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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE


SEARA

Todos os envolvidos na cadeia


produtora são responsáveis solidários
pela reparação do dano provocado ao
meio ambiente, assim considerados o
produtor proprietário da pocilga, a
cooperativa regional que forneceu o lote
de leitões e obrigou-se a dar assistência
técnica, bem ainda a cooperativa
centralizadora da industrialização dos
suínos1.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA


CATARINA, por seu Promotor de Justiça ao final assinado, com
fundamento nos arts. 127 e 129, III, da Constituição da República,
bem como no art. 82, I, do Código de Defesa do Consumidor, no
art. 5º da Lei nº 7.347/85 e no art. 3º e 14, §1º, da Lei nº 6.938/81,
propõe AÇÃO CIVIL PÚBLICA em defesa do direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, em face de:

SEARA ALIMENTOS S.A., pessoa jurídica de direito


privado, inscrita no CNPJ sob o nº 02.914.460/0001-50, domiciliada
na Avenida Paludo, 155, Bairro Industrial, Seara, Santa Catarina.

1. Objetivo da ação

Esta ação civil pública tem por objetivo obter


provimento jurisdicional que determine à Seara Alimentos S.A. a
adoção de providências para pôr fim à degradação ambiental que
1
Apelação cível n. 2008.004084-0, de Modelo, rel. Jânio Machado, j.
12.9.2008.
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vem incentivando e da qual vem se beneficiando no Município de


Arvoredo, mais precisamente na propriedade de Rogério
Dedonatti, na Linha Nereu Ramos.

Tem por objetivo também obter provimento que


determine a completa recuperação ambiental, também por parte
da Seara Alimentos S.A., bem como a indenização do dano
ambiental até o momento causado, mediante compensação
financeira destinada ao Fundo de Recuperação de Bens Lesados
do Estado de Santa Catarina.

2. Legitimidade passiva

Como está comprovado pelos documentos que seguem,


a Seara Alimentos S.A. tem por finalidade a industrialização da
produção de agricultores em regime de parceria, como é o caso de
Rogério Dedonatti.

Por sua vez, o produtor rural Rogério Dedonatti é


parceiro formal da Seara Alimentos S.A. O dano causado pelo
produtor, porque no caso específico dos autos incentivado,
admitido e explorado pela Seara Alimentos, deve ser imputado
objetivamente a ela, residindo aqui a legitimidade passiva para a
causa.

3. Fatos

3.1. Conduta de Rogério Dedonatti

No dia 6 de março de 2009, na Linha Nereu Ramos,


interior de Arvoredo, a Polícia Militar de Proteção Ambiental
constatou que Rogério Dedonatti havia causado poluição hídrica
em nível que causa risco à saúde humana, mediante lançamento

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de dejetos de suinocultura em desacordo com as regras


ambientais aplicáveis.

Conforme se apurou, Rogério Dedonatti é administrador


de uma pocilga com aproximadamente 960 suínos em ciclo de
terminação. Para dar vazão aos dejetos líquidos gerados na sua
atividade produtiva, Rogério instalou um cano e liberou parte dos
dejetos no curso do Lageado Leão, em Arvoredo.

A Polícia Militar de Proteção Ambiental colheu amostras


da água do Lageado Leão, a montante, a jusante e no local da
infração, constatando que o nível de coliformes fecais chegava a
aumentar de 5.400 NMP/100ml para 1.400.000 NMP/100ml,
quando a resolução Conama nº 357/2005 estabelece ser imprópria
para uso águas com índice de coliformes fecais superior a 1.000
NMP/100ml.

Além, disso, por menor que seja, é proibido o


lançamento de dejetos suínos em cursos d´água. A única forma de
descarte dos dejetos é o uso na agricultura, conforme Licença
Ambiental nº 935/2008 (fl. 14).

Por esses fatos, lavrou-se termo circunstanciado


ambiental contra Rogério Dedonatti e Seara Alimentos S.A. que foi
objeto de denúncia e atualmente aguarda audiência de instrução e
julgamento.

3.2. Conduta da Seara Alimentos S.A.

Evidentemente, por um princípio básico de Economia,


ninguém exerce atividade produtiva se não visar à obtenção de
alguma vantagem pessoal, que na maior parte das vezes é
financeira.
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É o caso dos autos. Como se apurou nesta Promotoria


de Justiça, o produtor, com contrato escrito, tem toda a sua
produção de suínos adquirida normalmente pela Seara Alimentos
S.A., que por sua vez a industrializa em suas unidades.

No entanto, mesmo visitando semanalmente a


propriedade rural, os técnicos da empresa requerida nada fizeram
para evitar os danos ambientais e o desrespeito à licença, em
nítida omissão para com o Direito Ambiental. Tinha a requerida em
mãos, durante todo o período, a licença ambiental e suas
exigências mas, mesmo assim, preferiu fechar os olhos para este
aspecto e se concentrar na maximização dos lucros, focando sua
atuação apenas na engorda rápida dos animais.

Note-se que a Seara Alimentos fornece a ração, presta


assistência técnica, especialmente no que diz respeito às
instalações, manejo e condições sanitárias, presta orientação
veterinária, define o cronograma de entrega de suínos e arca com
as despesas de transporte, tudo com exclusividade.

Assim, na verdade, se observa que a Seara Alimentos


S.A. explora juntamente com o produtor rural a produção de
suínos para abate, atividade que, no caso dos autos, causou
poluição ambiental intolerável.

Sobre esse assunto, esta Promotoria de Justiça já


colheu em outra ocasião o depoimento de Wolmir de Souza,
presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos,
ocasião em que foi informado o seguinte:
Em todos os sistemas de produção de suínos conhecidos
pelo declarante não há qualquer autonomia por parte
dos produtores rurais; os animais são alimentados com a

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ração fornecida pelas integradoras, na periodicidade


determinada pelas integradoras; são também as
integradoras que determinam a freqüência das raspagens
(limpezas das pocilgas); a entrada e a saída dos animais são
determinadas pelas integradoras, inclusive com horário
definido, o que freqüentemente pode ocorrer à noite e de
madrugada; a integradora também exige número mínimo de
funcionários; as integradoras vêm aos poucos exigindo
também dos produtores rurais a disponibilização de botas e
roupas especiais para os funcionários e para quem quer que
venha a ingressar na área de produção, inclusive os próprios
técnicos das integradoras; as integradoras também vem
exigindo o “arco de desinfeção” que são lugares onde os
caminhões com ração ou animais são desinfectados;
aproximadamente 70% dos produtores já foram obrigados a
instalar este sistema; não sabe o declarante se o custo do
arco de desinfecção é suportado exclusivamente pelo
produtor ou se há apoio da integradora; o preço do animal
não é negociado entre a integradora e o produtor; o preço é
definido por um cálculo realizado pela integradora, que leva
em conta o peso do animal na entrada e o peso de saída e a
quantidade de ração consumida (sistema de conversão
alimentar); os produtores rurais, ainda que estejam de
posse de todos estes dados, não conseguem calcular
o preço do animal; a integradora, de qualquer forma,
não permite negociação do preço (doc. anexo).
Por isso é que está evidente a omissão da empresa,
somente levada a efeito desta forma por lhe trazer notável
benefício financeiro: deixa de investir em treinamento e nas
instalações dos produtores e, ao mesmo tempo, continua
comprando todos os animais produzidos a preços geralmente
bastante baixos.

4. Direito

A água, este bem escasso de que depende a


humanidade, vem sofrendo constantes degradações desde o
processo de industrialização por que passou o mundo nos últimos
séculos.

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Afora o desperdício e a contaminação por agrotóxicos,


apontam os estudos mais modernos a indústria como o principal
agressor ambiental em se tratando de recursos hídricos. No caso
do Oeste de Santa Catarina, a agroindústria vem corretamente
sendo responsabilizada pela intensa contaminação dos lençóis
freáticos e dos cursos d´água existentes.

4.1. Lei de Crimes Ambientais

Para a Lei nº 9.605/98, é crime ambiental “Causar


poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou
possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a
mortandade de animais ou a destruição significativa da flora”.

Logo se vê, portanto, que a legislação brasileira proíbe


a conduta incentivada e explorada pela, e a ela confere tamanha
gravidade que chega a criminalizá-la pelo art. 54 da Lei nº
9.605/98.

4.2. Lei da Política Nacional do Meio Ambiente – Lei nº 6.938/81

Também é claramente perceptível que a legislação


ambiental brasileira, com vigor, objetiva punir a ocorrência de
danos ambientais sob vários aspectos, como forma de atender
àquela diretriz mundial de proteção ao meio ambiente.

No caso dos autos, despontam agressões à natureza de


altíssima gravidade, em que a atividade do produtor rural,
incentivada e explorada pela agroindústria, prejudica diretamente
a saúde e o bem-estar da população, por criar condições adversas
às atividades sociais e afetar desfavoravelmente a biota.

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Além disso, a poluição comprovada nos autos afeta as


condições sanitárias do meio ambiente e lança matéria em
desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. Vale lembrar
que o destino adequado a dejetos suínos é o lançamento em
lavouras ou a compostagem, o que apenas parcialmente foi feito
pelo produtor, com a conivência da primeira requerida, já que com
um tubo fez os dejetos escorrerem para o Lageado Leão, um dos
mais importantes de Arvoredo.

Há, portanto, poluição, pois o fato descrito se amolda


perfeitamente ao conceito legal: “Para os fins previstos nesta Lei,
considera-se poluição a “degradação da qualidade ambiental
resultante de atividades que direta ou indiretamente: a)
prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b)
criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c)
afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições
estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou
energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”2.

5. Responsabilidade civil objetiva pelo dano ambiental

Faz-se mais do que necessária, faz-se verdadeiramente


imperiosa a responsabilização civil dos poluidores pelos danos
ambientais e pelo ilícito que vêm praticando.

Não apenas pela obrigatoriedade de reparação do dano


e retorno ao status quo ante, mas também de modo exemplar, de
forma a amoldar a conduta futura da agroindústria e buscar
convencê-la (ainda que pela forma mais drástica) do necessário
respeito ao Meio Ambiente.

2
Lei nº 6.938/91, art. 9º, III.

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Despontam, portanto, as funções sancionatória e


dissuasora da responsabilidade civil por dano ambiental,
necessidade imposta pela sociedade pós-industrial, marcada pelo
crescimento de riscos nos processos produtivos.

Em apoio ao entendimento aqui trazido, Annelise


Monteiro Steigleder, Promotora de Justiça de Porto Alegre, lembra
que “a responsabilidade civil típica da ‘era tecnológica’
desempenha funções que se desenvolvem em dois âmbitos: como
instrumento de regulação social e como mecanismo para a
indenização da vítima”.

E, ainda segundo a autora, “no âmbito de ser


instrumento de regulação social, a responsabilidade exerce a
função de prevenir comportamentos anti-sociais, dentre os quais
aqueles que implicam geração de riscos; de distribuir a carga dos
riscos, pelo que se torna otimizadora de justiça social; e de
garantia dos direitos do cidadão”3.

Por isso é que se buscará nesta ação não apenas a


reparação do dano, mas também a condenação por danos
extrapatrimoniais causados ao meio ambiente, única forma de
sancionar a agroindústria pelos danos ambientais e ao mesmo
tempo dissuadi-la de prosseguir no fomento de atividades lesivas
ao meio ambiente.

5.1. Pressupostos da responsabilidade civil

5.1.1. Fato antijurídico

3
Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito
brasileiro. Porto Alegre : Livraria do Advogado, 2004. p. 178, grifou-se.

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Para o surgimento da obrigação de indenizar na


responsabilidade civil, segundo Fernando Noronha, são
necessários os seguintes pressupostos: “que haja um fato (uma
ação ou omissão humana, ou um fato humano, mas independente
da vontade, ou ainda um fato da natureza) que seja antijurídico
(isto é, que não seja permitido pelo direito, em si mesmo ou nas
suas conseqüências)”4.

No caso narrado nesta ação, os fatos consistiram na


ação humana do produtor rural em instalar-se e produzir suínos,
por um lado. Por outro lado, o fato consistiu na aquisição, pela
agroindústria, dos animais produzidos em propriedade alheia às
normas de direito ambiental, bem como no incentivo à produção
irregular e na omissão em exigir a adequação da atividade.

Tais fatos são inegavelmente antijurídicos, porque


ferem a um só tempo a Lei de Crimes Ambientais e a Lei nº
6.938/86, como se observou nos itens anteriores.

5.1.2. Nexo de imputação – responsabilidade objetiva

Para o mesmo professor Fernando Noronha, ainda é


pressuposto necessário à configuração da responsabilidade civil
“que esse fato possa ser imputado a alguém, seja por se dever à
atuação culposa da pessoa, seja por simplesmente ter acontecido
no decurso de uma atividade realizada no interesse dela”5.

E, como se nota claramente pela prova produzida no


curso das investigações civis levadas a efeito pelo Ministério
Público, o fato narrado nesta ação deve ser imputado não apenas
ao produtor rural (que por isso já foi responsabilizado
4
NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. São Paulo : Saraiva, 2003, p. 468.
5
Idem, p. 468.

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criminalmente e deverá suportar a adequação de sua


propriedade), mas também e prioritariamente à agroindústria,
representada aqui pela Seara Alimentos S.A. já que a conduta
ocorreu no decurso de atividade realizada no interesse
dela própria.

É preciso recordar neste ponto que a responsabilidade


pelos danos ambientais é do tipo objetiva e, por esse motivo, não
se traz aqui qualquer argumentação sobre culpa da agroindústria
ou do produtor rural.

Novamente cita-se o autor catarinense para observar


que “quem exerce profissionalmente uma atividade econômica,
organizada para a produção ou distribuição de bens e serviços,
deve arcar com todos os ônus resultantes de qualquer evento
danoso inerente ao processo produtivo ou distributivo, inclusive os
danos causados por empregados e prepostos”6.

O próprio parágrafo único do art. 927 do Código Civil já


contém regra explícita a respeito: “Haverá obrigação de reparar o
dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em
lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor
do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de
outrem”.

Assim, está presente também no caso dos autos o nexo


de imputação, segundo pressuposto da responsabilização civil.

5.1.3. Dano e nexo de causalidade

Continua Fernando Noronha informando ser


pressuposto da responsabilização civil “que tenham sido
6
Idem, p. 486.

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produzidos danos; que tais danos possam ser juridicamente


considerados como causados pelo ato ou fato praticado, embora
em casos excepcionais seja suficiente que o dano constitua risco
próprio da atividade do responsável, sem propriamente ter sido
causado por esta”7.

Novamente aqui estão presentes os pressupostos no


caso específico dos autos. Evidentemente foram produzidos
danos, porque a simples operação de atividade em desacordo com
a licença ambiental, ainda mais quando se trate de suinocultura
(atividade de grande potencial poluidor), por si só causa dano
ambiental. Além do mais, como constatado pelo relatório do auto
de infração ambiental, as esterqueiras existentes transbordavam
constantemente, levando os dejetos diretamente à estrada
próxima da propriedade.

A atividade da requerida, por sua vez, é causa dos


danos, no sentido jurídico do termo. Além do evidente nexo de
causalidade com a conduta do produtor rural, também a conduta
da Seara Alimentos causou o dano descrito, já que não fosse a
promessa de aquisição dos suínos e a omissão na exigência do
respeito às normas ambientais não haveria sequer poluição.

Vale anotar aqui, quanto ao nexo de causalidade, que


para os fins da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente
considera-se poluidor “a pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental”8.

7
Idem, p. 468-469.
8
Art. 3º, IV, da Lei nº 6.938/86.

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A doutrina mais moderna, já calcada nos princípios


ambientais do poluidor-pagador, da prevenção e da precaução,
ensina ser necessário considerar como poluidor aquele que “tem
poder de controle sobre as condições que levam à ocorrência da
poluição, podendo portanto preveni-las ou tomar precauções para
evitar que ocorram”9.

Como é evidente, a requerida Seara Alimentos S.A. tem


total controle sobre as condições que levam à poluição, pois, como
visto no decorrer da instrução do procedimento investigativo,
controlam todo o ciclo produtivo, fornecendo ração, vacinas,
assessoria técnica ambiental e veterinária.

Assim, presentes os pressupostos da responsabilização


civil (fato antijurídico, nexo de imputação, dano e nexo de
causalidade), deve ser imposto à requerida o dever de recuperar a
área degradada pelo dano ambiental e compensar a Natureza
pelos danos causados.

A compensação é necessária, porque é evidente que a


recuperação adequada levará anos e, por princípio básico de
direito, não poderá haver dano sem reparação. Além disso, tem a
compensação a função de sancionar e dissuadir os poluidores em
suas condutas futuras.

6. Compensação ambiental

Como é óbvio, os danos já ocorridos, causados por


meses de poluição, e o desrespeito às normas de proteção
ambiental, não pode ser reparado diretamente. É preciso, pois,

9
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Ambiental: parte geral. 2ª ed. São
Paulo : Revista dos Tribunais, 2005, p. 307, citando Maria Alexandra de Sousa Aragão.

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indenização em dinheiro, decorrência natural da adoção pelo


direito brasileiro do princípio poluidor-pagador.

Cristiane Derani, dissertando sobre o princípio,


sintetiza-o da seguinte forma: “durante o processo produtivo, além
do produto a ser comercializado, são produzidas ‘externalidades
negativas’. São chamadas externalidades porque, embora
resultantes da produção, são recebidas pela coletividade, ao
contrário do lucro, que é percebido pelo produtor privado. Daí a
expressão ‘privatização de lucros e socialização de perdas’,
quando identificadas as externalidades negativas. Com a
aplicação do princípio do poluidor-pagador, procura-se
corrigir este custo adicionado à sociedade, impondo-se sua
internalização. Por isto, este princípio é também conhecido
como o princípio da responsabilidade”10.

Em outras palavras, o poluidor é responsável pela


indenização do custo social de sua atividade poluente, devendo
por ela ser responsabilizado.

Bem por isso – vale lembrar novamente – a Lei da


Política Nacional do Meio Ambiente determina que “é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar
ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a
terceiros afetados por sua atividade”11.

Assim, presente o dano extrapatrimonial, e presente o


nexo de causalidade entre o dano e a conduta da requerida, nasce
o dever de repará-lo, cabendo indenização pelos danos causados –

10
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 4ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005. p.
164.
11
Art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81.

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por todos os danos –, motivo pelo qual entende-se ser devida


indenização.

Tal indenização, como é natural em sede de direitos


difusos, deverá reverter ao fundo de reconstituição de bens
lesados (art. 13 da Lei nº 7.347/85). Em Santa Catarina, o Fundo
para Reconstituição dos Bens Lesados foi criado pelo Decreto nº
1.047, de 10 de dezembro de 1987.

7. Pedidos

Ante o exposto, requer o Ministério Público:

a) o recebimento, registro e autuação da presente ação


civil pública;

b) a citação da requerida para, querendo, apresentar a


defesa que entender pertinente;

c) a produção de todos os meios de prova admitidos,


notadamente a prova pericial, depoimento pessoal, prova
documental e testemunhal, se for necessário;

d) a condenação da requerida a recompor o dano


ambiental causado com a soltura de 30.000 alevinos e o plantio de
1000 mudas de árvores nativas, metade delas araucárias;

e) a condenação da requerida ao pagamento de


compensação ambiental decorrente de sua conduta poluidora, em
valor a ser arbitrado na sentença, não inferior a R$ 50.000,00, em
favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados do Estado de
Santa Catarina;

f) a condenação da requerida em custas, despesas


processuais e honorários advocatícios (estes conforme art. 4º do

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Decreto Estadual nº 2.666/04, em favor do Fundo de Recuperação


de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina).

Dá-se à causa o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil


reais).

Seara, 3 de julho de 2009

Eduardo Sens dos Santos


Promotor de Justiça

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