Você está na página 1de 6

V SEPRONe – Maceió, AL, Brasil - 2010

Estudo de Caso das Práticas Ergonômicas em uma Fábrica de Meias e


Caneleiras
Resumo
O foco desse trabalho foi uma linha de produção de meias e caneleiras em um sistema
produtivo. As operações realizadas nos processos se caracterizam por tarefas de caráter
bastante repetitivo, esse é o perfil do setor de meias, bem como, o de caneleiras, sendo
necessário constatar as ações realizadas para combater a LER/DORT. Tem-se objetivo em
realizar entrevistas com os trabalhadores, identificando com eles as ações técnicas que
envolvem desconforto, dificuldade, fadiga excessiva e mesmo dolorimento e com o auxílio de
check list observar as situações ergonomicamente inadequadas, riscos para o organismo e
medidas de melhoria ergonômica.
Palavras-chave: Ergonomia, Linha de Produção, Saúde Ocupacional.
1. Introdução
A ergonomia estuda a adaptação do homem ao trabalho. Isso envolve o ambiente físico, como
também o organizacional, abrangendo toda a situação em que ocorre no relacionamento entre
o homem e uma atividade produtiva. Portanto, pode-se dizer que essa ciência estuda as
relações do homem com a tecnologia, organização e ambiente, com a aplicação dos
conhecimentos de anatomia, fisiologia e psicologia no intuito de solucionar os problemas que
surgem dessas relações. Esse estudo objetiva influenciar o desempenho no sistema produtivo,
visando melhorar a segurança, a satisfação, a saúde e a eficiência dos trabalhadores durante o
seu relacionamento no seu trabalho (IIDA, 2005).
A postura e movimento corporal têm grande importância na ergonomia, eles são determinados
pela tarefa e pelo posto de trabalho. Posturas e movimentos inadequados produzem tensões
mecânicas nos músculos, ligamentos e articulações resultando em dores, além disso, podem
apresentar um gasto energético que exige muito dos músculos, coração e pulmões. Por isso,
torna-se necessário observar, analisar e decidir a melhor forma de execução das tarefas e
como aplicar medidas para melhorar o posto de trabalho (DUL e WEERDMEESTER, 2004).
Segundo Dul e Weerdmeester (2004), a biomecânica, a fisiologia e a antropométria são áreas
do conhecimento que auxiliam na formulação de recomendações para as atividades laborais.
Os fatores ambientais de natureza física e química, tais como ruídos, vibrações, iluminação,
clima e substâncias químicas, que podem afetar a saúde, a segurança e o conforto dos
trabalhadores na execução de suas tarefas também são abordados pela ergonomia.
As lesões por esforços repetitivos (LER) é o nome dado a sintomas dolorosos que acometem
tendões, músculos, nervos, ligamentos e outras estruturas responsáveis pelos movimentos de
membros superiores e inferiores. Os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho, que
se constituem em doenças ocupacionais que estão relacionadas a lesões pro traumas
cumulativos, sendo resultado de uma descompensação entre capacidade de movimentação da
musculatura e a execução de esforços rápidos e constantes. A LER/DORT já são considerados
doenças epidêmicas no Brasil, tendo registrado 30 mil casos/ano. Além de um problema de
saúde, tem implicado um grande desperdício de capacidades produtivas e, portanto, representa
um enorme prejuízo para as empresas (OLIVEIRA, 2006).
Segundo Lima (2007), a ginástica laboral pode ser conceituada como um conjunto de práticas
físicas elaboradas a partir da atividade profissional exercida durante o expediente, visando
compensar as estruturas mais utilizadas no trabalho, relaxando e tonificando-as, e ativar as
que não são tão requeridas. A mesma consiste em exercícios específicos, realizados no
próprio local de trabalho, atuando de forma preventiva e terapêutica. Com isso, espera-se
prevenir a fadiga muscular, diminuir o índice de acidentes do trabalho, corrigir vícios
V SEPRONe – Maceió, AL, Brasil - 2010

posturais, aumentar a disposição do funcionário no inicio e no retorno do trabalho e prevenir


as doenças por traumas cumulativos como a LER/DORT.
Através dos conhecimentos da ergonomia pode-se identificar a incidência de posturas e
movimentos incorretos que podem causar dores, fadiga, estresse e doenças, além de apontar
quais os postos de trabalho colocam os trabalhadores em risco, bem como, identificar
exposições nocivas dos trabalhadores há os fatores ambientais. Esses dados podem ser
extremamente úteis para uma análise da evolução do problema dentro da empresa e a
determinação, através de entrevistas e auditorias, dos principais motivos ou modificações
realizadas durante determinados períodos que levam os trabalhadores ao risco (DIAIS et al,
2002).
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Mini-fabrica é uma sub-área de produção dos variados processos e modelos existentes na
empresa, sendo o foco da pesquisa a linha de produção de meias e caneleiras. A mini-fabrica
divide-se em dois macros setores de produção, sendo cada setor responsável por uma linha de
produto. O setor de meias é bastante automatizado, devido às máquinas de tecelagem. Já o de
caneleiras é mais manual. Principais insumos utilizados no processo: fio de nylon, EVA,
tintas base de água.
1.2 CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA
Conforme observado na visita inicial, as operações realizadas nos processos se caracterizam
por tarefas de caráter bastante repetitivo, esse é o perfil do setor de meias, bem como, o de
caneleiras, sendo necessário constatar as ações realizadas para combater a LER/DORT.
Notou-se inicialmente, que algumas máquinas não possuem nenhum sistema de ajuste aos
perfis antropométricos dos operadores. Outro fator de risco identificado é o ruído excessivo e
contínuo. De forma geral a mini-fabrica não possui nenhum sistema de climatização.
1.3 OBJETIVO GERAL
Busca-se nesta pesquisa realizar uma análise qualitativa, realizando uma avaliação das
condições de trabalho basicamente através da observação da forma com que se trabalha e de
entrevistas com os trabalhadores e encarregados. Para tanto, essa análise será realizada com
base nos conceitos de ergonomia, procurando verificar se as características antropométricas,
fisiológicas e biomecânicas do trabalhador estão sendo seguidas naquela condição de
trabalho. Além disso, identificar possíveis exposições dos trabalhadores ao risco por fatores
físicos, químicos e ambientais.
1.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Realização de entrevista com os trabalhadores, identificando com eles as ações técnicas que
envolvem desconforto, dificuldade, fadiga excessiva e mesmo dolorimento. Promover nos
trabalhadores a percepção às melhorias necessárias visando eliminar o desconforto e as
dificuldades. Observação de situações ergonomicamente inadequadas, riscos para o
organismo e medidas de melhoria ergonômica.
1.5 JUSTIFICATIVA
No mundo globalizado em que se vive nos dias atuais a busca da qualidade total por uma
empresa não pode deixar de considerar as condições de trabalho do seu funcionário. Para a
empresa é vantajoso investir em programas de ergonomia para a prevenção de acidentes, da
fadiga, do stress e de doenças relacionadas ao posto de trabalho (LER/DORT), pois além de
melhorar a qualidade de vida de seus empregados, estes programas propiciam a diminuição de
gastos com assistência médica por doenças ocupacionais; a redução do índice de absenteísmo;
V SEPRONe – Maceió, AL, Brasil - 2010

o aumento na eficiência do trabalho humano e a diminuição da rotatividade do quadro de


empregados da empresa. Enquanto para o trabalhador, as vantagens também são diversas, já
que estes programas levam à diminuição da fadiga e do desconforto físico, com conseqüente
diminuição da irritabilidade do empregado; há diminuição do gasto energético na execução
das tarefas, do estresse emocional e da incidência de doenças ocupacionais, além de favorecer
a socialização do trabalhador com o grupo de trabalho e melhorar a sua qualidade de vida
(DIAS et al, 2002).
2. MATERIAL E METODOS
Realizar uma análise qualitativa com os funcionários, através de entrevistas por amostragem
de 30% dos colaboradores da linha de produção. Para as entrevistas foram utilizados os
questionários de avaliação de fadiga e de práticas ergonômicas inadequadas (censo
ergonomia). Os questionários foram obtidos e adaptados dos questionários de Couto. Também
foi realizada uma avaliação de distúrbio musculoesquelético de membros superiores
relacionados ao trabalho através de uma auditoria com auxilio de Check list, adapatado da
Chek list de Couto. Para a avaliação de exposição a algum tipo de risco inerente a fatores
ambientais foi utilizada uma lista de verificação adaptado de Dul e Weerdmeester (2004).
Durante a visita também se observou às condições ergonômicas dos postos de trabalho, bem
como, a exposição ao risco na operação de máquinas.
3. RESULTADOS E DISCURSSÕES
A entrevista realizada com auxílio do censo de ergonomia foi útil para analisar a opinião do
colaborador. Através dela o trabalhador expressou sua percepção a respeito do posto de
trabalho e da atividade que executa, informando se sente ou não desconforto, dificuldade ou
fadiga, em que intensidade, se está relacionado ou não ao trabalho que executa e, ao mesmo
tempo, deu sugestões do que melhorar no posto de trabalho. No entanto, é necessária uma
postura crítica inerente ao tipo de resposta, olhando o resultado da mesma e confrontando-a
para se obter um melhor entendimento da real situação.
Os dados obtidos foram plotados em gráficos que resumem os resultados obtidos. Na figura 1
o gráfico apresenta a incidência de desconforto por membros, a análise do mesmo revela que
o ombro é membro mais afetado, ou seja, aquele que o operador sente mais desconforto na
jornada de trabalho, seguido de pernas e coluna. Isso pode ser explicado pelo fato das
atividades serem efetuadas em posturas estáticas em pé ou sentado e com a manipulação de
pequenas peças.

Figura1 – Incidência de desconforto por membros


V SEPRONe – Maceió, AL, Brasil - 2010

Além disso, o maior desconforto é o dolorimento, o segundo é o cansaço, e as mesmas


ocorrendo durante a jornada de trabalho, conforme apresentado respectivamente pelas figuras
2 e 3. Outra informação relevante da entrevista, é que os colaboradores informam que esse
desconforto só se reduz ou para durante os finais de semana, ou até mesmo não melhora com
o descanso (figura 4). Apesar dos sintomas de desconforto, 96% dos trabalhadores afirmam
não fazerem nenhum tipo de tratamento médico e 72% afirmam que já se automedicaram com
uso de emplastos e medicamentos do gênero (figura 5).

Figura 2 – Tipo de Desconforto

Figura 3 – Intensidade do Desconforto em Função do tempo

Figura 4 – Redução do Desconforto em Função do Tempo


V SEPRONe – Maceió, AL, Brasil - 2010

Figura 5 – Tratamento Medido e Medicação na Jornada de Trabalho

Como forma de constatar e confrontar os dados obtidos com a entrevista foi realizado uma
auditoria na linha de produção com o auxílio do check list do Couto para avaliação do fator
biomecânico para distúrbios musculoesqueléticos de membros superiores relacionados ao
trabalho. Os resultados são apresentados a seguir.

Figura 6 – Avaliação Fator Biomecânico

Pode-se observar que a linha caneleira apresenta no geral um fator de moderada importância
inerente ao fator biomecânico, enquanto a linha de meias possui um fator de risco, essa
classificação foi realizada conforme descrita por Couto (Figura 5). Através da coleta de dados
da auditoria percebeu-se que esses funcionários estão expostos a dois riscos biomecânicos, a
alta repetitividade na realização das atividades e a postura estática dos trabalhadores. Em
relação à NR-9, exposição ao risco por fatores ambientais, pode-se afirmar que na unidade
fabril visitada não existem problemas com vibração nem com substâncias químicas, devido
aos tipos de processos existentes. A iluminação do local pode ser considerada adequada, pois
não há trabalhos especiais que necessitem de uma quantidade de lux diferenciada. Um ponto
em que se deixa a desejar é a reflexão da luz em alguns móveis presentes na linha de
produção. Outro importante item a ser citado é o nível de ruído encontrado na unidade,
estando abaixo do limite tolerável de 80 decibéis. Além disso, há o limitante de propagação
V SEPRONe – Maceió, AL, Brasil - 2010

de ruído em cada funcionário com a utilização de EPI de proteção auricular. A unidade fabril
não consegue se adaptar as condições climáticas do local, havendo desconforto proporcionado
pelo ambiente com temperatura acima dos 25°. A figura 6 apresenta os dados inerentes ao
risco por fatores ambientais.

Figura 7 – Avaliação Fator Ambiental

Fica como sugestão primeiramente, a necessidade de instalação de um melhor sistema de


ventilação da área de produção da unidade fabril, o que causaria um menor desconforto em
todos os funcionários. Outra medida a ser adotada seria a troca das mesas de embalagens do
produto final, as quais possuem superfícies brancas refletoras por outra de material opaco
(superfície difusora), diminuindo assim o prejuízo ao sentido da visão e melhorando a
produtividade.
4. CONCLUSÃO
Em geral, a empresa atende as medidas ergonômicas exigidas, no entanto, existem
possibilidades de melhoria. Entre as mesmas pode-se citar a repetitividade na execução das
atividades sem uma rotatividade definida nas funções, o esforço estático (em pé, sentado e
ombro) na operação de alguns postos de trabalho e o clima do ambiente que possui uma
temperatura excessiva. As constatações obtidas pelas auditorias sugerem uma concordância
com os quesitos apontados pelos colaboradores nas entrevistas, como por exemplo, a
repetitividade inerente na execução na maioria das operações que pode levar a ocorrência de
dolorimento e em casos mais extremos a LER/DORT. Um ponto positivo observado foi à
realização da ginástica laboral e a área de jogos que auxilia nos contatos sociais.
Referências
DUL. J.; WEERDMEESTER. B. Ergonomia Prática . 2 ed. São Paulo: Edgard Blucher,
2004
DIAS. L.R. et. al. Análise de fatores ambientais e a relação com aspectos subjetivos entre
funcionários de uma agência bancária. Revista Kinesis, n.26, p. 9-166, 2002.
http://www.ergoltda.com.br/checklist/index.html, acesso 14/09/2009
IIDA, I. Ergonomia: Projeto e Produção. 2 ed. São Paulo: Edgard Blucher, 2005.
LIMA, V. Ginástica laboral: atividade física no ambiente de trabalho. 3. ed. São Paulo:
Phorte, 2007.
OLIVEIRA, J.R.G. A prática da ginástica laboral. 3. ed. Rio de Janeiro: Sprint, 2006

Você também pode gostar