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O Projecto do novo Regime Jurídico das Federações Desportivas

– Breves considerandos

O projecto de Regime Jurídico das Federações Desportivas, apresentado pelo


Governo ao Conselho Nacional do Desporto (CND) em 17 de Dezembro de 2007,
merece-nos, numa primeira leitura global, alguns reparos.
Por ora, muito sumariamente, daremos apenas conta do projectado quanto à
proporcionalidade de representação das Assembleias-Gerais das Federações
Desportivas (art. 37º) e da limitação à renovação do mandato dos titulares dos
respectivos órgãos sociais (art. 50º).
Com efeito, de acordo com a referida proposta, nas Federações Desportivas de
modalidades colectivas o número de delegados representantes de clubes e
sociedades desportivas não pode ser inferior a 70% do número total de membros da
assembleia geral, estando distribuídos da seguinte forma:
- 35% dos delegados são designados pelas estruturas representativas dos clubes e
sociedades desportivas que participam nos quadros competitivos de âmbito
nacional, (Liga Profissional e Associações de Clubes não profissionais);
- 35% dos delegados são designados pelas estruturas representativas dos clubes
que participam nos quadros competitivos de âmbito regional ou distrital.
Quanto aos restantes 30% serão atribuídos à associação mais representativa dos
praticantes (15%) e pelas associações de treinadores e de árbitros, com 7,5 % para
cada.
Segundo o Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Dr. Laurentino Dias,
"uma federação tem de reflectir nos seus órgãos principais, sobretudo em
Assembleia Geral, a importância da base da sua modalidade, os atletas e os
clubes". Sendo esta distribuição, levada a efeito em nome da denominada
“proporcionalidade de representação”.
No entanto, não podemos estranhar o critério da proporcionalidade seguido,
atendendo que não existe qualquer comparação entre o número de clubes filiados
nas modalidades desportivas onde se verifica a existência de Ligas Profissionais e
nas respectivas competições não profissionais, nem no número de praticantes
desportivos envolvidos nas várias modalidades onde se disputam competições
desportivas profissionais, é semelhante aos que participam em competições
desportivas de nível “inferior”.
Efectivamente, continuamos a assistir a uma valorização representativa (talvez
desproporcionada) de um reduzido número de Clubes que disputam competições
Crónica n.º 13 publicada em 14 de Janeiro de 2008
Autor: Lúcio Correia
Associado n.º 83
desportivas de carácter profissional (a saber: 32 no Futebol, 11 no Andebol e 8 no
Basquetebol), face a um número muito superior de Clubes e atletas que são a
verdadeira “base” da estrutura fundamental de cada modalidade.
Estranhamos pois, o discutível critério de proporcionalidade e democraticidade
adoptado pelo Governo. Talvez estejamos perante a tentativa da criação de um novo
modelo organizativo no futebol, e (sempre por arrastamento) tente-se aplicar o
mesmo modelo às restantes modalidades desportivas colectivas que não detêm
semelhante estrutura, nem nela têm condições para se poder rever.
Veremos adiante, o resultado final deste inovador preceito.
Quanto à duração do mandato dos titulares dos órgãos sociais das Federações
Desportivas e à imposição de limitação legal à sua renovação, constatamos mais
uma inovação curiosa.
O art. 50º da aludida proposta estabelece que:
“1 - O mandato dos titulares dos órgãos das federações desportivas é de quatro
anos, em regra coincidentes com o ciclo olímpico.
2 – Ninguém pode exercer mais do que dois mandatos seguidos no mesmo órgão de
uma federação.”
A meu ver, a perpetuação no exercício de cargos directivos não constitui uma
originalidade desportiva, sendo certo que constatamos este fenómeno, em muitos
outros sectores da sociedade (Sindicatos, Organizações Patronais, etc, etc).
Compreende-se perfeitamente, a tentativa deste Governo para conseguir de alguma
forma acabar com a perpetuação do exercício de cargos que possam, de alguma
maneira, originar comportamentos que traduzam sucessivos e intolerantes abusos
de poder. É indesmentível que a perpetuação no exercício de cargos tem vantagens
e inconvenientes
Contudo, a maior temporalidade na ocupação de determinados cargos directivos nas
Federações Desportivas, também pode, e deve significar, o reconhecimento de
competência e qualidades por parte daqueles que os elegem.
Assim, parece-me que a limitação de exercício de apenas dois mandatos seguidos
em qualquer órgão de uma Federação Desportiva, também poderá contribuir para o
abandono precoce de pessoas que detêm, aptidão e qualidades inaptas para o
exercício de um determinado cargo, e que, por imposição legal, sejam forçadas a ser
substituídas por outras menos experientes e sem qualquer capacidade para o
mesmo.
No meu entendimento, o importante não é saber quem vai exercer o poder e por
quanto tempo, mas sim, o que fazer com este durante o tempo que se tem, e que
tipo de legado se deixa na respectiva modalidade.
Esperemos que a versão final deste diploma fundamental seja substancialmente
diferente da proposta apresentada.

Crónica n.º 13 publicada em 14 de Janeiro de 2008


Autor: Lúcio Correia
Associado n.º 83

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