Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Genero Feminino Mebengokre Lea - 1994
Genero Feminino Mebengokre Lea - 1994
ARTIGOS
Vanessa Lea**
*
Este artigo foi apresentado inicialmente na XVIII Reunião da Associação Brasileira de
Antropologia (ABA), em Belo Horizonte, em abril de 1992 e, subseqüentemente, no Centro de
Estudos de Gênero - PAGU, UNICAMP, no dia 26 de maio de 1992. Agradeço a Mariza Corrêa
pelas sugestões para a versão publicada aqui.
As palavras mebengokre, mebiok, mekuni, mebengete, mekurerere, possuem a letra e
em destaque acentuadas com um "til" (~) que, devido a impossibilidade de sua obtensão através
do editor de texto utilizado, acabou ficando sem a sua grafia correta.
**
Departamento de Antropologia - Unicamp.
1
Foi o movimento feminista que deu o impulso para repensar a situação de mulher. Um dos
resultados inevitáveis foi o abandono da crença da unicidade dessa situação que cedeu lugar à
percepção da diversidade de formas de ser mulher. (Cf.: FRANCHETTO, B.; HEILBORN, M.L.
e CAVALCANTI, M.L.V.C.: "Antropologia e Feminismo", IN Perspectivas Antropológicas da
Mulher (no 1). Rio de Janeiro, Zahar. 1980; e MUKHOPADHYAY,C.C. e HIGGINS, P.J.:
"Anthropological studies of women's status revisited: 1977-1987", IN Annual Review of
Anthropology (no 17). 1988.
2
Esta reunião pan-Kayapó, liderada por Payakan, tinha como objetivo sustar o projeto de
construção do complexo hidrelétrico do rio Xingu. Para a cobertura completa desta reunião, veja
CEDI (Centro Ecumênico de Documentação e Informação): Povos Indígenas no Brasil
1987/88/89/90 Aconteceu Especial 18. São Paulo, CEDI. 1991.
3
BAMBERGER, J.: Environment and cultural classification:a study of the Northern Kayapó.
Tese de doutorado, Universidade de Harvard. 1967. pp. 128.
4
BAMBERGER, J.: Op. cit.1967, pp. 162.
5
BAMBERGER, J.: "The myth of matriarchy: why men rule in primitive society", IN In
Women, Culture and Society. M. Rosaldo e L. Lamphere (orgs.). Stanford, University Press.
1974. pp.173.
Obs:As traduções das citações são minhas.
6
DUMONT, L.: Homo hierarchicus. Paris, Gallimard. 1966 (1979).
86
Vanessa Lea
7
O artigo "Mulher", de Franca Ongaro Basaglia (BASAGLIA, F. Ongaro: "Mulher", IN
Enciclopédia Einaudi (no 20): Parentesco. Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. 1989.),
é sugestivo de analogias com a maneira pela qual o índio tem sido pensado.
8
BOURDIEU, P.: Outline of a theory of practice. Cambridge, CUP. 1977.
9
GIDDENS, A.: The constitution of society. Cambridge:Polity. 1984.
10
LÉVI-STRAUSS, C.: "Histoire et ethnologie", IN Annales no 38. 1983.
11
EVANS-PRITCHARD: Witchcraft, oracles and magic among the Azande. Oxford, Clarendon
Press. 1937 (1968).
12
STRATHERN, M. (org.): Dealing with inequality: analysing gender relations in Melanesia
and beyond. Cambridge, CUP. 1987.
87
Gênero feminino
13
STRATHERN, M. (org.): Op. cit. 1987, pp.6.
14
A contrapartida brasileira é a recente obsessão dos etnólogos com a história, que passa a se
constituir o tema dominante por aqui.
15
HERTZ, R.: "La préeminence de la main droite", IN Année Sociologique. 1907.
88
Vanessa Lea
16
Nada ilustra isto melhor do que o debate atual acerca da gravidez após a menopausa; cf. a
Folha de S. Paulo "Menopausa é uma 'injustiça' natural", de José Aristodemo Pinotti, 17/1/94 e
"Gravidez tardia tem debate ético machista", de Lúcia Cristina de Barros, 24/1/94.
17
TURNER, T.: Social structure and political organization among the Northern Kayapó. Tese
de doutorado, Harvard University. 1966.
89
Gênero feminino
18
A distinção entre "jurídico" e "jural" vem da antropologia britânica. A palavra jural
(incorporada na etnologia brasileira) remete a normas e injunções morais em sociedades sem um
aparato jurídico em si.
19
DA MATTA, R.: Um mundo dividido: a estrutura social dos índios Apinayé. Petrópolis,
Vozes. 1976.
20
Héritier (HÉRITIER, F.: "Família", IN Enciclopédia Einaudi (no 20): Parentesco. Lisboa,
Imprensa Nacional/Casa da Moeda. 1989 (1979)), argumenta que a divisão sexual de trabalho é
arbitrária; tem por objetivo tornar um sexo dependente do outro, criando "uma espécie de
contrato de sustento" mútuo.
21
Não há espaço para esclarecer isto aqui. A questão foi explorada em LEA, V.: Nomes e
nekrets: uma concepção de riqueza. Tese de doutoramento, PPGAS, Museu Nacional, Univ.
Federal de Rio de Janeiro (UFRJ). 1986.
90
Vanessa Lea
91
Gênero feminino
23
Para fins comparativos, veja VIVEIROS DE CASTRO, E.: "A fabricação do corpo na
sociedade Xinguana", IN Boletim do Museu Nacional NS 32. 1978.
24
Ainda não foi totalmente esclarecido exatamente o que é esticado. A palavra em mebengokre
é ù, que designa `semente' e tem sido traduzida (por vários etnólogos) como clitóris, que não é
passível de ser esticado. Num mito Mebengokre, o ù de uma mulher chega a arrastar-se pelo
chão. E no mito da aldeia das mulheres, é o vento que engravida as mulheres soprando em seus
ânus (tekre). Os Suyá têm a mesma prática (cf. SEEGER, A.: Nature and society in Central
Brazil: the Suya Indians of Mato Grosso. Cambridge Mass., Harvard Univ. Press. 1981.) do
esticamento dos lábios da vagina e Viveiros de Castro (VIVEIROS DE CASTRO, E.: Araweté:
os deuses canibais. Rio de Janeiro, Zahar/ANPOCS. 1986. ) notou algo semelhante entre os
Araweté; segundo ele, esticam os grandes lábios. Será que existe tal diversidade, ou seja, que os
Mebengokre esticam os pequenos lábios e os Araweté os grandes lábios? Somente novas
informações podem esclarecer este enigma da sexualidade amazônica.
92
Vanessa Lea
25
A falecida missionária do SIl, Mickey Stout, tinha se deparado com esta mesma questão, ou
seja, se as mulheres atribuem o que chamamos de menstruação às antas, sendo que parece algo
que experimentam raramente. Trabalhei com um povo Tupi-Guarani onde parecia ser mesmo
uma ocorrência mensal. Isabelle Vidal Giannini (comunicação pessoal) considera que os
Mebengokre reconhecem a existência da menstruação, embora de curta duração. Na opinião
dela, a hemorragia denominada kukrùt kane é considerada como sendo causada pela ingestão de
coração de anta pelas mulheres.
93
Gênero feminino
26
LÉVI-STRAUSS, C.: Paroles Données. Paris, Plon. 1984.
27
LÉVI-STRAUSS, C.:Op. cit. 1984, pp. 190.
94
Vanessa Lea
28
LEA, V.: Nomes e nekrets: uma concepção de riqueza. Tese de doutoramento, PPGAS,
Museu Nacional, Univ. Federal de Rio de Janeiro (UFRJ). 1986; LEA, V.: "Mebengokre
(Kayapó) onomastics: a facet of Houses as total social facts in Central Brazil", IN Man (Vol.27
no 1). 1992; LEA, V.: "Casas e casas Mebengokre (Jê)", IN Viveiros de Castro, E. e Carneiro da
Cunha, M. (orgs.) Amazônia: Etnologia e História Indígena. São Paulo: NHII/USP/FAPESP.
1993.
29
Posteriormente esta aldeia ficou conhecida pelo nome Mêtùktire. A planta é esquemática; as
habitações atuais são retangulares. Os algarismos e letras usados para identificar as Casas
remetem a um croqui da aldeia de Kràymëprùyaká, situada ao oeste do rio Xingu na década de
30 (LEA, V.: Op. cit. 1986). É a aldeia onde vários dos Mêtùktire com quem trabalhei passaram
sua infância. Os algarismos romanos referem-se às primeiras Casas cujos membros atravessaram
o Xingu, no início do século; as letras identificam as Casas cujos membros chegaram
posteriormente ao lado ocidental do rio.
95
Gênero feminino
30
Cf. TURNER, T.:Op. cit. 1966.
96
Vanessa Lea
11 10 9
12 8
13 O O O 7
14 O XIII XII XI O
O VI XI O 6
15 O XIV IV O 5
O XV XI
16 XVI O
IX 4
O
XVI DO
17 O XVII 3
BO
18 O XVII VI O 2
O XVII VO
19 1
O XVII IV
O
20 XVII IV 31
O O
? IV
21 O IV O 30
I XI O
22 O I I IV
O O 29
O O
23 28
24 27
25 26
97
Gênero feminino
31
Cf. VIDAL, L. (Org.).: Grafismo Indígena. São Paulo, Nobel/FAPESP/EDUSP. 1992.
32
Cf. WASHBURN, D.K. e CROWE, D.W.: Symmetries of Culture: Theory and Practice of
Plane Pattern Analysis. Seattle, University of Washington Press. 1988; GUERDES, P.: Cultura
e o despertar do pensamento geométrico. Maputo, Instituto Superior Pedagógico. 1991.
33
SEEGER, A.: Os índios e nós. Rio de Janeiro, Campus. 1980; SEEGER, A.: Nature and
society in Central Brazil: the Suya Indians of Mato Grosso. Cambridge Mass., Harvard Univ.
Press. 1981.
98
Vanessa Lea
99
Gênero feminino
100
Vanessa Lea
Mebengokre voltam de suas perambulações (treks) prolongadas no mato (quando viviam dos
produtos da caça e da coleta) para, no decorrer dos próximos meses, comer os produtos das
roças.
36
CROCKER, W.H. "Extramarital Sexual Practices of the Ramkokamekra-Canela Indians: an
analysis of socio-cultural factors", IN Native South Americans: Ethnology of the least known
continent, P. Lyon (org.). Boston, Little, Brown & Co. 1974 (1964).
101
Gênero feminino
37
BAMBERGER, J.: Op. cit.1974, pp. 278.
38
BAMBERGER, J.: Op. cit.1974, pp. 278.
39
BAMBERGER, J.: Op. cit.1974, pp. 276.
40
CROCKER, W.H.:Op. cit. 1974 (1964).
41
CROCKER, W. e J.: The Canela: Bonding through kinship, ritual, and sex. Fort Worth, Holt,
Rinehart and Winston. 1994.
102
Vanessa Lea
42
CROCKER, W. e J.:Op. cit. 1994.
43
FRANCHETTO, B.: " 'A vagina é cara e querida': Representações sobre o(s) sexo(s) e a
sexualidade entre os Kuikúro (Karíbe do Alto Xingu, MS)." Trabalho apresentado à XIX
Reunião da ABA. Niterói, Rio de Janeiro. 1994.
103
Gênero feminino
44
SISKIND, J.: To hunt in the morning. London, Oxford Univ. Press. 1973.
45
NIMUENDAJU, C.: The Eastern Timbira. Berkeley e Los Angeles, Univ. of California Press/
New York:Kraus Reprint Co. 1946 (1971).
104
Vanessa Lea
46
Werner (WERNER, D.: "Mulheres Solteiras entre os Mekranotí-Kayapo", IN Anuário
Antropológico. 1983.), que pesquisou os Mekranoti, os Mebengokre do Pará, afirma que o
termo kuprù em mebengokre refere especificamente às mães solteiras. Acho que isto é correto
mas discordo quando ele as compara a prostitutas em nossa sociedade. Entre os Mebengokre,
como entre os Kuikuru do Alto Xingu, qualquer relação sexual com uma amante deve ser
retribuida com um presente. Werner parece desconhecer isto quando insiste na existência de
"Paid sex specialists" (WERNER, D.: "Paid sex specialists among the Mekranoti", IN Journal
of Anthropological Research (Vol.40 no 3). 1985).
47
GREGOR, T.: Mehinaku. Chicago, University Press. 1977.
48
Prõ pràm = esposa/amante fome; mied pràm = marido/amante fome.
105
Gênero feminino
49
Traduzido em termos de ego masculino, isto significa que um homem se casa com a filha de
uma amiga formal.
106
Vanessa Lea
50
Uso o termo "patrilinha" e não "patrilinhagem" porque tais linhas resultam inconscientemente
da aplicação da regra, no decorrer de várias gerações, da transmissão dos amigos formais de um
pai a seus filhos. Esta questão é tratada em mais detalhe em Lea (LEA, V.: "Casa-se do outro
lado: um sistema simulado de aliança referente aos Mebengokre (Jê)", IN Viveiros de Castro
(org.) Estruturas Sociais Ameríndias: estudos da antropologia do parentesco. Rio de Janeiro,
Editora da UFRJ. No prelo).
51
Cf. VIVEIROS DE CASTRO, E.: "Alguns aspectos da afinidade no dravidianato amazônico",
IN Viveiros de Castro e Carneiro da Cunha (orgs.) Amazônia etnologia e história indígena. São
Paulo, EDUSP. 1993.
52
A lógica é essencialmente triádica; um homem dando sua filha não a seu amigo formal mas
aos amigos formais de quem lhe concedeu uma esposa (sendo que cada patrilinha troca cônjuges
com mais duas alternadamente). (Cf. LEA, V.: "Casa-se do outro lado: um sistema simulado de
aliança referente aos Mebengokre (Jê)", IN Viveiros de Castro (org.) Estruturas Sociais
Ameríndias: estudos da antropologia do parentesco. Rio de Janeiro, Editora da UFRJ. No
prelo.)
53
BOURDIEU, P.: Op. cit. 1977.
107
Gênero feminino
108
Vanessa Lea
55
Descola (DESCOLA, P.: La Nature Doméstique. Paris, Ed. de la Maison des Sciences de
l'Homme. 1986) nota que na sociedade Achuar, Equador, as mulheres pescam com anzóis,
embora lá também jamais empreguem arcos e flechas. Oferece uma interpretação interessante,
sugerindo que a pesca com anzol é concebida como uma espécie de coleta e portanto é tratada
como sendo análoga a esta tarefa tradicionalmente feminina.
109
Gênero feminino
56
VIDAL, L.: "A mulher indígena Kayapó" IN Mensageiro (no 63, abril/maio/junho).
Publicação do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Bélem. 1990.
57
MUKHOPADHYAY,C.C. e HIGGINS, P.J.: "Anthropological studies of women's status
revisited: 1977-1987", IN Annual Review of Anthropology (no 17). 1988.
111
Gênero feminino
58
VIDAL, L.: Morte e vida de uma sociedade indígena brasileira. São Paulo, Hucitec. 1977.
pp. 166.
59
É comparável com o choro de carpideira mas não é análogo. As mulheres choram quando
qualquer parente entra ou sai da aldeia mais de alguns dias. Portanto, o choro não se limita aos
funerais. Faz parte, também, de qualquer grande cerimônia quando as mulheres lembram de seus
mortos. Pretendo, em breve, publicar alguns discursos que integram este gênero de fala.
60
VIDAL, L.: Op. cit. 1977. pp. 147, 188.
112
Vanessa Lea
61
GODELIER, M.: "Homem/Mulher", IN Enciclopédia Einaudi (no 20): Parentesco. Lisboa,
Imprensa Nacional - Casa da Moeda. 1989.
113
Gênero feminino
62
BAMBERGER, J.: "The myth of matriarchy: why men rule in primitive society", IN In
Women, Culture and Society. M. Rosaldo e L. Lamphere (orgs.). Stanford, University Press.
1974.
63
GODELIER, M.: Op. cit. 1989. pp. 162
64
MUKHOPADHYAY,C.C. e HIGGINS, P.J.: "Anthropological studies of women's status
revisited: 1977-1987", IN Annual Review of Anthropology (no 17). 1988.
114
Vanessa Lea
Resumo:
115
Gênero feminino
Abstract:
116