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CENTRO DE FORMAÇÃ O JURÍDICA LÍNGUA 2008

PORTUGUESA

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Divórcio: Bloco defende que veto do PR teve "como base concepções
conservadoras"

2008-08-20 11:57:09
Lisboa, 20 Ago (Lusa) - O Bloco de Esquerda (BE) defendeu hoje que o veto do Presidente da
República (PR) ao diploma que altera o Regime Jurídico do Divórcio teve "como base concepções
conservadoras" e que "os motivos alegados não têm eco na lei".

"Lamentamos o veto de uma lei que considerávamos ser positiva e encaramos que tem como base
concepções conservadoras", afirmou à Lusa a deputada do Bloco de Esquerda Helena Pinto.

"Nós [Bloco de Esquerda] votámos a favor da lei e esta era uma lei de algum consenso alargado.
Além do mais os motivos alegados pelo Presidente da República [Cavaco Silva] não têm eco na lei",
acrescentou.

A bloquista deu como exemplo o caso da violência doméstica, um dos pontos abordados por Cavaco
Silva no comunicado divulgado hoje no 'site' da presidência, www.presidencia.pt.

"A violência doméstica já é crime, não tem a ver com a lei do divórcio, é um crime à parte",
justificou Helena Pinto.

"O Presidente da República sublinha que é no mínimo singular que um cônjuge que viole
sistematicamente os deveres conjugais previstos na lei - por exemplo, uma situação de violência
doméstica - possa de forma unilateral e sem mais obter o divórcio e, sobretudo, possa daí retirar
vantagens aos mais diversos níveis, incluindo patrimonial", lê-se no comunicado do PR.

"Nada justifica que continuemos a manter este autêntico calvário a que os casais estão sujeitos",
referiu também a deputada do Bloco de Esquerda.

O Presidente da República devolveu hoje à Assembleia da República, sem promulgação, o diploma


que altera o Regime Jurídico do Divórcio, utilizando o chamado "veto político".

De acordo com o site do chefe do Estado, "o Presidente da República decidiu devolver hoje à
Assembleia da República o Decreto nº232/X que aprova o Regime Jurídico do Divórcio, solicitando
que o mesmo seja objecto de nova apreciação, com fundamento na desprotecção do cônjuge que se
encontre em situação mais fraca - geralmente a mulher - bem como dos filhos menores a que, na
prática, pode conduzir o diploma, conforme explica na mensagem enviada aos deputados".

Num comunicado de cinco pontos, divulgado em www.presidencia.pt, Cavaco Silva sublinha que
"importa não abstrair por completo da realidade da vida matrimonial no Portugal contemporâneo,
onde subsistem múltiplas situações em que um dos cônjuges se encontra numa posição mais débil,
não devendo a lei, por acção ou por omissão, agravar essa fragilidade".

No site está também disponível a mensagem que o Presidente da República dirige ao Parlamento,
acompanhando o diploma agora devolvido à Assembleia, onde foi aprovado a 04 de Julho com os
votos favoráveis do PS, PCP, BE e Verdes e votos contra do CDS-PP e da maioria da bancada do PSD.

Depois da devolução do diploma, a Assembleia da República pode confirmar o seu voto por maioria
absoluta dos deputados em efectividade de funções - bastando para tal os votos da maioria
socialista - caso em que o Presidente da República terá de promulgar o diploma no prazo de oito
dias a contar da sua recepção.

ATF/SMA
Lusa/fim.
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21 Agosto 2008 - 00h30


Divórcio: Presidente da República veta novo regime jurídico
Veto de Cavaco protege mulheres

O Presidente da República vetou o novo regime jurídico do divórcio com fundamento


no efeito "indesejável" que o diploma possa implicar na "desprotecção do cônjuge que se
encontre numa situação mais fraca – geralmente, a mulher –, bem como, indirectamente,
dos filhos menores". No texto enviado à Assembleia da República, o Chefe de Estado
sustenta todos os pareceres com exemplos práticos.

Cavaco Silva defende que, "para não agravar a desprotecção da parte mais fraca",
devia ser ponderada a manutenção do divórcio culposo. Para o Presidente, "é no mínimo
singular que um cônjuge que viole sistematicamente os deveres conjugais previstos na lei
possa de forma unilateral e sem mais obter o divórcio e, sobretudo, possa retirar daí
vantagens ". Neste sentido, Cavaco traça um cenário passível de ocorrer no âmbito do novo
regime: "Numa situação de violência doméstica, em que o marido agride a mulher – uma
realidade que não é rara em Portugal – é possível aquele obter o divórcio
independentemente da vontade da vítima de maus tratos " e "exigir o pagamento de
montantes financeiros", caso tenha contribuído em exclusivo para a despesa familiar. A este
propósito, o Chefe de Estado revela a necessidade de saber "à luz de que critérios
contabilizarão os tribunais o valor monetário do trabalho desenvolvido por uma mulher no
seio do lar".

O Presidente alerta para o facto de a nova lei poder forçar a uma "visão contabilística
do matrimónio", em que cada um dos cônjuges "é estimulado a manter uma conta corrente
das suas contribuições para os encargos da vida conjugal e familiar". Contesta também um
ponto "extremamente controverso" da nova lei, que prevê que, em caso de divórcio, seja
imposto na partilha de bens um regime diferente do escolhido no acto de matrimónio. O
facto de, em Portugal, haver 48 divórcios em cada cem casamentos poderá ser um factor de
preocupação acrescido para Cavaco Silva com a lei do divórcio.

O porta-voz do PS, Vitalino Canas, garante que os socialistas vão analisar os


fundamentos de Cavaco para depois "tomarem uma decisão no quadro constitucional".
Também o PCP manifesta disponibilidade neste sentido. Helena Pinto, do BE, refere que o
veto de Cavaco tem "como base concepções conservadoras". O PSD e o CDS-PP, os únicos
partidos que votaram contra o diploma, congratularam-se com a atitude do Chefe de
Estado.

FRASES

- "Numa situação de violência doméstica, em que o marido agride a mulher ao longo dos
anos – uma realidade que não é rara em Portugal –, é possível aquele obter o divórcio
independentemente da vontade da vítima de maus tratos."

- "Em casos-limite, o novo regime, ao invés de promover a igualdade entre cônjuges, pode
perpetuar situações de dependência pessoal e de submissão às mais graves violações aos
deveres de respeito, de solidariedade, de coabitação, entre outros. "

- "A par desta visão "afectiva" do casamento, pretende-se que a seu lado conviva uma
outra, dir-se-ia ‘contabilística’, em que cada um dos cônjuges é estimulado a manter uma
‘conta-corrente’ das suas contribuições, e apenas a prática poderá dizer qual delas irá
prevalecer."
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Janete Frazão in Internet

A violência sexual Outubro 4, 2007

É considerada violência sexual as situações de abuso, violação e assédio sexual. É


a passagem ao acto quando o outro não o deseja, é uma agressão focalizada na
sexualidade da pessoa, mas que a atinge todo o seu ser, é crime punido pela
lei. Alguns artigos do código penal relativos a crimes de índole sexual: art. 163º, art.
164º, art. 171º, art. 172º, art. 173º, art. 174º art. 175º e art. 176º, ainda há mais
artigos na Legislação portuguesa, só que devido a poder ser muito exaustivo,
deixamos apenas alguns exemplos. As marcas físicas e psicológicas da violência
sexual são frequentemente muito grandes e não falamos apenas de ferimentos,
infecções sexualmente transmitidas ou gravidezes não desejadas. Não podemos
esquecer que o uso da coacção psicológica, da “chantagem” enquanto uso do
poder, é também muito frequente, sendo em muitos casos uma forma que o
agressor usa para confundir e criar situações de grande ansiedade e angústia na
vítima.  

Como se define abuso sexual e violação sexual?


Chama-se abuso sexual quando o comportamento de alguém do sexo masculino ou
feminino face a um menor, engloba a prática de um acto sexual com penetração,
(cópula, coito anal ou coito oral).

 Consideram-se ainda como situações de abuso, as práticas de carácter


exibicionista perante o outro, obscenidade escrita ou oral, obrigatoriedade de
assistir a espectáculos pornográficos, o uso de objectos pornográficos, ou ainda se
o menor é usado para fins fotográficos ou filmes de índole pornográfica, (Art. 172º e
173º, Código Penal
A violação é outra forma de violência e abuso sexual, que a maior parte das leis
define como agressão sexual com penetração sem consentimento mútuo. O
importante é que se trata de um acto de violência física ou psíquica que condiciona
a liberdade do outro, obrigando-o a aceitar comportamentos sexuais que não
deseja. De uma forma geral existem um maior número de casos
de violação praticados por pessoas do sexo masculino, face ao sexo feminino e ao
mesmo género.

www.juventude.org.pt/portal/outrostemas/saudesexualidadejuvenil/problemassexualidade/A+violencia+sexualida
de.htm
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 A nova Lei do divórcio

Aprovada na generalidade no passado dia 16 de Abril, foi também na passada quarta-feira aprovada
na especialidade a nova Lei do Divórcio. A proposta do BE para que o divórcio seja aceite a pedido de
um dos cônjuges foi rejeitada pela maioria.

O Bloco de Esquerda voltou a insistir na necessidade de se introduzir na proposta de Lei do PS sujeita


a apreciação mais uma modalidade, a saber a do divórcio a pedido de um dos cônjuges. PS, PSD e
CDS chumbaram a proposta.

"O BE insiste (...) Pensamos que a lei ficará incompleta se não for incluída a possibilidade de divórcio
mediante a vontade expressa de um dos cônjuges. A vontade própria não fica acautelada no
projecto do PS", defendeu a deputada bloquista Helena Pinto.

A lei aprovada agora na especialidade corresponde no essencial à proposta de diploma apresentada


pelo PS com apenas uma grande e substancial alteração.

Na versão original, os socialistas propunham que "o incumprimento do regime fixado sobre o
exercício das responsabilidades parentais constitui crime de desobediência nos termos da lei penal".

Por "razões de técnica legislativa", o grupo parlamentar do PS desistiu de incluir na lei do divórcio o
"crime de desobediência", optando por alterar as disposições previstas no Código Penal para os
"crimes contra a família", como a subtracção de menor ou a violação da obrigação de prestar
alimentos.

Uma das críticas mais frequentes a esta introdução do crime de desobediência era a de ser previsível
que viesse a aumentar o grau de conflitualidade entre os cônjuges desavindos.

Esta quarta-feira e após um trabalho efectuado na comissão parlamentar dos Assuntos


Constitucionais PS, PCP e BE aprovaram as alterações introduzidas no diploma, aprovando assim a
sua versão final na especialidade.

Conhecida que é a posição dos sociais-democratas contra a alteração do regime que regula o
divórcio em Portugal na actualidade, não será de estranhar que tenha assumido a posição de votar
contra todos os artigos que modificam o regime do divórcio e abster-se nos artigos que visam a
regulação do poder paternal, agora na nova lei “responsabilidade parental”.

O regime jurídico aprovado não se aplicará aos processos pendentes em tribunal e entrará em vigor
30 dias após a publicação.

Um novo conceito de Divórcio

Com a aprovação desta nova lei põe-se fim a um conceito que imperou na ordem jurídica
portuguesa durante muitos anos, excessivos segundo alguns, o de divórcio litigioso acabando
definitivamente com a noção de violação culposa dos deveres conjugais.
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Deixa de ser necessário alegar e provar a culpa fruto de alta conflitualidade e confrontação em
Tribunal geradora de agravamentos de relações que já de si são periclitantes.

Fundamentos de divórcio

O divórcio “sem o consentimento de um dos cônjuges” pode ser requerido com base na:

• “separação de facto por um ano consecutivo".

• "alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um ano e, pela
sua gravidade, comprometa a vida em comum".

• "a ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a um ano"

• "quaisquer outros factores que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a


ruptura definitiva do casamento".

Efeitos Patrimoniais na nova Lei do Divórcio

• Em caso de divórcio a partilha passará a fazer-se como se os cônjuges tivessem estado


casados em comunhão de adquiridos, mesmo que o regime convencionado tivesse sido a comunhão
geral – são bens próprios do cônjuge os levados para o casamento, são comuns os adquiridos na
pendência do casamento.

• : A lei introduz um novo princípio: - "se a contribuição de um dos cônjuges para os encargos
da vida familiar exceder manifestamente a parte que lhe pertencia (...), esse cônjuge torna-se credor
do outro "pelo que haja contribuído".

Esse "crédito" só pode ser exigido no momento da partilha dos bens.

Novidades no regime da violação da Responsabilidade Parental

Quanto ao crime de subtracção de menor, as penas diminuem mas alargam-se as situações passíveis
de ser sancionadas.

No actual regime previa 1 a 5 anos de prisão para quem se recusasse a entregar o menor à pessoa
que exerce o poder paternal ou tutela.

Com as alterações agora introduzidas pelo PS, basta, por exemplo, atrasar repetidamente o
acolhimento ou a entrega do menor para incorrer numa multa até 240 dias ou pena de prisão até
dois anos.

O artigo prevê que "é punido com pena de prisão até dois anos ou multa até 240 dias" quem "de
modo repetitivo e injustificado, não cumprir o regime estabelecido para a convivência do menor na
regulação das responsabilidades parentais, ao recusar, atrasar ou dificultar significativamente a sua
entrega ou acolhimento".
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A pena pode ser "especialmente atenuada" se quem tiver falhado naquelas obrigações "tiver sido
condicionado pelo respeito pela vontade do menor", se este tiver mais de 12 anos.

A nova lei prevê que quem falhar a prestação de alimentos durante dois meses a seguir ao prazo
fixado é punido com multa até 120 dias. Se voltar a haver incumprimento, pode ser aplicada mais
uma multa até 120 dias ou a pena de prisão.

O artigo estabelece que a "prática reiterada" desse crime é punível com "pena de prisão até um ano"
ou mais uma multa até 120 dias.

No caso de o juiz decidir que houve intencionalidade na violação de prestação dos alimentos "é
punido com pena de prisão até dois anos" ou "multa até 240 dias". A mesma pena é aplicada quando
o incumprimento "puser em perigo a satisfação das necessidade fundamentais" de quem tiver
direito aos alimentos.

Eduardo Caetano, RTP

2008-07-02

A violência sexual Outubro 4, 2007


Arquivado em: Violência sexual — eduardobainaite @ 5:56 pm

É considerada violência sexual as situações de abuso, violação e assédio sexual. É


a passagem ao acto quando o outro não o deseja, é uma agressão focalizada na
sexualidade da pessoa, mas que a atinge todo o seu ser, é crime punido pela
lei. Alguns artigos do código penal relativos a crimes de índole sexual: art. 163º, art.
164º, art. 171º, art. 172º, art. 173º, art. 174º art. 175º e art. 176º, ainda há mais
artigos na Legislação portuguesa, só que devido a poder ser muito exaustivo,
deixamos apenas alguns exemplos. As marcas físicas e psicológicas da violência
sexual são frequentemente muito grandes e não falamos apenas de ferimentos,
infecções sexualmente transmitidas ou gravidezes não desejadas. Não podemos
esquecer que o uso da coacção psicológica, da “chantagem” enquanto uso do
poder, é também muito frequente, sendo em muitos casos uma forma que o
agressor usa para confundir e criar situações de grande ansiedade e angústia na
vítima.  

VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA MENINA - RECURSO DE APELAÇÃO


CRIMINAL N. 2.514/97 - COMARCA DE PEIXOTO DE AZEVEDO - MT
Apelante: A Justiça Pública

Apelado: F. M. R.

Relatora: Desembargadora Shelma Lombardi de Kato

VOTO

Egrégia Câmara:
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Malgrado o parecer da ilustrada Procuradoria Geral da Justiça, não decidiu com acerto a meritíssima
Juíza de Primeiro Grau ao julgar improcedente a denúncia para absolver o apelado do crime previsto
no artigo 213 c/c o artigo 69 do Código Penal por insuficiência de provas para a condenação.

Com efeito, para a douta Juíza sentenciante, apesar de comprovado que o réu apelado por três
vezes manteve coito vagínico com a vítima, sua filha de criação, não ficou cabalmente demonstrado
que o réu assim procedera mediante violência física ou coação moral, havendo dúvidas quanto à
aquiescência da vítima, à época menor com 14 anos completos e alguns meses.

Data venia,as razões que levaram a meritíssima Juíza a absolver o réu apelado não
resistem a uma análise aprofundada da prova constante dos autos, no contexto
familiar em que a infração foi praticada. Realmente, consta do auto de flagrante à
fls., que às 9 horas da manhã do dia 15 de agosto de 1996, mãe e filha (vítima)
dirigiram-se à Delegacia de Polícia de Peixoto de Azevedo, no intuito de formularem
perante a autoridade policial competente queixa criminal. No dia 14 do mesmo mês,
isto é, na véspera da queixa, a vítima fora submetida a exame por médico legista o
qual constatou a ruptura himenal, com presença na vulva de sinais de hematomas.
Esse documento vem reforçado pelo Auto de Conjunção Carnal de fls. que atesta a
fragilidade física da vítima, menor com 14 anos de idade. De resto, as violações
sexuais repetidas, relatadas pela menor, foram confirmadas pelo acusado não se
constituindo em fundamento para a absolvição.

Passo, pois, a analisar o conjunto probatório para o fim de constatar se existem ou não provas firmes
do constrangimento, por meio de violência física ou moral, de modo a configurar o delito de estupro.

Segundo consta do Inquérito Policial, a mãe da vítima, apesar de ter-se certificado da conjunção
carnal, na véspera, dia 14, por confirmação médica, não pôde comunicar o fato no mesmo dia,
porque o apelado "conduzido presente" permaneceu o tempo todo a seu lado, ameaçando-a de
morte. Consta do mesmo inquérito que "há trinta dias atrás, a mãe da vítima sofrera espancamento
por parte do apelado, inclusive com ameaças de morte, que procurou a justiça e que foi atendida pelo
Doutor Promotor de Justiça, há 15 dias atrás. Naquela oportunidade o casal separou-se, tendo o
representante do MP local adotado providências pertinentes, quais sejam: advertiu o apelado de que
não deveria voltar à residência da família; de que não deveria voltar a ameaçar a mãe da vítima.
Entretanto, o apelado não só continuou a ir diariamente à casa da declarante (mãe da vítima) como
prosseguiu com as ameaças de morte chegando a espancá-la violentamente e, como se não
bastasse isso tudo, o apelado, aproveitando-se de que a mesma saia para o trabalho, passou a
forçar a menor a manter com ele relações sexuais. Declarou a mãe da vítima que esta cedeu à
investida do réu apelado com medo de vir a ser assassinada por este que prometia matar também a
mãe e seus outros irmãos.

O depoimento acima citado da mãe da vítima apresenta-se em perfeita coerência com o depoimento
desta e com aquele livremente prestado pelo próprio réu apelado, no que é essencial, além de vir
confirmado pelo pai biológico da vítima (depoimento de Salvador Bueno Camargo, e ainda pelo
depoimento do policial Jair Vieira da Mata).

Quanto às datas das violações sexuais, há absoluta coincidência e coerência nos depoimentos
prestados por todos, exceto pelo apelado que tergiversou na polícia e em juízo, entrando em
contradição. Realmente, a vítima e sua mãe referem-se na polícia a estupros recentes, por três
vezes. A vítima informou que foi estuprada pela primeira vez no dia 6 de agosto de 1996, por volta
das 9 horas da noite; que duas noites depois, i.e., no dia 8.8 o conduzido voltou à residência, abrindo
a porta (fechada por uma tramela) com uma faca e, novamente, com ameaças manteve com ela
relações sexuais pela segunda vez. Finalmente, manteve novas relações no domingo (no dia 10 de
agosto, e não no dia 11 de agosto como por equívoco o escrivão de polícia fez constar). Nesta última
vez, como nas anteriores, o apelado aproveitou a ausência da mãe de família que dava plantão no
hospital e forçou a menor a manter relações sexuais mediante ameaças contra toda a família caso
alguém o denunciasse. Tais datas são verídicas e comprovadas nos autos, tanto que no dia 14 de
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agosto (quinta-feira) e não quarta-feira como por equívoco o escrivão de polícia fez constar, a vítima
foi levada ao hospital e submetida a exame médico pelo Doutor João Bertinetti.

Equívoco evidente, a constar do termo de declarações, embasou o parecer da culta Procuradora.


Dele consta: três dias antes do dia em que o acusado contou à mãe da vítima que havia mantido
relações sexuais com ela, a mesma foi submetida a exame médico no hospital Santa Luzia. É
evidente que a expressão antes foi usada por engano de quem datilografou o termo, ou da própria
vítima, pois a palavra certa seria "depois" ao invés de "antes". Assim, a vítima depois de examinada
pelo médico não manteve com o réu apelado nenhuma relação sexual. Efetivamente, a terceira e
última relação sexual a que foi submetida ocorreu no sábado "dia 9 e não dia 10", quando a mãe da
vítima estava de plantão. No domingo "dia 10 e não dia 11", como o escrivão por equívoco fez
constar, foi que o réu apelado se embriagou, passando a fazer quebradeiras para confessar suas
intenções com relação à menor. No dia 14, quatro dias depois e não três dias antes, foi que a menor
se submeteu a exame médico conforme comprovado nos autos às fls. Não vejo como um mero
equívoco, não se sabe por parte de quem, muito provavelmente de quem ditou ou datilografou as
declarações de fls. possa contrapor-se à verdade dos autos.

Coerente com as declarações da vítima estão as de sua mãe e os documentos médicos constantes
de fls., confirmado pelos de fls.

Por outro lado, o réu confessou na polícia as relações espúrias mantidas com sua filha de criação,
fls. Alegou, contudo, que tais relações eram antigas e consentidas pela mãe da vítima. Tais
argumentos, se verdadeiros fossem, longe de beneficiá-lo, recrudeceriam sua culpa. Sem embargo,
não só o réu apelado se contradisse, como a prova documental existente nos autos o desmente.
Senão, vejamos: se verdadeira fosse a alegação de relações sexuais antigas (há 6 meses) como
declarou na Polícia, o estupro estaria configurado em face da idade da ofendida que à época contaria
com menos de 14 anos de idade (13 anos e 11 meses), sendo a violência nessa hipótese presumida
por lei. Quanto ao alegado consentimento da mãe, além de inócuo, vem desmentido nos autos que
demonstram a desfaçatez e o cinismo por parte do apelado. Tanto isto é verdade que o próprio réu
apelado confessou na polícia e em juízo que as três relações sexuais mantidas com a vítima, o foram
na ausência da mãe da vítima, por ocasiões de seu plantão noturno como enfermeira. Afirmou,
também, o réu, em juízo, durante o seu interrogatório, que dormia com a menina, sendo que
adentrava "pela janela do quarto" (???); que era intenção do interrogado esclarecer toda a situação,
de modo que, em determinado dia, após tomar algumas cervejas, abriu o jogo com os pais da vítima
prontificando-se até a se casar com ela (tal fato ocorreu no domingo, um dia após a última relação),
que os pais manifestaram a sua concordância, mas, a menina não consentiu. Ao pretender justificar-
se caiu o apelado em verdadeira esparrela, colidindo com todo o conjunto probatório. Com efeito, são
palpáveis, constatáveis de plano as incoerências da versão disparatada do apelado. Primeiramente,
se as relações eram consentidas porque precisava o apelado adentrar pela janela do quarto, como
um ladrão, furtivamente, sempre na ausência da mãe da menor, sua ex-companheira? Como e
porque teria o apelado que beber, embriagar-se mesmo, a fim de criar coragem, ou como se diz,
"abrir o jogo", isto é, contar o acontecido para a mãe da menor? Não param por aí as contradições,
vez que, se as relações sexuais eram espontâneas por parte da vítima, e se os pais da menor
estavam de acordo, como explicar-se a situação traumatizante que levou as pessoas envolvidas a
buscarem a interferência do "Estado polícia" e que redundou no presente processo criminal? Como
explicar-se o repúdio da menor à proposta de convivência feita pelo acusado se ela mantinha com o
mesmo um envolvimento sexual amoroso?!

A bem da verdade, outra versão não existe para os fatos senão aquela dada pela mãe da vítima, e
pelo pai biológico da mesma. No caso em espécie, cuida-se de estupro no meio familiar, em que a
violência se estabelece através de uma relação de poder e de opressão; em que o agressor se
desvia da conduta normal e abusando da sua autoridade de "chefe" da casa, passa a constranger as
pessoas "dominadas", subjugando-as sexualmente. Essa relação de opressão, no caso dos autos,
ficou plenamente demonstrada, tanto que o casal era conhecido pelas constantes agressões sofridas
pela companheira, mãe da vítima, o que a obrigava a peregrinar pela Delegacia de Polícia e até pelo
Fórum, onde eram já conhecidos.

Por outro lado, o argumento fulcral para a absolvição que embasou o parecer da ilustre Procuradora
Doutora Sílvia Guimarães não prospera. Inexistem, no caso, dúvidas quanto a coação moral que
configura grave ameaça de modo a caracterizar o constrangimento à liberdade sexual. Com efeito,
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cuida-se de abuso sexual de "pai" contra filha de criação, que desde os 6 anos de idade fora por ele
criada nessa condição; a vítima é irmã biológica de um menino de 6 anos, sendo o apelado pai do
mesmo. O apelado, conforme se demonstrou, não era apenas autoritário, como também violento,
tendo confessado que chegou a espancar a mãe da vítima por várias vezes. Nesse contexto, ainda
que dúvidas existissem quanto à violência real, seriam insubsistentes quanto à violência moral,
inibidora da vontade da vítima. Dessarte, não se amolda à espécie a jurisprudência invocada pela
ilustre parecerista por isso que não versam os autos sobre relação sexual supostamente forçada
entre namorados, nem entre pessoas estranhas, sem qualquer vínculo familiar, mas de abuso sexual
com quebra do dever inerente ao poder paterno. Nesse sentido o ensinamento pacífico dos
Tribunais, corporificado nas seguintes ementas adotadas pela magistrada sentenciante:

"O pai ou aqueles que por circunstâncias várias se colocam de fato nessa posição, quando
constrange a filha ou enteada a manter relações sexuais, comete estupro pelo temor reverencial"
(TJSP-M AC – rel. Weiss de Andrade – RT 492/311).

Superior Tribunal de Justiça:

"O pai que mantém relação com sua própria filha, menor, em atos sucessivos, durante certo tempo,
comete o crime de estupro em continuidade delitiva" (STJ – RE – rel. Willian Patterson – RT
664/339).

Ademais, as supostas contradições vislumbradas nos depoimentos da vítima por irrelevantes não
alteram a verdade substancial e, no meu sentir, devem-se mais ao equívoco no registro das suas
declarações.

Finalmente, sob outro prisma merece censura a r. decisão invectivada. A absolvição resultou da
visão complacente da magistrada, diante da inutilidade e miséria dos presídios, fato que sem dúvida
preocupa e incomoda qualquer julgador. Todavia, não é dado ao Juiz tão-só por essa razão absolver
infratores. Muito menos se justifica o arbítrio por benevolência, a pretexto de que 5 meses de cadeia,
em precárias condições, teriam sido suficiente punição. Ao juiz não é dado sobrepor-se ao legislador
para valorar a conduta punível por determinada infração. Cabe-lhe, isso sim, dentro dos limites
fixados pelo legislador, aplicar a pena cabível, ao caso concreto, a qual há de ser a pena justa,
devendo o mesmo agir discricionariamente, segundo os critérios legais. Entender de outra forma
implica em desobedecer à Lei Maior e aos princípios basilares do Direito Penal.

Bem analisada a prova dos autos, concluo que as razões que levaram a meritíssima Juíza a absolver
o réu são de ordem cultural, numa sociedade que assimilou como natural e desculpável, apenas uma
questão moral de foro familiar, a violência perpetrada na intimidade dos lares contra mulheres e
crianças. Tal postura é inaceitável em face dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil,
como a Convenção Interamericana para Punir, Prevenir e Erradicar a Violência contra a Mulher, da
Organização dos Estados Americanos (OEA), "Convenção de Belém do Pará", incorporada ao direito
pátrio por força do disposto no § 2º, do inciso LXXVII, do artigo 5º, da Constituição Federal, bem
como em face do disposto no § 8º, do artigo 226, artigo 227, caput e § 4º do CP.

Pelo exposto, dou provimento ao apelo da Justiça Pública para julgar procedente em parte a
acusação condenando o réu Francisco Manoel Rufino por incurso nas sanções do artigo 214 c/c o
artigo 71 do Código Penal, aplicando-lhe a pena base de 6 anos de reclusão, mínimo legal. Em face
do reconhecimento da continuidade delitiva elevo em 1/6 (um sexto) a pena em formação, fixando-a
e tornando-a definitiva em 7 (sete) anos de reclusão a ser cumprido em regime inicial fechado,
observado o disposto no artigo 42 do CP. A causa de aumento prevista no artigo 226, inciso II do CP,
deixou de ser considerada por não constar da denúncia.

É como voto.

Desembargadora Shelma Lombardi de Kato, Relatora

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