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Era uma vez uma cigarra, que todos os dias, durante toda a sua existência,
cantara sobre um lírio, e encantava a todos. -Seu melodioso som parecia vir dos deuses. -
Diziam alguns. – Ou era a voz de querubins. -Diziam outros. Não se sabia se aprendera através
de estudo, ou se nascera assim, com um dom inexplicável. O fato é que todos se emocionavam
ao ouvi-la. Certo dia, entre um som e outro, enquanto descansava a garganta e o pequeno
violino que carregava, ela viu lá embaixo, um grupo de formigas, andando alinhadas,
roboticamente, cumprindo suas funções habituais. As formigas lhe cumprimentaram, algumas,
de tão atarefadas que estavam mal lhe dirigiram o olhar. A cigarra, feliz que ficara de ver as
pequeninas criaturas, entoou seu canto com ainda mais força. E assim seguiram os dias,
formigas trabalhando, enquanto dona cigarra entoava seu canto.
O outono passou depressa e dona Cigarra cantante mal viu os dias que se
esvaíram dando espaço ao inverno. Continuava fazendo aquilo para o qual havia nascido.
Cumprindo sua missão. Então a neve desceu sobre o jardim, com toda a força que só a
natureza possui, e congelou cada trecho, cada rama, cada córrego. As pequeninas estradas,
abertas pelas formigas, com suas patinhas mínimas e rápidas, já não existiam. A boca do
formigueiro estava fechada. Lá dentro, aquecidas por uma pequenina lareira, alimentada por
galinhos que as valentes funcionárias haviam buscado durante os meses anteriores, ardia
aquecendo as centenas de moradoras. Ao fundo, em um trono de folhas secas, imponente, a
rainha comandava suas súditas. As mesmas súditas que por uma janelinha mínima, avistaram
longe, entre os galhos molhados e tombados pela temperatura extremamente mínima, a dona
cigarra. Estava esticada e trêmula. Pálida e silenciosa. De sua garganta não mais saía som
algum. Esperava sem luta, pelo fim.