.
cia de trinta metros da casa,quafi ei na cisterna e coloquei alguns
do ouvi passos. cartuchos de dinamite no furo an
Parei no canto de uma parede teriormente feito. Acendi o pavio
e esperei. e procurei sair rapidamente do l£
Alguns segundos depois, ouvi cal.
baterem na casa de Jules Bouvet.A Após a explosão, seria nece£
sua esposa, Lea, veio abrir, e pju sário evacuar um gás mortal, que
de ouvir a conversação. 0 terro sempre ficava nesses buracos.
rista queria saber se eu não estja Usávamos, para isso, um meio
va refugiado na sua casa. A dis rudimentar, o único existente na
tância de uns dez metros de onde época: um feixe de trigo,para ser
eu estava, tudo foi muito claro. mais exato a palha do trigo, era
Quando todos os assassinos e amarrado no extremo de uma compri_
bandidos chegaram à minha casa.es^ da corda, com a qual, fazendo mo
perando encontrar-me estendido a- vimentos de vai-e-vem, tentávamos
trás da porta, tiveram uma decep ventilar o poço, para tirarmos t£
ção. do o gás formado no fundo.
Agora, procuravam-me, para ja Após uma hora, resolvi des
cabar a caçada. cer para ver o resultado do servi_
Além de simpatizante de Petji ço. Para isso, usávamos um cabo,
in, eu era presidente do sindica de aço, com um gancho na ponta.Ne
to agrícola do município,cargo es_ le colocávamos um pé e, com o ou
te bastante visado pelos crápulas tro livre, nos protegíamos das pe_
da falsa resistência. dras pontudas. Segurando-nos fir
Vendo o perigo que eu corria, me, com as mãos, descíamos na ve
se ficasse por perto, resolvi fu locidade que o sarilho permitia,
gir para a casa de um amigo, que vestidos apenas com bermudas.
morava no campo. Chamava-se Breil Uma vez no fundo do poço, eu
de Augusto Pilpré, e foi em sua acendi um fósforo, que queimou a-
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té a ponta de meus dedos. Deixei- Pedi novamente para descer.
o cair, inadvertidamente,sobre al^ Lembro-me, depois disso que,
gumas palhas que haviam se solta- deitado no fundo do poço, via uma
to do feixe. Acendeu-se, então,um névoa, cada vez mais densa; o ca
pequeno fogo, que apaguei de ime bo, estava perto do meu rosto. Eu
diato com a sola da bota que usa~ tentei pegá-lo várias vezes , sem
va. conseguir sequer tocá-lo. Então,a
0 gás, que tanto nos preocu escuridão absoluta sobreveio.
pava, era extremamente mortífero, Quando recobrei os sentidos,
e em poucos segundos podia matar estava deitado na grama, perto da
uma pessoa. Por sorte, não era e^ boca do poço, com umas oito pess£
plosivo. Pelo contrário. Portanto, as à minha volta, mais apavoradas
quando queríamos nos certificar a do que eu.
respeito da não mais existência Mareei, ao ver o que aconte
da substância, usávamos o "teste" cera, tinha chamado todos os vizi^
do fósforo: acendia-mos um, e se nhos, que, juntos, puxaram-me pe
houvesse gás, a pequena chama apa_ lo pé, de cabeça para baixo mesmo
garia de imediato. Por sorte, o cabo e a bota
Não foi esse o caso. resistiram ao esforço. Do contrá
Tranqüilizado, tirei o pé do rio, eu estaria morto.
gancho e comecei a mexer em alg^j Meu corpo estava cheio de ar
mas pedras soltas. Sob elas, co- ranhões; pelo atrito com as pare
vim a saber, havia ainda gás. des do buraco. Contudo, se tives
Senti como que uma pancada à se permanecido mais alguns segun
nuca, e de imediato coloquei o pé dos lá embaixo, certamente não es_
no laço, segurando firme. Gritei: taria escrevendo este livro.
- "Sobe!" Pouco a pouco, a fisionomia
Mareei começou a enrolar o das pessoas à minha volta começa
sarilho. Entretanto, meu corpo já ram a ficar mais claras. Sorrisos
não respondia ao esforço necessá amarelos apareciam.
rio para suportar a subida. Levantei-me sozinho, com di
0 cabo puxando a perna,eu no ficuldade. A cabeça pesada, o pei^
fundo do poço, caído. to doendo. Ao meu lado, Mareei e
- "Desce! Desce!" -berrei ojj sua esposa, Auguste, com a mãe e
tra vez. De imediato minha perna a viúva Gasset, que havia perdido
desceu novamente ao cascalho. o marido na guerra. Também reco
Ergui-me, segurei o cabo de nheci a família Goubaire, comple
aço com força e, de novo, chamei: ta, e alguns amigos.
- "Sobe!" Um pouco tonto, dirigí-me a
Foi uma repetição da primei Mareei:
ra tentativa: a perna subiu, en - "Traga uma jarra de sldra,
quanto eu caí sentado no chão. para festejarmos! Vai fazer bem a
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todos, pois não foi desta vez, a- nhamos sido perdoados.
inda, que me fui!" Esqueceu, porém, de duas cqi^
Mais uma vez, posso creditar sas importantes, que deveriam ser
este milagre à Nossa Senhora, que esclarecidas:
jamais negou-me a proteção. De que estávamos sendo per
Foram difíceis alguns momen doados?
tos que passei na casa do amigo, E porque estávamos sendo pe^r
lembro-me bem. doados?
mo fui bem recebido por Pilpré ao Também, logo eu, que não ti
chegar. Expliquei o problema e de nha nenhuma razão para pedir per
imediato convidou-me a entrar,ofe dão!
tiu para que esperasse, pelo me noite, para continuar suas ações
nos, o dia clarear. "patrióticas" e perpetuar o mais
Pilpré recomendou-me muito a horrendo dos crimes que a França
fim de que eu não falasse a nin veio a conhecer.
guém que ele me recebera em sua Ao entrar na casa, vi que
zer-lhe mal por causa disso. inteiro, nenhum vidro nas portas
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vam sobre a mesa. Também roubaram Quero aproveitar, antes de
roupas, uma bicicleta. De valor, prosseguir a narrativa, para me
o que não puderam levar, queima apresentar corretamente.
ram na praça da Fontaine. 0 fogo Filho de um agricultor pe
ardia ainda. Um valor aproximado queno, igual à maioria da região,
de cem mil francos... meu pai era dono de mais ou menos
vinte hectares de terra.
Numa das minhas viagens en Desde a mais tenra infância,
contrei-me, na França, por acaso, tive o desejo de conhecer o mundo
com um dos falsos "barões", pa percorrendo grandes espaços.
deiro à época em Maure de Bretaçj Terminados meus estudos bási
ne. cos em minha cidade, não tive pos^
Dirigindo-se a mim quis, co sibilidade de continuar o curso
sempre o fazem, mostrar-se ino— superior na capital, apesar de um
cente diante -do que havia aconte professor, Le Gracier, encorajar-
cido em minha casa, em 1944. Es me a isso.
tava com um sobrinho, que não a- Sentimental demais, não fui
briu a boca. capaz de abandonar meus pais, que
Tentava provar sua inocên— já não eram muito jovens. Quando
cia dizendo que não poderia ter falava me partir, meus pais dizi
mandado fazer algo assim com um am-me :
necessário, mas meu pai seria, Um dia, esta minha amiga viu
de qualquer jeito, vingado!Seria ser necessário dar alguns conse
meu direito, meu dever, e não i- lhos a elas, de que muito preci
ria me furtar disso!" savam. Recebeu de volta gritos
horríveis. Quanto me contou a ce_
- "Ah, sim! - respondeu-me, na, tinha lágrimas nos olhos
espantado - "Tu matarias inocen - "Queremos nossa liberdade!
tes!" Queremos nossa liberdade!"- grite
Durante os meses de verão a vam.
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ninguém, nem mesmo aos agriculto Joseph Wester foi um bode ex_
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aos seus sucessores. ções, não tive outra opção, a não
Mais tarde, isso fez com que ser aceitar o cargo; e fiquei na
grande número de pessoas dissesse presidência até minha partida pa
que "a grande derrota da França e ra a Guiana Francesa, em 1951.
seu desmoronamento não foi em qua Neste ano, a propósito, Jean
renta, mas em quatrenta e quatro, Bouhon, presidente regional do
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soes, torturados e massacrados, e locado nessa cidade foi planejado
a desculpa que davam para tais ca^ por um ex-nazista).
sos era meramente pertencerem aos Tratando-se da glória do che
sindicatos. Em 1944 isto bastava. fão, seus seguidores aceitam tudo
A Jean Bouhon, os agriculto que lhes apresentam; deitam-se no
res do oeste da França devem sua chão e ronronam como gatos; e, se
organização atual. o "patrão" passa a mão nas costas
Ele sim merecia um busto co deles, levantam o rabo de satisfa
mo homenagem, colocado na praça ção.
de Lices, e não o sinistro crimi Lembro-me de um caso que me
noso De Gaulle, que recebeu um em atingiu no campo sentimental vio
Colombery. (Ainda mais quando sa lentamente.
be-se que o busto de De Gaulle co
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Esse episódio mostrou, de ma bom Gaullista que era.
neira clara, a que ponto as pes Não se deve esquecer,também,
soas podem chegar, em baixeza, c£ que trinta milhões de franceses u_
vardia, em determinados momentos, nicamente dependiam dos agricult£
turvos, da história. res para comer. Mesmo as tropas a
Só Deus sabe tudo o que co lemas recebiam parte da produção,
nhecemos no período desses anos.. embora a maior parte se destinas
Tratava-se de um agricultor se ao povo francês.
amigo. Apesar de toda a sujeira e Entretanto, muitas pessoas u_
crimes, ficou na França." savam "fazer de conta" não saber,
Pergunto: para encobrir sua ganância.
- "Temos que esquecer?" - "Isso é para os boches!" -
Não é possível. Não se pode berravam, sobre a produção.
mais passar por cima das coisas à Infelizmente, uma parte da a
nossa volta. Para isso,precisaria gricultura geralmente era para e-
mos de um paraíso escondido, ain les dirigida.
da por ser criado; um espaço que Mas, e o resto? Os milhões a
se opusesse à camada de nulidade, viver nas grandes cidades?
de inutilidade, tão presente. Se nos campos houvesse só os
Durante a ocupação, como já Gaullistas, todos teriam passado,
citei, eu era presidente do sinol sem duvida, muito mal.
cato agrícola. Isso, talvez, tivesse servi
Este agricultor veio até mim do às ambições de De Gaulle e de
para pedir cinco atestados de a- seus amigos; para eles o pior era
borto para suas vacas. Se, por a- o melhor. Embora este tipo de corn
caso, não fornecesse terneiros pa portamento não fosse, absolutameji
ra a comissão de abastecimento,s£ te, o melhor para a França.
ria multado pesadamente. Os ates
tados que eu podia fornecer-lhe e_
vitariam a multa. Contudo, preci
sava da constatação de tais abor
tos, o que não havia.
Absolutamente, o agricultor,
homem comum, nã.o era o que cha
mávamos de traficante do mercado
negro. Vendia seus animais,no me£
cado intermediário, sendo que os
seus preços,embora acima dos esta
belecidos oficialmente, eram acei_
tos por todos, pois estavam abai
xo do mercado negro.
Procurava apenas lucro, como
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Mas, voltando ao problema do dias atribulados, achando-se inc£
agricultor e seus atestados,achei modado por alguma coisa,esse com
que, mesmo sem poder comprovar os portamento fosse um "descarrega-
abortos, o amigo tinha direito a mento" dos problemas. Soltou so
eles. Concedí-os, então. bre mim o seu mau humor, as suas
frustraç3es, como agradecimento à
minha ingenuidade.
Ele mostrou-se muito satis—
Tudo isso exemplifica perfei^
feito, dizendo que eu tirara"um
tamente a que ponto pode chegar ^j
grosso espinho de seu pé", agrade,
ma pessoa num período assim.
cendo muito.
Talvez o medo da polícia fojs
Éramos amigos e nos encontrji
se latente. Serviria isto como ex
vamos sempre na pequena cidade,in
plicação?
do ou vindo do trabalho.
Semanas' após a libertação, co Acho que o que vimos nesse ca
so foi como o homem pode nhegar a
meçou, sem que eu saiba o porquê,
encarnar um lobo!
a reprovar-me, por ter lhe faciU
Ressalto que o agricultor fa
tado conseguir os atestados fal
zia parte das pessoas mais concei
sos para os abortos. Dizia que eu
tuadas da cidade.
nSo tinha direito de âg£f assim
Apesar de tudo, não dei maior
Isso é realmente veraadernão
importância ao caso. Éramos amigos
tinha este direito. Mas, como im
e continuamos amigos. Só imagino o
becil que era, eu o fiz, com o iji
que poderia ter acontecido se não
tuito de ajudar-lhe, para receber
tivesse lhe fornecido os atestados
depois um agradecimento desse ti
naquele dia...
po.
Não vendo mais muito futuro,
na década de cinqüenta comecei a
Chegou ao extremo ao afirmar procurar uma terra para imigrar.
que, em determinado momento, qua Durante esse tempo,apesar do
se me denunciou, e que se arreper^ trabalho duro, era boa e bela a
dia de não tê-lo feito. vida em Campei.
Que bicho o havia picado? 0 Éramos um grupo de rapazes e
que tinha na cabeça? moças, unido. As festas eram mui
É o que me pergunto até hoje. to alegres e, de vez em quando,be
Creio que, quanto às denúnci bíamos um pouco demais...
as, seriam feitas às autoridades, Os anos se passaram. Meu ir
apesar de crer que ele o faria di_ mão se casou e a época do bandi
reto aos franceses, e não aos ale tismo Gaullista perdeu-se no tem
mães. po.
30
rer o mundo. tasma. Aqueles que experimentam _a
Um amigo, "petit Louis", que tos de banditismo desse tipo demo
pesava cento e trinta quilos,iria ram a esquecer.
31
ciasse um teatro-quermesse, mesmo quele momento, eu não estava pre
com antecedência longa, para que parado para isso. Preferi a terra
esse professor escolhesse a mesma ao céu.
data para realizar um baile. Sem Como fato curioso, os anti
pre com o propósito de criar desu^ bióticos eram pouco conhecidos du_
nião, seguindo a linha política rante este período.
de um certo partido da época. Entrei numa "boutique", onde
Determinado ano, no dia tra comprei um pincel para barba, que
dicional da quermesse na cidade,o ainda possuo quarenta anos depois,
professor chegou ao cúmulo de or em bom estado.
ganizar uma peregrinação ao san Boas lembranças...
tuário de Santa-Anna de Auray! 0 A hora do meu trem chegou;t£
que, vindo de sua parte, era o cú_ mei meu lugar e, algum tempo mais
mulo da hipocrisia. tarde, após uma corrida em grande
Mas, na pequena cidade, sem velocidade, atravessando a planí
pre havia alguém para segui-lo... cie normanda, chegamos a Havres.
0 prefeito, após algumas dis Desci e peguei um táxi para
cussSes, conseguiu da administra o porto, pois estava em cima da
ção a transferência do instigador hora.
de intrigas, e sua substituta mo£ No cais, o Gascogne esperava
trou-se bem mais moderna e cornpr^ o momento de lançar-se ao oceano,
ensiva. em viagem. Era um navio antigo,ca
A harmonia acabou por retor nadense, comprado pela Transat de
nar ao lugarejo. pois da guerra.
Transcorrida uma semana, to À sua volta, todo mundo ti
mei o trem em Rennes, iniciando a nha pressa: corriam de um lado pa_
minha viagem. Quem levou-me até a ra outro, voltando, sempre, à pojn
estação foi Fernando, um bom ami te de saída.
go. Fui empurrado para uma cabi-
Cinco horas após eu cheguei ne de três passageiros. Um era de
na estação de Monparnasse, em Pa Porto Rico; o outro, era do sul
ris. Depois, foi a vez da estação da Ásia. Ninguém entendia uma só
de Saint Lázaro, de onde saíam os palavra do que o outro dizia.
trens para o Havre, porto de onde Que companhias eu tinha ar
sairia o navio que me levaria até ranjado!
a Guiana. Mais tarde, os passageiros a
Em Saint Lázaro, esperando a bordo fizeram suas últimas despe
hora da saída do trem, fiz um pe didas às suas famílias que esta
queno passeio pelas ruas próximas. vam no cais. Eu não tinha ninguém
Não demorou muito, moças evangéli para me despedir...
cas me cercaram,, propondo o cami 0 navio se distanciou do per
nho do sétimo céu; entretanto, na to, em direção a Southampton, In-
32
glaterra, a única parada na Euro mitávamos. E ninguém sentia-se eri
pa. Como a travessia foi curta,em vergonhado na frente dos outros.
pouco tempo estávamos lá, ancora Estávamos todos na mesma situação
dos. inesperada. Todos éramos iguais.E
Era tempo de embarcar passa os que não comiam ficavam doentes
geiros ingleses. Logo, ficamos em em pouco tempo.
condições de continuar a viagem.E Tivemos, inclusive, um morto
em meio a bruma da madrugada,o na^ no navio: um martiniquês que, teri
vio lentamente distanciou-se, em do terminado seus estudos de medi^
direção ao alto-mar. cina em Paris, voltava para a sua
34
para viver. lhas Royal, Saint Joseph e Ilha do
Mas, pena, passamos por es Diabo, onde condenados cumpriam se
sas ilhas rapidamente. Em algumas veras penas determinadas pela jus
não era permitido descer ao cais. tiça francesa.
las inglesas, que se diziam atri ra possível ler, nas paredes das
zes, e que bebiam mais whiskey do celas, mensagens que os prisionei_
tos, eu nâ"o notei muita diferença ondas, deixando sinais de seus ru_
35
não impediu que, depois de quinze instalava-se o governador.Como eu
minutos, diversos passageiros jo não fazia parte desses eleitos de
gassem ao oceano o que tinham no Deus, hospedei-me no Hotel dos Pal_
estômago. mitos, em uma praça, que recebia,
Como já disse, o cais de ma coincidentemente, o mesmo nome.
deira estava completamente podre, Neste tempo, Cayennes era u-
e toda a atenção era pouca, para ma pequena cidade, sem muita im
evitar os buracos. portância, com poucos moradores:
Constatei, ao chegar às dis uns duzentos brancos,incluindo as
tantes ilhas,que nada parecia ten^ famílias.
tar-me ali. Nenhuma possibilidade Após alguns dias,deixei o h£
de cultura parecia apresentar-se. tel, trocando-o .pela casa hospit§_
Contudo, com o tempo,descobri coi_ leira de São Paulo, na mesma pra
sas muito importantes e melhores. ça, porém em direção oposta.Era jj
Essa época era.a dos grandes ma casa;de repouso e também espé
administradores que a França teve cie de hospital, dirigido por ir
logo após a libertação: Vincent mãs. A diretora, madre Hortência,
Aurioul,como Presidente da Repúbü estava há trinta anos ali,sem nun
ca; os senhores Mosch e Le Tro- ca ter retornado à França.
quer, respectivamente primeiro-nú A devoção das irmãs era adnú
nistro e ministro da fazenda. rável. Todos os pacientes e pen
Os três faziam parte do que, sionistas adoravam-nas. Ali, o re
durante meses, foi chamado de "as lacionamento era muito melhor que
bailadas brancas", quando tais se_ no hotel.
nhores divertiam-se com meninas Havia alguns jovens,oriundos
de quinze anos, no Palácio do Eli da floresta, que estavam em.trata
seu, em Paris. Na ocasião foi um mento. Outros, ali estavam em des_
belíssimo escândalo., porém não ma canso.. Também havia duas profess£
nifestaram-se maiores conseqüência ras, das escolas da cidade, sendo
as. Toda a máfia estava unida> que uma viera recuperar o marido
Vignon, o prefeito da Guiana, que fugira dela para vir traba
era um dos protegidos desta máfia, lhar na produção de bauxita,no M§_
e como prefeito e governador de _I_ roni.
nini, não facilitava em nada para A guiana era, e ainda é, ad
quem quisesse trabalhar e não fos^ ministrativamente dividida em du
se parte do seu grupo. as partes. Uma chama-se departa
Um passageiro, nosso colega mento da Guiana, na beira do mar.
de viagem, de nome Ma.llet,mostrojj A sua legislação tem as mesmas le_
nos uma carta de Le troquer, apre_ is da França. A outra é batizada
sentando-o ao prefeito Vignon. Ao de Território de Inini. Suas leis
chegar, .: pegou suas malas e diri são mais liberais, para facilitar
giu-se direto para o palácio onde a exploração. Contudo, as duas es
tavam sob a autoridade dos mesmos também, diversos outros utensíli
indivíduos. os úteis.
Alguns dias mais tarde, após Quinze minutos depois, está
a transferência de local, fui ver vamos no ancoradouro do rio Con
o prefeito Vignon. Ele mandou-me te; esperava-nos uma barca.com p£
ao escritório de Biro Mineiro, d_i tente motor.
zendo que este queria montar, tm Na leve cerração da madruga
Saul, um centro agrícola. Este lu da, a barca subiu o rio e, logo a
gar ficava no centro da Guiana, ojn seguir, estávamos em plena flores^
de se fazia extração de ouro. ta, que chegava quase às ruas de
No mesmo dia encontrei-me ao Cayenne.
lado de seu diretor, o senhor La- O diretor do controle econô
ballerie. Era um jovem engenheiro mico da Guiana acompanhava-nos,c£
da Escola de Minas. Fui muito bem mo turista.
recebido e expus meu caso. A correnteza era suave, e na
Ouviu-me atentamente e disse: brisa matinal continuávamos o ca
- "Vou a Saul na quinta-fei minho, navegando.
ra." O sol começava a se mostrar,
Era terça, ainda. acima da copa das árvores,que ain
Continuou: da nos protegiam do calor de seus
- "Eu o convido a vir comigo. raios. Aos poucos, o sol foi in-
Assim, poderá ter uma idéia de ttj filtrando-se entre os galhos, viri
do que-pretendemos fazer." do incomodar-nos com seu ardor.
Eu aceitei, satisfeito em fa Mais tarde, nuvens formaram-
zer uma viagem que iria durar um se e a chuva não demorou a cair,£
mês. Mesmo que o resultado fosse companhando-nos durante boa parte
negativo, isto permitiria que eu do percurso.
travasse conhecimento com as al De cada lado das margens, o
tas florestas, o que seduzia-me. mato era baixo, mas impenetrável.
0 senhor Laballerie deu-me a De vez em quando, árvores enormes
lista do que eu precisaria levar, erguiam-se acima do cerrado, como
marcando a salda para quinta-fei cogumelos crescendo na verde reti
ra. dão das pradarias.
Cedo deste dia,esperei em um Isso porém, acontecia só nas
local pré-estabelecido, em frente margens do rio. A grande floresta
à casa hospitaleira. Deixei meus não é impenetrável. Pelo contrá
pertences à guarda das irmãs. . rio, era bem acessível.
0 carro chegou logo e eu em O rio, sendo calmo e bastan
barquei com minhas compras: leite te previsível, sem corredeiras e
condensado, pão, chapéu, biscoi cascatas por onde passamos, pernú
tos e uma rede, indispensável pa tiu que avançássemos bastante rá
ra se dormir na floresta. Levei, pido.
37
Fizemos um pequeno lanche, u_ cos e outros profissionais.
sando o pão e o leite condensado. Comemos com esta turma e, p£
Não foi ruim. E, quanto à bebida, ia primeira vez, dormi numa rede,
bastava abaixar-se o braço, pois que guardei até poucos anos atrás.
o rio corria abaixo de nós. Para se descansar bem, é preciso
Eu olhava meus companheiros, dormir meio atravessado nela, não
que não se privavam do líquido;só deixando o corpo afundar demais.
que demorei um pouco a segui-los, Na manhã seguinte, nós em
pois pensava na boa cidra da Bre barcamos em um caminhão G.M.C. pe_
tanha. Gostaria de usá-la substi sado, com tração nas seis rodas,
tuindo a água. Entretanto, depois indo em direção a Saul.
de meio dia de sol e chuva alter Era época de chuvas, que não
nados, fui obrigado a aderir a e- paravam de cair torrencialmente.O
les. Uma vez acostumado, a água veículo, com o qual seguimos por
valia por qualquer aperitivo ima dois dias, ia devagar, atolando a
ginável. todo instante. Para soltá-lo da Ia
A tarde do mesmo dia chega ma, era necessário utilizarmos un
mos a Dieu-Vá; ultrapassamos rapi_ cabo de aço com guincho.
damente Edmundo-Grand-Bassin, de 0 caminho, com árvores corta
zon. Ali começava a pista que, em tro igual ao que segue o navio du_
plena floresta, se abria, liberan_ rante a calmaria.
do a travessia para Saul, no cen De vez em quando, a estrada
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lava-se cada vez mais freqüente sorrateiros como a noite. Em Cay-
mente, e era proporcionalmente di^ enne, falava-se muito deles, cau
fícil tirá-lo do barro. sando estremecimento até à pele.
Resolvemos então abandonar o Era a primeira noite que eu
veículo, que fez meia volta levaji dormia na floresta. Já havia doj:
do o chofer e o diretor do BirÔ £ mido em barracos, mas em melhores
conômico, que aí encerrou sua ex condições e habitados. Reconheço
cursão. que, apesar do cansaço, o repouso
Nós terminamos por continuar, não foi perfeito.
sentados em toneis de óleo diesel Falando dos "vampiros", lem
que um trator Latil quatro rodas, brei-me que eu tinha feito amiza
com tração total, levava,numa pe de com uma de suas vítimas.Os mo£
quena plataforma, para manter al cegos vampiros atacam sem que se
guns tratores de esteira, que es sinta.
tavam trabalhando na abertura de 0 jovem atacado era um mecâ
uma outra estrada, mais à frente. nico, que trabalhava em uma : mina
Depois de.viajar um dia as de ouro em Guiana; Um filão muito
sim, posso assegurar que ficamos rico, pelo que me consta. Inclus_i
contentissimos com o final da tra ve, em vista dos excelentes resul
vessia, um verdadeiro passeio so tados, o valor das ações subia na
bre um cavalo chucro. bolsa de Paris. Os diretores apro
Laballerie inspecionou o ma veitavam e vendiam uma parte das
terial, viu o estado físico e mo ações que lhes pertencia, e em s£
ral dos trabalhadores, e as condi, guida mandavam parar a produção.E
ções dos tratores, que quase desja passavam a fazer a lavagem da ter
pareciam sob o barro. ra que :produzia pouco, provocando
Como restavam ainda algumas uma queda brusca na produção.Isso
horas de claridade, resolvemos a- assim ia até o dia em que os no
proveitá-las, e fomos em frente,a vos acionistas, cansados de espe
pé. rar um resultado que não aparecia,
39
esta cicatrizasse. Pela manhã, a- A chuva caía já a vários di
cordou anêmico. Quando o conheci, as, deixando o terreno escorrega
nos forte e menos perigoso que o fechados que era impossível, mes
da África, mas suficientemente pe mo para um coelho, atravessá-los.
rigoso para apavorar,em meio à es^ Sob a massa de bambu, encon
curidão da mata. tramos túneis que tinham sido fei_
Uma noite, um desses tigres tos a facSo por garimpeiros.0 que
entrou na barraca onde este conv£ eles conseguem fazer, e o que ain
lescente descansava. Pegou na bo da fazem, é fantástico. Chegam a
ca seu cachorro, que se refugiara revirar áreas inteiras que, mui
sob a cama, arrastou para fora e tas vezes, ficam inúteis para as
o devorou. 0 cão sequer latiu. criações e culturas. E tudo no de_
0 homem, deitado em sua rede sejo de obterem mais e mais vil
nSo esboçou qualquer reação, embo_ metal.
ra tivesse uma arma na mão. Esses túneis tinham mais ou
Nas baixadas pantanosas, nas menos um metro e vinte, tanto em
encostas das pequenas colinas,não largura como em altura. Era neces^
era raro encontrar-se serpentes sário ajoelhar-se para passar por
de seis metros ou mais. Eu mesmo, eles. As vezes, percorriam cente
certo dia, vi uma que media mais nas de metros.
que isso. Que trabalho isso dava! Mes
De madrugada, antes do sol jj mo as cobras deveriam ter dificid
parecer, começamos a jornada que dades para atravessar esses tú
seria a parte mais dura da viagem neis. Dentro destas difíceis pa£
até Saul. sagens, uma boa bole de cidra da
Cinqüenta quilômetros, a pé, Bretanha iria nos fazer um grande
na floresta cerrada, onde o cimo bem.
das árvores enormes não deixavam Esses cinqüenta quilômetros
o sol penetrar, onde gotas conW estavam sendo uma dura prova para
nuavam a cair em nossas costas Uo_ nós.
ras depois de terminadas as chu Laballerie estava preparado.
vas. Já se acostumara a essas viagens.
0 terreno era acidentado,com Em Saul, no centro, estavam
pequenas colinas, não muito altas nos esperando. Após duas horas de
mas com inclinação bastante forte marcha à noite, o caminho sendo _i
Para subi-las, só se agarrando na luminado por tochas, encontramos,
vegetação rasteira. Para descer,o enfim, o primeiro grupo que vinha
sistema era o mesmo. à nossa procura. Alcançaram^-nos
quilômetros antes de chegarmos ao Passei lá alguns dias tran
acampamento. qüilos descansando. Estava preci
Eu estava morto de cansado. sando, pois no primeiro dia nem
Laballerie, já acostumado, encon sequer pude sair do Carbet, onde
trava-se em bem melhor forma. eu tinha meu quarto, pois os pés
Tendo saído de tênis e sem mantinham-se extremamente dolori
meias, passando cinco dias embai dos, e o corpo não ficava atrás.
xo de uma forte chuva que insis Carbet é uma espécie de hajn
tia em cair, não. me sobrou um pe gar construído de madeira da flo
daço de pele nos pés. Os cinqüen resta, cortada e depois, rachada
ta quilômetros de marcha, acresci. em lâminas finas, para formar as
dos da chuva incessante e dos pés paredes. 0 teto era de folhas de
sacrificados foram demais para coqueiro; o soalho, levantado um
mim. metro acima do nível do chão,para
Em Saul, não faltava nada pa_ defesa contra as serpentes, bas
ra nós: whiskey, Champagne, vinho tante numerosas.
e cerveja. Em um porão havia mui A noite, usávamos um mosqui-
tas provisões, bem como grande nú teiro para defendermo-nos dos in
mero de enlatados. setos.
Quanto à carne fresca, os Cja Mal podia ir ao refeitório a
çadores encarregavam-se. A flore^ pé, que era bem perto de Carbet.
ta era rica em tatus, veados, ma No primeiro dia, fui até lá arrajs
cacos. Rabos de jacaré e serpente tando-me.
também eram pratos procurados. Depois de alguns dias, com o
No centro de Saul encontra corpo bastante descansado e meus
vam-se umas vinte pessoas, todas pés curados,eu estava pronto pa
Jovens. Alguns eram casados e es ra uma nova jornada. Fazia peque
peravam suas mulheres. No momento nos passeios ao redor do acampa
não havia nenhuma ali. Eram geól£ mento, gostando muito da floresta
gos operadores de sondas, mecâni que nos cercava.
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ção do oeste e da Serra dos Tumu- aparecia ocasionalmente, tornando
Saul, eu ia: com Laballerie em di_ Havia uma cabana à nossa disposi
reção ao pequeno Inini. ção, e um verdadeiro banquete nos
Os dias de marcha passaram- esperava: peixes, tatu, veado, tu
se muito bem. 0 terreno era contai do acompanhado de um vinho conse
nuação de pequenas cochilhas, e a guido por Gaujis para festejar o
floresta não se modificara. 0 sol encontro.
A beira do rio, de quinze me Tendo conseguido, no princí
tros de largura, estava a zona de pio da seca, um trator de estei
exploração de sua propriedade. Nte ras, para retirar as camadas supe
Ia só se podia trabalhar em época riores do local de exploração, ha
de seca. No período chuvoso, tudo veria mais tempo para Gaujis ded_i
ficava inundado e a exploração re_ car-se à lavagem dos aluviSes, em
duzia-se a nada. busca de mais minério.
Gaujis solicitou do Birô Mi Ao voltarmos, Gaujis espera
neiro um trator de esteiras, para va-nos com uma piroga de quinze
quando a estrada chegasse em Saul. metros, mais longa que a largura
Para que isto acontecesse falta do próprio Inini. Esta piroga fo
vam ainda uns cem quilômetros ain ra cavada num tronco de árvore,ba
da. Por isso havia muitas coisas seada em uma técnica que os índi-
por fazer; "projetos", como disse genas da Amazônia dominam com fa
Gaujis para Laballerie. cilidade.
Na manhã seguinte à chegada, Dormimos por lá mais uma rio_i
fomos visitar sua exploração. Era te, e de manhã bem cedo, embarca
toda construída sobre as águas, e mos no transporte. Éramos oito na
só se podia trabalhar quando a á- piroga, além do produto das plan
gua estava baixa, nas secas. tações, que Gaujis levava a Saint
Fazia-se escavações de oito Laurent do Maroni. 0 rio era es
por vinte metros de comprimento. treito e entulhado no meio com
Primeiro retirava-se a camada su galhos de árvores. Muitas vezes e_
perficial de detritos, de vinte ra necessário utilizar machados,a
centímetros de espessura. Depois, fim de conseguir abrir passagens.
uma camada de dois metros de argi Uma vez no grande Inini,alar.
Ia. gava-se o rio e ficávamos livres
Por baixo disso tudo, encon dessas barreiras flutuantes.
trava-se o gravilhão, onde exis Puxada pela correnteza e em
tia pó de ouro em quantidade sufi. purrada pelo motor, a piroga ia a
ciente para justificar a explora uma belíssima velocidade, na dire_
ção. Toda a riqueza que se achava ção do Maroni, na divisa da Guia
concentrada neste trecho, talvez na Holandesa.
43
No outro lado do rio, também circunstâncias, mudaram constante
havia a policia holandesa. mente, de uma margem para outra,e
A água, neste lugar, corria para fazê-los voltar ao seu lugar
devagar, assemelhando-se aos ca ofereciam-lhes presentes: cigarro
nais dos pantanais de Poitou; só e rum.
que o rio era bem mais largo. Cl§_ Os índios viam os brancos só
ra e limpa, a água atraia-nos,mes_ como seres que ofereciam gulodi-
mo sabendo da ameaça das piranhas, ces e bugigangas. E,desse modo,os
que são numerosas na Alta Guiana. funcionários dos dois lados pro
Descansamos o corpo no rio Maroni tegiam as raças indígenas que fo
sob os olhares dos moradores de ram a eles confiadas.
Maripasoula. Estavam lá índios,p£ E interessante notar que nes_
final, não era todo dia que apare posaula. Além de nos dar o neces
cia uma piroga naquele lugar. Era sário, o belo rio nos atraía. Foi
mos uma distração, todos nos olhari um lugar onde pudemos descansar à
do, tendo isso como único traba vontade.
lho naquele momento; que vida boa Dois dias mais tarde, reembaj_
44
Gaujis trazia consigo uma pe que fora condenado. Isto fazia de
quena fortuna: mais ou menos três le um preso perpétuo.
quilos de ouro em pó, num saqui Não havia nenhuma estrada na
nho de tela grossa. Guiana, e nós embarcamos num pe
Antes de chegar às corredei queno navio que fazia ligação cqs
ras, atou ao saco uma corda com o teira, sendo que, desta vez, con-
comprimento de dez metros,tendo à . seguimos entrar direito em Cayen
extremidade uma bóia grande.No ca ne, sem passar pelas ilhas do Sa-
so de o barco virar, o que não e- lut.
ra impossível de acontecer,graças Esta viagem, no ponto de vis
à bóia ele recuperaria, com a nm ta de trabalho, foi negativa, mas
or facilidade, sua pequena fortu muito interessante pelo que permi
na. tiu-me ver e descobrir. Enfim,foi
Durante o percurso,Netuno es_ muito instrutiva. Chegando a tal
tava do nosso lado. Tudo foi bem, conclusão, fiquei satisfeito por
sem perigo. Assim atravessamos os ter realizado uma viagem diferer^
lugares mais difíceis. te das normais.
Depois de termos dormido nra A vida passa mas as lembran
is uma noite na margem do rio,e a ças ficam sempre dentro de nós.
medida que o oceano ficava mais e Em Cayenne, dirigí-me nova
mais próximo a nós, as corredei mente à Casa de Repouso Saint Pa
ras iam desaparecendo. A corrente^ ul, na praça dos Palmitos. Nesta
za era mais suave,e Saint laurent praça, em meio a vários outros,ha^
aproximava-se. Chegamos à tardezi^ via um palmito "gêmeo", cora dois
nha. troncos. "0 único no mundo" dizi
Saint Laurent era bem menor am os cayennes. E toda a popula
que Cayenne. Também tinha pouco ção mostrava-se orgulhosa disso.
movimento Na minha volta, eu tive poj;
Na penitenciária encontrava^ sibilidade de entrar no birô mi
se alguns condenados esperando o neiro, para trabalhar. Mas eu não
fim de suas penas. Como em Cayen- saíra da França para ser funcioná_
nes, encontramos antigos condena rio público ou privado.
dos que eram verdadeiros farrapos Bem que o trabalho na florej;
humanos. Alguns deles, após a pe ta não me era desagradável.Ao cqn
na, haviam conseguido reerguer-se trário. Porém, trabalhando no in
abrindo pequenos negócios: comér terior dá Guiana,eu me acharia em
cios, restaurantes, etc. uma situação quase fora da possi
Em geral, estavam em "doubla bilidade de me corresponder com o
ge", isto é, depois de cumprida a exterior, e minha intenção era de
pena, o condenado não podia vol continuar com meu propósito ini
tar à França, devendo passar ali cial: plantaçSes. Isso me atraía.
na Guiana um período igual àquele Tinha vontade de seguir meu cami-
45
nho, por outros países da América um antigo funcionário das colôni
do Sul, mas sem me apressar. as da África, cheirando a cachaça
Esperando, eu comprei um po£ por todos os poros.
to comercial, um café-bar, que es^ Depois de uma pequena discujs
tava fechado, desejando fazer sua são a conversa tornou-se amigável.
reabertura, já que eu tinha a sua Quando soube que eu era bretão, a
licença nas mãos. Isso não me foi sua fisionomia transformou-se:
permitido. "0 estabelecimento estja - "Vem comigo" -disse- "que
va situado perto demais de uma i- eu vou te apresentar a um grande
greja",foi o aviso que me trouxe amigo que é breton também."
o comissário de polícia,porta-voz Pegamos seu carro e, atravejs
dos grandes donos da Guiana. sando as ruas de Cayenne, dirigi-
Eu não estava do lado dos pa_ mo-nos ao tribunal.
trões que mandavam no lugar. Eram 0 tal de bretão era Procura
os protegidos de Auriol,que naqu£ dor Geral da República, para o De
le momento, era Presidente da Re partamento da Guiana e território
pública, e de Mosch e Le Troquer, de Inini.
que formavam a máfia em Paris. Meu Deus, que figura eu iria
Vignon. prefeito da Guiana e encontrar.Chegando ao tribunal,fi
governador do Inini,era também um zemo-nos anunciar,e em seguida,fo
protegido deles. mos introduzidos ao seu gabinete.
Eu estava muito perto à igrjs Após as apresentações forma
ja, na qual eu assistia missa to is, o Procurador da República di§_
dos os domingos, enquanto os che- se estar muito contente por conhe
fões nunca punham os pés lá. cer-me. Contudo, ele não iria re
Meu comércio estava situado petir amabilidades parecidas com
a cem metros da porta da igreja,o esta, alguns minutos depois.
que serviu de motivo para os que - "Fiquei contente de encon
mantinham o poder justificarem a trar"- disse -"um compatriota." E
sua oposição. falou também ter vindo de Redon
0 melhor bar de Cayenne, cu no Departamento de Ille e Vilaine
jo dono era um chinês, estava dis_ e que se chamava "Cuscus".
tante trinta metros da igreja. E Ohl! ti! Pa...! Não era possí^
era lá que, com os amigos, ia to vel! Como o mundo é pequeno e a
mar meu ponche. vida, bizarra!
Não há nada mais vil do que Eu não o reconheci, quando eri
se dizer "defensores dos peque trei no escritório. Mas tive a im_
nos", quando se tem o poder nas pressão de não encontrar um estra
mãos. nho à minha frente. A roupa muda
0 comissário de polícia veio ra! Vestia uma jaqueta branca com
em pessoa entregar-me a interdi manga curta, o que, certamente,em
ção. Um tal de Baurgoin, era ele, Redon, não usava. Embaixo da radi
46
ante brancura, existia uma cons do para levar uma boa reprimenda
ciência escura como a noite. de seu amigo, advertindo-o a não
Era o pequeno juiz de Redon, trazer mais fantasmas que quebras^
que depois da guerra, fez-se' retirar sem sua quietude.
car, por ter tão bem protegido os Que vergonha!Mas naqueles a-
assassinos da falsa resistência e nos estávamos acostumados a isso.
condenado, em diversos casos, su Todavia, o pequeno, juiz deve
as vítimas. ter pago suas infâmias. Não creio
Que recompensa! que sua bela recompensa, sua for
De pequeno juiz de uma peque midável promoção o ajudaram a ser
na cidade da Bretanha, nomeado um feliz em Cayenne.
Procurador Geral da República. Ele era motivo de deboche djj
Que promoção! E que surpresa ra todos na Guiana, desde os frari
para mim! ceses até os antigos condenados,
Eu lhe falei do meu caso,dos chamados de "velhos brancos", pa£
bandidos da falsa resistência, do sando pelos negros e mestiços.
processo que ele tivera em mãos Aqui não vou contar a razão,
quando era juiz em Redon. pois seria obrigado a falar de um
Não lhe escondi minha estra membro de sua família,e eu não de_
nheza de ver que tudo tinha fica sejo fazê-lo.
do no mesmo ponto e concluí: Felizmente, para tranqüilida^
- "No fim, bandidos são ban de de meus nervos, nunca mais o
didos, mesmo que se intitulem re vi.
sistentes." Esta equipe de pretensos re
- "Sim, sim"- respondeu-me - sistentes comandava com poder ab
"mas você sabe, em vista das cir soluto a Guiana, não facilitando
cunstâncias " o trabalho daqueles que não per
Começava a gaguejar; de ver tenciam à sua turba.
gonha, não havia dúvida. Impossibilitado de levar em
Eu lembrei-lhe também, avivar^ frente o meu plano.de abrir o ca
do sua memória, do caso da famí fé e de fazer dele umn ponto "chi_
lia Testerel, massacrada, inclus_i que" da cidade, pus o local à ven
ve as crianças pequenas, pela mes^ da.
ma laia que veio à minha casa, na Esperando, comecei a trab§_
mesma noite. lhar i na E.M.C. (Empresa Metropo
- "Sim, sim, eu me lembro" - litana e Colonial).
dizia ele, e desviava a conversa, Rapidamente, passei a Chefe
que ficou fria e sem interesse. de Turma. Não foi uma promoção in
Eu me retirei, voltando para teressante, sob o ponto de vista
casa a pé. Não era longe. 0 comis da equipe que eu tinha comigo. Eq
sário ficou retido para assinar trei como mecânico nas oficinas.
alguns papéis. Creio ter ele ficja Depois, descarregando navios de
47
ferro e cimento que a empresa re rante numa das ruas principais da
cebia para o novo porto de Cayen- cidade.
ne, que logo iria começar a ser Na inauguração, todo o ninho
ros da dama fariam barulho demais mes franceses trazidos como con
cia. Para mim, duas vezes bandido. nador. Desde muito ele preparava
48
tiamos próximos uns dos outros. Elas nunca tinham visto luz
Outro bom amigo, Kaujjman, o do dia, nem sabiam o que era a á-
chefe das oficinas do E.M.C., dis gua, mas adivinhavam que era seu
se-me ter sido membro do Comitê elemento.
Central do Partido Comunista Fra£ De vez em quando eu, que sem
cês, após a guerra. pre gostei muito de nadar e mergtj
Chembery "pied noir",que tejn lhar, entrava na água, apesar de
do previsto o que iria se passar sua sujeira e de meu receio de tjj
alguns anos depois na Algéria,pa£ barões. E nadando mantinha minha
tiu para fazer sua vida, sob ou cabeça o mais alto possível acima
tros céus. Um judeu polonês natu do nível da água, como o periscó-
ralizado francês, que tinha fugi pio de um submarino, vendo se oi
do da Polônia depois da guerra,em nimigo não se aproximava.
c,ue sofrerá muito. Minha mulher sempre se quei
Um bom amigo que tive duran xa sobre eu ter um pescoço muito
te minha estadia na Guiana foi Nü curto, e minha barba estragar as
cios.A tarde, após o trabalho,que golas de minhas camisas. Ficando
ia das sete às quatorze horas, fa -nas Guianas e freqüentando as su
ziamos pequenos passeios fora da as praias, eu conseguiria alongá-
cidade, no carro dele. Alguns qui lo um pouco.
lômetros de estradas era o que a 0 amigo Miclos era do norte
Guiana possuía. Outras vezes, fa da França, e tinha mais idade que
zíamos o percurso a pé. Também ia eu. Nos anos trinta, comprou uma
mos nos sentar nos rochedos atrás criação de porcos em Marrocos. M£
do palácio do prefeito, à beira- is tarde, na crise dos anos trin
mar. ta e dois e trinta e três, perde
Na água, bem suja, olhávamos ria tudo.
os tubarões passando em grupos de Após o primeiro tombo,partiu
cinco ou seis, a quinze metros de para as Guianas, em companhia de
nós. alguns jovens, onde todos pensa
Outras vezes ainda, íamos a vam que, com um pouco de coragem,
pequenas praias, com águas igual o ouro acumular-se-ia nas suas
mente sujas, admirar o nascimento mãos.
das pequenas tartarugas. A areia Pessoalmente, nunca tive ilu
toda se mexia quando os bichinhos soes parecidas.
duzentos a trezentos, saíam de n_i
nhos escondidos sob a areia. Chegando à Guiana como garim
Corriam em todas as direções peiro, comprou um barco e lançou-
não sabendo de início para onde se na subida do Maroni, em dire
se dirigir e, em seguida, iam ru ção dos Tumucs Humacs.i evavam com
mo ao mar. Lá estavam salvas, pe eles provisSes e mercúrio,que se^r
lo menos do homem. viria para aglomerar o pó de ouro
49
que pensavam encontrar em grande do este dia, fez amizade com uma
quantidade. pequena negra. E o inevitável che_
Nunca chegaram ao fim da via^ gou! 0 nascimento de uma menina!
gem. O Maroni é duro de descer e Mãe e filha foram viver em Cayen-
mais duro ainda para subir. Todos ne. Miclos continuou a trabalhar
inexperientes diante dos barcos a em Saint Laurent. Depois apertou
motor, e mais ainda na floresta. o cinto o mais possível até a ho
Muitos dias passaram-se na tenta ra da volta. Mas lembrou-se da me
tiva de se subir o rio com todas nina e resolveu visitá-la, antes
as suas corredeiras, com vários de ir para sempre. Vendo a peque
mergulhos contra a vontade.Alguns na, sentiu umas batidas mais for
já não queriam mais ir adiante,ao tes no coração e pensou: "que vai
encontro do desconhecido. acontecer com esta pequena, se eu
Depois de diversas discus me for? Tornar-se-á igual a to
sões, esconderam o mercúrio no pé das as que encontro pelas ruas de
de um árvore, bem visível e fácil Cayenne e do mundo inteiro? Mui
de encontrar numa possível volta tas vezes pela irresponsabilidade
ao lugar. de quem as gerou?"
Desceram em direção ao ocea E, por causa disso abandonou
no e de Saint Laurent do Maroni. a idéia de voltar à França, ficaji
Os que ainda tinham dinheiro para do para cuidar da menina. Eu não
a passagem voltaram à França. Os conheci sua filha, que se encon
outros, desmunidos, ficaram em Sa trava num pensionato de irmãs na
int Laurent, onde procuraram tra ilha de Guadaloupe.
balho, o que não era nada fácil. Depois de ter decidido ficar
Os condenados, que naquela época definitivamente, começou a ser o
eram numerosos, forneciam o gros representante do comércio ataca
so da mão-de-obra, e a baixo pre dista francês. 0 negócio ia bem,
ço. mas com o início da guerra e da £
é menos fácil de se expatri cupação, cortado de seus fornece
ar do que muitos pensam. Fácil,se dores, ficou sem meio de sustento.
vocês chegam com um contrato,mui Refugiou-se então nos arred£
to dinheiro, ou alguém que o espe_ res de Cayénne, numa cabana velha
ra. Caso contrário, é necessário que forrou com sacos de cimento.E
uma certa coragem e não se deixar para viver ia todos os dias, pela
levar por ilusões. manhã, em velhas plantações de Ia
Miclos ficou em Saint Lau ranja e limão, abandonadas depois
rent procurando trabalho e o en do fechamento da prisões, onde ro
controu numa serraria, apesar do lhia cestos de frutas, que vendia
salário não ser dos melhores. Tra em Cayenne.
balhava, economizava, só pensando Depois da guerra, quando as
na volta para a França. E, esperar^ comunicações recomeçaram a funci£
50
nar com a França, sua situação me Alguns dias antes de minha
lhorou, e quando eu cheguei à Gui^ saída para Belém, recebia uma ca£
ana, já tinha uma ótima casa, com ta de um amigo de Montevidéu.
ar condicionado, o que era bastajn Ele tinha um amigo, diretor
te raro naquela época. E ele bem de uma criação de cavalos de cor
o tinha merecido. rida, perto da cidade, e ele pode
Fora E.M.C. e o birô minei_ ria me empregar como chefe de cuj^
ro, não havia possibilidade de se tura. Tal criação ficava em pleno
encontrar emprego para as pessoas mato, dizia-me ele. Nunca tinha
do país. Era o "funcionalismo", a saído da cidade, e mais tarde,teri
viver por toda uma cidade. Um mem do atravessado o país diversas v£
bro de cada família trabalhava a zes, vi que este não tinha nem ma
fim de sustentá-la. E, os outros, to, nem nada parecido, só o Pampa.
não queriam trabalhar. Deixando o Peru de lado, re
Os franceses burros eram quem solvi ir para o Uruguai.
pagava. Neste meio tempo,recebi a Saí de Cayenne num avião mi
notícia da morte de meu pai. Sen litar brasileiro, com passagem re
ti-me mais livre para continuar o cebida do Cônsul, em troca de me
meu caminho. ia caixa de champagne. Como não e_
Foi quando avisei MonsieurBo xistia nenhuma estrada nem na Gui_
nuas, um bretão de Saint Brienc, ana, nem na parte brasileira, via_
diretor da E.M.C, de minha interi jar, só por via aérea.
ção de seguir adiante. Ele ofere Belém, bela cidade no desem-
ceu-me um bom posto, com contrato bocadouro do Amazonas, naquela é-
e um ótimo salário, o que não fa poca contava com mais de trezen
zia para ninguém fichado no local. tos mil habitantes.
Eu tinha resolvido viajar de Belém tem igrejas muito boni^
novo, e sua oferta não me inte tas, ricamente decoradas,altares
ressava mais. Vendo-jne resoluto, revestidos de ouro, uma riqueza.
não insistiu, mas me disse: Isso vinha do tempo da borracha,
- "Você vai se aventurar,vai que era explorada no interior do
gastar o que seus pais lhe deixa Amazonas. Época próspera
ram. Lembre-se disso: caso alguma 0 porto era bastante movimejn
coisa não der certo, não esqueça, tado, com seus navios a roda, pa
sempre haverá um lugar aqui, para ra subir o rio. Eu assisti ao que
você." chamavam "Pororoca": nas altas ma_
Emocionado, agradeci, e fui rés, as ondas do oceano, não po
seguindo meu destino. dendo deter a enorme massa d*água
Primeiro, pensei em subir o que desce do Amazonas,adiantam-se
Amazonas para chegar ao Peru,que sobre ela, com diversos metros de
me atraía.Seis mil quilômetros de altura, e a água continua a cor
rio antes de chegar lá... rer na direção do mar. É um espe-
51
táculo único e muito interessante à embaixada francesa, onde eu er-a
Fiquei nesta cidade uns oito sempre bem recebido. Mas no fundo
dias, tempo suficiente para tirar estes senhores desejavam uma coi
minha carteira de estrangeiro, mo sa só: livrar-se de mim. "Deve ir
delo dezenove, e continuar meu ru para o Uruguai; é muito melhor."
uns dez dias, indo diversas vezes tro casal era belga, com um filho
52
de dezessete anos, que, como eu, eu tinha deixado a querida provín
partia para a primeira aventura. cia.
0 destino deles era Montevidéu, e Lembrava-me a canção de Theo
tinham muitos projetos; mas só os doro Batrel, "Comme est belle ma
projetos. Bretagne, sur son ciei gris il fa
Os normandos pareciam satis ut Ia voir". De longe, ela me pa
feitos, recebendo um bom salário. recia ainda mais bela, com suas
Aparentemente não tinham preocupa_ boas, e malgrado,suas más-lembrajn
ç3es, porém, uma semana depois, de_ ças.
53
pouco da França que ali estava. E ra ir ao interior do estado para
isso, trinta anos depois, não te ver e conhecer um pouco mais do
ria a menor importância. país.
Qual não foi nossa surpresa, Indo duas vezes por semana a
que saíam pelos dois lados do pra^ tos outros, principalmente normarn
55
mano." - me dizia essa dama. "Cônsul" da região, como era con^-
Em Montevidéu, foram bem sut- siderado pelas pessoas. Ele tinha
cedidos. 0 filho, mais tarde, ca ajudado a levantar e manter o no
sou-se muito bem. A senhora M,que me da França. Teria gostado, di
passou alguns meses no Brasil, me zia ele, de ter recebido uma pe
contou haver conhecido o presiderj quena condecoração qualquer, por
te dos Franceses Livres de SãoPay_ serviços prestados a seu país. Te
Io. ria sido uma felicidade. Ele a me
Quando, em 1938, na época de recia, bem mais que as distribuí
Munique, quando a ameaça de guer das a granel aos falsos resisten
ra era grande, esse presidente a- tes, criminosos comuns que, nos a_
pressou-se em naturalizar seu fir- nos depois da guerra, fizeram das
lho brasileiro, evitando que o ra_ condecorações um negócio lucrati
paz servisse no exército francês, vo.
56
a cinqüenta quilômetros desta úl Sentado no vagão restaurante
tima cidade. tomando minha cerveja, olhava pe
ção das chuvas, era muito escorre_ Mas, infelizmente, esse dia
gadia, muitas vezes levando-nos a não foi muito feliz, pois a loco
barrancos. No verão, com poeira, motiva era nova, diesel, que não
era muito mais perigosa. tinha a necessidade de abastecer,
Em todo o Rio grande do Sul, como as antigas, com água. Brusca_
só havia estradas de terra. Nesta mente ela movimentou-se, sua saí
região o asfalto não era conheci da surpreendendo-me, pegando-me a
do. A única estrada onde havia as^ tomar, devagar, minha cerveja...
57
trada de ferro Pelotas-Bagé. Como de um animal deste tamanho, o ca
a companhia era paga por quilôme chorro policial da fazenda acompa
tro construído, tinham alongado o nhava-me, mas chegava a recuar.
mais possível esta linha. Pelo me De vez em quando eu descia à
nos, era isso que os brasileiros Bagé, onde encontrei amigos da mi_
me contavam. nha idade. Isso sim me ajudava um
Oito meses se passaram desde pouco no estudo da língua portu
minha volta ao Brasil. Em certa £ guesa.
58
negar que um dos meus melhores a- víduos que o pais conheceu. 0 que
migos em Cayenna era, dizia-me e_ na minha consciência, é uma infâ
le, membro do comitê central do mia e uma vergonha para a França1.'
Partido Comunista da França, de - "Sim, é uma grande vergo
pois da guerra. nha!" - disse ele.
Naquela ocasião ele me dizia - "Mas, apesar de tudo, foi
apertando os dentes: condenado à morte em nome do país.
- "Eu não sou mais comunista Nome que seus torturadores usaram
e sim anarquista!" e abusaram para esconder a sua pe_
Era bom rapaz, e como ele a quenêz, sujando a França com cri
minha opinião não pedia, eu nada mes horríveis que cometeram."
tinha a ver com as suas. Sequer os larápios tiveram a
No restaurante, na Cripte, coragem de executar a sentença!
propriedade de dois antigos conde_ Mas: logo em seguida o mare
nados, onde fazíamos nossas refe.i chal foi agraciado, sem ter pedi
ções, o terceiro na mesa era bas-r do. 0 marechal Pètain tinha os a-
co, e monarquista. Isto dava be visado: um marechal francês nunca
las discussSes, com todos rindo. pede perdão. E ele tinha razão. A
Era formidável. sua glória, presente e passada, a
Muitas das pessoas que a mim ele não permitia curvar-se diante
vinham visitar tinham alguém in de tais nulidades.
ternado, da família. Mas este não Pètain, depois de um proces
era o caso das jovens, que me e^ so simulado foi preso na ilha D'y.
ram desconhecidas. Elas apenas me eu, onde morreu miseravelmente,e.s
procuravam, curiosas, queerendo o perando inutilmente, sem pedir o
contato direto com um francês,ccd perdão. Morreu por uma reconcilia
sa rara na cidade. ção nacional. Pelo bem da França.
Também recebia, como visita, Mas os novos "gauleiters" is
um coronel, que falava bem o fran_ so não queriam. Para eles, o ódio
cês. Tinha estudado diversos anos era evangelho. Nestes momentos, o
em Sorbonne, em Paris. velho ditado ainda subsistia: um
Sempre falávamos da guerra e por todos e todos por um! (ver o
da ocupação, que não estavam lon- princípio do livro "Resposta à 0-
ges, naquele momento. merson").
Um dia ele me disse: 0 marechal morreu depois de
- "A que ponto a França pôde muitos anos de prisão, numa peque_
cair para deixar assassinar o ma na casa miserável da ilha D'yeu,e
rechal Pètain, no final dos anos isto veio a acontecer no dia vin
quarenta." te e dois de julho de 1951.
Eu respondi a ele: Eu visitei seu túmulo. Como
- "0 marechal Pètain foi con_ ele é emocionante, em sua simpli
denado à morte pelos piores indi cidade, em frente ao oceano.
59
Lembro-me ainda de que, no vergonha não sobe à fronte deles!
hospital, o coronel, endireitando Acredito que o sangue que corre
o corpo, disse-me, olhando-me nos em suas veias não é mais verme
olhos: lho, mas negro, como as trevas, a
- "Quando se fecha um mare envolver a França nestes tristes
chal da França,um .herói nacional, anos de infâmias.
na prisão, com a idade de noventa Quarenta anos se passaram, e
anos, é um assassinato!" - e com me é permitido constatar que a ig_
pletou: "1944 é uma página de ver_ norância e a mentira, principal
gonha, um ano negro na história mente dos jovens, é a mesma.
da França." 0 embrutecimento é geral, e
0 coronel contou-me ainda al_ mesmo aqueles que assistiram a es^
guns dos crimes de que ele foi in_ sas páginas vergonhosas ainda es
formado, na França, em 1944. tão mudos, como se tivessem sido
- "Isso representa uma gota asfixiados por estas ondas crimi^
d'água perto do oceano de crimes nosas.
60
to estes, e até mais desumanos, po desses campos, onde passou numer£
is as vítimas eram os próprios pj3 sos anos, sofrendo enormemente:
trícios dos torturadores. Só para "só a fé em Deus nos sustentava."
citar um, em Paitier, famílias iri Também merece citação o li
teiras morreram de fome. vro "Escândalos da Resistência",
(Nota dos Editores: vide o livro escrito por Andres Figueras. Jun
"Holocausto; judeu ou Alemão?" de to com Paulhan, desde o princí
S.E.Castan) pio da ocupação, estava revoltado
com os crimes que se sucediam em
1944 e depois.
Ainda Paulhan, em "Carta aos
Diretores da Resistência", escre
ve: "Eu sou resistente! Eu o fui
Depois da declaração do cor desde o mês de julho de 1940! Eu
te de contas de 1947, citada por o sou ainda, pelo menos eu penso
Jean Paulhan, em seu livro "Carta se! Apesar disso, eu não sinto ma
aos Diretores da Resistência", on is nenhum orgulho, só vergonha! E
de ele acusa e .declara: "mais de que não tem nenhum destes quatro
duzentas e cinqüenta famílias, pja centos mil franceses!"
is e filhos,morreram de fome nos Logo em seguida declarou que
campos de concentração da Chauvi- este número estava bem abaixo da
nerie, em Poitiers",veio à tona o realidade.
impacto da verdade. Admite-se que mais de um mi
Os pais eram acusados de se lhão de franceses foram presos na
rem Petainistas, e as crianças i- libertação, torturados, desonra
nocentes deveriam pagar este cri dos, sendo deles tirados todos os
me junto com seus pais. direitos civis; e outros perderam
Saint-Germain escreve no seu seus empregos, principalmente os
livro "PrlsSo da EpuraçSo": "Fa funcionários públicos. Além de u-
zer da fome um meio de repressSo, ma boa parte ter sido massacrada.
é uma infâmia." Um relatório da Seção Histó
0 direito ao pão e outros a- rica do Estado Maior do general
limentos é um direito sagrado do Eisenhower denuncia cinqüenta
homem do qual nenhum ser humano, mil execuções sumárias em alguns
em hipótese alguma, pode ser pri departamentos do sudeste da Fran
vado. ça ( a França possui mais de oi
Todavia nossos falsos resis tenta departamentos ).
tentes não pensavam neste direi Seria interessante saber se
to. Mesmo os bebês deviam sofrer as vítimas da Garganta de Fond es
tal tortura. tão incluídas neste número. Esta
Continuando a citar o livro garganta subterrânea está locali
de Saint-Germain, que foi vítima zada no departamento de Ardeche,
61
perto desta pequena cidade. de horror, só tínhamos coragem pa
Monsieur Chandon,prefeito de ra ficar calados."
tos cadáveres haviam sido jogados quela garganta, nos dias que se
nessa garganta. Ninguém o sabe. E guiam as macabras cerimônias, ou
mesmo os criminosos que fizeram a viam os gritos lancinantes dos in_
carnificina não o sabem. felizes, que ainda nSo tinham mor_
Uns chegam a falar em oito- rido.
centos, talvez mil. Outros,de mui Pouco a pouco, só o silêncio
to mais. se ouvia. Os sobreviventes morri
0 certo é que esta garganta, am das feridas, de fome, de sede,
com mais de quarenta metros, en de febres, ou simplesmente asfi
cerra muitos cadáveres. xiados pelos odores nauseabundos,
Os "justiceiros" Gaullistas, que se desprendiam dos cadáveres,
não tendo tempo para enterrar ca, em putrefação.
var sepulturas a suas vítimas, tra_ A Assembléia de Strasburgo
62
e medalhas de agradecimento ao te_ gar, dessa garganta, num monte ma
rem Escrito a mais horrível pági cabro que sobe na direção do céu,
na de vergonha da França, france onde Deus já recebeu suas almas.
ses dignos repousam, na garganta Vocês viram-nos? Se já os v_i_
de Fond. ram, notem que em cima de tudo is
Esperamos que nunca mais re so tremula a bandeira tricolor, e
pitam-se episódios iguais. Nunca nela fulgura a cruz de Loraine (é
mais! o emblema dos Gaullistas). Qual é
Amigos leitores, fechem os o_ a diferença da cruz gamada? 0 ce
lhos e escondam os rostos. Sintam nário é o mesmo, talvez pior!
a visão deste maravilhoso dia de Agora, vão abrindo os olhos.
julho, este lindo sol de verão, a 0 que vocês vêem? 0 belo sol
brilhar com tanta clareza. que há pouco brilhava?
Vocês estão na Costa Azul.se Agora sim, você revê o monte
estendendo em praias belas de gra de cadáveres desses infelizes,mor_
vilhões, onde ricaços, tubarSes e tos como moscas por um inseticida
malandros convivem. violento.
Vocês vêem somente a obscuri^ Ao lado disso, os campos de
dade. Fiquem com os olhos fecha concentração alemães, os goulags
dos. Dirijam-se à pequena cidade stalinistas, vão reduzindo-se.
chamada Fond, no Ardéche. Não é Certos indivíduos na França,
longe... indiscriminadamente mataram seus
Pouco a pouco, irão aparecejn próprios irmãos, muito mais ino
do, à sua frente, montes de cadá centes e honestos que eles.
veres. Oitocentos, mil, mil e du E, sobre tudo, tremula sem
zentos, mil e quinhentos? Quan pre a bandeira tricolor!
tos? Não sabe? Ninguém o sabe... Esta bandeira que serviu, e
ainda serve, a estes bandidos pa
Vejam os corpos, misturados, ra ocultarem todos os horrores de
quebrados, não se parecendo mais que foram mentores, que sujam a
com nada. Grandes olhos abertos, França inteira, trazendo a ela a
ainda olhando para vocês, pareceri vergonha.
do pedir piedade, através da né-
voa da morte. Bocas dolorosas mqs_
tram-se, sem mais dentes, que fo
ram quebrados em dias anteriores, Agora, volto a Campei, Maure
a socos e coronhadas. de Bretagne, para seguir a turba
Este monte de cadáveres de dos falsos resistentes, os mesmos
homens, mulheres e crianças, empi_ que saquearam a nossa casa. Para
lhados um sobre os outros,como p^ escrever as monstruosidades come
dras jogadas de um caminhão. To tidas neste pequeno canto da Fraji
dos misturados, no fundo desse lu ça. Monstruosidades que não cau-
63
sam inveja a seus colegas do su rando-se, entraram cheios de cobi_
deste da França. Após terem ternú ça, pensando no dinheiro que pode_
nado seu serviço em minha casa, o riam conseguir.
que não puderam levar, roubando, Com o rosto cheio de ódio, e
queimaram. Após terem metralhado a loucura estampada nos olhos, ern
64
nha na escuridão, apavorada, so as"que eu falo partem de preten
frendo mil dores, perdendo sangue sos franceses. E" isso é muito ma
pelas feridas abertas. is grave que os campos de concen
Chamando, abraçando^ o corpo tração alemães e os campos de ex
de seu pai, sua mãe, de seu peque termínio na Sibéria".
no irmão, na escuridão da cozinha Um historiador israelita a-
sentindo que, pouco a pouco, esva^ borda a tese de Henri Roques defen
íam-se os corpos em sangue, lenta^ dida ultimamente na Universidade
nente esfriando. de Nantes. Ela tenta provar a não
Sua pequena camisola estava existência das câmaras de gás nos
ensopada do sangue de todos. Seu campos de concentração germânicos
rostinho, seus longos cabelos loi^ Esta tese foi recebida e aprovada
ros, tingiam-se de vermelho. Suas por professores dessa Universida
■nãos, também cheias de sangue, e£ de. Na época, fez correr muita no
sanguentavam os olhos, o nariz,os ticia, sendo comentada aqui mesmo
ouvidos, que ela esfregava sem pe[ pela imprensa brasileira.
rar. Tudo estava entupido pelo 1_£ 0 historiador israelita afir
quido viscoso e nojento, que ter mou, a propósito desta tese: " a
minou por formar, no rosto da me perda de memória é perigosa para
nina uma máscara grotesca e horrí o mundo civilizado."
vel que, secando, não deixava ma Sim a perda de memória volun
is as lágrimas correrem. tária, ou involuntária, é perigo
sa, no que se refere a crimes co
0 senhor Lecler não pôde ap£
metidos, seja por "amigos", seja
gar de suaretina, por muito tem
por inimigos. A perda da memória
po, o triste espetáculo.
é tão perigosa para os crimes co
Sobre estes crimes, silêncio
metidos pelos Gaullistas, como pe
absoluto. E os animais, as bestas
los cometidos pelos nazistas.
humanas, foram condecorados pelo
Interessante que muitos per
poder Gaullista!
deram-na no dia dos crimes, e não
Sim, senhores! Condecorados! quarenta anos depois.
E isso aconteceu na França,
E ainda agora continua-se a
que tão baixo caiu nesses tristes
glorificar os carrascos e insul
anos... Um país que muitos ainda tar as vítimas.
têm a coragem de chamar "Reino da
Do meu lado, não faço distin
Civilização", "Pátria dos Direi
ção entre crimes de um ou de ou
tos Humanos"...
tro bandido. Dois pesos e duas me
Reportando-me ao livro ante didas? Não!
riormente citado de Saint Germain Um dos matadores de Petit
digo: "eu peço para não esquece Chateau, o que havia, em minha ca
rem que as chamadas "atrocidades sa havia me ameaçado com a arma e
alemãs" partiam de inimigos, mas metralhado todas as paredes, não
65
era outra coisa senão um vulgar e ram criminosos que deveriam estar
mesquinho traficante do mercado na mira da justiça.
negro, metido com as tropas" ale Falando de Pipriac, eu quero
radores dos anos de 1940 e 1941,e. reconhecia ter posto fogo em nome
66
da Resistência, que ele declarava com atividades iniciadas em 1941,
representar. era o preferido por todos os plajn
Nunca teve problemas por cau_ tadores da região para fazer to
sa disso. 0 governo francês, po do o serviço, que antes era reaH
rém, teve que pagar uma pesada iri zado pelos falsos "barons".
denização, que permitia a eles re Para eles, perder isso era _i
construir um dos mais belos moi nadmissível. Monsieur Testerel e
nhos da região. Os Colber conse sua família pagaram com as vidas!
guiram o que exigiam, mas não fo Outro que fazia parte da tur
ram os culpados que pagaram, mas ma de assassinos, morava no vila
sim os contribuintes franceses, e rejo de Brangalo, também em Mau-
que de nada tinham culpa,exceto a re de Bretagne. Era mais conheci
covardia de aceitar esses crimes, do como "mal-penteado", embora se
calados, sem protesto. chamase Louis. Ele participou di
Os falsos "barons de Campei" retamente dos crimes.
têm a sua história também,que pojs Trabalhando em uma estação
sivelmente, nem eles mesmo conhe de trens em Paris, tinha, em 1940
cem. 0 avô bastardo de alguns no abandonado o serviço, refugiando-
bres, abandonado quando era criari^ se no vilarejo de Brangalo, de on
ça por sua mãe, que não queria de_ de era nativo. Transformou-se no
notar sua desonra, fora recolhido maior traficante do mercado negro
por uma família de Campei.Esta fa da região.
mllia, e ele próprio, mais tarde, Era sua profissão roubar aos
viriam a receber, da família ver pobres para alimentar os ricos, e
dadeira da criança, ajuda materi aos soldados alemães.Ao mesmo tern
al, o que lhes permitiu, e ã seus po, é claro, enchia seus bolsos.
descendentes, dominarem a pequena Estes eram os justiceiros, a_
cidade de Campei. pavorando a população, matando,
Esta é a razSo pela qual fo roubando, massacrando.
ram batizados pela população com Agora, todos eles levam,à 1§_
o nome de "barons".Serviram-se da pela do casaco, as condecorações,
falsa nobreza para fazer mal não que ganharam por "bravura".
só a nós, mas praticamente a to No enterro da família de Pe-
dos os moradores do lugar. tit Chateau, nenhum cidadão fran
Meu pai conhecia toda a his cês, fora os carregadores, teve a
tória, que a ele foi narrada pelo coragem de acompanhar os corpos
meu avô. até o cemitério.
Os falsos "barons" tinham j5 Os excrementos da sociedade
dio de Amand Testerel, que foi as_ fizeram saber que aqueles que fi
sassinado com sua família na sua zessem o cortejo seriam pessoas à
fazenda. Monsieur Testerel,emprei^ beira da morte, condenadas.
teiro de beneficiamento de grãos, E todos foram covardes.
67
Eu mesmo o fui... processo, eu precisava da autori
Era o terror! Mas isso expll zação do próprio indivíduo.
ca tudo?... Mas, onde ele se encontrava,
nham-no enviado, pois não podia - "Os crimes dessa gente são
ser posto .em: liberdade.-com todos muitos,e bem maiores do que pode
Nos anos 70, em uma das mi sos. Quem sabe, não foi a França
68
inclusive a si próprios, repetiam us, também foram deportados para
incessantemente suas falsas verd£ a Alemanha.
des. Tiveram a sorte de poder vo_l
De qualquer maneira, apesar tar para casa, antes do fim da II
de todos os exageros que vocês fi guerra.
69
Depois da guerra, dois volta mente nunca terem combatido,someri
ram. Dezoito, ficaram lá... te massacrado seus próprios patrí
Chamar os homens que causa cios.
ram isso de "resistentes" é malal Vocês apenas reservaram-se,
acontecido por armas russas, in ram para casa após a vitória sem
glesas, ou mesmo francesas. roubar, pilhar, e sem assassinar
Muitas vezes, antes de mor os próprios irmãos, como vocês fl
rer, devem ter amaldiçoado aos re_ zeram.
70
resistentes, obedecendo ordens de Com os olhos vendados, mada
seus chefes. Mais tarde quase in£ me Le Pasteque foi abatida com. um
centados no tribunal.É somente um tiro na têmpora, tendo morte ins
caso à parte, julgado e condenado. tantânea. Já madame Clementine te
Os assassinos pegaram uma pe_ ve uma morte não tão rápida, aca
na leve, e ainda foram agraciados bando por implorar para acabarem
pelo armistício, que beneficiou a com ela. Um dos assassinos estran_
criminosos. gulou-a com a ajuda de uma corda.
Que solidariedade! Isso aconteceu em 4 de agos
Monsieur, madame, e sua úni to de 1944, na cidade de Vannes e
ca filha, mademoiselle Balkery,fo no departamento de Morbihan.
ram as vítimas. Apesar de ter si Monsieur Le Daualar,antes da
do metralhada com o resto da farrú libertação, teve um acidente, com
lia, madame Balkery não teve uma seu carro, no qual morreu uma pes_
morte imediata. Então, após terem soa.
71
do mais de cento e dez pessoas! tos outros, "redimir" seu passado
E sua estimativa era mddes<- incômodo...
mestre.
Monsieur Jourdan, professor
0 assassinato do senhor Ber-
no Liceu da cidade, era Petainis-
nabe, em Tarbe, não foi menos vi£
ta. Dois de seus colegas, Meunier
lento.
e Durand, eram Gaullistas.
Um resistente tinha ódio dg_
Mostrando sua coragem, con
le e prometeu fazer um "acerto de
seguiram convencer quatro alunos
contas". Um dia, cercado no canto
do colégio; Gonin, Girard,Collona
de um bar, conseguiu escapar. Fo
e Touche a matar toda a família
ram correndo atrás dele,gritando:
Jourdan. Depois de os ter armado,
- "Parem-no! É um milicia
os jovens se apresentaram à porta
no!"
do professor; fazendo-se reconhe
Preso, foi conduzido; ao co
cer; eram nove horas da noite.Sem
missário. Depois de ter sido in
desconfiança,Jourdan abriu a por
terrogado, nada tendo sido desco
ta, os jovens entraram e a seguir
berto contra ele, foi liberto. Pa_
começou a matança.
ra sua infelicidade,os bandidos o
0 professor, sua mulher,sua
esperavam na rua.
cunhada, e dois amigos presentes,
Depois de baterem muito nele,
são mortos. Um dos assassinos,
perfuraram-no com várias balas,na
Gonin,sobe ao primeiro andar onde
frente do comissário de polícia e
encontra a vovó de 82 anos e o
jogaram o corpo no canal.Isso,no
bebê de dois anos, que dormia em
centro da cidade! As autoridades
seu berço.Mata ambos com balas na
fecharam os olhos, pois todos ti
cabeça.
nham medo dos bandidos.
Um mês mais tarde; os gen-
Em Marseille.
darmes (policiais) de uma cidade
No dia 23 de agosto de 1944,
vizinha, descobriram um rapaz er
onze cadáveres foram retirados de
rando pela montanha, bàlbuciando
águas do Jarret, um pequeno rio,
palavras sem nexo. Era Gonin; seu
que passa no centro da cidade.
crime monstruoso tinha feito dele
Um dos assassinos foi preso.
um louco. Precisou ser internado
Tratava-se de um espanhol,chamado
num asilo de alienados.
Ramón Ramirez.Como falso resisteri
te, tinha se intitulado juiz fraji
cês!
Trabalhara para as tropas in^
vasoras alemãs e queria,como tan
72
MASSACRE DA blicados pela revista "Histórias
FLORESTA DE TRONÇAIS. Hors Série"
pés na balaustrada do segundo an bou por ser jogada viva no rio Vi_
dar, num balanço lento e agonizar^ laine.
te.Durante 42 horas seus lamentos A mãe da coitada, tendo rec£
de angústia se ouviram,até a mor nhecido dois dos assassinos, de
te silenciá-los.;, nunciou-os, e um ano depois disso
[estes crimes foram, em parte, pu_ foi condenada, pelo tribunal fran
73
cês de Redon,a quinze anos de tra e preferem se calar sobre o que
75
publicou matérias sobre crimes da 0 senhor do jornal olhou-me,
falsa resistência de Marselha, i- de frente, demorou a responder e
lustrando com a foto de três infe finalmente confirmou!
lizes que foram enforcados à moda - "Se não pararmos a publica_
do faroeste americano. ção desses crimes em nosso jornal
Na semana seguinte, o mesmo perderemos o direito de fazer no_s
jornal desmentiu o que havia pu sa impressão no "Fígaro". Temos
blicado, apesar das fotografias, contra nós uma máfia poderosa".
que provavam a existência de cri 0 "Special Derniere" era im
mes. presso pelo "Fígaro", cujo dono,o
A explicação dada aos leito senhor Provost, já idoso, não ti
res foi a de que "haviam se enga nha mais tanta influência.Ele tam
nado". Quem acreditaria num des bém teve problemas em 1944, e foi
mentido absurdo desses? Georges Bidault, presidente do Co
A verdade é que, entre uma mitê Nacional de Resistência que
semana e outra, a máfia fez o dia o salvou. Isto é, salvou o jornal
bo para impedir que a verdade ch£ "Fígaro", que não foi roubado, c£
gasse aos olhos e ouvidos dos lei_ mo outros jornais franceses. Nos
tores. sos resistentes precisavam de re-
Eu me encontrava em Paris na ccmpensa, e serviam-se à vontade!
época em que isso aconteceu.Minha 0 senhor Provost devia estar
senhora estava comigo quando fo devendo um grande reconhecimento
mos ao "Fígaro", onde era impres por essa gente. Isto explica o s^
so o "Special Derniere". lêncio a que foi obrigado o "Spe
Eu tinha preparado dados, d£ cial Derniere".
cumentos sobre os crimes da re- Apesar da parada da publi
giSo de Redon. Eu queria entregar cação a respeito dos crimes, este
tal documentação a eles para que senhor me pediu para ficar com os
fosse publicada, evitando que fi_ documentos que eu havia prepara
casse perdida no tempo. do.
0 diretor, senhor "Desmarèt, Depois, perguntou-me qual ha_
estava ausente. Fui recebido pelo via sido o campo de concentração
responsável, que depois de ter me francês em que eu estivera preso,
ouvido,disse-me que essas reporta depois da guerra.
gens não seriam mais publicadas. Respondi-lhe:
Alguma coisa me cheirou mal nesta - "Nem preso, nem trancafia
atitude. Coloquei minhas dúvidas do em nenhum lugar. Esses "super-
e pedi a ele a real razão de tal patriotas" contentaram-se com a
mudança. tentativa de me assassinar entre
- "Vocês foram obrigados a as sombras da noite".
parar as publicaçSes desses cri Ele abriu os olhos,arregalari
mes?" - perguntei. do-os,quase não acreditando.
76
Não tendo mais nada a fazer sexo fraco. Nos dias de hoje, se
no "Flgaro",em companhia de minha riam feitos em pedaços por senho
mulher dirigí-me para Notre Dame. ras conscientes dos direitos da
Queria visitá-la antes de voltar mulher.
ao Brasil, para lhe agradecer pe Minhas senhoras,há tempo airj
la proteção que sempre me foi cori da! Suas infelizes irmãs inocen
cedida. tes foram ultrajadas demais, mar
Alguns meses mais tarde, vim tirizadas. Os falsos machões não
a saber, por um membro da família merecem nenhuma piedade de vocês.
Provost que já tinha encontrado Uma das vítimas de Baulon fi^
em Paris, e que já estivera em nã cou impossibilitada de trabalhar,
nha casa, em Goiânia,que o senhor até 1951, em conseqüência das tor_
Provost era aparentado da família turas recebidas.
Mesmes. Um dos membros desta famí_ Foram mais sete anos de mar
lia, na época da ocupação,era pri_ tírio.
meiro ministro e Gaullista fervo Três mulheres foram enforca
roso. Está explicada a razão pe das atrás do castelo,depois de s£
la qual o "Fígaro" não foi rouba frerem um monstruoso calvário.
do a exemplo de outros jornais da Uma destas mulheres,do norte
Mesmer sentia-se como todos os se_ tudo que ela possuía.No início da
us colegas da mesma laia, incomo fuga, estava com sua família,, que
dado pelas revelações que o jor aos poucos ela foi perdendo pelas
77
nhos franceses, para, depois, ser A senhora Guihard, por mais
massacrada por seus próprios com de vinte dias sofreu maus tratos,
patriotas, que declaravam agir em apanhando diariamente, quase sem
nome da pátria. Pátria que também parar.
78
elas foram presas, levadas ao ca£ A um assassino se dá um copo
telo de Monterfil, aos porSes. 0 de Rum. Para essas três coitadas,
seu martírio começava, junto com uma gota d'água foi negada.
outras quinze mulheres. A identidade da terceira mu
Comandando as atrocidades,es_ lher nunca ficou bem definida. A-
tava o filho do Castelão. credita-se ser Suzane Belsau, re
Mais tarde, o senhor Guihard, fugiada do norte da França.
marido e pai de duas delas, decla A prefeitura de Monterfil,eu
rava: jo prefeito era o Castelão, fez de_
- "Faz quatro anos que dei a saparecer os papéis de identidade
queixa no tribunal.Ainda estou es_ da mulher e denegriu sua imagem à
perando o resultado". família, que depois disso não ma
E prosseguia: is procurou saber de seu destino.
- "Sempre tenho, diante dos As infelizes eram levadas e
meus olhos, o horrível espetáculo trazidas dos porões do castelo à
de minha pobre mulher e minha que_ pequena praça, onde, amarradas co
rida filha, atadas como gado, na mo animais nas barras que ficavam
pequena praça de Monterfil. Eu as em frente do Café Beda, sofriam
procurei durante dois dias,nas re_ sem parar os insultos è socos dos
dondezas, em todos os lugares on seus carrascos.
79
mato, atrás do castelo. Lá, onde Pobres inocentes.
os oficiais alemães eram recebi Parte deste episódio foi pu
dos como convidados, no princípio blicado pelo "L'Oeste Journal" de
da ocupação. 20 de novembro de 1944.
As supliciadas caminhavam, tj Os cadáveres foram enterra
ma atrás da outra, recebendo ain dos no própio local do assassina
da golpes e insultos -das bestas to, a beirade um barranco. Não ti
humanas que as rodeavam. nham direito ao cemitério da pe
Já estavam mortas, mental e quena cidade, nem mesmo ao padre,
moralmente, antes mesmo de reali que elas haviam pedido nos seus
zar-se o derradeiro ato de morte últimos momentos de vida.-"Vão ao
física. diabo!"-foi a resposta dada.Deus,
Por terem passado por tantas porém, entendeu os seus apelos e,
atrocidades,não se importavam com sem dúvida,acolheu-as sem pedir a
mais nada; aceitavam tudo, pedin opinião humana, principalmente
do uma só coisa: que o pesadelo desses homens,que um dia poderiam
acabasse, pois o cálice tinto de muito bem encontrar-se, se já não
sangue fora bebido até o fim. o fizeram, com o diabo.
Antes do enforcamento,ura tal A família Guihard era de pe
de Ranièr fora requisitado, para quenos operários agrícolas, e bem
cavar a fossa, na presença delas. pobre.
Estando tudo pronto, passaram pa 0 senhor Guihard solicitou à
ra a execução. A corda foi passa prefeitura de Rennes a translação
da no pescoço dos pobres farrapos dos corpos para o cemitério. Para
humanos. 0 fim, para eles, tinha obtê-la, foi preciso esperar qua^
chegado. Foram pendurados num mes_ se dez anos.
mo galho de pinheiro,três corpos, Não que as autoridades negas^
que com o peso, quebrou-se. Nova sem atendê-lo. Fariam sim, mas de
ordem foi dada, para que a opera maneira que não causasse publici
ção fosse repetida. dade, e escondido.
Mas, as cordas, grossas de- 0 senhor Guihard, revoltado,
uais, r;ão apertavam o bastante.Ba e apoiado por amigos e pelo peque^
tendo os. pés, as pobres não morri no jornal de Rennes, exigiu que a
am. Foram, então, tiradas do ga translação fosse feita de modo o-
lho mais uma vez, e tiveram seus ficial e legal: na frente do tri
crânios esfacelados por golpes de bunal e do prefeito D'Ille e Vil-
coronhas dos fuzis. Estes golpes, laine, ou de seu representante.
foram repetidas.vezes dados, àté Situação difícil de aceitar
que o último suspiro fosse arran pelos que tinham cometido o crime
cado delas. (aqui recomendo a leitura do priji
0 suspiro da libertação... cípio do livro, já citado, "Res
0 fim do martírio! posta à Omerson").
80
Estes senhores "resistentes" noite, sem comida ou bebida. Mi
Gaullistas, tinham vergonha de se_ nhas feridas faziam-me sofrer e-
us atos criminosos e de seus cúm normemente. No dia de meu seqües
plices. tro, aproveitaram e roubaram tu
E, com vergonha ou sem, hão do o que eu tinha. No dia 19, foi
queriam que o povo se lembrasse a vez da senhora Daneil. Durante
dos tristes acontecimentos. horas bateram nela; a coitada gri
Quinze mulheres ainda esta tava de dor. Mas nós estávamos pja
vam presas nos porões do castelo ralisadas de medo. 0 céu,a terra,
com seus carrascos deleitando-se, poderiam cair em nossa cabeça: es.
graças à boa qualidade das bebi távamos impossibilitadas de fazer
das encontradas nas adegas. Esta qualquer movimento. Mais tarde,ao
vam sempre bêbados, pois sóbrios, vê-la voltar, catnbaleante, e co
não seriam capazes de cair tanto. berta de suor e de sangue, des
Mesmo selvagens não seriam capa maiei. Apresentei queixa. Porém,
zes de tanto. como todas as outras, sem resulta
Madame Croalte, uma delas,d£ do".
clarava, mais tarde: Adiante, dizia:
- "Eles ameaçavam-me constari - "Fiquei dezoito meses sem
temente com seus revólveres e me poder trabalhar, em conseqüência
tralhadoras, assustar-me era bem das torturas. Eu nunca poderei es_
menos perigoso que atacar tropas quecer o que essa gente nos fez.A
nazistas, e também mais lucrati noite, desperto sobressaltada, a
vo" . cabeça pesada, o corpo cansado, e
E continuava: tremendo, como se, de novo, injú
- "No dia 18 de julho; Emile rias físicas, morais estivessem a
Jouetel des Sables D'01ones inter. me atingir".
rogou-me na garagem, com seu revól_ Os assassinos estavam espa
ver nas minhas costas, ameaçando- lhados em qualquer lugar da Fran
me sem parar. De um lado estava o ça: fosse Monterfil, Tarbes, Re-
seu filho; do outro, um indivíduo don, Maure de Bretagne. E sempre,
que eu nSo conhecia. Cada um ti acima da lei.
nha um chicote nas mãos. Batiam- É preciso ter vivido esse p£
me e davam risadas, quando eu me ríodo triste para ter uma pequena
torcia, a cada um dos golpes. Pa idéia de toda a sujeira que acon
ra esconder o vexame de não terem teceu, em todos os cantos do país.
podido fazer com-que eu confess,as_ 0 caso de madame Cioatte ori
se algo que não fizera, não hesi ginou-se de pura vingança. Ela e
taram em cortar meus cabelos. Emi_ madame Poirot, outra prisioneira,
le, sempre me ameaçando com a sua negaram-se a abandonar um quarto
arma. Deixaram-me num cubículo,no que ocupavam, e pagavam regular
81
O ódio da proprietária, rnada, Outras delas, madame Daneil-
me Alexis, foi tão violento como le, por exemplo, recebia especial
a denúncia que fez contra as duas atenção nos fundos dos porSes, de
coitadas. onde só saía à noite para travar
Salice André foi presa, sem conhecimento com os chicotes e ou_
saber o porquê,alguns dias depois tros instrumentos de tortura, co
da chegada das tropas americanas, mo socos e pontapés do senhor Lou_
em Monfort sur Meu. is e de seus fiéis ajudantes.
Relata ela: Graças a uma briga entre os
- "Fui levada aos porões do assassinos, madame Danèille não
castelo sob ameaças. Lá já se en foi enforcada. Um deles começou a
contravam outras mulheres, e quan achar o comportamento do grupo um
do vi as pobres criaturas acredi abuso, fato que provocou uma bri
tei ter entrado no inferno.Louis, ga que marcou o fim de seus pesa
o filho do Castelão, com seus co delos.
legas, tiraram-me a roupa até os Levadas para o quartel Mar-
quadris. Todos já estavam bêbados querite, em Rennes, elas foram li_
e continuavam a beber. Louis amesi bertadas ao primeiro interrogató
çava-me com o chicote, como se eu rio, após terem sido bem tratadas.
fosse uma jumenta de suas cavala- Quanto aos responsáveis, nun_
riças, querendo me fazer confes ca foram incomodados por seus cri
sar que eu tinha denunciado al mes. A não ser o incômodo de ver
guém. Fiquei três dias presa, de seus nomes e horrores que pratica^
pois fui liberada, junto com meu ram revelados pelo jornal de Ren
irmão, que também tinha sido pre nes.
so sem saber o porquê. Nós não fo Se não fosse por ele, eu pej>
mos agredidos fisicamente, -mas a soalmente ignoraria muitos deta
tortura moral que nós dois agüen lhes sobre esses crimes, que acon_
tamos, nunca mais vamos esquecer". teceram a alguns quilômetros de
Madame Houe, prisioneira de Campei. Bem como milhares de ou
sessenta anos, passou mais de vin tros, escondidos sob a névoa que
te dias nos porSes desse castelo. encobriu a França nos anos de 40
Queriam obrigar a pobre- velha a e 50. E a névoa continua pairando
revelar o endereço de seu filho,o sobre o país.
que possivelmente, nem conhecia. Os outros jornais da região,
nunca tiveram a probidade de fa
As prisioneiras, como madame zer o seu dever: informar os lei
Houe, depois de serem obrigadas a tores de todos os crimes cometi
levantar as tampas dos esgotos no dos.
porão do castelo, eram ameaçadas A desinformação começou com
de serem lançadas dentro da sujei_ as ameaças dos criminosos, e con
ra, para apavorá-las ainda mais. tinua com a covardia dos meios de
82
informação. É preciso, no entan obrigado a ficar um mês a mais no
to, reconhecer que não dispunham, hospital.
é certo, de todas as liberdades Todavia, tudo terminou bem,
para isso. 0 "Special Derniere" apesar da perna ter feito com que
mostrou-nos isso. Porém outros p£ eu sofresse bastante. E,de vez em
derosos não tinham necessidade de quando,ainda o faz.
se curvar, como o fizeram. Minha colheita, que tinha si^
Certamente, era cômodo e lu do boa, foi feita por Petter, um
crativo, e a imprensa foi responsjá alemão que trabalhava na fazenda,
vel por ter feito passar culpados comigo.
por vítimas e bandidos por bons Na plantação, empreguei pou
franceses. co adubo, pois as terras eram mui
Em 1789, na Revolução F rance; to boas. Graças a isso, consegui
sa, alguns meses após ò final do ótimos resultados.
terror, os matadores foram denun Deixando o hospital, voltei
ciados e muitos torturadores subi para a fazenda, onde amigos me e_s
ram a escada da mesma guilhotina peravam. A intendente geral do
em que haviam executado as suas hospital queria me acompanhar, e
vítimas, que assim foram reabili ela tinha sido muito devotada du
tadas. rante a minha recuperação, apesar
Em 1944 e 1945, após o ter de algumas briguinhas por causa
ror, os assassinos estão em pedejs das moças que me visitavam.Depois
tais de heróis, e suas vítimas jjd dos meses de internação, até pre
gadas na lama. E,mais de quarenta cisaria de uma pessoa como ela p£
anos depois, continuam assim. ra cuidar de mim. Mas fiquei pre£
Verdade triste para a França, cupado com as conseqüências, que
que nos últimos anos não se mos poderiam advir. Resolvi retornar,
trou um país civilizado. à sós, para a fazenda.
As pílulas não eram conheci
das, dificultando ainda mais aque
Ia situação.
Um pequeno sacrifício a mais,
Bem, voltando atrás, passei e a vida está repleta deles.E são
três meses no hospital, em Bagé, deles que, muitas vezes, vêm as
pois duas pneumonias dificultaram melhores satisfaçSes.
a cura da perna quebrada. Algumas semanas mais tarde,
Depois de quarenta dias, dei_ fui à Bagé. Entre outras coisas,
xou-me a doença uma ferida em um eu fiz uma visita ao hospital.
dos pulmões, e por eu ter emagre Desci, como antes, no Hotel
cido bastante, o gesso ficou sol do Comércio, onde tive uma . das
to, e o osso, torto. Para conse maiores surpresas de minha vida:
guir que ele se endireitasse, fúi em minha frente apareceu um tal
83
de Bouret, que conheci na Guiana. pria voz. Só ele tinha razão.E is
Estava lá, na porta do hotel, to so lhe custava caro, mas não muda_
do sorrisos. Fiquei sem fala. va.
84
tante quatrocentos quilômetros.Lá futuros.
aluguei uma fazenda de mil hecta Era um pouco parecido com a
res de um amigo "pied noir". fábula de La Fontaine, "Perrette
Nesta fazenda, fiquei com a e o pote de leite".
administração, deixando para ele Oito meses depois,um novo de_
a parte mecânica, pois dizia-se sastre. 0 proprietário pagou os
especialista no ramo. Ele não tar_ estragos causados pela sua incon-
daria a me mostrar sua "capacida seqüencia, e estes não foram pe
de". quenos.
85
Eu não lhe escondi minha op,i Acertado o casamento, pediu,
nião pessimista sobre o resultado à França, certidões de estado ci
do que fazia. vil e religioso. Quando os papéis
- "Não faça trabalhar sua ca_ chegaram, descobriu que ainda es
beca por causa de minha planta tava casado: d divórcio não tinha
ção" - respondeu-me - "Sei o que seguido seu curso normal, pois o
faço. Dentro de dois anos o Bra único interessado estava fora do
sil não precisará mais importar a país. Assim, perdeu a noiva.
semente da batata. Eu vou abaste Logo parti para Goiás,a dois
cer o mercado!" mil quilômetros do Rio Grande do
Naquele tempo, as sementes e_ Sul, e nunca mais o vi.
ram importadas da Holanda. Depois de sua saída, fiquei
Sua ambição era grande, mas a sós na fazenda. Alguns meses óe_
seis meses depois, uma nova catas pois, um primo veio encontrar-se
trofe: o proprietário, novamente, comigo.
pagava o "tufo", e Bouret descia A fazenda onde me encontrava
à Porto Alegre, indo mais uma vez já tinha sido propriedade de um
ver o Cônsul. francês; como prova disso, encon
0 Chanceler não o abandonou, trava-se vestígios de antigos lo
arrumando para ele um emprego na cais de plantaçSes frutíferas,bem
Companhia de Bondes,como especia como de árvores ornamentais, que
lista em tornos. Nunca tinha pego não existiam nas propriedades vi
tal máquina nas suas mãos... zinhas.
Apesar de tudo,, conseguiu se Isso dava a essas terras uma
adaptar, e após algum tempo, con reputação não merecida. Eram mui
seguiu sua aposentadoria. to inferiores às terras de Bagé.
A mania de grandeza sempre o A sede da fazenda situava-se
tinha posto a perder. Eu me lem a sete quilômetros da cidade, fa
bro dele ter me dito quando traba_ cilitando em muito o trabalho, no
lhava comigo: que diz respeito ao transporte de
- "Quando eu voltar para â mercadorias, principalmente. Nes
França, será de Cadillac!" te primeiro ano, o único meio de
Naquele tempo, era o carro transporte era a bicicleta, e uma
dos que tinham poder e dinheiro. para dois!
Em minha primeira viagem de Foi aí que conheci Zélia,com
volta à Fiança, em núpcias, com quem, dois anos depois, me casei.
pramos uma Citroen dois cavalos e Boa moça de origem alemã, sern
nos achamos muito felizes com ela. pre me acompanhou, nos bons e nos
Bauret, durante o trabalho maus momentos. Veio do norte do
em seu último emprego, encontrou Estado, acompanhada de sua irmã,
uma noiva, de boa família, e em casada com Júlio, o diretor das
bóasituação financeira. Usinas de Linho A.J. Renner.. Ele
86
era letão. Seu pai era proprietá sem dinheiro, toda a família mi
rio de uma pequena fábrica na U- grava para o Brasil.
crânia, quando os "Kzares" bran Júlio conservou de seu país
cos dominavam seu país. as melhores lembranças: o inverno
Seu pai vendeu todas as pro e as águas geladas do Dvina, que
priedades na Ucrânia para voltar carregavam enormes blocos de gelo;
a seu país. Depois da I guerra, a a primavera, com açudes e lagos
Letônia conquistara sua indepen numerosos, onde encontrava-se um
dência, como todos os países bál- grande número de peixes.
ticos. Depois da última guerra,a Le
0 coletivismo ainda não ti tônia e todos os países bálticos,
nha sido aplicado na Rússia. que nada têm a ver com o povo ru§_
Com o pais inteiramente vira so, seja em cultura ou língua, es_
do de pernas para o ar, foram ne tavam de novo incorporados às for_
cessários diversos meses para cbe ças do Império dos "Kzares" verme
gar até Riga, capital do seu novo lhos.
po, Júlio era o segundo mais novo, quei a minha fazenda por outra me_
com oito anos de idade. nor, mas com uma qualidade bem s^j
Mesmo passando um longo pe perior
ríodo sob governo autoritário, ã Infelizmente, depois de mais
pulação, duas vezes na semana, fre_ de trigo: ferrugem, que não era
87
lhida mal servia de ração para o cos quilômetros de Caxias, havia
gado. a Companhia Georges Aubert, prodtj
Eu estava na zona mais atin tora de champagne, vinhos finos,
gida do Rio Grande do Sul: Deprejs conhaque, aperitivos e licores. E_
são Central. E eu era, na região, ra conhecida no Brasil inteiro, e
o maior plantador. seus proprietários eram franceses.
Depois desses três anos, co Senhor Aubert, Georges, meu
mo não existia seguro agrícola,eu xará, como se diz aqui no Brasil.
me vi numa situação■bastante incô Herault, Chauvin, Trouller e ou
moda. tros, eram bons amigos.
A fazenda de Encruzilhada ejn Havia também em Porto Alegre
contrava-se a cento e sessenta Monsieur De La Pierre, diretor e
quilômetros de Porto Alegre, en fundador de uma grande companhia,
quanto que, esta última, estava a também francesa. Este, aliás, não
cem quilômetros. era o seu verdadeiro nome.Ele ti
íamos à capital duas vezes à nha sido condenado à morte no ano
semana, pois lá tínhamos bastante de 1944, mas acabou por ser per
amigos. A estrada de terra era re doado em 1956, quando eu me encori
pleta e pedras, e larga,sendo que trava em viagem de núpcias, na
muitas vezes víamos o pára-brisas França. Voltou para Paris,onde e-
voar em pedaços, atingido por pe ra professor em Sorbonne.
dras, lançadas por outros carros. Era um senhor de grande va
Além das atividades em minha lor, atributo raro na França na
fazenda, eu era procurador de um quela época. Ele era secretário
amigo que morava em Mônaco.Ele ti de Darnand, fuzilado em 1944, mes^
nha terras e propriedades ali e mo após ter sido proclamado o me
em Porto alegre. Tínhamos também, lhor soldado da França, em princí_
na zona de Caxias do Sul, muitos pios da guerra, em 1939, sendo vo
amigos, principalmente franceses. luntário para todas as missões pe_
rigosas.
Esta região, povoada por des_ Já havia mostrado o seu des-
cendentés dos primeiros colonos temor, na guerra de 1914-1918.
italianos, juntamente com a co Depois de seis citaçBes, me
lônia alemã, que fica próxima, é, recidas por sua bravura, recebeu
certamente, uma das partes de ma a medalha militar, a cruz de guer^
ior desenvolvimento do Brasil .dei^ ra, e em 1919, o capitão Percival
xando para trás muitas regiSes da propósa ú .seu nome para receber a
Europa. Legião de Honra, que o General Gojj
Toda essa parte do país é, ja raud lhe entregou em 1929.
tualmente, cortada por boas estr£ 0 presidente Poincare escre
das, que não existiam na época. veu numa carta:Darnand foi um dos
Na cidade de Garibaldi,a pou^ principais autores da vitória de
88
1918. Somente três homens foram morte, como traidor, por seus pró
merecedores deste título: Autores prios amigos da Frente Popular,em
da Vitória. Georges Clemenceau, o 1939, foi chamado, por De Gaulle,
Marechal Foch, e Joseph Darnand. para ser vice-presidente do cons£
0 prêmio que recebeu em 1945 lho! Vejam a diferencia entre os
foi o fuzilamento,ao contrário de dois casos: Thorez havia deserta
Thorez, secretário do Partido Co do e passado para as linhas nazis
munista, que, sendo condenado a tas!
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Georges Aubert, sindicalis. tencer à resistência, como os ou
ta "paysano" (ruralista) antes da tros.
guerra, tinha bem mais idade com Em seguida, foi colocado no
parado à mim, e também, como eu, vãmente no paredão de fuzilamen
era Pètainista. Teve bastante in to. E só nos últimos instantes pô_
cômodo em 1944. de se fazer ouvir pelo oficial co
Em geral, todos os sindica mandante alemão, e ser salvo, pe
listas "paysano" eram anti-comu- la segunda vez num mesmo dia, de
nistas, e muitos pagaram caro por ser fuzilado.
aquilo que chamamos "libertação". Já morreu há muitos anos.Te_
Preso pelos terroristas da ve um ataque cardíaco quando visi_
falsa resistência, foi levado até tava a exposição internacional de
o Vercors, uma região situada nos Montreal. Trazido de volta ao Bra
Alpes, perto de Grenoble, onde,d£ sil, não pôde se recuperar.
pois de uma paródia de julgamento Quando os visitávamos,em Ga
foi condenado à morte. Prestes a ribaldi, era uma festa. Todos sa
ser fuzilado, as tropas alemãs a- biam apreciar a qualidade das be
tacaram o local. Os falsos resis bidas que nos estavam servindo.
tentes, já com muito sangue em slj Na volta, o carro vinha ca
as mãos, pararam as execuçBes. De rregado de caixas de champagne,^
repente, nossos "heróis" perdiam nho, aperitivos, licores. Nas es
a arrogância e a suposta bravura. tradas da serra, pelas quais tra
Assim, esse ataque salvou a fegávamos de volta à Porto Alegre,
vida de monsieur Albert, e de al toda a atenção era pouca.
guns outros, que, reunidos,valiam
mais que todos os resistentes de
Vercors.
Em poucos dias,as tropas n§_
zistas limparam a região.
Nossos "heróis" eram fortes
e corajosos para assassinar seus Voltei à França, pela pri
compatriotas desarmados, mulheres meira vez, em viagem de núpcias.
e crianças. Porém, na frente das Fomos para ficar três meses, en
tropas alemãs, só conheciam a fu tre o plantio e a colheita, de ju
ga. nho a outubro.
Monsieur Aubert novamente a_ Zélia, que realizava a sua
cabou aprisionado, desta vez pe primeira viagem à Europa, adorou
los alemães, sem portar nenhum d£ a França. Mesmo depois de numero
cumento, pois todos os seus pa sas outras visitas, não mudou de
péis haviam sido roubados, pelos opinião.
terroristas da falsa resistência. A França é, realmente,um be_
Terminou por ser acusado de per Io, muito belo, país.
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"Oh quel e bèlle ma Bretag_ zinho desta vez, e dirigi-me para
ne Messac.
Sous son gris il faul Ia va_ Estacionei a Citrõen à mar
ir" gem do Vilaine, e encaminhei-me à
(Canção de Theodore Botrel, garagem.
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gar em Morbihan, onde os terroris heac. Alguns quilômetros após pa:s
tas pretendiam ter sustentado um sar por esta última, encontrava-
pequeno combate, entre eles es as se a fazenda de X, município de
tropas alemãs, e no qual fugiram, Maure de Bretagne.
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res patriotas Gaullistas. Enquan cultor, ex-dono de um moinho, ex-
to alguns seguravam a família, as empreiteiro de colheita e de enge
armas servindo como ameaça, os ojj nho, e ex- agente de polícia, em
tros, ainda mais covardemente, ba Paris. Agora era padeiro, em Mau
tiam, a socos e pontapés, no pro re de Bretagne.
prietário, que não podia defender^ Disse-me:
se. Quando ele estava quase morto - "Eu vou levá-lo à justiça
abandonaram a casa, após terem tu e você terá que apresentar provas
do roubado. do que nos acusa!"
Eu encontrei o senhor Raffe Todos eram iguais. Nunca e-
geau um mês mais tarde, no moinho ram eles, mas sempre os outros,os
Lebretan, em Maure de Bretagne.Ejs que faziam as sujeiras. Nunca ti
tava irreconhecível. 0 rosto, re veram a responsabilidade de assu
pleto de esquimoses, e inchado pe_ mir a responsabilidade por seus a_
los socos recebidos. tos de canalhice.
Disse-me, rindo: Não era a primeira vez, nem
- "Sempre tinha o rosto so£ seria a última, que me ameaçavam
ridente e alegre". de chamar-me ao tribunal. Como se
- "Não é desse modo que es eles ou a suposta justiça tives
ses porcos vão me fazer mudar de sem o poder para impedir-me de di^
idéia". zer a verdade.
Dez minutos mais tarde, che Quantas vezes ele e um tal
guei em Campei, encontrando minha de Simon, um dos terroristas, me
esposa e os amigos, a quem contei ameaçaram!
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as provas. Ainda não conhecia to be o que a população diz nas re
da a covardia dessa turma. dondezas?"
Uma vez mais, o pretendido Como não respondeu, contiraj
processo parou nesse ponto. Nunca ei:
mais ouvi falar dele. - "A população diz que é o
Não ignoravam que,depois da sangue dos meninos do castelo que
podre òâmara dos deputados Gaul- o está sufocando!"
listas ter votado o armistício a Referia-me às crianças mas
esses canalhas, todos os documen sacradas, juntamente com seus pa
tos que comprometiam tinham sido is, na fazenda do castelo.
destruídos pela polícia e pelos Um«senhor subia a rua, vin
tribunais. do em nossa direção. Quando apro
E, primeiramente, por aque ximou-se de nós, o "baron" o cha
le de Redon, cujo juiz, Cuscus, e_ mou:
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e murmurando eu não sei o que, e Bruz!
creio que nem mesmo ele sabia. Lari Agora vou falar de Bruz...
çando-me um olhar cheio de ódio e Uma bela cidade, a alguns
ameaça, fez meia volta e entrou quilômetros a sudoeste de Rennes.
em sua padaria. Em 1944, eu teria Com oitocentos e mil moradores, é
sido morto na hora... conhecida como una cidade de apo
Quanto a me chamar no tribu sentados.
nal, para que eu provasse minhas É uma excelente região, qn
acusações, foi tudo mais uma vez de há muita terra boa à volta. E
arquivado. ali viviam seus moradores, feli
Mesmo sabendo que iria sair zes e tranqüilos.
vitorioso do tribunal, ficou quie Sete de maio de 1944.Dia da
para fora do Café Central, pelo tudo já visto nestes anas de car
proprietário, tio de sua mulher. nificina.
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perche, que morava em frente à zido a nada. Depois do bombardeio
nossa casa, e cujo marido morrera a linda cidadezinha de Bruz deixa
na frente da batalha, a sua irmã ra de existir. Não havia mais pe
Antoinette, seu cunhado André e a dra sobre pedra. E tudo isso em jj
sua sobrinha, que escaparam dessa penas dois minutos.
matança coletiva. Um pequeno Verdum (uma ciàa_
Foi nesse momento que soube de mártir da I guerra) de 1944. E
mos que não havia sido Rennes, e este não foi criado para salvar a
sim Bruz, a atingida, o que expli pátria, mas para ajudar a acabar
cava a violência das explosBes no com ela.
local, que faziam-se sentir até A única coisa que sobrou de
em nossa casa. Bruz era bem mais Bruz, na extremidade do que pare
perto que Rennes. cia ter sido a praça da igreja da
Esse família tinha ido à c£ cidade, foi uma simples cruz, em
munhão de um sobrinho, cujo pai e_ granito rosa, que o arredondado
ra proprietário de um restaurante dos braços permitiu que resistis
chamado "La Rabine", no cruzamen se
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eu visitei em 1956. dade de tê-lo denunciado.
Para um foi erigido um monij Para se vingar, nas trans-
mento contra a barbárie. Para oij missSes deles com Londres, pedi
tro, bem pior, restou o esqueci ram a destruição da pequena cida
mento, deixando ao povo a ignorâni de.
cia completa de sua tragédia. A destruição foi realizada
0 que aconteceu em Bruz po com um capricho formidável. Não
deria ser qualificado como "espe houve uma falha sequer. Uma mis
táculo" para uma pequena platéia, são cem por cento completa.
que se divertiu. E quanto mais nij Pode ser que o acusado te
merosas as vítimas, melhor o espe_ nha pago; pode ser que não. E po
táculo. Torna-se mais divertido. de ser que ele fosse inocente do
Assim como os cristãos, queimados que era acusado.
nos circos romanos. Enquanto que, Desesperado, cheio de retirar
tocar um fio de cabelo de um ami sos por haver provocado a morte
go qualquer dessa pequena platéia de tantos inocentes, o culpado,al^
era considerado um crime. guns anos mais tarde, entrou para
Quais foram os responsáveis um mosteiro.
por esse crime? Vocês sabem? Era o mínimo que ele pode
Aviação americana? ria ter feito: rezar por suas ví
Em geral, os americanos nun timas e pedir perdão a Deus.
ca eram tão precisos. Cora eles as 0 pior e que todos esses a£
bombas caíam do lado de fora do sassinatos, esses crimes, eram a-
ponto visado. plaudidos por uma turma de france_
Aviação inglesa? ses que, em 1944, tinha, graças a
ajuda da B.B.C. de Londres, perd_i
Acertaria melhor o objeti do toda a noção de sofrimento hjj
vo a aviação Gaullista? mano e de respeito pela vida dos
No ano de 1970, o abade Le outros.
Page, padre de Campei, deu-me res^ Como o caso do ataque aéreo
posta a uma dessas perguntas, nó a Nantes, em que dois mil france
que se refere à nacionalidade dos ses foram mortos no centro da ci
se.
Estas super fortalezas-voa-
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zer seu horrível serviço: matar a de lutar e queria juntar-se à re
franceses inocentes. sistência de De Gaulle. Mas nunca
E eram aclamados por nossos teve coragem para isso. É verdade
corajosos Gaullistas, que tinham, que, pelo que já fizera de bom e
há muito, perdido a vergonha. de bonito, era melhor, como pes
Armandine de Gringnardais e_ soa honesta, afastar-se deles.Mas
ra mãe solteira e seu filho fora para ele, nesse momento, os Gaul
morto no início da guerra, ainda listas ainda eram heróis.
em 1940. Durante toda a sua vida, Um dia falou-me novamente a
fora lavadeira. respeito de sua vontade de comba
Descia, depois do almoço, a ter. Eu lhe disse:
estrada que levava para a lavande^ - "Porque você não vai para
ria pública de Fontaine, onde eu a Inglaterra. Lá, esperam por vo
levava os bois para tomar água. cê!"
Descendo a estrada, eu e ela - "Ah, sim! Você pensa que
ouvimos o barulho das centenas de é fácil atravessar o mar da Man
aviões, que iam semeando a morte, cha?" - respondeu-me.
a destruição. - "Fácil não é, mas, quando
Nossos corajosos Gaullistas alguém quer enfrentar uma guerra,
que, como nós, assistiam a cena, não pode ter medo de atravessar o
não se seguravam mais de felicida mar da Mancha. E ainda há a outra
de e cantavam. Eram uma meia dú solução: passar pela Espanha."
zia. E não importava a eles se Lá também era perigoso de
dois mil compatriotas fossem mor mais passar pelos Pirineus.
tos naquele momento.Nada tinham a Eu lhe indiquei o caminho e
ver com os infelizes que morre a coragem dele não era suficiente
riam sob os escombros. para seguir... Nem tinha o bas
Olhando céu e a revoada de tante para atravessar a linha de
aviBes, mãe Armandine, quando es demarcação entre a zona livre e a
távamos sós, disse-me: zona ocupada, o que era uma brin
- "Se isso caísse "sau leu- cadeira.
rs gaulle a ieux" (sobre a cara
deles), eu lhe garanto que eles Coragem que não tinham tam
não cantariam tão bem!" bém os falsos resistentes, pois e_
Tinham passado pela lavagem ra mais fácil atacar seus compa
cerebral da propaganda Gaullista. triotas desarmados, enquanto eles
Não sendo eles as vítimas, o res estavam armados até os dentes.Sem
to era o resto. sequer precisar deixar o local de
E Deus sabe que não eram c£ nascimento para fazer essas coi
rajosos. Sem mencionar o nome, re_ sas.
latarei o caso de um amigo. E, também, era muito lucra
Dizia ter uma vontade louca tivo.
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fuzil e entregou-se sem combater. comandante, que não soube, ou não
Terminou a guerra como prisionei quis defender-se. Em vez de se
ro na Alemanha, recebendo o trata guir o "ils ne passerons pas"
mento devido aos oficiais. (eles não passarão), do marechal
Meu pai estava na artilha Pètain, que reergueu as tropas da
ria de "Forteresse", e foi manda França na batalha de Verdun, o ca
do, com sua bateria, como reforço pitão De Gaulle respondia, agitar^
externo ao forte. do seu estandarte branco:
Chegando nas imediações, em - "Entrem, amigos, entrem".
plena noite, à procura de um bom As tropas alemãs entraram a
local para os canhões, caiu sobre tempo para tirar os estoques de
um comandante, encontrado por aca alimentos, enormes, e armas guar
so. dadas em abrigos de cimento. De
- "Aonde vocês vão?" - per pois, sabendo ser impossível ob
guntou ele ao chefe da bateria. ter outros proveitos do forte, re_
- "Em reforço para o forte, tiraram-se, fazendo-o voar pelos
meu comandante!" ares.
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negaram a ser "veaux" (nome dado para se impor, satisfazendo seu
aos franceses por De Gaulle após orgulho e ambição. 0 outro, para
ter perdido um referendum). Nega fazer da França um satélite do c£
ram seguir a um falso pastor, que munismo de Moscou, deixando os
na verdade era um açougueiro. seus compatriotas nas mãos do
"Ah, este monstro! Fez-nos sanguinário Kremlin.
mais mal que Hitler". Este trecho Durante esse tempo, De GauL
foi retirado do livro, já citado, le participou do assassinato d e
"Escândalo da Resistência", de An um marechal da França, herói, na
dré Figuera. cional, que durante toda a sua vi
No desembarque da Normandia da tinha servido a seu país, en
nós vimos, nas fotos da frente de quanto, também durante toda a Sua
batalha, Churchill e Eisenhower a vida, Thorez o havia traído.
inspecionar, animando suas tropas Este marechal de noventa a-
e arriscándo-se, apesar de toda a nos deveria morrer anos depois,
precaução. na ilha D'yeux, condenado por ha
De Gaulle chegou para desfi ver amado demais seu país e seus
lar nos Campos Eliseus, em Paris, patrícios.
depois que o verdadeiro perigo já Esta foi uma página negra,
havia passado. E depois disso, as^ a mais negra que temos lido...
sistiu, impassível,ao massacre de Thorez, além de vice-presi
dezenas e dezenas de milhares de dente do Conselho, voltou a ser o
seus patrícios. chefe do partido comunista,também
Um pouco mais tarde, por pu. chamado de "partido dos setenta
ro anti-americanismo, mostrando o mil fuzilados"; multiplicado- por
seu verdadeiro "patriotismo", foi sessenta, para mostrar o seu pre
a Moscou buscar Maurice Thorez ,ex. tenso patriotismo.
secretário do partido comunista e Foi a maior droga que apre
102
jetivo "herói". Parece-me novo, e De que isso nos serviu? Pa
novo demais, para ser um ex-resis ra ter uma poltrona no Conselho
tente. É possível que seja "filho de Segurança? Estes traseiros ma
de papai resistente" ou, não se jestosos não podem, como nós, seri
importando com a verdade, siga as tar em simples cadeiras?
ondas, esperando colher, talvez, E para termos o direito de
certos frutos. veto?
Não é um herói! É outra coi^ Podíamos tê-lo tido sem to
sa, disso eu tenho certeza! Você dos os massacres, que eu espero,
nem sabe o que é! não tenham contribuído para nossa
Eu gostaria de ver a juven entrada nesse órgão.
tude da França, e de outros luga A frança, atualmente,já não
res, sentir uma onda de honestid£ é vista como uma grande potência,
de e sinceridade para,poder devas^ economicamente falando.
sar todos esses crimes. A Alemanha foi esmagada, vejn
Olhá-los bem de frente. Afi cida e dividida. Agora,está de pé
nal, ainda não estão tão longe na e altiva. 0 mesmo aconteceu com o
história do país. Muitas testemu Japão e com a Itália, a ponto de
nhas do horror ainda vivem. nos deixar para trás. Aliás, de ja
Olhem a verdade, tal como cordo com o "Expresso Internacio
ela foi e ainda o é, mesmo que s£ nal", de 30 de abril de 1987, a _I
ja desagradável aos olhos, expur tália seria a quinta potência mun
gando as mentiras que vedaram sua dial. Deixar a França para trás é
visão para proteger poderosos. não mais uma hipótese, mas a rea
Que os jovens, deixando t£ lidade. E tudo isso, graças a uma
da a demagogia de lado, procurem turma de dirigentes,superiores em
reestabelecer a verdade sobre es incapacidade administrativa,que a
ses acontecimentos, denunciando a quarenta anos nos governa.
todos as mentiras. 0 dever de vo Não podemos também nos es
cês ê rasgar este véu de falsida quecer dos anos 30 e AO,quando os
de e fazer surgir o que é verda socialistas ocuparam o poder. Pri_
deiro. meiro, a Frente Comum, de 1930 a
NSo se deixem mais enganar, 1936. Depois, a Frente popular.de
e não permitam que se enraize em 36 a 40.
seu íntimo todas as mentiras des
(Nota dos editores: ver li
tes falsos deuses, que não são ojj
vro "Holocausto, Judeu ou Ale
tra coisa, senão lúcifers, que pa_
mão?...", de S.E. Castan, pela
ra melhor se fantasiarem, recolfie
mesma editora.)
ram seus chifres afiados, de on
de ainda jorra o sangue. Durante esses anos, com sua
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deixando-a sem possibilidades de e comunistas, que gritavam:
defesa, nas mSos de Hitler. - "Abaixo Lavai! Abaixo os
Abusados, podendo mesmo di dois anos! Abaixo os militaristas
zer-se "cegos" pelo pacifismo bes^ e o exército!".
ta, não enxergavam que a Alemanha Durante muitos meses ouvi
se rearmaria com ou sem Hitler. mos estes "slogans", que estavam
Durante o tempo em que eles também em todos os tapumes france_
estavam embalados em seus sonhos, ses.
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sos grandes chefSes já lhe tinham Nossos quatrocentos mil em
Enfim, dos três irmãos, só ção., mesmo sadendo que uma parte
restava Louis Renault, que dotava iria para as tropas alemãs. Mas
bou por matá-lo, sem nenhum julga comida, apesar de De gaulle pedir
mento. Quem o condenou foi uma que os agricultores parassem com
Mais uma vez, a França mos forneceu aos alemães cobre, bron
trou-se indigna de ser um gran ze, ferro, e outros materiais ra
bém roubadas. Todavia, este teve mas. Ele tinha uma rede de "paur-
a sorte de não ser assassinado co voyeur" (indivíduos que catam me
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Não contribui com nada boai Eu não ignoro que há homens
to para o seu país e teve uma cojn tentando manter vocês, jovens, na
duta ignóbil.
ignorância, e que vão me reprovar
Apesar de ter sido condena por tentar abrir os seus olhos re
do, a justiça foi indulgente para volvendo túmulos e exumando defun
com ele: cumpriu apenas alguns me tos.
ses de reclusão. Enquanto outros, Mas, e a justiça?
que fizeram bem menos do que ele, E a honra de todas as víti
foram sumariamente exterminados e mas? 0 que foi feito delas?
sem qualquer direito a julgamento. Estas mesmas pessoas dirão
No princípio do desembarque que eu não falei das vítimas dos
Juanovici, auxiliado pelo dinhei nazistas, eu não as mencionei po£
ro que possuía, em grande quanti que, no mundo inteiro, todos o7
dade, chegou a ser chefe de uma dias, se fala nelas.
pretensa resistência, na polícia, Ao contrário das vítimas em
em Paris.
meu depoimento mencionadas.
No entanto, a Louis Renault Vítimas completamente esque
coube o castigo inexorável:a mor cidas... ~~
te I A Juanovici, o perdão e o re Sei apenas que o calvário
conhecimento do país! de ambas as vítimas foi um só.
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