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A EFICÁCIA DO SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE BASEADO

NAS NORMAS DA FAMÍLIA NBR ISO 9000:2000 IMPLANTADO NAS


INDÚSTRIAS DO PÓLO INDUSTRIAL DE MANAUS-PIM.
As normas NBR ISO 9000, têm feito a diferença na hora que se fala em qualidade de produto
ou qualidade de processo como ferramenta para atrair mais clientes?
No mundo dos negócios globalizados, o sucesso da organização depende das normas da
família NBR ISO 9000, ou irá depender do sucesso de seus funcionários?

Paulo de Sousa Silva

Engenheiro Eletricista –UFAM,


Pós-graduado em Engenharia da Produção -UFRGS
Especialista em Gestão da Qualidade e da Produtividade
Especialização em Administração Hospitalar
Professor de Sistemas de Informações e Gestão da Qualidade
Mais de 15 anos atuando na área da Qualidade como Auditor Lead Assessor, Engenheiro e
Gerente da Qualidade

RESUMO

O propósito desse artigo é colocar em discussão as mudanças ocorridas nos sistemas


industriais brasileiro, em especial no Pólo Industrial de Manaus com a implantação do
Sistema de Gestão da Qualidade baseado nas normas da família NBR ISO 9001:2000. Muitas
propagandas têm veiculado positivamente com o uso dessa norma, mas, o impacto negativo
pouco se tem falado, pois esse marketing positivo do uso das normas não é refletido no
ambiente interno de algumas empresas. O que vimos são: procedimentos mal elaborados;
procedimentos elaborados para serem cumpridos e são esquecidos nas gavetas dos
responsáveis; são colaboradores mal treinados; são produtos produzidos com índices de
defeitos altíssimos; são processos de produção sem controles e sem uso de ferramentas da
qualidade adequados ao controle e prevenção dos defeitos; falta de investimento para
treinamento por parte da alta direção; auditores internos que cumprem apenas ordem do
Responsável pela Direção - RD e não atuam como auditores; são auditores externos de
organismos certificadores que fecham os olhos para as não conformidades não penalizando-
as; são empresas que procuram organizar seus procedimentos e suas atividades um dia antes
das auditorias internas ou externas e são empresas de consultorias se beneficiando dessa falta
de interesse e confiabilidade às normas por parte da Direção e assim, mantém o chamado
“ prato feito”, isto é, elas, as consultorias já têm procedimentos feitos e só adaptam a realidade
do novo cliente e está pronto para a certificação. Portanto, vamos abordar esses dissabores
que a ISO 9000, tem trazido nesses últimos anos.

Palavra Chave: Dissabores, Qualidade, Eficácia, Auditoria e Comprometimento.

1. INTRODUÇÃO

No final da década de oitenta quando as empresas brasileiras sentiram

necessidades de mudanças em seus processos produtivos ocasionando modificações em suas

estruturas tanto de pessoal quanto física para se adaptarem a um sistema de competitividade

recém implantado no país, que praticamente, mobilizaram as empresas brasileiras a se

adaptarem aos novos estilos de processo de produtos manufaturados. Processos com mão-de-

obra reduzida e com o cumprimento das normas da família NBR ISO 9000.

Este sistema de competitividade fez com que as empresas nacionais mobilizassem

em busca de melhoria na cadeia produtiva, que segundo Slack (1999), essa cadeia produtiva é

qualquer operação que produz bens ou serviços ou até mesmo um misto dos dois e é formado

por um processo de transformação que envolve os recursos transformados (Matéria-Prima,

Informações e etc.) e os recursos de transformação (Pessoas, Instalações e etc.), e estes

recursos são necessários para que a empresa sofra o processo de mudança, gerando assim uma

necessidade fundamental para iniciar o processo de competitividade.


Fazia parte desse processo de mudança, a implantação das normas da família NBR

ISO 9000, que durante o inicio dos anos 90 muitas empresas adotaram como diferencial para

entrar na competição com os produtos importados que entravam no País via Zona Franca de

Manaus, e já no final da década 90, mais precisamente em 98 já podíamos ver o reflexo dessas

mudanças nos processos produtivos das empresas brasileiras. Algumas multinacionais

demitindo seu pessoal de nível estratégico (Chefes e Gerentes) e as empresas menores,

ajustando seu quadro de pessoal para dentro da sua realidade, isto é, deixando aqueles que

possuíam o conhecimento específico e treinando-os para ocuparem (acumularem) novas

funções, o chamado “profissional flexível”. Com a implantação das normas ISO 9000, os

processos ficaram procedimentados e as atividades mais fácil de serem executadas, pois todas

estavam baseadas nos procedimentos escritos e nas instruções de trabalhos específicos,

ficando a responsabilidade dos auditores internos da qualidade a verificação do cumprimento

ou não de tais procedimentos, assim como, dos auditores externos pertencentes aos

organismos certificadores à responsabilidade de auditar tais sistemas com o objetivo de

verificar a sua eficácia e manter ou expedir o certificado de garantia do cumprimento das

normas. Nesta etapa começa o aparecimento de algumas irregularidades ocasionadas por parte

dos auditores internos, do corpo gerencial das empresas e dos auditores externos e que estão

sendo mostradas nos passos seguintes.

2. A ISO 9000 E OS SEUS DISSABORES

O número de empresa com certificação no Brasil cresceu, chegando em meados de

2005 com um total de 7.528 empresas certificadas na ISO 9001:2000 (Certificados válidos

pela SBAC1) sendo que 172 dessas empresas estão no Pólo Industrial de Manaus (INMETRO,

2005) equivalente a 2,3% do total de empresas certificadas no Brasil, incluindo somente as


1
SBAC – Sistema Brasileiro de Avaliação e Conformidade
que já realizaram a transição da ISO 9001 e 9002 na versão 1994 para a ISO 9001 na versão

2000 que é a norma mais utilizada nas industriais do PIM2 e 607 empresas certificadas na

NBR ISO 14.001, das quais 17 pertencentes ao Pólo Industrial de Manaus (INMETRO, 2005).

Mas, até que ponto essas normas resolveram os problemas de qualidade existentes nas

Indústrias do Pólo de Manaus? os clientes confiam realmente nos processos que estão sobre o

controle da ISO 9000? será que as organizações adotaram essas normas com a intenção de

melhorar a qualidade dos produtos e não dos processos, e assim, manter um processo

sistematizado, melhorando as suas atividades e refletindo-os nos seus produtos, gerando uma

melhor qualidade? ou será que foi mais por obrigação de cumprir exigências quanto ao uso

dessas normas para as Indústrias instaladas no Pólo Industrial da Zona Franca de Manaus?

As respostas para essas perguntas não são as mais agradáveis aos olhos dos

pesquisadores, dos estudiosos, dos executivos (muitos nem sabem o que está ocorrendo com

relação à norma) e nem aos olhos dos consumidores, pois, tantos erros são cometidos pelo

RD3 (Representante da Direção), pela alta administração da empresas e mas,

surpreendentemente ainda, quando falamos dos organismos certificadores, que nas suas

auditorias tradicionais de certificação, manutenção ou periódica não detectam tais erros.

Podemos verificar que mais de 60% da empresas no PIM que receberam o certificado da NBR

ISO 9001:2000 mantém o Sistema de Gestão da Qualidade funcionando em precárias

condições ao ponto de seus procedimentos, suas normas, seus controles de desempenhos que

medem a eficácia dos processos e seus registros de auditorias e registros de fornecedores e

clientes serem arrumados, isto é, serem enquadrados dentro dos itens da Norma NBR ISO

9001:2000 às vésperas das auditorias. Posso citar como exemplo para ilustrar as falhas desse

2
PIM – Pólo Industrial de Manaus
3
RD – Representante da Direção – Item 5.5.2 da ISO 9001:2000 – A alta direção deve indicar um membro da
Direção que independentemente de outras responsabilidades, deve ter responsabilidade e autoridade para
assegurar que os processos necessários para o sistema de gestão da qualidade sejam estabelecidos,
implementados e mantidos. Ver também item b e c.
processo, o item 6.0 da NBR ISO 9001:2000 “Gestão de Recursos” que fala especificamente

sobre as condições de competência, conscientização e treinamento e diz que:

o pessoal que executa atividades que afetam a qualidade do produto deve ser
competente com base em educação, treinamento, habilidades e experiência
apropriados ( NBR ISO 9001:2000, item 6.2.1).

Algumas observações são feitas sobre esse item e que não são levados muito a sério

pela alta administração das empresas, pois, geram planejamento de recursos com programação

anual dos cursos que foram levantados nas necessidades dos departamentos, mais, pouco se

cumpre o que foi planejado. Para manter o efeito realizável perante as auditorias externas, são

quase sempre refeito nos dias que antecedem as auditorias para driblar os auditores externos,

isto é, são elaborados cursos não realizáveis, treinamento não aplicados, certificados não

recebidos e até mesmo a modificação nos planejamentos de recursos mostrando o

cumprimento da verba planejada para realização dos treinamentos com a verba gasta nos

cursos e treinamentos (recursos planejados versus recursos realizados). O mais triste ainda é

que tais problemas poderiam ser vistos nas auditorias internas, pois são nessas auditorias que

se devem rever e propor melhorias através de planos de ações ou outro método adotado pelo

sistema, isto, se não partisse da própria Alta Administração e do RD à manipulação dos dados

para iludir os auditores.

“Vamos programar horas extras para amanhã com todos os auditores internos
para prepararmos as documentações de ações corretivas, planos de ações e rever todas
as não conformidades e ou observações recebidas na última auditoria, assim
deixaremos tudo em dias para a auditoria externa que será realizada depois de amanhã.”
(Frase proferida pelo Representante da Direção de uma empresa ao seu superior
imediato tratando-se da auditoria externa de manutenção que seria realizado dois dias
após a sua fala)
3. AÇÃO DOS AUDITORES EXTERNOS FRENTE A ESTES CASOS

É triste, mas é verdade. Os auditores externos, na maioria das vezes sabem de tudo, e

fazem que não sabem ou não querem ver, são convencidos facilmente com os argumentos dos

auditados, mas, tem seus motivos; não querem emitir uma não conformidade maior em função

dos os contratos que são assinados. Pois se emitem um número excessivo de não

conformidades, correm o risco de suspender o certificado das empresas e assim, perdem o

contrato de dois, três, quatro e até cinco anos que fazem com seus clientes, contrato este que

mantém a realização de duas auditorias por ano e, o contrato chegar a variar de R$ 5.000,00 a

R$ 8.000,00 ao ano. Nesses casos, os auditores criam nomes tais como: observações;

oportunidades de melhorias; problemas potenciais e outros para não emitirem não

conformidades menores ou maiores. Os representantes das empresas, incluindo o RD e a Alta

Administração se prevalecem desse argumento para não dar importância às normas NBR ISO

9000 e assim, em alguns casos, forjar uma situação verdadeira aos olhos dos auditores

externos.

Muitas empresas do PIM têm feito menos do que deveriam para melhorar as condições

de uso e dá mais importância às Normas NBR ISO 9000 da forma com ela é estabelecida, pois

aos poucos acabam reconhecendo o quanto são úteis para melhorar as atividades de seus

processos e quantos benefícios podemos tirá-las com o uso correto dos itens e praticá-las em

sua perfeita forma. O maior dissabor quanto ao uso dessa Norma está no fato de algumas

empresas não entenderem o conceitos das Normas e nem o Conceito da Qualidade, pois

atribuem apenas o uso da norma como ferramenta principal para produzirem seus produtos

com qualidade, isto, está no fato de alguns comerciais televisionados ou escritos anunciarem

que a empresa X tem ISO 9000, por isso tem qualidade. Daí, o consumidor, que na maioria

das vezes por desconhecer o que é realmente essa tal ISO 9000, imagina que estão comprando
produtos com qualidade ISO 9000, equivoco terrível que só é percebido quando o produto,

quer seja eletroeletrônico, informática ou serviços de qualquer natureza apresente problemas

técnicos com pouco tempo de uso. Quero deixar uma pergunta e se for possível a resposta

quero ficar sabendo. Você conhece alguma empresa que perdeu o certificado por ter um

número excessivo de não-conformidades4?

Por mais bem cuidadas que sejam as fases do planejamento, projeto e produção,
produtos defeituosos acabarão por ser produzidos e alcançarão o mercado. As
reclamações do consumidor são essenciais para que correções possam ser feitas (as
reclamações estão para o bloqueio de defeitos do produto como os relatos de
anomalias estão para o bloqueio de processo) (Campos, 1992, p.115).

4. CONCLUSÃO

Com todos esses dissabores do uso incorreto das normas ISO 9000, o fator principal

na retenção dos clientes não é e nem deve ser somente a implantação do Sistema da Qualidade

baseados na ISO, apesar de tê-la seus méritos, mais sim, trabalhar os recursos humanos

existentes nas organizações (Incluindo o pessoal da liderança e a alta direção), que para

muitos são chamados de colaboradores, os quais eu chamo de Príncipe, pois alguns gurus

chamam os clientes de Reis, e se a palavra de um Rei é uma ordem, a do Príncipe também o é.

Logo o sucesso das organizações nessa era globalizada, não depende exclusivamente da ISO

9000, mais sim, de um grupo de funcionários envolvidos, comprometidos e compromissados

com os resultados da organização, com conhecimento e habilidades necessárias, além de tudo,

capacidade para colocar seus conhecimentos em ação. Esta ação, deve ser patrocinada pelas

empresas, pois, são as maiores beneficiadas nessa era do uso da Gestão do Conhecimento.. Já

4
A NBR ISO 9000:2000 define não-conformidade como sendo o não atendimento a um requisito especificado.
estamos na onda do SIG - Sistema de Gestão Integrada, integrando as Normas da NBR ISO

9000 (Sistema de Gestão da Qualidade), ISO 14000 (Sistema de Gestão Ambiental) e SA

8000 (Sistema de Responsabilidade Social), portanto, deveremos ter cuidado com as políticas

das empresas, para que não tenhamos também esse sistema fracassado.

Futuramente as empresas competirão entre si não apenas pelos clientes, mas também
pelos recursos humanos qualificado. Em um mercado competitivo, se as empresas não
tiverem uma cultura que estimule e “segure” os funcionários, eles trabalharão para o
concorrente. Coloque seus funcionários em primeiro lugar eles farão o mesmo com os
clientes (Claus Moller, em entrevista pela HSM Management, 1997).

Não esquecer que os colaboradores são mais importantes que as próprias normas e que

se não forem tratados como Príncipes ou até mesmo como Reis o programa pode nascer

fracassado, assim, o sucesso da empresa não será possível sem que haja sucesso pessoal

(Claus Moller, 1997, HSM). É necessário que os organismos certificadores atuem dentro da

ética , e que o INMETRO comece a ser mais exigente e fiscalizar mais os organismos

certificadores, inclusive, as empresas certificadas.

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