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RAUL BOPP (1898-1984) TRECHO DE COBRA NORATO I Um dia ainda eu hei de morar nas terras do Sem-fim.

Vou andando caminhando caminhando. Me misturo no ventre do mato mordendo razes. Depois fao puanga de flor de taj de lagoa e mando chamar a Cobra Norato. Quero contar-te uma histria. Vamos passear naquelas ilhas decotadas? Faz de conta que h luar. A noite chega mansinho. Estrelas conversam em voz baixa. Brinco ento de amarrar uma fita no pescoo e estrangulo a cobra. Agora sim me enfio nessa pele de seda elstica e saio a correr mundo. Vou visitar a rainha Luzia. Quero me casar com sua filha. Ento voc tem que apagar os olhos primeiro. O sono escorregou nas plpebras pesadas. Um cho de lama rouba a fora dos meus passos. (...) - E agora, compadre, vou de volta pro Sem-fim. Vou l para as terras altas

onde a serra se amontoa onde correm os rios de guas claras em matos de molungu. Quero levar minha noiva. Quero estarzinho com ela numa casa de morar com porta azul piquininha pintada a lpis de cor. Quero sentir a quentura do seu corpo de vai-e-vem. Querzinho de ficar junto quando a gente quer bem bem. Ficar sombra do mato ouvir a jurucutu guas que passam cantando pra gente se espreguiar. E quando estivermos espera que a noite volte outra vez eu hei de contar histrias (histrias de no-dizer-nada) escrever nomes na areia pro vento brincar de apagar.

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