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GERAÇÃO DE ELETRICIDADE A PARTIR DE

FONTES RENOVÁVEIS PARA ABASTECIMENTO


DE VEÍCULOS ELÉTRICOS

Campos, M.C. [1], Pugnaloni, I.A.A. [2]

[1] Universidade Federal do Paraná, Setor de Tecnologia, Departamento de Engenharia


Mecânica, Curitiba-PR-Brasil - mccampos@demec.ufpr.br
[2] Enercons Consultoria em Energia, Curitiba-PR-Brasil - ivo@enercons.com.br

Resumo

Este trabalho apresenta uma análise de preços de energia elétrica, com


origem em fontes renováveis, visando abastecimento de veículos elétricos. O
objetivo final será comparar estes preços com valores atuais do preço da
energia equivalente de combustíveis fósseis, no caso a gasolina. Como fonte
renovável de energia via biomassa, considera-se a utilização de florestas
energéticas, calculando o preço final de energia elétrica a partir desta
modalidade em cinco cenários de preços de madeira de reflorestamentos. A
análise comparativa parte de custos unitários de implantação típicos das
fontes renováveis, bem como de seus respectivos fatores de capacidade,
utiliza valores de referência de custos de operação e manutenção, e fixando
percentuais de custos de transmissão, de distribuição, e de ganhos de
investidores e impostos, obtém valores de preços de energia elétrica de fontes
renováveis.

Palavras-chave: Custos de energia renovável, Florestas energéticas, Veículos elétricos.

1. Introdução

São cada vez mais graves as consequências das flutuações dos preços dos
combustíveis fósseis, com variações mais positivas do que negativas, entre eles a gasolina
utilizada nos veículos particulares e de transporte. Os países europeus em geral estão sob forte
pressão inflacionária devido aos altos níveis atuais dos preços dos combustíveis. Sendo assim,
é oportuno rever e analisar os atuais custos de geração de energia elétrica a partir de fontes
renováveis, visando o abastecimento de veículos elétricos no futuro.

Este trabalho apresenta uma análise comparativa de custos de geração de energia


elétrica a partir de quatro fontes renováveis de energia: a hídrica, a eólica, a da biomassa e a
energia solar direta, e ao final realiza uma comparação com o preço equivalente da gasolina.
Não se considerará, neste estudo, os resíduos urbanos como fonte renovável em função da
composição destes resíduos, que podem conter plásticos com origem no petróleo. Nesta
análise excluiu-se também a biodigestão de resíduos da área rural, energia geotérmica e a
energia possível de ser extraída de ondas do mar e marés.
A análise utiliza dados atuais de custos unitários de implantação e de custos unitários
de operação e manutenção respectivos. No caso da geração por biomassa, este trabalho,
utilizará o conceito de florestas energéticas, descrito a seguir, analisando os custos de geração
em função de cenários dos preços de biomassa de reflorestamentos.

Florestas energéticas são áreas constantemente replantadas com determinada espécie


vegetal, ou com variação de espécies, visando abastecer com combustível renovável uma
central térmica com turbina a vapor produzindo energia elétrica. As áreas de manejo florestal
não precisam necessariamente ser contínuas em larga escala, sendo importante estarem
próximas a central térmica, para evitar custos excessivos de transporte.

2. Custos e preço da energia elétrica

Os custos de energia elétrica são compostos de: i) amortização do capital investido na


central, ii) custos de operação e manutenção, iii) custos de combustível (caso da central à
biomassa), iv) custos de transmissão, v) custos de distribuição. O total destes custos serão
aqui denominados custos totais e acrescentando o ganho ou lucro dos investidores e impostos
aos custos totais obtém-se o preço da energia. Os itens i, ii e iii são denominados custos
internos ou custos de geração. Neste trabalho, utilizou-se a nomenclatura de custos ou preço
quando se referencia a custos ou preços por unidade de energia (€/MWh) e custos ou outros
valores absolutos quando se trata de valores monetários (€).

2.1 Fator de capacidade e energia gerada.

Um parâmetro importante que afeta significativamente os custos de geração através de


fontes renováveis é o fator de capacidade de uma central elétrica de cada tipo de fonte.
Devido ao fato de que a fonte de energia nunca é constante ao longo de um determinado
período de tempo, geralmente um ano, o fator de capacidade representará o quanto gera-se
efetivamente de energia em função da potência instalada máxima em uma central. O fator de
capacidade de uma central elétrica inclui os tempos de paradas programada e forçada. Pode-se
então calcular, de maneira simplificada, a energia elétrica gerada anualmente em uma usina
com a seguinte equação:

EG = PINST FC 8.760 (1)

onde EG é a energia elétrica gerada anualmente, em MWh, PINST é a potência elétrica máxima
instalada na central, em MW, FC é o fator de capacidade médio da central, que varia de 0 a 1
e 8.760 é o número de horas em um ano. Alguns valores típicos de fator de capacidade para
centrais utilizando as quatro fonte de energia renováveis são mostradas na figura 1 (Noord et
al, 2004) .

Figura 1 – Fatores de capacidade típicos de centrais de fontes renováveis de energia


Os altos fatores de capacidade de centrais a biomassa estão relacionados com o fato de
que se realiza o armazenamento da biomassa, para um determinado período de tempo de
operação, de modo que é possível manter a geração no nível máximo de potência, durante
grandes intervalos de tempo. Os reservatórios de hidrelétricas podem realizam este processo,
porém, não atingem fatores de capacidade altos. A energia elétrica gerada anualmente
(MWh/ano) em uma usina de 1 MW elétrico, para cada tipo de central, utilizando a equação
(1), estão mostradas na figura 2.

Figura 2 – Energia gerada em uma central de 1 MW para cada fonte (MWh/ano)

2.2 - Peso da amortização do investimento no custo da energia elétrica gerada

Utilizando os valores típicos de custos unitários de implantação, em €/kW, mostrados


na figura 3 (Noord et al, 2004), pode-se calcular valores de investimento de capital para uma
usina de 1 MW em €, que serão os mesmos valores na figura 3, multiplicados por 1.000.

Figura 3 – Custos unitários típicos de centrais de fontes renováveis (€/kW)

Sequencialmente, calculou-se os valores de amortização de capital anual,


considerando-se taxa de juros de 5% e período de amortização de 8 anos, parâmetros que
fornecem um fator de recuperação de capital igual a 0,1547 (Newman e Lavelle, 2000) , para
uma usina de 1 MW, de cada uma das fontes de energia, valores mostrados na figura 4.

Figura 4 - Parcelas de amortização anual de central de 1 MW (€ / n=8 anos / j=5% a.a.)


Dividindo-se o custo anual de amortização pela energia elétrica gerada neste período,
tem-se o peso ou parcela da amortização de capital investido no custo da energia, em €/MWh,
valores mostrados na figura 5.

Figura 5 - Parcela de amortização no custo de geração (€/MWh)

Observa-se o efeito do alto custo de implantação de centrais solares e de seus fatores


de capacidade somente nesta parcela do custo da energia elétrica gerada através desta fonte
diretamente. Estes níveis de custos de energia elétrica são inviáveis para abastecimento de
veículos elétricos, como será observado. Ressalta-se que as três demais fontes são originárias
indiretamente da energia solar, portanto, ao utilizar-se estas fontes pode-se afirmar que
utiliza-se energia solar de forma mais barata. Por estes motivos as centrais solares serão
descartadas para efeito de análise de abastecimento de veículos elétricos.

2.3 - Peso dos custos de operação e manutenção no custo da energia elétrica gerada

Usando os seguintes valores típicos de custos unitários de operação e manutenção,


apresentados na figura 6, calcula-se os custos anuais de operação e manutenção para uma
usina de 1 MW, que serão os valores apresentados na figura 6 multiplicados por 1.000.
Dividindo-se os custos anuais de operação e manutenção pela energia elétrica gerada
anualmente tem-se a parcela deste item, conforme apresentada na figura 7.

Figura 6 - Custos unitários de Operação e Manutenção (€/kW/ano)

Figura 7 - Parcela de O.M. no custo da energia gerada (€/MWh)


2.4 - Soma das parcelas de amortização e os de operação e manutenção no custo da energia

Somando-se os custos anuais de amortização do investimento na usina com os custos


anuais de operação e manutenção, ambos com base na energia elétrica anualmente gerada,
tem-se os valores apresentados na figura 8.

Figura 8 - Soma dos peso dos custos de amortização, operação


e manuteção nos custos de geração - €/MWh

Observa-se pela figura 8 que os valores calculados destas parcelas do custo de geração
por biomassa e por energia hidráulica são as menores dentre as analisadas. Isto ocorre
principalmente em função de seus maiores fatores de capacidade, que pode atingir 0,95 para
centrais a biomassa corretamente projetadas e operadas. O maior custo de geração ocorre para
a geração através de energia eólica, dentre os três tipos acima, principalmente devido aos
menores fatores de capacidade e maiores custos unitários de implantação, apesar dos seus
custos de operação e manutenção serem menores dentre as três fontes analisadas.

2.5 - Peso do combustível renovável nos custos da energia elétrica gerada por biomassa.

Neste trabalho considerou-se o poder calorífico inferior da madeira (PCIm), obtida dos
reflorestamentos, constante e igual a 4.200 kcal/kg, valor equivalente a 17.556 MJ/ton. Para
calcular a quantidade de combustível renovável (madeira) necessária por ano, considerou-se a
eficiência térmica constante e igual a 25%, e utilizou-se a equação:

QAM = 3.600 x EG / (0,25 x PCIm ) (2)

onde QAM é a quantidade anual de combustível (madeira), em ton/ano, EG é a energia


elétrica gerada anualmente, em MWh/ano, e PCIm é o poder calorífico inferior da madeira,
em MJ/ton.

Para os níveis máximo e mínimo de geração de energia elétrica a partir de madeira


utilizados neste trabalho, respectivamente, 7.446 e 8.322 MWh/ano, calculou-se a quantidade
necessária de madeira por ano, utilizando a equação (2), em 6.107 e 6.826 ton/ano, respec-
tivamente. Observa-se, da equação (2), que a relação QAM por EG, será uma constante, uma
vez que a eficiência da central e o poder calorífico da madeira foram considerados constantes.
Esta relação é 0,820 ton/MWh.

De acordo com estas premissas, o peso do custo do combustível renovável no custo da


energia elétrica gerada dependerá somente do preço do combustível. Neste trabalho foram
analisados cinco cenários de preços da madeira para atender a central térmica, iniciando em €
40,00 por ton até € 60,00 por ton. com intervalos de € 5,00 por ton. Estes cenários de preços
da madeira para a central fornecerão pesos de custo de combustível de € 32,80/MWh até €
48,20/MWh com intervalos de € 4,10/MWh.

A figura 9 apresenta a soma dos pesos dos custos de amortização, operação e


manuteção e combustível, para o caso de biomassa, em cinco cenários de preço de
combustível renovável.

Figura 9 - Soma dos peso dos custos de amortização, operação,


manuteção (valores médios) e combustível nos custos de geração - €/MWh

As três formas renováveis de geração estão com os custos internos menores do que €
115,00/MWh, inclusive para a geração através de florestas energéticas com o maior preço de
madeira considerado.

2.7 - Peso da transmissão nos custos da energia elétrica.

Os custos de transmissão de energia elétrica serão considerados aceitáveis, para o


objetivo de abastecimento de veículos elétricos, quando onerarem a energia gerada até no
máximo 5% do valor do custo de geração. Neste trabalho utilizou-se este patamar fixo para
todas as fontes de energia renováveis para simplificar a análise comparativa com a energia
elétrica equivalente dos combustíveis fósseis. A figura 10 mostra os custos internos da energia
elétrica gerada nas centrais, somados aos custos de transmissão.

2.8 - Peso da distribuição nos custos e preço final da energia elétrica.

A distribuição da energia elétrica para veículos pode ser realizada de várias maneiras,
porém, não se definiu uma forma específica de distribuição, neste trabalho. Para quantificar os
custos de distribuição de energia elétrica adotou-se o percentual de 15% sobre os custos
anteriormente calculados, iguais para todas as fontes de energia renováveis. Os custos de
energia elétrica anteriores acrescidos dos custos de distribuíção, são aqui denominados custos
finais e estão mostrados na figura 10.

2.9 - Peso dos impostos e lucros no preço final da energia elétrica para veículos elétricos

Foi também adotado um percentual total único de impostos e lucros dos investidores
no sistema de abastecimento de veículos, incluindo geração, transmissão e distribuição, para
simplificar a comparação com o preço equivalente elétrico da gasolina. O percentual total
único de impostos e lucros adotado foi de 30%. Os custos finais e o preço da energia elétrica
estão mostrados na figura 10.
Figura 10 - Custos e preços de energia elétrica - €/MWh

A figura 11 mostra os valores, em € anuais, dos custos absolutos de distribuição, com


o percentual fixo de 15% sobre os custos internos e de transmissão, nas condições de energia
gerada mínima e máxima, para cada tipo de central de 1 MW, inclusive para os cenários de
preços de madeira, no caso de geração com biomassa. A mesma figura mostra os valores,
também em € anuais, dos montantes absolutos de lucro e impostos calculados com o
percentual fixo de 30% sobre os custos anteriores.

Figura 11 - Custos absolutos de distribuição, lucros e impostos (€ - Centrais de 1 MW)

3 - Preço equivalente elétrico de combustíveis fósseis

Um veículo movido a motor de combustão interna utiliza gasolina, cujo PCI é 44


MJ/kg e densidade em torno de 0,72, ou seja um PCI na base volumétrica de 32 MJ/lit. Sendo
1 MJ igual a 0,277 kWh, pode-se afirmar que abastecer um veículo com motor de combustão
interna com um litro de gasolina será equivalente a abastecer um veículo elétrico com 8,88
kWh ou 0,00888 MWh. O percurso que cada tipo de veículo desenvolve com a mesma
quantidade de energia fornecida dependerá das eficiências destes e de outros fatores externos.

Utilizando o preço de um litro de gasolina igual € 1,33 significa que os veículos com
motores a combustão interna são abastecidos com preços de energia elétrica equivalente a
€ 149,77/MWh (€ 1,33 / 0,00888 MWh).

4 - Análise dos resultados

Era esperado que os preços de energia elétrica de fonte hidráulica fossem os menores,
devido aos fatores de capacidade e custos de implantação desta fonte de energia, sendo o
preço médio calculado com impostos e lucros, mostrado na figura 10, € 83,61/MWh, igual a
55,8 % do preço equivalente elétrico da gasolina, € 149,77/MWh. Outro resultado mostra que
o preço médio da energia eólica, € 134,14/MWh, considerando as premissas adotadas, está
10,4 % abaixo do equivalente elétrico da gasolina, € 149,77/MWh. O preço médio da energia
elétrica gerada com biomassa a € 50,00/ton, € 148,57/MWh, é praticamente igual ao preço
equivalente elétrico da gasolina.

Os valores de preços finais indicados na figura 10 são semelhantes aos indicados por
por Skytte et al (2006), que incluem outras fontes renováveis de energia.

Os resultados mostrados na figura 11 indicam que os valores absolutos de lucros e


impostos, são maiores para centrais a biomassa do que para as demais fontes, para uma
mesma potência instalada. Isto ocorre principalmente devido às maiores quantidades de
energia produzidas pelas centrais de biomassa para uma mesma potência instalada, em
comparação com centrais eólicas e hidrelétricas.

5- Conclusões

De maneira simplificada, e atribuindo percentuais fixos para custos de transmissão,


distribuição, impostos e lucros, foi possível detectar a viabilidade atual de abastecimento de
veículos elétricos por meio de fontes renováveis de energia. Com os resultados obtidos pode-
se afirmar que existe uma significativa atratividade econômica no uso de energia elétrica de
fontes renováveis para a mobilidade.

Os valores de custos de distribuição, lucros e impostos mostrados na figura 11 indicam


claramente que devido a possibilidade de altos fatores de capacidade de centrais a biomassa,
pode-se cobrir os custos de implantação de sistemas de distribuição de energia elétrica para
veículos de modo distribuído em áreas específicas de um país, semelhantes aos atuais postos
de gasolina.

O possível uso de florestas energéticas como uma fonte renovável de energia, ao


contrário do uso de resíduos florestais com fins energéticos, possui a vantagem de concentrar
em determinadas áreas a geração de biomassa necessária para central. Tal vantagem permite o
fornecimento de combustível renovável a custos menores do que o de resíduos florestais,
devido principalmente aos menores custos de coleta por unidade de massa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SKYTTE, K, et al., Electricity from biomass in the European union - with ou without
biomass impor. Biomass & Energy, v. 30, p. 385-392, 2006.

NOORD, M. de, et al., Potencial and costs for renewable electricity generation: a data
overview. ECN-C-03-006, 2004.

NEWMAN, D.G. e LAVELLE, J.P., Fundamentos da engenharia econômica, Rio de


Janeiro: LTC, 2000.

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