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Vida, trabalho e linguagem na cultura das redes:

elementos para uma antropológica do ciberespaço


Cláudio Cardoso de Paiva ∗

Índice então as formas afirmativas na cultura das


redes, recorrendo a autores que têm apre-
1 Introdução . . . . . . . . . . . . . 1 sentado elementos vigorosos para um saber
2 Gestão da felicidade na cultura das em moldes de uma antropológica do ciberes-
redes . . . . . . . . . . . . . . . . 3 paço. São eles Maffesoli, Morin, Castells,
3 Estratégias de subjetividade e so- Lévy e Mattelart (no estrangeiro) e Sodré,
ciabilidade . . . . . . . . . . . . . 4 Lemos, Parente, Marcondes Filho, Moraes
4 Novas empiricidades na cultura (no Brasil), entre outros.
das redes . . . . . . . . . . . . . . 6
5 Novas competências na iniciação e
capacitação científica . . . . . . . 7 1 Introdução
6 Conclusão . . . . . . . . . . . . . 13 A cultura das redes aparece contemporane-
7 Bibliografia . . . . . . . . . . . . 14 amente como uma metáfora para traduzir o
sentido das experiências de interação, comu-
Resumo nicabilidade e sociabilidade. No contexto
brasileiro (e particularmente na região Nor-
Exploramos aqui as diferentes modalidades deste), os tempos de trabalho e de lazer têm
como os internautas utilizam os computado- se realizado visceralmente ligados a uma lin-
res. Para a maioria a hipermídia funciona guagem e uma pragmática das “redes”, se-
como um canal de diversão e entretenimento. jam “redes de dormir” ou “redes de pescar”.
Para outros, além de se constituir como um A configuração histórica das redes de al-
vetor de informação permanente, funciona godão, nas casas grandes e favelas, liga-se
como uma estratégia operacional eficiente no ao imaginário do sonho, do despertar, das re-
campo da pesquisa científica e como opor- lações amorosas e do devaneio poético; isto
tunidade de trabalho numa época de reces- se mostra exuberante, por exemplo, na obra
são e desemprego. Há outros ainda que vêm de Gilberto Freyre. A textura das redes de
a Internet como uma via de acesso a outras pesca (em corda ou nylon), por sua vez, tra-
espiritualidades e corporeidades. Sondamos duz as expressões do trabalho ao ar livre, um

Professor adjunto do Departamento de Comuni- ritmo de vida, uma temporalidade e uma eco-
cação - UFPB logia que possui enraizamentos muito fortes
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no contexto antropológico. Isto se faz pre- global, o apartheid tecnológico, as novas for-
sente - por exemplo - na descrição que Victor mas de segregação e exclusão mundiais com-
Hugo faz dos Os trabalhadores do mar, uma poriam assim a face perversa dessa nova de-
obra rica em detalhes da vida cotidiana que sordem mundial. Por outro lado, as novas
inspirou pensadores como Karl Marx. Em redes de identidade (a emancipação das mu-
linhas gerais, a cultura das redes, historica- lheres, dos negros, dos gays), as comunida-
mente, refere uma bacia semântica que situa des virtuais, os ambientalistas, os novos mo-
os seres humanos na rotina do trabalho e do vimentos sociais e seus agenciamentos mi-
lazer cotidiano, mas, sobretudo, traz consigo cropolíticos estabelecem os termos das no-
os traços de uma experiência marcada pelos vas estratégias inscritas no interior desta ex-
signos do homem, da terra e da luta. periência que nomeamos por “cultura das re-
Esta concepção se faz presente no âmbito des”.
de uma história social, cujas emanações per- O controle remoto, os celulares, os vide-
sistem até hoje e não podem ser negligenci- ogames, o fax, o computador, a Internet, etc
adas quando nos predispomos a um esforço geraram experiências culturais inéditas, in-
de leitura e interpretação das culturas con- clusive as inovações no âmbito dos discur-
temporâneas. sos e das práticas comunicacionais. O ensino
O termo “cultura das redes” traduz experi- à distância, as teleconferências, o namoro
ências reais, cuja força imaginante e concre- virtual, a correspondência on line, a virtu-
tude histórica, na época da chamada globa- alidade, disponibilidade e acesso dos textos
lização, neoliberalismo, aceleração tecnoló- on line, entre outros dispositivos criaram no-
gica e fluxos informacionais adquirem novas vas espacialidades e temporalidades. Ocor-
significações. Hoje as redes de informação reram alterações fundamentais nos tempos
têm modificado o sentido da nossa cultura do trabalho e nos tempos do lazer, nos mo-
das redes e evidentemente promovem novas dos de pensar, de falar e de agir. Dora-
relações de sentido nas dimensões da econo- vante evidenciam-se novas modulações que
mia, sociedade, estética e política. nos permitem repensar a significação do “es-
Remontando a Manuel Castells - e seu es- paço público” e os modos de participação
tudo da Sociedade em Rede - percebemos no contexto das decisões públicas. As no-
que, imbuído numa perspectiva crítica, o au- vas redes atualizam o estilo dos confrontos e
tor se empenha em decifrar o alcance e os das cooperações, dos conflitos e das negoci-
limites, os paradoxos e as contradições, as ações.
especificidades e generalidades das redes de Com a mundialização as fronteiras se tor-
informação como o produto mais acabado naram mais próximas e implicam uma di-
na nova fase do capitalismo global. Toda- mensão de pureza, mas também de perigo.
via a perspicácia do sociólogo catalão reside Na época dos mercados globais faz-se ne-
em revelar como no contexto da “globaliza- cessário distinguir as formas de expansão e
ção” se inscrevem novas redes de sociabili- de contração em que se misturam o tradici-
dade, com matizes regressivos, mas também onal e o ultramoderno. Num mesmo espaço
progressistas. A hiperconcentração de renda, regional se inscrevem as enxadas e os com-
os fundamentalismos, as conexões do crime putadores, as feiras tradicionais e os hiper-

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mercados, as receitas domésticas e a enge- tempo, observamos que os internautas par-


nharia genética. As tecnologias da informa- tilham as emoções, afetos e sensações atra-
ção se projetam nas estruturas do cotidiano, vés da Internet e percebemos que as salas de
criando novas formas de “inteligência cole- bate-papo são exemplares para entendermos
tiva”, como sugere Lévy, novos modos do algumas nuances das novas relações dos se-
“agir comunicacional”, novas “competências res em rede. Percebemos igualmente que a
comunicativas” e novos estilos de intersubje- ambiência virtual tem possibilitado a emer-
tividade, como escreve Habermas. gência de linguagens nas estruturas da vida
cotidiana e isto implica na aproximação das
fronteiras entre os sujeitos e grupos sociais.
2 Gestão da felicidade na cultura
O universo do ciberespaço tem performa-
das redes tizado a emergência de novos estilos de vi-
O nosso argumento sobre a comunicação no sibilidades, sonoridades e dizibilidades iné-
contexto cultural do Brasil coloca em pers- ditas, que são - simultaneamente - produzi-
pectiva o problema das tecnologias de in- dos, irradiados e consumidos pelos usuários.
formação, tentando acertar os ponteiros com Tudo isto proporciona novas relações de sen-
os novos discursos institucionais e instituin- tido, novos gêneros de comunicabilidade, ci-
tes motivados pela irradiação da idéia do dadania e experiência comunitária. Focaliza-
“novo”. Após a eleição no Brasil de um mos as modificações nas formas cognitivas,
Presidente da República advindo dos estra- sensoriais, estéticas, sociais e políticas que
tos mais populares, irradia-se uma aura de se instauram no espaço das redes virtuais, e
novidade e esperança, e de certo modo, isto neste sentido, buscamos examinar como as
implica na renovação das apostas acerca do tecnologias da informação e da comunica-
desenvolvimento sustentável. Assim, situa- ção se processam junto aos processos sócio-
mos o debate sobre as tecnologias de infor- históricos.
mação como uma atualização da “cultura das Assim privilegiamos a “cultura das redes”
redes”, que reúne num mesmo intervalo his- em nossas pesquisas mais recentes, perma-
tórico as formas arcaicas e ultramodernas. necendo atentos às formas históricas, soci-
Situamos um lugar de fala norteado por ais e subjetivas. Espreitamos as concretudes
uma antropologia da comunicação, conside- e empiricidades que formalizam o espectro
rando os processos comunicacionais em suas da “sociedade em rede” e procuramos deci-
relações com os mundos do trabalho, vida e frar os tipos de relações dialógicas entre os
linguagem. Assim, lançamos um olhar so- seres por meio das técnicas que habitam os
bre as formas recentes como os atores soci- novos meios interativos. Desta forma, bus-
ais realizam suas experiências profissionais camos apreender os modos de saber, poder e
por meio das tecnologias da informação e fazer que aquecem o novo ambiente comu-
da comunicação. Verificamos que as nano- nicacional, e ao mesmo tempo, investigamos
tecnologias são contemporâneas dos proces- as modalidades do pensar, dizer e agir ex-
sos biotecnológicos que acenam para sinais perimentadas pelos atores sociais no contato
positivos no mundo da vida. E ao mesmo imediato com as máquinas de comunicar.
Os tipos de vida marcados pelo hibridismo

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de formatos e tendências expressam uma es- 3 Estratégias de subjetividade e


tilística da existência guarnecida por diferen- sociabilidade
tes registros territoriais, cronológicos, senso-
riais, políticos e ecológicos. Esta geogra- Os seres humanos religados pelas redes vir-
fia híbrida que estrutura o imaginário pós- tuais dedicam-se permanentemente a rear-
moderno não está ausente no cotidiano do ranjar os modos de expressão de suas sub-
Brasil, no século XXI, em suas vastas di- jetividades e intersubjetividades. No exercí-
mensões territoriais (hoje tão próximas) e cio ativo das tramas culturais os indivíduos
convém prudentemente apreciar os seus bons em tribo atualizam a memória, a tradição e a
presságios. história em meio às novas interfaces urbanas,
Com a proliferação das mídias (analógi- industriais, tecnológicas e cibernéticas que
cas e digitais) assistimos uma tal mundia- os assediam e os fascinam, que podem atra-
lização cultural, de maneira que quase nin- palhar, mas podem abrir novos caminhos. Os
guém, mesmo nas regiões mais remotas do novos protocolos globais e informacionais
globo, está imune às formas de influência e podem gerar níveis de desemprego e infeli-
irradiação globais. Isto implica na difusão, cidade, mas também podem abrir novas fren-
circulação e consumo de imagens, sons, le- tes de trabalho e participação. Podem propi-
tras, cifras e símbolos que se irradiam por ciar migrações sofridas, mas podem desper-
todo o planeta. Neste contexto, é interes- tar outras percepções, afetos e sociabilidades
sante observar que esta irradiação oportuna- felizes a partir de novas regionalizações e re-
mente leva à difusão das culturas locais para territorializações.
os espaços globais, com toda as suas redes As culturas híbridas sob o signo das re-
de desejos, representações, afetos, emoções, des encerram contradições e paradoxos, mas
sentimentos, utopias e paixões. ao mesmo tempo, abrangem dimensões di-
Nessa direção atentamos para o fato que nâmicas e solidárias. Experimentamos na
tudo isso encerra uma dimensão evolutiva e pós-modernidade inúmeros desafios expres-
que se mostra evidente quando apreciamos sos pela pluridiversidade de mundos que às
os novos estilos de comportamento numa so- vezes parecem irreconciliáveis. E de fato
ciedade em que os indivíduos e grupos rein- existe uma série de tensões na interpenetra-
ventam as suas “ilusões necessárias”. Ho- bilidade destes mundos dotados de caracte-
mens, mulheres, velhos e crianças não ces- rísticas bem diferentes. Outrora isto se fa-
sam de recriar novas modalidades de atração zia presente na disparidade entre a moder-
e de trocas coletivas, na atual cultura das re- nidade urbano-industrial e o atraso sócio-
des. Os indivíduos em rede refazem assim econômico. Hoje as desigualdades se atu-
as utopias e os milagres driblando as formas alizam sob uma nova espécie de apartheid
recessivas e injustas da existência social. cultural. De um lado temos a configuração
de redes em que os indivíduos e grupos so-
ciais estão formidavelmente interconectados
através dos satélites, das parabólicas e das te-
vês pagas. Do outro lado, temos a permanên-
cia de outras tribos formadas pelos televiden-

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tes ligados na programação das tevês abertas, bem no atual concerto das culturas híbridas
cuja programação se faz ainda de maneira do planeta, constituídas pelos não-lugares e
massiva. temporalidades imprecisas, em que se mis-
Mas, sobretudo, há os novos “outsiders” turam o arcaico e o ultramoderno. E final-
na sociedade da informação, compondo a mente, pelo sincretismo dos ritos oficiais,
tribo dos “sem micro”, o que de certo modo, religiosos, seculares, impregnados de ima-
remete à situação histórica dos sem-terra. Ou gens sagradas e pagãs. Ou seja, a especi-
seja, ao invés de passividade e conformismo ficidade do hibridismo cultural brasileiro (e
há expressões afirmativas que impõem a re- nordestino) termina por imprimir caracterís-
ordenação do novo sistema globalizante. Vi- ticas particulares na vida cotidiana, inclu-
venciamos uma conjuntura que demanda a sive nos “modos de usar” e “modos de fa-
adoção de competências que nos permitam zer”, como propõe Michel de Certeau. A
transformar as crises em oportunidades. miscigenação de etnias, os tipos de lingua-
No que concerne à atualidade da cultura gens, falas, sotaques, expressões corporais e
das redes, verificamos que o problema re- gestualidades imprimem um sentido especí-
mete a novas estratégias de comunicação, in- fico ao que se tem designado de modo ge-
cluindo as suas interfaces econômicas, so- nérico por “cultura das redes”. Tudo isso
ciais e ético-políticas. O que está em jogo instiga formas inusitadas de produção e con-
aqui são os modos de acesso à informação, sumo dos produtos culturais. Um olhar sobre
à educação e às diversas modalidades cul- a história da cultura pode observar os dife-
turais que poderiam balancear o desnivela- rentes modos como os indivíduos se relaci-
mento dos fluxos informacionais. No que onam com os objetos, utensílios e mercado-
respeita às culturas híbridas do Brasil (e do rias, conferindo-lhes significações de acordo
Nordeste), o desafio que se impõe é ma- com as suas histórias de vida. Isto transpa-
pear as formas culturais, políticas, econômi- rece, por exemplo, nos estudos de Martin-
cas e sociais que se delineiam no contexto Barbéro. É instigante examinar como funci-
do nordeste brasileiro, considerando que os onam as suas relações com as formas mítico-
seus espaços e tempos são inteiramente atra- religiosas, materiais e simbólicas, e como
vessados pelos processos midiáticos. Sendo isto repercute em seus estilos de apropria-
uma região que experimenta distintas espa- ção das linguagens e inovações tecnológi-
cialidades e temporalidades, ou seja, con- cas. Convém perceber as diferentes maneiras
tendo traços da idade média, moderna e pós- como os indivíduos interagem no ambiente
moderna, o nordeste não pára de surpreen- gerado pela “terceira onda” do ciberespaço
der. Primeiramente porque secularmente tem porque as escolhas, respostas, usos e grati-
elaborado modos de resistência e carnavali- ficações dos atores sociais face às máquinas
zação face aos diferentes tipos de coloniza- de comunicar são geralmente imprevisíveis.
ção, dominação e exclusão, exibindo uma fi- Procurando transcender os espectros de
sionomia particular dentre as outras regiões crise e pessimismo e buscando espreitar a
do país. Surpreende também porque con- emergência de novas oportunidades, perma-
serva um repertório de expressões artísticas e necemos “de olho nas frestas” de um sistema
culturais, que sendo atemporais, adeqüam-se econômico-político global que se mostra for-

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temente excludente, mas que contém as cha- pressões locais, marketing cultural, folclore
ves para decifrarmos os mecanismos de se- e turismo promovendo experiências notáveis
gregação social, econômica, política. Apos- de desenvolvimento regional.
tamos ser possível nos instalarmos no inte- No plano das estruturas do cotidiano há
rior deste sistema e descobrir as estratégias novos modos de interação e sociabilidade
de comunicação contribuindo para a reversão que animam os diálogos e as conversações
do quadro global de adversidades; neste sen- dos indivíduos e grupos, criando um estilo
tido os meios interativos podem se constituir específico de “cultura das redes”. Por vezes
como vetores favoráveis. funcionam como vetores de lazer e entrete-
nimento, mas também, otimizam o trabalho
nas ONGs e outras instituições sem fins lu-
4 Novas empiricidades na
crativos voltadas para o desenvolvimento so-
cultura das redes cial.
Discutimos aqui a comunicação, em suas in- É importante observar os regimes de co-
terfaces com as dimensões da cultura e soci- municabilidade que estruturam os novos ser-
edade, particularizando o contexto brasileiro viços na “sociedade em rede”, na medida em
(com ênfase na região Nordeste). Logo, um que estes novos formatos implicam em mu-
desafio que se impõe é conciliar as forças tações evolutivas na divisão do trabalho. En-
da tradição e os arcaísmos com as potências tendemos que a informatização social tem
inovadoras e as ações afirmativas. propiciado favoravelmente a otimização dos
Aliás, isto é algo que se realiza com as- recursos nas áreas da saúde, agricultura, po-
túcia e sensibilidade nos diversos campos lítica, jornalismo, arte e economia. É rele-
da ação pragmática. No ramo da ativi- vante focalizarmos a gestão das informações
dade político-partidária enxergamos como o nos processos educacionais, principalmente
voto digital tem inibido as fraudes eleito- discutindo o tema da educação à distância.
rais, numa região historicamente marcada Em nossas preocupações tencionamos dis-
pelo coronelismo e pelo chamado voto de cutir os processos educacionais, cognitivos,
cabresto. Num outro registro, entendemos estéticos e comunicacionais que constituem
que nas localidades em que os fluxos comer- a ambiência da “cultura das redes”.
ciais se perfazem de maneira mais lenta, a Iniciamos aqui uma breve exploração dos
telemática sem agenciado uma economia de modos como as novas tecnologias têm con-
trocas mais ágil gerando bons dividendos. tribuído para o aprimoramento das condições
Por meio dos novos movimentos artístico- de ensino, pesquisa e extensão nos quadros
culturais como o “Mangue Beat”, encontra- do ensino superior. Isto se justifica consi-
mos expressões atualizadas que traduzem as derando a importância da universidade num
novas sensibilidades estético-musicais. En- espaço sócio-econômico, político e cultural
fim, novas experiências se desenham no es- cujos níveis de participação dos atores soci-
paço de virtualidade da Internet, como por ais na esfera pública se mostram desbalance-
exemplo, o caso das páginas eletrônicas de ados.
várias organizações que têm aliado as ex- Especificamente examinamos as maneiras
como a “cultura das redes” tem promovido

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linhas evolutivas na qualificação do trabalho mente porque apresentam práticas interati-


no campo da Comunicação e para isso reali- vas, que podem estimular um debate acerca
zamos um mapeamento seletivo de algumas da diversidade de espaços e tempos que con-
empiricidades que podem servir como jane- correm para decifrarmos alguns aspectos im-
las para uma apreciação dos processos cul- portantes da hibridização cultural no Brasil
turais. Neste sentido, estabelecemos alguns (e no Nordeste).
níveis de empiricidades que se articulam -
aqui, provisoriamente - em torno dos discur-
5 Novas competências na
sos e práticas ligadas ao contexto das “redes
de informação” e seus duplos, ou seja, as re- iniciação e capacitação
des de identidade e de alteridade, redes de científica
exclusão e redes de sociabilidade.
Enunciamos algumas experiências vivencia-
Propomos um trabalho que se realiza num
das no âmbito do ensino e pesquisa no De-
nível de abstração atento à proximidade das
partamento de Comunicação, da UFPB. E
práticas cotidianas numa faculdade de comu-
isto é pertinente porque mostra as articula-
nicação no Nordeste. Isto é, situamos al-
ções que se fazem entre o trabalho de funda-
gumas experiências regionais que eventual-
mentação científica e as práticas laboratori-
mente podem servir como pretexto para en-
ais gerando aptidões e habilidades num con-
tendermos as linhas evolutivas de centro de
texto profissional que passo a passo vem atu-
ensino e pesquisa em desenvolvimento, que
alizando as suas práticas, otimizando os re-
se nutre na substância das conexões propici-
cursos humanos e tecnológicos.
adas pelas “cultura das redes”.
Partimos de uma perspectiva menos base-
a) A busca da comunicação horizontal
ada numa lógica dedutiva e mais numa lógica
indutiva; ou seja, deslocamo-nos do particu-
Tivemos a oportunidade de orientar os tra-
lar ao geral. Buscando escapar aos modelos
balhos de Pesquisa Científica de duas alunas
determinantes que circunscreveriam as con-
interessadas no tema do ciberespaço, intitu-
dições de enunciação de uma prática discur-
lado “A busca da comunicação horizontal”.
siva sobre as culturas globais, optamos por
Delimitando como tema de estudo as páginas
examinar como algumas experiências locais
eletrônicas da Internet, dispuseram-se a exa-
podem sinalizar novas competências comu-
minar o agenciamento de novas competên-
nicativas no contexto cultural emergente.
cias no campo da comunicação. Dedicaram-
Apoiamo-nos nas bases interpretativas
se à região Nordeste, particularmente, ao Es-
fornecidas por autores e textos cuja contri-
tado da Paraíba e partiram das idéias pro-
buição tem sido fértil no domínio das tecno-
postas por Luiz Beltrão, contidas num texto
logias da informação e da comunicação.
claro e pedagógico, chamado “Adeus Aristó-
Situamos algumas séries de experiências
teles: o fim da comunicação vertical”. Como
realizadas na Escola de Comunicação da
de praxe em estudos desta natureza, o enfo-
UFPB que nos parecem relevantes porque re-
que que se apoiara em princípio numa base
novam os métodos de atuação nos domínios
crítica, terminou se desenvolvendo por um
da pesquisa, ensino e extensão, e principal-

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caminho mais funcionalista. As autoras des- b) Construção de um “Quiosque” inte-


creveram uma certa quantidade de sites, ob- rativo
servando sua eficácia e utilidade. Investiga-
ram estatisticamente o número de provedo- Por diversas razões, não é uma tarefa sim-
res atuantes no Estado, sem deixar de cui- ples transformar uma revista imprensa para
dar do aspecto qualitativo dos sites. Realiza- o formato digital. A revista “QUIOSQUE -
ram uma razoável análise de conteúdo, apon- Observatório das Mídias” editada pelo Prof.
tando para as funções e disfunções presentes Dr. Henrique Magalhães consiste numa re-
na configuração das páginas. Observaram a vista de tamanho curto e de circulação limi-
qualidade técnica, os efeitos audiovisuais e tada, mas que tem a qualidade de reunir arti-
cumpriram o protocolo de uma enquete so- gos de estudantes, professores e pesquisado-
bre o novo meio partindo de bases empíricas, res em comunicação impondo uma certa di-
apoiadas num método dedutivo, mas o im- nâmica às leituras, discussões e conferências
portante é que definiram os primeiros passos no Departamento de Comunicação da UFPB.
na pesquisa sobre cibercultura na UFPB, pri- A transcodificação da QUIOSQUE nos
mando pela coragem de criar num centro de parece exitosa porque em primeiro lugar, a
pesquisa ainda em fase de desenvolvimento. aluna manteve a leveza gráfica característica
Este trabalho é relevante em primeiro lu- da revista em seu formato original. Depois
gar por mostrar as novas tendências e seus pela otimização dos recursos que permiti-
deslocamentos que prefigurariam “o início riam uma certa agilidade na busca e acesso
do fim da comunicação massiva”, uma pers- aos textos. E finalmente, pela disponibili-
pectiva adotada por estudiosos como Sérgio zação em rede de um produto de qualidade,
Porto. É pertinente também porque busca se mas que até então se mantivera restrito às
orientar a partir de novos prismas, que no fim consultas de um número reduzido de leito-
das contas apontam para a “implosão da te- res.
oria da comunicação na experiência do cibe- A revista QUIOSQUE é pertinente em
respaço”, como escreve Eugenio Trivinho. nossa apreciação pelo hibridismo que mani-
A análise é sensível e inteligente perce- festa, no contexto das produções nordesti-
bendo o aspecto de hipertextualidade das pá- nas. Primeiramente pela adequação de vá-
ginas eletrônicas, um ângulo presente em rias tipologias discursivas em que se entre-
trabalhos importantes como o de André Pa- cruzam os textos de caráter mais analítico,
rente, abordando “o virtual e o hipertextual”. junto com intervenções poéticas, manifesta-
Mixando os estudos da forma e sentido dos ções artístico-culturais recentes, artigos jor-
sites a investigação merece destaque na me- nalísticos e de cunho didático-pedagógicos.
dida em inicia constrói uma ponte entre a Assim, promove - no formato linear e digi-
perspectiva crítica que norteou as pesquisas tal - uma experiência que Bakhtin nomeou
em comunicação nos anos 70/80 e uma aná- enquanto uma “polifonia das vozes”. Isto,
lise atenta aos níveis de “verticalidade” e em última instância, mantém correspondên-
“horizontalidade” que tem caracterizado dis- cia com as expectativas dos internautas, ci-
tintamente as mídias analógicas e das mídias dadãos e consumidores, cujos referenciais
digitais. se inscrevem de modo pluralista e diferenci-

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ado. Depois disso, a QUIOSQUE assinala uma programação dinâmica na Rádio Taba-
a sua importância pelo seu caráter crítico- jara, o grupo tem contribuído para uma linha
inventivo que reúne estilos diferentes de nar- evolutiva no tocante aos estudos dos audio-
rativas expressando a diversidade de sinta- visuais.
xes, acentos e sotaques mantendo a especi- Encontramos aqui algumas especificida-
ficidade das intervenções locais no ambiente des que podem ilustrar a dinâmica da “cul-
das enunciações globais. tura das redes”. Em sintonia com as expres-
Para além de uma retórica fisgada pelos sões mais fortes na vida cultural da cidade de
cânones editoriais, acadêmicos e cristaliza- João pessoa, este sistema de webdifusão tem
dos das revistas convencionais, esta se per- sido eficaz e criativo na edição de falas, sota-
faz correta, instrutiva e instigante na medida ques e sonoridades que atualizam as formas
em que sugere caminhos de busca, pesquisa da cultura verbal. Entrevistas, discussões e
e também entretenimento. debates, assim como a divulgações de can-
De maneira análoga apontamos a relevân- ções e melodias que recapturam um estilo de
cia da página eletrônica IN SITE UNIVERSI- oralidade atualizando a função das culturas
TÁRIO – http://www.insite.pro.br/index.htm populares no contexto dos processos midiá-
organizada pelo Prof. Dr. Marcos Nico- ticos.
lau (UFPB). O site se propõe a possibili- Assim, o projeto instaura um tipo de polí-
tar um acompanhamento das disciplinas do tica cultural importante numa ambiência cul-
Curso de Comunicação, a que os alunos ti- tural saturada pelos produtos mercantiliza-
rem suas dúvidas e obtenha conhecimentos dos sem muita referência com o repertório
extra-classe. Ali são contemplados assun- local. O que se processa aqui são novas
tos pertinentes às áreas de jornalismo, mar- reterritorializações, novos formatos reticula-
keting, radio, TV. Além disso, trata-se de res abrindo espaço para a construção das re-
uma página que permite o intercâmbio en- des identitárias e novas formas de possíveis
tre as diferentes matérias do curso, assim de cidadania. Refaz-se aqui o que Matte-
como, disponibiliza as pesquisas e textos dos lart enunciava como um tipo de “revanche
professores inscritos no programa de curso. das culturas” num contexto minado pela glo-
Logo, consiste num dispositivo que tem con- balização. Num outro prisma, a experiên-
tribuído para uma melhoria considerável na cia registra novas construções em meio à he-
Escola de Comunicação da UFPB. gemonia audiovisual, como escreve Martin-
Barbéro. Deslocam-se assim as formações
c) Webdifusão: radio digital, do local ao discursivas do massivo ao interativo, dos
mundial meios às mediações. O sistema de webdi-
fusão realiza também um novo campo de-
O sistema de Webdifusão tem evoluido na signado por webjornalismo, implicando em
UFPB também graças aos esforços do Grupo mudanças radicais nos campos da produção,
de Trabalho organizado pelo Prof. Carmélio dos meios e das mediações - numa palavra,
Reynaldo. Aliando a sua experiência de te- aqui temos uma nova reconfiguração das re-
leradiodifusão, as pesquisas sobre os movi- lações de poder e comunicação. Tudo isso
mentos sociais e a manutenção duradoura de ainda é muito incipiente – e cá entre nós –

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ainda desenha uma pré-história do que está dora construiu um histórico, abrangendo o
por vir, mas percebemos que as experiências formato do correio sentimental, da comuni-
da cibercultura no contexto do nordeste an- cação epistolar (recorrendo às correspondên-
tecipam um novo formato e sentido da nossa cias dos namorados virtuais através de car-
“cultura das redes”. tas) e as experiências telefônicas do “Dis-
que Amizade”, como uma pré-história so-
d) Tecnologia e afetividade das relações nora das relações afetivas na Internet. Esta-
virtuais vam lançadas a preliminares para os estudos
de comunicação orientados por uma perspec-
No comecinho do novo século, em João tiva histórico-hermenêutica, em que a opi-
pessoa, alguns alunos se mostraram mais in- nião e a mera informação empírica, cediam
teressados em estudar as novas tecnologias terreno para as práticas de caráter mais inter-
e uma jovem pesquisadora, particularmente, pretativo.
marcou uma certa distinção escolhendo um No plano teórico conceitual a experiência
estudo tratando das “relações virtuais”, num das relações afetivo-sexuais e intersubjetivas
projeto que terminou ganhando um belo tí- (prescrevendo um novo estilo do espaço pú-
tulo: “Comunicação, Sentimento e Interati- blico), tem sido revisitada por diversos gru-
vidade: Um estudo das relações afetivas nas pos de trabalho e aqui conviria destacar es-
salas de bate-papo da Internet”. pecificamente o trabalho de Raquel Paiva,
Diferentemente da maior parte das inves- Histeria na Mídia - a simulação da sexua-
tigações sobre o bate-papo na Internet, a pes- lidade na era digital. Trata-se de um en-
quisadora preteriu o “discurso da sexuali- foque crítico do que a autora designa como
dade” e optou por uma análise do discurso uma “formação histérica na cultura atual”.
da afetividade em rede, visando as relações Apoiando-se nas noções e conceitos psicana-
de amizade no espaço efêmero das salas de líticos, Paiva atualiza uma compreensão crí-
bate-papo. Aqui teríamos um primeiro des- tica das mídias digitais e das relações entre
locamento, deixando de lado o aspecto ma- os seres humanos por meio dos novos dispo-
terial, infra-estrutural, técnico-instrumental sitivos informacionais. Deste modo, a “cul-
que tem norteado o interesse da maior parte tura das redes” aparece aqui em sua dimen-
das pesquisas na graduação. A nova pos- são neurótica, assim como, para o pesquisa-
tura da pesquisadora movia-se pela inten- dor Muniz Sodré, os processos midiáticos es-
ção de analisar os discursos, examinando as timulavam as dimensões narcísicas dos teles-
suas condições de possibilidade, a sua pro- pectadores, ou seja, um aspecto mais confor-
dução de sentido. Então se percebe aqui mista e regressivo. Num registro oposto, en-
uma aliança entre as preocupações das ciên- contramos o Grupo de Estudos, coordenado
cias sociais, dos estudos culturais e das ci- pelo Prof. Sérgio Porto, da UnB, tratando
ências da linguagem, caminhando na dire- das relações intersubjetivas pelo viés da afe-
ção de uma semiótica da cibercultura. O as- tividade e que encontra-se sistematizada na
pecto quantitativo então foi cedendo lugar ao publicação “Sexo, afeto e era tecnológica –
aspecto qualitativo. No contexto da mundi- um estudo de chats na internet. Esta perspec-
alização das trocas simbólicas, a pesquisa- tiva se mostra mais compreensiva com rela-

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Vida, trabalho e linguagem na cultura das redes 11

ção às novas modalidades da comunicação, e) Experimentações e competências do


matizadas sob a forma do “namoro virtual”. novo milênio
Em sua maioria são pesquisa norteadas por
um prisma histórico-hermenêutico, viabili- Certamente uma das elaborações mais ar-
zado por um tratamento semiótico-textual rojadas produzidas no âmbito dos trabalhos
que se realiza por meio da análise dos dis- de conclusão de curso, sob a rubrica dos Pro-
cursos. Como escreve Janice Caiafa em sua jetos Experimentais, foi apresentada por um
apresentação, “a pesquisa busca sinais, mar- aluno e pesquisador, que ousou realizar a pri-
cas, indícios de que no final do século XX a meira defesa de monografia para obtenção
tecnologia estimula o imaginário e os dese- do grau de bacharel em comunicação em co-
jos do ser humano e instala publica e pom- nexão com a Internet. Em tempo real os alu-
posamente a relação discurso virtual versus nos e interessados puderam assistir e intera-
discurso real, de modo a criar uma nova ati- gir com o pesquisador durante o momento
tude no que diz respeito ao comportamento de sua apresentação. Assim, tivemos ali o
sexual e afetivo”. exemplo de uma estratégia feliz que soube
Podemos depreender que diversas são aliar competência técnica e imaginação cria-
as “dobras” que se manifestam no campo dora tratando de um tema relevante, pois se
discursivo da “vida on line”. A “cultura das debruçou sobre a disponibilidade virtual dos
redes” longe de apresentar uma superfície jornais locais no Estado da Paraíba, tema da
linear, plana, livre das tensões e conflitos, sua monografia: Estudos de Jornalismo em
impõe-se como lugar de tensões e conflitos Rede.
– isto se comprova – por exemplo – no nível O trabalho de Oliveira traz novos elemen-
das investigações teórico-metodológicas que tos para uma epistemologia da comunicação
suscita. Ao longo da história social, as redes e de modo específico, no âmbito de uma
se configuraram como um suporte para as epistemologia do jornalismo. No que
relações amorosas em que os senhores e concerne à cultura das redes, o jovem pes-
escravos se dedicavam ao calor das trocas quisador e jornalista ilumina uma dimensão
afetivo-sexuais, desde o período colonial. bastante fértil, mostrando ser possível reali-
Hoje, na época do pós-colonialismo a zar um trabalho original a partir de recursos
“cultura das redes” redefine-se através de minimalistas e inaugura um novo modo
novas intersubjetividades e de novas trocas de se exercitar no mundo acadêmico, sem
afetivas, que se constroem dentro e fora relegar o rigor e a sistematização. Oliveira
dos novos processo midiáticos, e tudo isto é responsável pela produção de um Centro
solicita novos pressupostos, metodologias e de Informação on Line (CIO), experiência
epistemologias cujo exercício nos permita pioneira no campo da telemática produzida
uma aproximação mais livre e imune aos por um aluno de comunicação da UFPB.
preconceitos; de certo modo, isto é o que Trata-se de um site contendo inovações no
fazemos um pouco aqui. campo da comunicação e ciências afins.
Professores, pesquisadores, estudantes e
especialistas encontram nesta página um
meio eficaz de expor suas idéias, publicar

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12 Cláudio Cardoso de Paiva

seus textos, disponibilizar seus artigos. versações para a linguagem escrita e isto
O CIO contém uns links conectando os freqüentemente era feito por meio de manus-
usuários aos principais jornais e às páginas critos com canetas esferográficas e papéis de
ligadas aos temas da comunicação, cultura e ofício. Dali em diante, o próximo passo seria
sociedade. digitar os textos num computador público e
em seguida enviar o produto por email para
f) Comunicação e cultura organizacio- o seu destinatário, que posteriormente se en-
nal no ciberespaço carregaria de disponibilizar os textos na In-
ternet, prontos para serem acessados pelos
Experiências curiosas se expressam no virtuais usuários.
trabalho de pesquisa de dois jovens inscritos O interessante neste percurso é o fato de
no programa de bolsas de iniciação cientí- se tratar de uma pesquisa que alia a expe-
fica, desde o ano 2002. Os pesquisadores são riência teórica e a dimensão pragmática do
matriculados nas habilitações de Jornalismo objeto de estudo. O aluno interessado em es-
e Relações Públicas, do curso de Comuni- tudar a sociedade em rede, ao mesmo tempo
cação Social da UFPB, e têm se dedicado em que consulta os trabalhos de Lévy, Cas-
a realizar um mapeamento seletivo dos sites tells, Mattelart, entre outros, além daqueles
das universidades. O aluno de RRPP tem ex- especializados nos assuntos de Relações Pú-
plorado os sites como manifestações de “co- blicas e da Comunicação Organizacional. O
municação e cultura organizacional”. Para mesmo pôde experimentar na prática o trân-
isso, o mesmo tem se guarnecido de diver- sito característico dos processos intermidiá-
sos textos teóricos, aprimorando sua funda- ticos, passando do rádio à escrita, da escrita
mentação científica através de uma rigorosa ao computador à Internet. Este é um exem-
revisão bibliográfica, além de repertoriar um plo de trabalho que expressa com clareza a
acervo de textos na Internet, cujos conteúdos intervenção num processo de comunicação
têm afinidade com o seu objeto de pesquisa. em rede. O exercício da escuta, da escri-
Tendo se voltado para a dimensão interativa tura, comunicação digital, reticular e biná-
dos meios de comunicação, o mesmo tem vi- ria se fundem aqui num tipo de intertextuali-
venciado na prática os aspectos presentes em dade, intermediatização e intersemioticidade
seu tema de estudo, na medida em que rea- que revelam a nova forma e sentido da co-
liza simultaneamente uma experiência inter- municação social - abrangendo as dimensões
midiática, passando pelo registro das mídias da vida, trabalho e linguagem, e particular-
analógicas até as mídias digitais. mente atualiza um novo sentido nos estágios
Prestando assessoria para profissionais de da história da “cultura das redes”.
webjornalismo, o pesquisador empenhou- O estudo de Marcos Alexandre, igual-
se no trabalho de registrar num gravador mente, contém este aspecto de originalidade
os discursos radiofônicos de políticos, em- aliando a praxis teórica e o exercício mais
presários, artistas, formadores de opinião pragmático no campo da comunicação, na
e transcrevê-los para o texto digital. al- medida em que se dedica aos estudos de
guns condicionamentos infra-estruturais sua cibercultura, baseado em autores voltados
tarefa seria de codificar, transcrever as con- para as novas tecnologias e também para as

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Vida, trabalho e linguagem na cultura das redes 13

investigações sobre as imagens fotográficas. outras que têm fertilizado a cultura das redes,
Atuando em estágios como fotógrafo pro- promovendo aberturas para o exercício da in-
fissional, o pesquisador se dedica ao exame vestigação científica por meio das redes tele-
das funções imagísticas nos processos de máticas e verificamos que isto se perfaz se-
intertextualidade em que dialogam imagens gundo as características das formações cultu-
e textos, ressituando a sua significação rais locais, enriquecendo a ambiência da in-
desde o formato do jornalismo impresso formação global, uma vez que estimula des-
até o formato recente do webjornalismo. locamentos promissores do virtual ao atual
Deste modo, no campo das ciências da como escreve Lévy.
comunicação, Alexandre tem aberto um
campo original que redefine a “cultura das
6 Conclusão
redes” pelo viés de uma hibridação em que
diversos suportes e discursos configuram Conforme indicamos este é um estágio ini-
um novo estilo do processo comunicacional, cial da nossa pesquisa sobre a “cultura das
sinalizando novas tendências nas escolas de redes”. Este texto configura uma parte de
comunicação. um projeto de pesquisa mais amplo que de-
signamos provisoriamente sob a rubrica Na-
g) O CEAD - Centro de Educação à Dis- vegação e Renascimento nas Águas da Ci-
tância - consiste num núcleo de produção bercultura. Aqui tentamos enunciar um tipo
tecnológica da UFPB que tem colocado esta de perspectiva procurando situar as práticas
instituição no trânsito das infovias, gerando comunicacionais emergentes (configuradas
novas modalidades de produção, circulação pelo ciberespaço) num contexto histórico-
e acesso ao conhecimento. Estas experiên- cultural que preserva ainda as práticas cul-
cias pontuais têm nos servido para contem- turais tradicionais. Daí a provocação amis-
plarmos os estágios de evolução - no domí- tosa que busca reunir num mesmo espaço as
nio das tecnologias de comunicação - suas temporalidades e espacialidades caracteriza-
interfaces com as práticas sócio-culturais e das pelo hibridismo cultural compreendendo
suas relações com a produção de conheci- as “redes de balanço”, as “redes de pescar”
mento científico visando o desenvolvimento e as “redes interativas”. Objetivamos, deste
sustentável do nordeste (e particularmente da modo, explorar “as estruturas antropológi-
Paraíba). Aqui evidenciam-se tendências nas cas do ciberespaço”, respeitando as estrutu-
atividades ligadas ao mundo acadêmico, à ras e conjunturas que configuram o imagi-
universidade e as suas conexões num nível nário brasileiro (e do Nordeste). Em nosso
mais local, interno, regional. Mas sobretudo, percurso permanecemos atentos aos estilos
abrem-se novas arestas para o exercício de de identidade e identificações, sociabilidade
um trabalho que extrapola os limites da uni- e tribalizações, subjetividades e intersubje-
versidade, na medida em que interage junto tividades que já se mostravam latentes na
às comunidades locais. O CEAD acerta os ecologia comunicacional da vida cotidiana,
ponteiros com a produção nacional, a exem- mas que adquirem novos contornos a partir
plo de outros centros de pesquisa como a dos novos agenciamentos possibilitados pe-
UFBa, UNB, UFF, UNISINOS, USP, entre los dispositivos informacionais. Ao invés de

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14 Cláudio Cardoso de Paiva

partir de um modelo teórico-metodológico FADUL, A. (org.) Novas tecnologias da co-


construído a priori, aceitamos auscutar algu- municação. S. Paulo: Summus, 1986.
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nos levam a refletir sobre a acústica, dizibi- HOBSBAWN, E. Era dos Extremos. S.
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