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Apresentação
Definir identidade cultural não é tarefa das mais fáceis. Então, quando se pretende entrelaçar
esse conceito com o ensino de leitura, a questão se torna mais ampla e complexa. Contudo,
vale a pena arriscar algumas considerações, trazer à baila alguns apontamentos que permitam
construir um diálogo com as propostas dos professores reunidos nesse seminário.
Nesse contexto, o propósito dessa comunicação é abrir uma perspectiva para refletir o
ensino de literatura aliada à questão do ensino-aprendizagem de leitura, mais
especificamente ao ensino de leitura como processo discursivo, considerando o aspecto
cultural para a aquisição da leitura, num possível entrelaçamento do literário com o social.
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Nessa perspectiva, o estudo das relações culturais na literatura leva em conta uma discussão
entre texto e contexto. Desse modo, o texto como forma de permanência cultural é, ao
mesmo tempo, produtor e produto da cultura. Como tal, expressa as visões de mundo
conflitantes, que se encontram e se chocam, num amplo diálogo entre umas e outras. Por isso
mesmo, a literatura é uma das dimensões culturais capazes de propiciar condições para o
desenvolvimento do indivíduo. Pode ser instrumento e meio de ensino de muitas áreas do
conhecimento além dela própria. Vale lembrar seu uso no ensino da leitura, da escrita, da
história, da filosofia, da geografia, dentre outras ciências.
Relacionado ao ensino, há, por um lado, o pressuposto de que a literatura é uma grande
reserva de cultura, percebida como ideal de formação humana. Por outro, há
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o pensamento de literatura como “arte divina”. Sendo assim, ela é um produto idealizado da
cultura. E, como tal, encontra-se acabada, seu sentido está “pronto”. Por isso mesmo persiste,
ainda, a idéia de que a literatura é uma representação simbólica, repleta de mistérios e de
dificuldades de desvendamento. A literatura tem sido tratada como um universo de signos
agradáveis que auxiliam o ensino da língua materna. A ação cultural, o exercício estético,
desenvolvido no ensino de literatura, ainda é muito precário, chegando, quando muito, a “pré-
textos” para se trabalhar a gramática na sala de aula. Assim, nessa concepção, a literatura é
tratada como uma “reserva” de modelo do tempo; os escritores não intervêm senão a título de
referência, como exemplo, sem história, modelos de bem-dizer e de bem-pensar. Visto dessa
forma os textos parecem muito mais uma introdução ao sagrado, pela exaltação do escritor,
produto acabado, feito objeto de museu.
Todavia, sabemos que a literatura, como qualquer obra de arte, é um produto de teias e efeitos
comunicativos, caminhos que se abrem para a configuração de um real sentido estimulado
pela experiência. Por isso mesmo, necessita de um destinatário, um ser concreto, com planos
vivenciais, com um olhar produzido por sua própria situação contextual, além da
sensibilidade provocada por sua cultura, que irá se defrontar com essa obra, abrindo, assim,
um caminho de diversidades e diálogo que se manifesta com uma riqueza de ressonâncias, de
forma hermenêutica, como observa Hans Robert Jauss, para quem a obra de arte se constitui
na interação autor-texto-leitor.
Vê-se, pois que, a comunicação artística supõe três elementos fundamentais: autor, obra e
público, indissoluvelmente ligados em seus papéis sociais, como nos ensina Antonio Candido.
A atividade do artista estimula a diferenciação de grupos; a criação de obras modifica os
recursos de comunicação expressiva; as obras delimitam e organizam o público. Há um jogo
permanente de relação entre os três: o público dá sentido e realidade à obra, é o espelho onde
o autor verifica a sua imagem refletida, atuando então como um elo entre autor e obra.
Observa-se que a problemática dessa literatura é que ela começa mesmo no ato da leitura,
movimento de inscrição em que a palavra é manifestação de uma ausência que ultrapassa
autor e leitor. Portanto, não há dúvida quanto à função e a importância do leitor no processo
de criação e re-criação da obra literária.
Como professores, sabemos que não basta ensinar a reconhecer as letras para formar um
leitor, ensinar a ler é desmistificar alguns conceitos, quebrar paradigmas que só contribuem
para fragmentar o ensino e, consequentemente, desvincular o indivíduo de sua cultura. O
predomínio da concepção idealista de literatura contribui para o esvaziamento de seu caráter
de veiculadora de cultura, universo que constitui um dos mais altos signos do pensamento-
linguagem do ser humano.
Vale lembrar que todas as disciplinas dão lugar para construção de valores, apropriação de
gestos e expressões que remetem ao universo cultural. O diálogo entre o eu e o outro começa
a se estabelecer a partir da experiência interdisciplinar. Dessa forma, a literatura, a história, a
geografia e todas as disciplinas devem oportunizar uma cultura de participação, em que os
educandos possam interagir como sujeitos de um tempo, de uma sociedade, de uma política,
interagindo na história como sujeitos atuantes na medida em que incorporarem experiências
de leitura.
REFERÊNCIAS
. Aula. Tradução de Leila Perrone Moisés. 7 ed. São Paulo: Cultrix, 1978.
NOVAIS, Adauto. O olhar. 7 ed. São Paulo: Companhia das letras, 1988.