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NOTA TÉCNICA PARA A ORGANIZAÇÃO DA REDE DE

ATENÇÃO À SAÚDE COM FOCO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE E ATENÇÃO


AMBULATORIAL ESPECIALIZADA

SAÚDE DA PESSOA IDOSA

AUTORES E COLABORADORES
Edgar Nunes de Moraes
Flávia Lanna de Moraes

Marco Antônio Bragança de Matos


Priscila Rodrigues Rabelo Lopes
Eliane Regina da Veiga Chomatas
Leane de Carvalho Machado
Rúbia Pereira Barra

2019
© 2019 Ministério da Saúde. Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein
Esta obra é disponibilizada nos termos da Licença Creative Commons – Atribuição – Não Comercial –
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desta
obra, desde que citada a fonte. EQUIPE DE TRABALHO

Coordenação e Revisão Final:


Marco Antônio Bragança de Matos Priscila Rodrigues Rabelo
Lopes
Elaboração Técnica - Especialidade: Edgar Nunes de Moraes
Flávia Lanna de Moraes

ELABORAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E INFORMAÇÕES: Elaboração Técnica - Organização da assistência:


Marco Antônio Bragança de Matos
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Priscila Rodrigues Rabelo Lopes
Secretaria de Atenção Primária à Saúde
Eliane Regina da Veiga Chomatas
Departamento de Saúde da Família
Leane de Carvalho Machado
Esplanada dos Ministérios, bloco G
Rúbia Pereira Barra
Ed. Sede MS – 7º andar
SOCIEDADE BENEFICENTE ISRAELITA BRASILEIRA
CEP: 70.058-900 – Brasília DF
ALBERT EINSTEIN
Fone: (61) 3315-9031
Instituto Israelita de Responsabilidade Social
Site: aps.saude.gov.br
Av. Brigadeiro Faria Lima, 1.188 – 3º andar
CEP: 01451-001 – São Paulo – SP
Fone: (11) 2151-4573
Site: www.einstein.br
Publicação financiada pelo Projeto de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009), através da
Portaria nº 3.362, de 8 de dezembro de 2017 - NOTA TÉCNICA: Nº 29/2018-CGGAB/DAB/SAS/MS.

Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein


NOTA TÉCNICA PARA A ORGANIZAÇÃO DA REDE DE ATENÇÃO À SAÚDE COM FOCO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
E ATENÇÃO AMBULATORIAL ESPECIALIZADA - SAÚDE DA PESSOA IDOSA. /Sociedade Beneficente Israelita Brasileira
Albert Einstein. São Paulo: Hospital Israelita Albert Einstein: Ministério da Saúde, 2019. .
72 p.: il.

1. Idoso 2. Saúde do Idoso 3. Rede de Atenção à Pessoa Idosa 4. Idoso Frágil I. Sociedade Beneficente Israelita
Brasileira Albert Einstein – SBIBAE.

APRESENTAÇÃO
(SERÁ ENCAMINHADO)
PREFÁCIO
(SERÁ ENCAMINHADO)

4 SAÚDE
LISTA DE ACRÔNIMOS E SIGLAS
AAE Atenção Ambulatorial Especializada
AAVD atividades avançadas de vida diária
ABVD atividades básicas de vida diária
AGA avaliação geriátrica ampla
AIVD atividades instrumentais de vida diária
AMI avaliação multidimensional do idoso
APS Atenção Primária à Saúde
AVD atividades de vida diária
BPC Benefício de Prestação Continuada
ESF Estratégia Saúde da Família
GFI Groningen Frailty Indicator
ILPI Instituição de Longa Permanência para Idosos
IVCF-20 Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20
MACC Modelo de Atenção às Condições Crônicas
MAO medicamento apropriado omitido
MPI medicamento potencialmente inapropriado
NASF Núcleo de Apoio à Saúde da Família
RAS Redes de Atenção à Saúde
SBQ Sherbrooke Postal Questionnaire
SUAS Sistema Único de Assistência Social
SUS Sistema Único de Saúde
TFI Tilburg Frailty Indicator
UBS Unidade Básica de Saúde
VES-13 Vulnerable Elders Survey-13

SUMÁRIO
◼ INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9

◼O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

◼ OBJETIVO .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ..
. . . . . 15

◼ CONHECENDO A PESSOA E A POPULAÇÃO IDOSA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

◼A ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CLÍNICO-FUNCIONAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .22

◼ ORGANIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .26

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 5


◼ PRINCÍPIOS DA ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DA PESSOA IDOSA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .26

◼O FLUXO DA ATENÇÃO AO IDOSO NA REDE DE ATENÇÃO SAÚDE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .28

FASE 1: CADASTRO DO IDOSO RESIDENTE NO TERRITÓRIO DE ABRANGÊNCIA DA EQUIPE . . . .30

FASE 2: CAPTAÇÃO DO IDOSO PARA O ACOMPANHAMENTO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .30

FASE 3: AVALIAÇÃO MULTIPROFISSIONAL E INTERDISCIPLINAR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .30

FASE 4: ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CLÍNICO-FUNCIONAL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

FASE 5: ACOMPANHAMENTO LONGITUDINAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

◼A GESTÃO DA CONDIÇÃO DE SAÚDE DO IDOSO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA DA SAÚDE. . . . . . . . . .32

◼ AÇÕES PREVENTIVAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33

1. COGNIÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33

2. HUMOR/COMPORTAMENTO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33

3. MOBILIDADE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33

3.1 ALCANCE, PREENSÃO E PINÇA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33

3.2 CAPACIDADE AERÓBIA/MUSCULAR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .34

3.3 MARCHA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .34

3.4 CONTINÊNCIA ESFINCTERIANA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .35

4. COMUNICAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .35

4.1 VISÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .35

4.2 AUDIÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .35

◼ AÇÕES DE CUIDADO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .36

A GESTÃO DA SAÚDE DO IDOSO DEPENDE DE SEU ESTRATO CLÍNICO-FUNCIONAL. . . . . . . . . .36

◼A GESTÃO DA CONDIÇÃO DE SAÚDE DO IDOSO NA ATENÇÃO AMBULATORIAL ESPECIALIZADA 41

◼ MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .48

◼ PAINEL DE INDICADORES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .48

◼ REFERÊNCIAS .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ..
. . .50

◼ ANEXOS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .52

6 SAÚDE
INTRODUÇÃO
No Brasil, estima-se que a população com 60 anos ou mais seja de 30 milhões de pessoas,
representando cerca de 14% da população geral (210 milhões habitantes). É o segmento
populacional com maior taxa de crescimento – acima de 4% ao ano –, passando de 14,2
milhões, em 2000, para 19,6 milhões, em 2010, e devendo atingir 41,5 milhões, em 2030, e
73,5 milhões, em 2060. Essa é uma consequência da rápida e contínua queda da
fecundidade no país, e da queda da mortalidade em todas as idades. Espera-se, para os
próximos 10 anos, o incremento médio de mais de 1,0 milhão de idosos anualmente.
Esse acelerado envelhecimento da população brasileira não deve ser considerado
necessariamente um problema, mas exige atenção e traz importantes desafios para a
sociedade.[1] No idoso, as condições crônicas de saúde são mais prevalentes, exigindo
respostas capazes não somente de resolver esses agravos, mas de manter ou recuperar sua
autonomia e independência, com qualidade, resolutividade e custo-eficácia.
Segundo Mendes,[2] o termo “condição de saúde” remete a circunstâncias na vida das
pessoas. Com um curso mais ou menos longo ou permanente, as condições de saúde são
consideradas crônicas e devem ser manejadas de forma proativa, contínua e integrada pelo
sistema de atenção à saúde, pelos profissionais e pelas pessoas usuárias, para seu controle
efetivo, eficiente e com qualidade. Inclui-se, nesse conceito, a manutenção da saúde por
ciclos de vida. Assim, a senicultura, ciclo de vida da população idosa, deve ser abordada de
acordo com a lógica das condições crônicas.[3]
A organização da Atenção à Saúde da Pessoa Idosa na lógica das Redes de Atenção à Saúde
(RAS) representa a melhor estratégia de resposta a essa situação de rápido envelhecimento
da população, aliada ao aumento da longevidade e à maior carga de doenças crônicas e,
particularmente, de incapacidades funcionais.
A RAS da pessoa idosa nada mais é do que o conjunto de respostas sociais deliberadas às
necessidades de saúde da população idosa, capazes de manter ou recuperar sua autonomia
e independência, com qualidade, resolutividade e custo-eficácia.
Este documento apresenta as recomendações para organização da RAS da pessoa idosa,
com foco nos processos integrados da Atenção Primária à Saúde (APS) e da Atenção
Ambulatorial Especializada (AAE), de acordo com o Modelo de Atenção às Condições
Crônicas (MACC).

O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO
A estruturação da RAS da pessoa idosa tem como ponto de partida a definição clara do que
é saúde do idoso, que não significa somente ausência de doenças. As doenças são mais
frequentes nesta faixa etária, mas nem sempre estão associadas à dependência funcional. [4]
Envelhecer sem doença crônica é mais uma exceção do que a regra. Indivíduos com as
mesmas doenças podem ter capacidades funcionais absolutamente distintas um do outro.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 7


Esta é uma informação que não agrega possibilidades de mudança e é por esse motivo
que foi introduzido um novo marcador para a saúde do idoso: a capacidade funcional.
O conceito de saúde do idoso está fortemente ancorado na “capacidade individual de
satisfação de suas necessidades biopsicossociais, independentemente da idade ou da
presença de doenças”.[5] Essa capacidade funcional resulta da combinação entre fatores
intrínsecos – sua capacidade física e mental (incluindo o componente psicológico) – e
extrínsecos (ambientais e contextuais), levando a uma marcante e progressiva
heterogeneidade entre os indivíduos idosos ao longo do processo de envelhecimento. A
fronteira entre os conceitos de saúde, doença, dependência e incapacidade deve estar bem
definida.
O envelhecimento fisiológico, ou senescência, reduz a vitalidade do indivíduo, definida
como capacidade de defesa contra as agressões dos meios interno e externo, gerando
maior vulnerabilidade dessa população. Essa redução fisiológica da vitalidade atribuída ao
envelhecimento normal, por si só, é insuficiente para gerar incapacidades ou dependência
funcional.[6] Por sua vez, o envelhecimento patológico, consequência de uma ou mais
doenças, e agravado por barreiras relacionadas aos fatores ambientais e contextuais,
compromete, de forma mais intensa, a vitalidade do indivíduo e está associado ao declínio
funcional.[7]
A saúde da pessoa idosa deve ser compreendida nessa multidimensionalidade de fatores
determinantes, assim como as intervenções capazes de recuperar ou manter a sua
autonomia e independência (Figura 1).

8 SAÚDE
SUPORTE Sistema nervoso central LAZER
FAMILIAR

Sistema
musculoesquelético Nutrição

Sistema
endócrino
metabólico
COGNIÇÃO

Sistema
gastrointestinal HUMOR MOBILIDADE
Funcionalidade Sistema
AAVD geniturinário
AIVD
ABVD
Sono Saúde
bucal
COMUNICAÇÃO

Sistema Pele
respiratório e anexos

SUPORTE SEGURANÇA
Sistema
SOCIAL AMBIENTAL
cardiovascular

Fonte: Moraes.[8]
AAVD: atividades avançadas de vida diária; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; ABVD: atividades básicas de vida diária.
Figura 1. Multidimensionalidade da saúde do idoso.

As necessidades biopsicossociais se referem àquelas tarefas fundamentais para a gestão da própria vida e do
autocuidado, denominadas atividades de vida diária (AVD), que podem ser básicas (ABVD), instrumentais (AIVD) ou
avançadas (AAVD) (Quadro 1).

Quadro 1. Atividades de vida diária.


ABVD Tarefas relacionadas ao autocuidado, como tomar banho sozinho, vestir-se sem ajuda, usar o
banheiro, deitar-se e sair da cama sozinho (transferência), controle de esfíncter (urina e fezes) e
alimentar-se sozinho[9,10]
AIVD Tarefas necessárias para o cuidado com o domicílio ou atividades domésticas, como o preparo das
refeições, controle do dinheiro e do pagamento de contas, tomar os remédios na dose e horário
correto, lavar e passar a roupa, uso do telefone, arrumar a casa e fazer pequenos trabalhos
domésticos, fazer compras e sair de casa sozinho para lugares distantes[11]
AAVD Atividades mais complexas, relacionadas à integração social, como as atividades produtivas,
recreativas e de participação social[5]
ABVD: atividades básicas de vida diária; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; AAVD: atividades avançadas de vida diária.
Essa capacidade funcional da pessoa idosa para realização das AVDs está relacionada à sua autonomia e à sua
independência – conceitos complementares, mas associados a domínios funcionais diferentes. A autonomia depende da
cognição e do humor/comportamento, enquanto a independência depende da mobilidade e da comunicação (Quadro 2).

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 9


Quadro 2. Domínios funcionais na avaliação do idoso.
Autonomia Capacidade individual de decisão e comando sobre as ações, estabelecendo e seguindo as
próprias convicções
Depende dos domínios funcionais da cognição e humor/comportamento
Cognição Capacidade mental de compreender e resolver adequadamente
os problemas do cotidiano. As principais alterações da cognição
são as síndromes demenciais, como a demência de Alzheimer
Humor/comportamento Motivação necessária para a realização das atividades e/ou
participação social. Inclui também o comportamento, definido
como a expressão individual diante da interpretação da realidade.
É a manifestação do pensamento, que é a capacidade de elaborar
conceitos (características essenciais dos objetos e fenômenos da
natureza), juízos (estabelecer relações entre os objetos) e
raciocínio (estabelecer relação entre os juízos). A principal
alteração do humor é a depressão, enquanto o comportamento é
profundamente afetado pela esquizofrenia e pelas demais
síndromes psicóticas
Independência Capacidade de executar a decisão com os próprios meios
Depende dos domínios funcionais da mobilidade e comunicação
Mobilidade Capacidade individual de deslocamento e de manipulação do
meio. Depende de quatro subsistemas funcionais: a capacidade
aeróbia e muscular (transporte e captação de oxigênio pelos
músculos), o alcance/preensão/pinça (membros superiores) e a
marcha, postura e transferência. A continência esfincteriana é
também considerada um subdomínio da mobilidade, pois sua
ausência (incontinência esfincteriana) é capaz de interferir na
mobilidade e restringir a participação social do indivíduo
Comunicação Capacidade de estabelecer um relacionamento produtivo com o
meio, trocar informações, manifestar desejos, ideias e
sentimentos. Depende de três subsistemas funcionais: visão,
audição e produção/motricidade orofacial. Este último é
representado pela voz, pela fala e pela mastigação/deglutição
O comprometimento desses domínios funcionais impede o indivíduo de gerir sua vida e/ou cuidar de si mesmo, gerando
a dependência funcional, também conhecida como incapacidade. As principais incapacidades no idoso são a
incapacidade cognitiva (demência, depressão, delirium e doença mental), a instabilidade postural (quedas), a
imobilidade, a incontinência esfincteriana e a incapacidade comunicativa (cegueira e surdez). Essas incapacidades são
condições crônicas na saúde da pessoa idosa, requerendo cuidados de longa duração e exigindo uma gestão diferenciada
por parte dos profissionais de saúde e familiares. Um profissional com manejo clínico inadequado para essas situações
resulta em maior risco de iatrogenia, assim como uma família que não se encontra preparada para prover os cuidados
necessários (situação frequente, conhecida como “insuficiência familiar”), podendo agravar a situação do idoso (Quadro
3).
Quadro 3. Incapacidades no declínio funcional do idoso.
INCAPACIDADES Incapacidade cognitiva
ou Instabilidade postural
“Gigantes da Geriatria” ou “Grandes Síndromes Imobilidade
Geriátricas” “7 Is da Geriatria” Incontinência esfincteriana
Incapacidade comunicativa
Iatrogenia
Insuficiência familiar

10 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


O termo “fragilidade” (“frailty”) é muitas vezes utilizado na literatura para indicar o idoso com maior risco de desfechos
adversos, como quedas, dependência funcional, hospitalização, institucionalização e óbito,[12-18] não existindo, porém, um
consenso para sua operacionalização.
Na tentativa de uma compreensão mais padronizada e coerente com a multidimensionalidade dos fatores determinantes
da saúde do idoso, foi proposto o conceito de “Fragilidade Multidimensional”. [19] Trata-se da situação do idoso em que há
uma redução da capacidade funcional e/ou da capacidade de adaptação às agressões biopsicossociais e,
consequentemente, ocorre uma maior vulnerabilidade ao declínio funcional, à institucionalização e ao óbito. Neste
conceito, as condições de saúde associadas a desfechos adversos podem ser agrupadas em dois componentes, clínico-
funcional e sociofamiliar, resgatando o conceito de saúde como o máximo bem-estar biopsicossocial e não simplesmente
como a ausência de doenças.
O componente clínico-funcional da Fragilidade Multidimensional tem como premissa a capacidade do idoso de ser
independente nas AVD. A fragilidade indica, justamente, o declínio dessa capacidade funcional, podendo este ser
iminente ou estabelecido (Quadro 4).
Quadro 4. Declínio funcional no idoso.
Declínio Síndrome caracterizada pela presença de condições crônicas de saúde preditoras de desfechos
funcional clínicos negativos ou adversos (dependência funcional, institucionalização, hospitalização e
iminente morte). Estas condições incluem a presença de comorbidade múltipla (polipatologia,
polifarmácia e internação recente), comprometimento cognitivo leve e sarcopenia
Polipatologia Presença de duas ou mais doenças crônico-degenerativas bem
estabelecidas e de maior complexidade clínica
OU
Presença de 5 ou mais condições crônicas de saúde, incluindo as doenças
crônico-degenerativas clássicas, enfermidades (illness), fatores de risco ou
sintomas que necessitam de intervenção médica Uso diário de 5 ou mais
Polifarmácia medicamentos diferentes
Internação recente Nos últimos 6 meses, por qualquer motivo
Comprometimento Presença de declínio cognitivo percebido pelo usuário e, usualmente, pelo
cognitivo leve informante, confirmado pela testagem cognitiva, mas que não está
associado a declínio funcional nas AVD, não preenchendo os critérios para
demência[20]
Sarcopenia Doença generalizada e progressiva da musculatura esquelética, associada
a desfechos adversos, como maior risco de quedas, fraturas, dependência
física e mortalidade[21]
Declínio
Presença de incapacidade funcional ou dependência e, consequentemente, restrição da
funcional
participação social
estabelecido
O componente sociofamiliar da Fragilidade Multidimensional resgata a importância de outros determinantes da saúde, [22]
como sexo, raça/cor, escolaridade, estado civil, arranjos familiares, viuvez recente, idoso cuidador, participação e apoio
social, acesso a serviços e situação laboral.
Idosos dependentes exigem cuidados de longa duração, ou seja, “apoio material, instrumental e emocional, formal ou
informalmente oferecido por um longo período de tempo, independentemente da idade”, [23] no domicílio, na
comunidade ou em Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI). Habitualmente, esses cuidados são prestados
pela família, mas se esta for despreparada, pode desencadear ou perpetuar a perda de autonomia e independência do
idoso. A insuficiência familiar surge justamente quando a família está ausente ou perde, por despreparo ou falta de
condições, a capacidade de prover os cuidados e de dar apoio e suporte ao idoso. Não deve ser confundida com

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 11


negligência ou abandono; muitas vezes, a família deseja cuidar de seu idoso frágil ou dependente, mas não reúne as
condições necessárias para tal cuidado.
Os conceitos, as dimensões relacionadas ao bem-estar biopsicossocial, os determinantes
da saúde do idoso, os domínios funcionais e os elementos relacionados à capacidade funcional foram sistematizados no
modelo multidimensional de saúde do idoso, conforme exposto na Figura 2.
Modelo Multidimensional de Saúde no Idoso
SAÚDE
Capacidade individual de satisfação das necessidades biopsicossociais,
INDEPENDENTEMENTE DA IDADE OU DA PRESENÇA DE DOENÇAS.

FUNCIONALIDADE
Atividades de Vida Diária

AUTONOMIA (DECISÃO) INDEPENDÊNCIA (EXECUÇÃO)


É a capacidade individual de decisão Refere-se à capacidade de realizar algo
e comando sobre as ações, estabelecendo com os próprios meios
e seguindo as próprias convicções.

COGNIÇÃO MOBILIDADE COMUNICAÇÃO


HUMOR/COMPORTAMENTO

Alcance Marcha Capacidade Continência Visão Audição Produção/


Preensão Postura aeróbica/muscular esfincteriana Motricidade
Pinça Transferência orofacial

INCAPACIDADE INSTABILIDADE IMOBILIDADE INCONTINÊNCIA INCAPACIDADE


COGNITIVA POSTURAL ESFINCTERIANA COMUNICATIVA

CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO

GESTÃO DIFERENCIADA DA SAÚDE


IATROGENIA INSUFICIÊNCIA FAMILIAR

Cuidado Profissional Cuidado Familiar

Fonte: Moraes et al.[19]


Figura 2. Modelo multidimensional de saúde do idoso.

OBJETIVO
A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, [24] tem como finalidade primordial “recuperar, manter e promover a
autonomia e a independência dos indivíduos idosos, direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse
fim, em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS)”.
Este objetivo deve ser alcançado organizando-se a atenção à saúde dos idosos, de acordo com os microssistemas clínicos
integrados Atenção Primária à Saúde/Atenção Ambulatorial Especializada, segundo as seguintes estratégias:
• Conhecimento da população de idosos do território.
• Estratificação de risco clínico-funcional.
• Manejo adequado das necessidades dos idosos por estrato de risco, com vistas à melhoria da qualidade de vida atual
e futura.

12 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


CONHECENDO A PESSOA E A
POPULAÇÃO IDOSA
O conhecimento profundo da população usuária de um sistema de atenção à saúde é o elemento básico que torna
possível romper com a gestão baseada na oferta, característica dos sistemas fragmentados, e instituir a gestão baseada
nas necessidades de saúde da população, identificando pessoas e grupos com necessidades de saúde semelhantes, que
devem ser atendidos por tecnologias e recursos específicos, segundo uma estratificação de riscos. [3] Envolve um processo
complexo e estruturado em vários momentos, a saber: territorialização; cadastramento das famílias; classificação das
famílias por riscos sociossanitários; vinculação das famílias à equipe da Estratégia Saúde da Família (ESF); identificação
das subpopulações com fatores de riscos proximais e biopsicológicos; reconhecimento das subpopulações com condições
de saúde estabelecidas por estratos de riscos; e distinção das subpopulações com condições de saúde muito complexas.
[25]

No Brasil, o Estatuto do Idoso definiu como idoso todo indivíduo com 60 anos ou mais. [26] Ele vive em um contexto
bastante heterogêneo, no que se refere ao território, à família, ao ambiente e à comunidade – heterogeneidade tanto
maior, quanto maior for sua idade.[7,27]
O conhecimento da população idosa começa pela identificação desses usuários na população geral residente no território
sanitário, por meio do cadastramento individual e familiar. Devem ser levantados, em seu contexto de vida, os fatores
multidimensionais que determinam sua capacidade de realizar as AVD, considerando tanto os recursos e fatores de
proteção, quanto os fatores de risco relacionados a relações familiares e comunitárias, ambiente domiciliar e
peridomiciliar, atividades produtivas, recreativas e de participação social.
Do ponto de vista sociofamiliar, os principais fatores de risco são:
• Morar sozinho.
• Residir em ILPI.
• Ausência de companheiro ou cônjuge.
• Viuvez recente.
• Ausência de familiares, amigos ou cuidadores com disponibilidade para atender o idoso, principalmente o dependente
de cuidados.
• Ausência de visitas de familiares ou amigos com regularidade.
• Ser responsável pelo cuidado de pessoas dependentes em sua casa.
• Analfabetismo.
• Ser dependente do Benefício de Prestação Continuada (BPC) ou não ter acesso à renda própria capaz de garantir a
própria subsistência.
• Não possuir moradia própria ou ter moradia própria em condições precárias de organização e higiene.
• Não participar de alguma atividade de socialização extradomiciliar, como trabalho, família, igreja, grupo de
convivência etc.
• Ter indícios ou ocorrências de violência doméstica, principalmente quando voltada à pessoa idosa.
Uma forma mais sistematizada de conhecimento da subpopulação de idosos com presença dos principais fatores
multidimensionais determinantes de sua saúde é a avaliação clínicofuncional, por meio do Índice de Vulnerabilidade
Clínico-Funcional 20 (IVCF-20) (Figura 3), instrumento desenvolvido a partir do modelo multidimensional de saúde do
idoso, para rastrear a fragilidade da pessoa idosa (Anexo 1).[19]

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 13


ÍNDICE DE VULNERABILIDADE CLÍNICO-FUNCIONAL-20 www.tvcf-20.com.br

da as perguntas abaixo com a ajuda de familiares ou acompanhantes. Marque a opção mais apropriada para a sua
ão de saúde atual.Todas as respostas devem ser confirmadas por alguém que conviva com você. Pontuação
osos incapazes de responder, utilizar as respostas do cuidador.
( ) 60 a 74 anos
1. Qual é a sua idade? ( ) 75 a 84 anos
( ) ≥ 85 anos
PERCEPÇÃO DA SAÚDE 2. Em geral, comparados com outras pessoas de sua ( ) Excelente, muito boa o boa
idade, você diria que sua saúde é: ( ) Regular ou ruim

AVD Instrumental 3. Por causa de sua saúde ou condição física, você deixou de fazer comprar?
Resposta positiva ( ) Sim ( ) Não ou não faz compras por outros motivos que não a saúde
vale 4 pontos
4. Por causa de sua saúde ou condição física, você deixou de controlar seu dinheiro, gastos
cada. Todavia, a
ou pagar as contas de sua casa?
pontuação máxima ( ) Sim ( ) Não ou não controla o dinheiro por outros motivos que não a saúde
do item é de 4 Máximo
pontos, mesmo 4 pts
5. Por causa de sua saúde ou condição física, você deixou de realizar pequenos trabalhos
que o idoso tenha domésticos, como lavar louça, arrumar a casa ou fazer limpeza leve?
respondido ruim ( ) Sim ( ) Não ou não faz pequenos trabalhos domésticos por outros motivos que não a
para todas as saúde
questões 3, 4 e 5.
AVD Básica 6. Por causa de sua saúde ou condição física, você deixou de tomar banho sozinho? (
) Sim ( ) Não

7. Algum familiar ou amigo falou que você está ficando esquecido?


( ) Sim ( ) Não
8. Este esquecimento está piorando nos últimos meses?
ÇÃO
( ) Sim ( ) Não
9. Este esquecimento está impedindo a realização de alguma atividade do cotidiano?
( ) Sim ( ) Não
10. No último mês, você ficou com desânimo, tristeza ou desesperança?
( ) Sim ( ) Não
R 11. No último mês, você perdeu o interesse ou prazer em atividades anteriormente
prazerosas?
( ) Sim ( ) Não
12. Você é incapaz de elevar os braços acima do nível do ombro?
Alcance, preensão e ( ) Sim ( ) Não
pinça 13. Você é incapaz de manusear ou segurar pequenos objetos?
( ) Sim ( ) Não
14. Você tem alguma das três condições abaixo relacionadas?
• Perda de peso não intencional de 4,5
kg ou 5% do peso corporal
no último ano ou 6 kg
nos últimos 6 meses ou 3
kg no último mês ( );
Capacidade aeróbica • Índice de Massa Corporal (IMC) menor que Máximo
e/ou muscular 22 kg/m2 ( ); 4 pts
• Circunferência de panturillha a < 31
cm ( );
• Tempo gasto no teste de velocidade da
marcha (4 m) > 5 segundos
( ).
( ) Sim ( ) Não
15. Você tem dificuldade para caminhar capaz de impedir a realização de alguma atividade
do cotidiano?
Marcha ( ) Sim ( ) Não
16. Você teve duas ou mais quedas no último ano?
( ) Sim ( ) Não
Consistência 17. Você perde urina ou fezes, sem querer, em algum momento?
esfincteriana ( ) Sim ( ) Não

18. Você tem problemas de visão capazes de impedir a realização de alguma atividade do
Visão cotidiano? É permitido o uso de óculos ou lentes de contato.
( ) Sim ( ) Não

14 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


19. Você tem problemas de audição capazes de impedir a realização de alguma atividade do
cotidiano? É permitido o uso de aparelhos de audição.
Audição ( ) Sim ( ) Não

Polipatologia 20. Você tem alguma das três condições abaixo relacionadas?
Polifarmácia • Cinco ou mais doenças crônicas ( );
• Uso regular de cinco ou mais
medicamentos diferentes, todo dia ( Máximo
Internação recente ); 4 pts
(< 6 • Internação recente, nos últimos 6 meses (
meses) ).
( ) Sim ( ) Não
AÇÃO FINAL (40 pontos)

Fonte: Moraes et al.[19] Figura 3. Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20.


O IVCF-20 foi desenvolvido e validado no Brasil,[28] a partir do Vulnerable Elders Survey-13 (VES-13)[29] e de outros
instrumentos de triagem rápida amplamente citados na literatura, como o PRISMA-7, [30] Sherbrooke Postal Questionnaire
(SBQ),[31] Tilburg Frailty Indicator (TFI),[15,32] o Groningen Frailty Indicator (GFI),[33] dentre outros. Em 2019, o IVCF-20 foi
reconhecido como um dos quatro melhores instrumentos do mundo capazes de reconhecer o idoso frágil.[34]
É um instrumento simples e de rápida aplicação (leva de 5 a 10 minutos) e tem a vantagem de apresentar caráter
multidimensional, avaliando oito dimensões consideradas preditoras de declínio funcional e/óbito em idosos: idade,
autopercepção da saúde, AVD (três AIVDs e uma ABVD), cognição, humor/comportamento, mobilidade (alcance,
preensão e pinça; capacidade aeróbica/muscular; marcha e continência esfincteriana), comunicação (visão e audição) e
presença de comorbidades múltiplas, representada por polipatologia, polifarmácia e/ou internação recente.
Cada seção é avaliada por meio de perguntas simples, que podem ser respondidas pelo idoso ou por alguém que conviva
com ele (familiar ou cuidador). Foram também incluídas algumas medidas consideradas fundamentais na avaliação do
risco de declínio funcional do idoso, como peso, estatura, índice de massa corporal, circunferência da panturrilha e
velocidade da marcha em 4 metros.
Pode ser aplicado por qualquer profissional da equipe da Atenção Primária (enfermeiro, médico, técnico/auxiliar de
enfermagem, Agente Comunitário de Saúde, dentista, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, assistente
social, dentista, psicólogo, farmacêutico e outros), desde que devidamente capacitados e autorizados por diretrizes
municipais, quando necessário.
Pode ser realizado durante a visita ou atendimento familiar, nas várias oportunidades de contato com a equipe
(vacinação, renovação de receita, dispensação de medicamentos, consultas por situações agudas, atividades
educacionais, dentre outras) ou em mutirões de avaliação.
A metodologia propõe uma pontuação que possibilita correlacionar o risco de vulnerabilidade clínico-funcional e o
declínio funcional, conforme disposto no quadro 5 e na figura 4.
Quadro 5. Correlação entre risco de vulnerabilidade e declínio funcional.
Ausência de declínio
0-6 pontos Idosos com baixo risco de vulnerabilidade clínico-funcional
funcional
Possível declínio
7-14 pontos Idosos com moderado risco de vulnerabilidade clínico-funcional
funcional
Presença de declínio
≥15 pontos Idosos com alto risco de vulnerabilidade clínico-funcional
funcional

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 15


Fonte: Moraes et al.[28]
Figura 4. Régua de avaliação do declínio funcional a partir do IVCF-20.
O IVCF-20 pode ser útil tanto para a avaliação de risco dos idosos, quanto para o manejo clínico desta população, da
seguinte forma:
• Avaliação de risco: possibilita a identificação do idoso frágil por profissionais de saúde não especialistas em Geriatria
ou Gerontologia; permite a gestão da população de risco, com elaboração de política públicas específicas, conforme o
diagnóstico populacional; facilita o planejamento de demanda programada, por meio da definição de grupo de idosos
que necessitam de atendimento diferenciado na APS e de critérios padronizados de compartilhamento do cuidado
para AAE em saúde do idoso.
• Manejo clínico: permite a identificação de sintomas ou problemas de saúde que merecem intervenções específicas,
como a suspeita de incapacidade cognitiva (demência), transtorno do humor, ombro doloroso e afecções das mãos,
sarcopenia, emagrecimento, quedas, alterações da marcha, incontinência esfincteriana, alterações da visão e da
audição, polifarmácia, dentre outras; possibilita a prescrição de intervenções preventivas, promocionais, paliativas ou
reabilitadoras individualizadas, conforme o estrato clínicofuncional do idoso, capazes de melhorar a autonomia e a
independência do idoso, e de prevenir o declínio funcional, a institucionalização e o óbito; favorece o planejamento da
consulta especializada, destacando as dimensões da saúde do idoso que merecem investigação mais detalhada.
O rastreamento de risco do idoso por meio do IVCF-20 deve ser complementado pela avaliação multiprofissional e
interdisciplinar, envolvendo os profissionais da equipe médica e de enfermagem, Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF) e saúde bucal.
Esta avaliação consiste na realização de avaliação clínica tradicional, avaliação sociofamiliar e detalhamento das AVD.
A avaliação clínica tradicional (Anexo 2) consiste na realização da anamnese e do exame físico do idoso, com foco na
avaliação dos sistemas fisiológicos principais (sistemas cardiovascular, respiratório, digestivo, musculoesquelético,
geniturinário, endócrinometabólico, nervoso central e pele/anexos) e de outras funções orgânicas, como sono, nutrição e
saúde bucal.
A avaliação sociofamiliar (Anexo 2) consiste na identificação e na caracterização dos principais fatores de risco
determinantes da saúde do idoso, por meio da aplicação do instrumento Avaliação da Fragilidade Sociofamiliar. O
instrumento contém itens que avaliam a gravidade do suporte familiar e social, com pontuação que indica desde a
ausência de gravidade (zero ponto) até uma situação grave (≥10 pontos). Quanto maior a pontuação, maior a fragilidade
sociofamiliar.
O detalhamento das AVD (Anexo 2) avalia a capacidade do idoso para a realização das ABVD (tomar banho, vestir-se, uso
do vaso sanitário, transferência, continência e alimentarse) e das AIVD (preparar refeições, tomar remédios, fazer
compras, controlar o dinheiro, usar o telefone, arrumar a casa, lavar e passar roupa e sair de casa sozinho), resultando na
avaliação de independência, dependência parcial ou completa. Esse detalhamento possibilita a identificação dos sinais de
declínio funcional.
As AAVD são relacionadas às atividades produtivas, de lazer e de socialização e absolutamente individuais, sendo difíceis
de serem padronizadas para comparação entre os idosos. Sua maior utilidade é o reconhecimento precoce de alterações
na funcionalidade global do idoso.
A avaliação sociofamiliar e o detalhamento das AVD são recomendados para os usuários com IVCF-20 com pontuação
final ≥7 pontos.
16 SAÚDE DA PESSOA IDOSA
A ESTRATIFICAÇÃO DE
RISCO CLÍNICO-FUNCIONAL
A estratificação de risco do idoso é resultado das avaliações descritas até aqui: IVCF-20, avaliação clínica tradicional,
avaliação sociofamiliar e detalhamento das AVD. Sua análise combinada expressa, de maneira clara, a complexidade
clínica funcional dos idosos, estratificando-os em subgrupos, como prevê o MACC.
A Escala Visual de Fragilidade (Figura 5) apresenta os extremos opostos da capacidade funcional, representando o grau
máximo e mínimo de vitalidade (capacidade intrínseca) e de fragilidade (vulnerabilidade), ligando-os por uma linha reta e
contínua, mas declinante, do ponto de máxima vitalidade e mínima vulnerabilidade, até o ponto de mínima vitalidade e
máxima vulnerabilidade. Nesse percurso, podem ser identificados dez estratos ou categorias clínico-funcionais do
processo de envelhecimento.

Fonte: Moraes et al.[35]


CCL: comprometimento cognitivo leve; AVD: atividade de vida diária.
Figura 5. Fragilidade e vitalidade do idoso de acordo com o estrato, declínio funcional e vulnerabilidade
clínico-funcional.
A definição do estrato clínico-funcional baseia-se na funcionalidade (dependência ou independência para AAVD, AIVD e
ABVD) e na presença de fatores de risco, doenças e comorbidades múltiplas, pois, além da heterogeneidade funcional, os
idosos também apresentam diferenças quanto à complexidade clínica e à necessidade de acompanhamento geriátrico-
gerontológico especializado.
SAÚDE DA PESSOA IDOSA 17
Os dez estratos ou categorias clínico-funcionais são agrupados em três grandes grupos de idosos: idoso robusto (estratos
1 a 3), em risco de fragilização (estratos 4 e 5) e frágil (estratos 6 a 10). Esta proposta foi sistematizada no instrumento de
estratificação de risco clínico-funcional do idoso (Quadro 6).[35]

Quadro 6. Estratificação de risco clínico-funcional do idoso.


Idoso robusto Estrato 1 Idosos que se encontram no grau máximo de vitalidade
– ausência de Idosos independentes para todas as AAVD, AIVD e ABVD
declínio Ausência de doenças ou fatores de risco, exceto a própria idade
funcional Envelheceram livres de doenças e não apresentam outra condição de saúde
preditora de desfechos adversos
Estrato 2 Idosos independentes para todas as AAVD, AIVD e ABVD
Apresentam condições de saúde de menor complexidade clínica, como a
hipertensão arterial controlada e sem lesão de órgão-alvo ou diabetes mellitus
controlado e sem lesão de órgão-alvo
E/OU
Apresentam fatores de risco gerais, como tabagismo, dislipidemia, osteopenia,
depressão leve, dentre outros
Estrato 3 Idosos independentes para todas as AAVD, AIVD e ABVD
Apresentam doenças crônico-degenerativas com base em critérios diagnósticos
bem estabelecidos e de maior complexidade clínica, como hipertensão arterial
descontrolada ou com lesão de órgão-alvo, diabetes mellitus descontrolado ou
com lesão de órgãoalvo, depressão moderada/grave, ataque isquêmico transitório,
acidente vascular cerebral, doença renal crônica, insuficiência cardíaca, doença
pulmonar obstrutiva crônica/asma, osteoartrite, doença arterial coronariana,
história de infarto agudo de miocárdio, doença arterial periférica, câncer não
cutâneo, osteoporose densitométrica, dor crônica, fibrilação atrial,
doença de Parkinson e anemia
Idoso em risco Estrato 4 Idosos independentes para todas as AAVD, AIVD e ABVD Apresentam
de fragilização – algumas das situações:
declínio ● Presença de evidências de redução da capacidade aeróbia/muscular:
perda de peso significativa, fatigabilidade, baixo nível de atividade física associado
funcional
à redução objetiva da força muscular ou CP 31cm ● Presença de CCL ou transtorno
iminente neurocognitivo leve
● Presença de comorbidades múltiplas:
◉ Duas ou mais doenças crônico-degenerativas bem estabelecidas e de maior

complexidade clínica (ver estrato 3)


◉ 5 ou mais condições crônicas de saúde, incluindo as doenças
crônicodegenerativas clássicas, enfermidades (illness), fatores de risco ou
sintomas que necessitam de intervenção médica
◉ Polifarmácia: uso diário de 5 ou mais medicamentos de classes diferentes

◉ Internação recente, nos últimos 6 meses

Estrato 5 Idosos independentes para AIVD e ABVD Apresentam:


● Limitações nas AAVD (atividades relacionadas à integração social, atividades

produtivas, recreativas e/ou sociais)


● Evidências clínicas de redução significativa da capacidade aeróbia/muscular:

VM-4m ≤ 0,8 m/s ou TUG ≥ 20 segundo

continua...

Idoso frágil – Estrato 6 Idosos que apresentam:


declínio ● Independência para ABVD

funcional E
estabelecido ● Declínio funcional parcial nas AIVD (dependência parcial)

18 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Estrato 7 Idosos que apresentam:
● Independência para ABVD

E
● Declínio funcional em todas as AIVD (dependência completa)

Estrato 8 Idosos que apresentam:


● Dependência completa nas AIVD

E
● Semidependência nas ABVD: comprometimento de uma das funções

influenciadas pela cultura e aprendizado (banhar-se e/ou vestir-se e/ou uso do


banheiro)
Estrato 9 Idosos que apresentam:
● Dependência completa nas AIVD E
● Dependência incompleta para ABVD: banhar-se, vestir-se, uso do
banheiro, continência e transferência. A única AVDB preservada é a capacidade
de alimentar-se sozinho Idosos que apresentam:
● Dependência completa para ABVD
Estrato 10 Encontram-se no grau máximo de fragilidade e, consequentemente, apresentam
o máximo de dependência funcional, necessitando de ajuda, inclusive, para
alimentar-se

AAVD: atividades avançadas de vida diária; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; ABVD: atividades básicas de vida diária; CP: circunferência da panturrilha; CCL:
comprometimento cognitivo leve; VM-4m: velocidade de marcha em 4 metros; TUG: Timed Up and Go.

O idoso frágil é aquele com declínio funcional estabelecido e algum grau de dependência para gerenciar sua vida, em
virtude de incapacidades únicas ou múltiplas, como incapacidade cognitiva (demência, depressão, delirium e doença
mental), instabilidade postural (história de duas ou mais quedas nos últimos 6 meses e/ou dificuldades da marcha
caracterizadas por desequilíbrio e alterações no padrão da marcha, capazes de restringir sua participação social),
imobilidade parcial ou completa, incontinência esfincteriana capaz de restringir a participação social do indivíduo ou
incapacidade comunicativa (distúrbios da comunicação oral/escrita, da audição e da visão, capazes de restringir a
participação social do indivíduo).
Esse grupo de idosos frágeis se divide em três subgrupos, de acordo com a probabilidade de melhora funcional e/ou
qualidade de vida:
• Idoso frágil com alto potencial de melhora funcional: são idosos com maior probabilidade de ganho funcional e/ou
qualidade de vida, beneficiando-se do acompanhamento geriátrico-gerontológico especializado integrado com a APS.
• Idoso frágil com baixo potencial de melhora funcional: são idosos que apresentam declínio funcional estabelecido e
baixo potencial de reversibilidade clínico-funcional. Nesses idosos, o acompanhamento geriátrico-gerontológico
especializado não necessita ser feito de forma intensiva. Este subgrupo deve ser manejado na APS, com apoio da AAE
em saúde do idoso quando necessário, com o objetivo de evitar a piora funcional.
• Idoso frágil em fase final de vida: apresenta grande dependência funcional e sobrevida estimada menor que 6 meses
ou que tem resposta negativa à seguinte pergunta: “Você ficaria surpreso se o paciente falecesse nos próximos meses,
semanas ou dias?”. Apesar da existência de uma clara associação entre maior grau de declínio funcional e maior
mortalidade, alguns idosos podem estar relativamente preservados funcionalmente e apresentar doenças com alto
potencial de mortalidade, como determinados tipos de neoplasia, por exemplo. Este subgrupo também deve ser
manejado na APS, com apoio da AAE em saúde do idoso quando necessário, tendo como foco das intervenções o
cuidado paliativo, baseado no conforto do usuário e de seus familiares.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 19


Nesta classificação clínico-funcional, estima-se que a maior parte dos idosos (cerca de 50%) é considerada robusta,
necessitando de pequenos ajustes na atenção à saúde, particularmente no que se refere à prescrição de intervenções
fúteis ou potencialmente iatrogênicas. Cerca de 20% dos idosos são frágeis e necessitam de respostas diferenciadas para
suas demandas de saúde, definidas de maneira compartilhada pela AAE e APS. O terceiro grupo, idosos com risco de
fragilização ou pré-frágeis, representa cerca de 30% da população idosa e deve ser monitorado rigorosamente pela APS,
pois estão em risco de adquirirem incapacidades funcionais (Figura 6).

10% IDOSO FRÁGIL EM FASE FINAL DE VIDA

IDOSO FRÁGIL COM BAIXO POTENCIAL


IDOSO DE MELHORA FUNCIONAL
60%
FRÁGIL
20%
IDOSO FRÁGIL COM ALTO POTENCIAL
30%
DE MELHORA FUNCIONAL

IDOSO EM RISCO DE
FRAGILIZAÇÃO
30%

IDOSO ROBUSTO
50%

Fonte:Moraes.[8]
Figura 6. Prevalência dos diversos tipos de idosos.

ORGANIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA

Princípios da atenção integral à saúde da pessoa idosa


O cuidado oferecido aos idosos, especialmente àqueles portadores de múltiplas condições crônicas de saúde, poli-
incapacidades ou necessidades complexas, é frequentemente fragmentado, ineficiente, ineficaz e descontínuo, podendo
agravar ainda mais sua condição de saúde.[36]
Contrariamente, as evidências atuais mostram que a atenção à saúde dos idosos mais frágeis, com qualidade,
resolutividade e custo-eficácia, deve ser associada a quatro princípios essenciais, que superam o simples diagnóstico e
tratamento das doenças individuais:
• Avaliação multidimensional ou abrangente, que reconheça todas as demandas biopsicossociais do usuário, seus
valores, crenças, sentimentos e preferências para o cuidado.
• Elaboração, implementação e monitoramento do plano de cuidados, composto por todas as intervenções preventivas,
curativas, paliativas e reabilitadoras, definidas de forma compartilhada.
• Comunicação e coordenação com todos os profissionais e serviços necessários para implementação do plano de
cuidados, com ênfase no cuidado transicional.
• Promoção do engajamento ativo do usuário e sua família no cuidado com sua saúde.

20 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Esses princípios definem uma lógica de organização para as RAS da pessoa idosa.
O MACC, proposto como lógica de organização das RAS,[3] acolhe esses princípios para o
cuidado do idoso. Assim, foi proposto o MACC Idoso (Figura 7), [5] inserindo as
particularidades dessa população, de acordo com a estratificação de risco clínico-funcional.

Figura 7. Modelo de Atenção às Condições Crônicas adaptado à saúde do idoso.


O modelo propõe cinco níveis de intervenções sobre os determinantes sociais da saúde, acumulativos de um nível para o
outro, voltados para uma população estratificada por risco.
No nível 1, o foco das intervenções são os determinantes sociais intermediários da saúde, que se manifestam no âmbito
local de atuação da APS, especialmente aqueles ligados às condições de vida e de trabalho, como educação, emprego,
renda, habitação, saneamento, disponibilidade de alimentos, infraestrutura urbana, serviços sociais e comunitários.
Propõe ações de promoção à saúde para a população total. Os idosos robustos sem doenças ou fatores de risco (idoso
robusto; estrato 1) são beneficiados neste nível.
No nível 2, o foco das intervenções são os determinantes proximais da saúde ligados aos comportamentos e aos estilos
de vida. Propõe ações de prevenção de doenças (prevenção primária), com ênfase nos comportamentos e estilo de vida
(tabagismo, alimentação inadequada, inatividade física, excesso de peso, uso excessivo de álcool etc.), beneficiando a
parte da população que apresenta esses fatores predisponentes, inclusive os idosos robustos com fatores de risco (idoso
robusto; estrato 2 – fatores de risco).
Até o segundo nível, não há condições de saúde estabelecidas e nem manifestação de fatores de risco biopsíquicos.
Nos níveis 3, 4 e 5, o foco são as condições crônicas de saúde estabelecidas, variando de condições crônicas simples (nível
3) e complexas (nível 4), até condições de saúde altamente complexas (nível 5), presentes em 1% a 5% da população total
e que chegam a consumir a maior parte dos recursos globais de um sistema de atenção à saúde. Propõe intervenções
diferenciadas por nível, utilizando as tecnologias de gestão da clínica (gestão de condição de saúde e gestão de caso).
O nível 3 beneficia idosos robustos portadores de doenças crônicas degenerativas de baixo, médio ou alto risco, mas
independentes para todas as AVD (idoso robusto; estratos 2 – doenças crônicas de baixo e médio risco – e 3 – doenças
crônicas de alto risco). Do ponto de vista da saúde do idoso, a presença de doenças crônicas degenerativas, mesmo que
de alto risco, é uma situação ainda considerada simples ou pouco complexa, desde que não haja comprometimento da

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 21


capacidade funcional. Do ponto de vista do manejo dessas doenças crônicas, as diretrizes clínicas específicas muitas
vezes as estratificam como condições complexas (como um diabético hipertenso de alto risco), requerendo intervenções
de serviços especializados (unidade ambulatorial especializada para hipertensão e diabetes de alto risco, por exemplo), o
que deve ser feito, com a atenção para as particularidades do manejo do idoso.
O nível 4 beneficia os idosos em risco de fragilização (estratos 4 e 5) e os frágeis (estratos 6 a 10). As intervenções são
compartilhadas entre as equipes da APS e AAE.
Os idosos frágeis com alto potencial de melhora clínico-funcional são beneficiados pela gestão de caso, intervenção
proposta no nível 5, sendo fundamental a realização da avaliação geriátrica ampla (AGA), que inclui a avaliação
multidimensional do idoso (AMI) e a elaboração de um plano de cuidados. Os idosos com baixo potencial de melhora
clínico-funcional são beneficiados pelas intervenções de gestão da condição de saúde no nível 4.
O MACC propõe uma relação de equilíbrio entre o autocuidado apoiado e o cuidado profissional, respeitando o nível de
complexidade da situação de saúde. Assim, para os idosos robustos, deve ser dada ênfase ao autocuidado apoiado e,
para os idosos frágeis, ao cuidado profissional.
Na saúde do idoso, o autocuidado apoiado apresenta algumas particularidades. A perda da autonomia e da
independência é a principal característica do idoso frágil, de tal forma que ele torna-se dependente para a realização das
atividades do cotidiano. Idosos frágeis no estrato 10 apresentam grau máximo de dependência funcional, pois não
conseguem nem mesmo alimentar-se sem ajuda de terceiros. Quanto maior essa dependência, mais a família e o
cuidador tornam-se atores fundamentais na preservação dos cuidados básicos com a vida. Assim, o termo “autocuidado
apoiado” inclui o cuidador do idoso, que, na maioria das vezes, é um familiar. A intervenção de saúde proposta deve
garantir o treinamento dos cuidadores de idosos frágeis, familiares e/ou profissionais, além de enfatizar a importância do
envolvimento deles com a equipe interdisciplinar responsável pelo acompanhamento.

O fluxo da atenção ao idoso na Rede de Atenção Saúde


Estabelecidos os princípios da atenção integral à saúde da pessoa idosa, são propostas estratégias de operacionalização
do atendimento do idoso nas RAS (Figura 8).

22 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


ACS: Agente Comunitário de Saúde; APS: Atenção Primária à Saúde;
IVCF-20: Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20; ABVD: atividades básicas de vida diária; AIVD: atividades instrumentais de vida diária;
CCL: comprometimento cognitivo leve. Figura 8. Fluxograma do atendimento ao idoso na Rede de Atenção à Saúde.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 23


Tais estratégias são distribuídas em cinco fases.

Fase 1: cadastro do idoso residente no território de abrangência da equipe


O processo de cadastramento familiar pelo ACS deve estar atualizado, possibilitando a identificação dos idosos residentes
no território. A abordagem familiar utilizando outras ferramentas, como a estratificação de risco familiar, agrega valor ao
processo de conhecimento do território e da população, caracterizando melhor o contexto de vida familiar e comunitário
do idoso. A vinculação com a equipe de saúde da família de referência complementa essa fase, dando garantia para o
cuidado contínuo de que a pessoa idosa necessita.

Fase 2: captação do idoso para o acompanhamento


O idoso residente no território deve ser captado para o acompanhamento pela ESF, obedecendo à sua avaliação clínica e
funcional. Todas as oportunidades de contato com idoso devem ser valorizadas para esse fim, principalmente quando há
sinalização para uma situação de dependência.
Oportunidades de captação do idoso: visita domiciliar rotineira pelo ACS; visita ou atendimento familiar por outros
profissionais do APS; demandas por serviços na Unidade Básica de Saúde (UBS), como consultas, vacinação (rotina ou
campanha), dispensação de medicamentos, ou eventos na comunidade, como ações educacionais e de promoção à
saúde; demandas de familiares para atendimento do idoso no domicílio (consultas, curativos, vacinação etc.); integração
com os equipamentos sociais presentes no território; e realização de mutirões de saúde do idoso.
O Mutirão de Saúde do Idoso é um evento intersetorial e interdisciplinar, realizado na própria UBS ou em outro
equipamento do território, e proposto com múltiplas finalidades: educação e promoção da saúde do idoso, capacitação
de profissionais no manejo do idoso e captação do idoso para o acompanhamento, especialmente do idoso de risco
(Anexo 3).
Em todas essas oportunidades de captação do idoso, deve ser aplicado o IVCF-20 para uma primeira avaliação clínico-
funcional. Ele pode ser aplicado por qualquer profissional de saúde da APS, incluindo o ACS.

Fase 3: avaliação multiprofissional e interdisciplinar


Após a realização do IVCF-20, o idoso deve fazer uma avaliação multiprofissional e interdisciplinar, a qual é fundamental,
devido à multidimensionalidade de fatores que determinam sua saúde (Anexo 2).
A avaliação é realizada por meio de avaliação clínica tradicional, para identificação de fatores de risco tradicionais,
doenças crônicas degenerativas e medicamentos em uso, por prescrição ou automedicação; avaliação sociofamiliar, para
identificação de deficiências do suporte familiar e/ou social; e detalhamento das AVDs, para avaliação da capacidade de
realização das AIVD e ABVD.
A avaliação sociofamiliar e o detalhamento das AVDs são recomendados para os usuários com IVCF-20 com pontuação
≥7 pontos.
Quando o número de idosos captados é grande, deve ser priorizada a avaliação multiprofissional para aqueles com
pontuação ≥15 pontos.

Fase 4: estratificação de risco clínico-funcional


As informações obtidas pelo IVCF-20, avaliação clínica tradicional, avaliação sociofamiliar e detalhamento das AVDs são
suficientes para a definição do estrato clínico-funcional do idoso (estratos 1 a 10), como descrito no quadro 6.

24 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Fase 5: acompanhamento longitudinal
O acompanhamento longitudinal do idoso deve ser realizado de acordo com o estrato de risco clínico-funcional.
Os idosos robustos (estratos 1 a 3), que usualmente têm IVCF-20 ≤6 pontos, podem ter seu plano de cuidados elaborado
e implementado pela APS. Na presença de doenças crônicas degenerativas, o manejo deve seguir as recomendações das
diretrizes clínicas específicas, com atenção para as intervenções potencialmente iatrogênicas, como prescrição de
medicamentos inapropriados para o idoso.
Os idosos em risco de fragilização (estratos 4 e 5), que em geral têm IVCF-20 entre 7 e 14 pontos, devem ter seu plano de
cuidados elaborado e implementado pela APS, com exceção para as seguintes situações:
• Suspeita de incapacidade cognitiva: pontuação nas três perguntas do IVCF-20 referentes à cognição. Neste caso, os
profissionais da APS devem investigar de maneira simples essa situação, com avaliação subjetiva da cognição, que
consiste em uma conversa com o usuário, indagando-o sobre fatos simples do dia a dia e verificando com o
acompanhante se as informações procedem. Comumente, pergunta-se o que o usuário almoçou no dia anterior, qual
foi a última viagem que fez, qual foi a última vez que viu determinado filho, onde passou o último Natal, quem é o
Presidente da República, o governador do Estado e o prefeito da cidade, entre outras perguntas informais, que podem
variar de usuário para usuário, de acordo com a rotina e a história de vida de cada um. Caso ainda haja dúvida sobre o
declínio cognitivo, o idoso deve ser avaliado pela equipe especializada para definição diagnóstica.
• Presença de instabilidade postural ou quedas de repetição: o cuidado do idoso deve ser compartilhado com a equipe
especializada, caso tenha pontuação nas duas perguntas do IVCF-20 referentes à marcha.
• Presença de sarcopenia: o cuidado do idoso deve ser compartilhado com a equipe especializada, caso tenha
pontuação em algumas das quatro perguntas do IVCF-20 referentes à capacidade aeróbica e/ou muscular. A
abordagem terapêutica da sarcopenia é interdisciplinar e baseia-se na prescrição de atividade física regular e aporte
nutricional adequado, com ênfase na ingestão de proteínas e microelementos, como vitamina D.
• Suspeita de prescrição inapropriada: a prescrição inapropriada inclui a presença de medicamentos potencialmente
inapropriados (MPI) e também a ausência de prescrição de medicamentos com eficácia comprovada (medicamento
apropriado omitido – MAO). Idosos com polifarmácia (uso diário de cinco ou mais medicamentos diferentes)
apresentam alto risco de uso de MPI (30% a 50%), representando o principal sinal de alerta para declínio funcional,
internação hospitalar e óbito. Usualmente, tais idosos têm polipatologia ou internação recente (últimos 6 meses) e
apresentam maior risco de serem portadores de condições crônicas de saúde que têm tratamento medicamentoso
com efetividade comprovada, porém, sem prescrição. São casos mais complexos que necessitam da equipe
especializada para melhor definição da adequabilidade dos fármacos, conforme o estrato clínico-funcional, e
orientação sobre as melhores estratégias para desprescrição dos MPI e prescrição para os MAO. [8] Vale lembrar que,
no idoso, é mais frequente o “cuidado pobre”, que inclui tanto o sobretratamento, quanto o subtratamento das
condições de saúde.[37]
• Presença de insuficiência sociofamiliar: idosos em risco de fragilização e idosos frágeis são portadores de condições
crônicas de saúde e exigem cuidados de longa duração, normalmente prestados pela família. Torna-se, portanto,
indispensável que o suporte familiar esteja preparado para oferecer as melhores tecnologias do cuidado, capazes de
melhorar as condições de vida do idoso, com um mínimo de sobrecarga possível para o cuidador. A presença de um
bom suporte social também é indispensável nestas situações. A identificação de fatores que possam comprometer o
suporte familiar e/ou social constitui critério para compartilhamento do cuidado com a equipe especializada, que
dispõe de ferramentas mais apropriadas para suavizar o fardo do cuidador.
Assim, os idosos estratificados com risco de fragilização e que apresentam uma ou mais dessas situações devem ter o
cuidado compartilhado com a equipe especializada.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 25


Da mesma maneira, os idosos frágeis (estratos 6 a 10), que, usualmente, têm IVCF ≥15 pontos devem ser prontamente
agendados para a equipe especializada.

A gestão da condição de saúde do idoso na Atenção Primária da Saúde


O processo do cuidado deve contemplar a multidimensionalidade da saúde do idoso. Assim como a avaliação, a
intervenção também é multidimensional. Daí a necessidade de atuação interdisciplinar da equipe multiprofissional na
APS.
O acompanhamento prevê a avaliação clínico-funcional evolutiva, com estratificação de risco a cada atendimento
programado, e a elaboração, o monitoramento e a atualização do plano de cuidados ao longo do período de
acompanhamento.
Como todo usuário com condição crônica, o idoso se beneficia de atendimentos em grupo, como a atenção
compartilhada, grupos operativos e grupo de pares, com exceção daqueles com declínio funcional acentuado.
Atenção especial deve ser dada aos familiares, principalmente ao cuidador de idosos com maior dependência, para
apoio, capacitação com relação ao conhecimento e habilidades necessárias para o cuidado, e avaliação de eventual
sobrecarga. O ato de cuidar do outro exige o conhecimento da tecnologia do cuidado, além de dedicação e carinho.[19]
A equipe da APS é sempre responsável pelo acompanhamento do idoso, compartilhando o cuidado com a AAE nos casos
de maior complexidade. Devem existir mecanismos potentes de comunicação e atuação conjunta das duas equipes, para
favorecer a atenção contínua e segura para os idosos e seus familiares.
Ações preventivas
A equipe da APS deve abordar e tratar adequadamente os principais fatores de risco para as doenças crônicas
degenerativas e as condições relacionadas ao declínio funcional da cognição, do humor/comportamento, da mobilidade
e da comunicação, implementando as intervenções detalhadas a seguir.

1. COGNIÇÃO
• Estimular o máxima a reserva cognitiva, por meio de escolarização, leitura, jogos cognitivos ou qualquer atividade que
exija aprendizado e resolução de problemas (desafios cognitivos).
• Controlar os fatores de risco e doenças cardiovasculares, como diabetes mellitus, hipertensão arterial, obesidade,
inatividade física e tabagismo.
• Prevenir e tratar adequadamente a depressão.
• Prevenir e tratar o delirium.
• Evitar traumatismo craniencefálico e traumas repetitivos associados a esportes violentos.
• Evitar o uso abusivo de álcool e outras drogas, como benzodiazepínicos e drogas com ação anticolinérgica.
• Prevenir e tratar os distúrbios do sono.
• Prevenir e tratar doenças com alto potencial de dano cerebral, como sífilis, infecção pelo HIV, hipotireoidismo,
deficiência de vitamina B12 e doença renal crônica.

2. HUMOR/COMPORTAMENTO
• Diagnosticar precocemente e tratar doenças psiquiátricas e transtornos de personalidade.
• Garantir o diagnóstico precoce e o tratamento adequado dos transtornos depressivos no idoso, facilitando o acesso à
psicoterapia e a medicamentos apropriados para o idoso.

26 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


• Abordar adequadamente os indivíduos em uso prolongado de psicotrópicos, com reavaliação periódica da indicação e
da dose da medicação.
• Estimular o autoconhecimento, buscando-se a compreensão plena do sentido da vida.
• Evitar o isolamento social e estimular as atividades de lazer, socialização e participação em redes sociais.

3. MOBILIDADE

3.1 Alcance, preensão e pinça


• Prevenir o trauma e a sobrecarga no ombro, evitando-se movimentos repetitivos e inadequados, com o uso da mão
acima da linha axilar.
• Diagnosticar e tratar adequadamente o ombro doloroso e as doenças que cursam com limitação de movimentos.
• Fazer exercícios de fortalecimento do ombro e da postura adequada, que facilitam o alcance.
3.2 Capacidade aeróbia/muscular
• Realizar atividade física multimodal, constituída por exercícios resistidos, aeróbicos e de flexibilidade (tipo tai chi e
similares) de forma regular e sistematizada, por meio de prescrição e acompanhamento pela equipe de saúde:
• Exercícios aeróbios, como caminhada, dança, ciclismo, natação etc., com frequência mínima de cinco vezes na
semana, com duração de 30 minutos, de intensidade moderada (definida como aquele capaz de provocar cansaço
autorreferido), totalizando 150 minutos/semana.
• Exercícios resistidos e com carga, como musculação, carregar peso, faixa elástica etc., com frequência mínima de duas
vezes semana, com duração de 30 minutos e intensidade moderada (definida como aquela capaz de provocar cansaço
autorreferido).
• Ter dieta balanceada, constituída por alimentos in natura ou minimamente processados, garantindo o aporte calórico
adequado (carboidrato, gordura e proteína), além de micronutrientes, distribuída ao longo do dia (três refeições e dois
lanches saudáveis ao dia). Fazer ingestão adequada de proteínas de origem animal (leite, carne e ovo), com ingestão
diária de 1 a 1,2g por quilograma de peso, harmonicamente distribuídos nas principais refeições do dia (20 a
30g/refeição). Em idoso com sarcopenia, recomenda-se a ingestão diária de até 1,5g por quilograma de peso.
• Alimentar-se de maneira saudável abrange diz também respeito à possibilidade de proporcionar convivência familiar,
social e interação.
• Manter o peso adequado. Evitar obesidade ou perda de peso excessiva e sem orientação.
• Ter o aporte adequado de vitamina D e cálcio.
• Garantir a ingestão adequada de líquidos.
• Suspender o tabagismo.
• Prevenir doenças associadas à insuficiência respiratória ou cardíaca, além de manter níveis adequados de
hemoglobina (transporte de oxigênio).

3.3 Marcha
• Fazer atividade física regular, com prescrição de exercícios de flexibilidade, como dança, ioga, artes marciais,
alongamento etc.
• Identificar os fatores intrínsecos, extrínsecos e comportamentais, associados ao risco de quedas.
• Fazer adaptação ambiental.
• Usar de maneira adequada dispositivos de auxílio para locomoção, como bengalas, muletas e andadores.
• Evitar o uso de drogas associadas a risco de quedas, como benzodiazepínicos (clonazepam, diazepam etc.), sedativos,
drogas com ação miorrelaxante (orfenadrina, ciclobenzaprina, carisoprodol e tizanidina) e
SAÚDE DA PESSOA IDOSA 27
drogas associadas a parkinsonismo (antivertiginosos, antipsicóticos, metoclopramida etc).
• Evitar polifarmácia.
• Evitar hipotensão ortostática.
• Cuidar dos pés e usar calçados adequados.
• Realizar avaliação oftalmológica regular.
• Evitar traumatismo articular ou sobrecarga de peso.
• Prevenir e tratar osteoporose e fraturas por fragilidade.
3.4 Continência esfincteriana
• Evitar trauma da musculatura pélvica associada à multiparidade e ao cuidado inadequado no parto.
• Realizar exercícios uroginecológicos para fortalecimento do assoalho pélvico.
• Diagnosticar precocemente e tratar de maneira adequada as doenças do trato urinário, incluindo as doenças da
próstata.
• Evitar drogas associadas à urgência ou à incontinência urinária, como diuréticos e drogas anticolinérgicas.
• Fazer avaliação ginecológica regular.

4. COMUNICAÇÃO

4.1 Visão
• Fazer avaliação oftalmológica regular e garantir o acesso às lentes corretivas, quando necessárias.
• Diagnosticar e tratar adequadamente as doenças associadas à retinopatia, como diabetes mellitus, glaucoma e
catarata.

4.2 Audição
• Evitar exposição auditiva prolongada a ambientes ruidosos, música alta, abuso no uso de fones de ouvido e outros
traumas acústicos.
• Evitar uso de drogas associadas à ototoxicidade (aminoglicosídeos, diuréticos e etc.).
• Avaliar a função auditiva regularmente e garantir o acesso às próteses auditivas, quando necessárias.
• Avaliar e remover rolha de cerúmen, quando indicada na Atenção Primária.
A identificação e o manejo dos fatores de risco sociofamiliares e também os específicos são fundamentais. A APS deve
articular equipes, equipamentos e recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) em ações intersetoriais que convoquem também os Conselhos do Idoso, Delegacias do Idoso, Ministério Público e
outros entes (Figura 9).

28 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Fonte: Moraes et al.[38]
UTI: unidade de tratamento intensivo; CTI: centro de tratamento intensivo; SAD: Serviço de Atenção
Domiciliar; SAMU: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência; UPA: unidade de pronto atendimento;
AAE: Atenção Ambulatorial Especializada; CER: Centro Especializado em Reabilitação; CEOS: Centro de
Especialidades Odontológicas: CAPS: Centro de Atenção Psicossocial; ESF: Estratégia Saúde da Família;
PACS: Programa de Agentes Comunitários de Saúde; APS: Atenção Primária à Saúde; NASF: Núcleo de Apoio à Saúde da Família; PICS:
Práticas Integrativas e Complementares; PAEFI: Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos; CREAS: Centro
de Referência Especializado de Assistência Social; ILPI: Instituição de Longa Permanência para Idosos.
Figura 9. A integração dos sistemas de saúde (Sistema Único de Saúde) e assistência social (Sistema Único de Assistência Social) no
cuidado do idoso.

Ações de cuidado

A gestão da saúde do idoso depende de seu estrato clínico-funcional.


Idosos com os estratos de 1 a 5 podem ser acompanhados pela APS, seguindo as recomendações dispostas no quadro 7.
Quadro 7. Recomendações para o cuidado do idoso na Atenção Primária à Saúde (estratos 1 a 5).
Estrato 1 Estrato 2 Estrato 3 Estrato 4 Estrato 5
Atendimento anual e quando Atendimento semestral,
ocorrer evento sentinela e quando houver evento sentinela (quedas, internação,
(quedas, internação, mudança na mudança na prescrição de medicamentos, viuvez recente) ou
prescrição de medicamentos, conforme o grupo de risco das condições crônicas,
viuvez recente) como HAS e DM

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 29


Aplicação do IVCF-20
Avaliar o risco sociofamiliar
Suspender Revisar medicamentos em uso (prescritos e automedicação), com
medicamentos ênfase na identificação de MPI e MAO
fúteis, como Suspender medicamentos fúteis, como polivitamínicos e
polivitamínicos e reposição hormonal inapropriada
reposição hormonal
inapropriada
Revisar anualmente fatores de risco presentes

Reavaliar a doença crônica, conforme Reavaliar anualmente as condições crônicas


diretriz clínica específica da doença de saúde complexas
(comorbidade múltipla, sarcopenia ou
comprometimento cognitivo leve),
conforme diretrizes clínicas, aplicadas à
condição do idoso
Revisar Revisar
detalhadamente as detalhadamente as
AAVD AAVD e AIVD

Estimular a adesão às intervenções capazes de otimizar ou preservar os sistemas funcionais principais:


cognição, humor, mobilidade e comunicação
Garantir o acesso às intervenções preventivas primárias e secundárias e aconselhamento, conforme diretrizes
clínicas do programa de atenção à saúde do idoso:
● Rastreamento de câncer (mama, colo, útero e intestino), osteoporose e doença cardiovascular
● Imunização: anti-influenza, antipneumocócica, dupla/tripla tipo adulto, hepatite B, antiamarílica e
antizóster ● Quimioprevenção: AAS, estatina, cálcio e vitamina D
Avaliar a segurança ambiental
Elaborar e monitorar o plano de cuidados

Elaborar e monitorar o plano de autocuidado apoiado


HAS: hipertensão arterial sistêmica; DM: diabetes mellitus; IVCF-20: Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20; MPI: medicamentos potencialmente inapropriados; MAO:
medicamento apropriado omitido; AAVD: atividades avançadas de vida diária; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; AAS: ácido acetilsalicílico.

Nos estratos 6 a 10, o idoso tem seu plano de cuidados elaborado de forma compartilhada pela equipe geriátrica
gerontológica. A APS é responsável por sua implementação (Quadro 8).
Quadro 8. Recomendações para o cuidado do idoso na Atenção Primária à Saúde (estratos 6 a 10).
Estrato 6 Estrato 7 Estrato 8 Estrato 9 Estrato 10
Atendimento semestral e quando houver Atendimento quadrimestral e quando houver evento sentinela
evento sentinela ou conforme o O acompanhamento deve seguir as definições do plano de
grupo de risco das condições crônicas, cuidados elaborado de maneira compartilhada
como HAS e DM com a atenção especializada
O acompanhamento deve seguir as
definições do plano de cuidados
elaborado de maneira compartilhada com
a atenção especializada
Aplicar o IVCF-20
Avaliar o risco sociofamiliar

30 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Avaliar a sobrecarga do cuidador

Revisar os medicamentos em uso Reavaliar a dose ou a necessidade do


(prescritos e automedicação) e redefinir metas para HAS e DM, uso de medicamentos antidiabéticos ou
conforme o estrato clínico-funcional anti-hipertensivos, e de outros
medicamentos com ação preventiva
Fazer abordagem adequada das condições de saúde reconhecidas pelo IVCF-20
Reavaliar as condições crônicas de saúde complexas, aplicadas ao estrato clínico-funcional do idoso
Revisar detalhadamente as AIVD e ABVD Revisar detalhadamente as ABVD
Avaliar a segurança ambiental
Compartilhar o cuidado com a AAE e implementar o plano de cuidados
Elaborar e monitorar o plano de autocuidado apoiado ou o Plano de Autocuidado Apoiado Familiar
Reavaliar a continuidade das ações voltadas para promoção da Reavaliar a continuidade das ações
saúde e prevenção primária voltadas para prevenção secundária
Discutir com a
família as questões
associadas à
finitude e ao
cuidado paliativo
HAS: hipertensão arterial sistêmica; DM: diabetes mellitus; IVCF-20: Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; ABVD:
atividades básicas de vida diária; AAE: Atenção Ambulatorial Especializada.

Os exames complementares para os idosos devem ser solicitados com prudência, evitando procedimentos que não
agregam valor à avaliação clínico-funcional e ao cuidado longitudinal. O quadro 9 apresenta a indicação dos exames, de
acordo com o estrato de risco clínicofuncional.
Quadro 9. Exames complementares rotineiros no idoso.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 31


32 SAÚDE DA PESSOA IDOSA
CKD-EPI: Chronic Kidney Disease Epidemiology Collaboration; MDRD: Modification of Diet in Renal Disease; DRC: doença renal crônica; IECA: inibidor da enzima conversora da
angiotensina; BRA: bloqueador de receptores da angiotensina; TSH: hormônio tireostimulante; TGO: transaminase glutâmico-oxalacética; TGP: transaminase glutâmico-
pirúvica; GGT: gama GT; TIME: fatores tóxicos, infecciosos, metabólicos e estruturais; PTH: paratormônio; PSOF: pesquisa de sangue oculto nas fezes; TC: tomografia
computadorizada; PSA: antígeno prostático específico; US: ultrassonografia; ECG: eletrocardiograma; ASCVD: Atherosclerotic Cardiovascular Disease; MMII: membros
inferiores; AIT: acidente isquêmico transitório; AVC: acidente vascular cerebral.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 33


A gestão da condição de saúde do idoso na Atenção Ambulatorial Especializada
A AAE em saúde do idoso tem a função de realizar a AMI e elaborar o Plano de Cuidados Personalizado para todos os
idosos frágeis ou com risco de fragilização (e suspeita de incapacidade cognitiva e/ou instabilidade postural ou quedas de
repetição e/ou sarcopenia e/ou prescrição inapropriada e/ou presença de insuficiência sociofamiliar) identificados pela
APS e com cuidado compartilhado, com vistas à recuperação ou à manutenção da autonomia e da independência.
É organizada no Centro de Referência em Atenção Integral à Saúde do Idoso, ponto de atenção secundária na RAS,
integrado com a APS. A integração entre APS e AAE, por meio de mecanismos de compartilhamento do cuidado e da
atuação integrada das duas equipes, torna os dois níveis ou serviços de saúde, progressivamente, um único
microssistema clínico, garantindo atenção contínua e integrada.
Sua função assistencial é desempenhada por uma equipe multiprofissional, que atua de maneira interdisciplinar,
aprofundando o manejo clínico dos usuários. A carteira de serviços do ambulatório pode ser dividida em básica,
correspondente ao mínimo que deve ser disponibilizado, ou ampliada, correspondente a serviços que podem ser
implantados de acordo com a demanda, ou podem ser alcançáveis na RAS. Todos os profissionais devem,
preferencialmente, ter formação em saúde do idoso (Quadro 10).

Quadro 10. Carteira básica de serviços no Ambulatório de Atenção Especializada à Saúde do Idoso.
Profissionais responsáveis pelos ciclos de atendimento:
Médico Residência em geriatria (preferencialmente) ou formação em saúde do idoso
Especialista com experiência em medicina de família e comunidade/saúde
pública/coletiva
Enfermeiro Formação em saúde do idoso
Especialista com experiência em saúde pública/coletiva/saúde da família
Farmacêutico Especialista com experiência em saúde pública/coletiva/saúde da família
Preferencialmente com formação em saúde do idoso
Assistente social Especialista com experiência em saúde pública/coletiva/saúde da família
Preferencialmente com formação em saúde do idoso
Psicólogo Especialista com experiência em saúde pública/coletiva/saúde da família
Preferencialmente com formação em saúde do idoso
Preferencialmente com experiência em abordagem linha teórica comportamental;
cognitivo-comportamental ou sistêmica.
Nutricionista Especialista com experiência em saúde pública/coletiva/saúde da família
Preferencialmente com formação em saúde do idoso
Fisioterapeuta Especialista com experiência em saúde pública/coletiva/saúde da família
Preferencialmente com formação em saúde do idoso
Técnico em enfermagem Com experiência em saúde da família
Na carteira ampliada, estão previstos também os profissionais fonoaudiólogo e terapeuta ocupacional. Caso não estejam
incluídos na equipe do ambulatório, devem ter o acesso pactuado e garantido na RAS, para quando necessários.
As atividades assistenciais são organizadas como demonstra o diagrama da figura 10.

34 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Fonte: Matos et al.[39]
Figura 10. Função assistencial no ambulatório de atenção especializada ao idoso.

Mecanismos de compartilhamento do cuidado devem ser definidos e pactuados, tanto no fluxo de “ida” – acesso
regulado pelas equipes da APS, critérios clínicos para compartilhamento, formulários, modalidades de agendamento,
checklist para agendamento –, quanto no de “volta” – plano de cuidados, monitoramento da estabilização, retornos. A
continuidade do cuidado e a vigilância da situação de saúde dos usuários devem ser garantidas pelas equipes.
A função assistencial é desenvolvida principalmente no formato de atenção contínua, caracterizada por ciclos de
atendimentos individuais sequenciais, para avaliação clínica pelos profissionais e prescrição das condutas e
recomendações, sistematizadas em um único plano de cuidados. Inclui atendimentos e exames diagnósticos
complementares.
Todos os profissionais da equipe devem participar do primeiro ciclo de atendimentos, compondo uma avaliação
diagnóstica abrangente, e, a partir dela, elaborar o plano de cuidados adequado para a situação do idoso. Nos ciclos de
atendimento subsequentes, a participação deve seguir as definições do plano de cuidados.
A indicação dos exames especializados segue as recomendações apresentadas anteriormente, sendo observadas as

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 35


indicações de acordo com o estrato de risco. Para os idosos frágeis, a realização de exames é sempre submetida a uma
avaliação de risco e benefício para o idoso. Os exames de rotina devem ser realizados na APS, com resultados
compartilhados na ocasião do ciclo de atendimento na AAE. Os exames especializados devem ser realizados no próprio
ambulatório ou em outros serviços da RAS, com fluxos pactuados e garantidos previamente (Quadro 11).
Quadro 11. Exames complementares para avaliação do idoso.
ECG Realizado de acordo com a avaliação cardiovascular
TC de crânio sem contraste Para suspeita de doença neurodegenerativa, como as demências
Densitometria óssea Para rastreio de osteoporose
Idade entre 65 e 85 anos (mulheres) e 75 e 85 anos (homens)
Ultrassonografia abdominal Para rastreio de aneurisma de aorta
Homens entre 65 e 75 anos, com história de tabagismo
ECG: eletrocardiograma; TC: tomografia computadorizada.

O primeiro ciclo de atendimentos tem o objetivo de realizar a AMI (Figura 11).

A avaliação multidimensional do idoso, também conhecida como avaliação geriátrica ampla, é uma abordagem diagnóstica sistematizada, que reúne um conjunto
de instrumentos capazes de avaliar a funcionalidade global do idoso, os sistemas funcionais principais, os sistemas fisiológicos, os medicamentos em uso e os
fatores contextuais do idoso, com o objetivo de elaborar um plano de cuidados capaz de maximizar sua independência e autonomia, e de melhorar a qualidade
de vida do idoso e de sua família

Fonte: Moraes et al.[40]


AAVD: atividades avançadas de vida diária;
AIVD: atividades instrumentais de vida diária; ABVD: atividades básicas de vida diária. Figura 11. Avaliação multidimensional
do idoso.
A equipe especializada deve conhecer e ter habilidade para a aplicação dos instrumentos durante o ciclo de
atendimentos.

Para aprofundar sobre a avaliação multidimensional do idoso, consulte:


Moraes EN. Atenção à Saúde do Idoso: Aspectos Conceituais. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da
Saúde; 2012.

36 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Quando necessário, deve ser feita avaliação complementar por outras especialidades médicas, particularmente a
cardiologia, a endocrinologia, a neurologia e a psiquiatria.
A partir da AMI, a equipe deve elaborar o plano de cuidados (Anexo 4), instrumento que sistematiza as intervenções
preventivas, curativas, paliativas e reabilitadoras para a saúde do idoso. Tendencialmente, deve se tornar o principal
instrumento de comunicação entre as equipes.
A AMI possibilita também a avaliação da probabilidade de melhora clínico-funcional, para uma melhor definição da
continuidade do cuidado.
Os idosos frágeis, com baixo potencial de melhora funcional ou em fase final de vida, bem como aqueles em risco de
fragilização com situações complexas, devem ser redirecionados para a implementação do plano de cuidados na APS e
nos outros pontos da RAS. A equipe especializada deve fazer a transição do cuidado, organizando-se para dar o apoio
necessário aos profissionais da APS.
O idoso frágil em fase final de vida deve ser inserido em um programa de cuidado paliativo, coordenado,
preferencialmente, pela APS. Na presença de dúvidas quanto à implementação do plano de cuidados ou de
intercorrências, o idoso deve ser reavaliado pela equipe geriátrica gerontológica, seguindo o fluxo já estabelecido.
Os idosos frágeis com alto potencial de melhora clínico-funcional farão o acompanhamento longitudinal pela equipe
multiprofissional da AAE em saúde do idoso para:
• Suspensão de intervenções diagnósticas e/ou terapêuticas inadequadas.
• Ênfase na desprescrição segura de medicamentos inapropriados.
• Definição de metas terapêuticas individualizadas e compartilhadas com o idoso e sua família, respeitando o estrato
clínico-funcional do usuário (Quadro 12).
• Tratamento adequado de condições subdiagnosticadas e, consequentemente, subtratadas, comumente atribuídas à
“idade” ou à “senilidade”.
• Educação sobre as condições crônicas de saúde e como manejá-las (“autocuidado apoiado”).
• Orientações à família quanto aos cuidados com o idoso (“autocuidado apoiado”).
• Abordagem não farmacológica das incapacidades funcionais e doenças associadas.
• Manejo interdisciplinar das condições crônicas de saúde, visando ao cumprimento das metas de estabilização do idoso
frágil de alta complexidade.
• Motivação de usuários/familiares não aderentes.
• Reabilitação, dependendo da existência de estrutura e recursos humanos no local; deve ser feita preferencialmente
em outro ponto de RAS.
Quadro 12. Metas terapêuticas para o idoso.
Marcadores de fragilidade
Metas específicas Objetivos
Dimensões Funcionais Comprometidas no IVCF-20
Idade -

Percepção subjetiva da saúde regular ou ruim Percepção de melhora da saúde


pelo paciente ou pelos familiares/
cuidadores
Incapacidade para fazer compras Recuperação parcial ou completa

Incapacidade para controlar seu dinheiro, gastos ou pagar as de qualquer AIVD


contas de sua casa

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 37


Incapacidade para realizar pequenos trabalhos domésticos,
como lavar louça, arrumar a casa ou fazer limpeza leve
Incapacidade para tomar banho sozinho Recuperação parcial ou completa
de qualquer ABVD
Esquecimento percebido pelos outros Percepção de melhora cognitiva
pelos familiares/cuidadores
Piora progressiva do esquecimento Ganho de 2 ou mais pontos no
MEEM
Esquecimento que impede a realização de alguma atividade Controle dos sintomas
do cotidiano comportamentais e psicológicos
associados à demência
Desânimo, tristeza ou desesperança no último mês Remissão parcial ou total da

Perda do interesse ou prazer em atividades anteriormente sintomatologia depressiva


prazerosas no último mês
Incapacidade para elevar os braços acima do nível do ombro Redução da dor local e/ou
recuperação parcial da função
Incapacidade para manusear ou segurar pequenos objetos Melhora na capacidade de
realização de tarefas
dependentes da mão
Perda de peso não intencional Aumento de 5% no peso corporal
de 4,5kg ou 5% do
peso corporal no último ano
ou 6kg nos últimos 6
meses ou 3kg no último mês
IMC <22kg/m2

CP<31 cm Qualquer aumento na CP

Tempo gasto no teste de Aumento de 0,15m/s na


velocidade da marcha (4m) >5 velocidade da marcha
segundos
Dificuldade para caminhar capaz de impedir a realização de Melhora de 3 a 5 segundos no
alguma atividade do cotidiano TUG. Avaliação e prescrição de
prótese/órtese, conforme o caso.
Melhora na classificação da
imobilidade
Duas ou mais quedas no último ano Ausência de quedas no período de
acompanhamento
continua...

Perda de urina ou fezes, sem querer, em algum momento Melhora do controle esfincteriano
documentada pela redução
significativa da quantidade de
fraldas por dia ou necessidade do
uso da fralda somente durante
a noite

38 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Problemas de visão capazes de impedir a realização de Melhora parcial ou completa da
alguma atividade do cotidiano visão, percebida nas tarefas do
cotidiano. Avaliação e prescrição
de prótese/órtese, conforme o
caso
Problemas de audição capazes de impedir a realização de Melhora parcial ou completa da
alguma atividade do cotidiano audição. Remoção da rolha de
cerúmen. Avaliação e prescrição
de prótese/órtese, conforme o
caso
Cinco ou mais doenças crônicas Tratamento adequado das
condições crônicas de saúde, com
definição de metas
terapêuticas individualizadas e
compartilhadas com idoso e sua
família, respeitando-se o estrato
clínico-funcional do paciente
Uso regular de cinco ou mais medicamentos diferentes, todo Correção da prescrição
dia. inapropriada: desprescrição de
MPI ou fúteis e prescrição de PAO
Internação recente, nos últimos 6 meses Ausência de internações e/ou
atendimentos de urgências no
período de acompanhamento
IVCF-20: Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; ABVD: atividades básicas de vida diária; MEEM: Miniexame do Estado
Mental; IMC: índice de massa corporal; CP: circunferência da panturrilha; TUG: Timed Up and Go; MPI: medicamentos potencialmente inapropriados; PAO: medicamentos
apropriados omitidos.

Tais intervenções dependem quase que exclusivamente da presença do “olhar geriátricogerontológico” e da tomada de
decisões corretas, conforme o estrato clínico-funcional do idoso. A desprescrição é a principal ferramenta de reversão da
iatrogenia, que representa um dos maiores problemas da população idosa. Por sua vez, a reabilitação pode também
trazer ganhos funcionais exuberantes no idoso frágil e ser oferecida paralelamente às intervenções propostas. Todavia, o
processo de reabilitação é usualmente longo e exige a presença de equipe interdisciplinar e de equipamentos de difícil
acesso. Assim, pode ser realizada em outro ponto da rede, com o apoio e acompanhamento do NASF.
O período de acompanhamento é de 4 a 6 meses, com média de cinco encontros, com intervalos de 30 a 45 dias, durante
os quais as equipes de APS devem monitorar o plano de cuidados elaborado, e apoiar o usuário e sua família. É
fundamental o estabelecimento de modalidades de comunicação entre os profissionais das duas equipes, de maneira a
discutir o caso e a revisar o plano de cuidados sempre que necessário e com prontidão.
Ao final desse período, a equipe deve avaliar a possibilidade de transição do cuidado para a equipe da APS, para
continuidade do acompanhamento longitudinal do idoso, com o apoio da equipe da AAE em saúde do idoso.
Existe a possibilidade de ausência de resposta às intervenções propostas na avaliação inicial da atenção secundária após
4 a 6 meses de acompanhamento. Nestes casos, a equipe deve continuar investindo na implementação de todas as
metas específicas para cada domínio funcional comprometido. A persistência na ausência de resposta indica o
comprometimento da saúde do idoso, que pode ser reestratificado como frágil com baixo potencial de melhora
funcional. Nesse caso, deve ser feita a transição do cuidado para a APS, com metas terapêuticas voltadas para manter a
capacidade funcional e evitar o declínio funcional associado à iatrogenia.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 39


MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO

Painel de indicadores
O acompanhamento dos indicadores de processo e resultados são úteis para a avaliação da efetividade da RAS da pessoa
idosa.
O quadro 13 reúne um conjunto de indicadores de processos e resultados do cuidado da pessoa idosa. É importante que
sejam analisados para o grupo total de idosos e por estrato de risco clínico-funcional.
Quadro 13. Painel de indicadores de processo na atenção à saúde da pessoa idosa.
Indicadores de processo Definição
Proporção de Idosos captados Proporção de idosos residentes no território, cadastrados na unidade de
para o acompanhamento pela saúde e com acompanhamento regular pela equipe de saúde
equipe de saúde
Proporção de idosos com Proporção de idosos com avaliação pelo IVCF-20 e definição do grau de
estratificação de risco vulnerabilidade clínico-funcional. Esta classificação de risco é fundamental
para a indicação de avaliação geriátrico-gerontológica especializada e para
elaboração de plano de orientações para o paciente e sua família
Proporção de idosos com O plano de cuidados está indicado para todo idoso com IVCF-20 ≥15 pontos,
IVCF-20 ≥15 pontos com e deverá ser feito pelo centro de especialidades e conter lista de condições
plano de cuidados elaborado de saúde e as intervenções preventivas, curativas, paliativas e reabilitadoras
indicadas para o idoso e sua família, além de estabelecer as prioridades e as
justificativas para as mudanças, bem como o local de atendimento e a
equipe interdisciplinar necessária para seu seguimento
Proporção de idosos com A polifarmácia é definida como o uso diário de 5 ou mais medicamentos
polifarmácia diferentes e representa marcador de maior risco para reações adversas
Frequência do uso de Os medicamentos potencialmente inapropriados para idosos são os que
medicamentos potencialmente devem ser sempre evitados por existirem similares mais seguros. Os critérios
inapropriados para idosos utilizados são os especificados pelas principais listas de MPI para idosos:
Beers, STOPP/START, FORTA, Australian Prescribing Indicators Tool,
Screening Tool for Older Person’s Appropriated Prescriptions for Japanese,
Consenso Brasileiro de Medicamentos Potencialmente Inapropriados para
Idosos, McLeod/IPET, PRISCUS, EU(7)-PIM List, Lista de Taiwan e NORGEP
Taxa de encaminhamento para Mede a percentagem de encaminhamento de idosos pela Atenção Primária
consulta na atenção para as especialidades médicas diversas, excluindo o atendimento
especializada geriátricogerontológico realizado pelo centro de especialidades.
Proporção compartilhamento do Mede a percentagem de idosos frágeis com cuidado compartilhado pela APS
cuidado de idosos com IVCF-20 com equipe geriátrico-gerontológico
≥ 15 pontos com a equipe
geriátrico-gerontológica do
ambulatório de atenção
especializada
Proporção de idosos que Mede a percentagem de idosos frágeis que implementaram todas as metas
implementação das metas específicas para cada domínio funcional comprometido
terapêuticas

40 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Os indicadores de resultados sugeridos são apresentados no quadro 14. Quadro 14. Painel de indicadores de resultado na atenção
à saúde da pessoa idosa.
Indicadores de resultado
Definição

Percentual de idosos com Indica os idosos que apresentaram melhora funcional após as intervenções proposta
melhoria na pontuação no plano de cuidados
do IVSCF-20
Taxa de internação de Percentual de internações de idosos de 60 anos ou mais na população residente em
idosos determinado espaço geográfico, no ano considerado
Taxa de internações de Número de internações de idosos por causas evitáveis, causas definidas como
idosos por causas condições sensíveis à Atenção Primária, na população idosa de 60 a 74 anos, por 10
evitáveis (internações mil habitantes de mesma faixa etária, residente em determinado espaço geográfico,
por ICSAP) no ano considerado. O indicador de condições sensíveis à Atenção Primária (ICSAP),
desenvolvido por Billings et al.,[41] representa um conjunto de problemas de saúde
para os quais a efetiva ação da Atenção Primária diminuiria o risco de internações,
tais como a prevenção de doenças, o diagnóstico e o tratamento precoce de
patologias agudas, além do controle e do acompanhamento de patologias crônicas.
A lista de causas sensíveis utilizada foi a estabelecida pelo Ministério da Saúde por
meio da Portaria 221 da SAS/MS, de 17 de abril de 2008[42]
Taxa de readmissão Mede a frequência de reinternação hospitalar no período de 30 dias após a alta. O
hospitalar (todas as indicador é importante para avaliar a qualidade da preparação para a alta hospitalar
causas) dentro de 30 e o atendimento pós-hospitalar, podendo ser considerado parâmetro de avaliação
dias após a alta da continuidade do cuidado na RAS
Taxa de internação Número de internações hospitalares financiadas pelo SUS por fratura de fêmur (CID-
de idosos por fratura 10 S72), na população idosa de 60 anos ou mais, por 10 mil habitantes na mesma
de fêmur faixa etária, residente em determinado espaço geográfico no ano considerado.
Estima o risco de internação por fratura de fêmur (CID-10 S72) na população idosa
de 60 anos ou mais e dimensiona sua magnitude como problema de saúde pública
Taxa de internação de Número de internações hospitalares financiadas pelo SUS por queda em pelo menos
idosos por queda em pelo uma das causas (CID-10 W00-W19) na população idosa de 60 anos ou mais, por 10
menos uma das causas mil habitantes na mesma faixa etária, residente em determinado espaço geográfico
no ano considerado. Estima o risco de internação por quedas na população idosa de
60 anos ou mais e dimensiona sua magnitude como problema de saúde pública
Taxa de óbito domiciliar Proporção de pacientes que vieram a óbito no domicílio. Pode ser considerado um
indicador da capacidade da rede em ofertar assistência domiciliar para idosos em
cuidados paliativos
Mortalidade prematura Indica a proporção dos óbitos de idosos de 60 até 69 anos do total de óbitos de
(<70 anos) pessoas de 30 até 69 anos pelo conjunto das quatro principais DCNTs (doenças do
pelo aparelho circulatório, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas/CID10 - I00-
conjunto das I99; C00-C97; J30-J98; E10-E14), em determinado espaço geográfico, no ano
4 principais DCNTs considerado. Mede a participação dos óbitos prematuros de idosos de 60 a 69 anos,
em relação ao total de óbitos prematuros de pessoas de 30 até 69 anos. Contribui
para o monitoramento do impacto das políticas públicas na prevenção e no controle
das DCNT e em seus fatores de risco
Proporção de
autoavaliação da saúde
boa ou muito boa

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 41


Mede a satisfação idoso e de sua família em relação ao atendimento
realizado na Unidade Básica de Daúde e no centro de especialidades
Grau de satisfação do
idoso e família

REFERÊNCIAS
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42 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


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Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/sas/2008/ prt0221_17_04_2008.html

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 43


ANEXOS
ANEXO 1
Manual de aplicação do Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20 para Atenção Primária à Saúde
O Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20 (IVCF-20) avalia 20 domínios da Fragilidade Multidimensional,
e sua aplicação completa leva em torno de 5 a 10 minutos. A pontuação varia de zero a 40 pontos, de acordo
com as respostas obtidas na entrevista.

Assista a vídeos de casos reais de aplicação do IVCF-20,


bem como sua interpretação: www.ivcf-20.com.br

A pontuação a ser somada a cada pergunta está escrita próximo à resposta. Por exemplo: em “Você teve duas
ou mais quedas no último ano? (X)Sim²”, somam-se 2 pontos ao resultado, e em “Algum familiar ou amigo falou
que você está ficando esquecido? (x)Sim¹”, soma-se 1 ponto ao resultado.
Algumas considerações quanto à aplicação do IVCF-20 devem ser feitas:

1) É importante valorizar a resposta do cuidador/acompanhante para definir a pontuação de cada item, uma
vez que este (sobretudo nos casos de incapacidade cognitiva, anosognosia e/ou depressão com
desmotivação grave) fornece informação mais fidedigna do que o próprio paciente.

2) Na parte de “atividades de vida diária” (perguntas de 3 a 6), somente devem pontuar os casos em que
houver declínio funcional, ou seja, quando o idoso fazia a atividade e deixou de fazer (neste momento não
interessa o motivo pelo qual deixou de fazer a atividades de vida diária). Por exemplo, na pergunta 4, se o
idoso não controla as finanças, mas nunca o fez, ele não vai pontuar neste item.

3) No domínio Cognição, a resposta do cuidador muitas vezes será mais valorizada que a do próprio paciente,
uma vez que uma das condições mais comuns de incapacidade cognitiva na população é a doença de
Alzheimer, que leva à anosognosia, fazendo com que o paciente não se sinta “esquecido”.

4) No domínio Comunicação, o objetivo não é avaliar a presença de hipoacuidade visual ou hipoacusia, mas a
presença destes problemas em gravidade suficiente para impedir a realização de alguma atividade do
cotidiano (ainda que simples, como a leitura). Caso o idoso consiga realizar a tarefa com o uso de óculos ou
prótese auditiva, o item não deve ser pontuado.

5) No domínio Comorbidades Múltiplas, o termo “cinco ou mais doenças crônicas” se refere a quaisquer
condições crônicas. Por exemplo: se o idoso tem hipertensão, incontinência urinária, hipoacusia, quedas de
repetição e osteoartrite, ele vai pontuar.

Quanto ao “uso de cinco ou mais medicações diferentes, todo dia” devem ser levados em consideração todos
os fármacos, incluindo os conjugados (por exemplo, o comprimido de cálcio e vitamina D conta como duas
medicações), polivitamínicos, fitoterápicos, ômega-3 e outras medicações – ainda que não tenham sido
prescritas pelo sistema de saúde.

Quanto ao item “internação recente, nos últimos 6 meses”, as internações eletivas ou curtas também devem
pontuar. Observação no hospital por tempo inferior a 24 horas não deve ser pontuada.
O IVCF-20 avalia todos os domínios da funcionalidade (cognição, humor, mobilidade, comunicação e
comorbidades múltiplas), podendo ser considerado uma avaliação geriátrica ampla de rápida aplicação. É
interessante a simplificação em termos de Atenção Primária à Saúde (APS), pelo tempo que se economiza. No
entanto, o IVCF-20 não é capaz de confirmar diagnósticos mais específicos por si só. Quando o idoso pontua em
um dos domínios do IVCF-20, sinaliza à equipe de saúde que é necessário aprofundar mais na avaliação daquele
item.

44 SAÚDE DA PESSOA IDOSA


Para ilustrar:
● Se o paciente/cuidador responde ‘sim’ às duas perguntas que avaliam o humor, é imperativo que se faça, de
maneira aprofundada, o rastreio de depressão maior, pois o IVCF-20 levantou fortemente esta hipótese,
porém não é capaz de confirmá-la.
● Se o paciente/cuidador responde ‘sim’ a alguns itens do domínio ‘cognição’, é imperativa a avaliação cognitiva
por meio da avaliação subjetiva e da aplicação de testes objetivos (Miniexame do Estado Mental, Consortium
to Establish a Registry for Alzheimer’s Disease – CERAD, lista de figuras, relógio de Shulman, fluência verbal –
conforme discutido na disciplina 1), para que se confirme ou se descarte a hipótese de incapacidade cognitiva
que o IVCF-20 levantou.
● Se paciente/cuidador responde ‘sim’ na avaliação de polifarmácia (uso de cinco ou mais medicamentos), é
mandatória uma avaliação minuciosa da prescrição do paciente – muitas vezes em conjunto com o
farmacêutico clínico –, uma vez que o risco de interações medicamentosas, efeitos adversos de medicações
e/ou iatrogenia é muito elevado diante da polifarmácia.
O comprometimento desses domínios funcionais impede o indivíduo de gerir plenamente sua vida e/ou cuidar
de si mesmo, gerando a dependência funcional, também conhecida como incapacidade. As incapacidades
prejudicam sobremaneira a qualidade de vida e devem ser prontamente avaliadas na tentativa de revertê-las,
ou pelo menos estabilizá-las, antes que gerem outras incapacidades por efeito em cascata.
O IVCF-20 é um instrumento de fácil aplicação pela APS, que pode ser útil tanto para a estratificação de risco dos
idosos, quanto para o manejo clínico desta população, como pode ser visto no quadro 1.

Quadro 1. Estratificação de risco e manejo clínico do idoso baseado no Índice


de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20.
Estratificação de risco Identificação do idoso frágil por profissionais de saúde não especialistas em Geriatria
ou Gerontologia
Gestão da população de risco, com elaboração de política públicas específicas,
conforme o diagnóstico populacional
Planejamento de demanda programada, pela definição de grupo de idosos que
necessitam de atendimento diferenciado na Atenção Primária à Saúde
Definição de critérios padronizados de compartilhamento do cuidado com a Atenção
Ambulatorial Especializada em saúde do idoso
Manejo clínico Identificação de sintomas ou problemas de saúde que merecem intervenções
específicas, como a suspeita de incapacidade cognitiva (demência), transtorno do
humor, ombro doloroso e afecções das mãos, sarcopenia, emagrecimento, quedas,
alterações da marcha, incontinência esfincteriana, alterações da visão e da audição,
polifarmácia, dentre outras
Prescrição de intervenções preventivas, promocionais, paliativas ou reabilitadoras
individualizadas, conforme o estrato clínico-funcional do idoso, capazes de
melhorar a autonomia e a independência do idoso e prevenir o declínio funcional, a
institucionalização e o óbito
Estruturação e direcionamento da consulta: planejamento da consulta
especializada do idoso (idosos de alto risco), destacando as dimensões da saúde do
idoso que merecem investigação mais detalhada

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 45


Propriedades clinimétricas do Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20 As
outras propriedades clinimétricas do IVCF-20 são:
● Curva Característica de Operação do Receptor (COR): a validade concorrente é obtida pela análise
Característica de Operação do Receptor, ou simplesmente curva COR, expressa por sensibilidade,
especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo. A área sob a curva (ASC) foi de 0,903
(intervalo de confiança de 95% – IC95% 0,871-0,934), sendo substancial, uma vez que o valor foi bastante
superior a 0,50 (concordância devida meramente ao acaso). O ponto de corte obtido foi 6, sendo que, assim,
pontuações no IVCF-20 ≥7 indicam forte possibilidade de o idoso ser classificado como frágil. Para esse valor
obtido, o percentual de indivíduos classificados como corretos foi igual a 84,4%.
● Confiabilidade ou fidedignidade: é a capacidade de se reproduzir um resultado de forma consistente no
tempo e no espaço, ou com observadores diferentes. A confiabilidade é avaliada pela estabilidade
(teste/reteste), homogeneidade e equivalência interobservadores. O índice alfa de Cronbach encontrado
variou de 0,740 a 0,861, dependendo da população estudada. Isso sugere que o instrumento tem alto grau de
consistência interna, sem, entretanto, ser redundante em seus itens constitutivos.
● Equivalência ou reprodutibilidade: refere-se à concordância quando o teste é reaplicado várias vezes e por
diferentes aplicadores. É a repetitividade dos resultados ao se repetir o teste várias vezes em circunstâncias
similares. Os índices Kappa foram quase perfeitos ou substanciais para todas os itens do IVCF-20, exceção feita
ao item desânimo, tristeza ou desesperança no último mês, que obteve concordância considerada moderada.
Quanto ao Kappa ponderado quadrático para a totalidade de itens do IVCF-20, este foi de 94,4%, sendo
considerado quase perfeito. A concordância ponderada foi igual a 99,5, indicando que o instrumento pode ser
aplicado por avaliadores diferentes, sem que haja discordância significativa.
● Praticabilidade: refere-se aos aspectos práticos da utilização do instrumento, como facilidade na aplicação,
rapidez, simplicidade, baixo custo e interpretação fácil do resultado. A duração de aplicação do IVCF-20 é
rápida, variando de 5 a 10 minutos, não necessita ser feita por especialistas, e utiliza tecnologias de baixo
custo (relógio comum e fita métrica). Além da estratificação do risco de vulnerabilidade clínico-funcional e,
por conseguinte, da necessidade de avaliação por equipe geriátrico-gerontológica especializada, o
questionário fornece várias informações quanto ao estado de saúde do paciente, possibilitando a prescrição
de intervenções capazes de melhorar a qualidade de vida do indivíduo.
Sobre a velocidade de marcha
● Velocidade da marcha <0,8m/s é considerada um dos
principais marcadores de sarcopenia.
● A diminuição da velocidade da marcha tem um valor preditivo para diversos desfechos negativos, como
quedas, dependência funcional e mortalidade dos idosos.[1,2]

● A velocidade da marcha é um bom teste da integração e do funcionamento de diversos sistemas fisiológicos.


Desta forma, a velocidade da marcha é reconhecida como instrumento essencial na avaliação dos idosos.
● Para fins de triagem, sua aferição pode ser feita em qualquer ambiente, até mesmo no domicílio. Orienta-se a
marcação de uma distância de 4 metros no chão, em linha reta, com o auxílio de uma fita métrica, sinalizando
o ponto de partida e o de chegada. O idoso é orientado a caminhar esta distância com passadas um pouco
mais aceleradas do que o usual (“andando como se estivesse atravessando uma rua”), mas sem correr. Assim
que o idoso começar a caminhar, o tempo é medido com relógio comum ou cronômetro, e seu término se dá
quando o idoso atinge a marca dos 4 metros. A velocidade da marcha é calculada dividindo-se 4 metros pelo
tempo cronometrado no relógio (4/tempo em segundos).
● Normalmente, o tempo gasto para o idoso percorrer esta distância é de, no máximo, 5 segundos (equivalente
a uma velocidade da marcha de 0,8 metro por segundo).
Sobre a circunferência da panturrilha
A presença de circunferência da panturrilha (CP) <31cm traduz a presença
de redução da massa muscular.[3]

46 SAÚDE DA PESSOA
A medida da circunferência da panturrilha pode ser feita nas posições sentada ou de pé, com os pés apoiados em uma superfície plana, de
forma a garantir que o peso fique distribuído equitativamente entre ambos os lados. No idoso acamado, fletir a perna de modo que o pé fique
todo apoiado sobre o colchão (Figura 1).
A medida deve ser realizada com uma fita métrica inelástica aplicada ao redor da região que, visualmente, apresenta o maior perímetro, sem
fazer compressão. Fazer medições adicionais acima e abaixo deste ponto, para assegurar-se de que a primeira medida é a maior. Deve-se ter o
cuidado de manter a fita métrica em ângulo reto com o comprimento da panturrilha. Evitar fazer a medida no membro que apresente alguma
alteração local, como linfedema, trombose venosa profunda, erisipela, celulite, atrofia muscular, atrofia cutânea por cicatriz ou fibrose, entre
outras. É necessário também estar atento ao caso de indivíduos obesos, que podem ter circunferência da panturrilha normal ou até aumentada
mesmo na presença de sarcopenia (obesidade sarcopênica).

Figura 1. Posicionamento para a medida da circunferência da panturrilha.

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ANEXO 2
Avaliação multiprofissional e interdisciplinar do idoso na Atenção Primária à Saúde
A definição do estrato clínico-funcional pela Atenção Primária à Saúde (APS) depende da aplicação do Índice de
Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20 (IVCF-20), da realização da avaliação clínica tradicional do idoso,
sociofamiliar e da avaliação de todas as atividades instrumentais (AIVD) e básicas de vida diária (ABVD).
1. Aplicação do IVCF-20: ver manual de aplicação do IVCF-20 (Anexo 1).
2. Avaliação clínica tradicional do idoso
Consiste na realização da anamnese e do exame físico do idoso, com foco na avaliação dos sistemas fisiológicos
principais (sistema cardiovascular, respiratório, digestivo, musculoesquelético, geniturinário,
endócrinometabólico, sistema nervoso central e pele/anexos) e de outras funções orgânicas, como sono,
nutrição e saúde bucal. Deve-se ter em conta que as queixas apresentadas pelo idoso são habitualmente
subestimadas pelos familiares e por ele próprio, retardando o diagnóstico precoce. O hábito de atribuir-se toda
sintomatologia aos problemas “da idade” é amplamente aceito, inclusive pelos profissionais da área da saúde.
Diferenciar as alterações fisiológicas do envelhecimento (senescência) das doenças, disfunções e incapacidades
(senilidade) que podem se acumular com a passagem do tempo é tarefa difícil. A polipatologia é, muitas vezes,
confundida com problemas psíquicos (“paciente poliqueixoso”), dificultando mais ainda o diagnóstico precoce
dos problemas de saúde no idoso. Como regra geral, nenhuma sintomatologia causadora de limitação ou

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 47


restrição em atividades de vida diária deve ser atribuída ao envelhecimento fisiológico per si. A expressã
idade” não deve ser utilizada, até que ampla avaliação diagnóstica exclua as doenças mais prevalentes
faixa etária. Normalmente, o idoso ou os familiares procuram assistência médica após o aparecimen
doença ou da incapacidade. Com frequência, a queixa principal no momento da consulta não reflete, de f
clara e direta, a verdadeira origem do problema. Na verdade, o motivo da consulta corresponde, com
frequência, ao sintoma mais familiar ou mais facilmente reconhecido, ao que requer mais cuidado o
problema que, na opinião do paciente ou do cuidador, permite legitimar o acesso ao sistema de saúde.
sempre as condições frequentemente associadas à velhice, como quedas, incontinência urinári
incapacidade cognitiva, constituem a queixa principal, apesar de estarem frequentemente present
raciocínio clínico tradicional de explicar todos os sinais e sintomas por uma única doença (unidade diagnó
não se aplica ao idoso. A presença de comorbidades ou polipatologia altera a apresentação das doe
tornando-as atípicas, ou melhor, típicas do idoso. Na literatura médica, é comum falar-se em “apresen
atípica das doenças no idoso”. Na verdade, a apresentação é atípica somente quando o referencial é o jov
típica quando se trata do paciente idoso. Comumente, a desordem em um órgão pode se manifesta
sintomas em outros, especialmente na presença de comorbidades, de tal forma que o órgão usualm
associado a determinado sintoma é menos provável de ser a fonte do problema principal. Por exe
confusão mental pode ser manifestação de infecção urinária e não necessariamente do comprometim
direto do sistema nervoso central. Da mesma forma, a história de queda pode significar comprometimen
sistema nervoso central (delirium, demência etc.) ou ser a apresentação inicial de uma infecção respiratóri
Várias doenças podem apresentar-se com a mesma sintomatologia, como, por exemplo, fadiga, ano
insônia, emagrecimento, quedas, confusão mental, incontinência, imobilidade, síncope, depressão e
portanto, merecem ampla investigação clínica e laboratorial. Recomenda-se sempre afastar, inicialm
doenças mais graves e com maior morbimortalidade. A simplificação diagnóstica é extremamente perigo
idoso. Para um dado sintoma, as alternativas de diagnóstico diferencial variam substancialmente entre o a
jovem e o idoso. Aquilo que, no jovem, corresponde à sintomatologia típica de refluxo gastresofágico
corresponder a carcinoma gástrico ou esofágico no idoso. Por outro lado, o mesmo processo alterado po
comportar de formas diferentes nos extremos da vida. O hipertireoidismo, que no jovem se apresenta
taquicardia, sudorese e emagrecimento, no idoso pode apresentar-se somente com fibrilação atrial
fratura de fêmur por osteoporose secundária. Alterações próprias do envelhecimento podem dificu
diagnóstico. Por exemplo, presença de quarta bulha na ausculta cardíaca, sopro sistólico, edema de mem
inferiores e crepitações pulmonares não significam, necessariamente, insuficiência cardíaca. Por outro lad
presença de febre e/ou desidratação, o idoso pode evoluir rapidamente para um quadro de insufic
cardíaca aguda, pela presença de disfunção diastólica – comum nessa faixa etária. Da mesma form
polifarmácia pode precipitar ou mascarar determinados sintomas e sempre deve ser considerada como
causal na origem de qualquer sintomatologia recente, na ausência de outra causa aparente.

48 SAÚDE DA PESSOA
O exame físico do paciente idoso deve ser o mais completo possível. Todavia, por ser extremamente amplo e
variável, o mito da completude deve ser considerado. Desta forma, os procedimentos utilizados dependem do
paciente, das queixas apresentadas, do contexto da consulta e da habilidade do médico. O paciente deve ter
sua privacidade resguardada e não deve ser exposto de forma desnecessária, não havendo necessidade de ficar
totalmente despido. O ambiente deve oferecer conforto e segurança para o paciente. O divã de exame físico
deve ter largura adequada (60 a 70cm) e permitir a elevação da cabeceira para exame do pescoço. A escada de
acesso ao divã deve ser mais larga e mais baixa, permitindo que o paciente faça um giro completo de forma
segura. Macas hidráulicas, que facilitem a transferência de idosos mais frágeis e/ou cadeirantes, podem ser
úteis para reduzir o risco de quedas no consultório. Vale lembrar algumas alterações no exame físico do idoso,
que habitualmente são negligenciadas e têm grande importância na conduta clínica:
Hipotensão ortostática: cerca de um terço dos idosos apresentam hipotensão ortostática, definida como a
queda da pressão sistólica de 20mmHg e/ou da pressão diastólica de 10mmHg, quando o paciente assume a
posição ortostática, associada ou não à sintomatologia de baixo fluxo cerebral. A hipotensão ortostática é causa
frequente de “tonturas”, “labirintite”, astenia e, principalmente, quedas, com risco de fratura de fêmur ou
hematoma subdural. Torna-se, portanto, fundamental a medida da pressão arterial em três posições: deitada,
sentada e de pé, nesta sequência. Uso inapropriado de medicamentos que causam hipotensão ortostática no
idoso ou metas discordantes com o estrato clínico-funcional devem ser sempre investigados.
Presença de fibrilação atrial: a presença de bulhas arrítmicas, com fonese variável, associada à avaliação do
pulso com amplitude variável e à ausência de onda “a” no pulso venoso, sugere o diagnóstico de fibrilação
atrial, presente em cerca de 10% dos idosos. A fibrilação atrial é causa importante de acidente vascular cerebral
cardioembólico e declínio funcional, devendo ser investigada em todo idoso. Pode se apresentar de forma
assintomática, como achado casual do exame físico.
Afecções nos pés: os pés devem ser rigorosamente avaliados em todo idoso, mesmo na ausência de diabetes
mellitus. As afecções dos pés e o uso de calçados inadequados são causas importantes de instabilidade postural
e quedas no idoso. Assim, todo idoso deve ser investigado para a presença de pé equino, valgo, varo, plano ou
desabamento do arco plantar; deformidades nos dedos, incluindo o joanete, fasciíte plantar, atrofia do coxim
plantar, calosidades e artropatia de Charcot. A prescrição de calçados adequados é também de grande
importância na avaliação do idoso.
Úlceras de membros inferiores: as úlceras de pernas constituem importante problema entre idosos, são mais
comuns em mulheres e aumentam sua frequência com a idade. A causa mais importante é a estase venosa, mas
as de origem arterial também aumentam com a idade. As úlceras venosas têm localização preferencial na região
distal da perna, acima do maléolo medial. Têm formas e tamanhos variados, e o fundo mostra algum tecido de
granulação e áreas recobertas por fibrina, às vezes com secreção purulenta. A pele ao redor pode exibir sinais
de insuficiência venosa crônica, como a dermatite ocre, eczematização, e infecção localizada ou do tipo celulite
ou erisipela. Nos casos crônicos e naqueles acompanhados por vários episódios de infecção secundária,
desenvolve-se a lipodermatoesclerose, que deixa a pele inelástica, com edema duro, dificultando a cicatrização.
As lesões extensas e em atividade podem ser dolorosas, são exsudativas e podem ter odor fétido,
comprometendo a qualidade de vida.
Lesão por pressão: são intercorrências comuns no idoso. O risco aumenta para pacientes em situações críticas,
como portadores de doença terminal, tetraplégicos ou imobilizados, desnutridos, com défices mentais, com
incontinência esfincteriana e nos imunossuprimidos. As úlceras surgem na região lombossacra, calcanhares,
tornozelos e outras áreas com proeminências ósseas. São decorrentes do dano tecidual secundário à isquemia
nestas regiões, sujeitas a pressão por longos períodos. Os seguintes estágios são descritos: (1) área
eritêmatopurpúrica na pele intacta; (2) necrose superficial atingindo epiderme e/ou derme; (3) necrose
profunda atingindo toda a espessura da pele, podendo chegar até a fáscia, mas sem ultrapassá-la; (4) a necrose
se estende à fáscia subjacente, podendo atingir o músculo, o osso e os ligamentos. Em pacientes de risco,
devem-se tomar todas as medidas preventivas para se prevenir esta complicação. Assim, deve ser garantidos o
aporte adequado de líquidos e nutrientes e a mobilização frequente no leito, bem como devem-se evitar áreas
de atrito e pressão na pele, usando-se de colchões e almofadas adequados, e fazer o exame diário da pele, com
a finalidade de se detectarem lesões iniciais.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 49


Toque retal: deve ser feito rotineiramente no idoso com queixas intestinais, por sua simplicidade, rapidez,
ausência de complicações e baixo custo. Não é apanágio do urologista ou coloproctologista. É capaz de detectar
lesões das estruturas esfincterianas anorretais, massas ou pólipos retais, fecaloma, hiperplasia ou tumor
prostático, prostatite, hemorroidas, fissura anal etc.
Otoscopia: é frequente a presença de rolha de cerúmen, que pode causar surdez ou comprometer mais ainda a
hipoacusia neurossensorial, piorando a surdez em até 40 decibéis a mais e que pode ser melhorada após sua
remoção.
Saúde bucal: os profissionais da área de saúde devem estar preparados para a realização de uma boa avaliação
da cavidade bucal, particularmente em idosos frágeis. O edentulismo está presente em mais da metade dos
idosos, prejudicando a capacidade mastigatória. A qualidade do rebordo ósseo residual, entre outros fatores
locais, muitas vezes dificulta a reabilitação protética desses indivíduos. Outro problema relacionado às próteses
dentárias refere-se à sua condição de higiene. A qualidade de limpeza das próteses odontológicas dos idosos,
por motivos diversos, geralmente é considerada ruim. A limpeza de dentaduras e próteses parciais removíveis
deve ser considerada no momento da avaliação bucal. A colonização de próteses dentárias por patógenos da
cavidade bucal está relacionada a lesões de mucosa, como a candidíase. Na avaliação da cavidade bucal, deve-
se estar atento para a presença de câncer de boca. O uso de próteses por muitos anos pode ocasionar desgastes
nos dentes, fraturas e outros problemas relacionados ao uso constante. Esses problemas podem levar ao
desenvolvimento de hiperplasias e leucoplasias, predispondo ao aparecimento de lesões malignas,
particularmente quando associadas ao fumo. Em relação ao fluxo salivar, a avaliação de indivíduos idosos
saudáveis mostra que o fluxo de saliva integral estimulada não diminui com a idade. A hipossalivação é a
redução no fluxo salivar. A sensação de boca seca ou xerostomia refere-se a uma sensação subjetiva. Diversas
drogas podem reduzir o fluxo salivar, como anticolinérgicas, antidepressivos e anti-hipertensivos, entre outras.
A redução do fluxo salivar afeta funções bucais, como mastigação, fonação e deglutição. Além disso, altera o
equilíbrio do processo de desmineralização e remineralização, que ocorre entre a superfície dos dentes e o
fluido da placa bacteriana, favorecendo o desenvolvimento da cárie dentária. A doença periodontal é um
processo inflamatório provocado por bactérias que acometem os tecidos gengival e ósseo. Essa doença causa
destruição dos tecidos de suporte dos dentes (gengiva e osso alveolar) em surtos aleatórios e em sítios
específicos, podendo levar à mobilidade e à perda do elemento dental.
Nutrição: a avaliação do peso, altura e da circunferência da panturrilha são elementos fundamentais na
avaliação da saúde do idoso. No idoso, há uma mudança na definição do dos parâmetros do índice de massa
corporal, sendo considerado aceitável esse índice entre 22 e
27kg/m2. A avaliação da circunferência da panturrilha é outro parâmetro antropométrico de redução
da massa muscular (sarcopenia), devendo ser melhor investigado todo idoso com
circunferência da panturrilha <31cm. O IVCF-20 inclui a
avaliação de peso, índice de massa corporal e circunferência da
panturrilha, que deve ser realizada pelo técnico de enfermagem, enfermeiro, médico ou pelos profissionais do
Núcleos de Apoio à Saúde da Família, como nutricionistas ou fisioterapeutas. A APS deve reconhecer os
principais fatores de risco e a presença das principais doenças crônicas estabelecidas, seguindo os critérios
diagnósticos preconizados. Recomenda-se também a realização de alguns exames laboratoriais no idoso,
conforme o estrato clínico-funcional (Anexo 3).

3. Avaliação sociofamiliar
AVALIAÇÃO DA FRAGILIDADE SOCIOFAMILIAR
Sim Não Pontuação

SUPORTE Morar sozinho 2 0


FAMILIAR
Residente em ILPI 4 0

50 SAÚDE DA PESSOA
Presença de companheiro ou cônjuge 0 2

Viuvez recente, no último ano 2 0

Presença de familiares ou amigos com disponibilidade para atendêlo, 0 6


em caso de necessidade ou presença de cuidador, familiar ou
profissional, qualificado para a prestação do cuidado necessário
Você recebe visitas dos seus familiares ou amigos com regularidade? 0 2

Responsável pelo cuidado de pessoas dependentes na sua casa 2 0

20

SUPORTE Analfabetismo 2 0
SOCIAL
Beneficiário do Benefício de Prestação Continuada (BPC) 4 0

Moradia própria 0 2

Moradia em boas condições de organização e higiene 0 4

Acesso à renda própria ou de familiares próximos suficiente para 0 6


garantir a própria subsistência
Relato de participação em alguma atividade extradomiciliar ou
comunitária ou rede social, como trabalho, família, igreja, grupo de
convivência etc
20

Suporte Familiar Grave:


CRITÉRIO DE Leve: 1 a 4 Moderado:
Ausente: 0 ≥10
GRAVIDADE Suporte Social pontos 4 a 9 pontos
pontos

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 51


ILPI: Instituição de Longa Permanência para Idosos.
4. Detalhamento das atividades de vida diária
É fundamental a avaliação do funcionamento global do idoso nas atividades de vida diária, tanto avançadas
(AAVD), como AIVD e ABVD. As tarefas do cotidiano necessárias para que o indivíduo cuide de si e de sua
própria vida são denominadas “atividades de vida diária”. A realização das atividades de vida diária de forma
independente é o resultado do funcionamento integrado e harmonioso dos sistemas funcionais de cognição,
humor, comportamento, mobilidade e comunicação (Quadros 1 a 3).
O principal sintoma a ser investigado é a presença de declínio funcional. Denominamos “declínio funcional”
quando um indivíduo torna-se dependente para a realização de alguma AVD que antes era capaz de realizar
sozinho.
As ABVD são fundamentais para a autopreservação e sobrevivência do indivíduo e referem-se às tarefas do
cotidiano necessárias para o cuidado com corpo, como tomar banho, vestir-se, higiene pessoal (uso do
banheiro), transferência, continência esfincteriana e alimentar-se sozinho.
As AIVD são mais complexas que as ABVC e indicadoras da capacidade do idoso de viver sozinho na
comunidade. Incluem as atividades relacionados ao cuidado intradomiciliar ou doméstico, como preparo de
alimentos, fazer compras, controle do dinheiro, uso do telefone, trabalhos domésticos, lavar e passar roupa, uso
correto dos medicamentos e sair de casa sozinho.
As AAVD referem-se às atividades mais complexas, sejam elas produtivas, recreativas e/ou sociais.

Quadro 1. Atividades básicas de vida diária – autocuidado.


Independência Dependência

Tomar banho Requer ajuda somente para lavar uma única Requer ajuda para lavar mais de uma parte do
parte do corpo (como as costas ou membro corpo ou para entrar ou sair da banheira, ou
deficiente) ou toma banho sozinho não toma banho sozinho
Vestir-se Pega as roupas nos armários e gavetas, Veste-se apenas parcialmente ou
veste-as, coloca órteses ou próteses, não se veste sozinho
manuseia fechos. Exclui-se o ato de
amarrar sapatos
Uso do vaso Vai ao vaso sanitário, senta-se e levanta-se Usa comadre ou similar, controlado por
sanitário do vaso; ajeita as roupas, faz terceiros, ou recebe ajuda para ir até o
a higiene íntima (pode usar comadre ou vaso sanitário e usá-lo
similar somente à noite e pode ou não estar
usando suportes mecânicos)
Transferência Deita-se e sai da cama sozinho, senta e se Requer ajuda para deitar-se na cama ou sentar
levanta da cadeira sozinho (pode estar na cadeira, ou para levantar-se; não faz
usando objeto de apoio) uma ou mais transferências
Continência Micção e evacuação inteiramente Incontinência parcial ou total para micção
autocontrolados ou evacuação; controle parcial ou total por
enemas e/ou cateteres; uso de urinóis ou
comadre controlado por terceiros. Acidentes
“ocasionais”
Alimentar-se Leva a comida do prato (ou de seu Requer ajuda para levar a comida do prato (ou
equivalente) à boca. O corte prévio da carne de seu equivalente) à boca; não come nada ou
e o preparo do alimento, como passar recebe alimentação parenteral
manteiga no pão, são excluídos da avaliação
Quadro 2. Atividades instrumentais de vida diária.

52 SAÚDE DA PESSOA
Com ajuda
Atividade de vida diária Sem ajuda Incapaz
parcial
Você é capaz de preparar suas refeições?

Você é capaz de tomar seus remédios na dose certa e horário correto?

Você é capaz de fazer compras?

Você é capaz de controlar seu dinheiro ou finanças?

Você é capaz de usar o telefone?

Você é capaz arrumar sua casa ou fazer pequenos trabalhos domésticos?

Você é capaz de lavar e passar sua roupa?

Você é capaz de sair de casa sozinho para lugares mais distantes, usando
algum transporte, sem necessidade de planejamento especial?

Quadro 3. Avaliação das atividades de vida diária.


ABVD O idoso pode ser:
● Independente: realiza todas as ABVD de forma independente

● Semidependente: apresenta comprometimento de uma das funções influenciadas pela cultura e

aprendizado (banhar-se e/ou vestir-se e/ou uso do banheiro)


● Dependente incompleto: apresenta comprometimento de uma das funções vegetativas simples

(transferência e/ou continência), além de, por decorrência lógica, ser dependente para banharse,
vestir-se e usar o banheiro. Deve-se ter cuidado neste item, pois alguns idosos podem ser
independentes para todas as atividades de vida diária e ter incontinência urinária. Isto se dá pelo
fato da incontinência esfincteriana ser uma função e não uma tarefa do cotidiano ou atividade,
como as outras ABVD propostas por Katz
● Dependente completo: apresenta comprometimento de todas as funções influenciadas pela

cultura e aprendizado e, também, das funções vegetativas simples, incluindo a capacidade de


alimentar-se sozinho. Representa o grau máximo de dependência funcional
AIVD O idoso pode ser:
● Independente para as AIVD

● Dependente parcial para as AIVD

● Dependente total para as AIVD

AAVD O idoso pode ser:


● Independente para as AAVD

● Dependente parcial para as AAVD

● Dependente total para as AAVD

ABVD: atividades básicas de vida diária; AIVD: atividades instrumentais de vida diária; AAVD: atividades avançadas de vida diária.

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 53


ANEXO 3
Roteiro para organização do Mutirão de Saúde do Idoso
Rúbia Barra, Leane Carvalho e Edgar Nunes de Moraes Introdução
Levando em consideração a realização de um mutirão de saúde, ademais de idosos, o espaço físico, os fluxos, a
equipe responsável e todos os aspectos operacionais merecem atenção especial, pois tratam de medidas
essenciais para a avaliação do risco de fragilidade da população de 60 anos e mais dentro dos padrões
definidos pelo Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional 20 (IVCF-20).
Tendo em vista a complexidade dos procedimentos relacionados aos idosos e levando em consideração o
processo de planificação da Atenção Primária no município, foi elaborado este documento, com os
procedimentos operacionais relevantes, objetivando manter o processo de trabalho padronizado, com vistas a
minimizar a ocorrência de desvios durante a assistência prestada no mutirão, bem como nortear e facilitar o
planejamento das atividades a serem desenvolvidas pelos profissionais que compõem este serviço.
Apresentação
O rápido envelhecimento da população brasileira, juntamente da incorporação de novas tecnologias, exige
novas respostas deliberadas às necessidades de saúde da população idosa, capazes de manter ou recuperar
sua autonomia e independência, com qualidade, resolutividade e custo-eficácia.
A avaliação da saúde do idoso deve ser abrangente e multidimensional, feita pela utilização de marcadores de
vulnerabilidade clínico-funcional, contemplando a coleta de informações sobre todas as condições capazes de
interferir na manutenção da autonomia e na independência do idoso (funcionalidade global ou capacidade
funcional) como autopercepção da saúde, atividades instrumentais e básicas de vida diária, cognição, humor,
mobilidade e comunicação, comorbidades múltiplas, uso de medicamentos, história pregressa e fatores
contextuais (avaliação sociofamiliar, do cuidador e do ambiente).
A identificação do idoso de risco leva a orientações capazes de preservar ou recuperar sua independência e
autonomia.
O IVCF-20 é o instrumento de rastreio na Atenção Primária à Saúde (APS) que identifica o idoso com fragilidade
(idoso em risco de fragilização e idoso frágil).
O Mutirão de Saúde do Idoso é uma das estratégias de rastreamento funcional da saúde do idoso residente nas
áreas de abrangência das equipes da APS, para identificação e posterior compartilhamento do cuidado dos
idosos frágeis que se beneficiarão da Atenção Ambulatorial Especializada (AAE), restabelecendo a coerência
entre a demanda e a oferta, e otimizando a utilização dos recursos municipais. É, sem dúvida, uma estratégia
de educação que permite a capacitação, a educação e a promoção da saúde do idoso, além da capacitação de
recursos humanos e do reconhecimento do idoso de risco (estratificação de risco), indispensáveis para a
construção da Rede de Atenção à Saúde (RAS), de forma organizada e sistematizada. É realizado no município
ou na Unidade Básica de Saúde, conforme a disponibilidade de espaço e recursos humanos locais. A população
idosa adscrita é convidada a comparecer ao evento, no qual são oferecidas várias atividades de educação em
saúde e de lazer. O evento é realizado ao longo do dia, no horário das 8h às 13h. O protagonismo da equipe
das Unidades Básicas de Saúde e da gerência local é fundamental para a realização do evento, na medida em
que se busca a maior vinculação do idoso ao centro de saúde.

Executante/responsável:
Unidade Básica de Saúde
Resultados esperados: planejar, organizar, supervisionar e executar o Mutirão de Saúde do Idosos no espaço
definido pelo município (ginásio de esporte, escola e/ou nas unidades de saúde)

54 SAÚDE DA PESSOA
Materiais necessários:
● Crachá de identificação dos profissionais que participarão do mutirão
● Ficha de consolidado do número de idosos que participarão do mutirão
● Ficha IVCF-20
● Cartão do idoso
● Fita métrica
● Balança antropométrica
● Cadeiras (levar em consideração número de profissionais que participarão e idosos convidados para o
mutirão)
● Mesas
● Aparelho de som
● Microfone
● Papel higiênico para os banheiros
● Desinfetante/sabão ● Lanche (se possível) Outros materiais:

Atividades para o mutirão de avalição clínico-funcional do idoso Atividades


prévias:
● Definir território/área dos idosos que participarão do mutirão

● Definir o coordenador do mutirão

● Levantar números de idosos residentes na área

● Definir número de idosos que participarão do mutirão

● Comunicar os idosos sobre local, data e horário do Mutirão de Saúde do Idoso (tentar fazer por bloco de horas)

● Explicar aos idosos, familiares e comunidade o objetivo do mutirão

● Divulgar o Mutirão de Saúde do Idoso na mídia e em instituições (igrejas, associação de moradores etc.)

● Orientar os idosos sobre a documentação necessária para levar no dia do mutirão

● Orientar os idosos a levar os medicamentos em uso prescritos e sem prescrição

● Definir local do mutirão e visitá-lo previamente;

● Desenhar o layout/croqui do local definido, estabelecendo em qual espaço ocorrerá cada ação (estações)

● Definir equipe responsável por cada ação e um coordenador por cada ação (recepção, informações (“Posso

ajudar?”), atividades de vida diária, mobilidade etc.) e quantidade de profissionais que participarão de cada
ação/estação (serviços gerais para higienização dos banheiro, Agente Comunitário de Saúde, auxiliar
administrativo, auxiliar ou técnico de enfermagem, enfermeiro, médico, profissionais do Núcleo de Apoio à
Saúde da Família etc.)
● Reunir e capacitar todos que participarão do mutirão

Atividade principal:
● A recepção deve registrar a chegada do idoso no mapa de consolidado

● Verificar documentos trazidos pelo idoso

● Preencher nome e idade do idoso na Ficha IVCF-20

● Solicitar à equipe do “Posso ajudar?” que direcione o idoso para as estações, evitando aglomerar idosos em

uma única estação


● Nas estações, realizar a ação e registrar na ficha IVFC-20, verificando e encaminhando, por meio do “Posso

ajudar?” para a próxima estação, evitando que o idoso fique perdido


● Verificar e orientar quando concluir a última estação (procurar a Unidade Básica de Saúde?)

Estações:
Estação 1
● Autopercepção da saúde

● Atividades de vida diária

Estação 2
● Atividades instrumentais de vida diária

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 55


● Atividades básicas de vida diária
Estação 3
● Cognição

● Humor

Estação 4
● Mobilidade: verificar peso, altura e calcular índice de massa corporal; medir panturrilha; medir teste de

velocidade
● Alcance, preensão e pinça

● Capacidade aeróbica e/ou muscular

● Marcha

● Continência esfincteriana

Estação 5
● Comunicação: verificar fala, visão e audição

Estação 6
● Comorbidades múltiplas

● Verificar número de medicamentos em uso

Outras atividades:
Estação 7
Estação 8
Atividades pós-mutirão:
● Proceder ao registro dos idosos avaliados no mutirão por faixa etária (60 a 69; 70 a 79; 80 a 89 etc.) para

conhecer o perfil demográfico (prevalência dos idosos por faixa etária) e epidemiológico (idosos robustos, em
risco de fragilização, frágeis, polifarmácia etc.)
● Encaminhar os dados para a coordenação da APS

● Desenvolver/colaborar com pesquisa na área da saúde do idoso

● Compartilhar o cuidado dos idosos frágeis com a AAE

● Elaborar o plano de cuidado dos idosos, iniciando pelos frágeis

● Elaborar o plano de autocuidado apoiado dos idosos

● Acompanhar e avaliar se há melhora na autonomia e independência dos idosos após a avaliação do risco

● Definir estratégia e período (tempo) para avaliar os demais idosos do território (por microárea, uma tarde por

semana com bloco de horas etc.)


Cuidados:
● Manter a ética profissional (não divulgar nome, problemas dos idosos etc.)

● Usar Equipamento de Proteção Individual quando necessário

● Estar legalmente habilitado para as atividades propostas

ANEXO 4
Plano de cuidados
PLANO DE CUIDADOS PARA A SAÚDE DO IDOSO

Idade: CPF: Cartão SUS:


Município: Telefone:

56 SAÚDE DA PESSOA
ACS (nome): Prontuário:
Apoio comunitário (nome) (telefone)

Adesão Terapêutica:
( ) Pouco aderente - intencional_( ) Pouco aderente - não intencional_( ) Aderente

mudança: Suporte Familiar: Suporte Social:


( ) Suficiente_( ) Insuficiente ( ) Suficiente_( ) Insuficiente
IVCF-20:

saúde e estratificação de risco, outros diagnósticos, complicações, fatores de risco modificáveis e


blemas):

Circunferências Velocidade TAX:


de
marcha:
Abdominal: Panturrilha:

cm cm s ºC

tado) PA (de pé) ITB

PAD PAS PAD

mmHg mmHg mmHg mmHg

a Se glicemia > 250 Dor


mg/dl
Pós prandial: Glicosúria Cetonúria

mg/dL mg/dL

causas (não utilização de medicamentos prescritos, jejum prolongado, outros):

EXAMES COMPLEMENTARES:

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 57


5. PROBLEMAS E RECOMENDAÇÕES

PROBLEMA OBJETIVOS BARREIRAS / DIFICULDADES PRIORIZAÇÃO * RECOMENDAÇÕES

7. INTERVENÇÕES CURATIVAS E/OU PALIATIVAS (ações direcionadas a problemas específicos)

8. ENCAMINHAMENTOS E EXAMES

*Assinalar os problemas por ordem de prioridade: P1, P2, P3 (recomendável até 3 priorizações)
6. MEDICAMENTOS

Alergia medicament osa:

ORIENTAÇÕES
AQUISIÇÃO
MEDICAMENTO DOSE VIA HORÁRIO (armazenamento, administração,
G/P*
monitoramento com exames, outras):

58 SAÚDE DA PESSOA
DESPRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTOS

MEDICAMENTO JUSTIFICATIVA

*Aquisição gratuita (G) ou particular (P)

9. PROBLEMAS PRIORITÁRIOS E METAS

PROBLEMA AÇÃO META GRAU (1 a 10) INTERESSE GRAU (1 a 10) CONFIANÇA APOIO NECESSÁRIO
P1

P2

P3

10. ORIENTAÇÃO PARA SINAIS DE ALERTA

SITUAÇÃO RECOMENDAÇÃO SERVIÇO DE URGÊNCIA DE REFERÊNCIA OBSERVAÇÕES

11. PRÓXIMOS ATENDIMENTOS

APS Data: ____/____/____ Hora: AAE Data: ____/____/____ Hora:

ASSINATURAS E CARIMBOS

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 59


Profissionais responsáveis pela elaboração do Plano de Cuidados Profissional do Ponto de Apoio responsável pela avaliação e fechamento
plano de cuidados

ANEXO 5
A desprescrição na atenção aos idosos
A prescrição é toda intervenção indicada para melhorar a saúde atual (tratamento) ou futura (prevenção) do
indivíduo. A desprescrição, por sua vez, é a intervenção reversa, ou seja, consiste na suspensão de
medicamentos que podem estar causando danos atuais (medicamentos inapropriados) ou futuros
(medicamentos potencialmente inapropriados) ou que não ofereçam benefícios (medicamentos fúteis). A
redução da dose de medicamentos para ajustar a relação risco-benefício-custo e a suspensão de intervenções
não medicamentosas inapropriadas também podem ser consideradas estratégias de desprescrição. Prescrever
de forma apropriada também inclui a desprescrição de medicamentos que não são mais úteis ou que não
estão mais alinhados com as metas atuais do cuidado. Prescrição e desprescrição podem, portanto, ser
consideradas as “duas faces da mesma moeda”, pois fazem parte do processo terapêutico como um todo e,
consequentemente, têm o mesmo impacto, positivo ou negativo, na saúde do indivíduo. É o que denominamos
de dualidade terapêutica. Ambas são intervenções ativas e estruturadas, que devem ser planejadas,
monitoradas e implementadas de forma individualizada, tendo como princípio a relação risco-benefício-custo e
as preferências, desejos e expectativas do paciente, customizadas pela presença de comorbidades múltiplas,
polifarmácia, idade, expectativa de vida e vitalidade do paciente. Desprescrição é, portanto, um processo
sistemático de identificação e descontinuação de medicamentos nos casos em que os danos existentes ou
potenciais superam os benefícios existentes no contexto dos objetivos de atenção individual de um paciente,
nível de funcionamento atual, expectativa de vida, valores e preferências do paciente.
Todos os idosos podem se beneficiar da desprescrição, todavia, os idosos frágeis são os indivíduos com maior
benefício, exatamente por serem mais vulneráveis e apresentarem menor reserva homeostática e, portanto,
mais suscetíveis aos efeitos adversos dos medicamentos. Idosos robustos têm maior vitalidade, e os
mecanismos homeostáticos encontram-se mais aptos para compensar os efeitos adversos dos medicamentos.
Nestes idosos, a repercussão das alterações da farmacocinética e farmacodinâmica são menos evidentes, na
medida em que apresentam menor número de comorbidades e polifarmácia. A expectativa de vida também é
bem diferente entre eles, de forma que os idosos frágeis têm menor chance de viver tempo suficiente para
obterem o benefício de algumas intervenções preventivas, como o uso de bisfosfonatos para prevenção de
fratura de fêmur, ou o uso de ácido acetilsalicílico e estatina para prevenção de fenômenos aterotrombóticos
futuros.
Existem vários algoritmos de desprescrição, mas não há evidências claras sobre a superioridade de qualquer
um deles. O processo de desprescrição é ainda empírico para a maioria dos medicamentos. A premissa mais
importante é conhecer profundamente o diagnóstico geriátrico-gerontológico e estabelecer relação de
confiança mútua entre a equipe de saúde e o idoso e sua família. A decisão da descontinuidade deve ser
compartilhada, respeitando-se os valores, as preferências, os medos e os desejos do paciente e de sua família.
Outro fator imprescindível para o sucesso da desprescrição é a disponibilidade da equipe de saúde responsável
pela implementação do plano de cuidados, de forma a garantir o vínculo e possibilitar o acesso a todas as
terapias alternativas, caso seja necessário. A desprescrição é um processo ativo e estruturado, que apresenta
riscos, da mesma forma que a prescrição.
A desprescrição pode ser súbita ou gradual, dependendo da presença e da gravidade dos efeitos adversos do
medicamento em uso e de algumas propriedades farmacocinéticas e farmacodinâmicas do fármaco, além das
expectativas e das preferências do paciente e de sua família. A suspensão súbita está indicada quando o
paciente apresenta efeitos adversos diretamente relacionados ao fármaco e sua descontinuidade tem alta
probabilidade de reverter o quadro clínico do paciente, com melhora global de sua funcionalidade ou da

60 SAÚDE DA PESSOA
sintomatologia secundária ao uso do medicamento, como, por exemplo, hipotensão ortostática (anti-
hipertensivos), hipoglicemias e equivalentes (antidiabéticos), tonturas e fraqueza geral (hipotensão arterial
medicamentosa), incontinência urinária (diuréticos), alteração do nível de consciência e confusão mental
(benzodiazepínicos e anticolinérgicos), constipação intestinal (anticolinérgicos), retenção urinária
(anticolinérgicos, anti-hipertensivos), parkinsonismo (antidopaminérgicos, como os
antipsicóticos, antivertiginosos, metoclopramida, diltiazem etc.), dentre outros. Outros
fatores determinantes da suspensão súbita são o alto risco de aparecimento de complicações agudas, como
pode ocorrer com o uso inapropriado de anticoagulantes. A possibilidade de substituição do fármaco por
outros com propriedades farmacodinâmicas semelhantes também facilita a desprescrição súbita.

ANEXO 6
Segurança ambiental para o idoso
Escala ambiental do risco de quedas

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 61


Áreas de locomoção Desimpedidas, com barras de apoio, revestimentos uniformes, sem tapetes ou com
tapetes bem fixos
Iluminação Suficiente para clarear todo o interior de cada cômodo, incluindo degraus; interruptores
acessíveis na entrada dos cômodos
Quarto de dormir Guarda-roupa com cabides facilmente acessíveis; cadeira permitindo sentar para se
vestir; cama de boa altura (45cm)
Banheiro Área do chuveiro com antiderrapante; box com abertura fácil ou cortina firme; presença
de barras de apoio; altura adequada do vaso sanitário
Cozinha Armários baixos, sem necessidade de uso de escadas; piso seco
Escadas Revestimento antiderrapante, com marcação com faixa amarela no primeiro e último
degraus, corrimão bilateral sólido que se prolongue além do primeiro e último degraus
Uniformidade dos degraus, com altura e profundidade constantes dos espelhos
Áreas externas Irregularidades e obstáculos nos calçamentos; vasos de plantas em altura acessível, sem
necessidades de se abaixar
Fonte: adaptado de Moraes EN, Lanna FM. Avaliação Multidimensional do Idoso. Belo Horizonte: Folium; 2016.

62 SAÚDE DA PESSOA
ência que
pre). Não
, fazer a

SAÚDE DA PESSOA IDOSA 63


64 SAÚDE DA PESSOA

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