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Casal
Perfeito
By Lya
Luft
A solidão dos
homens tem a
medida da solidão
de suas mulheres.
Isso eu disse e
escrevi - e repito -
em dezenas de
palestras por este
país afora. Aí me
pedem para
escrever sobre o
casal perfeito: bom
para quem gosta de
desafios.
O casal perfeito seria o que
sabe aceitar a solidão
inevitável do ser humano,
sem se sentir isolado do
parceiro - ou sem se isolar
dele? O casal perfeito seria o
que entende, aceita, mas não
se conforma, com o desgaste
de qualquer convívio e
qualquer união? Talvez se
possa começar por aí: não
correr para o casamento, o
namoro, o amante (não
importa) imaginando que
agora serão solucionados ou
suavizados todos os
problemas - a chatice da casa
dos pais, as amigas ou
Não cair nos braços do outro
como quem cai na armadilha
do "enfim nunca mais só!",
porque aí é que a coisa
começa a ferver. Conviver é
enfrentar o pior dos inimigos,
o insidioso, o silencioso, o
sempre à espreita, o
incansável: o tédio, o
desencanto, esse inimigo de
dois rostos.
Passada a primeira fase de
paixão (desculpem, mas ela
passa, o que não significa
tédio nem fim de tesão), a
gente começa a amar de outro
jeito.
A querer bem; a apreciar; a
respeitar; a valorizar; a
mimar; a sentir falta; a
conceder espaço; a querer
que o outro cresça e não fique
grudado na gente. O cotidiano
baixa sobre qualquer relação
e qualquer vida, com a poeira
do desencanto e do cansaço,
do tédio. A conta a pagar, a
empregada que não veio, o
filho doente, a filha
complicada, a mãe com
Alzheimer, o pai deprimido ou
simplesmente o emprego sem
graça e o patrão de mau
humor.
E a gente explode e quer
matar e morrer, quando cai
aquela última gota - pode ser
uma trivialíssima gota - e nos
damos conta: nada mais é
como era no começo.
Nada foi como eu esperava.
Não sei se quero continuar
assim, mas também não sei o
que fazer. Como a gente não
desiste fácil, porque afinal
somos guerreiros ou nem
estaríamos mais aqui, e
também porque há os filhos,
os compromissos, a casa, a
grana e até ainda o afeto, é
preciso inventar um jeito de
recomeçar, reconstruir.
Na verdade devia-se
reconstruir todos os dias. Usar
da criatividade numa relação.
Maio de 2007
gislenesoares@hotmail.com