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Integração do Direito: o

problema das lacunas da lei

Introdução ao Direito I
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 32 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
Lacunas da Lei
 As leis, por mais bem planejadas, não logram
disciplinar toda a grande variedade de
acontecimentos sociais.
 As lacunas são imanentes às codificações.
 Lacuna = não só quando a lei é
completamente omissa em relação ao caso,
mas também quando o legislador deixa o
assunto a critério do julgador.
Problema da existência de lacunas: teorias
 Realismo ingênuo: a evolução social cria
espaços vazios não só na lei, mas no próprio
sistema jurídico. Assim, muitos casos não
podem ser resolvidos com base em normas
preexistentes.
 Empirismo científico: se considerarmos que
“tudo o que não está proibido está
juridicamente permitido”, não há que se falar
em lacunas ou vácuos no ordenamento.
 Ecletismo: se, por um lado, a lei apresenta lacunas, a
ordem jurídica não. O Direito é mais que leis: é um
sistema que estabelece critérios para a aplicação das
leis (integração do Direito – costume, analogia,
princípios gerais de Direito). Teoria majoritária.
 Pragmatismo: convenciona que o Direito sempre
dispõe de fórmulas para regular todos os casos
emergentes da vida social.
 Apriorismo filosófico: a ordem jurídica não
apresenta lacunas. O Direito é “uma estrutura
totalizadora, de onde resulta que um regime de
Direito positivo é totalidade e, por isso, que não há
casos fora do todo porque, do contrário o todo não
seria o todo.”
Postulado da plenitude da ordem jurídica
 O Direito positivo é pleno de respostas e
soluções para todas as questões que surgem
no meio social.
 Se o caso for inusitado e imprevisível, desde
que submetido à apreciação judicial, deve ser
julgado à luz do Direito vigente.
Art. 126 do CPC: “o juiz não se exime de
sentenciar ou despachar alegando lacuna ou
obscuridade da lei...”.
LICC, art. 4º:
“Quando a lei for omissa, o
juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes
e os princípios gerias de
direito.”
Integração do Direito
 A integração é um processo de preenchimento
de lacunas, existentes na lei, por elementos
que a própria legislação oferece ou por
princípios jurídicos, mediante operação lógica
e juízos de valor.
 Analogia
 Costumes
 Princípios Gerais do Direito
Analogia
 Recurso técnico que consiste em se aplicar, a
uma hipótese não prevista pelo legislador, a
solução por ele apresentada para uma outra
hipótese fundamentalmente semelhante à não
prevista.
Jurisprudência Superior Tribunal de Justiça
EDcl no REsp 1026981 / RJ
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL
2008/0025171-7 – Julgado em 22/06/2010.

DIREITO CIVIL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO


ESPECIAL. BENEFÍCIOS. COMPLEMENTAÇÃO. PENSÃO POST MORTEM. UNIÃO ENTRE
PESSOAS DO MESMO SEXO. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS. EMPREGO DE ANALOGIA
PARA SUPRIR LACUNA LEGISLATIVA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO
INEQUÍVOCA DA PRESENÇA DOS ELEMENTOS ESSENCIAIS À CARACTERIZAÇÃO DA
UNIÃO ESTÁVEL, COM A EVIDENTE EXCEÇÃO DA DIVERSIDADE DE SEXOS.
IGUALDADE DE CONDIÇÕES ENTRE BENEFICIÁRIOS. - As questões suscitadas pela
embargante não constituem pontos omissos ou obscuros, tampouco erro de fato do julgado, mas
mero inconformismo com os fundamentos e conclusões adotados no acórdão embargado. - O que se
percebe, é que busca a embargante sustentar a tese de que o recurso especial não mereceria
conhecimento, por incidência das Súmulas 5, 7 e 126, do STJ, no intuito de que o acórdão proferido
pelo TJ/RJ seja restabelecido e a pensão post mortem consequentemente negada ao embargado. -
Para chegar à conclusão de que o companheiro homossexual sobrevivente de participante de
entidade de previdência privada complementar faz jus à pensão post mortem, o acórdão embargado
assentou-se na integração da norma infraconstitucional lacunosa por meio da analogia, nos princípios
gerais de Direito e na jurisprudência do STJ, sem necessidade alguma de revolvimento de matéria de
verniz fático ou probatório, tampouco de interpretação de cláusulas contratuais. - Conquanto
questionável a premissa constitucional fixada pelo TJ/RJ, de que o conceito de união estável não
contempla uniões entre pessoas do mesmo sexo, o recurso especial trouxe debate diverso e sob viés
igualmente distinto foi a matéria tratada no STJ, porquanto ao integrar a lei por meio da aplicação
analógica do art. 1.723 do CC/02, o acórdão embargado decidiu a temática sob ótica nitidamente
diversa daquela adotada no acórdão recorrido sem necessidade de tanger o fundamento
constitucional nele inserto, porque não definiu a união homoafetiva como união estável, mas apenas
emprestou-lhe as consequências jurídicas dela derivadas. (...).
Procedimento analógico
 Para se ter certeza de que no caso “1” há a
mesma razão que levou o legislador a
disciplinar o caso “2”, é preciso a apreciação
axiológica.
 AXIOLOGIA é a ciência dos juízos, da
apreciação, da estimação que damos aos bens
e a tudo que nos rodeia.Valor no sentido de
estimação e não econômico.
Jurisprudência
 EMENTA:  APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. LOCAÇÃO. FIANÇA. PENHORA DO
ÚNICO IMÓVEL QUE SERVE DE RESIDÊNCIA DO FIADOR. IMPOSSIBILIDADE. PAGAMENTOS
PARCIAIS. AUSÊNCIA DE RESSALVA DO EXEQÜENTE. MÁ-FÉ COMPROVADA. PENALIDADE
APLICADA. SUCUMBÊNCIA ADEQUADA. Não havendo qualquer acordo homologado nos autos do
feito executivo, não há falar em alteração do valor calculado com base no título judicial. São garantias
constitucionais fundamentais do cidadão e de sua família o direito de propriedade (CF/88, art. 5º, XXII) e o
direito à moradia (CF/88, art. 6º, caput, na redação da EC 26/00), sendo que a Constituição, em sua
axiologia, prestigia como valor fundamental a moradia dos cidadãos e de sua família, tanto que no art. 183
concede o usucapião para quem detenha imóvel urbano nas condições que menciona. A lei deve ser
interpretada e aplicada atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (LICC,
art. 5º), o que certamente não estará sendo atendido se o fiador perder sua residência para atender débitos de
aluguéis do afiançado em benefício do credor que explora economicamente a propriedade imobiliária. Outra
deve ser a solução para a viabilização do mercado de locação, seja pelos cuidados do locador ao aceitar o
fiador com patrimônio suficiente para a garantia, seja pela definitiva implementação do seguro-fiança. O
credor ou locador, ao contratar, deve examinar a situação patrimonial do fiador, pois seu é o risco.
Demonstrada a má-fé do exeqüente em não ressalvar quantia já recebida por conta do título exeqüendo,
cabível a aplicação da pena do art. 1.531 do CCB/1916, cumulável, ademais, com a pena do art. 18 do CPC.
Precedentes do STJ. Sucumbência redimensionada. APELO DO EMBARGADO DESPROVIDO.
PROVIDO PARCIALMENTE O RECURSO DOS EMBARGANTES. (Apelação Cível Nº 70002872240,
Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano,
Julgado em 08/09/2003)
Diferença entre analogia e interpretação extensiva

 Interpretação extensiva: o caso é previsto pela lei


diretamente, apenas com insuficiência verbal. A má
redação do texto é uma das causas que podem levar à
não correspondência entre as palavras da lei e o seu
espírito. Aqui não há lacuna da lei, mas
impropriedade de linguagem. Para se aplicar a
analogia, tem de haver lacuna da lei.
 Na interpretação extensiva, amplia-se a significação
das palavras até que coincidam com o espírito da lei;
na analogia isso não ocorre, pois o aplicador lida não
com a insuficiência de um dispositivo, mas com a
falta de dispositivos.
Princípios Gerais de Direito
 Garantem o critério de julgamento.
 Primeiro: a lei.
 Segundo: analogia.
 Terceiro: normas consuetudinárias (costume).
 Quarto: princípios gerais de Direito.
Princípios gerais de Direito
 São importantes na elaboração das leis e na aplicação do
Direito, pelo preenchimento das lacunas da lei.
 Eles “guiam, fundamentam e limitam as normas positivas já
sancionadas.”
 Onde encontrá-los?
1. No instituto que aborda a matéria;
2. Em vários institutos afins;
3. No ramo jurídico como um todo;
4. No Direito público ou no Direito Privado;
5. Em todo o Direito positivo;
6. No Direito em sua plenitude.
Progressão do mais específico ao mais geral.
STJ. REsp 1113804 / RS - RECURSO ESPECIAL - 2009/0043881-7. Julgado
em 27/04/2010.
 RESPONSABILIDADE CIVIL. TABAGISMO. AÇÃO REPARATÓRIA
AJUIZADA POR FAMILIARES DE FUMANTE FALECIDO.
PRESCRIÇÃO INOCORRENTE. PRODUTO DE PERICULOSIDADE
INERENTE. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A DEVER JURÍDICO
RELATIVO À INFORMAÇÃO. NEXO CAUSAL INDEMONSTRADO.
TEORIA DO DANO DIREITO E IMEDIATO (INTERRUPÇÃO DO
NEXO CAUSAL). IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. (...). 7. A
boa-fé não possui um conteúdo per se, a ela inerente, mas contextual, com
significativa carga histórico-social. Com efeito, em mira os fatores legais,
históricos e culturais vigentes nas décadas de cinquenta a oitenta, não há
como se agitar o princípio da boa-fé de maneira fluida, sem conteúdo
substancial e de forma contrária aos usos e aos costumes, os quais
preexistiam de séculos, para se chegar à conclusão de que era exigível das
indústrias do fumo um dever jurídico de informação aos fumantes. Não
havia, de fato, nenhuma norma, quer advinda de lei, quer dos princípios
gerais de direito, quer dos costumes, que lhes impusesse tal
comportamento. (...).”
Equidade
“PROCESSUAL CIVIL - ADMINISTRATIVO - RECURSO ESPECIAL -
DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA - INEXISTÊNCIA DE
VIOLAÇÃO DOS ARTS. 458 E 535 DO CPC - VALOR DA INDENIZAÇÃO -
CONTEMPORANEIDADE À AVALIAÇÃO - PRESENÇA DE POSSEIROS NO IMÓVEL
- FATOR DE DEPRECIAÇÃO OBRIGATÓRIO - JUROS COMPENSATÓRIOS -
IMÓVEL IMPRODUTIVO - INCIDÊNCIA - PRONUNCIAMENTO PELA
SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC (RESP 1.116.364/PI) - PERCENTUAL DOS
HONORÁRIOS - REVISÃO - SÚMULA 7/STJ. 1. (...). 2. O valor da indenização, na
desapropriação para fins de reforma agrária, deve ser contemporâneo à avaliação, não
havendo determinação legal obrigando a adoção do valor do imóvel na data da imissão
provisória na posse. Precedentes. 3. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de
que a presença de posseiros no imóvel expropriado, por influir no preço de mercado, deve
ser levado em conta no momento de se fixar o valor da indenização, conforme determina o
art. 12, IV, da Lei 8.629/93 (ancianidade das posses). 4. (...) 5. Ajustados os honorários
advocatícios aos limites estabelecidos no § 1º do art. 27 do Decreto-Lei 3.365/41, não é
possível rever o percentual fixado, por estar a questão relacionada ao juízo de equidade de
que trata o art. 20, § 4º, do CPC. Incidência da Súmula 7/STJ. 6 (...)”.

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