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SBC eet ee ee ‘gua é a substineia mais abundante na superfi- ce do planeta, participando dos seus processos maodeladores pela dissolucio de materiais terrestres ¢ do transporte de particulas. Ef 0 melhor e mais comum solvente disponivel na natureza ¢ seu papel no intemperismo quimico é evidenciado pela hidedlise (Cap. 8). Nos tios, a agua é responsével pelo transporte de particulas, desde a forma iénica (em solugio) até casca- Iho € blocos, representando 0 meio mais eficiente de erosio da superficie terrestre (Caps. 9 ¢ 10). Sob forma de gelo, acumnla-se em grandes volumes, inclusive gelei- servatérios compreende 0 ciclo da agua ou cielo hidrolégico, movimentado pela energia solar, ¢ repre- senta 0 processo mais importante da dinimica externa da Terra. 741 Origem da Agua No ciclo hidrolégico vamos acompanhar o percur- so de uma gota de Agua pelos reservatérios naturais, (Tabela 7.1). Mas de onde veio a primeira gota? A res- posta esti nos passos iniciais da diferenciacio do planeta. 12s, escarificando 0 terreno, arrastando blocos rochosos € esculpindo a paisagem (Cap. 11). A origem da primeira égua na histdria da ‘Terra esti rela- cionada com a formagio da atmosfera, ou seja, a egascificagio do planeta. Este termo refere-se ao fend~ meno de liberagio de gases por um sédlido ou liquido quando este é aquecido ou resfriado, Este processo, atu- ante até hoje, teve inicio na fase de resfriamento geral da “Tetra, apés a fase inicial de fusdio parcial. Neste gradativo resfriamento ¢ formagio de rochas igneas, foram libera- dos gases, principalmente vapor de agua (H,0) e gis carbénico (CO), entre varios outros, como subprodutos voliteis da cristalizactio do magma (Cap. 16). A geragio de gua sob forma de vapor é observada atualmente em erupgdes vulednicas, sendo chamada de Agua juve nil, suportando 0 modelo acima, sobre a origem da ‘gua. Logo surge outra divide: 0 volume de gua que atualmente compée a hidrosfera foi gerado _gtadativamente a0 longo do tempo geoldgico ou surgi repentinamente num certo momento desta hist6ria? Os gedlogos defendem a segunda possibilidade, Existem evidéncias geoquimicas que suportam a formagio de quase toda a atmosfera e a agua hoje disponivel nesta primeira fase de resftiamento da Terra; desde entio, este volume teria sofrido pequenas variagdes, apenas por reciclagem, através do ciclo das rochas (Cap. 2). Sua importincia na superficie terrestre € atestada ain- da quando se comparam as Areas cobertas por agua ¢ gel com aquelas de “terra firme”: do total de 510x10 km? da superficie da Terra, 310x10° km sio cobertos or oceanos, em contraposicio a 184,9410°km? de ter- 1 firme, resultando numa proporcio entre superficie ‘maritima e terra firme de 2,42 : 1, Considerando-se que cerca de 2,5x10° km? das terras firmes sto cobertas por tios € lagos e até 15x10 km? por geleiras, esta relacdo fica ainda mais desfavoravel para as terras emersas, Por isso a Terra é chamada de planeta azul quando vista do ‘espago: € a cor da égua. Fim subsuperficie, a 4gua tam- \bém é importante alimentando pogos, hoje responsiveis, por significante abastecimento de gua em grandes cen- ‘ros urbanos e dreas étidas (Cap. 20). a gua que mantém a vida sobre a Terra, pela fotossintese, que produz biomassa pela reagio entre CO, ¢ H,O. Neste contexto biolégico, devemos lem- brat que praticamente 80% do corpo humano é composto por Agua. A otigem da gua, sua distribuigio em superficie € subsuperfici, assim como 0 movimento entre seus re- servatdrios naturais sio temas do presente capitulo, todos fundamentais pata otientar 0 aproveitamento, manejo € protegio dos mananciais hidricos do planeta Terra, 741.2 Ciclo hidrolégico Partindo de um volume total de égua relativamente cconstante no Sistema Terra, podemos acompanhar 0 ci- lo hidrolégico (Fig, 7.1, iniciando com o fenémeno da precipitagaio meteérica, que representa a condensagio de goticulas a pattir do vapor de gua presente na at- mosfera, dando origem 4 chuva. Quando o vapor de ‘gua transforma-se diretamente em cristais de gelo e es- tes, por aglutinagio, atingem tamanho e peso suficientes, 2 precipitagio ocorre sob forma de neve ou granizo, responsivel pela geragio e manutengio do importante reservatorio representado pelas geleiras nas calotas pola~ tes € nos cumes de montanhas. 7.1 O Movimento de Agua no Sistema Terra - Ciclo Hidrolégico ‘A égua distribui-se na atmosfera e na parte superficial da crosta até uma profundidade de aproximadamente 10 km abaixo da interface atmosfera/crosta, constituin- do a hidrosfera, que consiste em uma série de reservatérios como os oceanos, geleitas, rios, lagos, va- por de gua atmosférica, 4gua subterrinea e égua retida nos seres vivos, O constante intercimbio entre estes re- “St Lago subterrdineo do caverna Poco Encantado (calcérios do Grupo Una), Itaeté, BA. Foto: Adriano Gemborini, Capituto 7 * CictopaAcua 115 Tabela 7.1 Distribuigéo de agua nos principais reservatorios naturais. A agua doce liquida disponivel na Terra corresponde praticamente a gua subterrénea. Dery Parte da precipitacio retorna para a atmosfera por evaporagio direta durante seu percurso em direcio & superficie terrestre. Esta frago evaporada na atmos- fera soma-se ao vapor de agua formado sobre 0 solo € aquele liberado pela atividade biolégica de organis- Nivel gue Fig. 7.1 O ciclo hidrolégico. Volume (km? x 10°) Volume (%) Tempo médio de permanéncia Come Supetticil em vot 4,000 anos 10 - 1000 anos 2 semanas o 10.000 anos 2 semanas 6 10 anos 2semanasa 1 ono 1 semana ~10dias mos, principalmente as plantas, através da respiragio. Esta soma de processos é denominada evapotrans- piragdo, na qual a evaporagio direta é causada pela radiagio solar ¢ vento, enquanto a transpiragao de- pende da vegetagio. A evapotranspiragio em areas logo GS = florestadas de clima quente ¢ dmido devolve & atmos- fera até 70% da precipitagio, Em ambientes glaciais 0 retorno da agua para a atmosfera ocorre pela subli- magio do gelo, na qual a 4gua passa diretamente do estado s6lido para 0 gasoso, pela aco do vento (Cap. 11) Em regides florestadas, uma parcela da precipita- io pode ser retida sobre folhas ¢ caules, sofrendo evaporagio posteriormente. Este processo é a interceptagio. Com a movimentagio das folhas pelo vento, parte da Agua retida continua seu trajeto para solo. A interceptasio, portanto, diminui o impacto das gotas de chuva sobre 0 solo, reduzindo sua acio erosiva. Uma vez atingido o solo, dois caminhos podem ser seguidos pela goticula de agua, O primeiro é a infiltragao que depende principalmente das carac- teristicas do material de cobertura da superficie. A gua de infiltracio, guiada pela forca gravitacional, tende a preencher os vazios no subsolo, seguindo em profundidade, onde abastece o corpo de agua subterrinea. A segunda possibilidade ocorre quan- do a capacidade de absorcio de 4gua pela superficie € superada e 0 excesso de agua inicia o escoamen- to superficial, impulsionado pela gravidade para zonas mais baixas. Este escoamento inicia-se atra- vés de pequenos filetes de agua, efémeros © disseminados pela superficie do solo, que conver- gem para os cérregos e rios, constituindo a rede de drenagem. O escoamento superficial, com raras ex- cegdes, tem como destino final os oceanos. E bom lembrar ainda que parte da égua de infiltragio retorna 4 superficie através de nascentes, alimentando o escoamento superficial ou, através de rotas de flu- xo mais profundas e lentas, reaparece diretamente ‘nos oceanos, Durante o trajeto geral do escoamento superficial nas reas emersas e, principalmente na superficie dos ‘oceanos, ocorte a evaporacio, realimentando 0 vapor de agua atmosférico, completando assim o ciclo hhidrol6gico. Hstima-se que 0s oceanos contribuem com 85% do total anual evaporado € os continentes com 15% por evapotranspiracio. 7.1.3. Formagio e consumo de 4gua no ciclo hidrolégico O ciclo hidrolégico pode ser comparado a uma gran- de maquina de reciclagem da agua, na qual operam processos tanto de transferéncia entre os reservatéri- Led dh tid seln dems tts 0s como de transformagio entre os estados gas0so, liquido € sélido. Processos de consumo e formagio de gua interferem neste ciclo, em relativo equilibrio através do tempo geol6gico, mantendo o volume geral de agua constante no Sistema Terra, Hla, portanto, um balango entre a geracio de 4gua juvenil e consumo de figua por dissociagio ¢ sua incorporacio em rochas sedimentares Considerando o tempo geoldgico, o ciclo hidrologico pode ser subdividido em dois subciclos: © primeiro opera a curto prazo envolvendo a dinimi- ca externa da Terra (movido pela energia solar e gravitacional, Cap. 9); 0 segundo, de longo prazo, movimentado pela dindmica interna (tectdnica de pla- cas, Cap. 6), onde a agua participa do ciclo das rochas, (Fig. 7.1). No ciclo “ripido”, a égua & consumida nas rea- gSes fotoquimicas (fotossintese) onde ¢ retida principalmente na produgio de biomassa vegetal (ce- lulose e agiicar). Com a reagio contriria i forossintese, 2 respiracio, esta agua retorna ao ciclo. No ciclo “lento” © consumo de Agua ocorre no intemperismo quimico através das reacbes de hidrdlise (Cap. 8) e na formagio de rochas sedimentares ¢ metamérficas, ‘com a formacio de miners hidratados (Cap. 2). A pro- ducio de gua juvenil pela atividade vuleinica representa © retomno desta 4gua a0 ciclo rapido. 7.1.4 Balango hidrico e bacias hidrogrificas O ciclo hidrolégico tem uma aplicagio pratica no estudo de recursos hidricos (Cap. 20) que visa avaliar € monitorar a quantidade de 4gua disponi- vel na superficie da Terra. A unidade geogrifica para esses estudos é a bacia hidrografica, defini- da como uma area de captacio da agua de precipitagio, demarcada por divisores topogriifi- cos, onde toda agua captada converge para um nico ponto de saida, o exutério (Fig. 7.2) ‘A bacia hidrogrifica € um sistema fisico onde podemos quantificar o ciclo da agua. Esta anélise quantitativa é feita pela equacio geral do balango hidrico, expressio basica da Hidrologia: P-E-Q(t As) Nesta equacio, P corresponde ao volume de agua precipitado sobre a area da bacia, Fo volume que voltou 4 atmosfera por evaporagio e transpiragio, ¢ 220 volume total de agua escoado pela bacia, duran- Capituto 7 * Cicto pa Act ars Bacia hidrogrdfica Linigrafo Curva chove Sedo no exutério 28.) 3 é 22. or = 42 g aL} fa a a Verso Registro do linigrato Hidrogroma Excoamento direto Fisxo basal PAE M ALM. d-3 4 8° 0.N. D Tempo ‘Tempo HMB = escoamento total (Q) Fig. 7.2 Elementos de uma bacia hidrogrética e obtencéo do hidrograma. O fluxo basel no hidrograma representa @ égua do rio Proveniente da égua subterrGnea, enquanto o escoamento direlo corresponde & agua superficial em resposta a eventos de chuvo, te um intervalo de tempo. Este escoamento total (Q) representa a “produgio” de agua pela bacia, medida pela vazio no cxutério durante o periodo de monitoramento. O termo AS refere-se a variagées positivas ¢ negativas devido ao armazenamento no interior da bacia. Este armazenamento ocorre na for- ma de Agua retida nas formacdes geoldgicas do subsolo, cujo fluxo é muito mais lento que o do esco- amento superficial direto. Considerando-se periodos de monitoramento mais longos (ciclos anuais), as di- ferengas positivas e negativas de armazenamento tendem a se anular. Os valores positivos ocorrem quan- do 0 escoamento total da bacia é alimentado pela gua subterrinea (perfodos de estiagem), enquanto os ne- gativos refletem perfodos de recarga (época de chuvas), quando parte da precipitacio sofre infiltracio, realimentando a 4gua subterrinea, em vex de escoar diretamente da bacia. Portanto, para um ciclo hidroldgico completo da bacia, é possivel resumit a equacio geral do balango hidrico para: PHE+Q, onde Q (vazio total da bacia) representa a soma do escoamento superficial direto com 0 escoamento da bacia suprido pela agua subterrinea e E a Agua perdida por evapotranspiracio. Na maioria das bacias hidrogrificas a saida do es- coamento total (Q) é através de um tio principal que coleta toda agua produzida pela bacia. A medicio de Q constitui um dos objetivos principais da hidrologia de bacias, Basela-se na construgio de umhidrograma, que expressa a variagio da vazio em fungio do tem- po (Fig, 7.2), envolvendo as seguintes etapas: 1, Medigio de diferentes vazes do rio a0 longo do ano para obter a curva chave que relaciona a altura com a vazio do rio. 2. Obtengio do tragado da variagio do nivel do rio ao longo do periodo de monitoramento por meio de um linigeafo. 3. Transformacio do registro da variagio do nivel do rio em curva de vazio (hidrograma), pela substituigio de cada ponto de altura do tio pelo seu correspondente valor de vazio. 4, Célculo da vazio total da bacia através da area sob a curva do hidrograma (m'/s x tempo, em segundos = volume total). © hidrograma é a base para estudos hidrol6gicos de bacias visando, por exemplo, 0 abastecimento de pRteete T eee eds Agua ou seu aproveitamento hidroelétrico. Permite ana- lisar 0 comportamento das bacias, identificando periodos de vazio baixa e alta, auxiliando na previsio de enchentes ¢ estiagens, assim como periodos ¢ volu- mes de recarga da Agua subterrinea. Através da identificacio, no hidrograma, dos componentes de es coamento direto ¢ fluxo basal, é possivel avaliar a contribuigio da agua subterrinea na producio total de 4gua da bacia (Fig. 7.2). 7.2 Agua no Subsol Agua Subterranea ‘Trataremos agora da fracio de agua que sofre in- filteagio, acompanhando seu caminho pelo subsolo, onde a forga gravitacional ¢ as caracteristicas dos ma- teriais presentes irio controlar o atmazenamento ¢ 0 movimento das Aguas. De maneira simplificada, toda gua que ocupa vazios em formagies rochosas ou no regolito (Cap. 8) é classificada como Agua subterrinea. 7.2. Infiltragio Infiltragio € 0 processo mais importante de recarga da gua no subsolo. O volume e a velocidade de infil- tragio dependem de vitios fatores, Tipo e condigao dos materiais terrestres ‘A infiltragio é favorecida pela presenga de materiais porosos ¢ permeaveis, como solos e sedimentos areno- sos. Rochas expostas muito fraturadas ou porosas também permitem a infitragio de aguas superticiais. Por outro lado, materia argilosos e rochas eristalinas pouco fratu- das, por exemplo corpos igneos pluténicos ¢ rochas ‘metamérficas como granitos ¢ gnaisses, sio desfavori- vcis a infiltragio, Espessas coberturas de solo (ou material inconsolidado) exercem um importante papel no con trole da infiltraglo, retendo temporariamente parte da figua de infiltragio que posteriormente é liberada lenta- mente para a rocha subjacente. A quantidade de agua transmitida pelo solo depende de uma caracteristica im- portante, chamada de capacidade de campo, que cortesponde ao volume de agua absorvido pelo solo, antes de atingir a saturagZo, e que nao sofre movimento para niveis inferiores, Este parimetro influencia direta- ‘mente a infiltracio, pois representa um volume de agua que participa do solo mas que no contribui com a recarga da agua subterrinea, sendo aproveitada somente pela vegetagao. Cobertura vegetal Em areas vegetadas a infiltracio é favorecida pelas raizes que abrem caminho para a gua descendente no solo. A cobertura florestal também exerce importante fancio no retardamento de parte da agua que atinge © solo, através da interceptacio, sendo 0 excesso len- tamente liberado para a superficie do solo por gotejamento. Por outro lado, nos ambientes densa- mente florestados, cerca de 1/3 da precipitagio interceptada sofre evaporagio antes de atingie o solo, Topografia De modo geral declives acentuados favorecem 0 escoamento superficial direto, diminuindo a infileea- io. Superficies suavemente onduladas permitem © escoamento superficial menos veloz, aumentando a possibilidade de infileragio, Precipitagio © modo como o total da precipitacao é distribu- {do a0 longo do ano é um fator decisivo no volume de recarga da égua subterrinea, em qualquer tipo de terreno, Chuvas regularmente distribuidas ao longo do tempo promovem uma iafiltragio maior pois, desta maneita, a velocidade de infiltragio acompanha o vo- lume de precipitagio. Ao contririo, chuvas torrenciais favorecem 0 escoamento superficial direto, pois a taxa de infiltracio € inferior ao grande volume de dgua pre- cipitada em curto intervalo de tempo. Ocupagio do solo O avango da urbanizagio © a devastagio da vegeta- io influenciam significativamente a quantidade de dgua infitrada em adensamentos populacionais e zonas de in- tenso uso agropecuirio, Nas éreas urbanas,as construges| © 4 pavimentagio impecem a infiltragio, causando efei- tos catastrdficos devido ao aumento do escoamento superficial e reducio na recarga da 4gua subterrinea, Nas ‘reas rurais, a infltracio sofre redugio pelo desmatamento em geral, pela exposicio de vertentes através de planta- ges sem terraceamento, ¢ pela compactagio dos solos causada pelo pisoteamento de animais, como em exten- sivas dreas de criagio de gado. Um fato curioso é a situngiio em grandes centros urbanos, como Sio Paulo, onde se detectou uma recarga significativa da gua subtertinea por vazamen- tos da rede de abastecimento (Cap. 20). 7.2.2 Distribuigio e movimento da Agua no subsolo © conceito de superficie freatica ou nivel digua Além da forca gravitacional ¢ das caracteristicas dos solos, sedimentos € rochas, 0 movimento da Agua no subsolo é controlado também pela forca de atragao molecular e tensio superficial, A atracio molecular age quando moléculas de agua sio pre- sas na superficie de argilominerais por atracio de cargas opostas, pois a molécula de agua é polar. Este fendmeno ocorre principalmente nos primei- ros metros de profundidade, no solo ou regolito, rico em argilominerais (Cap. 8). A tensfo superfici- al tem efeito nos intersticios muito pequenos, onde a gua fica presa nas paredes dos poros, podendo ter movimento ascendente, contea a gravidade, por capilaridade, A adsorgio de agua em argilominerais nos capilares dificulta seu movimento nas prox midades da superficie, reduzindo sua evaporacio ¢ infiltragio. Assim, conforme o tamanho do poro, a gua pode ser higroscépica (adsorvida) e pratica- mente imével, capilar quando 'sofre agao da tensio superficial movendo-se lentamente ou geavitacional (livre) em potos maiores, que permitem movimen- to mais rapido. O limite inferior da percolagio de agua é dado quando as rochas nao admitem mais espacos aber- tos (poros) devido 4 pressio da pilha de rochas sobrejacentes. Esta profundidade atinge um maxi- mo de 10.000m, dependendo da situagio topogrifica edo tipo de rocha, Pode-se imaginar ento que toda Agua de infilteagio tende a atingir este limite inferi- or, onde softe um represamento, preenchendo todos 08 espacos abertos em diregio a superficie. Estabe- lece-se assim uma zona onde todos os poros estio cheios de agua, denominada zona saturada ou freatica (Fig. 7.3). Acima desse nivel, os espagos vazios esto parcialmente preenchidos por agua, contendo também ar, definindo a zona nao saturada, também chamada de vadosa ou zona de aeracio, O limite entre estas duas zonas é uma im- portante superficie denominada superficie freatica (SF) ou nivel da agua subterrinea (nivel d’agua, NA), facilmente identificado na pritica, ao se perfurarem pocos, nos quais a altura da agua marca a posi¢io do nivel da agua. A superficie gerada por varios pontos do NA constitui a superficie freatica, PU Oe Ly Zone vadoea ou ndo satureda Fig. 7.3 Distribuigéo de égua no subsola O nivel fredtico acompanha aproximadamente as irregularidades da superficie do terreno, 0 que pode ser visualizado pelo tragado de sua superficie através de uma rede de pogos (Fig, 7.4). Sua profundidade é funcio da quantidade de recarga e dos materiais ter- restres do subsolo. Em 4reas timidas, com alta pluviosidade, tende a ser mais raso, enquanto em am- bientes dtidos tende a ser profundo. De modo geral, € mais profundo nas cristas de divisores topogrificos (nos interfhivios) e mais raso nos fundos de vales. Quando o nivel d’égua intercepta a superficie do ter- reno, aflora, gerando nascentes, cértegos ou tios. A maioria dos leitos fluviais com gua sio afloramentos do NA. O nivel freatico tem uma relagio intima com os rios. Os rios cuja vaziio aumenta para jusante sio cha- mados de trios efluentes, ¢ sio alimentados pela Agua subterrinea, situagio tipica de regid tritio, nos tios influentes, a vazdo diminui a jusante, como conseqiiéncia da recarga da gua subterrinea pelo, escoamento superficial. Nestes casos a gua do rio infiltr-se para 0 nivel freitico (Fig. 7.5) e 0 rio poder secat se 0 nivel for rebaixado, abandonando o leito do rio, como é comum em éreas semi-ridas ou éridas. imidas. Ao con- Em 4reas sridas, onde a evaporagio é intensa € su- planta a precipitacio, pode ocorrer a inversio sazonal da infiltragao, quando uma parte da égua subterrinea tem movimento ascendente por capilaridade, atraves- sando a zona vadosa para alimentar a evaporacio na superficie do solo. Este processo é responsivel pela mineralizagio dos horizontes superficiais do solo, pois sais dissolvidos na égua subterrinea acabam precipitan- do € cimentando os grios do regolito (salinizagio do solo). O caliche & um exemplo de solo endurecido pela Ife © Nl reieo Fluxo de égua subjerrdnea Fig. 7.4 O nivel fredtico e o relevo da superticie. Capituto 7 * CictcopaAcua 121 Fig. 7.5 Rios efluentes e influentes conforme a posigéio do nivel fredtico em relagdo ao vale. Porosidade intergranular precipitacio de carbonato de cilcio pelas aguas ascendentes em reas © semiviridas a dridas. Porosidade Porosidade de fraturas: teciénicas e reshiomento A porosidade € uma proprie- dade fisica definida pela relagio entre 0 volume de poros ¢ 0 volu- me total de um certo material, Existem dois tipos fundamentais de porosidade nos materiais ter- restres: primaria e secundéria, A porosidade primaria é gerada jun- tamente com o sedimento ou rocha, sendo caracterizada nas rochas sedimentares pelos espagos entre 0 clastos ou grios (porosidade intergranular) ou planos de estratificagio (Cap. 14). Nos mate- taissedimentares 0 tamanho e forma das particulas, 0 seu grau de selegiio a presenca de cimentagio influen- ciam a porosidade. porosidade secundaria, por sua vez, se desen- volve apés a formagio das rochas igneas, metamérficas ou sedimentares, por fraturamento ou falhamento durante sua deformagio (Porosidade de fraturas). Um tipo especial de porosidade secundaria ‘se desenvolve em rochas soltiveis, como caleitios marmores, atra- vés da criagio de vazios por dissolugio, caracterizando a porosidade carstica (Fig, 7.6). Fig. 7.6 Os tréstipos fundamentals de porosidade conforme diferentes materiois numa seca geolégica Pree ee ee TY Tabela 7.2 Volume de poros e tamanho de particulas em sedimentos. Fato importante é a diminuicao da permeabilidade com o aumento da porosidade e di iinuiggo do tamanho de particula. CCC a ee ee ee eee ee Coscalho, 7.020 ‘Areia grossa 102 Areia fina. 03 Sites ¢ orgilo 0,04 0 0,006 Permeabilidade principal fator que determina a disponibilidade de gua subterrinea nio é a quantidade de agua que os materiais armazenam, mas a sua capacidade em permitir o fluxo de agua através dos poros. Esta pro- ptiedade dos materiais conduzirem agua é chamada de permeabilidade, que depende do tamanho dos poros ¢ da conexao entre el Um sedimento argiloso, por exemplo, apesar de possuir alta porosidade (Tabela 7.2), é praticamente impermedvel, pois os poros sio muito pequenos ¢ a ‘igua fica presa por adsorgao. Por outro lado, derra- mes basilticos, onde a rocha em si niio tem porosidade alguma, mas possui abundantes fraturas abertas interconectadas, como disjungdes colunares Guntas de resfriamento), podem apresentar alta permeabilidade devido a esta porosidade primaria, + Linhas de fluxo da égua subterrénea Equipotenciais Relevo 35,2 Muito alta 37,4 Alto 42 Alta a médio 50.0 80 Baixa a muito baa Assim como 0s tipos de porosidade, a permeabili dade pode ser priméria ou secunditia O fluxo de gua no subsolo Além da forga gravitacional, 0 movimento da agua subterrinea também é guiado pela diferenga de pres sio entre dois pontos, exercida pela coluna de agua sobrejacente aos pontos e pelas rochas adjacentes. F diferenga de pressio é chamada de potencial da agua (potencial hidraulico) © promove 0 movimento da ‘igua subterrinea de pontos com alto potencial, como nas cristas do nivel freditico, para zonas de baixo po- tencial, como em fundos de vales, Esta pressio exes pela coluna de agua pode causar fluxos ascendentes da Agua subterrinea, contrariando a gravidade, como no caso de porgées profundas abaixo de cristas, onde a figua tende a subir para zonas de baixo potencial, junto a leitos de rios e lagos. a ida Nivel dégua 1a impermedvel pee ie A uniio de pontos com o mesmo potencial hidriu- lico cm subsuperficie define as linhas equipotenciais do nivel freitico, semelhantes a curvas de nivel topogrificas. © fluxo de égua, partindo de um poteneial maior pata outro menor, define uma linha de fluxo, que segue o caminho mais curto entre dois poteneiais diferentes, num tracado perpendicular ds linhas equipotenciais (Fig, 7.7). Condutividade hidrdulica e a lei de Darcy Observando 0 movimento do nivel fredtico em po- {908 e mascentes apés eventos de chuva (recarga), noti-se que a velocidade do fluxo da agua subterrinea é relativa- mente lenta. Se fosse ripida, passados alguns dias depois da chuva, um poco normal iria secar. Surge a pergunta: porque fluso da gua subterriinea em certos locais € ripido e em outros é lento? No flaxo de 4gua em superficie, a velocidade diretamente proporcional 4 inclinagao da superti- cic. Este grau de inclinacio, denominado gradiente hidréulico (As/AL), é definido pela ra- Zio entre o desnivel (Ai) ea distincia horizontal entre dois pontos (AL). O desnivel indica a diferenca de po- tencial entre os pontos. Quanto maior a diferenga de potencial, dada uma distincia lateral constante, maior sera a velocidade do fluxo, ara o fluxo da gua subterrinea, necessita-se consi- erat, além da inclinagio do nivel d’égua,a permeabilidade do subsolo € a viscosidade da agua. A influéncia desses parimetros sobre o fluxo da 4gua subterrinea foi investigada c quantificada em laboratério pelo engenhei- 10 hidraulico francés Henry Darcy, em 1856, resultando, na formulagio da lei de Darcy, base da hidrologia de meios porasos. © experimento de Darcy bascou-se na medigio da vazio de agua (Q) com um cilindro preenchido por ‘material arenoso, para diferentes gradicntes hidriulicos (Fig 7.8). O fluxo de agua para cada gradiente foi caleu- Jado pela telagio entre a vazio (Q) e a area (A) da seco do cilindro, Este fluxo, com unidade de velocidade, foi definido como a vazto especifica (q) do matetial, A vaziio especifica & diretamente proporcional ao gradiente hidriulico. Neste grifico (Fig, 7.8), 0 coefi- ciente angular da reta corresponde 4 condutividade hidraulica, que é uma caracteristica intrinseca do ma- terial, expressando sua capacidade de transmissio de Agua. Este parimetro é uma forma de quantificar a capacidade dos materiais transmitirem gua em fun- io da inclinagio do nivel freatico. Alerta-se para 0 fato de que a vazio especifica € uum conceito macroseépico que considera o material todo, nio se referindo as velocidades reais dos traje tos microseépicos entre os espacos da porosidade, A vazio especifica, com unidades de velocidade (distin- cia/tempo), deve ser entendida como uma velocidade macroscépica, ou média, ao longo do trajeto entre um ponto de entrada € outro de saida da agua. Uma das aplicagdes da lei de Darey é determi- nar 0 fluxo da agua subterrinea numa certa regio, pela condutividade hidritulica medida em labora- t6tio ou, a0 contrério, medindo a velocidade média do fluxo, determinar a condutividade hidréulica dos materials A velocidade de percolagio da agua subterri- nea também pode ser medida com 0 uso de tracadores, como corantes inofensivos a satide ¢ 20 ambiente, quando 0 trajeto do fluxo € conhecido, Neste caso, injeta-se © corante na zona saturada de um poco, medindo-se o tempo de percurso deste até um outro pogo ou uma nascente, A velocidade do fluso é a distincia entre os pontos sobre 0 tem- po de percurso, De maneira geral, 0 movimento da agua subterri- nea é muito lento quando comparado ao escoamento superficial. Em materiais permeaveis, como areia mal selecionada, a velocidade varia entre 0,5 ¢ 15 em/dia, atingindo maximos de até 100 m/dia em cascalhos bem selecionados sem cimentagio, No caso de grani- tos € gnaisses pouco fraturados, o fluxo chega a algumas dezenas de centimetros por ano, Ja'em basaltos muito fraturados, registram-se velocidades de até 100m/dia. Os flusos mais sépidos sio registrados em calcitios com condutos (césticos), com maximos de 1.000 m/hora. Para movimentos muito lentos e por longas distin as, 08 hidrogedlogos utilizam métodos geoctonolégicos (Cap. 15) para medi velocidades. Um deles baseia-se no MC, presente no CO, atmosférico dissolvido na égua subtertiinea. Uma vez que 0 isétopo radioativo “C no € seposto no percurso subterrineo, seu decaimento em fungi do tempo permite datar a agua subterrinea. Di- vidindo-se a distincia entre a zona de recarga da agua subterrinea e 0 ponto analisado (um poco ou nascente) pela idade da agua, obtém-se sua velocidade de petcolacio. Estudos realizados na bacia do Maranhio (Piaui), mostraram idades de até 35,000 anos para a agua subtertinea em camadas profuundas, indicando fluxos em torno de 1m/ano. Poe ae 2 Na natureza: gradlente hidréulic: atta aaa Descarga no vale Ensaio no laboratério: Volume injetado A = Area da secéo do cilindro (m*) @ = Vario obtida para 4H e AH, Volume recuperado em Q( mis) = — ‘A vazdo expectica q ( m/s) ¢ obtida de Q= qxA q= No gréfico de q em fungéo de AH v 8 a K = Constante do material = condutividade hidréulica 3 pees 2 a es ak ow equagdo de Darcy ro o 2 L eT A Gradiente hidréulico" Fig. 7.8 Obtencéo experimental do lei de Darcy, 723 Aquifer terranea teservatétios da agua sub- Unidades rochosas ou de sedimentos, porosas permeiveis, que armazenam e transmitem volumes significativos de égua subterrinea passivel de ser ex- plotada pela sociedade sio chamadas de aqiiferos (do latim “carregar Agua”). O estudo dos aqiifferos visando a exploragio ¢ protecio da agua subterrinea (Cap. 20) constitui um dos objetivos mais importantes, da Hidrogeologia, Em oposicio ao termo aqiifero, utliza-se o ter- mo aqiticlude para definir unidades geolégicas que, apesar de saturadas, ¢ com grandes quantidades de gua absorvida lentamente, s20 incapazes de transmi- tir um volume significativo de 4gua com velocidade suficiente par abastecer pogos ou nascentes, por se- rem rochas relativamente impermeiveis, Por outro lado, unidades geolgicas que no apresentam poros interconectados ¢ no absorvem e nem transmitem Agua sto denominadas de aqiiifugos. Recentemente os hidrogedlogos tém utilizado os termos aqiiffero e aqijitarde para.exprimir compara- tivamente a capacidade de produgio de agua por unidades rochosas, onde a unidade com producio de ‘igua corresponde a0 aqiiifero e a menos produtiva 20 agiiitarde (Cap. 20). Por exemplo, numa seqiiéncia de estratos intercalados de arenitos e silttos, os siltitos, menos permeaveis que os arenitos, correspondem a0 aqiitarde. Numa outra seqiiéncia, formada de siltitos catgilitos, a unidade siltosa pode representar 0 aqiifero, Portanto, 0 aqilitarde cortesponde & camada ou uni- dade geolégica relativamente menos permedvel numa determinada seqiiéncia estratigrifica, Bons aqiiiferos sio os matetiais com média a alta condutividade hidréulica, como sedimentos inconsolidados (por exemplo, cascalhos ¢ arcias), rochas sedimentares (por exemplo, arenitos, conglomerados ¢ alguns calcirios), além de rochas vuleinicas, pluténicas e metamérficas com alto grau de fraturamento. Aqiiiferos ¢ tipos de porosidade Conforme os trés tipos fundamentais de porosidade, identificam-se agiiiferos de porosidade intergranular (ou granular), de fraturas ¢ de condutos (cirstico). Os agfiferos de porosidade granular ocotrem no regolito ¢ em rochas sedimentares clisticas com porosidade priméria, Os arenitos, de modo geral, sio excelentes Se te ad aqiifferos deste tipo. A produtividade em agua dos arenitos diminui com o sea grau de cimentagio, como & caso de arenitos slicificados, quase sem permeabilidade intergranular A maioria dos aqiiiferos de fraturas forma-se em conseqiiéncia de deformagio tecténica (Cap. 19), na qual processos de dobramento e falhamento geram sistemas de fraturas, normalmente seladas, devido 4 profundidade. Posteriormente sofrem aberturas submilimétricas a milimétricas, permitindo a entrada fluxo de agua, pela expansio das rochas devido a0 alfvio de carga litostatica causado pelo soerguimento regional ¢ erosio das rochas sobrejacentes. E 6bvio que o fluxo de agua somente se instala quando as fraturas que compdem o sistema estao interconectadas. Fraturas nfo tectdnicas, do tipo disjungio colunar (Cap. 17) em rochas vulednicas, como nos derrames de basaltos, podem ser gera- das durante as etapas de resfriamento € contragio, possibilitando que estas rochas tornem-se posteri ormente importantes aqiiferos. Aqiiiferos de condutos caracterizam-se pela porosidade cérstica, constitufda por uma rede de con- dutos, com didmetros milimétricos a métricos, gerados pela dissolucio de rochas carboniticas. Constituem aqiiiferos com grandes volumes de agua, mas extrema- mente vulneriveis 4 contaminagio (Cap. 20), devido & baixa capacidade de fitragio deste tipo de porosidade. Na natureza, esses agiifferos ocorrem associados, refletindo a variedade litoldgica ¢ estrutural de seqiién- cias estratigraficas. Situacdes transit6tias entre os tipos de agiiiferos ocorrem, como por exemplo, em regi- Ses calcérias, onde aqifferos de fraturas passam a aqiiiferos de condutos, ou de porosidade granular nos depésitos de cobertura. Agiiferos livres, suspensos ¢ confinados Aqiiiferos livres so aqueles cujo topo é demarca- do pelo nivel freatico, estando em contato com a atmosfera (Fig, 7.9). Normalmente ocorrem a pro- fundidades de alguns metros a poucas dezenas de metros da superficie, associados ao regolito, sedimen- tos de cobertura ou rochas. Agiiiferos suspensos sto acumulagdes de gua so- bre agiiitardes na zona insaturada, formando nfveis Jentiformes de aqitferos livres acima do nivel freatico principal (Fig: 7.9). el baie ape ifero suspenso “sobre mane caved Fig. 7.9 Aqitferos livres © suspensos. Agiiferos suspensos ‘ocorrem quando uma camada impermesvel intercepta a infil- tragéo. ho 8 io et Agiifferos confinados ocorrem quando um estra- to permeivel (aqiiffero) esta confinado entre duas unidades pouco permedveis (aqiitardes) ou imperme- Aiveis. Representam situagdes mais profundas, a dezenas, vrias centenas ou até milhares de metros de profun- didade, onde a gua esti sob agio da pressio nio somente atmosférica, mas também de toda a coluna de agua localizada no estrato permeével (Fig, 7.10). Artesianismo Em determinadas situagdes geol6gicas, aiifferos eon- finados dio origem ao fendmeno do artesianismo, responsivel por pogos jorrantes, chamados de artesi- anos (nome derivado da localidade de Artuit, Franca). Neste caso, a égua penetra no aqiifero confinado em direcio a profundidades crescentes, onde sofre a pres- sio hidrostitica crescente da coluna de agua entre a zona de recarga ¢ um ponto em profundidade. Quan- do um poco perfura esse aqiiifero, a dgua sobe, pressionada por esta pressio hidrostitica, jorrando Superticie Pemeananics ‘Aturo do nivel da égua no érea de recorge certesiano Fig. 7.10 Aqutfero confinado, superficie potencioméirica e artesianismo. A équa no poco artesiano jorta até « altura da linha AC ‘endo AB devide @ perda de potencial hidréulice durante a percolagdo no aqiifero. naturalmente, A formacio deste tipo de aqiifero re- ‘quer as seguintes condigdes: uma seqiiéncia de estratos inclinados, onde pelo menos um estrato permeavel -ntre estratos impermeéveis e uma situa- io geométrica em que o estrato permedvel intercepte a superficie, permitindo a recarga de Agua nesta cama. da. O pogo, ao perfurar © agiifero, permite a ascensio da gua pelo principio dos vasos comunicantes, € gua jorra na tentativa de atingir a altura da zona de recarga. A altura do nivel da agua no poco corres- ponde ao nivel potenciométrico da agua; em trés, dimensées, 0 conjunto de varios niveis potencio- métricos define a superficie potenciométrica da ‘agua (Fig, 7.10). Devido & perda de carga hidréuli- ca ao longo do fluxo ha um rebaixamento no nivel dagua no pogo em relacio ao nivel digua da zona de recarga, a distincia da area de recarga. encontre- ic desnivel cresce conforme aumenta Quando ocorre a conexo entre um aqiiifero con- finado em condigdes artesianas e a superficie, através, de descontinuidades, como fraturamentos, falhas ou fissuras, formam-se nascentes artesianas. 7.3 Ago Geolégica da Agua Subterranea Agio geolégica é a capacidade de um conjunto de processos causar modificagées nos materiais terres tres, transformando minerais, sochas e feigoes terrestres. © esculpimento de formas de relevo da superficie ter- restre € um tipo de agdo geol6gica, dominada pela dinimica externa do planeta Terra, conhecida como acio geomérfica, rE tee TotW Co a A zona de ocorréncia da gua subterrinea é uma regio onde é iniciada a maioria das formas de relevo, pois a 4gua subterrinea é 0 principal meio das reagdes, do intemperismo quimico. O movimento da égua sub- terrénea, somado ao da gua superficial, sio os principais agentes geomérficos da superficie da ‘Terra A agio geomérfica da agua subterrinea se traduz por virios processos de modificacio da superficie terres- tre € seus respectivos produtos (Tabela 7.3), 7.3.1 Escorregamentos de encostas A movimentagio de coberturas como solos ou se~ dimentos inconsolidados em encostas de morros tem velocidades muito variiveis (Cap. 9). Os movimentos ripidos, com deslizamentos catastrdficos acontecem com freqiiéncia em épocas de fortes chuvas, em regi- des de relevo acidentado, Os movimentos muito lentos so chamados de rastejamento (creep) do solo, com velocidades normalmente menores que 0,3 m/ano. Os movimentos de encostas com velocidades superiores 4 0,3 m/ano sao englobados na categoria de escorregamentos ou deslizamentos de encostas, com velocidades que podem ultrapassar 100 km/hora. Enquanto o rastejamento lento € movido unicamente pela forga gravitacional, nao havendo influéncia de égua ‘no material, os escorregamentos sio movidos pelo processo de solifluxdo, no qual a forca gravitacional age devido A presenca de gua subterrinea no subsolo. Os materiais inconsolidados em encostas possuem uma estabilidade controlada pelo atrito entre as parti- culas. No momento em que o atrito interno € vencido pela forca gravitacional, a massa de solo entra em movimento, encosta abaixo. A diminuigio do atrito Tabela 7.3 Principais processos e respectivos produtos da ado geomérfica da agua subterranea. Pedogénese intemperismo quimico) (Cop. 8) Solifluxéo (Cap. 9) Erosdo interna, solapamento Carstificagéo (dissolucéo) Cobertura pedolégica (solos) Escorregamentos de encostas Bocorocas Relevo cérstico, caveras, agiifero de condutos centre as particulas é causada principalmente pela adi- io de Agua a0 material. Embora a 4gua aumente a coesio entre particulas do solo quando presente em pequena quantidade, (através da tensio superficial que aumenta a atracdo entre as particulas), a saturacio do solo em ‘gua acaba envolvendo a maioria das parti culas por um filme de agua, diminuindo drasticamente © atrito entre clas ¢ permitindo o seu movimento pela forca gravitacional, no processo conhecido como solifluxdo. A saturacio em Agua também aumenta 0 peso da cobertura, o que contribui instabilizacio do material, Tanto o rastejamento como o escorregamento de encostas sio processos naturais que contribuem para a evolugio da paisagem, modificando vertentes, Um exemplo de escorregamento catastréfico ocorreu na Serra do Mar, em 1967, destruindo estradas ¢ soter- rando bairros periféricos da cidade de Caraguatatuba, litoral de Sao Paulo. Esses movimentos podem set induzidos ou acelerados pela retitada artifical da co- bertura vegetal, acarretando o aumento da infiltracio de chuvas, lubrificagao das particulas e seu movimen- to vertente abaixo (Fig, 7.11). 7.3.2 Bogorocas: a erosiio que ameaga cidades Quem viaja pela serra da Mantiqueira (sul de Mi- nas Gerais) e vale do Paraiba, ou observa as colinas do oeste de Sio Paulo € norte do Parana, nota a pre- senga de fendas e cortes disseminados nas vertentes, cada vez mais freqiientes: sio as bogorocas (ou vogorocas), temidas pelos moradores locais porque constituem feigdes erosivas, altamente destrutivas, que rapidamente se ampliam, ameacando campos, solos cultivados e zonas povoadas. O termo bogoroca (eu, ‘em inglés) tem sua origem do tupi guarani “yby”, ter- ra “sorok”, rasgar ou romper. Esses cortes se instalam em vertentes sobre 0 manto intempérico, sedimentos ou rochas sedimentares pou- co consolidadas, e podem ter profundidades de decimetros até varios metros ¢ paredes abruptas € fundo plano, com secio transversal em U, O fundo é coberto por material desagregado, onde aflora 4gua, freqiientemente associada a areias movedigas (Cap. 9), ‘ow canais anastomosados (Fig, 7.12). Originam-se de suleos gerados pela erosio linear. Mas, enquanto os sulcos ou ravinas sao formados pela agio erosiva do escoamento superficial concentrado Pe a ee ne Fig. 7.11 A saturagéo em agua do material inconsolidado devido a subida do lencol fredtico em periodos de chuvas in- tenn pnteon suearogerooton ds seman cm linhas, as bogorocas sio geradas pela acto da égua subterriinea. A ampliacao de suleos pela erosio super- ficial forma vales fluviais, em forma de V, com vertentes inclinadas e fundo estreito. A partir do mo- mento em que um suleo deixa de evoluir pela erosio fluvial ¢ 0 afloramento do nivel freitico inicia o proces- so de erosio na base das vertentes, instala-se 0 bocorocamento, A erosio provocada pelo afloramento do fluxo da égua subterrinea tende a solapar a base das paredes, carreando material em profundidade e forman- do vazios no interior do solo (erosio interna ou tubificagio). O colapso desses vazios instabiliza as ver- tentes e é responsivel pela inclinagio abrupta € pelo recuo das paredes de bogorocas. A evolugio de sulcos de drenagem para bocorocas normalmente é causada pela alteragio das condigdes ambientais do local, principalmente pela retirada da cobertura vegetal, sendo quase sempre conseqiiéncia da intervencao humana sobre a dindmica da paisa- gem. Estas feigdes podem atingir dimensdes de até vvirias dezenas de metros de largura ¢ profundidade, com virias centenas de metros de comprimento. A Nivel d'3gua Suleos ou ravines Fig. 7.12 Morfologia de sulcos e bocorocos. ocorréncia de bogorocas sobre vertentes desprotegidas torna este processo pouco controlivel, ¢ seu ripido crescimento freqiientemente atinge areas urbanas ¢ es- tradas (Fig, 7.13), 7.3.3 Carste e cavernas: paisagens subterrineas Dentre as paisagens mais espetaculares da Terra ressaltam-se os sistemas cérsticos, com cavernas, cinions, pareddes rochosos ¢ relevos ruiniformes pro- duzidos pela ago geol6gica da Agua subterrinea sobre rochas sohiveis, Além de representarem atragbes obri gatérias para turistas, fordgrafos e cientistas, as constituem um desafio aos exploradores das frontei- ras desconhecidas do nosso planeta. Juntamente com topos de cadeias de montanhas e fundos oceanicos, as cavernas ainda reservam territérios nunca antes per- corridos pelo ser humano. A exploragio de cavernas tem sido de interesse da humanidade desde tempos ernas pré-histéricos, conforme o registro arqueoldgico de habitagdes humanas, com até dezenas de milhares de anos, como nas cavernas de Lagoa Santa (MG) ¢ Si0 Raimundo Nonato (PI). Fig, 7.13 Bogoroca na regido urbana do municipio de Bauru (SP), desenvolvida sobre o manto intempérico em arenitos do bacia do Porand. Foto de 1993, arquivo IPT-SP Carste é a traducao do termo alemio karst, origi- nado da palavra Arasg, denominagio dada pelos camponeses a uma paisagem da atual Croacia e Eslovénia (antiga Tugoslivia), marcada por rios sub- terrineos com cavernas ¢ superficie acidentada dominada por depresses com pareddes rochosos € torres de pedra. Do ponto de vista hidrolégico € geomorfoldgico, sistemas cirsticos so constituidos por trés compo- nentes principais (Fig. 7.14), que se desenvolvem de mancira conjunta e interdependente: 1. sistemas de cavernas — formas subterrineas aces- siveis 4 exploragio; 2. agiifferos de condutos — formas condutoras da gua subterrinea; 3, relevo eirstico ~ formas superficiais, Rochas carstificaveis Sistemas cérsticos sto formados pela dissolucio de certos tipos de rochas pela 4gua subterrinea. Considera- se rocha soliivel aquela que apés sofrer intemperismo quimico produz pouco residuo insolivel. Entre as ro- (NW dcquer ontigo: Sumidouro Nivel d! dgua atval Condutos freéticos Fig. 7.14 Componentes principais do sistema cérsico. 130 DeciFrRaNDO A TERRA chas mais favoriveis a carstificagio encontram-se as carboniticas (calcérios, mérmores ¢ dolomitos, por exem- plo), cujo principal mineral calcita (¢/ou dolomita), dissocia-se nos fons Ca e/ou Mg € CO,* pela agio da gua. Os caleatios so mais sohiveis que os dolomitos, pois a solubilidade da caleita é maior que a da dolomita. Rochas evaporiticas, constituidas por halita e/ou gipsita, apesar de sua altissima solubilidade, originam sistemas cirsticos somente em situagdes especiais, como em Areas dridas a semi-dridas, pois seu intemperismo, sob clima timido € tio répido que no permite 0 ple- no desenvolvimento do carste. Como exemplo de rocha considerada insoliivel, pode-se citar os granitos, nos quais feldspatos e micas submetidos ao intemperismo originam argilominerais, estveis em superficie, produzindo muito residuo in- soliivel em comparagio a0 volume inicial de rocha, 0 que impede 0 aumento da porosidade secundétia. Um caso especial, pouco comum, sio os quartzitos. Apesar da baixa solubilidade do quartzo em Aguas naturais, quartzitos com baixo teor de residuos inso- liveis podem desenvolver sistemas cérsticos, quando sofrem longos periodos de exposi¢io & acio da égua subterrinea, Dolina de colapso Solo de abatimento Dissolugao de rochas carboniticas O mineral calcita é quase insoliivel em agua pura, produzindo concentragdes miximas em Cat* de cer- ca de 8 mg/L, a0 passo que em aguas naturais é bastante solivel, como é evidenciado em nascentes ele cirsticas, cujas 4guas so chamadas de “duras”, devi- do ao alto teor de Ca e Mg (até 250 mg/L). Este fato deve-se a dissolugio fcida do carbonato de calcio pelo Acido carbonic (Cap. 8), getado pela reacio entre égua e gis carbénico (Fig. 7.13). Api ft pe [ey weal cera, > a terete kel for oe) Tipos de espeleotemas 1 Estologmite 3 - Estolactite tipo canudo Sedimentos flu or ere 5 Cortina com estalactta 7 - Excéntrcos (helicites ) 2-Estolagmite tipo vela 4 - Estolactite 6-Coluna 8 - Represas de travertino com cristais de calcta suboquética Fig. 7.15 Dissolugéo e precipitacio de calita num perfil cértico e principais tipos de espeleotemas. Pe AAs figuas de chuva, acidificadas inicialmente com 0 CO, atmosférico, softem um grande enriquecimento em acido carbénico quando passam pelo solo, pois a respitagio das raizes das plantas ¢ a decomposigio de matéria orginica resultam em elevado teor de CO, no solo, O ficido carbénico é quase totalmente consumi- do nos primeiros metros de percolagio da égua de infiltracio no pacote rochoso, sendo que, nas partes mais profundas do aqiiffero, resta somente uma pe- quena parcela deste Acido para dissolver a rocha. ‘Outro agente corrosivo as vezes presente na agua subterrinea é 0 Acido sulfirico, gerado principalmen- te pela oxidagio de sulfetos, como pitita ¢ galena, minerais acessérios muito freqiientes em rochas carboniiticas. Requisitos para o desenvolvimento de sistemas carsticos © desenvolvimento pleno de sistemas carsticos requer trés condig6es: a) Rocha sohivel com permeabilidade de fraturas. Rochas soltiveis do substrato geolégico, principal- mente caleatios, mirmores ¢ dolomitos, devem possuir uma rede de descontinuidades, formadas por superfi- s de estratificagio, planos de fraturas e falhas, caracterizando um aqiiffero de fraturas, Com a disso- lugio da rocha ao longo de intercessdes entre planos, instalam-se rotas preferenciais de circulagio da égua subterrinea. Em rochas sem descontinuidades plana- res ¢ porosidade intergranular dominante, a dissolugio ‘ocorte de maneira disseminada e homogénea, sem © desenvolvimento de rotas de fluxo preferencial da dgua subterranea, b) Relevo - gradientes hidraulicos moderados a altos © desenvolvimento do carste é favorecido quan- do a regiio carbonatica possui topografia, no minimo, moderadamente acidentada. Vales encai xados e desniveis grandes geram gradientes hidriulicos maiores, com fluxos mais ripidos das guas de percolacio a0 longo dos condutos no aqiiifero, 4 semelhanea do que se observa no esco- amento superficial. Essas velocidades maiores da gua subterrinea resultam em maior eficiéncia na remogao de residuos insohiveis, bem como na dis- solugio da rocha ao longo das rotas de fluxo e rios subterrincos, acelerando o processo de carstificacio. Aguas com fluxo lento exercem pouca agio, pois logo saturam-se em carbonato, perdendo sua acio corrosiva ¢ a capacidade de transportar particulas. ©) Clima - disponibilidade de agua Sendo 2 dissolugao a causa principal da formacio de sistemas cirsticos, 0 desenvolvimento do carste 6 mais intenso cm climas timidos. Além de alta pluviosidade, a carstificagio também é favorecida em ambientes de clima quente com densa vegetagio, onde a produgio biogénica de CO, no solo é maior, au- mentando 0 teor de Acido carbénico nas aguas de infiltragio. Desse modo as paisagens cérsticas sio mais desenvolvidas em regides de clima quente ¢ imido quando comparadas as regides de clima frio. Cavernas e condutos Cavernas sio cavidades naturais com dimensées «que permitem acesso 20 ser humano, Cavernas cérsticas slo parte do sistema de condutos e vazios caracteristi- cos das rochas carboniticas. A ampliagio dos condutos que compéem as ro- tas preferenciais de fluxo da égua subterrinea aumenta gradativamente a permeabilidade secundaria da ro- cha, transformando parte do aqiiifero fraturado em. aqiiffero de condutos, caracteristica hidrol6gica fun- damental de sistemas carsticos. Devido 20 rebaixamento do nivel freatico em funcio da crescente permeabilidade, muitas vezes somada a0 soerguimento tecténico da regio, se- tores da rede de condutos, iniciados e desenvolvidos em ambiente freatico, si expostos acima do nivel da Agua, sofrendo modificacoes ¢ ampliagio em ambiente vadoso. Estes segmentos de condutos, quando atingem dimensdes acessiveis ao ser huma- ‘no, constituem as cavernas. O processo de formacio do aqiiffero de condutos ¢ cavernas é chamado de espeleogénese, tetmo originado do grego spelaion, que significa caverna, No vasto sistema de porosidade de condutos de um aqiiifero cérstico, cerca de 1% € acessivel a0 ho- mem, formando sistemas de cavernas, compostos por tum conjunto de galerias, condutos ¢ sales, todos fa- zendo parte de uma mesma bacia de drenagem subterrinea, caracterizada por entradas e saidas da agua. Os padrées morfoldgicos dos sistemas de cavernas refletem principalmente a estrutura da rocha (acamamento dobrado ou horizontal e geometria € densidade do sistema de fraturas) ea maneira como é realizada a recarga de Agua no sistema, ou seja, através de sumidouros de rios com origem externa ao carste ou a partir de virios pontos de infiltracio distribuidos sobre a superficie carbor Depésitos sedimentares em cavernas € espeleotemas Nos condutos expostos na zona de oscilagio do 1 da agua, a ampliagio das cavernas ocorre pela aco de rios subterrineos, os quais entalham seus lei- tos, formando canions subterrineos. Nesta fase iniciam-se processos de abatimento de blocos, trans- formando parte dos condutos originais em salbes de desmoronamento onde se acumulam pilhas de frag- mentos de rocha com dimensdes extremamente variadas, Com 0 rebaixamento do nivel da gua, rios da superficie sio absorvidos pelos condutos cérsticos, 0 que causa a injecio de importantes volumes de agua detritos provenientes das Areas de captagio superticia desses rios, Parte dos detritos pode ser acumulada 20 longo drenagens subterrineas, formando depési- tos sedimentares fluviais nas cavernas, Com o gradativo rebaixamento do leito fluvial, acompanhando o soerguimento regional, testemunhos dos sedimentos fluviais sto preservados em niveis superiores das gale- rias subterrineas. Estas feigdes sio importantes no estudo da histéria de entalhamento e registros palcoambientais do rio subterrineo. Outro fenémeno importante que corte nas ca vernas acima do nivel fredtico é a deposicio de minerais nos tetos, paredes e pisos das cavidades, pro- duzindo um variado conjunto de formas ¢ ornamentagdes, genericamente denominadas de espeleotemas (Fig, 7.15). Os minerais mais comuns depositados em cavernas carsticas sio a calcita € aragonita (Fig, 7.16). A precipitacio ocorre quando as iguas saturadas em CaCO, perdem CO, para o am biente das cavernas, pois a concentracio de CO, da atmosfera subterrinea € muito menor que a quantida- de de CO, dissolvido nas aguas de infiltracio cenriquecidas em CO, biogénico. Devido a esta dife- renga de contetido em CO, a solugio de infiltragio tende a se equilibrar com a atmosfera da caverna, per- dendo CO,, € causa o deslocamento da reacio entre Aigua, gis carbénico e carbonato de cilcio no sentido de precipitagio de CaCO, Os espeleotemas sto classificados segundo sua for ma € o regime de fluxo da principal da sua grande diversidade morfoldgica. Os mais freqiientes sio formados por gotejamento da gua de infiltragio, como estalactites ¢ estalagmites gua de infiltracio, causa Figs.7.16 ( centro, compostes por calcita, caverna Santana, SP Foto: Ivo estolactites do tipo canudo e estolagmite no Karmann; (0) espeleotema tipo flor de aragonite, caverna Santana, SP Foto: Adriano Gambari, (Fig. 7.15). As primeiras sio geradas a partir de gotas que surgem em fraturas nos tetos de cavernas ¢ cres- cem em directo a0 ‘piso. Inicialmente formam-se estalactites do tipo canudo (Fig. 7.16), pela superposigio de anéis de carbonato de calcio com espessura microscépica. Estes canudos podem dar origem posteriormente a formas cénicas, quando 0 interior do canudo é obstruido e a deposicio do mi- neral passa a ocorrer através do escorrimento da solugio pela superficie externa do canudo, As stalagmites crescem do piso em diregio a origem do gotejamento, com o actimulo de carbonato de cilcio precipitado pela gota apés atingir o piso. Quan- do a deposigéo do mineral é associada a filmes de solugio que escorrem sobre superficies inclinadas, sio gerados espeleotemas em forma de crostas carbonaticas, que crescem com a superposigio de finas liminas de carbonato de célcio, podendo cobrir Fig. 7.17 Bacios de drenagem centripeta e voles cegos vistos em mapa topogréfico. Exemplo da regido da bacia do rio Betari, vale do Ribeira, sul de Sdo Paulo, ee trechos do piso e paredes de cavernas até uma espes- sura de virios metros. Os espeleotemas podem formar acumulagées de varias camadas, compostas por mais de um mi- neral (por exemplo calcita e aragonita), ¢ englobar contribuigdes detriticas, como areia e argila, trazi- dos por enchentes de rios subterriineos, ou mesmo pela agua de gotejamento. Desta mancira, constitu- em rochas sedimentares de origem quimica precipitadas a partir da agua subterrinea, Formas do relevo carstico A caractetistica principal de superficies carsticas € a substituicio da rede de drenagem fluvial, com seus vales e canais organizados por bacias de dre- nagem centripeta, que & primeira vista formam um quadro de drenagem caético. Essas bacias condu- zem a agua superficial para sumidouros, que conectam a superficie com a drenagem subterrinea (ig. 7.17). Quanto mais desenvol- vido © sistema cérstico, maior sua permeabilidade secundaria, o que aumenta © niimero de sumidouros € respectivas bacias de drena- gem centripeta. Isto, por sua vez, condiciona um forte in- cremento no volume de infiltragio diminuigio no volume de Agua do escoa- mento superficial. Associadas as drenagens centripetas, desenvolvem-se dolinas, que representam uma das feigdes de relevo mais freqiientes e tipicas de paisagens cérsticas, com ta- manhos que variam entre uma banheira e um estidio de futebol. Dolinas sto de- presses cOnicas, circulares nna superficie, lembrando a forma de um funil. Dolinas de dissolugio formam-se com a dissolucio a partir de um ponto de infiltragao na Dissolugto do caleério ao longo dos ratures e inicio da depressao Dolina de subsidéncia lenta Fig. 7.18 Evolugdo esquemética de dolinas de colapso e de subsidéncie lento, superficie da rocha (zona de cruzamento de fraturas). Crescem em profundidade e diimetro, conforme a rocha e o material residual so levados pela gua sub- terrinea (Fig. 7.18). Dolinas de colapso (Fig, 7.18) sio aquelas geradas a partir do colapso da superficie de- vido a0 abatimento do teto de cavernas ou outras cavidades em profundidade. No primeito tipo de Adepressio ‘6 ampliada com ‘adissolugéo ao longo das frotures contigo nivel ddgua’ fori to es beret Tw Ct Ki) (© abatimento de blocos tinge o supericie Dolina de colapso dolina a subsidéncia do terreno é lenta, enquanto no segundo, é ripida, freqiientemente dando acesso a ca- vernas. Um dos processos que desengatilha o abatimento de cavidades em profundidade € a perda da sustentagio que a agua subterriinea exerce sobre as paredes desses vazios, pelo rebaixamento do nivel freético e exposigio das cavidades na zona vadosa. Outra feigio diagnés- tica do carste sio os vales cegos com iios que parecem em sumidouros junto a anfiteatros rocho- es. Os vales cegos mais expres epentinamente desa- sos ou depres sivos ocorrem quando a superficie carstica é re baixada em relagdo aos terrenos nao carbonati cos, onde os rios correm em direco 20s carbona- tos € os sumidouros marcam a zona de con tato entre as rochas (Fig, 717). Vales carsticos ou Fig. 7.19 Vale cérstico associado & caverna Lapa dos Brej6es. No lado esquerdo do vale avisto-se de abatimento sio for- 9 pértico de entrada da caverna com 106 m de altura. Municipio de Morro do Chapéu, Chapada mados quando galeria de cavernas sofrem aba- timento, freqiientemente expondo tios subterrineos, e geram depressdes alongadas com vertentes verticalizadas. Apesar do produto final ser pareci do com vales fluviais, este no pode ser classificado como tal, pois sua origem nao é devida ao entalhamento de um canal fluvial (Fig. 7.19). Areas de rochas carbonaticas expostas quase sem- pre exibem um padrio de sulcos com ptofundidades de milimétricas a métricas, as vezes com liminas proeminentes entre os sulcos. Sio os lapis ou caneluras de dissolucio. Formam-se ini cialmente pela dissolugio da rocha na interface solo - rocha e apés a erosio do solo continuam seu de- senvolvimento pelo escorrimento da precipitacio diretamente sobre rocha (Fig, 7.20) Entre as formas mais notiveis do relevo cirstico, citam-se ainda os cones carsticos. Constituem morros de vertentes fortemente inclinadas ¢ pare des rochosas, representando mortos testemunhos que resistiram 4 dissolugio. Sio tipicos de areas carbonaticas com relevo acidentado. Distribuem- se na forma de divisores de agua contornando bacias de drenagem centripeta. Freqiientemente abri- gam trechos de antigos sistemas de cavernas em diferentes niveis (Fig. 7. Diamontina, BA. Foto: Ivo Karmann, Fig. 7.20 Alloramento calcério entalhado por caneluras de dissolugéo (lapiés) no regio da caverna do Podre, Tocantins. Foto: Adriano Gambarini Fig. 7.21 (a) Cones cArsticos, regiéo do vale do rio Betari, Iporanga, SP; (b) regio de Piar del Rio, Cuba. Fotos: ve Korman, Carste no Brasil Cerca de 5 a 7% do territério brasileiro € ocu- pado por carste carbonatico, constituindo um importante componente nas paisagens do Brasil. A maior area de rochas carboniticas corresponde aos Grupos Bambui e Una, do Neoproterozdico. O primeiro cobre porgdes do noroeste de Minas Gerais, leste de Gois, sudeste de Tocantins ¢ oeste da Bahia. O segundo ocorre na regio central da Bahia. Predominam calcitios ¢ dolomitos pouco deformados ¢ drenagens de bai xo gradiente, com relevos suaves € vastas depress com dolinas de abatimento ¢ vales cirsticos. Mui- tas cavernas sio conhecidas nessas areas, incluindo a mais extensa do Pais, como a Toca da Boa Vista (municipio de Campo Formoso, BA), uma caverna com padrao labirintico € cerca de 80 km de galeri- ‘as mapeadas. Além de cavetnas € vistosas paisagens, abrigam também importantes aqiiiferos, ainda pou co explorados para abastecimento de gua. Grande parte da regio metropolitana de Belo Horizonte, por exemplo, é abastecida com agua subterrinea ptoveniente do carste. 138 DeciFRANDO A TERRA Nos Estados de Sao Paulo € Parana, os tetrenos _ grandes lagos subterraineos. Atividades de explora- cirsticos concentram-se sobre caledrios _¢o subaqustica tém revelado passagens com 50 m metamorfizados ¢ dobrados do Grupo Agungui, com _ de largura e profundidades de 150 m, evidencian- relevo acidentado ¢ zonas de carste poligonal, domi- do cavernas em processo de submersio devido nado por bacias de drenagem centripeta e vistosos _subsidéncia tecténica da regio. cones cérsticos. Os sistemas de cavernas, atingindo até 8km de desenvolvimento, caracterizam-se por abrigar ‘os maiores desniveis subterrineos do pais, como as Leituras recomendadas cavernas Casa de Pedra, com 350 m, ¢ o Abismo do FEITOSA, F. A. Ce MANOEL Fo, J. coord) Jovenal, com 250 m, localizadas no alto vale do tio Hideinhets — tomeinye seeded Ribeira, sul de Séo Paulo. CPRM e LABHID.UFPE, 1997, No Oeste do Brasil, importantes sistemas FREEZE, A. & CHERRY, J. A. Gronndvater: cirsticos encontram-se nos calearios e dolomitos Biseigbel, clliteana ken: Lo, do Grupo Corumba, MS ¢ Grupo Araras, MT. No tees setor leste da serra da Bodoquena e regiio do mu- GILLIESON, D. Caves: Processes, Development, nicipio de Bonito, MS, ocorrem cavernas com ‘Management. Oxford: Blackwell, 1996, 7.1 “Buraco” de Cajamar: acidente geolégico no carste Em agosto de 1986, a populacdo de Cajamar (SP) assistiu ao epis6dio repentino da formacio de uma cratera com cerca de 10m de didmetro e profundidade. Destruindo o quintal de uma casa, a formagio do buraco foi antecedida por ruidos descritos como explosdes ou trovoadas longinquas. A partir deste dia, o buraco conti- ‘nuou a crescer, atingindo 29m de diémetro e 18m de profundidade em um més, consumindo quatro sobrados (figura 7.22) ¢ formando trincas em construgdes num raio de 400m. Apés seis meses, o buraco estabilizou com 32m de diimetro e profundidade constante de 13m, A populagio local, sem saber, estava sentindo a predisposi¢ao a0 colapso com muita antecedéncia observando deformacées em pisos, surgimento de racha- duras em paredes, rompimento de tubulagdes da rede de fornecimento de agua e a ocorréncia de ruidos, No dia do colapso, gedlogos em visita ao local levantaram a hipétese do abatimento de uma caverna abaixo da Cidade, pois esta se encontra sobre caleirios. Estudos posteriores realizados por gedlogos do Instituto de Pesquisas ‘Tecnolégicas de Sto Paulo, mostraram tratar-se de uma dolina desenvolvida no manto intempérico que cobre as rochas carboniticas, devido ao colapso de cavidades profundas na rocha, O rebaixamento do nivel freético abaixo dda zona de cavidades foi a causa do co- Japso destas, Atribuiu-seo rebaixamento do nivel d’igua & somatéria dos efeitos da época de estiagem e da extracio de gua por posos da regio, Este acidente geoldgico causou muita polémica na época, pois foi a primeira dolina de colapso no Brasil que afetou uma zona urbana densamente ocupada, Apés sua estabilizagio, a area da dolina de Cajamar foi transforma- da em praca piblica. Fendmeno semelhante aconteceu em seguida na zona urbana de Sete Lagoas, MG. Alias, Sete Lagoas deriva seu nome de sete dolinas com lagos. A forma- cio de dolinas representa um 4 fendmeno de risco geol6gico que Fig. 7.22 Sivacde estobilzada da dolina de Cojomor em 7/1/87; com deve set considerado no plancjamen- afloramento do nivel d’agua no fundo, No inicio do colopso em 12/8/86, 609. to do uso e ocupacio do. solo em de estiagem, ndo oflorava dgua tetrenos carbonaticos.

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