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ASL - Não enjeitava a ideia de dar uma perninha nos negócios mas não queria que
fosse aquela a minha vida. Já na altura escrevia para os jornais, uma altura em que
ninguém se metia na política dado que o Estado Novo convidava as pessoas a não
se envolverem na vida política. Os meus amigos universitários ou eram
comunistas, de extrema-esquerda, maoistas, ou então eram de uma direita que não
sabiam que era direita e que diziam pouco se importar com a política. Pelo
contrário, eu fazia parte de uma pequeníssima minoria que se mexeu em termos
políticos e a minha iniciação
nessa área foi através do movimento monárquico. Tinha 15/16 anos quando entrei
para a Juventude Monárquica Portuguesa, tendo mais tarde acabado por ser eleito
Presidente do Conselho Geral da Juventude Monárquica Portuguesa.
ASL - Quando acabei o meu curso fui o melhor classificado com 16,5 valores e o Professor
Adriano Moreira chamou-me e disse-me que, devido à nota, tinha acesso imediato à carreira
diplomática mas, como também iriam recrutar assistentes, ele também não se importava que
eu fosse assistente. Apesar de a carreira de diplomata ser muito mais bem paga, disse-lhe
imediatamente que queria ser assistente. Ele pediu-me para dormir sobre o assunto e eu
assim fiz, e no dia da reunião reafirmei-lhe a minha vontade de ser assistente. Em 1973
comecei a dar aulas de Introdução às Ciências Sociais, que ainda hoje dou aos meus alunos
do primeiro ano. Recordo-me que no primeiro dia tinha cerca de duzentas pessoas no
anfiteatro e correu-me bem essa prova de fogo. Nesse mesmo ano fiz o primeiro livro de
lições de Ciência Política, ainda anteriores ao 25 de Abril. Importa também referir ainda antes
da revolução era eu estudante quando teve lugar o Maio de 68, 69 em Portugal, quando um
belo dia o meu amigo e colega de carteira Maurício Pires, chefe da UEC (União dos
Estudantes Comunistas), vem ter comigo dizendo-me que ia ser preso pela PIDE e que tinha
uma série de documentos do partido que tinha que tirar dali sem que a PIDE lhes deitasse a
mão e, como na altura era o único que tinha carro e todos sabiam que era monárquico, pediu-
me para guardar os documentos no meu carro. Tanto se carpiu que acabei por aceder. Ele e
outros comunistas estiveram presos durante cerca de três meses e durante esse tempo andei
a passear aqueles documentos. Não imagina o drama que era meter gasolina porque na
altura, para o fazer, tinha que abrir o capot central onde também estavam os documentos. Ao
fim de três meses lá levaram os documentos para uma sede clandestina do partido que havia
em Algés. Quando se dá o 25 de Abril, os professores da universidade vêm quase todos para
a rua e eu fui um dos que ficou, protegido pelo Partido Comunista que conhecia a minha
história. E foi assim que, absurdamente, foi tudo para a rua excepto meia dúzia de anti-
fascistas e eu que era monárquico confesso. Apesar disso, não deixei de passar por algumas
situações incómodas nomeadamente pessoas que entravam pela minha aula adentro para
discutir com os alunos se eu deveria dar a aula seguinte ou não. Lembro-me também de, na
altura, ser parado todos os dias por detrás do Mónaco para abrir a mala do carro porque
havia quem dissesse que eu era traficante de armas. Lá se passou o PREC e no dia 25 de
Novembro acabou aquela “cegada” toda, tendo o instituto sido suspenso pelo Ministro. Fui
então dar aulas para outra universidade e aproveitei para fazer uma licenciatura em
Antropologia para complementar o meu estudo em Ciências Políticas. Tirei também mais
umas cadeiras na Faculdade de Direito que entendia que me eram vantajosas e candidatei-
me a Doutoramento, já depois de ter ido dar aulas para a Universidade Católica como
assistente do professor Armando Marques Guedes. Meti-me mais tarde no ensino privado.
Primeiro fiz parte do conselho da Universidade Livre, onde nunca dei aulas, e depois fui
professor durante cerca de dez anos na Lusíada. Ainda dei aulas na Internacional e fui Vice-
Reitor e um dos fundadores da Universidade Moderna, que considero ter sido a universidade
com mais qualidade científica onde estive até hoje.
CL – Em termos políticos como se deu a passagem do Partido Monárquico
para o PPD/PSD?
ASL - Não. Tenho consciência que a política é uma merda, para onde converge
tudo o que não presta. É óbvio que também aqui há coisas boas, tal como há
flores que nascem ao pé do esgoto, mas reconheço que a maioria da política que
se faz hoje em dia é uma perfeita porcaria. O senhor Saramago tinha o lobby
poderoso do Partido Comunista e assim se explica que esta campanha
orquestrada ainda hoje perdure.
ASL – Porque a meu ver faço parte de uma direita que já quase não existe. Há a
direita dos valores e a direita dos interesses. A direita dos valores não cede nos
valores morais e é mais à esquerda nos valores económicos. Sou contra a
destruição do estado social. Sou contra as soluções que obrigam o Estado a
espremer cada vez mais os trabalhadores ou que destruam o serviço nacional de
saúde. Agora nos valores morais eu não cedo, não cedo a favor do aborto, do
casamento homossexual ou da defesa da pátria, que é um tema que hoje em dia
infelizmente já não se discute. Por sua vez, a direita dos interesses cede à
politocrassia e à rede financeira mundial que está materializada no Banco
Europeu, no Fundo Monetário Europeu ou no Fundo Mundial do Comércio. Como
não podem ceder nisso cedem nos valores morais como a eutanásia ou no
casamento por parte de homossexuais. São, pois, os partidos do capitalismo
sórdido e do imperialismo suez e é por isso que hoje considero que a minha
direita é uma direita dinossáurica.
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CL – Gostaria de voltar um dia à vida política activa?