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2011

APOLOGÉTICA CRISTÃ
UMA ANÁLISE CONTEMPORÂNEA
“... antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando
sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão
da esperança que há em vós, fazendo-o, todavia, com mansidão e
temor..." 1 Pedro 3:15-16

PASTOR SAULO NOGUEIRA


CENTRO DE FORMAÇÃO TEOLÓGICA-CEFORTE
15/10/2011
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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO_____________________________________________________ 03
DEFINIÇÃO E CONSIDERAÇÕES INICIAIS________________________________ 04

A LÓGICA, A VERDADE E A FILOSOFIA_________________________________05


ANÁLISE EPISTEMOLÓGICA (GNOSIOLOGIA)__________________________ 06

ASPECTOS HISTÓRICOS E TEOLÓGICOS________________________________ 10


ELEMENTOS APOLOGÉTICOS DA TEOLOGIA NATURAL___________________ 11
ARGUMENTOS DA EXISTÊNCIA DE DEUS_____________________________ 12
EXPOENTES HISTÓRICOS________________________________________ 15

TEODICÉIA_______________________________________________________ 19

“EVIDÊNCIAS QUE EXIGEM UM VEREDICTO”____________________________ 21


ELEMENTOS DE CRÍTICA BÍBLICA_________________________________ 21
TESTES DE CONFIABILIDADE HISTÓRICA____________________________ 23

A DIVINDADE DE JESUS CRISTO______________________________________ 28


CITAÇÕES DOS EVANGELHOS_____________________________________ 28
DISCURSOS DE JESUS CRISTO NO EVANGELHO DO JOÃO_________________ 32

BIBLIOGRAFIA_____________________________________________________ 36
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Introdução
“O que é a apologética Cristã?”

A palavra "apologia" vem de uma palavra grega que significa "dar uma defesa".
Apologética Cristã, então, é a ciência de dar uma defesa da fé Cristã. Há muitos céticos
que duvidam da existência de Deus e/ou atacam a crença no Deus da Bíblia. Há muitos
críticos que atacam a inspiração e inerrância das Escrituras. Há muitos falsos
professores que promovem doutrinas falsas e negam as verdades básicas da fé Cristã. A
missão da apologética Cristã é combater esses movimentos e promover o Deus Cristão e
a verdade Cristã.
O versículo chave para a apologética Cristã é provavelmente 1 Pedro 3:15-16:
"antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando sempre preparados
para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós, fazendo-
o, todavia, com mansidão e temor..." Não há nenhuma desculpa para um Cristão ser
completamente incapaz de defender sua fé. Todo Cristão deve ser capaz de pelo menos
dar uma apresentação razoável de sua fé em Cristo. É claro, que nem todo Cristão
precisa ser um especialista em apologética, no entanto, deve saber o que acredita, por
que acredita, como compartilhar sua fé com outras pessoas, e como defendê-la contra
mentiras e ataques.Um segundo aspecto de apologética Cristã que é ignorado com
freqüência é a primeira parte de 1 Pedro 3:16: "fazendo-o, todavia, com mansidão e
temor..." Defender a fé Cristã com apologética nunca deve envolver ser rude, furioso ou
desrespeitoso. Enquanto praticando apologética Cristã, devemos tentar ser fortes em
nossa defesa e ao mesmo tempo imitar a humildade de Cristo em nossa apresentação. Se
ao ganharmos um debate levamos uma pessoa ainda mais longe de Cristo pela nossa
atitude, perdemos o verdadeiro propósito da apologética Cristã.

Apologética Cristã é simplesmente apresentar uma defesa básica da fé Cristã e


da verdade àqueles que delas discordam, é um aspecto necessário da vida Cristã. Somos
todos comandados a estarmos prontos e equipados a proclamar o Evangelho e defender
nossa fé (Mateus 28:18-20; 1 Pedro 3:15). Essa é a essência da apologética Cristã.
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1. DEFINIÇÃO E CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A ―apologética‖ relaciona-se à ―defesa‖. A palavra vem do grego apologia, e a idéia é


a de ―defender-se mediante um ataque‖. Por isso, nos dias no NT, era comum ser usada no
sentido de defesa perante um tribunal. Isto está explícito em 2 Tm. 4:16. Talvez esta idéia
também esteja presente em 1 Pe. 3:15-16:

―... Antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração; e estai preparados para
responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em
vós, tendo uma boa consciência, para que, naquilo em que falam mal de vós, como de
malfeitores, fiquem confundidos os que blasfemam do vosso bom procedimento em Cristo‖.

A Apologética, como ciência ou disciplina teológica, tem uma abrangência muito maior
do que aparenta. Vê-se, de antemão, que a apologética não se relaciona à organização ou
criação de dogmas ou ―leis‖ teológicas. Pelo contrário, procura defender o pensamento
fundamental do cristianismo frente às questões ou investidas dos que pensam de forma distinta.
Como o cristianismo tem um posicionamento muito específico acerca de alguns temas, tais
quais: o cosmos, o homem, Deus, o pecado, Cristo, etc., cabe hoje à apologética cristã dispor
de meios, argumentos, que corroborem o pensamento bíblico sobre tais temas. Assim, em
última análise, a apologética seria uma defesa do pensamento teológico bíblico cristão, e que
envereda pelos diversos campos do conhecimento.
Há quem afirme que a apologética é usada no evangelismo. Isto é verdade a partir do
momento em que o Evangelho é questionado quanto à sua veracidade como ―fé‖ verdadeira.
Aprenderemos que, por definição fundamental, a ―verdade‖ não é relativa, pois se assim
fosse estaríamos admitindo o pensamento de que há ―verdades‖ que se sustentam, baseadas
na cosmovisão de quem as vê. Fundamentalmente, a disciplina da Apologética cuidará em
defender o cristianismo, e não expô-lo. Porém, é certo que, principalmente nos dias atuais,
torna-se quase inevitável uma defesa do cristianismo no ato de sua exposição, pois à medida
em as culturas globalizam-se, um sentimento paralelo de identificação e auto-afirmação
religiosa está cada vez mais latente, principalmente em sociedades em que o Estado
confunde-se com a Religião.
Devemos ter ciência plena de que o Cristianismo é lógico e verdadeiro, e que o vácuo
deixado por outras ―soluções‖ religiosas para o homem, é completa e perfeitamente
preenchido pelo Cristianismo bíblico. Daí a importância de sabermos também, o que pensam
os grupos religiosos, tanto sobre os conceitos fundamentais do pensamento religioso, bem
como sobre o próprio Cristianismo. A forma como expusermos o Cristianismo fará muita
diferença. Cada vez mais, faz-se necessária uma defesa que englobe concepções acerca de
temas e questões para as quais, à princípio, não há um aparente posicionamento bíblico claro
e direto. Problemas modernos, peculiares, os quais ―exigem‖ que conheçamos mais acerca
do mundo que nos rodeia. Isto, apesar de amplamente aceito no meio evangélico
contemporâneo, não o era há algumas décadas atrás. Os missionários, por exemplo, não se
contextualizavam. Os teólogos, muitas vezes construíram um sistema sistemático do qual
alguma coisa, ou até muito do que fora construído, tinha mais a ver com a sua com a sua
concepção filosófico-religiosa, que por sua vez tinha raízes na realidade sócio-político-
econômica de seus dias, do que na verdadeira teologia bíblica. ―Apologética Cristã‖,
portanto, não é atacar o alheio, criar teologia; é fundamentalmente, ―responder a razão da
esperança que há em nós‖.
APOLOGÉTICA CRISTÃ
Conceitos Fundamentais e Análise de Questionamentos Contemporâneos
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2. A LÓGICA, A VERDADE E A FILOSOFIA

Antes de analisarmos alguns questionamentos contemporâneos, ou mesmo falarmos


sobre alguns aspectos da história da Apologética, é importantíssimo que discorramos sobre
alguns conceitos fundamentais. Para tal, temos que lembrar em que tipo de sociedade
vivemos atualmente. Hoje, vivemos em um mundo cada vez mais ―pluralista‖. Este conceito
está presente, embora muitos desconheçam-no objetivamente. A pluralização, como modus
operandi em uma sociedade tem como causa uma construção de pensamento-lógica-verdade,
que advém de décadas, ou séculos. Observando a situação sob uma perspectiva histórica,
estamos culminando, há alguns séculos, à relativização da verdade ―moral‖. Observemos que
todos as discussões sobre relativização da verdade giram, de fato, em torno de conceitos
morais. Para entendermos isto hoje, precisamos discorrer um pouco sobre lógica e verdade.
A lógica está fundamentalmente ligada ao conceito de realidade. Negar a realidade é
admitir, por exemplo, que tudo é ilusão (pensamento hindu). Seria anular o ―ser‖, o que por
si só é uma contradição, haja vista que ―ser real‖ é sinônimo de ―existir‖, e vice versa. Logo,
em última análise, a negação da realidade é ilógica. Tem-se por definição de ―ilusão‖ o que
se segue: ―Ilusão é a percepção enganosa da realidade‖, isto é, o seu ―oposto‖. Ora, se a
negação da realidade é ilusão absoluta, o princípio fundamental da lógica, sobre o qual se
constrói o pensamento, anula-se; pois só haveria ilusão com a contraposição do seu oposto,
isto é, a realidade. Logo, é lógico concluir que é ilusão crer que a realidade é ilusão.
Atendo-se a este conceito nós podemos construir, baseados nas leis do pensamento, um
sistema ao qual podemos chamar de verdadeiro. Mas, o que é a verdade? Normam Geisler e
Peter Bocchino assim a definem: ―A verdade em si é a expressão ou símbolo ou declaração
que corresponde ao seu objeto ou referente. Nosso sistema deve ser, portanto, REAL, isto é,
baseado na realidade, para que seja verdadeiro. E é aí que está a grande questão de uma
sociedade pluralista: Se a verdade é relativa, qual ou quais sistemas são verdadeiros? A
resposta comum a esta pergunta seria: NENHUM, e, ao mesmo tempo, TODOS. ―Nenhum‖,
pois a verdade de tal sistema não teria aceitação universal. ―Todos‖, pois, para aqueles que o
defendem, tal sistema é ―verdadeiro‖. Porém isto é uma proposição que, de acordo com a
lógica, se auto anula. A ―lei do terceiro excluído‖, uma das leis fundamentais da lógica,
afirma que algo é ―A‖ não é ―-A‖. A não pode ser igual a ―A‖ e ao mesmo tempo a ―-A‖.
O filósofo e matemático francês, Blaise Pascal, levou a razão humana ao seu limite.
Pascal afirma ser impossível uma comprovação científica da existência de Deus. Para Pascal,
tudo estava baseado na fé e na experiência (do coração). Para Pascal, uma vez que é
impossível comprovar cientificamente a existência de Deus, devíamos nos sujeitar a uma
hipótese razoável, que viria a ser conhecida como a ―Aposta de Pascal‖. Pascal afirma: ―Ou
Deus existe, ou Ele não existe‖, e propõe que nós apostemos. Apostar que Deus existe, seria
para o filósofo, uma modesta entrega da razão. Porém, optar que Ele não existe é arriscar a
perda da vida e da felicidade eternas. Para Pascal, o valor da aposta é mínimo, comparado
com o prêmio a ser ganho: Se aquele que apostou na existência de Deus, acertar ganhará
tudo. Se errar, não perderá nada. Em contrapartida, se aquele que apostou na não existência
de Deus acertar, não ganhará nada. Se errar, perderá tudo.

É fato, porém, que nem tudo o que real é verdadeiro. Porém, tudo o que é verdadeiro é
real. Aqui, a ordem dos fatores altera o produto. A astrologia é algo real, porém será
verdadeiro? A questão é seguir um caminho que leve à realidade verdadeira. Este é o
objetivo de quem se preocupa com os conceitos fundamentais do Cristianismo, e com as
questões polêmicas que nos cercam hoje em dia, para as quais, infelizmente, não temos
1 – Pluralismo: pensamento filosófico que admite uma visão relativa da verdade.
2 – GEISLER, Normam – Fundamentos Inabaláveis, p. 21
3 – A Lei do Terceiro Excluído afirma que uma coisa não pode ser, ao mesmo tempo, A e –A, ou seja, algo e o seu oposto.
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Conceitos Fundamentais e Análise de Questionamentos Contemporâneos

resposta justamente por não sabermos o que é verdadeiro quanto a tais questões. Por
exemplo: será lícito, de acordo com os preceitos cristãos, a eutanásia? Por quê?
Nossa tarefa como líderes, pensadores, instrutores e evangelistas, não é ficar
procurando questões para confrontá-las com o que cremos, mas, estarmos prontos para
analisar tais questões sob a ótica do que conhecemos da teologia bíblica, e das áreas do
conhecimento do pensamento humano. Há quem afirme que aquele que faz Teologia e
Filosofia será melhor teólogo do que aquele que só faz Teologia. Isto é questionável; porém,
uma coisa é fato: quanto mais conhecemos sobre o pensamento humano, mais ferramentas
temos para construir um modelo apologético conciso e livre de ―furos‖.

2.1 ANÁLISE EPISTEMOLÓGICA (GNOSIOLOGIA)

―Epistemologia‖ é a disciplina acadêmica que se preocupa em investigar e validar


como verdadeiras as muitas visões da realidade. A palavra vem do grego episteme =
―conhecimento‖, e “logia = ―tratado‖ ou ―discurso‖. Efetivamente, a lógica em si mesma
pode dizer o que é falso, mas não o que é verdadeiro. A Epistemologia preocupa-se com a
natureza do raciocínio correto em relação à verdade, e do processo de se conhecer o
verdadeiro. Trata do ―modo‖ que justifica nossas convicções, e testa se as mesmas traduzem-
se em conhecimento. O conhecimento da verdade, segundo alguns estudiosos da Filosofia,
advém do que chamam de ―princípio da unidade da verdade‖, que pode ser resumida por
coerência. O estudo proposto no livro de Geisler e Bocchino, admite uma análise baseada no
trabalho de Mortimer J. Adler (―Os Grandes Livros do Mundo Ocidental‖), cujo enfoque
principal é a premissa de que a verdade é um todo harmonioso constituída de muitas partes.
Tais partes, porém, diferem quanto ao método pelo qual a mesma é descoberta.
O que Geisler e Bocchino sugerem é que façamos uma análise comparativa das
―verdades‖ existentes na nossa realidade. Através da coerência, e de sua contraposta, a
correspondência, tenhamos um modelo no qual tais declarações da verdade possam ser
testadas. A tarefa é monumental. Citando Geisler:

―Os primeiros princípios que buscamos são os pontos de partida fundamentais, ou


verdades auto-evidentes das disciplinas acadêmicas: ciência, direito, história e ética. Se
conseguirmos que cada parte da lente intelectual represente algum atributo essencial da
natureza da realidade, então a lente intelectual passará a ser o padrão pelo qual devemos
testar todas as declarações de verdade acerca do mundo‖.

Esta idéia está ilustrada pela experiência do cilindro. Dependendo de nossa perspectiva
(cosmovisão) do cilindro, veremos ―verdades‖ diferentes, como segue:

Fig. 1 – Perspectiva lateral do cilindro – Correspondência: retângulo.

Fig. 2 – Perspectiva linear do cilindro – Correspondência: círculo.

Fig. 3 – Perspectiva de profundidade – Correspondência: cilindro.


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Conceitos Fundamentais: Cosmovisões

Quando afirmamos que as três perspectivas são diferentes, e que trazem situações
completamente diferentes, não podemos dizer que ―são a mesma coisa‖, pela lei
fundamental do ―terceiro excluído‖. O cilindro não é um círculo, ou um retângulo.
Aquelas realidades (pois são produzidas pelas diferentes perspectivas) produzem falsas
―verdades‖. A perspectiva de número 3 nos dá uma idéia melhor do que é realmente a
figura. Deus, por sua vez, vê o objeto por inteiro, sua perspectiva é diferente da nossa:

Deus Deus

Deus Deus

As religiões vêem o mundo, e têm suas idéias, a partir de sua cosmovisão. Como
as cosmovisões têm contrapontos, ou seja, idéias opostas, logo uma cosmovisão
corresponde realmente à realidade. Lembre-se de que para uma cosmovisão ser
considerada verdadeira, todos os aspectos inerentes à mesma têm de ser reais, e
corresponderem exatamente à verdade que a realidade suscita. Um quadro com algumas
das principais correntes filosófico-teológicas, extraído do livro de Geisler e Bocchino,
pode ser visualizado logo abaixo. Tais correntes vêm com suas respectivas
correspondências (―verdades‖) sobre determinados assuntos, que são amplamente
debatidos nos círculos acadêmicos:

ATEÍSMO PANTEÍSMO TEÍSMO


Verdade Relativa. Não há Relativa a este A verdade absoluta
absolutos. mundo. existe.
Cosmos Sempre existiu. Não é real, mas Realidade criada.
ilusão.
Direito Relativo. Relativo a este Absoluto, objetivo e
Determinado pela mundo. revelado.
humanidade. (Ética
situacional)
Mal Ignorância humana. Não é real, mas Coração egoísta.
ilusão.
Ética Situacional. Relativa, transcende Absoluta, objetiva e
o bem e o mal. prescritiva.

Sabemos que negar a verdade é negar a realidade. Ora, isto é o que alguns
filósofos chamam de conceito autofrustrante. Logo, quaisquer espécies de agnosticismo
são quase que imediatamente descartados como não coerentes, pois, rejeitar o
conhecimento da realidade pode ser, em última análise, rejeitar o conhecimento da
verdade. Se assim for, a pergunta ―A verdade pode ser isto OU aquilo?‖ fica ―sem
resposta‖, o que é uma impossibilidade filosófica.
9 – Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã - Vol. I, pg. 135
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Conceitos Fundamentais: Cosmovisões

2.1.1 - A Enciclopédia Histórico Teológica traz quatro tipos básicos de ―ateus‖, a


saber:
(a) clássicos,
(b) dogmáticos,
(c) filosóficos e
(d) práticos.

Os primeiros são, por definição, os que se opõem à idéia de um Deus de uma


nação específica, ou de um povo. Assim, os cristãos eram ―ateus‖, por não aceitarem os
deuses pagãos, e conservarem a idéia de um Deus específico. Os ―dogmáticos‖ são os
negam absolutamente a existência da divindade. Os ―naturalistas‖, principalmente os
franceses do século XVIII são ateus dogmáticos clássicos. Apóiam-se bastante na idéia
evolucionista. Os ―filosóficos‖ opõem-se à idéia de um Deus pessoal e auto consciente.
Os últimos, chamados de ―práticos‖, não afirmam necessariamente que Deus não existe,
mas vivem como se Deus não existisse. Este é o mais comum tipo de ateísmo. Alguns
célebres ateus foram: Nietzsche, Freud, Karl Marx e Jean-Paul Sartre.

2.1.2 - E quanto aos ―panteístas‖?


Bem, os panteístas, basicamente, confundem Deus e sua Criação. Um
ressurgimento de tal idéia está presente em praticamente todas as linhas de pensamento
new age. Há diferentes sub tipos de pateísmo (no Hinduísmo, Zen Budismo e New Age),
porém, todos concordam com a unidade do Universo com a Divindade. Deus é
completamente impessoal, e o Universo é a sua manifestação. Bem e Mal são ilusões, e
a Ética transcende tais princípios.

2.1.3 - Os ―teístas‖ são os que não apenas crêem em Deus, mas o vêem como
Causa primeira do Cosmos. Deus é pessoal, no ―teísmo‖ (contrastando com o ―deísmo‖,
que radicaliza a transcendência divina, em detrimento de sua imanência). Deus é a causa
do bem, e o coração humano (realidade) é a causa do mal. A Ética é absoluta, pois
advém de Deus, ou seja, de suas normas ou daquilo que está estabelecido por Deus
como Moral, Amoral e Imoral. Nesta concepção está inserido o Cristianismo bíblico, e
sua cosmovisão parte também destas premissas.

2.1.4 - O problema com as cosmovisões, efetivamente, recai no correto


entendimento das mesmas. Não se muda um conceito apenas apresentando-se outro. O
conceito que apresentarmos tem de estar corretamente fundamentado; aquele que for
oposto ao correto, precisa ter descoberto seus conceitos, fundamentalmente errôneos,
descobertos. Para isso, sob uma perspectiva filosófica, que ora é o caso, faz-se mister
reconhecermos bem os princípios fundamentais do pensamento, para que não
incorramos em erros fundamentais. Muitas das questões não respondidas por cristãos
genuínos não estão necessariamente no desconhecimento dos preceitos da ―fé
doutrinária‖ (é verdade que isto acontece), mas, muitas vezes está na ignorância dos
conceitos fundamentais do pensamento, pois, tal desconhecimento produz questões
erradas. O trecho a seguir foi extraído na íntegra do livro Geisler, e corrobora o
pensamento exposto:

―Fazer perguntas certas depende de nossa capacidade de conhecer e utilizar com


propriedade os preceitos gerais (os primeiros princípios) relacionados ao problema específico

9 – Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã - Vol. I, pg. 135


APOLOGÉTICA CRISTÃ 9
Conceitos Fundamentais: Cosmovisões

que se está discutindo. Lembre-se de que quando as crenças tornam-se convicções, o aspecto
pessoal introduz um diálogo em que as emoções podem aprofundar-se muito! (...)
Uma pergunta de princípio pode catapultar uma conversa do nível
emocional e subjetivo para o nível racional e objetivo. Questionar princípios em vez de
crenças pessoais a fim de comprometer as pessoas com conceitos, e não com convicções, faz
diferença!(...)

Agora, você vai encontrar um aluno chamado Tom que está irritado porque não se
conforma com a sua crença aparentemente absurda em Deus. Ele mal pode esperar a
oportunidade de constrangê-lo na frente de outros alunos interessados em ouvir mais a
respeito de sua fé. Um dia... Tom decide sentar à sua mesa e dizer:
- Você se importa se eu lhe fizer algumas perguntas?
Você reage dizendo que as perguntas são bem vindas. Tom então pergunta:
- Jesus não disse em Mateus 19:26 que para Deus todas as coisas são
possíveis?
- Sim – você responde.
Tom continua:
- Você acredita que Deus é todo poderoso e pode fazer tudo?
Novamente a sua resposta é positiva. (...)
- Certo. Deus pode criar uma rocha tão grande que ele próprio não possa
levantá-la? (...)
Vamos retornar à pergunta de Tom e aplicar a ela o que aprendemos com o uso
correto da LNC. Tom quer que Deus crie uma pedra tão grande que o próprio Deus não a
possa erguer. O que Tom na verdade está pedindo para Deus fazer? Para saber, precisamos
definir e esclarecer o emprego das palavras de Tom. A primeira pergunta que vem à mente é:
―De que tamanho é a pedra que Tom quer que Deus crie?‖. Bem, Tom quer que Deus crie
uma pedra tão grande que seria impossível ao próprio Deus movê-la. -...) Mesmo que Deus
criasse uma pedra do tamanho do universo em expansão constante, Deus ainda seria capaz de
erguê-la e controlá-la. (...) Mas, uma vez que Deus é infinito, ele teria de criar uma rocha de
proporções infinitas! Esta é a chave: Tom quer que Deus crie uma pedra, e uma pedra é um
objeto físico, finito. Como pode Deus criar um objeto que é finito por natureza e dar a ele um
tamanho infinito? Há alguma coisa terrivelmente errada na pergunta de Tom. Então vamos
aplicar corretamente a LNC para analisá-la.
É lógica e concretamente impossível criar uma coisa finita fisicamente e fazer que ela
seja infinitamente grande! Por definição, uma coisa infinita, não criada, não tem limite, e
uma coisa finita, criada, tem. Conseqüentemente, Tom acabou de perguntar se Deus pode
criar uma pedra infinitamente finita, isto é, uma pedra que tem limites, e ao mesmo tempo e
no mesmo sentido, não tem limites. A pergunte dele, portanto, viola a LNC e vem a ser
absurda. Tom achava que estava fazendo uma pergunta muito importante, que poria o cristão
num grande dilema. Em vez disso, ele apenas conseguiu mostrar a própria incapacidade de
pensar com clareza.
Agora que temos entendimento claro da pergunta de Tom, é só uma questão de
formular uma pergunta de princípio a fim de que o erro dele se revele. Que tal esta: ―Tom,
qual o tamanho da pedra que você quer que Deus crie? Se você me disser o tamanho dela, eu
lhe direi se ele pode criá-la‖. Bem, podemos continuar perguntando até que as respostas se
aproximem do tamanho do universo e finalmente introduzam a idéia da infinitude. Uma vez
que Tom chegue ao ponto em que comece a enxergar o que está realmente pedindo para
Deus fazer – criar uma pedra infinita –, é necessário mostrar-lhe que está pedindo que Deus
faça algo logicamente irrelevante e impossível. Deus não pode criar uma pedra infinitamente
finita assim como não pode criar um círculo quadrado. Ambos são exemplos de

10 – LNC: Lei da Não-Contradição – Princípio da Lógica sobre o qual se baseia todo o pensamento. Quando se confrontam idéias
ou afirmações, admite-se que as idéias têm opostas. P. ex.: Para o Hinduísmo o mal é uma ―ilusão‖. Para o Cristianismo o mal é
―real‖. Se uma declaração do mal está correta, a outra necessariamente deve ser falsa. É uma lei ―auto-evidente‖, ou seja, no ato de
nega-la o indivíduo passa a utilizá-la.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 10
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

impossibilidades intrínsecas. Comentando sobre a impossibilidade intrínseca e um Deus todo


poderoso, C. S. Lewis disse:

―É impossível [ou intrinsecamente impossível] em todas as condições e em todos


os mundos e para todos os agentes. “Todos os agentes” aqui incluem o próprio Deus. Sua
onipotência significa poder para fazer tudo o que é intrinsecamente impossível. Pode-se
atribuir milagres a ele, mas não absurdos.
Nem toda a pergunta que se faz é automaticamente significativa apenas por ser
uma pergunta. A pergunta pode parecer significativa, mas devemos testá-la com os primeiros
princípios para verificar a sua validade. Seja cuidadoso, portanto, não apressado demais para
responder às perguntas.‖

3. ASPECTOS HISTÓRICOS E TEOLÓGICOS

3.1 – ELEMENTOS APOLOGÉTICOS NA TEOLOGIA NATURAL

Tradicionalmente, a Teologia Natural nunca foi aceita pelos protestantes, de um


modo geral, por causa de sua definição histórica. Diz-se de verdades sobre Deus que
podem ser aprendidas a partir das coisas criadas, porém, somente através da razão. A
Reforma e o protestantismo florescem no século XVI, e a fé torna-se um ponto central
na Teologia. A doutrina da ―Justificação pela Fé‖ é conhecida como o pilar maior do
Luteranismo. Os teólogos protestantes dividiram a ―Revelação‖ de Deus em duas,
basicamente: Geral e Especial. A Revelação Geral aplica-se às coisas criadas. O texto
base é Rm. 1:20-21. Os católicos romanos, desde Tomás de Aquino, têm alternado sua
atenção quanto ao uso da Teologia Natural. De fato, Tomás de Aquino foi seu
idealizador (do conceito tradicional). Aliou o conhecimento teológico com à Filosofia
grega, numa tentativa de justificar o uso da razão humana na busca do conhecimento de
Deus.
Os teólogos protestantes, de um modo geral e principalmente os reformados
calvinistas, tendiam a objetar completamente a Teologia Natural, por causa do conceito
de ―Depravação Total‖ da raça humana. Argumenta-se que o homem originalmente
tinha a capacidade racional dada por Deus de conhecê-lo, porém a mesma fora
completamente perdida na Queda. Esta concepção tem se mantido mais ou menos geral
no meio protestante, com algumas mudanças pragmáticas de conceito. Porém, Calvino
argumentou sobre o ―senso divino‖ que todo o homem tinha, e que não havia sido
aniquilado completamente todo o saber do homem sobre Deus. É fato que o
conhecimento dos homens acerca de Deus está corrompido (degenerado), e que pela
razão somente, o homem é incapaz de receber a Graça salvadora, a glorificação e muitos
outros aspectos pertinentes à Revelação Especial; a fé seria, desta forma, fundamental
para o alcance da salvação.
Nosso objetivo aqui transcende tal discussão teológica, e foca-se nos aspectos
mais modernos do que podemos chamar de ―Teologia Natural‖, cujos resultados
pragmáticos têm se distanciado da definição tradicional. Entendemos que tal Teologia é
importante, como são importantes os famosos argumentos da existência de Deus. É fato
que a Bíblia jamais se mostra como um livro que tenta provar a existência de Deus.
Começa afirmando no seu início: ―No princípio criou Deus os céus e a terra...‖ (Gn.
1:1). Porém, na medida em que a Revelação de Deus progride, a Bíblia defende o uso da
fé como meio para se chegar a Deus e agradá-lo: ―Ora, sem fé é impossível agradar a

11 – GEISLER, N. ; BOCCHINO, P. – Fundamentos Inabaláveis, pgs. 66, 67


APOLOGÉTICA CRISTÃ 11
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

Deus, pois é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que
é galardoador dos que o buscam‖ (Hb. 11:6). A palavra ―crer‖ (gr. Pisteo) tem dois
aspectos básicos em sua definição, a saber:
- Crer racionalmente. Tem-se fé em quem se conhece, em quem se sabe. E a fé
não é algo ―cego‖, mas confiança baseada em um entendimento naquilo que se crê.
- Crer em um sentido mais subjetivo. Esvaziamento daquele que tem fé e a
colocação do objeto da fé no coração.

Note que um não pode vir sem o outro, pois o termo é definido por estas duas
variantes básicas. Tal forma no NT está muito presente no evangelho de João, por
exemplo. Cremos que o ―senso divino‖, ou qualquer que nome tenha, é algo real,
havendo no homem um sentimento, ainda que longínquo e terrivelmente distorcido,
acerca da existência de Deus. Prova disto é a espiritualidade inerente no ser humano,
verificável em todas as sociedades indistintamente, que resultam em alguns em algumas
formas religiosas específicas, estudadas pela história das religiões (na Antropologia
cultural). Alguns padrões de crenças e práticas religiosas apontam para um
conhecimento perdido ao longo da História, e que inclusive, é utilizado pelos
protestantes em missões ao redor do mundo inteiro (idéias quanto a um Deus Supremo,
uma Queda, uma Idade de Ouro no passado, um Dilúvio, vários temas sobre a salvação
da alma). Se aliarmos os aspectos práticos (não conceituais) da Teologia Natural, à
análise expositiva da revelação especial de Deus, podemos descobrir formas e
acrescentarmos meios interessantes ao estudo da Teologia Cristã.

3.2 – ARGUMENTOS DA EXISTÊNCIA DE DEUS

Antes de passarmos efetivamente aos argumentos, lembramos a sua limitação


quanto à exposição correta da pessoa de Deus, o que somente pode ser visto, e portanto
experimentado, com a revelação das Sagradas Escrituras. Tais argumentos, porém, têm
seu valor, pois servem como ―prova‖ de que, ao menos, o homem tem um ―senso
divino‖, e o está utilizando.

3.2.1 – O Argumento Ontológico foi primeiramente esboçado por Agostinho,


e desenvolvido por Anselmo de Cantuária (1033-1109), tido de acordo com Champlin,
como ―o maior filósofo do século XI‖12. Anselmo argumentou que Deus é um ―ser a
respeito de quem nada de maior pode ser concebido‖. Deus não poderia existir apenas
no pensamento, pois, desta forma seria uma contradição. Se não, vejamos: Se Deus
existe apenas no pensamento do homem, ele é verdadeiro, mas não é real, pois de fato
não existe. Porém, conhecer a Deus leva-nos a pensar automaticamente na sua
existência. A idéia de Deus somente tem coesão com a sua existência, o que está
intimamente ligado na própria definição de Deus. Se Deus é o ―ser de quem nada de
maior pode ser concebido‖, aquele que crê que Deus não existe poderia dizer: ―Posso
pensar num ser perfeito que não existe‖, em outras palavras, a pessoa estaria afirmando
poder pensar em um algo maior do que aquilo de quem não se pode conceber coisa
maior, o que é, obviamente, absurdo. Alguns matemáticos como Descartes, Spinoza e
Leibniz trabalharam suas idéias sobre o argumento ontológico. Porém, alguns outros o
criticaram, como Kant afirmando que ―a necessidade incondicional de um julgamento
não forma a necessidade absoluta da coisa‖. A idéia é simples: uma proposição pode

12 – CHAMPLIN, R. N. – Enc. de Bíblia, Teol. e Filosofia – Vol. I, pg. 265


APOLOGÉTICA CRISTÃ 12
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

ser lógica, sem ser necessariamente verídica. A história do argumento ontológico,


conforme nos diz Hoover, tem tido uma história tempestuosa, ora sendo extremamente
elogiado por uns, ora sendo criticado por outros. Esta abordagem também é conhecida
como a priori, pois focaliza a causa, enquanto que os outros argumentos (Cosmológico,
Teleológico) ressaltam o desígnio e são, portanto chamados de a posteriori.

3.2.1.1 – René Descartes (1596-1649) foi matemático e filósofo, e é tido como o


―pai do racionalismo‖. Seu sistema filosófico é conhecido pelo ―Estudo do Método‖, e
tem como ponto de partida a dúvida. Da dúvida, Descartes vai ao reconhecimento da
alma, e daí às famosas ―provas da existência de Deus‖. Tal pensamento está baseado no
argumento ontológico, e pode ser exposto subdividio: a posteriori e a priori.
Descrevendo ―O Espírito, Deus e o Mundo‖, em Descartes, Padovani afirma 13:

―As provas que Descartes dá existência de Deus se podem reduzir


substancialmente a duas. Uma, chamada a posteriori, parte da idéia de perfeito, à qual
chegaríamos, segundo Descartes, partindo da nossa imperfeição. Visto que essa idéia
não pode derivar coisas, que são certamente limitadas, nem de nós, que somos
imperfeitos, tem que derivar de um ser perfeito, isto é, de Deus; pois deve haver
adequação entre causa e efeito. A segunda prova é a priori, e pode formular-se mais ou
menos como o velho argumento ontológico. Pelo fato de haver na nossa mente a idéia e
um ser perfeitíssimo, este deve também existir,isto é, dever ter a perfeição da existência,
ou então, diversamente, não seria mais perfeito. Logo Deus existe.‖

3.2.2 – O Argumento Cosmológico inevitavelmente (principalmente nos dias


atuais) irá relacionar-se, de uma forma ou de outra, com a ciência moderna. Há alguns
anos atrás muitos, como Einstein, acreditavam que o Universo (gr. Kosmoj) era uma
entidade auto existente e eterna. Isto foi amplamente questionado após a verificação na
década de 20 de que o Universo está, de fato, se expandindo, acelerando. Ora, uma
entidade auto existente é, inerentemente, eterna. Pelo fato de o Universo não estar em
repouso inercial, mas em movimento acelerado, é impossível que seja auto-existente,
pois o Universo não pode ter estado eternamente se expandindo. Houve um início. Ao
motivo deste início dá-se o nome de ―princípio da causalidade‖, ou ―singularidade‖,
no jargão acadêmico científico. Apesar de muitos filósofos e teólogos discutirem o
assunto (tendo os teólogos teístas, obviamente, sempre aplicado a Deus o princípio da
causalidade do Universo), de fato, não podemos discutir sobre este assunto se nos
isentarmos das mais recentes descobertas científicas e das famosas especulações
teóricas modernas.

3.2.2.1 – Hoje é sabido que o Universo teve um início, e a Física entende que
desconhece as leis que regiam “o que havia antes da criação do Universo”. Contudo,
há quem vá mais longe. É o caso de Stephen Hawking, que publicou suas idéias mais
recentes sobre o assunto no livro ―O Universo numa Casca de Noz‖ . Hawking nasceu
em Oxford, Inglaterra em 1942; é matemático, astrofísico e doutor em Cosmologia pela
Universidade de Cambridge. É tido como o
mais brilhante físico teórico desde Albert Einstein. Hawking é agnóstico, e prefere
respostas científicas aos problemas científicos. Porém, sua análise o levou a discordar
de Einstein, ao discorrer sobre o início do espaço e do tempo como os conhecemos.
Einstein acertou em quase tudo o que postulou, porém, por razões de dogma acadêmico,

13 – PADOVANI, U.; CASTAGNOLA, L. – História da Filosofia, pg. 292


APOLOGÉTICA CRISTÃ 13
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

relutava em aceitar a hipótese de criação do Universo, e a falta de explicação sobre o


quê existira antes. Segundo as palavras de Hawking:

―Penrose e eu mostramos que a relatividade geral previa que o tempo não


existiria dentro de um buraco negro, tanto para a estrela como para qualquer
astronauta que tivesse o azar de cair dentro dele. Mas tanto o início como o fim do
tempo seriam lugares onde equações da relatividade geral não poderiam ser definidas.
Assim, a teoria é incapaz de prever o que deveria emergir do big-bang. Houve quem
visse isso como um sinal da liberdade de Deus para começar o universo como quisesse
(...) não temos ainda uma compreensão completa da origem do universo. (...)

Segundo santo Agostinho, antes de criar o Céu e a Terra, Deus não criou
absolutamente nada. Na verdade, isso se aproxima bastante das idéias modernas.‖14

Observador

Galáxias há 5 bi.de anos

Densidade da matéria
fazendo com que o cone de
luz volte-se para o centro

―Singularidade‖ (?)

Fig. 4 – O cone de luz tem a forma de uma pêra.. Todo o Universo está contido
em uma região cujo limite cai para ―0‖ no big-bang. Isso seria uma ―singularidade‖.
Aqui as leis da Relatividade deixariam de ser válidas. Embora hoje, na astrofísica, se
postule sobre ―mundos paralelos‖, nada, nesta disciplina acadêmica, é conclusivo.

3.2.3 – O Argumento Teleológico afirma que a ordem, inteligência e propósito


presentes no Universo indicam que há alguém por trás de tal organização. Voltaire
colocou que ―se um relógio indica a criação por parte do relojoeiro, o Universo indica a
existência de um Criador‖. O debate teleológico tem ganhado atenção especial

14 – HAWKING, Stephen – O Universo Numa Casca de Nós, pgs. 24, 35


APOLOGÉTICA CRISTÃ 15
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

ultimamente. O nome deste tipo de argumentação sugere um projeto, um pensamento


prévio, uma distinção entre idealizador e idealizado. Alguns, como Kant, o consideram
superior ao argumento cosmológico. Outros, como Hegel, o consideravam um
argumento subordinado aos anteriores.

3.2.4- A Lei Moral:Implica em um argumento que se baseia na


premissa de que toda lei tem um legislador e se de fato existe uma lei moraL,
consequentemente existe o criador dessa lei moral. O que queremos dizer quando
afirmamos que a lei moral existe é que todas as pessoas foram marcadas com um senso
fundamental de certo e errado. Todo mundo sabe, por exemplo, que o amor é superior
ao ódio e que a coragem é melhor do que a covardia. O professor Jay Budziszewski, da
Universidade do Texas, em Austin, escreve o seguinte: "Todo mundo conhece certos
princípios. Não existe uma terra onde o assassínio seja uma virtude e a gratidão seja um
defeito". C. S. Lewis, que escreveu com profundidade sobre esse assunto em sua obra
clássica chamada Mere Christianity, expõe a questão da seguinte maneira:
Pense em um país onde as pessoas fossem admiradas por fugirem da batalha, ou
onde um homem se sentisse orgulhoso por trair todas as pessoas que tivessem
sido bondosas para ele. Você também poderia tentar imaginar um país onde dois
mais dois fosse igual a cinco.

Em outras palavras, todo mundo sabe que existem obrigações morais absolutas.
Uma obrigação moral absoluta é alguma coisa que é ordenada a todas as pessoas, em
todos os momentos, em todos os lugares. Uma lei moral absoluta implica o Criador de
uma lei moral absoluta.
Veja que isso não quer dizer que toda questão moral possua respostas rapidamente
reconhecíveis ou que algumas pessoas não neguem que a moralidade absoluta exista.
Existem problemas difíceis na moralidade, e as pessoas suprimem e negam a lei moral
todos os dias. Isso simplesmente significa que existem princípios básicos de certo e
errado que todo mundo conhece, quer as pessoas admitam sua existência quer não.
Budziszewski chama este conhecimento básico de certo e errado de "aquilo que não
podemos não saber", no livro do mesmo nome.
Não podemos não saber, por exemplo, que é errado matar seres humanos
inocentes sem uma razão. Algumas pessoas podem negar isso e cometer assassínio sem
se importar, mas, lá no fundo do coração, elas sabem que matar é errado. Mesmo os
assassinos em série sabem que matar é errado — eles podem simplesmente não sentir
remorso. Tal quais todas as leis morais absolutas, o homicídio é errado para todos, em
todos os lugares: nos Estados Unidos, na Índia, no Zimbábue e em qualquer outro país,
agora e para sempre. É isso o que a lei moral diz a todo coração humano .

3.3 – EXPOENTES HISTÓRICOS

As enciclopédias e livros sobre o assunto diferem na forma como apresentam os


personagens históricos com alguma relevância na área. A primeira expressão de defesa
do Cristianismo deve ser associada ao próprio NT. O evangelho de Lucas e o livro de
Atos são boas provas disto. Visto que toda a base de defesa contra as heresias, e
posteriormente contra as polêmicas avessas ao Cristianismo foram as Sagradas
Escrituras, podemos alegar que as mesmas, principalmente o NT, são escritos
10
APOLOGÉTICA CRISTÃ 15
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

apologéticos também. O AT apregoa a idéia de juízo, benção, maldição, glorificação


futura, lei, como mensagens de Deus ao povo. O AT, de certa forma, defende-se a si
mesmo. O NT defende a autoridade espiritual do AT (cf. 2 Tm. 3:15-16), e de si mesmo
(cf. 2 Pe. 3:16-17). A 2 Epístola de Pedro pode ser considerada como uma carta
apologética. Pedro ressalta a autoridade das Sagradas Escrituras (1:19-21; 3:2),
aparentemente contra heresias que, se já não haviam surgido, pareciam iminentes.
Paulo também foi, de certa forma, o maior apologeta do NT, talvez apenas depois
de Lucas. Lucas escreveu seus dois volumes exclusivamente para expor de forma
detalhada os acontecimentos, como ele afirma nos prólogos de suas obras (Lc. 1:1-4; At.
1:1-3). Se o objetivo de Lucas está definido nos prólogos de seus livros, toda a obra do
escritor bíblico torna-se uma evidência do Cristianismo, portanto, uma defesa. Paulo
escreve com objetivos diferentes. Porém, sempre alerta os seus leitores sobre o perigo
de deixarem a fé (gr. Pistis), como escreveu aos Gálatas (cf. Gl. 3), aos
Tessalonicenses (cf. 2 Ts. 2:1-10) e 1 Timóteo (cf. 1 Tm. 4:1-2). Aqui, o vocábulo ―fé‖
assume a idéia de ―código de doutrina‖. ―A Bíblia é o nosso manual de fé e prática‖
(Confissão de Westminster).

3.3.1 – Vários foram os expoentes (apologetas) entre os séculos II e III, tais como:
 Aristides, cerca de 147 d.C. Sua obra ataca o paganismo e suas diferentes
formas de adoração, exaltando em contrapartida, a forma e a moral cristãs.
 Justino Mártir, cerca de 150 d.C. Sua obra ―Apologia‖ foi endereçada
aos imperadores Adriano e Marco Aurélio. Afirmava que a Filosofia grega era útil,
porém incompleta, sendo aperfeiçoada em Cristo e em sua Revelação. A Filosofia seria,
como o Judaísmo, a precursora de algo superior
 Aristo, metade do segundo século d.C. Escreveu um livro citado por
Orígenes, no qual demonstrava que as profecias judaicas cumpriam-se em Cristo Jesus.
Justino Mártir utilizou-se dessa obra como base em sua Apologia.
 Atenágoras, final do segundo século d.C. Escreveu uma obra na qual
incluía argumentos a favor da ressurreição dos mortos. Na mesma escreve contra o
paganismo e o Estado romano. Endereça a obra a Marco Aurélio, esperando uma
melhoria no tratamento aos cristãos.
 Taciano demonstrou aversão à Filosofia grega em prol da superioridade
do Cristianismo.
 Teófilo de Antioquia, seguiu o caminho de Taciano.
 Minúcio, início do terceiro século d.C. Procurou demonstrar que os
cristãos eram os ―melhores filósofos‖, em contraste com alguns dos seus predecessores.
 Tertuliano, terceiro século d.C. Conforme Champlin, ―atacou a Filosofia
com argumentos filosóficos‖. Atacou o paganismo e o gnosticismo. Colocava a
Filosofia como simples produto do pensamento pagão. Porém, todo o exercício
teológico é, em suma, um exercício filosófico, até certo ponto. A razão não deve
separar-se da fé, mas aliar-se à mesma.
 Irineu, segundo século d.C. Defendeu o Cristianismo, juntamente com
Hipólito, seu discípulo, contra as heresias gnósticas. Sua obra ―Contra as Heresias‖ é
tida como a primeira exposição sistemática das doutrinas cristãs.
 Arnóbio, segundo e terceiro séculos d.C. Atacou a idéia platônica da
preexistência da alma, e defendeu o criacionismo.
 Eusébio de Cesaréia e Lactâncio, séculos terceiro e quarto d.C.
Exaltaram o Cristianismo em detrimento do Judaísmo e do paganismo. Eusébio tinha
algumas idéias consideradas não ortodoxas acerca da divindade de Cristo. A principal
11
APOLOGÉTICA CRISTÃ 16
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

contribuição de Eusébio é sua História Eclesiástica que narra quase quatro séculos de
tensão entre o Cristianismo e o Estado romano.

3.3.2 – Agostinho de Hipona (350-430 d.C.), é considerado, se não o maior, mais


um dos maiores teólogos do primeiro milênio da era cristã. Filho de pai pagão e mãe
cristã estudou Gramática em Madura, e retórica em Cártago. Ensinou as mesmas
matérias na África (373-382) e em Roma (383). Neste ano abandonou o Maniqueísmo15,
e tornou-se cético. Converteu-se por meio de uma exortação, ouvida em um jardim,
baseada em Rm. 13:13-14. Foi batizado por Ambrósio, em 387 d.C. Após anos de
estudo, Agostinho foi ordenado pastor em Hipona, na África do Norte, em 391 d.C. Ali
estabelece um mosteiro, e, em 395 é ordenado bispo. Participou de algumas
controvérsias, e produziu célebres discursos, e livros. Morreu em 28 de agosto de 430
d.C.Agostinho é tido como o ―pai da Teologia ortodoxa‖. Quanto à pessoa de Deus,
Agostinho discursou sobre os seus conceitos acerca de Deus, que constituem a base do
pensamento dogmático sistemático acerca de Deus. Para o teólogo Deus era auto-
existente, absolutamente imutável, singelo (uno), porém trino. Deus também é
onipresente, onipotente, imaterial, eterno. Deus, para Agostinho, não estava no tempo,
mas, o havia criado. Agostinho escrevia e perscrutava sobre Deus e a alma. Cria na
revelação de Deus, porém, sempre procurou ―base‖ para a fé, e encontrou em Platão,
contrastando com os céticos, que usavam os escritos filosóficos gregos com objetivos
opostos.
Agostinho utilizou-se do argumento teleológico sobre a existência de Deus. À
existência das coisas, havia desígnio, ao que Agostinho atribuiu ao ―projeto‖ de um
Planejador. Quanto à autoridade do NT, Agostinho aceitava sem problemas. Onde não
se podia explicar ou descrever a razão, ele se contentava com a fé na doutrina. Por
ocasião do saque da cidade de Roma pelos bárbaros, em 410 d.C., Agostinho escreveu
sua obra mais conhecida e aclamada, ―Cidade de Deus‖. Muitos diziam que a queda de
Roma se deu pelo reconhecimento e oficialização do Cristianismo como religião do
império. O objetivo primeiro de Agostinho foi, portanto, apologético. Porém, ampliou o
tema da obra, à medida que escrevia, transformando-a em uma resenha da filosofia da
religião cristã. Nesta obra, Agostinho concebe duas cidades: ―Jerusalém‖ (a Igreja
Universal) e ―Babilônia‖ (o Estado pagão). Na cidade do homem, estão em conflito
constante os dois amores: o amor a Deus ou a este mundo. Por causa da natureza do
livre-arbítrio (corrompido, segundo Agostinho), a ―cidade dos homens‖ estava sempre
sujeita à ruína. ―A cidade de Deus‖, entretanto, era superior e deveria exercer autoridade
sobre aquela. Estava lançada a base filosófica para a união entre a Igreja e o Estado,
extremamente discutido ao longo dos séculos posteriores. O Estado moldado pela
―cidade de Deus‖é denominado ―Roma‖. Em última análise, a Igreja deveria ter voz
ativa e determinante dentro da sociedade civil. Agostinho não chega a ser apresentado
como um apologeta, no sentido conceitual da palavra, porém sua obra foi de grande
valor aos pensadores da Igreja cristã.

3.3.3 – Escolas Apologéticas - De acordo com a Enciclopédia Histórico-


Teológica (Vol. 1, pg. 99), a Apologética ao longo da História tem adotado estilos
diversos, que, divididos em classes gerais, são-nos apresentados em duas ―escolas‖
principais ao longo da História, descritas a seguir:

 Escola Subjetiva: Inclui pensadores como Lutero, Pascal, Kierkgaard e Karl


Barth. Todos estes pensadores admitiram dúvidas quanto ao fato de o descrente ser
levado ao entendimento e aceitação da existência de Deus pelos argumentos. Todos
APOLOGÉTICA CRISTÃ 17
Conceitos Fundamentais Analisados Sob Uma Perspectiva Hstórico-Teológica

ressaltaram a experiência singular da graça; o encontro subjetivo com Deus. Conforme


nos diz a Enciclopédia (op. cit., pg. 99): ―Tais pensadores raramente têm reverente
temor da sabedoria humana, mas, pelo contrário, de modo geral rejeitam a filosofia
tradicional e a lógica clássica, e ressaltam o trans-racional e o paradoxal.(...) Segundo
a metáfora de Lutero, „a razão é uma meretriz‟‖. Kierkgaard afirmava que a
Apologética tem a simples intenção de tornar plausível o Cristianismo, o que
Kierkgaard não aceitava pois, para ele, defender algo sempre traz o descrédito para
aquilo que se defende. Porém, ele mesmo usou uma apologética baseando-a no absurdo
da afirmação cristã, de que Deus apareceu na terra em forma humana, e muitos crêem
em tal idéia. Este fato por si só seria uma evidência de que tal idéia poderia ser verdade.
Não há registros de quaisquer outros movimentos que sugiram afirmando que baseemos
a nossa felicidade em um evento histórico. Para Kierkgaard esta idéia ―não subiu ao
coração de homem algum‖.

Blaise Pascal (1623-1662) é considerado como um dos maiores intelectuais do


Ocidente, de todos os tempos. Paradoxalmente, Pascal em seus escritos foi mais
apologista do que um pensador sistemático. Desconsiderava as ―provas metafísicas‖ da
existência de Deus, como as de Descartes, por achá-las insuficientes para levar o
homem a Deus. Acreditava que o coração era a chave, pois Deus poderia ser percebido
pelo coração, mas não pela razão. Contudo, apesar de crer que ―o coração tem razões
que a própria razão desconhece‖, sustentava que as Escrituras (que se auto validavam),
as profecias, a existência dos judeus, os milagres, todos estes fatores serviam para
autenticar a veracidade do Cristianismo. (OBS: Recomendo a releitura do ponto 2, no
qual falamos sobre a famosa ―aposta de Pascal‖). Pascal, em sua obra Pensées,
publicada postumamente, recomendava a religião bíblica por ter um conceito profundo
acerca do ser humano. A grandeza do homem está no fato dele ser a imagem e
semelhança de Deus, ao passo que a Queda explica todas as tendências malignas pelas
quais o homem envereda. Um pensamento simples e correto, do ponto de vista
ortodoxo.

Gotthold Ephraim Lessing (1729-1781) também foi um proeminente pensador


desta ―escola‖. Lessing desafiou o pensamento comum quando afirmou que as
―verdades acidentais‖ da História nunca poderão se tornar a prova de verdades
necessárias à razão. Tais ―verdades acidentais‖ poderiam ser falsas, o que era
incompatível com a ―certeza religiosa‖ interior, que pode ser desenvolvida pelo ser
humano. A passagem das verdades acidentais para a certeza religiosa foi chamando de o
―fosso de Lessing‖. Contudo, Lessing argumentava que a Estética (obras de arte) são
uma espécie de silhueta do plano divino da Criação, operando como uma espécie de
Teodicéia16, ao juntar os eventos ―exibindo‖ os fatos (na retratação de uma cena
importante relatada pela Bíblia). O efeito geral de tal Estética é, segundo Lessing,
tendente ao bem. Note que o pensador não está justificando o uso de imagens ou coisas
do gênero.

 Escola Objetiva: A Enciclopédia Histórica Teológica (vol. I; pg. 100) a descreve


como a que ―coloca o problema da averiguação claramente no âmbito dos fatos
objetivos‖. Enfatiza as realidades externas, existindo, porém, duas formas distintas desta
escola, descritas como segue:

16 – Teodicéia: Do grego Theo – ―Deus‖ e dike – ―justiça‖. Termo usado para referir-se às tentativas de se justificar os caminhos de
Deus com os homens. A Teodicéia, em um determinado sistema teológico, resolve o ―problema do mal‖, ao mesmo tempo em que
demonstra que Deus é Todo-Poderoso, Todo-Amoroso e Justo.
17 – Citado na revista Super Interessante, de Maio de 2004. Seção Super Novas.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 20
Teodicéia

 Escola da Teologia Natural – Não exclui a razão humana no


exercício da defesa da fé. Teólogos como Tomás de Aquino, Joseph Butler e William
Paley são nomes que se destacam como membros desta escola. Todos estes teólogos
crêem no pecado original, porém não admitiam que a razão humana estivesse deficiente
por completa. Em outras palavras, seria possível demonstrar a existência de Deus
através das Escrituras, e da razão humana. Estas abordagens ―simplistas‖ para provar a
existência de Deus, tais como a apresentação simples e direta dos milagres e profecias,
crêem os adeptos desta escola, bastará para levar o descrente a crer em Deus. Alguns
matemáticos e pensadores modernos seguem um caminho similar. Recentemente um
físico inglês, Stephen Unwin17, no seu livro ―The Probality of God‖ (―A Probalidade de
Deus‖), sugeriu que Deus ―tem 67% de chance de existir‖, após usar cálculos
bayesianos. A idéia do físico foi ―equilibrar nosso lado que precisa de idéias racionais,
com nossa capacidade de acreditar em algo por intuição.‖.
 Escola da Revelação – Inclui alguns dos maiores teólogos de todos os
tempos, como Agostinho, E. J. Carnell, Lutero e Calvino. Crê que as provas objetivas
(milagres, argumentos em prol da existência de Deus) são importantes na tarefa
apologética. Contudo, insistem que o homem não regenerado não pode ser convertido
apenas sendo exposto às provas, porque o pecado enfraqueceu o raciocínio humano a tal
ponto que, para que as evidências fossem eficazes, seria necessário um ato sobrenatural
do Espírito Santo. É verdade que não se deve presumir que esta escola considere sem
valor os fatos externos. Pelo contrário, apresentam a Bíblia e o Jesus histórico como
causa necessária à fé, ao passo que o Espírito Santo seria a causa suficiente à fé.
Alguns acham que esta escola seria uma espécie de junção da escola da Teologia
Natural a escola da revelação. Assim a Enciclopédia Histórica Teológica cita Lutero
(Vol. I; pg. 101): ―Antes da fé e do conhecimento de Deus, a razão humana é trevas,
mas nos crentes é um instrumento excelente. Assim como todos os dons e os
instrumentos da natureza são maus nos ímpios, assim também são bons nos crentes‖.

No decorrer da História, os apologistas da escola objetiva utilizam uma longa


série de material que auxiliam os seus trabalhos, entre os quais podemos citar: a) Os
argumentos Ontológico, Teleológico, Cosmológico e Moral; b) Profecias cumpridas em
Cristo; c) Milagres registrados nas Escrituras; d) A pessoa de Cristo (O “Jesus
histórico”); e) A Ressurreição de Cristo (considerada por alguns o principal
fundamento da Apologética Cristã); f) A História do Cristianismo; g) Provas
arqueológicas (Evidências externas que corroboram o que está dito nas Escrituras. A
Arqueologia Bíblica vem ganhando notoriedade desde o fim do século XIX). Uma coisa
é certa: todas as ―provas‖ que ratificam o Cristianismo não devem jamais substituir o
aspecto subjetivo da fé. A fé não depende da razão, antes a transcende. Porém, só existe
fé causada por algo que se conheça, por causa de sua própria definição. Logo, tais
provas são importantes para o homem.

4. TEODICÉIA

―O problema da relação de Deus com o pecado continua um mistério para nós,


mistério que não somos capazes de resolver. Pode-se dizer, porém, que o Seu decreto
para permitir o pecado, embora assegure a entrada do pecado no mundo, não significa
que Ele tem prazer nele; significa somente que ele considerou sábio, com o propósito
da sua auto-revelação, permitir o mal moral, por mais detestável que seja à sua
16 – Teodicéia: Do grego Theo – ―Deus‖ e dike – ―justiça‖. Termo usado para referir-se às tentativas de se justificar os caminhos de
Deus com os homens. A Teodicéia, em um determinado sistema teológico, resolve o ―problema do mal‖, ao mesmo tempo em que
demonstra que Deus é Todo-Poderoso, Todo-Amoroso e Justo.
17 – Citado na revista Super Interessante, de Maio de 2004. Seção Super Novas.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 20
Teodicéia

natureza‖. (Louis Berkhof, do livro Teologia Sistemática, pg. 109. A orientação


teológica do autor é reformada calvinista).

―Considerando a largura e a profundidade do problema do mal, concordamos


com Peter Kreeft quando diz que a existência do mal e do sofrimento é mais um
mistério do que um problema. Comparou-o ao amor e disse que, uma vez que estamos
envolvidos subjetivamente, achamos difícil compreender plenamente todas as razões
por que o mal acontece. (...) Portanto, reconhecemos nossa explicação incompleta para
justificar todos os propósitos que o mal e a dor possam ter na vida de um indivíduo‖.
(Norman Geisler, do livro Fundamentos Inabaláveis, pg. 255. A orientação teológica
do autor é arminiana).
Estas citações, de posicionamentos teológicos diferentes (opostos, até), foram
transcritas para expor o tamanho do problema de Deus e o mal. Entendamos,
primeiramente, que o mal, aqui, é aquele que desfigura aquilo que naturalmente
inferimos como o bem. Por exemplo, naturalmente sabemos que não relatar um fato
como ele aconteceu realmente, mas, inventar ou mudar tal fato, enquanto o estamos
relatando, constitui-se uma mentira, um desvio da verdade. Algo em nós sabe que
aquilo não está correto. Daí surge a idéia do mal. Das mentiras aos assassinatos, das
bombas atômicas que fizemos com a tecnologia da fissão nuclear, até o tráfego
clandestino de animais selvagens, algo em nós nos dirige acerca do que é certo e
errado. Este é o grande problema do Ateísmo e do Panteísmo.
Para o Panteísmo, o mal é uma ilusão. O pensamento do Ateísmo reduz-se a
apenas identificar o mal, porém sem o seu contra-senso, o bem. Apenas taxar o mal
como ―ilusão‖, como fazem os panteístas, é tratar o problema quase que ingenuamente,
pois a nossa subjetividade intelectual (emoções) são os principais agentes que nos
induzem a pensarmos que algo, naquilo que está “errado”, tem que ser mudado. Mas,
por que precisaria ser mudado, se tudo é ilusão? Bem, é verdade que o Hinduísmo
obrigou os seus adeptos a aceitarem a sua vida (―karma‖), pois os males da mesma são
apenas ―ilusão‖. Porém, por que os hinduístas têm hospitais? Por que têm escolas? Por
que se precavêem de desastres naturais? De epidemias? Por que têm programas contra a
forme a pobreza, se tudo é ilusão, como afirmam? Cremos que, de fato, é ilusão crermos
que o mundo é ilusão.
Tão insatisfatória quanto a proposta dos hinduístas é a pensamento ateísta. Ora, o
ateu não reconhece a existência de Deus, porém, reconhece a existência do mal. Isto é
um contra-senso, pois Deus é a fonte suprema do BEM, e o bem é o oposto do MAL
Logo, aceitar o mal, sem a existência do bem, é aceitar a ferrugem sem ferro, a explosão
sem oxigênio para a combustão, um tiro de arma de fogo sem pólvora, as ações
consideradas ―más‖, sem um exemplo padrão de ―bom‖. A idéia ateísta, portanto, é
insustentável, pois se auto anula. A proposta teísta cristã vai, portanto, explicar de
forma mais satisfatória a existência do mal, de forma mais lógica, pois se há mal, é
necessário que haja seu contra-senso. Se há malignidade de forma imensa, há o bem de
forma imensa.
Creio que você, caro aluno, já deve ter se apercebido a problemática deste
assunto: como justificar um Deus Todo-Poderoso, e Todo-Amoroso juntamente com a
existência do mal? Ao longo da História, vários sistemas foram propostos para
responder esta pergunta. No sistema racionalista de Leibniz (1646-1716) o mal foi
dividido em moral, metafísico, e físico. O mal moral advém da resistência, natural, dos
homens em relação à vontade de Deus. O mal metafísico constitui a ―limitação‖ dos
seres. É a ―ausência‖ do bem, daquilo que é bom. Exemplo: quando há um câncer em
16 – Teodicéia: Do grego Theo – ―Deus‖ e dike – ―justiça‖. Termo usado para referir-se às tentativas de se justificar os caminhos de
Deus com os homens. A Teodicéia, em um determinado sistema teológico, resolve o ―problema do mal‖, ao mesmo tempo em que
demonstra que Deus é Todo-Poderoso, Todo-Amoroso e Justo.
17 – Citado na revista Super Interessante, de Maio de 2004. Seção Super Novas.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 20
Teodicéia

alguém, é porque ali está faltando algo no processo biológico normal, que impeça as
células de se multiplicarem desordenadamente. Geisler dá o exemplo da ferrugem, que
seria um exemplo de mal. A oxidação se dá pela falta de alguns elementos no ferro, o
que necessariamente originaria a presença de outros, que originariam o processo de
deterioração do ferro. Geisler ainda tenta coadunar o problema do mal metafísico com a
Segunda Lei da Termodinâmica, que diz ―que a quantidade de energia utilizável no
Universo está diminuindo constantemente‖. Como o Cosmos (Universo) é um sistema
fechado, isto é, não há força física que o alimente, toda a energia contida nele se dissipa,
gradativamente, transformando-se em energia não utilizável, como um carro. O carro
seria o Cosmos, e a gasolina toda a sua energia. Em um determinado momento, a
energia irá findar, pois, do percentual de energia da gasolina, aproximadamente 75% se
dissipa em calor, enquanto 25% em rendimento. Segundo esta Lei, o Universo caminha
para um estado caótico.
Este sistema pode justificar a existência do mal (no sentido metafísico), tanto
quanto a teodicéia daquele que afirma, de forma distinta da posição anterior, que o
problema do mal consiste no arbítrio do homem. Deus seria ―culpado‖, portanto, se
sabia que o homem, sua criação, usaria do arbítrio para usá-lo para o mal? Não, se
partirmos do pressuposto que Deus criou (decretou) leis, dentre as quais estivesse
presente a consciência da existência do mal. Assim, em sua Criação, o mal poderia vir a
existir, como realmente veio, e seria uma lástima para o ser humano. Em alguns casos, o
mal seria usado para produzir o bem, e encontramos exemplos disto, inclusive, nas
páginas das Sagradas Escrituras. Um exemplo clássico nas Escrituras é fato acontecido
em 1 Rs. 22:1-37. Aparentemente ilógico o problema, pois Deus ali se utiliza,
aparentemente, de uma mentira para punir o rei maligno Acabe. Como um ser
perfeitamente bom utilizaria um meio maligno? (a verdade é sempre associada ao bem,
enquanto a mentira, ao seu contra-senso, o mal, logo Deus estaria usando um meio
maligno).
A solução para este problema de 1 Rs. 22:1-37 estende-se à resposta do problema
do mal, em todos os âmbitos, de acordo com o sistema do livre arbítrio. Deus dera a
visão a Micaías, sobre o espírito de mentira, que estaria na boca dos profetas (vss. 10-9-
23). Por quê? Logicamente, porque sabia que Micaías seria chamado, e que falaria o que
realmente estava acontecendo. Logo, Acabe teria uma escolha: ou acreditaria em
Micaías, ou nos profetas de Baal. O resultado desta escolha iria produzir o bem, ou o
mal. Há quem diga que o homem perdeu o seu arbítrio para a salvação, no Éden. E, fica
apenas com o arbítrio racional. Bem, de qualquer forma, se Deus livrar-nos do mal, é
necessário que o arbítrio inerente a nós, seres racionais, seja anulado. O mal seria,
portanto, o preço a pagarmos para vivermos em um mundo com arbítrio. Preferiríamos
nós, o contrário? Um mundo com arbítrio sugere a possibilidade do mal. Isto, em última
análise não faz de Deus o autor do mal, uma vez que deva haver um mundo melhor
possível. Nós não estamos vivendo neste mundo, o ―céu‖, contudo, o mundo atual é um
meio para chegarmos àquele.

5. ―EVIDÊNCIAS QUE EXIGEM UM VEREDICTO‖

A questão histórica vem alimentando debates acalorados sobre a veracidade das


Escrituras, desde o século XVIII, quando foi formulada a hipótese documentária, que
―desconstruía‖ o Pentateuco em quatro, e posteriormente, cinco ―fontes‖ distintas, que
segundo os críticos, originaram o material que temos atualmente. De antemão, é
16 – Teodicéia: Do grego Theo – ―Deus‖ e dike – ―justiça‖. Termo usado para referir-se às tentativas de se justificar os caminhos de
Deus com os homens. A Teodicéia, em um determinado sistema teológico, resolve o ―problema do mal‖, ao mesmo tempo em que
demonstra que Deus é Todo-Poderoso, Todo-Amoroso e Justo.
17 – Citado na revista Super Interessante, de Maio de 2004. Seção Super Novas.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 21
A Bíblia e os Testes da Crítica Moderna

importante lembrarmos que a crítica bíblica tem o seu lado positivo. Através de testes,
como veremos a seguir, torna-se quase impossível duvidar-se da superioridade dos
manuscritos do Novo Testamento sobre outros escritos antigos.
A Apologética aqui carece de uma atenção especial, pois é mister que todo
apologeta ao menos se interesse em saber como a Bíblia passa pelos testes históricos,
bibliográficos, internos, etc. Vale salientar que outros títulos históricos clássicos têm o
mesmo tratamento, contudo, quando se trata da Bíblia, uma enxurrada de pressupostos,
muitos dos quais sem sentido, vêm à tona, e o desavisado pode enveredar-se por
informações não muito confiáveis, de alguém que, por exemplo, se utiliza de
pressupostos apenas para contradizer as Sagradas Escrituras. Um conhecimento prévio
de crítica bíblica é fundamental para uma análise sobre o quê afirma a própria crítica.
Vamos ao mesmo.

5.1. ELEMENTOS DE CRÍTICA BÍBLICA


As nomenclaturas das principais ―críticas‖ da Bíblia surgiram principalmente no
século XIX, e vêm sendo promovidas principalmente por estudiosos bíblicos alemães.
Josh Mcdowell assim classifica a crítica bíblica:

―A crítica bíblica pode ser dividida em baixa e alta crítica, como indicado na
tabela (aqui o autor inclui um gráfico, o qual reproduzimos):

Crítica de Redação

Crítica
Crítica
Crítica de Forma
de Fonte
Histórica
Crítica
Literária
} = Alta Crítica

Crítica Textual } = Baixa Crítica


A baixa crítica é identificada com a crítica textual, já que esta é fundamental para
todas as outras formas de crítica bíblica. A crítica textual busca determinar as palavras
originais do texto bíblico, especialmente porque não temos os documentos originais
(chamados “autógrafos”). Quem quer que saiba ler se envolve com a crítica textual.
Se, por exemplo, você notar um erro tipográfico enquanto lê esta página, corrigirá o
erro em sua mente, sabendo que não foi originalmente essa a intenção dos autores. Este
processo constitui essencialmente a crítica textual. (...)
A alta crítica pode ser dividida em duas disciplinas abrangentes: crítica histórica
e crítica literária. A crítica literária busca analisar o texto como uma peça acabada de
literatura. Ela avalia o sentido das palavras, a gramática e o estilo do texto. Também
busca determinar o significado do texto e tem sido usada para especular sobre o
cenário, a situação vivencial e as circunstâncias do escritor. A crítica histórica estuda
o cenário histórico que cerca a composição do texto. Ela busca responder a perguntas,
tais como: (1) Quando e onde foi escrito? (2) Quem escreveu? (3) Quer circunstâncias
cercavam o autor ou autores? (4) A quem foi escrito?

16 – Teodicéia: Do grego Theo – ―Deus‖ e dike – ―justiça‖. Termo usado para referir-se às tentativas de se justificar os caminhos de
Deus com os homens. A Teodicéia, em um determinado sistema teológico, resolve o ―problema do mal‖, ao mesmo tempo em que
demonstra que Deus é Todo-Poderoso, Todo-Amoroso e Justo.
17 – Citado na revista Super Interessante, de Maio de 2004. Seção Super Novas.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 22
Conceitos Fundamentais e Análise de Questionamentos Contemporâneos

A crítica de fonte propunha que pelo menos quatro fontes estivessem por trás da
formação dos cinco primeiros livros do Antigo Testamento. A mesma metodologia foi,
então, aplicada aos evangelhos durante o século 19 para sugerir várias fontes (por
exemplo: “Q”, “Marcos” e “Proto-Lucas”) subjacentes, aos relatos dos evangelhos.
(....)
Os alemães chamaram a crítica de forma de Formgeschichte, significando
“história da forma”. Seus principais proponentes foram Karl Ludwing Schmidt, Martin
Dibelius e Rudolf Bultmann. Outros críticos de forma incluem R. H. Lightfoot e D. E.
Nineham. Alguns dos críticos de forma mais moderados são Frederick Grant, B. S.
Easton e Vincent Taylor.
Os críticos de forma do Novo Testamento geralmente opinam que os evangelhos
foram compostos de pequenas unidades ou episódios independentes. Essas pequenas
unidades individuais (perícopes) circularam independentemente. Os críticos ensinam
que as unidades tomaram gradualmente a forma de vários tipos de literatura popular,
tais como lendas, contos, mitos e parábolas.
Segundo a crítica de forma, a formação e preservação das unidades foram
determinadas pelas necessidades da comunidade cristã. Em outras palavras, quando a
comunidade tinha um problema, eles criavam ou preservavam uma declaração ou
episódio de Jesus para satisfazer as necessidades desse problema em particular. Assim
sendo, essas unidades não são basicamente testemunhos da vida de Jesus, mas reflexos
das crenças e práticas da igreja primitiva. (....)
A tarefa da crítica de forma é, então, descobrir as “leis da tradição” que
governam a coleta, desenvolvimento, e registro das unidades isoladas. A seguir, com a
remoção da suposta estrutura artificial (editorial) da cronologia ou outras adições
providas pela comunidade, os críticos de forma acreditam que podem recobrar a forma
original das unidades (perícopes) e determinar qual o propósito prático (sitz-im-leben –
“situação vivencial”) para a qual os cristão a preservaram. Mediante este método
julga-se ser possível “ir além das fontes escritas e alcançar o período de transmissão
oral, chegando aos diferentes tipos de episódios que eventualmente se tornaram parte
dos evangelhos.
Onde a crítica de forma admitiu como possível o trabalho da “comunidade na
formulação das várias perícopes, a crítica de redação, originária da crítica de forma,
concentrou-se nos redatores finais (ou compiladores) dos evangelhos, como autores de
direito. Norma Perrin, um crítico de redação, define isso como “ocupado em estudar a
motivação teológica do autor como revelada na coleta, arranjo, revisão e modificação
do material tradicional; assim como na composição de material novo ou na criação de
novas formas dentro das tradições do cristianismo primitivo18‖.

5.2. TESTES DE CONFIABILIDADE HISTÓRICA

C. S. Sanders, em seu livro ―Introdução à Pesquisa em História Literária


Inglesa‖, ofereceu os critérios, geralmente aceitos, para se estabelecer a confiabilidade
de obras antigas. Os critérios são os seguintes:

5.2.1 - O Teste Bibliográfico: De acordo com a postulação da crítica bíblica os


evangelhos foram escritos baseados em relatos orais. A evidência histórica, porém,
aponta para uma conclusão excepcional. Para se construir mitos e lendas, como
aconteceu com o panteão dos deuses gregos, por exemplo, são necessários séculos. Isto
está comprovado com o estudo da literatura universal, no que é conhecido como teste
bibliográfico, proposto pelo erudito militar C. Sanders. O teste bibliográfico examina

18 – MACDOWELL, Josh – Ele Andou Entre Nós: Evidências do Jesus Histórico, pgs. 142, 143 e 144
APOLOGÉTICA CRISTÃ 23
A Bíblia e os Testes da Crítica Moderna

como os documentos (em sua maioria, cópias antigas da literatura clássica universal)
chegam até nós. O teste bibliográfico é uma ferramenta indispensável na tentativa de
comprovação da autenticidade histórica do Novo Testamento, e especificamente, dos
evangelhos. Assim afirma Josh Mcdowell:

―Podemos apreciar a tremenda riqueza de manuscritos com autoridade do Novo


Testamento, comparando-as com o material textual de outras fontes notáveis e antigas.
Temos acesso à história de Tucíades (460-400 a.C.) mediante apenas oito MSS datados
de cerca de 900 d.C., quase mil e trezentos anos depois de ele te-la escrito. Os MSS da
história de Heródoto são também recentes e escassos; todavia, como F. F. Bruce
responde: “Nenhum erudito clássico daria atenção a um argumento de que a
autenticidade de Heródoto ou Tucíades é posta em dúvida, porque os primeiro
manuscritos de suas obras úteis para nós têm mais de mil e trezentos anos a mais que
os originais.”.
Aristóteles escreveu suas obras de ficção cerca de 345 a.C., mas a cópia mais
antiga que temos é datada de 1100 d.C., um intervalo de quase mil e quatrocentos anos,
e apenas cinco MSS sobreviveram.
César compôs sua história das Guerras Gaulesas entre 58 e 50 a.C.e a
autoridade do seu manuscrito se apóia em nove ou dez cópias datadas de mil anos após
a sua morte.
Quando se trata da autoridade do manuscrito do Novo Testamento, a abundância
de material é quase embaraçosa em contraste. (....) Mais de 22 mil cópias de
manuscritos do Novo Testamento existem hoje. A Ilíada tem 643 MSS e é a segunda em
autoridade de manuscrito depois do Novo Testamento.‖ 19

Como podemos observar, a confiabilidade do registro bíblico do Novo


Testamento é assegurada, em termos científicos, por várias disciplinas acadêmicas,
apesar dos constantes ataques à essência da composição ortodoxa bíblica por meio da
crítica, de alguns círculos eruditos. Negar a veracidade do conceito ortodoxo é negar os
fatos, a abundância de evidências históricas tanto externas quanto internas.

5.2.2. - O Teste Interno: ―O que há no texto? Há coerência?‖ Estas perguntas são


a base do chamado teste interno. Enquanto não houver certeza sobre uma contradição
aparente, o benefício da dúvida deve ser usado em favor do escritor. Esta ―regra‖
formulada por Aristóteles, citado por Richard Mckeon em seu The Basic Works of
Aristotele (pg. 1485-6), e reproduzido no livro Fundamentos Inabaláveis, de Geisler e
Bocchino, aponta para a singularidade da obra do Novo Testamento. Não se demonstrou
nenhuma contradição real no Novo Testamento, e, quando nos referimos à Bíblia como
um todo, as muitas alegações de contradições e discrepâncias, foram respondidas com a
utilização correta da Hermenêutica e com as descobertas arqueológicas dos séculos XIX
e XX. No caso deste tipo de verificação deve-se observar alguns fatores que, se não
forem bem observados e analisados, darão margens para interpretações errôneas e
absurdas.

 Distância Lingüística: Nós falamos português, porém a Bíblia foi escrita


em grego, hebraico e algumas porções de aramaico. Há algumas lacunas que devem ser
preenchidas. Um bom exemplo é dado por Gleason Archer, na sua Enciclopédia de
Temas Bíblicos (pg. 14), quando afirma: ―Pense sobre o quanto deve ficar confuso um
estrangeiro ao ler em um de nossos textos algo assim: “Fulano tomou um banho,
depois tomou o seu café, e em seguida foi tomar um ônibus”. “Tome juízo menino”;
18 – Op. Cit. , pgs. 142, 143 e 144.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 25
A Bíblia e os Testes da Crítica Moderna

“Vamos tomar nota disto”. O verbo tomar tem sentido diferente em cada frase.
Presume-se que as palavras geradoras de sentidos diferentes possuem as mesmas raízes
ou a mesma origem etimológica. Entretanto, pode haver total confusão se a pessoa
entender mal o que o autor escreveu, o que quis expressar ao usar estes vocábulos. (...)
É por isso que devemos aplicar-nos à exegese cuidadosa a fim de descobrir o que o
autor quis dizer à luz das situações e sentidos da época‖.

 Distância Cultural: Se não conhecermos os aspectos da cultura nos


tempos bíblicos jamais entenderemos plenamente o que o autor bíblico está querendo
dizer. Sobre a importância de pesquisarmos tais elementos culturais para enriquecermos
nossa interpretação do texto bíblico, assim nos diz Josh Mcdowell, exemplificando as
peculiaridades contidas nos Evangelhos:

―O arranjo dos quatro evangelhos é indiscutivelmente hebraico do século I.


Alguns eventos parecem estranhos para nós, mas são perfeitamente naturais na cultura
dos dias de Jesus. Por exemplo, Lucas 7:38 fala de uma mulher chorando e molhando
os pés de Jesus com as lágrimas. (...) Pranteadores profissionais eram empregados
para os funerais, e muitos judeus tinham “vasos de lágrimas”, onde recolhiam as
lágrimas de sua tristeza. A mulher descrita por Lucas pode ter literalmente derramado
o conteúdo de seu vaso de lágrimas para mostrar a Jesus sua tristeza pelo pecado. Em
nossos dias, quem visita Israel, pode observar muitos desses vasos de lágrimas antigos
nos museus dali.
Lucas 2:24 fala de uma outra das diversas práticas culturais mencionadas nas
narrativas do evangelho. Em obediência a Levítico 12:2,6,8, José e Maria levaram o
sacrifício exigido após o nascimento de um filho. (...)
Os costumes hebraicos relativos ao casamento ajudam a explicar o que de outro
modo pareceria uma contradição em Mateus 1:18-19. No vs. 18, Maria está apenas
comprometida com José, enquanto no vs. 19, José é chamado de seu “marido”. O
Reverendo James Freeman, que compilou uma vasta coleção de costumes bíblicos
explica: „Os esponsais entre os hebreus significavam algo mais do que um simples
noivado representa para nós. Eles eram considerados como o início de um casamento,
uniam tão legalmente quanto o casamento propriamente dito e não podiam ser
quebrados senão com uma carta de divórcio. Daí o motivo de José ser chamado de
marido‟.
O confronto de Jesus com os saduceus em Marcos 12 está de acordo com o que
sabemos sobre a atitude dos saduceus com relação ao casamento no regime do levirato.
Em Yebbamoth 4:6b do Talmude Palestino, os saduceus usam novamente o casamento
em levirato, desta vez para zombar dos fariseus. Eeles apresentam ali o problema
hipotético de um dentre 13 irmãosque é obrigado a casar-se em levirato com as viúvas
de seus 12 irmãos falecidos.
A descrição da mulher com hemorragia se torna muito mais significativa e
realista à luz das leis judias de pureza. A condição da mulher significava que ela
estivera cerimonialmente impura durante 12 anos e que, pela lei, tocar as roupas de
Jesus seria contaminá-lo. Ela fica compreensivelmente amedrontada ao ver que Jesus
percebera o seu ato. Você pode imaginar o raro senso de compaixão que ela deve ter
sentido, quando Jesus lhe disse: “Filha, a tua fé te salvou; vai-te em paz”.
(...) Um aspecto surpreendente das narrativas do evangelho é que elas falam de
Jesus praticar seu ministério apenas em cidades judias. Os relatos registram que Jesus
só entrou em duas cidades que não eram principalmente judias e ortodoxas: a cidade
gentia de Sidom e a cidade samaritana de Sicar. Como não ficamos sabendo de
APOLOGÉTICA CRISTÃ 25
A Bíblia e os Testes da Crítica Moderna

quaisquer incidentes ocorrendo em Sidom, não temos relatórios de qualquer ministério


de Jesus em uma cidade gentia. É surpreendente que os evangelhos registrem a ida de
Jesus a Betsaida, mas não a Julias, provavelmente a 91,4 metros de distância. Ele vai
para a obscura Nazaré, mas não para a grande cidade de Séforis a aproximadamente
4,8 Km. Viaja para o campo ou as regiões de Decápolis, Cesaréia de Fillipe e Tiro,
mas não para cidades gentias propriamente ditas. Tudo na situação geográfica é
essencialmente judeu – judeu ortodoxo. (...)
Note que a refeição da Páscoa foi comida em posição reclinada. Era assim que os
ricos e livres comiam. Todos em Israel, ricos e pobres, deviam comer essa refeição
nessa posição, como lembrança de sua libertação do cativeiro no Egito. Tudo a
respeito da refeição era destinado a fazer com que os participantes se lembrassem do
anjo da morte passando por sobre as casas marcadas com sangue de cordeiro na noite
da libertação. Mas o que Jesus ordenou a seus discípulos que lembrassem? “Fazei isto
em memória de mim”. A partir desse ponto, a refeição em memorial tinha o prpósito de
lembrar dele. Segundo a cronologia do evangelho de João, Jesus estava morrendo na
cruz no dia seguinte na hora em que os cordeiros pascais estavam sendo sacrificados
no templo. O povo chamava João Batista de profeta. Foi ele quem disse a respeito de
Jesus cerca de três anos antes: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do
mundo”20

 Distância Geográfica: Os apologetas também destacam a importância


em conhecermos a geografia histórica do período bíblico. Geisler lembra o trecho do
livro de John MacArthur, ―How to Study the Bible‖ (cit. em ―Fundamentos Inabaláveis‖,
pg. 279), explicando a rapidez como a mensagem havia sido propagada pelas áreas que
Paulo citou, ―a Macedônia e a Acaia (atual Grécia)‖. Paulo havia estado com eles
algumas semanas, contudo, em pouco tempo o seu testemunho se espalhara. Isto pode
ser explicado observando a geografia antiga do lugar. A rodovia Inaciana passava pela
Tessalônica, sendo, como disse MacArthur, ―a principal confluência entre o leste e o
oeste, e tudo que acontecesse ali se transmitia por todo o trajeto da rodovia‖.
Há outras evidências desconcertantes no aspecto geográfico. Este parâmetro é
importante, pois geografia de uma área (principalmente uma área de turbulência
política, como Israel sempre foi) é mutável, daí a importância de geografia histórica.
Provas históricas corroboram suposições geográficas. E, elementos obscuros da
geografia que não poderiam ter sido escritos por cristãos distantes tanto culturalmente
quanto geograficamente, por desconhecerem tais elementos, favorecem o pensamento
de que o relato bíblico remonta ao período em que os eventos registrados nos mesmos
ocorreram. Observemos o que diz Mcdowell:

―Os escritores dos evangelhos se referem casualmente e com freqüência a


aspectos geográficos, indicando sua familiaridade com a terra. Mais importante, Jesus
parece ter feito e dito certas coisas em relação ao ambiente que o circundava com o
propósito de deixar mensagens inesquecíveis impressas vividamente na mente dos
discípulos.
Por exemplo, na base do “rochedo” do Monte Hermom, com 2.743,2 m de altura,
Jesus diz aPedro: “Tu és Pedro (gr. Petroj, pedra) e sobre esta pedra (gr. Petra,
grande pedra, fundamento) edificarei a minha igreja, as portas do inferno (Hades) não
prevalecerão contra ela” (Mt. 16:18). “Portas de Hades” era um termo rabínico,
referindo-se às cidades gentias. Jesus estava predizendo que a missão confiada a seus
apóstolos iria, no futuro, conquistar os gentios. Jesus fez também essa predição num
lugar apropriado, pois a base do Monte Hermom, em Cesaréia de Filipe, contém
APOLOGÉTICA CRISTÃ 26
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

inúmeras cavernas grandes, cavadas no penhasco que abrigavam estátuas de deuses do


panteão greco-romano.(...)
Havia várias outras cidades e vilarejos pendurados no alto do montes em volta do
Mar da Galiléia. Por exemplo, Gamala era a fortaleza dos zelotes ao leste. As luzes
dessas cidades muitas vezes faziam os apóstolos se lembrarem do tempo em que Jesus
acenava para eles ao dizer: “Vós sois s luz do mundo. Não se pode esconder a cidade
edificada sobre um monte” (Mt. 5:14). (...)
Ao redor do Mar da Galiléia, particularmente Tiberíades e Gadara, fontes de
águas famosas atraíam os que precisavam de cura. As fontes termais de Gadara,
também conhecidas como Emmatha, eram as maiores do mundo, além das de Veneza.
O relato de Mateus se ajusta muito bem a este ambiente: “Percorria Jesus toda a
Galiléia, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda a
sorte de doenças e enfermidades entre o povo. E a sua fama correu por toda a Síria;
trouxeram-lhe, então, todos os doentes, acometidos de varas enfermidades e tormentos:
endemoninhados, lunáticos e paralíticos. E ele os curou. E da Galiléia, Decápolis,
Jerusalém, Judéia e dalém do Jordão, numerosas multidões o seguiam” (Mt. 4:23-25).
(...) Mesmo alguns dos milagres mais estranhos de Jesus pareciam familiares
nesse cenário em volta do Mar da Galiléia. Uma família de peixes que habitam nesse
mar é chamada de Chichlidae, ou reprodutores pela boca. Ela só é encontrada no Lago
Vitória (Uganda), ao longo do rio Nilo, e no Mar da Galiléia. O cartógrafo Dr. Jim
Fleming (....) explica seu significado: “A fêmea conserva os ovos na boca até que
nasçam os filhotes. À medida que eles começam a crescer, ela os deixa sair de tempos
em tempos para “arejar”, mas os recolhe depressa quando pressente perigo. A mãe
jejua até quase a inanição, a fim de não engolir seus filhotes. Esses instintos fortes
provocaram o nome hebreu “Peixe-Mãe” para a espécie. Depois de os filhotes estarem
aptos para sobreviver sozinhos, a mãe muitas vezes mantém um substituto na boca. As
fêmeas são algumas vezes apanhadas hoje com seixos ou tampas de garrafa na boca! O
nome popular desses peixes é “peixe de São Pedro”,por causa da história no evangelho
de Mateus 17:24-27 sobre Pedro fisgar um peixe com uma moeda na boca”.
(...) A pequena cidade de Betfagé fica na encosta do Monte das Oliveiras do outro
lado de Jerusalém. Ela toma o seu nome de uma fruta temporã que cresce nas figueiras
da região. A fruta é chamada phage em hebraico e aparece no início da primavera,
com as primeiras folhas. Você já se perguntou por que Jesus estava procurando figos
na figueira quando o texto diz especificamente que “porque não era tempo de figos”? A
resposta é que embora não fosse a estação de figos (gr. sukon, “figos maduros”)o
fato de a árvore ter folhas indicava que ela também deveria ter os figos temporãos
(phage), que eram comestíveis. Desde que a árvore não tinha frutos, Jesus parece tê-la
usado como uma lição objetiva para advertir contra mostrar algo pela nossa
aparência, mas não ter fruto com que apoiá-lo (Mc. 11:12-14). (...)
Em Jerusalém, dos degraus do lado sul do templo onde os rabinos geralmente se
dirigiam a seus pupilos, as sepulturas caiadas de branco que cobrem o Monte das
Oliveiras são claramente visíveis. Jesus provavelmente olhou nesta direção quando
disse: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Porque sois semelhantes aos
sepulcros caiados, que por fora se mostram belos, mas interiormente estão cheios de
ossos mortos, e de toda a imundícia. Assim também vós exteriormente pareceis justos
aos homens, mas por dentro estais cheios de hipocrisia e iniqüidade21”. (Mt. 23:27-
28).

5.2.3 – Quanto ao Teste Externo, profuso é o material histórico, como


demonstrado no item anterior, que corrobora o texto bíblico; porém escasso é o material
21 – Ibid. pgs.230, 231, 232 e 233.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 27
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

literário. Em termos de obras proeminentes de períodos contemporâneos e próximos a


Cristo, sobre a vida e ressurreição do Messias, temos os escritos de Phlegon (c. de 54 d.
C.), Thallus (c. de 140 d. C.) e Josefo (c. de 93 d. C.). Há ainda muita especulação
sobre escritos que possivelmente referiam-se a Cristo, dentre os manuscritos de
Qumram, e em alguns escritos rabínicos remanescentes. Recomendamos a leitura dos
capítulos 1 a 3, do livro ―Ele Andou Entre Nós – Evidências do Jesus Histórico‖, de
Josh Mcdowell e Bill Wilson.

6. A DIVINDADE DE JESUS CRISTO

6.1. CITAÇÕES DOS EVANGELHOS


Vimos anteriormente que as evidências mostram que os manuscritos bíblicos são
registros coesos, que passam no teste de confiabilidade de C. S. Sanders. A profusão de
material (mais de 22 mil cópias) do NT, o transformam no documento com maior
probabilidade de fidelidade histórica, a partir do teste bibliográfico, que se conhece.
Não se pode negar as evidências internas e externas, simplesmente. Além disto, já
observamos que Deus se justifica, isto é, a existência de Deus não somente é possível,
como totalmente provável, e em termos empíricos, totalmente necessária. Isto, pois a
Criação (Universo) não pode ter sido algo auto causado. Sabemos, de acordo com a
Segunda Lei da Termodinâmica, que o Universo está gradativamente perdendo energia.
Ora, o sistema não pode estar perdendo energia eternamente, o que nos leva ao princípio
da causalidade.
A causa do Universo é motivo de muita discussão nos círculos acadêmicos,
porém, uma coisa é quase unanimidade hoje em dia: a visão de um Universo finito e
causado. Sabe-se, atualmente, que antes da criação do Universo, houvesse o que
houvesse, as leis da Física não se aplicariam, e àquela situação, os astrofísicos deram o
nome de ―singularidade‖. Ora, somente algo de fora de um sistema fechado pode
explicá-lo, logo o Universo tem uma causa exterior. Através de argumentos também
expostos, imaginamos que há algo maior do que tudo isso, e nada, por definição pode
―ser o maior do que o maior que tudo isso‖ (argumento ontológico), logo, este ser que é
―maior do que tudo isso‖ fora o Criador do Universo. A Bíblia, como Revelação de
Deus, afirma categoricamente que ―Deus Criou céus e terra‖, e o chama de ―eterno‖.
Deus, o não causado, eterno e infinito, é o Criador do Universo físico finito, ao mesmo
tempo em que é Todo Poderoso, Todo Bondoso. Vimos também que Deus, Todo
Bondoso, permite a existência do mal, uma vez que criou seres que tinham vontade,
capacidade de escolha entre bem e mal. Este é o preço de uma sociedade com arbítrio
em suas decisões (apesar, lembramos, que o sistema reformado de um modo geral,
propõe que esta condição de escolha não engloba as decisões espirituais, uma vez que o
ser humano, espiritualmente, está morto, cf. Ef. 2:1-2).
Alguns destes assuntos são pré requisitos para entendermos a proposta do capítulo
que ora estamos. Se o texto to NT é confiável, pelas evidências, então é de suma
importância observarmos com cuidado o que Jesus disse acerca de si mesmo, nos
evangelhos, e o que a Bíblia, de modo geral, diz acerca de Cristo, desde as profecias, até
as páginas dos escritos dos apóstolos. De todos os escritos evangélicos, porém, o que
mais centraliza-se neste assunto é o evangelho de João. Neste evangelho, Jesus é tratado
de forma distinta dos outros evangelhos (sinóticos). Entender as reivindicações de Jesus
acerca de si mesmo,é tentar perscrutar a teologia do texto de João, na qual há os mais
belos ensinos acerca da divindade de Jesus dentre os demais, em toda a Escritura.
O propósito do evangelho de João está escrito no epílogo (20:30-31), quando o
escritor afirma que os relatos ali servem para que os leitores creiam que Jesus é o
APOLOGÉTICA CRISTÃ 28
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

Cristo, o Filho de Deus. Há implicações nestas afirmações. A primeira diz respeito ao


entendimento dos significados de ―Cristo‖ e ―Filho de Deus‖, tanto sob a ótica judaica
(João era judeu), quanto a ótica grega, que tipificava o pensamento do mundo antigo,
que diga-se de passagem já era maioria da Igreja nos dias finais do apóstolo.

6.1.1 – ―Cristo‖ significa que Jesus era o Messias (hb. Mashiach), ou seja, o
―Ungido‖. Sabe-se que havia três tipos básicos de ―ungidos‖ na perspectiva vétero
testamentária, a saber:
O rei de Israel, a partir do período monárquico. Os reis deveriam ser
ungidos pelo sumo sacerdote para o ofício. Após Samuel ungir Saul, o sub título
―ungido‖ permanece consigo. Cf. 1 Sm. 24:10; 2 Sm. 22:51
O sumo sacerdote, desde o estabelecimento do ofício sacerdotal, nos dias
de Moisés e Arão. Cf. Lv. 8:12.
O Ungido prometido, este seria o ―restaurador‖ e ―libertador eterno‖ de
Israel. Traria, de acordo com a concepção judaica dos dias de Jesus, a paz e a
prosperidade para Israel, conforme os dias do rei Davi. Este Messias fora predito no AT
por textos que viriam a ser interpretados claramente como textos messiânicos, como o
Salmo 22 e o capítulo 61 de Isaías. Quanto a este último, Jesus testifica-o acerca de si
mesmo, em Lucas capítulo 4.
Mateus é o escritor evangélico que mais dispensa atenção ao título Messias, pois
era de seu interesse mostrar aos seus destinatários, os judeus, que Jesus era o Cristo. O
artigo ―o‖ identifica que o ―Ungido‖ nos dias Jesus assumiria uma conotação profética,
mística, pouco compreensível até, inclusive para os judeus. O messias seria um homem
comum? Seria um enviado, um mensageiro de Deus? Eram perguntas que permeavam a
mente dos israelitas. Em Mateus 16, observamos o interesse de Jesus em saber o que os
homens pensavam acerca dele mesmo. A resposta dos discípulos, sobre o que os
homens achavam sobre Jesus, demonstra o que eles pensavam. Esta resposta encontra-
se no versículo 14, e mostra que os homens associavam o ministério de Jesus a um
ministério profético sob os moldes do ministério profético do AT. Contudo, a resposta
de Pedro indica que ele sabia bem quem Jesus era. A resposta de Pedro, em Mateus
16:16, constitui-se no motivo de João ter escrito o seu evangelho: mostrar que Jesus é o
Cristo, o Filho do Deus vivo.

6.1.2 - A filiação para o judeu tinha um caráter mais excepcional do que para nós,
ocidentais, hoje. A filiação significava natureza. Ser filho de alguém significava, em
última análise, compartilhar da natureza daquele indivíduo. Ser ―Filho de Deus‖
significava compartilhar da natureza de Deus (cf. Jo. 5:18), e apenas a uma pessoa ao
longo da História foi dado este atributo, Adão. Uma coisa, porém, era dizer-se igual a
Adão, outra coisa era dizer-se igual a Deus. E é aí que há um fator desconcertante nos
ensinos de João: o registro das auto reivindicações de Jesus, com a forma ―EU SOU‖. O
uso do termo ―Eu Sou‖ tinha um especial interesse aos judeus e rabinos da época, pois,
para eles, estava clara a associação com a utilização da mesma forma por Deus, no
Velho Testamento:

―Respondeu Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos
olhos de Israel: EU SOU ( hyh, hayah – texto hebraico; egw eimi, „egô eimí‟ – LXX:
tornar-se, ser, vir a ser, acontecer, existir) me enviou a vós.‖ Êxodo 3:14
―Disseram-lhe, pois, os judeus: Ainda não tens cinqüenta anos e viste a Abraão?
Disse-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que, antes que Abraão existisse, EU
APOLOGÉTICA CRISTÃ 29
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

SOU. Então pegaram em pedras para lhe atirarem, mas Jesus ocultou-se, e saiu do
templo passando por meio deles, e assim se retirou‖. João 8:57-59

―Se vocês não crerem que EU SOU, de fato morrerão em vossos pecados‖. João
8:24

Se Jesus associava-se claramente a YHWH (Iahweh), do Antigo Testamento,


quais eram as suas pretensões? Obviamente que ele queria que os judeus vissem um
paralelo entre ele e Deus no AT. Isto significa que podemos afirmar que Jesus,
explicitamente, reivindica para si a divindade. Ora, isto explicaria o seu nascimento e
ressurreição, sua infalibilidade e autoridade para perdoar pecados (Mc. 2:5). Não há
como imaginarmos a Jesus dissociado de sua divindade. Pela evidência do relato
bíblico, Jesus é Deus, e só pode existir, de acordo com o que nos á apresentado no NT,
como Deus. Geisler cita alguns paralelos dos evangelhos com o AT 22:

―Jesus disse: ―Eu sou o bom pastor‖ (Jo. 10:11); o AT declarou : ―Iahweh
(SENHOR) é o meu pastor‖ (Sl. 23:1).
Jesus declarou ser o juiz de todos os homens e de todas as nações (Jo.
5:27; Mt. 25;31).
Jesus disse: ―Eu Sou a luz do mundo‖ (Jo. 8:12); o AT proclamou:
―Iahweh é luz para sempre‖ (Is. 60:19). ―Iahweh é minha luz‖ (Sl. 27:1).
Jesus afirmou que podia ―perdoar pecados‖ (Mc. 2:5), e os judeus
reagiram a ele dizendo: ―Quem pode perdoar pecados, a não ser Deus?‖ (Mc. 2:7). Jesus
então provou sua autoridade pela cura miraculosa (Mc. 2:10-12; contudo, Jeremias
31:34 afirma que ―Porque eu (Deus) lhes perdoarei‖.
Jesus declarou ser o doador da vida (Jo. 5:21-23). Somente Deus dá a vida
(1 Sm. 2:6; Dt. 32:39).
Finalmente, Jesus disse: ―Eu e o Pai somos um‖ (Jo. 10:30). O termo um
refere-se à essência ou natureza do Ser divino‖.

6.1.3 - A tabela a seguir associa alguns títulos usados exclusivamente por Deus
(YHWH)23 no Antigo Testamento, e os relaciona com Jesus, em passagens do Novo
Testamento. A tabela é uma reprodução do Trabalho de Josh McDowell e Bart Larson,
no livro ―Jesus: uma defesa bíblica de sua divindade‖, reproduzida no livro
―Fundamentos Inabaláveis‖, de Geisler e Bocchino:

Título / Atributo Usado por Iahweh Usado por Jesus


YHWH (Eu Sou) Ex. 3:14 Jo. 8:24
Dt. 32:39 Jo. 8:58
Is. 43:10 Jo. 18:15
Doador da Vida Gn. 2:7 Jo. 5:21
Dt. 32:39 Jo. 10:28
1 Sm. 2:6 Jo. 11:25
Perdoador de pecados Êx. 34:6-7 Mr. 2:1-12
Ne. 9:17 At. 26:18
Perdoador de pecados Dn. 9:9 Cl. 2:13
Onipresente Sl. 139:7-12 Mt. 18:20
22 – Op. Cit, pg 308
23 – ―YHWH‖: Tetragrama sagrado, que continha o nome de Deus.Seu significado foi perdido, pois os israelitas tinham medo de
ferir o quarto mandamento (Êx 20:7), depois do exílio, quando houve uma atenção cuidadosa à prática da Lei. As vogais de
―Adonai‖ (Senhor) eram postas embaixo do tetragrama para lembrar os leitores que YHWH não deveria ser pronunciado. Como os
cristãos não sabiam de tal inferência, liam as vogais e as consoantes, resultando a forma ―YeHoaWah‖ ou ―JeHoVaH‖.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 30
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

Pv. 15:3 Mt. 28:20


Onisciente 1 Rs. 8:39 Mt. 11:27
Jr. 17:9-10,16 Lc. 5:4-6
Jo. 2:25; 16:30; 21:27
At. 1:24
Onipotente Is. 40:10-31; 45:5- Mt. 28:18
13,18 Mr. 1:29-34
Jo. 10:18
Preexistente Gn. 1:1 Jo. 1:15,30; 3:13,31-
32; 6:62; 16:28; 17:5
Eterno Sl. 102:26-27 Jo. 8:58
Hc. 3:6
Is. 9:6
Mq. 5:2
Imutável Nm. 23:19 Hb. 13:8

João apresenta a Jesus como o ―Logos‖ de Deus (Jo. 1:1; 1 Jo. 1:13; Ap. 19:13).
Este termo, da forma como foi usada por João, apresenta similaridades e discrepâncias
quanto ao conceito, se comparado com o termo como era usado na filosofia grega. De
forma geral, para os gregos, o logos era razão, e refletia o pensamento de que Deus não
poderia entrar em contato diretamente com a matéria, mas utilizava-se da razão como
um sensor divisório entre si e o mundo. Assim o logos do pensamento grego era a razão
de Deus e da ordem do mundo sensível, criado. Contudo, o logos de João relacionava-se
mais ao uso que a expressão tinha comumente, ―palavra‖. Em última análise, a palavra é
a expressão absoluta de um pensamento, sendo um meio pelo qual o pensamento se
revele. A associação com o pensamento grego fora inevitável, e alguns viram isto de
forma benéfica, sugerindo que a filosofia grega preparou o mundo para o recebimento
desta mensagem. Alguns gnósticos viram similaridade entre o pensamento neoplatônico
grego e o uso da expressão em João, sugerindo um evangelho gnóstico. Porém, percebe-
se que o evangelho traz uma idéia latente radicalmente diferente da usada pelos
filósofos neoplatônicos, como Filo.
A expressão tinha mais a ver, segundo alguns eruditos, com o uso de ―palavra‖ no
Velho Testamento. A expressão ―Verbo‖ vem do latim (Verbum = logoi, palavra). No
hebraico, dabar (palavra) é usada 394 vezes, é a expressão virtualmente concreta da
personalidade divina. A idéia é a de que ―Deus é aquilo que ele diz‖. O salmo 119
mostra esta ―palavra‖ como fonte de vida (vs. 25), da luz (vs. 105) e do entendimento
(vs. 169). Na LXX, logos e rhema são usadas para traduzir dabar. Contudo, logos tem
proeminência no uso, principalmente nos livros proféticos. O ―Verbo‖que no princípio
esta com Deus, ao mesmo tempo é Deus.
A afirmação final do versículo 1, de João 1, literalmente diz ―...E Deus era a
Palavra‖. ―Palavra‖, portanto, seria o sujeito, enquanto que ―Deus‖ é o predicado. De
início observamos que João lança os alicerces da doutrina da Trindade, pois afirma que
o Logos, ao mesmo tempo em que estava com Deus era Deus. Aqueles que dizem, como
as Testemunhas de Jeová, que é necessário o uso do artigo indefinido por ser norma no
grego não levam em conta várias considerações. Vejamos algumas: A) Esta regra
deveria aplicar-se, portanto, a toda vez que aparece um substantivo como predicado, o
que tornaria a tradução inteira o caos. Por exemplo: no versículo 14 do mesmo capítulo,
seguindo-se esse pensamento, a tradução seria ―...e o verbo se tornou uma carne‖. No
versículo 18 deveria estar escrito ―...ninguém jamais viu a um deus‖. O que,
APOLOGÉTICA CRISTÃ 31
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

obviamente, seria absurdo. B) Como predicado ―Deus‖ indicaria uma qualidade do


logos. Assim, o logos também seria Deus, como o Pai é Deus. Contudo, o logos não é o
Pai. A distinção que João faz, no início de seu evangelho, portanto, indica que ele quis
mostrar a natureza de Cristo, do Messias salvador, como sendo divina. Cristo é Deus, ou
seja, existe com Deus em mesma essência ou substância. Se perguntássemos a um judeu
que ouvira a ―Palavra‖ do Senhor (como no salmo 119): Desde quando isto (a palavra
de Deus) representa o que Deus é ou sente? Desde SEMPRE, seria obviamente a
resposta, pois, como já foi exposto, a palavra de Deus expressa o que Deus é ou pensa.
Como Deus (e somente ele) é IMUTÁVEL e ETERNO, sua palavra também é, posto
que está com Deus desde sempre, e obviamente permanece imutável.

6.2. DISCURSOS DE JESUS CRISTO NO EVANGELHO DE JOÃO


Jesus Cristo fez 7 célebres discursos em João, nos quais figuradamente relaciona a
si mesmo com figuras conhecidas do cotidiano judaico de sua época, e que, nas páginas
do Antigo Testamento, foram usadas com bastante significação. Vejamo-las:

6.2.1 – O Pão da Vida – Em Êx. 16:15 está escrito que os israelitas, no deserto,
comiam do Maná (hb. sig, ―o que é isto?‖). O maná precisava ser recolhido diariamente,
pois se ficasse para outro dia, amanheceria estragado. Por ser a base da nutrição israelita
naquele período, o Sl. 78:24-25 afirma que Deus lhes dera o trigo do céu. No versículo
41 do capítulo 6 de João, Jesus afirma acerca de si mesmo:

―Eu sou o pão vivo que desceu do céu‖

Nos versículos 56 a 58, Jesus não somente reafirma metaforicamente que ele é o
―pão vivo que desceu do céu‖, como ele orienta que as pessoas bebam de seu sangue e
comam de sua carne. Ora, o que terá quisto dizer com isto. Além de relacionar-se à fé
nele, isto é, em quem Jesus era, era preciso ouvir à sua palavra. ―Comer a carne‖ seria,
portanto, ―ouvir e obedecer à sua palavra‖. Isto é exatamente o que diz Pedro, quando
muitos discípulos, após este discurso, deixam Jesus (vs. 66), no versículo 68: ―... Tu tens
as palavras da vida eterna‖.

6.2.2 – A Luz do Mundo – Jesus diz de si mesmo: ―Eu sou a luz do mundo‖, em
Jo. 8:12. Como vimos, o salmista, no Salmo 119:105 diz que a Palavra do Senhor é luz
para o seu caminho. Obviamente que Jesus fazia um paralelo com texto tão conhecido.
O Salmo 119 era especialmente observado por ser um salmo que fala inteiramente da
Palavra de Deus. É o maior salmo da Bíblia, e é dedicado exclusivamente a fazer
referências sobre a Palavra de Deus. Jesus, em outras palavras, está dizendo novamente
que ele mesmo é a Palavra.

6.2.3 – A Porta das Ovelhas – Esta terceira figura, ―porta das ovelhas‖ (10:9), que
Jesus usa para falar acerca de si mesmo, funciona quando observamos o contexto, quase
como um preparativo para a próxima figura usada por ele, a do Bom Pastor (10:11).
Somente o pastor das ovelhas passaria pela porta, isto porque era costume dos pastores
israelitas ficarem de guarda nos currais das suas ovelhas. Muitos dormiam inclusive
nestes currais, e somente os que guardassem as ovelhas estariam autorizados a entrarem
pela porta. A ―porta‖ tinha uma finalidade: levar aquele que adentrasse por ela a ―achar
pastagens‖ (vs. 9). O que isto significa? No mesmo versículo Jesus afirma que aquele
que passar pela porta, ―entrará e sairá...‖, esta é uma expressão que nitidamente
relaciona-se à liberdade! No capítulo 8 de João, versículos 31 e 32, está escrito:
APOLOGÉTICA CRISTÃ 32
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

―Jesus dizia, pois, aos judeus que criam nele: Se vós permanecerdes em minha
palavra, verdadeiramente sereis os meus discípulos, e conhecereis a verdade, e a
verdade vos libertará‖.

A idéia de liberdade está presente no evangelho de João, tanto no capítulo 8


quanto no capítulo 10. Contudo, nos dois casos, a liberdade relaciona-se com a Palavra.
Obviamente que, se nós para termos liberdade, precisamos entrar e sair pela ―Porta‖,
que conduz às ―pastagens‖, esta expressão, portanto, relaciona-se à Palavra de Deus.

6.2.4 – O Bom Pastor – Esta expressão (10:11) é continuação do discurso anterior.


Jesus mesmo é A Porta das ovelhas e o Bom Pastor, que conduz as ovelhas, às
pastagens, que obviamente referem-se à sua Palavra. Obviamente que há uma analogia
com o Salmo 23 ―O Senhor é o meu Pastor, nada me faltará‖. Da mesma forma que
Jesus nos guia às pastagens, o Senhor guia o salmista às pastagens verdes (Sl .23:2).
Seguindo as instruções da Palavra do Senhor somos alimentados e fortalecidos.

6.2.5 – Ressurreição e a Vida – Este é o quinto pronunciamento de Jesus, ―Eu


Sou...‖. Aqui, como em João 14:6, Jesus se intitula como sendo a Vida. No Salmo
119:107, o salmista pede ao Senhor que ele o vivifique segundo a sua Palavra. Quando
disse de si mesmo, que era a ―Porta‖, Jesus afirmara que viera para dar vida, e vida em
abundância. Esta vida tem obviamente duas nuances: uma imediata (cap. 11) e uma
escatológica (Jo. 11:24, Ap. 2, 3 e 4). O que nos garante receber tal vida abundante?
Obviamente que é seguindo o que diz a Palavra de Deus. Quem a Palavra de Deus, teme
a Deus. E ―O temor do Senhor é fonte de vida, que livra os homens dos laços da morte‖
Pv. 14:27.

6.2.6 – O Caminho, a Verdade e a Vida - O sexto pronunciamento de Jesus,


começando com a expressão ―Eu Sou‖ está em Jo. 14:6. Já falamos sobre as figuras do
Caminho e da Vida. Nos deteremos na expressão ―Verdade‖. Apologética, como
sabemos, significa ―defesa‖. Vimos, no início da apostila que esta idéia está presente em
2 Tm. 4:16 e provavelmente em 1 Pe. 3:15-16. Nesta última referência, Pedro orienta a
Igreja a responder a razão da esperança que há em nós. Isto, em última análise,
consistirá na Verdade absoluta. Toda argumentação deve basear-se em verdades, não
em conjecturas, pois as mesmas, perante um tribunal, não se igualam: a verdade
prevalece sobre a conjectura. Jesus afirma categoricamente, em João 17:17 que a
Palavra de Deus é a Verdade:

―Santifica-os na verdade: A tua Palavra é a verdade‖.

Ora, se Jesus é a ―Verdade‖, conforme diz de si mesmo, em Jo. 14:6; e a Verdade


é a Palavra (Jo. 17:17), logo Jesus é a Palavra (silogismo simples).
APOLOGÉTICA CRISTÃ 34
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

6.2.7 – Videira Verdadeira – O sétimo e último pronunciamento ―Eu Sou...‖ de


Jesus está em João 15:1. Extraordinariamente, mais uma vez o exemplo relaciona-se à
Palavra:

―Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o lavrador. Toda vara que em mim não
dá fruto, a tira; e limpa toda aquela que dá fruto, para que dê mais fruto. Vós já estais
limpos pela palavra que vos tenho falado‖. Jo. 15:1-3

Somos nutridos, como varas que estão enxertadas na Videira, que é próprio
Senhor Jesus. Observe que, como a seiva nutre interiormente, a limpeza pela Palavra é
interior.

6.2.8 – O que há de desconcertante nestes discursos, apenas registrados por João,


e que eles trazem dois aspectos comuns, que se repetem:

1. Jesus usa a expressão “EU SOU‖. Como sabemos, esta expressão é


comumente associada ao Deus Yahweh, de Êxodo 3:14, aonde
encontramos a expressão ―EU SOU O QUE SOU‖. Logo, de forma nítida e
inconfundível, Jesus associava-se à Divindade. Isto está claro em Jo.
8:24,57-59.
2. Todas as expressões relacionam-se à Palavra. De uma maneira ou de
outra, os exemplos que Jesus dá, de si mesmo, apontam para a Palavra de
Deus. Ele (Jesus) é a Verdade (Jo. 14:6). A Palavra de Deus é a Verdade
(Jo. 17:17).

É nítida a idéia de Jesus, pelo relato dos evangelhos, cria que era Deus. Os
milagres (sinais) testificaram isto. Não é à toa, portanto, que João inicia seu evangelho
afirmando que, no início era a Palavra... e a Palavra era Deus. Por todo o seu
evangelho, João relaciona Jesus com a Palavra de Deus, e isto está presente nos
discursos de Cristo. Há sete sinais em João, e ele, distintamente dos sinóticos, apresenta
os sinais (milagres) não apenas como eventos escatológicos, mas como ações
sobrenaturais de Deus para exemplificar verdades inerentes que o próprio Deus quis
transmitir. Interessante que o último destes sinais relatados em João fora a ressurreição
de Lázaro (Jo. 11:1-46), o que apontava diretamente para o último milagre relatado no
evangelho, que seria a sua própria ressurreição (Jo. 20:1-10).

Indubitavelmente este é o pensamento registrado pelos evangelistas, e que


permeia todo o Novo Testamento. Em um estudo específico sobre a Teologia do Novo
Testamento, o fator divindade de Cristo evidencia-se, logicamente. Se o NT passa-nos
diversos tipos de testes literários, se está apoiado pelas evidências internas e externas, se
há coesão no relato, e comprovadamente, historicidade, não há porque duvidar da
veracidade de suas palavras. O NT é algo legitimo, como é toda a Bíblia. Focamos mais
o estudo no NT pelas inferências óbvias de assuntos a serem abordados pela
Apologética Cristã. Porém, como afirmamos ao longo desta apostila, a Bíblia não traz
contradições de espécie alguma, e seus pontos obscuros vem sido, ao longo dos séculos,
elucidados pela utilização correta dos meios de verificação crítica, pela Arqueologia e
pela utilização correta dos meios hermenêuticos legítimos. Sendo assim, concluímos
que é perfeitamente lógico crer em Deus e crer em seus atributos, em seu amor, e na
pessoa de Jesus Cristo. Precisamos deste conhecimento para bem responder, a qualquer
pessoa que nos perguntar a razão da esperança que há em nós.
APOLOGÉTICA CRISTÃ 34
A Divindade de Cristo: Pilar Apologético

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Jesus Histórico. São Paulo: Ed. Candeia, 1995.
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I, II, III e VI. São Paulo: Ed. Hagnos, 2001. Ed. Candeia, 1997.
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Versículo. Volume II. São Paulo: Ed. Candeia, 1998.
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12. Revista Superinteresssante. São Paulo: Ed. Abril, Maio de 2004

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