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Breve Introdução

Este livro está escrito em português antigo…..


Pensei que a Inquisição já tivesse acabado, mas quando
cheguei ao Brasil isso não era verdade!
Nunca pensei que houvessem tantos carrascos nesta área natural;
alguma classe da medicina exige que a Homeopatia seja
exclusividade médica não permitindo assim os homeopatas populares
e outros graduados conceituados exercerem. Fazendo perseguições
até conseguirem difamar e humilhar publicamente através da
imprensa, que infelizmente eles a manipulam. Qual a lógica desta
atitude inquisidora???
A Homeopatia sempre foi utilizada pelo povo e numa
pertenceu a uma matéria do curso de medicina, pois se assim o fosse
à mais de 200 anos que faria parte desta tão nobre escola. Por
exemplo a Cardiologia é uma especialidade médica que sempre
pertenceu à medicina, e o povo nunca a utilizou, pois não lhe
pertencia. Então porquê tirar algo que sempre pertenceu ao povo?
A Homeopatia nada tem a ver com o que se aprende na Escola
de Medicina. Ora se tivesse alguma coisa a ver já tinha sido posta ao
pé das especialidades médicas; mas o título de especialista de
homeopata para médicos (curso de 2 anos) é dado à parte por
associações e nem é reconhecida pelo MEC. Então como podem
estes senhores feudais tentar controlar uma área totalmente oposta ao
seu pensamento?
Na Europa e em quase todos os países do mundo isto não
acontece, pois existem cursos de graduação em Homeopatia.
Nunca nenhum homeopata graduado (com formação superior,
sem ser médico) se fez passar por médico ou quis fazer medicina.

J.N
Luís da Silva Morgado, o “Homeopata”, nascera em Bracara em 1945,
de uma das famílias mais nobres do Norte do país que tinham vindo
para Lisabona, pois seu pai chateara-se e teve que partir deixando
assim aquela bela cidade, os seus amigos e a sua fortuna. Com nove
anos de idade, vem com a sua família, seu pai era Homeopata e poeta
nas horas vagas. Era um boêmio e namoradeiro. Em 1932, quando
exercia Homeopatia em Valadares, é preso, juntamente com a mãe por
prática ilegal da medicina, foi acusado de curandeiro e bruxo. Ora
perdoem-me tais ignorâncias, pois ele se formou em Inglaterra com
distinção perante os outros colegas, tirou o curso de graduação em
Homeopatia, especializou-se em Homeopatia Clínica e mais tarde
doutorou-se tendo trabalhado em Hospitais, então seria ele um
curandeiro só por exercer uma terapêutica da medicina Natural? Pois é
amigos estes país comandado por alguns coronéis da classe médica,
fazia perseguições a quem não era médico e exercia a Homeopatia.
Não se entende tamanha estupidez, pois a Homeopatia em alguns
países é curso de graduação e livre. À medida que a Homeopatia se ia
desenvolvendo, iam-se criando cursos de graduação para quem
quisesse ser homeopata, e pós-graduação e doutoramentos para
médicos e outros profissionais de saúde. Isto foi acordado, pois tal
técnica natural nada tinha a ver com a prática de medicina. Assim
formaram-se Associações credíveis, Conselhos Federativos e
Conselhos Europeus e Internacionais de Homeopatia Clássica que
protegem todos estes profissionais até hoje desamparados e
perseguidos por estes inquisidores que fazem reviver a triste história da
humanidade. Foram aparecendo as primeiras Escolas Superiores em
Portugal e nasceram outras técnicas naturais. Salvai o vosso homeopata
popular das garras destes médicos homeopatas, salvai-me destes
inquisidores que matam com autorização e ninguém lhes faz nada. Só
vocês amigos que se encontram na plateia sabem o bem que vos fiz e
sempre tratei muita gente necessitada.
1º ACTO
PERSONAGENS:

João Xavier da Ribeira


Médico Homeopata pregador da Associação
Luís da Silva Morgado
Mulher do homeopata popular
Amiga Irene
Bortolini – médico homeopata (FDP)
1º inquisidor – António Sénior
2º Inquisidor – Maria Adelaide
Justiça cega
Membro da associação I
Membro da associação II
António Fagundes – proclamador das sentenças
Mulher homeopata popular
Estudante de Homeopatia
Dr. João Labareda
Emilia Sarmento
Homeopata popular II
Espectadores (médicos homeopatas)
Maria Adelaide
Brigite Silva
João da Silva Morgado
Em todo o seu comprimento visível, no fundo e nos lados, o
tribunal está forrado por uma parede negra revestida por ódio e ironia
das classes que a representam. Desenhado à sua volta com símbolos
próprios de uma mãe inquisidora e manipuladora da cegueira nacional
e corrupta. Este fortemente iluminado tem pintado caveiras e até o
próprio diabo, e uma figura do tribunal da inquisição. No centro uma
mesa de pedra de altar e sobre ela algumas peças barrocas em ouro e
com velas acesas.
À direita e à esquerda da mesa, um pouco mais avançado dos
espectadores, duas cadeiras enormes que percorrem toda a mesa em
frente aos bancos onde a população ia assistir ao massacre.

Durante algum tempo, com a sala vazia ouve-se: “é favor


sentarem-se e não fazerem barulho. Sentem-se lacaios”. Ouvem-se os
sinos e crianças e mulheres a cantar. Parece que vamos assistir a um
circo manipulado pelos inquisidores.
De repente acende-se uma luz e a sala enche-se de pessoas, entra
o médico homeopata pregador.

Médico Homeopata pregador da Associação

(dirigindo-se aos espectadores do massacre, que nesta cena


funcionam como assistentes da acusação) ai senhores, meus muito
amados espectadores deste tribunal bem ditos sejais vós! Ai amigos
herdeiros desta justiça útil para prejudicar quem não tem dinheiro,
vinde até mim e vejam quem nós vamos aqui nesta santa casa julgar!
Pior que tudo é ser curandeiro e tentar enganar as pessoas com as suas
falsas curas, eu sei amigos meus eu sei: isto são pecados da fraqueza
humana, são aproveitamentos da vossa ignorância. Por causa disto
tenho tido menos pacientes e eu não quero repartir a minha clientela
com ninguém. E quem disse que a Homeopatia é para outros
profissionais!!! A Europa e o resto do mundo estão enganados, nós
estamos certos a Homeopatia é especialidade médica. Nós estamos
aqui para impor e não para brincar amigos. E o povo que se lixe, pois a
Homeopatia é nossa, desde 1980 que descobrimos outra mina de ouro
para nós, eheheheeh. E esse Homeopata popular deve ser julgado por
não ser médico.
Voz de um associado

(entre os espectadores) à prisão, fora os homeopatas populares! À


fogueira!

Médico homeopata pregador da Associação

(impondo silencio na plateia) homeopatas populares? Quem são


esses sujeitos sem formação médica? Falam eles do resto do mundo
onde a Homeopatia é curso de graduação!!! Que sabem eles? Prendei
tais indesejados senhores (com ódio ateado aos olhos). Temos que
varrê-los do nosso caminho, Amigos ajudai-nos!!!
Os homeopatas populares – eles são praga, neste infeliz reino!
Ficam com a nossa clientela, não cobram consultas e tratam os
pacientes. Por isto estou aqui neste tribunal inquisidor para julgar tais
infiéis. Acudi-nos senhores deputados e espectadores, salvai-nos deste
mal que nos percorre.

Dr. João Labareda (Homeopata Europeu graduado)

Senhores porque não me ouvides vós? Pesquisem no resto do


mundo. Só aqui neste país a Homeopatia é especialidade médica, mas
no resto do mundo é curso de graduação e até curso livre. Porque
quereis vós ficar com tal área que não vos pertence? Acordaram agora?
Ela sempre foi feita pelo povo, pois se não como resistiria até agora?
Vós sois pior que a Santa sé! Vós sois a nova Inquisição! Sois rudes!
Porque querem ser diferentes do resto do mundo? Cheira a dinheiro
não é? Não podem já repartir com os outros o vosso dinheiro. A
Homeopatia é uma ciência natural e Hahnemann era médico, mas
frustrado com a medicina da época seguiu outro caminho. Nem o
fundador desta terapia natural disse que a Homeopatia seria só para os
médicos. Aprendeis com a Europa e com o resto do mundo, não
quereis ser diferentes dos outros, por isso estais na miséria amigos.
Porquê um julgamento assim? Vós sois burros porque toda esta
Doutrina difere da escola que vocês tiveram. Mas viva o dinheiro e as
perseguições. Não nos queimem Senhor!!! E quem ajuda os
desgraçados do interior onde não há médicos de nenhuma
especialidade???? Vão proibir toda a gente de fazer as suas curas?
Então senhores quem tratará a população carente, vós? Duvido! Vós
trabalhais nas grandes cidades e não permitem concorrência. E ainda
mais não aceitam nenhum homeopata graduado de outro país não
sendo médico, que ridículo!!! Pois vós podeis trabalhar em qualquer
parte do mundo. (alguém da platéia diz) calem esse infame, deixai falar
o profissional.

Médico homeopata pregador

(reagiu rapidamente à revolta do Dr João Labareda


colericamente, dando uns olhares de cascavel irritada, retoma o sermão
com ironia e ódio). É verdade que na Europa é assim eu sei, mas eles
não têm razão, eles não sabem que a Homeopatia é uma especialidade
médica, só nós detemos a verdade e quem duvidar será perseguido e
até..... Não esqueceis nunca meus irmãos que quem manda aqui somos
nós e ai de alguém que se atravesse no nosso caminho! Descerão do
fogo da santa Inquisição para o fogo eterno do Inferno! Quem protege
estes culpados? Quem permite tal situação?
Não vos esqueceis que vós não sabeis nada de Homeopatia, não
o esqueçais nunca, meus irmãos! (Fúria desencadeada:) porque vós
nada sabeis de anatomia, fisiologia e outras matérias médicas –
hereges, relapsos, apóstatas, costumazes negativos – descerão do fogo
da Santa Inquisição para o fogo eterno do Inferno (Luís da Silva
Morgado, homeopata popular range os dentes e chora um pouco, os
espectadores gritam de raiva. O pregador silencia-os de súbito). O
Santo Tribunal da Santa Inquisição! Cárcere, potro, polé, excomunhão,
confisco de bens materiais....À fogueira! Eis os remédios benditos da
sua panaceia salvadora: ai, irmãos, quantas almas terão sido limpas da
lepra herética com esta santa botica? Quantas terão sido salvas para a
eternidade?!.... Como a madre amantíssima embala em seus braços o
filhinho doente, com ele sofrendo o destempero das febres ruins, com
ele saboreando o azedo das ervas curandeiras, assim a Santa Inquisição
embala os míseros hereges; assim, com desvelado zelo na esperança
curtido, lhes trata da saúde da alma!
(Para os réus, em rasgo de oratória teatral:) Olhai, hereges e
desquitados, pesai bem os vossos corações da vossa triste figura!
Honra, graças e louvor aos vossos inquisidores e seus nobres
familiares! Honra, graças e redobrado louvor ao nosso excelentíssimo
presidente desta associação de Homeopatia, o senhor Bortolini (Vénia
mais profunda e demorada, dirigida aos senhores inquisidores da
associação de Homeopatia. Este limita-se a agradecer com um leve frio
baixar da cabeça, a expressão facial sempre inalterável. O Médico
homeopata pregador pingarreia e continua o sermão, dirigindo-se mais
uma vez ao réu:) e vós mereceis ser acusado por prática ilegal da
medicina, pois não sois médico e exercestes uma especialidade nossa!
Ai, irmãos salvai o nosso tribunal destes hereges, viva a justiça cega
que só nós conseguimos manipular (vénia profunda. A justiça cega
surge agora iluminada, tal como os dois membros da associação que
lhe servem de comitiva. Ao pretender corresponder ao cumprimento do
médico homeopata pregador, D. Geribaldo pai, nesta idade já bastante
obeso, sofre um ataque de caspa aguda, de maneira que a sua peruca
ridícula se desprende do couro cabeludo, e cai no chão, a rica peruca
que o ornamentava, olhando para a sua face parecia um verdadeiro
macaquito, até custa a acreditar que tenha desenvolvido um programa
para esta área!!! Enquanto dura esta triste cena, o médico homeopata
pregador suspende o seu discurso: aguarda olhando para o D.
Geribaldo, este apanha a peruca e muito atrapalhado põe outra vez na
sua cabeça. assim continua o discurso:) é por direito nosso julgar estes
infiéis e falsos homeopatas que nos roubam os clientes, permiti, irmãos
muito amados que o faça. (nesta altura, D. Geribaldo tem um ataque de
tosse. O médico homeopata pregador interrompe mais uma vez a sua
fala. O membro da associação I apressa-se em acudir a sua excelência,
batendo-lhe nas costas. Nisto o Homeopata Europeu graduado
interrompe).

Dr. João Labareda (Homeopata Europeu graduado)

Senhores em toda a minha vida só ouvi e vi na televisão médicos


acusados de mortes e nunca ouvi queixa de um homeopata popular que
tivesse morto alguém. E, aliás, senhores quem tem culpa deste país
estar tão mal organizado na área natural? são estes médicos de meia
tigela, que só se preocupam com eles, que só se preocupam em
perseguir os outros profissionais e não se olham ao espelho e vêem o
que alguns fazem de mal, a negligência médica que existe no país!!!!
Se deixassem os terapeutas naturistas trabalhar à vontade era melhor,
se deixassem que existisse um curso de graduação nesta área, tudo era
melhor, esta guerra acabaria, mas eu compreendo, vossas excelências
não quereis ficar com concorrência!!!!
Salvai este nosso colega por não ser médico e ter vindo parar a
um país errado, será julgado!

Alguém da plateia

Calai a boca infame! Quem sois vós para vir aqui defender esse
terapeuta sem formação médica?

Médico homeopata pregador da associação

Viva a associação Inquisidora! Cortemos o mal pela raiz.


Alguém da plateia rindo

Acabem com esta palhaçada amigos, não ligueis a esse


imbecil, acabem com isto depressa!!!

(O Bortolini médico homeopata está de pé: muito direito, rígido


como diria a MM com um olhar de Platina! Impressionante tal olhar
devastador)

Médico pregador

Glória a este santo tribunal nacional que resolve todos os


problemas que nós queremos! Ainda bem que o controlamos.

Plateia analfabeta e manipulada

Glória à justiça cega e viva D. Geribaldo pai!


(D. Geribaldo pai levanta-se com um ar de arrogância e
superioridade: passeando os olhos pela multidão ingénua e má.
Do fundo de cena destacam-se três inquisidores e António
Fagundes – proclamador das sentenças: este último sobe ao palco para
proclamar as sentenças: o primeiro dos inquisidores vai colocar-se de
pé, de face para o público, sobre os degraus do palco: abre o livro na
página onde continha a lei de reconhecimento da Homeopatia como
especialidade médica, em plano um pouco superior ao deste, também
sobre a escada do palco: tanto um como o outro seguram duas velas
acesas).

“No Brasil, a Homeopatia definitivamente é uma


especialidade médica reconhecida em 1980 pela resolução nº 1000
do Conselho Federal de medicina e, portanto só pode ser praticada
por profissionais que disponham de Diploma Universitário de
Médico expedido por Escolas Médicas Brasileiras ou de outros
países contando que cumpridas as exigências legais de
reconhecimento. Portanto tratando-se de prática ética, qualquer
pessoa que não disponha de diploma de Médico, que pratique
Homeopatia estará agindo de maneira ilegal”.
António Fagundes – proclamador das sentenças

Homeopata popular acusado II, residente em Viamão com


quarenta e dois anos de idade (o acusado sai da fila dos réus e vai
ajoelhar-se no centro da cena, assim escutando a sentença; acompanha-
o o juiz inquisidor que se mantém de pé, um passo atrás), dou por
aberta a sessão de punição e provas contra este senhor que exerceu a
Homeopatia em nome do povo. Todos na tribuna esperam que o réu se
defenda. Os deputados e os inquisidores acordam para começar a deter
a sentença, uns arrotam, outros peidam-se. (O penitente ergue-se, vai
ajoelhar-se aos pés do Inquisidor beijando-o e dizendo: Senhor não me
castigueis, eu juro que não volto a fazer Homeopatia popular, eu deixo
o povo das colónias ficar sem saúde, e como eles vão poder esperar por
vocês, quando vossas excelências lá chegarem já toda a gente se
evaporou!!!).

António Fagundes – proclamador das sentenças

Dr. João Labareda (Homeopata Europeu graduado), homeopata


com alguma experiência clínica, com trinta e dois anos de idade, veio
para o Brasil pensando que iria atracar numa viagem maravilhosa e
saiu-lhe o tiro pela culatra, pois entrou numa verdadeira selva urbana
onde os médicos faziam o que queriam..... Parecia um faroeste futurista
(o réu, sempre amordaçado das palavras, não se move; o “familiar” e o
inquisidor dele encarregados, um de cada lado tomam-no pelo braço, e,
discretamente, forçam-no a ir ao centro do palco; isto feito retrocedem
o passo que o ritual exige; Labareda não se ajoelha, pois se se quisesse
peidar seria uma catástrofe, antes toma uma postura arrogante de
desafio e rebeldia contra estes ignorantes e racistas em relação ao resto
do mundo). Espero de vossas excelências todas as provas que tendes
contra este lacaio para poder iniciar e acabar logo o julgamento e ir
para casa jantar. Já estamos a perder muito tempo com esta situação.
Acordam os inquisidores, ordinários e deputados, em pedir ao
senhor proclamador de sentenças, com muita eficácia e insistência, se
haja com o condenado maligna e impiedosamente na sua pena.
(Labareda volta-se de face para a platéia, num movimento rápido: a
cabeça orgulhosamente levantada, os olhos tristes e desiludido com os
seus ditos colegas irmãos. Na sala da Inquisição toda a gente esperava
a fogueira para o infiel. O proclamador das sentenças e o “familiar”
aproximam-se tentando, de acordo com o triste ritual, acompanha-lo
até junto do D. Geribaldo pai, para que comece a leitura do
julgamento: Labareda afasta-os, brusco, rígido. Destacam-se mais dois
médicos homeopatas da associação que, juntamente com o réu, o
levam de arrasto até ao altar, forçando-o a ajoelhar-se diante do
proclamador das sentenças: João Labareda, a cabeça voltada para baixo
e para o lado, cerra com força os dentes, recusando-se a ouvir tal
infâmia a seu respeito. Os amigos da associação de Homeopatia
médica, com raiva mal contida, acabam por levantá-lo. Labareda
sacode as mãos que o prendem e dirige-se sozinho, tipo marionete,
para o seu lugar entre os réus).

Voz de uma médica homeopata

(vinda da plateia; com ar de arrogância comendo pipocas.) eh


homeopata popular maldito! Eh, tu que és nosso concorrente, vai-te
embora para o teu país!

Voz de um médico homeopata

(Na plateia, na primeira fila) eh, homeopata não médico! Anda,


vais pagar por prática ilegal de medicina, curandeiro, logo na fogueira
hás-de bailar!

Outra voz de um médico homeopata

(Gargalhada cruel) hoje vai-se acender uma nova fogueira para ti


infiel. Nem as caravelas te salvam!

Voz de alguém da plateia

Quem te manda a ti exercer uma especialidade que é médica? No


teu país estavas bem, porque vieste para aqui tentar mudar esta selva
urbana, controlada por chulos (cafetões) e corruptos? (risos.) aqui se
tens poder podes fazer de tudo, mas como tu és da plebe vais pagar por
todos os que se safam.

Outra voz de um médico homeopata

Que arda a noite toda para fazermos um bom churrasquito de ti,


porco sujo! (gargalhadas da plateia assistente).
António Fagundes – proclamador das sentenças

(volta-se para a assistência, com uma cara pouco convincente de


desaprovação e pede silêncio com um gesto arrogante. Com o seu ar
irónico continua a proclamar sentenças). Emília Sarmento, mais
conhecida como a mulher do grande jumento, homeopata popular,
professora de cursos de extensão, do estado de Minas Gerais com trinta
e cinco anos (a acusada sai da fila dos réus), foi provado que esta
senhora além de promover cursos para infiéis exercia Homeopatia
popular sem ter autorização deste Santo Tribunal. Será juntamente com
os outros julgada e queimada.

Voz de uma mulher arrogante

Este julgamento parece uma sopa de letras, foram


apanhando letra por letra até fazerem esta sopa inquisitorial.

Voz de uma mulher

(na plateia) queimem esses malditos, esses homeopatas


populares, esses homeopatas europeus graduados. Onde já se viu a
Homeopatia ser um curso de graduação!

António Fagundes – proclamador das sentenças

(impondo respeito) provou-se que vossas excelências


prescreviam remédios homeopáticos sem serem médicos, embora não
haja uma proibição de prescrição por não médicos, pois estes remédios
não exigem receita médica, não importa! Quiseram tratar o povo
diagnosticando! Dizem que são graduados, tudo bem, mas aqui no
Brasil é especialidade médica, portanto vão ser condenados. Todo o
remédio homeopático mal prescrito pode causar danos.

Outra mulher na plateia

(na assistência) só de ver esses dois indesejáveis dá-me vómitos


e agonia. Já não bastou enquanto colonizadores e ainda vêm aqui dizer
que o Brasil é diferente do resto do mundo em relação à Homeopatia;
viva a independência! É uma perdição, à fogueira com eles!
António Fagundes – proclamador das sentenças

Acordam os inquisidores, ordinários e deputados da santa


Inquisição; neste momento vou proclamar as penas para estes dois
enfermos: pagamento de multa de mil reais e serão deportados para o
vosso país. Safai-vos da fogueira, pois não fostes apanhados em
flagrante. Foram julgados como sendo curandeiro e bruxa.

Voz de um Homem

(risada irónica), porrada neles, não os deixem ir embora


sem levarem uma boa coça!

Outro homem contra o acto

Onde já se viu virem para aqui tentar mudar este país crivado de
injustiças, este país onde a classe médica comanda a saúde e não deixa
nada ir em frente na área natural. Sei que na Europa a Homeopatia e a
Naturopatia são cursos superiores respeitados, a área natural está bem
difundida e até existem hospitais onde esses profissionais podem
trabalhar, mas aqui amigos não têm valor, isto porque a educação é só
para uns. Não vale a pena mudar este país comandado por imbecis
(pela oposição claro!)

António Fagundes – proclamador das sentenças

Carcaça imunda, na própria podridão do teu corpo irás


desaparecer, ficando os teus restos boiando nos esgotos imundos da
cidade....Boiarás nas ruas da amargura, sem lei nem rei, sem ninguém
para atenderes com as tuas bruxarias e feitiços, fez-se justiça! Que
pena não seres largado da prancha para tubarões comerem tal carne
imunda e viciada.

Voz de uma mulher revoltada

Justiça a sério seja feita, quanto vos pagai ele senhores para
merecer pena tão pequena? Corruptos! Com o que ele fez era para o
queimadeiro. Justiça seja feita, senhores ouvi-me, que se passa aqui
nesta santa casa?
(o proclamador de justiças, com um gesto pesado impõe silêncio.
Emília Sarmento, cada vez mais assustada, está agora a gaguejar e a
tremer pela pena que será aplicada. Levanta-se e dirige-se para o seu
lugar entre os réus: a meio caminho tropeça na peruca de D. Geribaldo
pai e cai de joelhos, mais um bocado e tinha que....o público aplaude,
fica louco atiram-se para o chão com enormes risadas; o acusador que
a acompanhava nos seus movimentos, não fosse lá esta vadia fugir,
ajudando-a a levantar-se e obriga-a a ficar voltada para a mesa das
acusações.)
Alguém da plateia rindo

Glória à sua excelência o inquisidor geral!


(O Bortolini está de pé: erecto, rígido, quase parecia uma tábua; está
impressionado com a plateia, pois pensava que não tinha apoio deles).

Plateia remunerada

Glória à sua majestade D. Geribaldo pai.


(D. Geribaldo levanta-se: senhorial, cacique, coronel; passa os
olhos lentamente pela multidão que o apoia.
Recomeçam os cânticos de alegria e folia da população que
amava este tipo de espectáculo, geralmente eram comemorados com
umas cervejas, uma música bem pimba (MPB) e um churrasquito,
depois ainda se jogava um futebol. Os condenados antes de morrer
participavam desta festa maravilhosa patrocinada por estes indesejáveis
senhores com mentalidade medieval.

Dr. João Labareda (Homeopata graduado Europeu)

(dirige-se especialmente ao D. Geribaldo pai): Vossa excelência


antes de pertencer à sua famosa associação inquisidora e ser presidente
tirou uns cursos básicos de Homeopatia com homeopatas populares, e
agora vejo-o aqui a dizer barbaridades a este santo tribunal manipulado
por vossa excelência. Que tipo de pessoa vossa excelência é?

Povo contente e bêbado

(D. Geribaldo pai faz um olhar tenebroso para quem o rodeia,


próprio da sua pessoa.)
Recomeçam as badaladas de um sino artificial implementado à
pressa no próprio tribunal para realçar melhor uma época bem
esquecida, a inquisição. De repente, começa o cântico das sentenças, a
letra era mais ou menos assim:
Vós ides morrer
Neste Santo Tribunal
Não vais esquecer
Este dia Infernal

Homeopata popular
Exercias na ilegalidade
À que bem que vais pagar
Para toda a eternidade.

Uma rima feita à pressa, como dizia um poeta português, uma


rima feita à martelada.

António Fagundes – proclamador das sentenças

(Continuando a dizer baboseiras) Armanda Serinho, homeopata


popular com 50 anos de idade, viúva, natural de Lisabona e moradora
neste estado de Mato Grosso (MT) Cuiabá.
(Armanda destaca-se entre os acusados, pois vai responder por
mais crimes – atendia mais de 20 pessoas por dia sem cobrar nada, mas
o pior era que exercia Homeopatia sem ser médica). Muito frágil,
pálida e muito envelhecida para a idade, a cabeça inclinada e os olhos
com pesar e tristeza. Foi condenada a três anos de prisão e uma multa
de dois mil reais (o povo grita de euforia raivosa).

António Fagundes – proclamador das sentenças

Luís da Silva Morgado “O Homeopata Popular” o mais


conhecido do Brasil pelas suas curas milagrosas e por não cobrar nada
ao povo carente. Filho de Brigite Silva Morgado e de João da Rosa
Morgado, estudante de Homeopatia em Londres, natural de Lisabona,
morador em Porto alegre – RS. (acompanhado pelo inquisidor, o
Homeopata popular extremamente abatido arrasta-se até ao centro, de
joelhos escuta a sua sentença. Irá ser julgado por prática ilegal de
Homeopatia.
Voz de Homem na plateia

(Vindo da plateia, com uma raiva desenfreada) eh, animal! Que


sabes tu de medicina? Lês livros para curiosos e já te julgas
Homeopata? (enfurecido, reage com desprezo virando a cabeça).
(Neste julgamento manipulado e assistido por analfabetos, nota-
se a total ignorância e desconhecimento da importância do réu perante
a população carente. Nem procuraram saber a credibilidade e a
importância deste Homem no primeiro mundo).

António Fagundes – proclamador das sentenças

Que fazeis vós neste país? Vindes exercer Homeopatia sem ser
médico, porquê? Pensastes que mudarias a mentalidade desta classe de
médicos que roubou uma terapia popular por causa do dinheiro? Aqui é
especialidade médica! Ides em Liberdade condicional até ao próximo
julgamento (a cortina preta deste santo tribunal corre até ao final do
palco. Todos os acusadores e associados saem, mas a plateia
permanece esperando a entrada do proclamador de sentenças –
poderemos dizer que foi feito um “coffee break”, para depois começar
de novo a matança).

Proclamador das sentenças

(em off) a 15 de Setembro de 2001, Brigite Silva é presa nas


masmorras da Santa Sé. Brigite – não a bardot – fica aterrorizada com
a sua sentença. Imóvel, Luís da Silva Morgado afasta-se da sua mãe,
empurrado pelo inquisidor, com medo ousa olhar para ela....triste.

Mulher velha – uma caquética qualquer

(Toda esta plateia é constituída por ignorantes, uns autênticos


analfabetos comprados.) credo cruzes, que senhora miserável e nojenta,
sus, daqui para fora sua vadia imunda!
(Luís e sua mãe começam com a sua marcha, ele à frente com
medo e com vergonha, ela atrás... a chamada fila indiana da desgraça e
podridão).
Mulher nova loira

(com o seio de fora, aparece do lado oposto à velhota). Porcos,


merecem a sentença! Quem os mandou fazer Homeopatia sem serem
médicos? Os três filhos de Bortolini vão até aos condenados e puxam-
lhes as roupas, fazem caretas e atiram grampos de arame.

Proclamador das sentenças

A 16 de Agosto de 2001 Luís da Silva Morgado “O Homeopata


Popular” é preso pela primeira vez em Porto alegre pela ordem da
Santa Sé e de Bortolini.
(Todas as vezes que António Fagundes sobe para falar, o povo delira,
assobia, peita-se e arrota com canções de embalar, quase que não o
deixam falar de tanta euforia e balbúrdia que é este julgamento).

Dr. João Labareda (Homeopata Europeu graduado)

E vós como podeis julgar se nem existe lei que proíba a prática
de Homeopatia por não médicos????? Ela é especialidade médica, e
por isso ela só diz respeito aos profissionais que pertencerem ao
Conselho Federal de medicina, quem não pertence vossas excelências
nada podem fazer nada. Não existe nenhuma lei nacional. Aconteceu o
mesmo com a acupunctura caros amigos, quiseram açambarcá-la e não
conseguiram ficar com a exclusividade!!!

Voz do proclamador de sentenças

Neste dia foi nomeado outro Inquisidor para acompanhar o


julgamento, o médico homeopata Inquisidor II (Luís da Silva e Brigite
retomam a marcha, mas agora mais depressa, como se fugissem de
algo. Entram mulheres e homens novos na plateia, acaba o intervalo.
Estes populares juntam-se aos que não saíram para abastecer os seus
estômagos imundos).
Homem rude

(Chegando com uma chibata perto da face de Luís), vou cortar-te


esse pêlo, quem te manda ser curandeiro e desafiar a classe médica?
Afinal quem manda aqui? Agora pagarás pelos teus actos.

Mulher com rugas

(Com um archote e uma faca), onde já se viu estes dois imundos


exercerem Homeopatia sem serem médicos? À fogueira com eles. Rica
justiça que se faz neste reino limpar a sociedade desta peste. Filhos do
demónio. Como querem escapar-se à fogueira se andam a fazer cursos
de Homeopatia para curiosos? A Homeopatia é especialidade médica.

Luís da Silva Morgado

Senhores meus, para prescrever os remédios homeopáticos não


são precisas receitas médicas (não existe lei que restrinja isso, porque
será?). Se a Homeopatia só foi especialidade médica desde 1980 então
como ela sobreviveu até aos nossos dias?
Que fundamento tem este julgamento se não me intitulei
médico? Porque o CFM se preocupa com os profissionais fora da sua
área? Aliás, amigos meus não existe uma lei nacional que proíba algum
profissional não médico de exercer Homeopatia. Esta lei foi feita pelo
vosso Conselho e para os Profissionais do vosso Conselho. Um
Conselho não tem autoridade para fazer as leis que lhe apetece.
Qualquer dia também se lembram de dizer e escrever que o
Cabeleireiro é especialidade médica e depois fazem um curso de
especialidade em Cabeleireiro e o paciente vai ao clínico geral que
também tem a especialidade de cabeleireiro!!!
(Brigite Silva, triste e ferida emocionalmente, seus olhos cheios de
lágrimas; aproxima-se de seu filho abraçando-o e tentando convencê-lo
de que era inútil falar com pessoas tão ocas. Não adiantava nada.)
Desde 1991 que existem projectos nesta área e nada foi aprovado
porquê? Assim é mais fácil dizer que todos os terapeutas naturais são
um bando de curiosos e curandeiros que só tentam enganar. Que
mentalidade a vossa senhores governantes!!!!
Vós sois ordinários, não respeitam ninguém da sociedade onde
vivem, sois mesmo os novos inquisidores.
E porque nasceram as medicinas naturais? A medicina
convencional não dava resposta a certas doenças, então esta medicina
desenvolveu-se e foi criando seguidores, alguns honestos outros
charlatões, mas senhores isso existe em todas as áreas da saúde!!! Ela é
tão importante que no resto do mundo, primeiro desenvolveram-se
cursos livres e depois como a procura era tanta, desenvolveram-se
cursos superiores.
Senhores o vosso mal foi terem vindo ao povo e tirar algo que
lhes pertencia à gerações, não se faz isso amigos, ditadores!

Voz da Justiça Cega

Senhores sentai-vos e calai-vos! Hoje vamos fazer um breve


intervalo desta sessão inquisidora para vermos um joguito de futebol
importante. Depois disso vamos sambar, pois já que estamos em
Fevereiro temos que aproveitar. Só se vive uma vez. Existe alguma
coisa melhor do que isto? (passado uma semana este Santo tribunal
reúne-se outra vez. Os palhaços são sempre os mesmos. Entram os
médicos homeopatas das associações com expressão de inquisidores.
A sala de audiências enche; Brigite Silva e Luís da Silva seguem
em direcção à tribuna onde está sentado o nosso amigo Bortolini, um
Alagoense onde a sua cabeça chata dava para pôr três copos de cerveja
média. À sua direita estão os médicos Homeopatas de vários estados,
excepto do sul.)

Mulher Homeopata raivosa na plateia

(puxando a saia de Brigite com ira) maldita sejas tu que tratas


estes pobres sem cobrares um tostão! E quem paga o meu Audi A3, o
BMW ou a minha casa na praia e as minhas viagens? Sem terem cursos
superiores vêm aqui tentar tirar o nosso mercado, porquê? A
Homeopatia não está explicada cientificamente, mas não interessa, o
que importa é o dinheiro que nos dá.

Voz do proclamador de Sentenças

O proclamador de sentenças ainda traz a sua vestimenta de


carnaval, com um copo de cerveja na mão começa a falar...) Amigos
sentai-vos e vamos começar novamente a sessão, depois de um semana
de férias de folia temos que mostrar trabalho ao executivo. Não façam
como os líderes e os deputados do PFL que amuaram pelas notícias
que corriam, por isso faltaram todos na câmara para aprovar leis
importantes na saúde; enfim é assim a vida de político, muito difícil.
Por isso vós homeopatas médicos e plateia não falteis a este
maravilhoso julgamento, não sejais iguais a eles.
Justiça cega

(no palco, o povo fica em silêncio; imóveis e com uma expressão facial
raivosa. Luís da Silva Morgado escuta vozes vindas dos inquisidores e
dos cães assassinos). O Inquisidor interroga-o com ironia perguntando
quais os bens que ele possuía; este responde que nada tem, apenas a
roupa que o seu corpo transportava.

3º Homem

(cuspindo no rosto de Luís da Silva. Com uma voz raivosa diz:)


homeopata graduado, maldito sejais vós!
Os homeopatas populares têm cursos superiores? Não! Os
homeopatas populares são médicos? Não! Então porque existem eles?
Medicina só há uma.

Uma mulher raivosa

(esta mulher mal se podia sentar, teria ela hemorróidas? Penso que era
mulher do nosso amigo Bortolini de Merdeió. Luís e a sua mãe
recomeçam a marcha até ao queimadeiro: tão cansados quase se
arrastam).
Caminhem cães vadios. Vós soeis a vergonha da nossa classe que tanto
defende o povo. Esta classe que encaminha para o particular para poder
nadar em dinheiro!

Todos na plateia

(batendo os pés com um ritmo ameaçador) à fogueira! À fogueira!

Proclamador de sentenças

Averiguando os seus actos senhor infiel, vossa excelência prescrevia


remédios homeopáticos sem ser médico e fazia diagnóstico. Ora tais
actos são crime. Você veio para o país errado, veio para uma selva
urbana onde as leis não funcionam, onde a justiça é uma piada
mundial. E nós médicos homeopatas, especialmente o Dom Bortolini a
controlam. Por isso você não tem hipóteses. Não importa que vossa
excelência tenha feito muito trabalho comunitário e tenha ajudado
muitas populações do sul no interior; ainda bem que você não veio
para o Nordeste porque ai era logo caçado, não tinha julgamento e era
logo queimado.
António José da Silva

Eu só quero que vossa excelência me deixe partir. Fiquei desiludido,


pois pensei que a vossa classe fosse nobre e tivesse ética. Vós
manipulastes esta plateia fria e imunda com a representação da vossa
imagem; e digo outra vez, não existe nenhuma lei que me proíba de
receitar remédios homeopáticos. Essa lei, esta perseguição e este
julgamento foi inventado por vossas excelências!
E onde se situa a Associação Médica Homeopática Brasileira? No
Nordeste, logo onde se podia situar!!! Coronéis achatados.

João da Ribeira

Agora senhores espectadores vão conhecer o vosso amigo defensor da


Homeopatia como curso de graduação; encontra-se sentado ao pé dos
inquisidores (num plano intermediário entre o palco e a plateia); de um
modo geral fala num tom suave, um pouco desencantado e sempre à
beira da dita ironia....
(dirigindo-se directamente aos espectadores, apontando sem olhar para
o palco).
A mentalidade destes senhores pode comparar-se a um relógio atrasado
pela malícia e perversidade daqueles que tem o cargo de dar-lhe
corda... “Perdão, vossas senhorias, a vós vos devo apresentar”. (ergue-
se da cadeira com ar palaciano. João Xavier da Ribeira, já fora antes
expulso duas vezes deste país por prática ilegal de Homeopatia....
estava neste julgamento apenas como personagem exemplo dos
Homeopatas graduados do resto do mundo. Era um homeopata muito
respeitado em Portugal e na Europa).
“Senhores não posso deixar de voltar a lamentar a vossa opinião em
relação a este meu colega.....eu passei pela mesma situação e não vejo
ainda a lógica disto. Em todos os países podemos trabalhar porque aqui
não? Não entendo! Será este país assim tão diferente do resto do
mundo?
Não posso deixar de ver a sina deste triste colega homeopata não
médico, mas graduado e doutorado! (vindo do palco começa a ouvir-
se, cada vez mais nítido, um choro arrastado, agudo, quase infantil.
João da Ribeira corta esse choro, voltando-se para trás onde se
encontram os carrascos, mantém uma expressão de revolta e nojo: Luís
da Silva Morgado e a sua mãe estão visíveis para a plateia. Este
ambiente de pesar é-nos dado pela diminuição do foco de iluminação
apontado para ambos.
Dom João da Ribeira entra com uma voz irada e violenta): “é preciso
resgatar estes pobres terapeutas deste santo ofício. Será esta a salvação
deste país tão novo perto do mundo? Esta igualdade de direitos não
pode haver enquanto perdurar esta maldita inquisição nacional!
(enquanto João da Ribeira vai falando, a luz da cena vai diminuindo até
ao que antes era: iluminados apenas a amiga Irene e Luís da Silva
Morgado. As suas expressões de angústia e desespero são mantidas
durante todo este espectáculo.) “era afinal isto que vos queria dizer;
sou um exilado deste vosso país tão belo, mas governado por imbecis e
controlado por mesquinhos. Nunca mais poderei aqui voltar, maldita
Inquisição Homeopática! E maldito sejais vós Dom Bortolini
presidente desta associação! Duro, mais duro que o corno cabresto que
lhe enfeita a marrante cabeça! Velho beato! Judas! Inveja é o que ele
tem de vós amigos homeopatas populares! Sim meus senhores antes da
Homeopatia ser especialidade médica eu ensinei tudo a esta besta e ele
voltou-se contra nós! (Luís da Silva Morgado no palco solta um grito
de dor: a mulher do homeopata popular tira-lhe as ligaduras dos pulsos
feridos pelos guardas prisionais. A luz aumenta para realçar esta
situação macabra, para dar uma visão mais Barroca do acto. Luís em
súbita crise de desespero, levanta-se violento, arremessa as ligaduras
ao chão e ajoelhado, levanta-se).

Luís da Silva Morgado

(Com raiva, em lágrimas): “Deixem-me! Larguem-me! a sua mãe e a


sua mulher olham para ele aterrorizadas). “Todo este mal aconteceu
porque pensei que aqui pudesse trabalhar, que tudo seria diferente. Eu
só queria ajudar as pessoas e pôr em prática o meu conhecimento”.

João da Ribeira

Pobre rapaz! Quase uma criança em lágrimas.... trinta e três anos e


neste sofrimento! Que grande currículo e respeito têm por ele no resto
do mundo....cuspido e torturado implacavelmente por vós....que nojo!
Que pessoas estas tão mesquinhas! Quais as suas culpas? É homeopata
popular, filho da saúde, e é essa a vossa paga por ajudar tanta gente
doente? (neste momento a fala do João da Ribeira é interrompida por
uma gargalhada colectiva, com foguetes de ódio. A luz da cena
aumenta ficando sobre os três homeopatas populares. João da Ribeira
senta-se pesadamente desiludido. Entram a correr muitos Homens e
mulheres Homeopatas médicos ainda recém formados, possessos com
uma fúria selvagem de alegria, João da Ribeira permanece sentado
observando o tumulto).
Médica homeopata nova

Expulsem estes demónios, à fogueira! À fogueira! Foram eles e outros


homeopatas populares que nos roubaram os clientes.

Médico homeopata jovem

(entrando a correr no palco com um archote acesso), quem faz justiça


somos nós e não este santo tribunal!

João da Ribeira

(levantado-se com um gesto cansado, irónico e triste observa estes


senhores feudais): “Senhores homeopatas médicos tendes mais
educação, nem pareceis que tendes um curso de graduação em
medicina!!! Pena tenho eu e infelizmente a área da saúde é comandada
pelo CFM. Que nação é esta? Protege só os interesses desta classe de
saúde e os outros profissionais que também são competentes? Porque
não aceitam outras áreas da medicina? Têm medo da concorrência? E
porque impedem a formação de cursos de graduação da área natural de
saúde? Classe podre e egoísta!

Luís da Silva Morgado

(separa-se da mãe e da mulher e dirige-se ao público): “odeio vocês,


porque me julgam sem conhecer o meu trabalho social com os mais
necessitados, aqueles que não têm 120 reais para pagar as consultas
destes senhores? Por acaso informaram-se ou estareis cegos? Sabem
por acaso quem eu sou? Que formação superior tenho? Vós não passais
de uns analfabetos controlados por estes senhores de fato e gravata.

Amiga Irene (a casa de…)

(rosto abatido e com lágrimas): “porque são nossos inimigos se não nos
conhecem nem o nosso trabalho? Viemos para o Brasil para ajudar a
população carente. Trouxemos o modelo Europeu de Homeopatia e
para quê? É uma injustiça amigos! Peço-vos que não nos lancem nas
chamas do inferno e nos deixem abandonar o vosso país.
Luís da Silva Morgado

(afastando a mãe numa expressão de desespero, muito agressivo e


revoltado): “como vós nos odiais? Inquisidores, familiares, povo...
todos!”. Primeiro não nos intitulamos médicos e depois não há
nenhuma lei nacional que nos proíba de praticar Homeopatia sem
sermos médicos! E depois a orientação de remédios homeopáticos não
é com receita médica. (a luz do palco apaga-se e o foco aponta para
João da Ribeira.): “pobre rapaz, já nada pode fazer a não ser expulso
ou ser levado para a fogueira. Que saudades daqueles tempos onde o
povo exercia a sua função de homeopata popular sem ser perseguido
por esta classe mesquinha e podre. Como é possível incutirem esta
profissão no vosso Conselho se ela é totalmente oposta à vossa
formação?” (luz intensa na poltrona de Dom Geribaldo pai. Estão
presentes, além dele, outros inquisidores, o membro da Associação um
(Eurico Gonçalves) e o membro da associação dois (Tomé Silva)

Membro da associação dois (Tomé Silva)

(velho, alto, uma testa grande, destacando-se da peruca empoada, olhos


escuros e penetrantes, nariz estreito e longo; uma voz metálica, clara e
bem articulada. Lê ao Dom Geribaldo pai a seguinte acusação
pragmática): “Dom Geribaldo pai, faço saber aos que esta lei, pela
obrigação que tenho de atolhar os prejuízos dos meus associados. Não
pude deixar de adverter quanto têm perdido com esta concorrência
desleal. Este foi sempre um dos males que todo o sábio governo
procurou não impedir, como proliferação de uma classe homeopática
não médica; o ministério do trabalho aceitou e catalogaram a profissão
de homeopata prático (não médico) para poder arrecadar mais receitas
no final do ano fiscal, assim os senhores que o governam vão enchendo
os bolsos e mantêm-se mais ricos”.

Dom Geribaldo pai

(ouve a leitura sentado na sua bela e luxuosa poltrona, enquanto isso


uma bela mulher o acaricia e penteia a sua longa peruca. Outra mulher
limpa-lhe as unhas e engraxa os sapatos): “Bem. Parece-me muito
bem. Vós tendes razão meu fiel amigo. Diga-nos agora o seu parecer
Senhor Eurico Gonçalves. Vossa excelência sabe o quanto prezamos a
sua opinião, quanto dela nos informamos para iluminar a nossa
profissão. E, Tomé Silva, pensa igual a mim, que eu bem sei!
Membro da associação um (Eurico Gonçalves)

(obeso, ergue-se da cadeira numa vénia pomposa e quase perfeita):


“Concordo com vossas excelências, estes hereges devem ser punidos
por praticarem Homeopatia sem serem médicos”.

Membro da associação dois (Tomé Silva)

(Revirando os olhos ao céu; cínico e formal): “oh. Senhores tendes


razão! (neste instante o foco de luz sobre João da Ribeira aumenta, os
restantes inquisidores permanecem imóveis no mesmo lugar).

Continua (to be continued………)

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