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Cultura, Arte, Música e Cosmovisão Cristã

Não peço que tires do mundo, e sim que os guardes do mal. Eles não são do mundo,
como também eu não sou. Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade. - João
17.15-17

Introdução

O cristão e a cultura, uma relação de amor e ódio. De apreço e de desprezo. De


excessos e equilíbrios.
Quando pensamos em produtos culturais, vem a questão: Será que nós cristãos
podemos consumir a cultura popular como um todo? Existem limites?
E a subcultura criada no meio evangélico? É boa?
Quais os cuidados que precisamos ter em relação a consumo dos produtos culturais?
Há um significado teológico nas manifestações culturais?
Existe neutralidade cultural?
A cultura e a graça comum, qual a relação?
Precisamos atentar ao cuidado dos excessos: a anorexia cultura e a glutonaria
cultural.
Encontrar o equilíbrio entre o excesso e a abstenção.

1. O conceito de cultura

Precisamos ter em vista que o advento da internet foi o potencializador da expansão


da cultura popular em todo o mundo. Porém, o que de fato é cultura?

Conceituar cultura é importante, visto que com a compreensão correta podemos


recuperar o conceito de cultura na criação.

Etimologicamente, a palavra provém do latim colere, que significa cultivar. A


expressão cultivar é a que vai originar a expressão cultura. Mas cultivar o que?

Bom, D. A. Carson, citando dois pensadores, A. L. Kroeber e C. Cluckhon, nos dá


uma explicação do que é a cultura:
“A cultura consiste em padrões, explícitos e implícitos, de comportamento
adquirido e transmitido por símbolos, constituindo a realização distintiva
de grupos humanos, inclusive sua expressão em artefatos; o núcleo
essência da cultura consiste em ideias tradicionais (i.e.. derivadas e
selecionadas ao longo da história) e, especialmente nos valores a elas
associados; sistemas culturais podem ser considerados, de um lado,
produtos de ação, de outro, elementos condicionados de ação posterior”.
(p. 13)

O Michael Horton, no seu livro O Cristão e a Cultura, utiliza o termo no seu sentido
mais amplo, referindo-se tanto à cultura popular (esportes, política, música popular
e diversões etc) como à alta cultura (a horticultura, a literatura, as artes e a ciência,
a música clássica, a ópera, etc).

Isto é, cultura é tudo aquilo produzido pela humanidade, seja no plano concreto ou
no plano imaterial, desde artefatos e objetos até ideais e crenças.

Cultura, assim, é todo e qualquer esforço e trabalho humano feito no cosmos para
descobrir suas riquezas e fazê-las assistirem o homem (ou seja, auxiliarem) para o
enriquecimento da existência humana para a glória de Deus. (Henry Van Til)

Cultura é obra humana, é a relação do homem com a criação e mudança o


desenvolvimento que este homem faz com a criação para a glória de Deus. A ideia
do Coram Deo.

E aqui vem um ponto importante, não criamos nada do nada. Sempre criamos a
partir de algo. Cultivar a criação de Deus para criar algo. Um sub-criador a partir
da criação de Deus.

Cultura não necessariamente é má. Ela começa com o objetivo de glorificar a Deus.
Porém, como posto acima, ela é obra humana, e nós humanos somos maus por causa
da queda, logo, a cultura por si só não é má, mas a intenção pecaminosa do coração
humano pode transformá-la em algo mau.
Podemos entender isto em termos práticos quando entendemos que que a cultura
não é somente questão artística, mas é tecnologia, linguagem, etc. Sendo assim, na
bíblia nós temos elementos culturais na sua concepção. Elementos estes que não são
pecaminosos.

E aqui quero abrir um parêntese para compreendermos o que é pecado. Pecado é


uma quebra do padrão estabelecido por Deus para suas criaturas.

Cultura é todo complexo de conhecimentos e toda habilidade humana empregada


socialmente para o bem de outros.

E cultura pop?

Cultura pop (ou cultura popular) se refere a um conjunto de ideias, atitudes,


imagens, fenômenos e outros elementos culturais que são amplamente difundidos e
apreciados por grande parte da população, geralmente através de meios de
comunicação de massa, como a televisão, o cinema, a música, a internet e as redes
sociais.

A cultura pop é caracterizada por sua capacidade de se renovar constantemente,


incorporando elementos de outras culturas e criando novos padrões e tendências.
Ela abrange uma ampla gama de manifestações culturais, incluindo filmes,
programas de TV, videogames, música, moda, quadrinhos, memes e outras formas
de entretenimento e arte.

Embora a cultura pop seja muitas vezes criticada por ser superficial ou comercial,
ela também tem sido vista como uma forma de resistência e subversão, que desafia
as normas e valores estabelecidos pela sociedade e abre espaço para a diversidade e
a criatividade.

Por isto precisamos encontrar uma forma sadia de se relacionar com estes produtos
culturais. Entender como glorificar a Deus com isto.
2. Cristo, o Cristão e a cultura: a tipologia de H. Richard Niebuhr

Veja, a relação do cristão com a cultura pop pode variar de acordo com as crenças
e convicções pessoais de cada indivíduo.

Alguns cristãos podem ver a cultura pop como uma influência negativa, que
promove valores contrários à sua fé e moralidade, enquanto outros podem apreciar
a cultura pop como uma forma de entretenimento e arte, desde que seja avaliada e
selecionada cuidadosamente.

Muitos cristãos veem a cultura pop como uma oportunidade de compartilhar sua fé
e valores com o mundo, usando a arte e a mídia para transmitir mensagens positivas
e inspiradoras.

Por exemplo, músicos cristãos podem usar a música pop para transmitir sua
mensagem de amor e esperança, enquanto escritores cristãos podem criar histórias
e personagens que promovam valores cristãos como a bondade, a justiça e a
honestidade.

Por outro lado, alguns cristãos podem escolher evitar a cultura pop em geral, a fim
de se proteger de influências negativas e se concentrar em seu relacionamento com
Deus e sua comunidade de fé. Essa abordagem pode ser especialmente importante
para aqueles que estão lutando contra vícios ou tentações específicas relacionadas à
cultura pop.

No geral, a relação do cristão com a cultura pop é uma questão pessoal e complexa,
que deve ser abordada com discernimento e sabedoria, avaliando cuidadosamente
as influências e mensagens transmitidas pela cultura popular em relação à fé e
valores cristãos.

Sobre a relação de Cristo, o cristão e a cutlura, uma das abordagens mais completas
acerca desta temática foi feita por H. Richard Niebuhr no clássico Cristo e Cultura,
escrito em 1951 e considerado “um dos livros cristãos de maior influência do século
passado”, e que ainda continua produzindo impacto no ambiente da teologia; prova
disso é que os estudos de autores recentes utilizam-se do livro de Niebuhr como
ponto de partida, a exemplo de Cristo & Cultura: uma releitura (D. A. Carson), O
cristão e a cultura (Michael Horton) e A igreja na cultura emergente (organizado
por Leonard Sweet).

Cristo e Cultura, como afirmara o próprio Niebuhr, é na verdade um ensaio, sobre


“a constante luta que a Igreja enfrenta, em dois planos – com o seu Senhor e com a
sociedade cultural (com que vive essencialmente associada)”, como parte do
resultado de muitos anos de estudo, reflexão e magistério, que tem o propósito de
apresentar respostas cristãs típicas ao problema e assim contribuir para a
compreensão mútua dos várias do conflito.

O Niebuhr aborda a relação entre Cristianismo e civilização, apresentando a sua


estrutura tipológica composta de modelos explicativos, não sem antes relembrar que
esse problema não era novo, visto que a perplexidade cristã tem sido perene e que o
problema tem atravessado os séculos.

Ele também recorda que as repetidas lutas dos cristãos com este assunto não
produziram uma resposta cristã única, exclusiva, mas apenas uma série de respostas
típicas que, em seu conjunto, para a fé, representam fases da estratégia da Igreja
militante no mundo.

De acordo com Niebuhr, cultura é, em primeiro lugar, o “ambiente artificial e


secundário” que o homem sobrepõe ao natural.

Ela abrange a linguagem, hábitos, ideias, crenças, costumes, organização social,


artefatos herdados, processos técnicos e valores.

Esta “herança social”, diz Niebuhr, esta “realidade sui generis”, que os escritores do
Novo Testamento tinham sempre em mente quando falavam do “mundo”, que é
representada em muitas formas, e a que os cristãos como os demais homens estão
inevitavelmente sujeitos, é o que queremos significar quando falamos de cultura.
(p.33)

Em segundo lugar, cultura é realização humana:

“Nós a distinguimos da natureza pelo fato de vermos nela evidências de


esforço e propósitos humanos. Um rio é natureza, um canal é cultura; uma
peça bruta de quartzo é natureza, uma flecha é cultura; um gemido é
natural, uma palavra é cultura. Cultura é a obra de mentes e mãos
humanas. É aquela porção de herança do homem em qualquer lugar ou
tempo que nos foi legada intencional e laboriosamente por outros homens,
e não o que nos tem vindo por intermédio de seres não humanos ou através
de seres humanos que agiram sem intenção de resultados ou sem o controle
do processo. Ela inclui, portanto, linguagem, educação, tradição, mito,
ciência, arte, filosofia, governo, lei, rito, crença, invenções e tecnologia.
Além do mais, se uma das marcas da cultura é o fato de ela ser o resultado
de realizações humanas passadas, a outra está no fato de que ninguém
pode se apoderar dela sem esforço e realização de sua própria parte. Os
dons da natureza são recebidos como são comunicados, sem intenção ou
esforço consciente do homem; mas os dons da cultura não podem ser
possuídos sem o empenho da parte do receptor. A linguagem deve ser
laboriosamente adquirida; o governo não pode ser mantido sem esforço
constante; o método científico deve ser reencenado e reorientado em cada
geração. Mesmo os resultados materiais da atividade cultural são inúteis,
a não ser que sejam acompanhados de um processo de aprendizado que
nos capacite a usá-los com propriedade. Quer tentemos interpretar os
sinais da cultura antiga ou resolver os problemas da civilização
contemporânea, esta feição característica sempre despertará a nossa
atenção: estamos lidando com aquilo que o homem produziu
intencionalmente e com aquilo que o homem pode ou deve fazer. O mundo,
na medida em que é feito pelo homem e orientado pelo homem, é o mundo
da cultura”.

Na sequência Niebuhr apresenta, baseado na sua análise histórica, os possíveis tipos


de relacionamento que os cristãos podem ter com a cultura: Cristo contra a cultura,
Cristo da cultura, Cristo acima da cultura, Cristo e a cultura em paradoxo e Cristo,
o transformador da cultura.

Vejamos cada um desses modelos para que possamos entender a questão dos
excessos:
a) Cristo contra a cultura:

Esse primeiro tipo de relacionamento com a cultura foi comum entre os primeiros
cristãos. A igreja primitiva, conforme Niebuhr, era ensinada a obedecer a Cristo,
amar aos seus irmãos e a rejeitar o mundo, a exemplo do que se vê na exortação da
primeira epístola de João: “Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se
alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele”. Por isso, os cristãos são
ensinados a deixarem a sociedade secular, seu materialismo e concupiscência, a fim
de se preocuparem com a cidadania celestial.

Segundo Niebuhr o representante mais explícito do relacionamento do tipo Cristo-


contracultura no Cristianismo dos primeiros tempos, à parte dos escritores do Novo
Testamento, foi Tertuliano. Em sua oposição ao pensamento secular, Tertuliano
perguntou: “O que tem Atenas a ver com Jerusalém?”.

Como podemos perceber, esse modelo é exclusivista e eminentemente


contracultural, em que se traça uma nítida separação entre a fraternidade dos filhos
de Deus e o mundo, isto é, a sociedade fora da igreja. Outros exemplos desse tipo de
relacionamento incluem os anabatistas do século 16, os cristãos Quakers, amish,
monastérios etc.

Apesar das críticas, Niebuhr diz que “estas fugas e rejeições cristãs das instituições
da sociedade têm sido, na história, de grande importância, tanto para a Igreja como
para a cultura.

Elas têm mantido a distinção entre Cristo e César, entre revelação e razão, entre a
vontade de Deus e a vontade do homem. Elas têm provocado reformas tanto na
Igreja como no mundo, muito embora não fosse este o seu propósito. Eis porque
homens e movimentos desta espécie são sempre celebrados pelo seu heróico papel na
história de uma cultura que eles rejeitaram” (p. 90).

E qual o problema deste tipo de ação em relação a cultura? A criação de uma


subcultura.

O movimento fundamentalista americano, como reação à atitude liberal da igreja


com a cultura. Então defendiam que o cristão deveria se abster disso. Isto nos anos
60, 70, 80 chegando aos 90.
Nós hoje ainda encontramos isto em alguns grupos, seja de forma leve, moderada
ou até mais rígida.
Isto gera um medo da cultura, e acaba gerando uma subcultura, a cultura gospel.
A questão do reducionismo. Cria-se uma espécie de Anorexia cultural.
É um movimento monástico.

b) O Cristo da cultura:

Em oposição ao primeiro modelo, o Cristo da cultura advoga a acomodação e


aceitação pelos cristãos ao ambiente cultural vigente. Aqui, busca-se a harmonização
entre Cristo e a cultura, de modo que “não haja tensão entre Igreja e mundo, entre
as leis sociais e o Evangelho, entre as operações da divina graça e o esforço humano,
entre a ética da salvação e a ética da preservação ou progresso”.

Historicamente, esse tipo de relacionamento foi advogado pelo gnosticismo – que


insistia em interpretar o Cristianismo como uma religião e não como uma igreja
(entendida como simples associação religiosa), e Jesus como mais um deus, e não o
Senhor da Vida – e posteriormente pelo liberalismo teológico, propriamente
chamado de Protestantismo Cultural.

Aqui teríamos uma entrega sem filtro (Glutonaria cultural).

Estamos mais expostos ao excesso do consumo da cultura pop.

Neste ponto também podemos destacar o Cristo acima da cultura, esta categoria
(Cristo acima da cultura) rejeita as posições extremas anteriores e busca uma
situação de centralidade (a Igreja do centro, como afirma Niebuhr), que seria a
majoritária na história da igreja. É uma visão tipo dualista.

Essa posição afirma a “dupla cidadania”. Para os dualistas, a questão fundamental


não é a linha que deve ser traçada para estabelecer separação entre os cristãos e o
mundo pagão ou secular, mas entre Deus e toda a humanidade. Nesse caso, nenhuma
esfera deverá reger a outra, e nem atacar a outra. São somente esferas distintas de
atuação, com propósitos diferentes

Desse modo, lei, Estado, e outras instituições são “como freios e diques contra o
pecado, impedidores da anarquia, e não como agências positivas através das quais
os homens em união social prestam serviço aos próximos, avançando rumo à vida
verdadeira. Além disto, para. os dualistas, tais instituições pertencem inteiramente
ao mundo temporal e passageiro”.

Niebuhr afirma a presença do dualismo em Paulo, Marcião e Lutero.

c) Cristo, o transformador da cultura:

Temos aqui a categoria do tipo conversionista, em que a cultura deve ser levada
cativa ao senhorio de Cristo.

Niebuhr diz que “o efeito da teoria de cultura do conversionista sobre o seu


pensamento acerca da criação é considerável. Ele descobre lugar para uma resposta
ordenada e afirmativa da parte do homem criado à obra criativa e ordenadora de
Deus, muito embora a criatura possa fazer de má vontade a sua obra, na medida em
que carpa o solo, cultiva a sua mente e organiza a sua sociedade, e muito embora
possa administrar perversamente a ordem que lhe foi dada com sua existência”.

Ao explicar a posição do autor, Michael Horton diz que a soberania de Deus


desempenha um papel importante nessa abordagem.

Porém, os cristãos transformacionais também não querem simplesmente “batizar”


a cultura secular, mas transformar o mundo tornando-o melhor.

São exemplos desse tipo para Niebuhr, Agostinho, Calvino e F. D, Maurice.

Embora – como já afirmado – a obra de Niebuhr seja um dos livros cristãos de maior
influência do século passado e apesar de ainda continuar sendo usada (a obra) como
referência na atualidade, várias críticas têm sido direcionadas à sua abordagem.

Michael Horton (p. 46) diz que ela tende ao reducionismo, colocando vários
movimentos ou indivíduos em categorias nitidamente demarcadas, numa espécie de
manipulação da própria tipologia.

De igual modo, D. A. Carson, apesar de reconhecer alguns pontos fortes no livro,


critica o fato de Niebuhr eliminar seletivamente da sua tipologia alguns movimentos
religiosos que considera inaceitáveis ou sectários (arianos, mórmons, p. ex.), ao
tempo em que não elimina nenhum ramo do gnosticismo “cristão” ou até mesmo do
liberalismo teológico.

Além disso, Carson diz que o modo como Niebuhr utiliza as Escrituras é
insatisfatório e acrescenta que alguns dos seus personagens exemplificativos não
condizem com as categorias nas quais foram alocadas.

Por seu turno, Leornard Sweet sustenta que Niebuhr desenvolveu seu estudo em um
momento histórico em que a igreja tinha um lugar de muito mais honra na mesa,
muito diferente do atual contexto de secularização, pós-religiosidade e pós-
cristandade.

3. Cultura e Escrituras Sagradas

Um dos princípios bíblicos é que Deus é o criador de todas as coisas, incluindo a


cultura, e que todas as coisas boas vêm dele (Tiago 1:17). A cultura, portanto, pode
ser vista como uma expressão da criatividade humana que reflete o dom de Deus de
criar e produzir.

No entanto, a Bíblia também alerta contra seguir as normas e valores da cultura que
estão em desacordo com os princípios e valores de Deus. Romanos 12:2 diz: "Não se
conforme com este mundo, mas transforme-se pela renovação da sua mente". Isso
significa que os cristãos devem avaliar a cultura e discernir quais aspectos são
compatíveis com a vontade de Deus e quais precisam ser rejeitados.

Além disso, a Bíblia também enfatiza a importância de viver em comunidade e de


amar o próximo, independentemente de sua cultura ou origem étnica. Em Atos
17:26-27, Paulo ensina que Deus criou todas as nações e estabeleceu as fronteiras de
seus territórios, para que os homens pudessem buscar a Deus, mesmo que buscassem
tateando.
Em resumo, a Bíblia não condena a cultura em si, mas orienta os cristãos a discernir
e avaliar a cultura à luz dos valores e princípios de Deus, e a buscar viver em amor
e comunidade com todas as pessoas, independentemente de suas culturas ou origens.

A definição do modo ideal como o cristão deve se relacionar com a cultura requer
uma reflexão baseada nas Escrituras Sagradas, considerando sobretudo os três
elementos fundamentais da cosmovisão cristã: Criação, Queda e Redenção. Essa
tríade contraria o pensamento dualista (secular-sagrado) e fornece os elementos
necessários para a construção da perspectiva cristã, além de servir de base para
avaliar outras cosmovisões.

De certo modo, como defende Michael Horton (p. 47), as Escrituras parecem
evidenciar a necessidade de misturar dois tipos de paradigmas: “Cristo e cultura em
paradoxo” e “Cristo, o transformador da cultura”, porque este mundo é do Pai
Celeste, e no entanto, aqui não é meu lar. Com efeito, ao longo do Antigo Testamento
aprendemos que há dois reinos: a Cidade de Deus e a Cidade dos Homens, de modo
que o reino e a cultura de Deus estão unidos enquanto a nação espelha o reino de
Deus; mas quando Israel quebrou a aliança, os dois reinos mais uma vez foram
divididos. No Novo Testamento – diz Horton – Jesus afirmou que “agora o meu reino
não é daqui” (Jo 18.36), os crentes colocam suas esperanças numa pátria melhor,
celestial (Hb. 11.16).

Nada obstante, somos também admoestados a evitar ver a cidadania num reino
como antítese completa da cidadania e participação no outro, afinal o próprio Paulo
afirma: E não vos conformeis com este mundo (paradoxo) mas transformai-vos pela
renovação do vosso entendimento (Rm. 12.2). Aliás, a palavra “mundo” possui
vários significados na Bíblia. Kosmos, no grego, pode denotar a terra (mundo físico)
(Mt 13.35; Jo 21.25; At 17.24); o gênero humano (mundo demográfico) (Mt 5.14; Jo
1.10; 3.16; 3.17); a atual condição da humanidade em oposição a Deus (mundo caído)
(Jo 7.7; 8.23; 14.30; 1Co 2.12; Gl 4.3; 6.14; Cl 2.8). Portanto, o cristão precisa
estabelecer a correta relação com essas diferentes concepções de mundo.

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