Profª Adjunta – DCJ e do PPGS Nota de aula I • KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. São Paulo : Martins Fontes, 2000. Pp: 62-70 • __________. Teoria Pura do Direito. São Paulo : Martins Fontes, 2003. pp. 79-102. Teoria Pura do Direito • 1. As normas jurídicas como objeto da ciência jurídica • - objeto da ciência jurídica – o direito – as normas jurídicas • - conduta humana só interessa ao direito quando determinada nas normas jurídicas como pressuposto, consequência ou conteúdo. • - relações inter-humanas - interessa quando são relações jurídicas – relações constituídas através de normas jurídicas • -apreender algo juridicamente é apreender como direito e como norma jurídica • 2. teoria estática e teoria dinâmica • - o conhecimento jurídico é dirigido a: – Norma jurídica – Aplicação – Observação – Atos de produção da norma • - Teoria estática – tem por objeto o direito como um sistema de normas em vigor • - teoria dinâmica – tem por objeto o processo jurídico em que o direito é produzido e aplicado, o direito no seu movimento – O processo referido é regulado pelo direito: • O processo legislativo – regulado pela constituição • As leis formais ou processuais regulam a aplicação pelos tribunais e autoridades administrativas – a teoria dinâmica também está voltada para as normas • O ato de aplicação é também de produção – considerando que o caráter prescritivo da decisão judicial • 3. Normas jurídicas e proposição jurídica: • A ciência jurídica representa uma atitude interpretativa dos fatos da conduta implicada na norma jurídica – Descreve as normas jurídicas produzidas e aplicadas por atos de conduta humana – Descreve as relações constituídas através das normas jurídicas e entre os fatos por estas determinados – As descrições são proposições jurídicas - são juízos hipotéticos que enunciam ou traduzem o sentido de uma ordem jurídica, condições ou pressupostos fixados por esse ordenamento e consequências determinadas pelo mesmo ordenamento; – São enunciados sobre objetos dado ao conhecimento • Normas jurídicas – são mandamentos, comandos, imperativos, permissões, atribuições de poder, competências – o direito prescreve, permite, confere poder ou competência – O que não é - instruções, ensinamentos, – Podem aparecer sob forma de enunciados propositivos, fáticos – A norma jurídica não é definida por estrutura frasal, o que a define é o sentido produtor do direito • O que diferencia norma de proposição? Diferença entre conhecimento jurídico e autoridade jurídica • Missão da ciência jurídica – conhecer o direito de fora e descrevê-lo com base no seu conhecimento • Missão dos órgãos jurídicos – produzir o direito • O conhecimento para o juiz e para o legislador – é preparatório da sua função • Função do juiz e do legislador - produção jurídica – Legislador –produção de norma geral – Juiz – produção de norma individual • Conhecimento tem caráter constitutivo – produz o seu objeto na medida em que o apreende como um todo com sentido • A pluralidade de normas jurídicas gerais e individuais postas pelos órgãos jurídicos torna-se sistema unitário isento de contradições numa ordem jurídica pelo conhecimento – A produção referida tem caráter teorético ou gnosiológico – Diferente da produção de objetos pelo trabalho humano e da produção do direito pela autoridade jurídica – A ciência não é prescritiva, é descritiva • A ciência e suas proposições são verídicas ou inverídicas e as normas são válidas ou não – A observação de se a norma está em vigor ou não é verificável empiricamente – As proposições não são meras repetições das normas jurídicas • Perguntar se a ciência jurídica é supérflua ao lado do direito é o mesmo que perguntar se a ciência da natureza é supérflua diante da natureza? • Não, a natureza não se expressa em palavras • Se a ciência jurídica é supérflua será apenas diante da lei • Princípios da não contradição e as regras da concludência do raciocínio são aplicáveis ao direito? • Sim, se não direta, indiretamente e podem ser verdadeiros ou não • As normas se contradizem e não podem ser válidas se as proposições jurídicas que as descrevem se contradizem • Uma norma jurídica pode ser deduzida de outra se as proposições que a descrevem podem entrar num silogismo lógico 4. Ciência causal e ciência normativa • Direito e natureza / ciência jurídica e todas as outras ciências que visam o conhecimento informado pela lei da causalidade, de processos reais • A natureza é uma determinada ordem das coisas ou um sistema de elementos ligados uns aos outros como causa e efeito, pelo princípio da causalidade • As leis naturais são aplicações do princípio da causalidade • Se há uma ciência social diferente da ciência natural a sua descrição deve ser feita por princípio diferente do princípio da causalidade • A sociedade é uma ordem normativa de conduta humana • A conduta humana é elemento da natureza , portanto aplicável o princípio da causalidade, portanto não havendo separação distintiva entre ciência social e ciência natural • A análise dos atos da conduta humana entre si e com outros fatos não é feita apenas pelo princípio da causalidade • A existência de outro princípio que ainda não tem designação aceita no âmbito da ciência - o princípio da imputação • A prova da existência de tal princípio é possível nas ciências que estudam a conduta humana determinadas por normas, as ciências que têm por objeto as normas e não a conduta em si – A possibilidade de ser a ciência social diferente da ciência da natureza 5. Causalidade e imputação – lei natural e lei jurídica • Princípio da imputação – é o princípio ordenador, diferente da causalidade, que é aplicado na descrição da ordem normativa da conduta humana • É análogo ao princípio da causalidade, mas deste diferente – a analogia reside na circunstância de o princípio ter nas proposições jurídicas a mesma função análoga à do princípio da causalidade nas leis naturais, com as quais a ciência da natureza descreve seu objeto • Fórmula geral – forma fundamental da proposição jurídica: “sob determinados pressupostos, fixados pela ordem jurídica, deve efetivar- se um ato de coerção pela mesma norma estabelecido” (p. 86) • Como nas ciências naturais, a proposição jurídica liga entre si dois elementos • A natureza da ligação – DEVER-SER e não Ser – resulta da circunstância de a ligação na proposição jurídica ser produzida através da norma estabelecida pela autoridade jurídica, por ato de vontade • Na lei natural a ligação é indepente da vontade humana. • Lei natural – se A é, B é • Na proposição jurídica – se A é, B deve-ser • A diferença só desaparece na mundividência metafísica- religiosa – a ligação causa-efeito é produzida pela vontade divina • Só uma teoria metafísica do direito crer poder encontrar um direito natural na natureza • Numa mundividência científica só há lugar para uma teoria positivista de direito com manutenção da diferença entre ciência natural e proposição jurídica • Sentido do dever-ser – ser prescrito e não ser competente, ser autorizado ou ser permitido – O dever-ser jurídico é a cópula que na proposição jurídica liga pressuposto e consequência • O dever-ser jurídico abrange as três significações: ser prescrito, ser competente e ser permitido positivamente • A proposição jurídica só pode afirmar que, de acordo com determinada ordem jurídica positiva, sob certos pressupostos, deverá intervir determinadas consequências • A ciência jurídica não é o SER, pois afirmar que está em vigor a lei não significa a conduta efetivamente se realiza, apenas afirma que a conduta deve realizar-se • O dever-ser da ciência jurídica não é prescritivo, é descritivo – o fato descrito não é da ordem do SER • A proposição é um juízo, a afirmação sobre um objeto dado ao conhecimento • A descrição é feita alheia aos valores, a resposta será se a norma é prescrita ou não • As semelhanças entre ciências da natureza e ciências jurídicas: • A conexão entre os fatos é funcional – como ocorre com a lei natural • A lei natural é um afirmação descritiva da natureza • A lei jurídica é uma afirmação descritiva do direito – mesmo sendo geral, não é lei propriamente dita • A proposição jurídica, que se apresenta como lei jurídica, descreve as normas gerais da ordem jurídica e as relações através dela constituída bem como as normas individuais que são postas pelas decisões jurisdicionais e pelas resoluções administrativas; • Imputação – “a ligação de pressuposto e consequência expressa na proposição jurídica com a palavra dever-ser “(p. 91) • Imputável – é aquele que pode ser punido pela sua conduta, aquele que pode ser responsabilizado por sua conduta • A ação ou omissão é imputada pelo fato de a conduta ser ligada a uma consequência do ilícito • Imputação – é a ligação entre a consequência do ilícito e o ilícito e não a ligação entre a conduta e o autor • A consequência do ilícito é imputada ao ilícito, mas não é produzida pelo ilícito como sua causa, mas como imputação. 6. Princípio da imputação no pensamento dos primitivos • O princípio da causalidade é uma aquisição evolutiva da humanidade • O ser humano primitivo interpreta os fatos apreendidos pelos sentidos • A vida grupal permite o surgimento da ideia julgadora do que da conduta boa e justa e existe na consciência a representação das normas que regulam a conduta no grupo e vinculam os indivíduos • Na vida grupal, os indivíduos vivem em comum e apreciam ou julgam sua conduta recíproca segundo as normas costumeiras do grupo interpretadas como ordens ou comandos de uma autoridade supra-humana • As normas mais antigas da humanidade são provavelmente as que visam frenar e limitar os impulsos sexuais. • Regra da retribuição ou retaliação – compreende tanto a pena como o prêmio • Trata-se de uma interpretação sócio-normativa da natureza e não de explicação causal • O animismo dos primitivos – regra da retribuição – a crença de que as coisas se comportam em relação às pessoas tal como as pessoas se portam em relação às coisas • A essência do animismo é uma interpretação personalística, portanto sócio-normativo, uma interpretação que opera não segundo o princípio da causalidade, mas segundo o princípio da imputação • O normativismo é anterior à causalidade, que vem da ciência moderna • O dualismo – normativismo e causalidade – é resultado de uma evolução espiritual que separou humanos de coisas 7. O surgimento do princípio causal a partir do princípio retributivo • É provável que a causalidade tenha se originado do princípio da retribuição • O princípio da causalidade é o resultado de uma transformação do princípio da imputação – a conduta não reta é ligada à pena e a conduta reta é ligada ao prêmio • O processo teve início na filosofia natural dos antigos gregos – O sentido histórico de causa é culpa – “a causa é culpa pelo efeito, a causa é responsável pelo efeito e o efeito é imputado à causa da mesma forma que a pena o é ao ato ilícito” (p. 94). • o passo decisivo na transição de uma interpretação normativa para uma interpretação causal da natureza está no fato de o ser humano tornar-se consciente de que as relações entre as coisas independe da vontade humana 8. Ciência social e ciência social normativa • O princípio da causalidade é aplicável à conduta humana nas ciências: psicologia, etnologia, história, sociologia, que têm por objeto à conduta humana • A distinção entre as ciência naturais e as sociais é apenas de grau e não de princípio • A distinção essencial se dá apenas com as ciências sociais normativas, que interpretam a conduta humana segundo o princípio da imputação – são as ciências: da Moral, ética, da jurisprudência e do direito • A tarefa do teórico não é regulamentar, mas conhecer, compreender a sociedade humana • A sociedade, como objeto de uma ciência social normativa, é uma ordem normativa da conduta dos seres humanos uns em face aos outros. • A conduta recíproca dos indivíduos é o que há de comum numa sociedade que consiste numa ordem, que designada como comunidade – comunidade jurídica • Comunidade jurídica – formada por indivíduos de várias línguas, raças, religiões, concepções de mundo, grupos com interesses diferentes e antagônicos. • A comunidade jurídica existe em função de estarem submetidos à mesma ordem, as condutas reguladas através de uma única e mesma ordem jurídica • A eficácia da norma jurídica se verifica por sua validade – validade e eficácia não são idênticas • A conduta antijurídica não constitui razão para a ciência jurídica considerar como não válida a norma jurídica • A lei natural e a norma jurídica ambas voltadas para eventos passados – só se voltam para o futuro sob o pressuposto de que o passado se repita no futuro. • A tarefa da ciência jurídica não é fazer profecia sobre as decisões dos tribunais – põe-se a conhecer as normas individuais e as normas gerais • As profecias da jurisprudência realística distinguem-se das proposições por serem afirmações de SER e não de DEVER SER • A ciência apresenta conexão de imputação (e não causal) entre os elementos do seu objeto • Diferença entre os princípios da causalidade e o princípio da imputação • A forma verbal que apresenta princípios da causalidade e da imputação é um juízo hipotético ( Se A é, B também é / Se A é, B deve ser) • Imputação significa relação normativa / Causalidade é relação natural • Outra diferença: toda a causa concreta pressupõe uma outra causa e todo efeito concreto deve ser considerado como causa de um outro efeito – uma cadeia interminável de causa e efeito • O pressuposto a que é imputada a consequência numa lei moral ou jurídica não são consequências que tenham de ser atribuídos a outros pressupostos – o número de elos numa série imputativa é limitado • O pressuposto de uma causa primeira análoga ao ponto terminal da imputação é inconciliável com a causalidade TGD • Normas que formas uma ordem jurídica são normas que estipulam um ato coercitivo, uma sanção. • Normas gerais devem ser normas nas quais certa sanção é tornada dependente de certas condições, sendo a dependência expressada pelo conceito dever ser. • Normas gerais não define pela forma de escrever - não há necessidade de o legislativo dar às normas a forma de um enunciado com um dever ser hipotético. • Os diferentes elementos de uma norma podem estar contidos em produtos bem diferentes do procedimento legislativo e podem ser exprimidos linguisticamente de várias maneiras. • Colocar o fato no futuro não significa predição, é comando, imperativo. • Regra jurídica ou regra de direito - são descrições formuladas pela ciência jurídica. • As normas jurídicas são decretadas pela autoridade legislativa. • Regra do direito, em sentido descritivo, é um julgamento hipotético, vinculando certas consequências a certas condições, como ocorre com a natureza, em que a condição é causa e a consequência é o efeito. • Diferença entre regra de direito e a lei da natureza - Se A é, B é / Se A é, B deve ser. • Ciência da natureza descreve a Lei da natureza - princípio da causalidade • Ciência jurídica descreve a Regra do direito - normatividade. • Regra do direito não tem exceção e lei da natureza tem exceção - a norma jurídica é inviolável. • A lei da causalidade tem origem na norma – a lei social fundamental é a norma - princípio da retribuição - o bem é recompensado e o mal é punido. • A lei da causalidade emancipou-se da norma e deixou de ser inviolável. • A norma jurídica como padrão de avaliação - • A aplicação da norma jurídica como execução de um órgão ou como obediência pelo sujeito e como base de um julgamento específico de valor qualificando a conduta do órgão ou do sujeito como lícita ou ilícita - julgamentos de valor jurídicos - • A atividade do juiz, como aplicador da norma, é lícita ou ilícita. • A validade da norma é condicionada por fatos: a eficácia da ordem jurídica total; a presença de um fato criando a norma; a ausência de algum fato anulado a norma. • Justo e injusto para o direito - é legal ou não, conforme a lei ou não. • existe apenas um direito positivo para cada território.