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Corpos negros e átomos

Astrofísica I - Aula II
Helio J. Rocha-Pinto
(OV/UFRJ)

© 2005 Helio J. Rocha-Pinto


Introdução
Todo corpo irradia e absorve energia em
várias freqüências. No espaço de
freqüências essa radiação pode ser
contínua ou descontínua. Para
entendermos o espectro eletromagnético
e a distribuição de energia espectral,
precisamos considerar que diversas
quantidades físicas são quantizadas nas
escalas atômicas.
Plano de aula

• Corpos negros
• Leis de Planck, Wien, Rayleigh-Jeans e
Stefan-Boltzmann
• Leis de Kirchhoff
• Átomos de Thompson, Rutherford e Bohr
Corpos negros
• Todo corpo macroscópico emite radiação
térmica sob a forma de ondas
eletromagnéticas. Quanto maior é a
temperatura do corpo, mais radiação é por
ele emitida.
• Corpos também absorvem, refletem ou
espalham radiação que sobre eles incide.
Corpos negros

• Se um corpo receber radiação isotrópica e


constante durante tempo suficiente para que se
acostume a esse ambiente, ele entra num
estado chamado equilíbrio termodinâmico.

Nenhum objeto está jamais em equilíbrio termodinâmico


perfeito. Porém, é possível usar esse estado como
aproximação a estados de quase-equilíbrio encontrados
na natureza e no laboratório.
Corpos negros

• O equilíbrio termodinâmico implica que toda


energia absorvida por um corpo seja, em
seguida, irradiada; do contrário, o corpo se
aqueceria ou se resfriaria.

• A intensidade da radiação emitida por um corpo


em equilíbrio termodinâmico depende somente
da temperatura do objeto e do comprimento de
onda da radiação emitida.
Corpos negros

• Um corpo que absorve grande parte da energia


que sobre ele incide emite como se estivesse
em equilíbrio termodinâmico, i.e., a intensidade
de sua radiação depende somente da
temperatura do corpo e do comprimento de
onda. Como tais corpos são pretos, se sua
temperatura não for muito alta, foram
chamados de corpos negros.
Corpos negros

Representação de um corpo negro usualmente usado em


laboratório, que consiste de uma caixa de paredes
adiabáticas numa das quais há um orifício estreito.

Aprisionamento de fótons numa atmosfera estelar.


© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.

Corpos negros interessam à Astronomia porque as estrelas


podem ser aproximadas como corpos negros. Uma pequena parte da
radiação emitida pela estrela escapa ao espaço circunstelar, de forma
que o astro fica próximo ao equilíbrio termodinâmico.
Radiação de corpo negro
• Muitos pesquisadores
dedicaram-se a medir e
descrever a distribuição de
energia emitida por corpos
negros em diferentes
temperaturas.
• Embora as principais
propriedades destas curvas
fossem conhecidas, a física
clássica não oferece meios
de descrever a distribuição
por inteiro.
Distribuições de energia emitida por corpos negros a
diferentes temperaturas
© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.
Radiação de corpo negro

Lei dos deslocamentos de Wien

Demonstração da Lei de Wien.


© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.

Wien (1864-1928) descobriu que a intensidade


máxima da radiação de corpo negro desloca-se para
comprimentos de onda menores (e freqüências
maiores) à medida que o corpo é aquecido. Essa lei
pode ser expressada matematicamente como:

Representação gráfica da Lei dos deslocamentos de Wien.


© 1998, 1995 Prentice-Hall, Inc., Astronomy Today
Radiação de corpo negro

Distribuição de Rayleigh-Jeans

Rayleigh e Jeans usaram a física clássica para calcular a


radiação de um corpo negro. Eles previram que a intensidade
da radiação de corpo negro dependa de T e λ (ou ν) segundo
as fórmulas ao lado.

Catátrofe do
A discrepância entre a
ultravioleta distribuição de Rayleigh-Jeans
e os dados observacionais, em
altas freqüências, foi chamada
de catástrofe do ultravioleta.
Ela evidenciou a inabilidade da
física clássica em explicar a
distribuição de radiação de
corpos negros.
Radiação de corpo negro

Distribuição de Wien

Pesquisando a intensidade da radiação em altas freqüências, Wien encontrou a


seguinte lei:

A distribuição de Wien
consegue dar conta dos dados
observacionais quando a
freqüência da radiação é muito
alta. Porém, não consegue
explicar toda a curva de
radiação de corpos negros.
Radiação de corpo negro

Lei de Stefan-Boltzmann

A intensidade total irradiada em todos os comprimentos de onda (ou


freqüências) por um corpo negro segue a chamada Lei de Stefan-
Boltzmann:

onde σ é a constante de Stefan-Boltzmann.

B(T) corresponde à área total sobre a


curva da radiação de corpo negro.

© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.


Radiação de corpo negro

Distribuição de Planck

Max Planck só conseguiu descrever a radiação de corpo negro ao adotar uma


hipótese que se chocava frontalmente com a física clássica: a energia de um
onda eletromagnética só poderia admitir valores discretos, múltiplos da
freqüência da radiação multiplicada por uma constante fundamental, que foi
chamada constante de Planck (h).

Com isso, a distribuição de


radiação de corpo negro pode
ser escrita como:
Radiação de corpo negro

Distribuição de Planck (cont.)

Todas as demais leis da radiação decorrem da lei de Planck.


•Lei dos deslocamentos

•Lei de Stefan-Boltzmann

•Distribuição de Rayleigh-Jeans

•Distribuição de Wien
Leis de Kirchhoff
• Ao estudar o espectro de diversos materiais, Gustav Kirchhoff
(1824-1887) estabeleceu as seguintes três leis:
– um sólido, líquido ou gás denso incandescente produz um
espectro contínuo.
– Um gás rarefeito incandescente produz um espectro de
linhas.
– Se a luz de uma fonte de espectro contínuo passa através
de um gás, o espectro do gás se sobreporá ao da fonte.
Se a temperatura do gás é maior do que a da fonte, o
espectro resultante é contínuo, com linhas de emissão
sobrepostas. Se o gás é mais frio que a fonte, o espectro
resultante é contínuo, com linhas de absorção
sobrepostas.
Leis de Kirchhof

Tipos de espectros, segundo as Leis de Kirchhof


© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.
Leis de Kirchhof

Espectro de absorção do Hidrogênio


© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.

Comparação entre os espectros de emissão e absorção do Sódio, no visível.


© 1998, 1995 Prentice-Hall, Inc., Astronomy Today
Leis de Kirchhof

• Se a fonte que emite o espectro contínuo


estiver em equilíbrio termodinâmico, o espectro
contínuo corresponde à radiação de corpo
negro; do contrário, apresentará desvios com
relação à radiação de corpo negro.
• À época de Kirchhoff, a natureza das linhas de
emissão e absorção dos espectros descontínuos
era completamente desconhecida. Sua
compreensão só foi possível quando um novo
modelo de átomo foi proposto por Niels Bohr.
Átomo de Thompson
• Por volta de 1910, inúmeras evidências
experimentais indicavam que os átomos continham
partículas de carga negativa. Uma vez que os
átomos são neutros, deveriam conter igualmente
carga positiva.
• Thomson propôs um modelo de átomo
no qual as cargas negativas se
distribuiriam homogeneamente no
interior de uma distribuição contínua
de carga positiva.
Representação do átomo de Thompson
Átomo de Rutherford
• Através de experiências com espalhamento de
partículas α, Rutherford descobriu que os átomos
deveriam ter um núcleo pesado, onde se
concentrariam as cargas positivas, ao redor do qual
girariam os elétrons.

• O modelo de Rutherford põe os


elétrons em órbitas keplerianas, tal
como os planetas ao redor do Sol.

Representação do átomo de Rutherford


Átomo de Rutherford

O átomo de Rutherford não conseguia explicar


a estabilidade dos átomos. Se o elétron se
movesse em órbita kepleriana ao redor do
núcleo, ele seria acelerado. Como cargas
aceleradas emitem radiação, o elétron acabaria
perdendo energia e espiralaria em direção ao
núcleo. Um átomo com diâmetro de 10-10 m
teria uma vida média de apenas 10-12 s!
Átomo de Bohr
• Para explicar a estabilidade dos átomos, Bohr
modificou o modelo de Rutherford a partir de
quatro postulados:
– Um elétron move-se em órbita circular em torno do
núcleo, sob atração da força coulombiana, obedecendo as
leis da mecânica clássica.
– As únicas órbitas possíveis são aquelas em que o
momento angular é um múltiplo inteiro de ħ (=h/2π).
– Um elétron não emite radiação quando se move numa
dessas órbitas permitidas.
– Um elétron emite radiação de freqüência (E1-E2)/ h quando
se move entre duas órbitas permitidas de energias E1 e E2.
Átomo de Bohr

Suponha um elétron girando ao redor de O segundo postulado de Bohr estabelece


um núcleo de carga Z. A aceleração que que:
ele sofre é v2/r. Usando a fórmula da força
coulombiana: mvr  n, n  1,2, ...

Ze 2 mv 2 Combinando equações anteriores:


F  2 
r r 1 1
mv 2 r  ( mvr ) 2  ( n ) 2  Ze 2
mv 2 r  Ze 2 mr mr

A energia potencial do elétron é: n 2 2


rn  2
 0.529  10 8 n 2 cm
mZe
Ze 2 O raio da n-ésima órbita do átomo de Bohr é
P    F dr   proporcional a n2. A velocidade nessa órbita é
r
dada por
Ze 2
E a energia total é vn 
n
1 Ze 2 Ze 2 E a energia do átomo nessa configuração é
E  mv 
2

2 r 2r
2 π 2 mZ 2 e 4 Z2
En   2 2
 13.6 2 eV
n h n
Átomo de Bohr

Espectros de linha segundo o modelo de Bohr

Kirchhof não conseguiu explicar a natureza das linhas espectrais


encontradas no espectro de gases rarefeitos. Sua existência, todavia,
decorre naturalmente do quarto postulado de Bohr:

Um elétron emite radiação de freqüência (E1-E2)/ h quando se


move entre duas órbitas permitidas de energias E1 e E2.

E1  E2
  Na medida que somente as freqüências
h
possíveis dependem dos níveis
2 π 2 mZ 2 e 4 1 1 energéticos envolvidos na transição e
 
h3 n12 n22 do número atômico, vemos que cada
substância apresentará um espectro de
1 1 linhas distintas, tais como observado
 3.290  1015 Z 2 
n12 n22 por Kirchhof.
Átomo de Bohr

O modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio

O átomo de Bohr baseia-se em aproximações físicas muito grosseiras, que desconsideram


um sem-número de efeitos quânticos. Todavia, ele fornece resultados bastante precisos para
sistemas compostos por um única partícula carregada ao redor de um núcleo massudo, de
carga oposta, tais como os átomos do H neutro, He+, Li++, etc.

De acordo com esse modelo, o raio do átomo de H


no estado fundamental (n=1) é

2
rH  2
 0.529  10 8 cm
me

A energia do átomo depende do nível em que o


elétron se encontra.

13.6
En   eV
n2

Representação dos níveis de energia do átomo de H


© 1968 John Wiley & Sons, Inc., Astrophysics and Stellar Astronomy
Átomo de Bohr

Séries de linhas do hidrogênio

Se tabularmos todas as possíveis transições do elétron a partir de um


determinado nível de energia n a outros níveis de energia superiores,
teremos construído a série de linhas do nível n.

Em cada série de linhas do nível n, as transições entre o nível n e n+1 são denominadas Xα,
onde X é o símbolo indicativo da série. As transições entre os níveis subseqüentes recebem
letras gregas em ordem alfabética. Ex. Xα, Xβ, Xζ, Xε, Xκ, etc. Após a linha Xω, usam-se
números.

série nível símbolo principal transição limite


Lyman 1 L La 1216 Å 912 Å
Balmer 2 H Ha 6563 Å 3646 Å
Paschen 3 P Pa 18750 Å 8208 Å
Brackett 4 Br Bra 40512 Å 14592 Å
Pfund 5 Pf Pfa 74618 Å 22800 Å
Átomo de Bohr

Séries de linhas do hidrogênio

As séries independem de a
transição eletrônica ser uma
absorção ou emissão. Em
ambos os casos, há a formação
de uma linha no espectro com
comprimento de onda
característico da transição entre
os dois níveis envolvidos.

Representação das séries de Lyman, Balmer e Paschen


© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.
Átomo de Bohr

As linhas do espectro do gás


H no visível correspondem
à série de Balmer. As
demais séries do H caem em
ultravioleta ou
infravermelho.

© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.

Linhas de Balmer no espectro de altíssima resolução da estrela HD 193182


© 1996 W. H. Freeman and Co., Discovering the Universe, 4th. Ed.
Átomo de Bohr

linha ll
Le 937.8 Å
Ld 949.8 Å
Lg 972.5 Å
Lb 1025.8 Å
La 1215.6 Å
Hh 3835.3 Å
Hz 3889.0 Å
He 3970.0 Å
Hd 4101.7 Å
Hg 4340.5 Å
Hb 4861.3 Å
Ha 6562.7 Å
Pe 9546.2 Å
Pd 10050 Å
Pg 10938 Å
Pb 12818 Å
Pa 18750 Å
Brb 26300 Å
Bra 40512 Å
Representação das transições mais comuns das séries de Lyman, Balmer e Paschen
Pfa 74618 Å
© http://hyperphysics.phy-astr.gsu.edu/hbase/hyde.html#c4
Linhas do H mais importantes

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