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Cumprimento de sentença – Art. 475-J do CPC (Lei 11.

232/05)

Alexandre Catharina – Professor de Direito Processual Civil

1 – Introdução

O processo de execução passou por diversas transformações nos últimos


anos ensejando, por assim dizer, uma nova execução. A principal
característica da nova execução, sobretudo no que diz respeito aos
títulos executivos judiciais, é criação do processo sincrético onde a
execução passa a ser apenas uma fase do processo e não mais um
processo autônomo.

Esta mudança tem reflexos importantes na prática da fase executiva


pois a execução é um mero desdobramento da fase de conhecimento. A
fase executiva inicia-se com o cumprimento de sentença conforme
dispõe o art. 475-J do Código de Processo Civil e desenvolve-se como
continuidade da fase de conhecimento. É importante dizer que a
execução de títulos executivos extrajudiciais permanece como um
processo autônomo, pois a certeza, liquidez e exigibilidade já estão
presentes no título, o que dispensa um processo de conhecimento onde
as partes debateram exaustivamente.

O objeto do presente estudo é a execução de título judicial que


doravante será denominada de cumprimento de sentença.

2 – Cumprimento de sentença - Considerações introdutórias

O cumprimento de sentença, como visto, constitui numa fase do


processo sincrético através da qual serão realizados atos materiais para
a satisfação do crédito do exeqüente. No entanto, esta sistemática
comporta algumas exceções. Existem alguns títulos que são
considerados judiciais pelo art. 475-N do CPC mas que serão executados
através de um processo autônomo de execução como a sentença penal
condenatória (art. 475-N, II); a Sentença Arbitral (art. 475-N, IV); a
Sentença Estrangeira (art. 475-N, VI) e a execução de título judicial em
face da Fazenda Pública (art. 730).

Nestes casos a execução far-se-á através de um processo autônomo


pois o órgão judicial que vai promover a execução do título não
conheceu da matéria em primeiro grau de jurisdição. Por tal motivo o
processo será autônomo o que permite um alargamento das matérias
que serão objeto da defesa do executado e uma cognição mais ampla do
órgão julgador.

Uma segunda consideração introdutória se faz necessária. O


cumprimento de sentença que condenam o executado a realizar uma
obrigação de fazer ou entrega de coisa será feita pelo art. 461 e 461-A
do CPC, conforme dispõe o art. 475-I. Nestes casos o cumprimento de
sentença não se fará pelo procedimento do art. 475-J e sim pela
sistemática dos artigos mencionados acima.

Após estas breves considerações resta claro que somente se aplica o


procedimento do art. 475-J nas execuções de quantia certa, ou seja
quando o devedor tem que pagar quantia em dinheiro.

3 - Cumprimento de sentença – Instauração do procedimento

Aspectos polêmicos

Conforme se depreende do art. 475-J do CPC, uma vez que a obrigação


de pagar não foi cumprida voluntariamente pelo devedor surge a
possibilidade de se instaurar o procedimento de cumprimento de
sentença. Segundo o mencionado artigo, se o devedor não pagar no
prazo de quinze dias, será aplicada a multa de 10% e a fase executiva
tem seu início.

A primeira polêmica concerne sobre o próprio início do procedimento


de cumprimento de sentença. Com o estabelecimento do processo
sincrético, em que a execução de sentença judicial é um mero
desdobramento da fase de conhecimento, alguns autores entendem que
não há necessidade do exeqüente promover a execução. Entende este
segmento da doutrina que o próprio juiz pode instaurar o procedimento
de cumprimento de sentença. Esta corrente tem como um de seus
defensores Fredie Didier Jr.1

O entendimento majoritário, capitaneado por Humberto Theodoro Jr.,


sustenta que o próprio art. 475-J, § 5° é claro ao dizer que se o credor
não requerer a execução no prazo de seis meses o juiz mandará
arquivar os autos.

Assim, na prática, dúvida parece não haver que o exeqüente deva


promover, através de simples petição com os cálculos atualizados, o
cumprimento de sentença.

1
In Curso de Direito Processual Civil. Vol. 5, pág. 518.
A segunda polêmica versa sobre o momento em que o prazo de 15
dias para o cumprimento voluntário da obrigação de inicia. Inicia-se com
a publicação da sentença ou tão somente com o trânsito em julgado?

Segundo Humberto Theodoro Jr, o momento em que se inicia-se o prazo


para cumprimento voluntário com o trânsito em julgado, ou seja quando
a execução for definitiva. Para este autor o prazo para cumprimento não
se inicia antes do trânsito em julgado.

José Miguel Medina2 diferencia momento da incidência de momento da


cobrança. Para este autor transcorrido o prazo de 15 dias, independente
de recurso, o multa já incide. No entanto, a cobrança somente pode ser
levada a efeito no momento da execução forçada.

Marinoni, por sua vez, entende que a multa incide após o decurso do
prazo, salvo nas hipóteses em que o recurso tem efeito suspensivo.

A terceira polêmica criada pelo art. 475-J diz respeito a forma através
da qual o devedor será intimado para pagar em 15 dias. Será através de
intimação pessoal ou através de seus advogado?

A doutrina e a jurisprudência não são uníssonas neste aspecto.

Alexandre Câmara3 entende que o prazo de 15 dias deve se iniciar com


a intimação do devedor pois é este quem tem que satisfazer a
obrigação. Segundo o autor se o art. 475-J nada fala, aplica-se a regra
geral que está disposta no art. 240 do CPC. Nesta mesma linha de
raciocínio, também defendem a intimação pessoal do devedor José
Miguel Medina, em Processo Civil Moderno, Vol. 3, pág. 221.

Destoando deste entendimento, Humberto Theodoro Junior entende que


a execução não é um novo processo que enseje nova citação ou
intimação pessoal do devedor. Neste sentido, defende o referido autor
que a intimação deve ser feita somente através do advogado do
devedor vez que o prazo do art. 475-J é efeito legal da sentença e não
fruto de assinação particular do juiz, donde inexistir outra intimação que
não aquela normal do ato judicial ao advogado da parte condenada a
pagar quantia certa.4

Luiz Guilherme Marinoni5 entende, também, que a intimação pode se dar


através do patrono do devedor. Tal entendimento está assentado na
jurisprudência do STJ que firmou entendimento no sentido de o prazo

2
Curso de Processo Civil Moderno, pág. 218.
3
Lições de Direito Processual, Vol. II, 16° ed, pág. 307.
4
Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, 42° ed, pág. 54.
5
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo. Ed. Revista dos Tribunais.
começar a correr independente de intimação. O Julgado em síntese diz o
seguinte:

“Não é necessário a intimação pessoal do condenado para que


corra o prazo de 15 (quinze dias) para o cumprimento da
sentença condenatória ao pagamento da quantia (STJ, 3° Turma,
Resp 954.859/RS, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. em
16.08.2007)”

Segundo entendimento do julgado acima, o prazo começa a correr do


trânsito em julgado independente de intimação.

Fredie Didier Jr comunga, também, do entendimento de que a intimação


deve ser feita através do patrono do devedor, conforme sustenta em seu
Curso de Direito Processual Civil, Vol. 5, pág 518.

Note-se que a questão é controvertida e ainda não foi pacificada pelo


STJ.

A quarta polêmica refere-se ao pagamento de honorários advocatícios


na fase executiva. Autores como Cândido Rangel Dinamarco e Alexandre
Câmara defendem a fixação de honorários na fase executiva. Embora
este entendimento esteja se consolidando, há vozes dissonantes no
sentido de entender que não é cabível honorários na fase executiva.

Importante registrar que o art. 20, §4°, do CPC é claro ao dizer que na
execução será cobrado honorários. É razoável entender que embora o
cumprimento de sentença constitua-se em uma nova fase do processo
esta não seria necessária se o devedor satisfizesse a dívida no prazo
fixado.

4 – Possíveis atitudes do executado

Após a penhora, que poderá ser de valor depositado em conta, o


executado será intimado do auto de penhora e avaliação, conforme
dispõe o art. 475-J, 1°, do CPC. A penhora antes da intimação se justifica
pois o devedor teve o prazo de 15 dias para satisfazer a obrigação. Não
havendo o pagamento voluntário haverá a penhora de bens do
executado, para somente depois este ser intimado da mesma.

O executado, após a intimação da penhora, pode realizar alguma


atitudes. a) Pagar o débito; b) Efetuar o depósito parcial (art.475-J, §4°) ;
c) Impugnar no prazo de 15 dias( art. 475-J, § 1°) ou d) ficar inerte.

Se pagar o débito o procedimento encerra-se. Se pagar parte do débito


a multa incidirá sobre o restante e o procedimento prossegue com a
expropriação dos bens do executado para satisfação do crédito. Se
impugnar, o procedimento estabelecido nos arts. 475-L e 475-M, ambos
do CPC.

5 – Defesa do executado. Modalidades.

O executado pode apresentar defesas contra a execução, seja ela


cumprimento de sentença ou processo autônomo de execução. No
processo autônomo de execução e a defesa será feita através de
Embargos à Execução nos termos do art. 736 e seguintes do CPC.

As defesas apresentadas pelo devedor no processo sincrético devem ser


veiculadas na impugnação. Ao contrário dos Embargos à Execução, que
possui natureza jurídica de ação autônoma incidental, a impugnação
possui natureza de incidente ocorrido na fase executiva do processo
sincrético.

Existe, ainda, uma terceira modalidade de defesa do executado


denominada de exceção ou objeção de pré-executividade. Trata-se de
uma defesa, deduzida a qualquer tempo, quando a matéria a ser
alegada é de ordem pública. Não encontra respaldo no ordenamento
jurídico-processual brasileiro mas tem fundamento constitucional,
sobretudo no princípio do amplo acesso à justiça, art. 5°, XXXV, CF/88.

6 – Impugnação – Matérias que podem ser deduzidas

O art. 475-L do CPC é taxativo ao elencar as matérias que poderão ser


veiculadas na impugnação. Buscou o legislador processual evitar que as
discussões que foram superadas na fase de conhecimento fossem
reanimadas na fase executiva causando prejuízo à efetividade da
jurisdição ou servissem de meios protelatórios utilizados pelo devedor.

Pode-se, também, ser matéria de defesa do executado a coisa julgada


inconstitucional, conforme dispõe o art. 475-L, §1°, do CPC. A sentença
baseada em leis ou atos normativos declarados inconstitucionais ou
incompatíveis com a Constituição Federal de 1988 configura
inexigibilidade do título o que acarreta a extinção da execução.

Por fim, quando o executado alegar excesso de execução (art. 743-C do


CPC), deve dizer, de imediato, o valor que entende correto, sob pena de
ser rejeitada a impugnação, conforme se depreende da leitura do art.
475-L, §2°, do CPC.

7 – Procedimento da Impugnação
Após a apresentação da impugnação, a fase executiva terá seu curso
normal com a expropriação dos bens do devedor, salvo se este alegar
que o prosseguimento da execução pode causar danos de difícil
reparação, conforme dispõe o art.475-M do CPC. Nestes casos a
execução será suspensa até o julgamento da impugnação. Caso haja
interesse do exeqüente em prosseguir na execução após a suspensão,
este deve prestar caução nos termos do art. 475-M, §1°, do CPC.

Após a instrução, o juiz resolverá a impugnação. Trata-se de decisão de


natureza interlocutória e poderá ser impugnada através do recurso de
agravo de instrumento. Quando o acolhimento da matéria alegada
ocasionar a extinção do processo, o recurso cabível será apelação.

Referências Bibliográficas:

Câmara, Alexandre. Lições de Direito Processual Civil. Vol. II. Ed. Lúmen
Júris.

Didier Jr, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol 5. Ed. Podium.

Dinamarco, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol.


IV. Editora Malheiros.

Marinoni, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil Comentado. Editora


RT.

Medina, José Miguel Garcia. Processo Civil Moderno. Vol. 3. Editora RT.

Theodoro Junior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol II.


Editora Forense.

Wambier, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil. Vol. 2.


Editora RT.

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