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Antnio Torrado
escreveu e Cristina Malaquias ilustrou
Uma grande desgraa respondeu o lenhador. Estava a dormitar, cansado do trabalho, ao fresco da beira-rio, quando o machado me escorregou. Foi para o fundo e eu, que no sei nadar, no tendo machado, fico um intil. Deixe que eu trato disso tranquilizou-o o homem de barbas azuis, despindo a camisa e as calas e tirando meias e sapatos. Mergulhou nas guas do rio, que estava limoso e redemoinhento. Um perigo. Voltou ao cimo com um machado de oiro. este? perguntou. meu senhor, esse no . O meu machado ferramenta de pobre. O homem de barbas azuis mergulhou de novo, para logo voltar superfcie, empunhando um machado de prata. Claro que tambm aquele no era o machado do lenhador. Ao terceiro mergulho trouxe-lhe o machado perdido. E, como s honesto e sincero, levas tambm os outros machados disse-lhe o homem de barbas azuis. Pela primeira vez o lenhador reparou nas barbas do seu benfeitor. Assustou-se, atrapalhou-se e, tartamudeando uns agradecimentos em voz sumida, abalou com os trs machados. Entardecia. Antes de chegar a casa, encontrou um vizinho a quem contou a maravilha, exibindo os machados de oiro e de prata que refulgiam, luz do sol a despedir-se. O vizinho, que vinha da lavoura numa carrocita a desfazer-se, nem quis ouvir a histria segunda vez. Puxou as rdeas e fez a mula trotar por barrancos, at beira do rio. 2
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Estava a noite a descer. O vizinho do lenhador, num afogadilho, desatrelou a mula e atirou a carroa com tudo dentro, ribanceira abaixo. O rio engoliu-a num trago. Depois ainda atirou o relgio, a bolsa com moedas, o colete e a camisa para o meio do rio. E ps-se a gritar, numa grande choradeira: Ai quem me acode, que perdi todos os meus pertences e no sei nadar! Relanceava os olhos cobiosos para as moitas que escureciam, espera do tal bruxo de barbas azuis. De mos nas cavas, tiritando da friagem da noite, gritou e voltou a gritar: Quem me devolve os meus ricos bens, a carroa de prata, com rodas de oiro e a riqueza toda que l ia dentro, mais a camisa e o colete com botes de oiro e a bolsa cheia de libras, mais o relgio de oiro, ai quem me acode?! A mula pastava solta, de dente arreganhado para a ervinha tenra. Ou estaria a rir-se? Mais se ria, socapa, a Lua, cheia e chapada, no meio da noite. E o homem, quase nu, numa aflio, cada vez mais a srio: Quem me salva? Quem me acode? Mas ningum lhe acudiu. FIM
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