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Umuarama, domingo, 12 de julho de 2009 15

CRÔNICA
Reflexão sobre o a essência do
Ser por Caroline Guimarães Gil

Conto
por Vinícius de Moraes

O pé de valsa
Ouvi esses dias uma história que aconteceu em uma pequena cidade do
interior do Paraná. Era meados dos anos 70 e a cidade era bastante recente,
muito religiosa como era bem comum naqueles tempos.
Era tempo de quaresma, período de resguardo dos católicos, quando a
igreja não aconselha festas. Dizem também que nessa época o exército celeste
está ocupado com outras coisas e deixam de cuidar de nós, os mortais, então
o caminho fica livre para as forças do mal. Mas o dono do salão de baile, o
Manoel, também conhecido como Mané, não dava a mínima pra isso, não
Ah! Quantas coisas se passaram por minha cabeça. Talvez achava a idéia de ficar quarenta dias sem abrir seu bailão muito boa. “Quem
eu me dê tão pouco para existência, por isso que todos querem vai pagá o meu feijão, pô?!” – dizia ele.
sempre muito de mim. Não fico sabendo o que teria eu de oferecer E foi assim que o Mané resolveu abrir o baile naquela Sexta-
a outrem. O que eu veria em mim, se tivesse exceto mim? Penso feira de quaresma. O padre excomungou, as beatas
que talvez tenha de ser gente, afinal. Mas o que seria ser isso? esconjuraram, todo mundo olhou torto pra ele. Mesmo assim
Não sei nem por onde dar início. Ninguém sabe, no entanto já bailão lotou e o rastapé comeu solto a noite toda... ou quase toda.
começamos. E quem deu o arranque? Quem falou: “Que se abre Dizem que por volta das onze da noite apareceu um
a viver...”? Eu não fui. forasteiro, um cara elegante, de paletó e camisa, sapato
Só sinto que fui parar aqui, num dia desses, numa varanda branco lustroso, bigode charmoso e babosa no cabelo
de uma casa ignota, com vários passatempos esparramados penteado pra trás. O sujeito chegou calado e foi
pelos azulejos amarelos. Nasci e vi que tinha um corpo, foi um tomar um trago, debaixo da atenta vigilância dos
choque! Tinha pessoa, eu era um indivíduo. Mas, e agora o que homens do salão - os olhos de todas as
eu fazia com aquilo? Eu tinha olhos, nariz, e eu pensava muito, garotas brilharam de desejo.
pensava sempre, uma coisa meio esquisita o pensar! Eu tinha Não demorou muito e o forasteiro pé
duas pernas para me levar onde eu quisesse, e duas mãos para de valsa estava rodando o salão, dançava
resgatar tudo o que eu pudesse. Mas para onde quero ir? O que com uma, com outra, mais outra... estava
eu quero pegar? Isso ninguém pode ensinar. Contudo a existência literalmente dando um baile no pessoal e deixando as moças ouriçadas, todas começam a piscar desordenadamente; apagam e acendem ao som daquela
deveria ser mais do que isso, pensava eu. queriam mais. Chegou um ponto que todas elas só queriam dançar com o tal maldita risada até que finalmente tudo escurece. Ao acender das luzes o
O que é ser gente? Quando sei que estou sendo o que sou, cara do bigode. Os homens do recinto, indignados, foram tirar satisfação. Aí forasteiro não está mais ali na frente do Ademir, mas em cima das caixas de
se quando sou é ser um pouco do outro dado por mim mesma? a coisa ficou feia. som do palco, e continua rindo. Enquanto gargalha feito um lunático levanta
Creio que dou tantos presentes num dia... Sou tão mãe, tão coruja. O Ademar da quitanda, um cara enorme e esquentado, já chegou suas duas mãos para cima, se consome numa labareda de fogo e desaparece.
Mimo tanto as partes minhas que nem tenho. E acho pulcro ainda empurrando o forasteiro de lado e perguntou: Todos que estavam no salão imediatamente saem correndo desesperados,
embora tão ausente. - Quem diabos é você, cumpadi? Vai chegando e atrapalhando o nosso deixando na sala apenas um forte cheiro de enxofre.
Creio que isso acontece conosco uns pares de horas. baile, pegando nossas garotas... tu acha que é quem? Dias depois tomaram coragem para voltar ao salão, foram acompanhados
E como que para me distrair das dúvidas, deram-me um lápis O forasteiro, olha firmemente para Ademar durante uns 5 segundos sem pelo delegado e pelo padre. A única coisa que encontraram como prova do
e um caderno. Nestas figuras, algumas definidas outras distraídas, esboçar qualquer reação. Então começa a rir. A gargalhada vai aumentando fatídico foram marcas de cascos queimadas sobre a caixa de som de onde sumiu
perguntaram-me: “Somos grafia sua ou você é grafia nossa?”. Até cada vez mais até ecoar por todo o salão e encobrir a música. A banda para o forasteiro. No jornal daquele dia publicaram a foto das marcas e a seguinte
hoje estou na ambigüidade dessa questão. de tocar e, todos assustados, olham para o risonho forasteiro. As luzes então manchete: “O dia em que o capeta veio pra dançar”.
Enfim, se sou ou não, não sei ao certo. Mas sei onde estou,
sei que vivo talvez só isso eu ei de ser. Mas sou também tudo o
que eu não digo. E por saber o que não sou já sei o que eu sou!
Fortifico-me no que sou sabendo o que não quero vir a ser. Sou
porque o ser e o estar caminham juntos numa mesma casa. Às
vezes relutam ser, e às vezes são desesperadamente! Seja lá o
que for. Sou e estou na medida em que me permito ser.
O Pó da Estrada.
Só eu, sou eu. Eis a exaustão do ser humano. Só ser o que
se é. E não há nada, nem ninguém que possa nos tirar desta rotina.
Nenhuma roupa irá disfarçar a pele que é sua, nenhuma história
falsa irá camuflar o que é a boca sua. Só nós, somos nós. Eis a
grande solidão. Esforçarmo-nos em dizer aos outros, aquilo que
é só nosso. Dar o máximo de si para o outro, e sentirmos mais unos.
Parecendo-nos menos tolos, com esses braços, ou nos esquecer
no outro, para não nos tornar presentes de nós mesmos, ausentes
de nós mesmos.
Respira, respira, pois só você consegue ser você mesmo.

Nevilton e seus companheiros andam com a agenda lotada. Acabaram Wander Wildner, mitológica figura rock Gaucho, ex-integrante do grupo
de retornar de uma apresentação de sucesso na Funhouse, em São Paulo e Replicantes e compositor de canções de sucesso como “Bebendo Vinho” e “Eu
já embarcaram este fim de semana para Paraíso do Norte, pequena cidade a tenho uma camiseta escrita Eu Te Amo”.
uns 100 Km daqui de Umuarama. Depois de passar pelo Paraíso, Nevilton segue com sua disputadíssima
Lá em Paraíso se apresentaram na segunda edição do festival Paraíso agenda de julho, tocando em Curitiba nos dias 19, no Expressões Oi e no dia
do Rock. O festival é considerado um dos mais bem estruturados do sul do 24 no Festival Rock de Inverno. A banda também se apresenta em Santa
Brasil, e está prestes a entrar no calendário da Abrafin (Associação Brasileira Catarina: dia 18 estão em Joinville com a banda Fevereiro da Silva e dia 25
dos Festivais Independentes). Este ano Nevilton (que também esteve presente em Florianópolis, com a Aerocirco. Para mais detalhes acesse
na primeira edição) divide o palco com grandes nomes do nosso novo rock, www.nevilton.com.br e mantenha-se informado das façanhas dessa banda
como: Zefirina Bomba, de João Pessoa; Relespública, de Curitiba e Umuaramense que está dando o que falar Brasil afora.

Quem Lê escreve:
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com personagens reais ou fictícios de Umuarama ou
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