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Sumário
Conclusão.............................................................................................................10
Referências.......................................................................................................... 41
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Ocorre que o contexto nacional é complexo – talvez mais do que em outros países que
também discutem reformas educacionais, mas que já estão mais avançados em conquistas
sociais.
Segundo dados do Dieese, dos 209 milhões de brasileiros, 104,3 milhões estariam aptos
à força de trabalho. Desses, somente 90,6 milhões estão ocupados, enquanto 13,7 milhões
buscam um emprego. Das pessoas ocupadas, 57,8 milhões contribuem para a previdência – daí
se percebe o alto grau de informalidade. Em países como o Brasil, com uma imensa
desigualdade econômica e social – onde os 5% mais ricos detêm a mesma renda que os outros
95% –, o cenário da evolução para uma sociedade do conhecimento precisa estar sempre com
muitos pés atrás. A nossa realidade é bastante desafiadora – e triste. Entre as pessoas com 25
anos ou mais, só 15% têm formação superior completa, 26% têm ensino médio completo e 51%
têm apenas o ensino fundamental.
Como um país pode estar confortável numa sociedade do conhecimento com uma
população sem formação, com dificuldade para encontrar ocupação e, consequentemente, de
continuar a aprender para estar constantemente se adaptando às mudanças?
Além de educar pouco (uma vez que acesso não implica em conclusão), o Brasil educa
mal.
No período conhecido como Modernidade (que durou mais ou menos 500 anos) a escola
mudou muito, mas a passos bem lentos. A ideia de uma educação pública e popular surgiu por
volta do século XVIII, mas se estabeleceu na Europa somente no fim do século XIX e início do
século XX, muito influenciada por uma corrente filosófica chamada Iluminismo e, depois, por
um modelo produtivo originado nos Estados Unidos, chamado Fordismo (por causa da fábrica
da Ford, que implantou a primeira linha de montagem de automóveis em série).
De forma geral, a escola ainda é produto do Iluminismo no que se refere à construção
conceitual. Nessa filosofia está a origem da divisão do conhecimento em disciplinas
especializadas (Matemática, História, Geografia, Ciências, Língua...). Tudo é fragmentado,
como nas enciclopédias. E o foco está em aprofundar conceitos, definições e fatos.
Já o funcionamento da escola é herança do Fordismo. Esse modelo de gestão industrial
propunha o controle de todos os processos com o objetivo de produzir um mesmo produto em
grande quantidade. O principal símbolo desse modelo é a esteira da fábrica, com o tempo e o
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LGBT, feminista, negro e ambientalista – todos eles presentes novamente nos dias de hoje, cada
vez mais fortes, ainda que penando para conseguir conquistas e evitar retrocessos nos marcos
legais.
Esse caldo diversificado já está invadindo a escola há algum tempo. Os mesmos grupos
que atuavam de maneira difusa na sociedade passaram a reivindicar voz nas salas de aula e nos
pátios escolares. O currículo virou um campo de batalha. Das representações nas portas de
banheiros aos protestos contra piadas machistas, da necessária discussão sobre gênero à
negação da educação pelo movimento Escola sem Partido, tensões e distensões ocorrem a cada
momento. A tendência é não haver mais hierarquia nem homogeneidade. O modelo “fábrica”,
que já não tinha sentido na escola, agora perde totalmente o seu lugar na educação.
O contexto contemporâneo é de multiculturalismo, ideia proposta pelo sociólogo
jamaicano, radicado em Londres, Stuart Hall (1932-2014):
As velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em
declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto
como um sujeito unificado. A assim chamada ‘crise de identidade’ é vista como parte de um
processo mais amplo de mudança, que está deslocando as estruturas e os processos centrais das
sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma
ancoragem estável no mundo social.
Como não poderia deixar de ser, o núcleo familiar também refletiu todas essas
transformações e alterou-se profundamente. No mundo ocidental, ninguém mais dá o sangue
voluntariamente pela nação, partido político ou ideologia. Segundo o filósofo francês Luc
Ferry, herdeiro da tradição filosófica humanista, a mais recente utopia é o filho. A centralidade
da casa deixa de ser o pai para ser a prole. As decisões passam a ser divididas com todos os
membros da família, que agora se revelam feministas, LGBTs, ambientalistas, entre outras
identidades. Os privilégios de outrora do patriarcado, do bife e do controle remoto, cedem
espaço a uma comuna mais ou menos democrática, sendo referendados pelos rebentos. Surgem
novas formas de designar as relações (namoridos, ficantes, pegantes...), palavras que
representam a transitoriedade e volatilidade das relações, como aponta Zygmunt Bauman
(1925-2017) em seu conceito de modernidade líquida.
As reformas educacionais também vêm sendo altamente influenciadas por esse
contexto. As chamadas habilidades do século XXI focam no autoconhecimento, na empatia e
nas relações interpessoais, visando uma educação em tempos de individualismo e desapego.
Uma crítica muito bem construída ao momento atual é feita pelo fotógrafo norte-americano
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Erick Pickersgill na série Removed, na qual ele retrata amigos e familiares em cenas do
cotidiano com seus dispositivos digitais, porém com os aparelhos retirados das imagens. Vale
a pena também assistir ao TED com o fotógrafo.
Conclusão
É nesse contexto geleia geral (só para lembrar um pouquinho o Tropicalismo dos anos
1960) que a BNCC chega às redes de ensino e às escolas públicas e particulares brasileiras,
elaborada para ser uma referência nacional na construção e nas próximas revisões dos currículos
e das propostas pedagógicas de todas as redes e escolas brasileiras.
Nada disso! A hora é de refletir sobre as propostas contidas nesse documento. E a
primeira tarefa é fazer a leitura crítica do texto. A Base apresenta conceitos e concepções,
propõe formas de organização das unidades temáticas dentro de cada área do conhecimento e
distribui os objetivos de aprendizagem e as habilidades no tempo letivo.
Não podemos perder de vista que o documento é uma referência, e não um manual de
instruções. Se já houve um processo de discussão curricular na sua rede ou na sua escola, ele
precisa ser aprofundado nesse momento.
Sem chance! Agora é que gestores e professores de cada rede e de cada escola terão de
arregaçar as mangas e se preparar para transformar referências, conceitos e expectativas de
aprendizagem em currículo para as redes e em propostas pedagógicas para as escolas. É com
base nas discussões em cada rede, levando em conta cada contexto, que os documentos
curriculares deverão ser redesenhados (ou construídos).
Teorias de currículo
Como vimos, finalizado esse movimentado processo de elaboração da BNCC, chegou a
hora de os educadores, que estão na ponta do processo educativo – ou seja, você, gestor
municipal, com sua equipe técnica; ou você, diretor de escola, com sua equipe gestora e os
professores –, centrarem esforços na construção de um currículo que atenda às expectativas de
aprendizagem da comunidade escolar, tendo agora por base as referências nacionais
obrigatórias.
Mas, se a Base traz os objetivos de aprendizagem que cada criança precisa atingir, não
bastaria transcrevê-los para o documento curricular? Não! Há um longo processo de reflexão
antes de formular ou alterar um currículo seguindo os princípios da Base. O primeiro passo é
alinhar o entendimento em relação à definição de currículo.
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É sempre interessante buscar a origem da palavra e saber como a humanidade foi usando
o termo ao longo do tempo. Currículo tem origem no latim curriculum, que quer dizer "pista de
corrida". Remete, portanto, a caminho, trilha, percurso. Por sua vez, curriculum deriva de
currere, em latim, "correr". Ao considerar o verbo, desloca-se a ênfase da “pista de corrida”
para o ato de “percorrer a pista”.
Trata-se de uma competição? Longe disso! Acompanhe o raciocínio: no dia a dia,
relacionamos currículo a conhecimento. Mas quais são os conhecimentos de que um sujeito
precisa para constituir-se como indivíduo e cidadão, para construir sua identidade e manter sua
subjetividade, realizando-se pessoal, profissional e socialmente? Que caminho ele deve
percorrer pelos conhecimentos e saberes já criados pela humanidade para chegar com
autonomia à própria existência como cidadão de direito?
De acordo com o educador espanhol César Coll, da Universidade de Barcelona, um
currículo tem de responder a seis perguntas básicas:
• O que ensinar?
• Quando ensinar?
• Como ensinar?
• O que avaliar?
• Quando avaliar?
• Como avaliar?
Fazer um currículo é fazer escolhas. E é preciso ter consciência de que todas essas
escolhas são políticas. Ao definir, por exemplo, que ensinar a criança a ter comportamentos
leitores e escritores é importante, estamos optando por formar pessoas capazes de fazer uso
social da leitura e da escrita em seu pleno potencial e, portanto, ser capaz de se tornar uma
pessoa crítica e poder expressar ideias e sentimentos por meio de vários tipos de texto.
Por outro lado, quando se opta pelo ensino focado apenas no sistema alfabético,
ensinando a criança a decifrar letras e sílabas, o máximo que se consegue é formar, quem sabe,
pessoas que leem, mas não compreendem nem as informações mais simples, muito menos as
sutilezas de um bom texto.
Além disso, as escolhas curriculares não ficam restritas aos conteúdo. Um currículo
deve conter também as maneiras mais apropriadas de ensinar cada conteúdo. As aulas são
programadas essencialmente com o professor falando o tempo todo e o aluno somente
escutando ou preveem a liberdade do aluno de fazer intervenções e procurar informações em
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fontes diversas, sem restringir-se ao livro didático? O estudante pode aprender a escrever
juntando letras e copiando textos da lousa e de livros ou pode produzir seus próprios textos,
escrevendo conforme suas hipóteses de escrita, mesmo que não sejam convencionais?
O cardápio de escolhas, como se vê, é vasto. E, para entendê-lo, é preciso estudar um
pouco as teorias curriculares que surgiram ao longo da história.
As teorias do currículo
Como vimos, as escolhas curriculares nunca são isentas. Elas se moldam por interesses,
e esses interesses privilegiam alguns conhecimentos em detrimento de outros. Quando a
educação secundária passou a ser institucionalizada, herdou das universidades do Renascimento
os conteúdos que nelas eram trabalhados – basicamente, Gramática, Retórica, Dialética,
Astronomia, Geometria, Aritmética e Música. O ideal da sociedade dominante, na época, era
formar o ser humano – dar uma educação humanista – colocando os poucos que tinham a chance
de frequentar a escola em contato com as grandes obras literárias e artísticas e com o
pensamento científico produzido até então.
Nas primeiras décadas do século XX, em plena fase de industrialização, esse modelo
passou a ser questionado e foi considerado abstrato e inútil para a vida moderna. Boa parte dos
educadores, na época, pensava: latim, grego e as obras escritas nessas línguas de nada servem
para o profissional de que a indústria e o comércio tanto necessitam.
Então, tudo precisaria mudar nas escolas. Embora houvesse uma preocupação em como
organizar os conteúdos a serem ensinados desde que a escola surgiu, o termo currículo só foi
usado pela primeira vez em 1902, no título de um livro de John Dewey (1859-1952). Porém,
como ele se preocupava em ter uma escola que ajudasse mais na construção da democracia
americana, e não com a economia, suas ideias na área do currículo não repercutiram naquele
momento.
Quem acabou fazendo escola nesse período foi John Franklin Bobbitt (1876-1956). Mas
o que ele propunha de tão diferente?
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Para Bobbitt, currículo era sinônimo de organização. Uma frase dele resume bem seu
pensamento: “A Educação, tal como a usina de fabricação de aço, é um processo de moldagem.”
O objetivo é desenvolver habilidades necessárias para exercer com eficiência as ocupações
profissionais da vida adulta. E a palavra-chave, tal qual nas empresas, é eficiência.
O currículo, portanto, era uma instrução com temas que seriam ensinados pelo professor
e repetidos e memorizados pelos alunos, com base nas habilidades necessárias para o mundo
do trabalho na indústria ou no comércio.
Teorias críticas
· Movimentos estudantis surgem em diversos países da Europa.
· Antigas colônias europeias conquistam a independência.
· A Guerra do Vietnã desagrada ao mundo e a uma boa parcela dos próprios americanos.
· Direitos civis entram na pauta de discussões em diversas esferas.
· Luta contra ditaduras em vários países latino-americanos e no Brasil, em especial.
· Movimento feminista.
· Liberação sexual.
· Contracultura.
Os anos 1960 e 1970 não foram para amadores! Nessa época, vários educadores
começaram a questionar a estrutura da educação vigente. As ideias do inglês Lawrence
Stenhouse (1926-1982) fizeram uma transição entre as teorias acríticas e as críticas. Stenhouse
trouxe outra perspectiva para o currículo: para ele, currículo deveria ser apenas uma “pauta
ordenada” da prática de ensino, e não uma lista de conteúdos a serem desenvolvidos. Isso
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porque, para ele, sempre haveria um descompasso entre as ideias de quem formulava o currículo
– os especialistas – e de quem tinha de aplicá-lo – o professor.
Para Stenhouse, o professor era a pessoa que mais conhecia as necessidades dos alunos
e as questões didáticas que enfrentava no dia a dia. Por isso, cada sala de aula deveria ser um
laboratório, no qual a proposta curricular seria testada na prática, e o docente teria toda a
liberdade de adaptar e fazer os ajustes de acordo com o contexto escolar e sua experiência de
educador. O professor assumiria, assim, o papel de investigador de práticas pedagógicas (ideia
retomada, na década de 1990, pelo educador português Antonio Nóvoa, da Universidade de
Lisboa, e pela educadora espanhola Isabel Solé, da Universidade de Barcelona) e seria o
responsável pelas inovações didáticas e pelo sucesso de cada escola. Com Stenhouse, o
professor tornava-se um coautor do currículo escolar.
Mas não foi somente Stenhouse que se incomodou com o currículo acrítico e tradicional.
Essa inquietação tomou também outros educadores, em vários países:
• Na Inglaterra também, Michael Young (1915-2002) elaborou a Nova Sociologia
da Educação, um embasamento para desenhar um currículo com conteúdos contextualizados
com o entorno em que se localiza a escola e onde moram os alunos e com os fenômenos
cotidianos, atendendo à demanda da comunidade em questão.
• Na França, Louis Althusser (1918-1990) falava sobre ideologia e como as
instituições a usavam para a manutenção do status quo capitalista, dentre elas a escola, fazendo
esse papel por meio do currículo. Junto com seu conterrâneo Pierre Bourdieu (1930-2002),
Althusser defendia que as crianças das classes dominadas deviam ter na escola as mesmas
condições proporcionadas na família para as crianças das classes dominantes.
• Na Alemanha, Edmund Husserl (1859-1938) defendia que o currículo não
deveria ser constituído de fatos nem de conceitos teóricos e abstratos, mas de questionamento
dos fatos do dia a dia, buscando novos significados para a vida cotidiana.
• No Brasil, Anísio Teixeira (1900-1971) e Paulo Freire (1921-1997), no
movimento Escola Nova, também queriam mudanças, como veremos mais adiante.
As teorias críticas, basicamente, desconfiavam do que já estava estabelecido e, mais do
que isso, culpavam as teorias tradicionais pelas injustiças, guerras e desigualdades sociais. Se
para as teorias tradicionais o status quo era uma referência inquestionável, para as teorias
críticas os modelos tidos como “naturais” precisavam ser questionados e transformados
radicalmente.
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Uma das teorias críticas que mais fez sucesso foi a do professor Michael Appl e, da
Faculdade de Educação da Universidade Wisconsin-Madison. Ele propôs a análise marxista dos
currículos tradicionais, constatando que o currículo seleciona os conhecimentos considerados
verdadeiros por quem está no poder – ou seja, as classes dominantes do mundo capitalista e
neoliberal. Nesse sentido, o conhecimento dito popular não é levado em consideração. Para
transformar o currículo tradicional, segundo Apple, é preciso questionar suas conexões com as
relações de poder:
• Como a divisão da sociedade afeta o currículo?
• Como o currículo considera as relações entre o conhecimento e as pessoas, de
forma a reproduzir a divisão social?
• Quais grupos se beneficiam e quais são prejudicados de acordo com a
organização do currículo?
• Como se formam resistências e oposições ao currículo oficial?
No Brasil, Paulo Freire foi o principal teórico a propor uma visão crítica do currículo,
expressa em sua obra mais famosa, o livro Pedagogia do Oprimido (60. ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 2016). Freire vai direto ao ponto ao teorizar como deveriam ser a educação e a
pedagogia. Para criticar o currículo tradicional, ele o associa à imagem de uma “educação
bancária”. Nela, o conhecimento se confunde com o ato de um depósito bancário, em alusão a
algo que está fora da pessoa que será educada. O currículo tradicional, para Freire, é
desconectado da vida dessas pessoas. Na “educação bancária”, o professor é sempre o sujeito
ativo e o aluno, o passivo. Em contraposição, Freire propõe uma educação problematizadora,
em cuja base esteja uma compreensão diferente do significado de “conhecer”. Ele defende que
conhecimento está sempre ligado a uma ação dirigida para alguma coisa. Não se conhece,
simplesmente. Conhece-se com alguma intenção. Como exemplo, vale a pena assistir a este
vídeo, feito em 1963, sobre a experiência de alfabetização de adultos em Angicos, no sertão do
Rio Grande do Norte.
Além disso, o ato de conhecer nunca é isolado ou individual; ele envolve uma relação
entre professor e aluno, baseada no diálogo e na interação. Nesse sentido, Freire propõe que o
conteúdo programático do currículo seja definido sempre levando em consideração a realidade,
a experiência e o interesse dos alunos. E que essa definição nunca seja imposta, mas sempre
tomada em conjunto.
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E como formar, então, um aluno crítico? As teorias críticas não invalidam todos os
conteúdos importantes das teorias tradicionais, mas dão a eles novas perspectivas: que tal se
cada objeto de ensino fosse problematizado, fazendo com que o aluno fosse atrás do
conhecimento necessário para solucionar um dilema ou uma questão que tivesse alguma relação
com a sua realidade, com assuntos de seu interesse? Assim, além de aprender, esse aluno estaria
tendo condições de intervir na realidade, questionando os porquês e criando novas maneiras de
aprender.
Ainda que as teorias críticas tenham suas diferenças entre si, todas elas consideram a
relevância do chamado currículo oculto, uma força não explícita da educação tradicional. O
currículo oculto é “constituído por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer
parte do currículo oficial, explícito, contribuem, de forma implícita, para aprendizagens sociais
relevantes”. Estamos falando de “atitudes, comportamentos, valores e orientações que
permitem que crianças e jovens se ajustem da forma mais conveniente às estruturas e às pautas
de funcionamento, consideradas injustas e antidemocráticas e, portanto, indesejáveis, da
sociedade capitalista”. Em geral, o currículo oculto é o responsável por fomentar o
conformismo, a obediência e o individualismo, quando sugestões que vêm dos alunos para
mudanças na escola não são consideradas, os estudantes mais quietos ganham nota por bom
comportamento e são privilegiadas tarefas individuais em detrimento das coletivas.
Por fim, perceba que ele também ensina sobre as dimensões de gênero, sexualidade ou
raça, quando há papéis predefinidos para meninos e meninas, quando são reprimidas ou
desconsideradas outras maneiras de afeto que não a homem-mulher e se aceita com mais
naturalidade o baixo desempenho de um estudante negro do que o de um branco. O currículo
oculto se apresenta também por meio da organização do ambiente escolar, da rigidez da sala de
aula, da organização do tempo, das relações entre professores e alunos, entre funcionários e
alunos, entre alunos e alunos.
Teorias pós-críticas
Mas o mundo continuou a mudar, e novas ideias surgiram para tentar mudar a concepção
de currículo escolar. Assim como as teorias críticas, as pós-críticas também consideravam o
currículo como um espaço de poder e de luta e fruto de uma construção social. As teorias pós-
críticas ganharam corpo em publicações do início do século XXI. Nelas, o aluno continua no
centro das atenções da escola, e é para ele que o currículo deve se voltar cada vez mais.
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Agora que já estamos craques em currículo, vamos à estrutura da BNCC? Vamos saber
como ela foi organizada para se tornar uma referência nacional. Como já dissemos, a Base tem
um caráter normativo – ou seja, embora tenha sido publicada em forma de resolução, tem a
mesma força de uma lei: precisa ser cumprida, e não adianta alegar desconhecimento para não
segui-la!
De agora em diante, todos os currículos e materiais didáticos elaborados neste país,
todas as políticas de formação de educadores, todos os critérios para avaliações em larga escala,
os conteúdos dos concursos públicos e os currículos estaduais e municipais deverão se abrigar
embaixo desse grande guarda-chuva que é a BNCC. Ela traz listas de aprendizagens essenciais
para assegurar que qualquer brasileirinho ou brasileirinha tenha seus direitos de aprendizagem
garantidos, não importa onde estude.
Isso significa que tanto na escola municipal de Tepequém, no norte de Roraima, como
na de Chuí, no sul do Rio Grande do Sul; tanto numa escola particular de João Pessoa, ou de
Rio Branco, no Acre, os meninos e as meninas vão aprender a mesma coisa, se estiverem no
mesmo ano ou série?
Sim! Eles deverão aprender o mesmo conteúdo, mas não necessariamente da mesma
forma: cada aprendizagem deverá ser contextualizada de acordo com a comunidade e a cultura
locais. Cada lugar vai decidir como é melhor ensinar cálculo mental, por exemplo, se contando
figurinhas ou sementes de árvores, mas as aprendizagens serão as mesmas.
É bom lembrar que a ideia de ter uma base curricular comum não surgiu do nada! A sua
semente já estava plantada na Constituição de 1988, no artigo 210:
Título VIII
Da Ordem Social
Capítulo III
Da Educação, da Cultura e do Desporto
Seção I
Da Educação
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Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a
assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e
regionais.
§ 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental.
§ 2º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às
comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de
aprendizagem.
Depois, seguindo essas determinações constitucionais, a ideia de uma Base Nacional
Comum reapareceu em vários documentos orientadores da política educacional brasileira.
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei n. 9394/1996):
TÍTULO IV
Da organização da educação nacional
Artigo 9º
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A BNCC orientará os currículos dos estados, que serão elaborados pelas redes estaduais
e pelos Conselhos Estaduais de Educação. Pretende-se que todos os entes da federação
(Governo Federal, Estadual e Municipal) atuem em um regime de colaboração para a
elaboração de suas propostas curriculares.
Competências e Habilidades
Uma das grandes mudanças que a BNCC traz é a proposta de formar os jovens com base
em Competências e Habilidades. Até agora, a maioria dos cursos embasava o currículo em
conhecimentos traduzidos em conceitos, definições, fatos e outros modelos de informações
estruturadas.
Mas o que é competência? E o que é habilidade? Só consigo pensar no que as pessoas
costumam dizer: “Competência entrou com força no vocabulário dos educadores na década de
1990: o texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) propunha que o
currículo escolar do Ensino Médio fosse orientado para o desenvolvimento de competências
fundamentais para o exercício da cidadania. Competência pode ser definida como o conjunto
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Educação Infantil
Vamos começar pela Educação Infantil. Esse segmento está baseado em dois eixos
estruturantes: o das interações e o das brincadeiras. Entende-se que é por meio da relação com
outras crianças e com os adultos que a criança constrói conhecimentos e se apropria deles, o
que leva ao seu desenvolvimento e à sua socialização e aprendizagem.
De acordo com a BNCC, as crianças de 0 a 5 anos têm os seguintes direitos de
aprendizagem e desenvolvimento:
1) Conviver com outras crianças e adultos, em pequenos e grandes grupos, utilizando
diferentes linguagens, ampliando o conhecimento de si e do outro, o respeito em relação à
cultura e às diferenças entre as pessoas.
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Ensino Fundamental
O Ensino Fundamental permanece com a sua organização em duas etapas – os Anos
Iniciais, que vão do 1o ao 5º ano, e os Anos Finais, do 6º ao 9º ano. A construção do currículo
deverá ser pautada em cinco áreas do conhecimento, que se subdividem em nove componentes
curriculares. As áreas do conhecimento, e respectivos componentes, são:
1. Matemática: Matemática
2. Linguagens: Língua Portuguesa, Educação Física, Arte e Língua Inglesa
3. Ciências Humanas: História e Geografia
4. Ciências da Natureza: Ciências
5. Ensino Religioso: Ensino Religioso
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Para poder refletir sobre qualquer documento curricular, é importante saber de onde ele
vem. Apesar de a BNCC não apresentar bibliografia, a leitura do documento dá pistas sobre as
teorias que a sustentam. Nos textos de introdução, fica evidente que a ideia de educação baseada
no ensino de conceitos dá lugar ao desenvolvimento de competências e habilidades. Na prática,
isso significa que o substantivo dá lugar ao verbo.
Para entender essa mudança, temos que estudar textos relacionados, por exemplo, à
Taxonomia de Bloom, uma proposta de organização dos processos cognitivos elaborada em
1948, por um grupo de psicólogos norte-americanos, e revisada nos anos 1990. Seu objetivo foi
criar um quadro de referência para que as avaliações de conhecimento pudessem ser mais bem
classificadas e comunicadas. Enfim, é um jeito de saber se as crianças estão aprendendo a lidar
com o que se apresenta e ser criativas ou se estão apenas decorando definições.
Basicamente, dado um determinado conhecimento, a taxonomia permite localizar a
capacidade que o estudante tem, numa escala crescente, de lembrar, entender, aplicar, analisar,
avaliar e criar. De certa forma, essa lógica é retomada na progressão dos objetivos de
aprendizagem (Educação Infantil) e do conjunto de habilidades (Ensino
Fundamental) estabelecidos na BNCC. Infelizmente, os principais livros sobre o tema não estão
traduzidos para o português, mas artigos sobre o assunto podem ser encontrados no Scielo
(sclielo.br). Em inglês, a leitura obrigatória é o livro A taxonomy for learning, teaching and
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Com estratégias como essas, o que se pretende é que o aluno trabalhe habilidades
mediadas por um conteúdo. Com a articulação dessas habilidades, espera-se que ele tenha
condições de construir competências para resolver problemas reais que lhe forem apresentados.
Outra mudança necessária é que o conceito fechado de disciplina dê lugar à ideia de
componente curricular, mais flexível e solidária para uma resolução conjunta de problemas.
Pense bem, você consegue imaginar um problema do nosso dia a dia que tenha uma solução
única e que envolva apenas uma área de conhecimento? É difícil, não? A vida é sempre mais
complicada do que imaginamos. Por isso, os conteúdos de aprendizagem, na BNCC, estão
diluídos em grandes áreas. No Ensino Fundamental, a área de Linguagens contempla Língua
Portuguesa, Língua Inglesa, Educação Física e Arte. A área de Ciências Humanas engloba
Geografia e História. O quadro se completa com as áreas de Matemática, Ciências da Natureza
e Ensino Religioso. A intenção dessa organização é justamente evitar a especialização.
De fato, a ideia de disciplina, formulada no século XIX, remete a uma caixa fechada, da
qual o professor saca uma sequência de prescrições para planejar suas aulas, sem muita
conversa com o colega do lado. A ideia de componente curricular – aquele que compõe – remete
a um corpo mais poroso e flexível, que se integra aos demais. A resolução de problemas por
meio da mobilização de saberes de diversas áreas em articulação passa a ser a tônica. Essa
organicidade não está muito explícita na BNCC, mas é interessante que você discuta isso com
seus pares nas reuniões pedagógicas.
A seguir, apresentaremos algumas das questões polêmicas que atravessaram o processo
de construção da Base. Essas questões podem ser levadas para a sua escola como pontos de
discussão e reflexão com sua equipe docente, para serem trabalhadas em reuniões e encontros
formativos.
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Vamos também relembrar os objetivos do currículo escolar, para saber como poderemos
revê-lo para implementar a BNCC objetivos do currículo escolar:
• Alinhar a concepção de aprendizagem da escola com cada área de conhecimento.
• Alinhar as práticas ao Projeto Político-Pedagógico.
• Definir os conteúdos escolares e o que será priorizado e aprofundado.
• Promover a interatividade entre os componentes curriculares.
• Tornar a linguagem acessível a todos os participantes de todas as áreas.
• Organizar as situações de aprendizagem.
• Decidir a metodologia, as tecnologias necessárias e escolher os materiais mais
adequados para a implementação do currículo
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Para que a Base seja efetivamente utilizada, a primeira coisa de que você vai precisar é
da adesão de todo mundo! Todos os professores, de todas as áreas, especialistas de fora que
porventura trabalhem na escola, monitores dos alunos.
Que tal pedir a todos os convocados para a reunião de planejamento que leiam a BNCC
antes da reunião, pelo menos a introdução e a parte específica da área de cada um?
Uma boa discussão inicial é sobre a questão das competências, que pode ter alguma
resistência, principalmente dos professore estão acostumados a listar, nos objetivos dos planos
de aula, pura e simplesmente os conceitos básicos da disciplina. Porém como já vimos, o
importante não é saber de cor uma definição, mas saber usar os conceitos e os conhecimentos
em situ diversas.
Você pode chamar a atenção dos professores para o texto da BNCC: “Notem como há
uma preponderância de verbos, interpretar, comparar, inferir, produzir etc.” Isso não é por
acaso, nem é novidade. Os mais antigos hão de se lembrar de conteúdos das faculdades de
Pedagogia que foram revisitados na elaboração da BNCC:
1) A Taxonomia de Bloom, uma proposta de organização dos processos cognitivos,
organizada em 1948 por um grupo de psicólogos norte-americanos e revisada nos anos 1990,
com o objetivo de criar um quadro de referência para que as avaliações de conhecimento
pudessem ser mais bem classificadas e comunicadas. Enfim, um jeito de saber se os alunos e as
alunas aprendendo a ser autônomos e criativos ou apenas decorando definições. Um bom
exercício é comparar os verbos usados na Taxonomia de Bloom com os que são usados na
BNCC: Quantos se repetem? Quais são os que diferem?
2) O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova – ou Manifesto da Escola Nova,
como ficou conhecido –, de 1932. Não se a com a data – o conteúdo parece ter sido escrito este
ano. Esse documento tem um teor mais político, e dá pistas para uma educação voltada ao
protagonismo do aluno, já defendida naquela época. Um bom exercício é comparar o que diz
esse documento com competências básicas que vimos.
Vamos ver aqui dois exemplos de práticas em sala de aula, de Língua Portuguesa e
Matemática, que podem ser aplicadas no Ensino Fundamental, retiradas do livro A Base
Nacional Comum Curricular na prática da gestão escolar e pedagógica (organizado por Tereza
Perez e publicado pela editora Moderna). Com base nos quadros apresentados na publicação,
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2-Aproveitar diferentes referências que as crianças e os jovens trazem de seu dia a dia
(conhecimento prévio)
Competência geral – Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e
apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhes possibilitem entender as relações
próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu
projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.
4-Assegurar que todos os alunos estejam tranquilos para se expor e que tenham
persistência na busca de soluções.
Competência geral – Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade,
flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos,
democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.
5. Pedir aos estudantes que antecipem possíveis soluções com base nas vivências de
cada um.
Competência geral – Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e
apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhes possibilitem entender as relações
próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu
projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.
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8. Proporcionar situações em que a literatura possa ser identificada por seu potencial
estético, transformador e humanizador.
Competências gerais – Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente
construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade,
continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e
inclusiva e valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às
mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural.
9. Gerar situações em que os alunos possam escolher textos de acordo com seus
interesses pessoais.
Competências gerais – Conhecer-se, apreciar-se e cuidar da saúde física e emocional,
compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com
autocrítica e capacidade para lidar com elas e valorizar e fruir as diversas manifestações
artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da
produção artístico-cultural.
Depois dessa discussão sobre a parte introdutória da BNCC, segue uma sugestão de
algumas etapas que podem ser úteis no planejamento da semana – ou, caso a sua semana
pedagógica tenha apenas um, dois ou três dias, pode distribuir atividades ao longo dos encontros
formativos.
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Referências
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