Você está na página 1de 15

Boletim da Educação no Brasil, 2009 (versão resumida)

Apresentação
Entender os principais aspectos da educação no Brasil se tornou importante para profissionais das mais
variadas áreas de atuação. Seja para orientar escolhas na vida pessoal ou no trabalho, seja para
compreender como o país se insere no contexto internacional, pais, gestores públicos, economistas e
empresários precisam e querem conhecer os indicadores do ensino no país. Quais são os resultados dos
alunos? Estamos avançando? A mão de obra chega ao mercado de trabalho bem qualificada? Quanto
investimos nas escolas?

O Boletim da Educação no Brasil: Saindo da inércia? foi elaborado justamente para responder a essas
perguntas. O objetivo é apresentar a um público leigo informações atualizadas e confiáveis sobre a situação
da educação no Brasil.

Inspirado nos documentos utilizados nas escolas para avaliar os alunos, o Boletim dá notas a nove temas,
divididos em dois grupos: Diagnóstico e Perspectivas. No primeiro, são apresentados os indicadores de
matrícula, permanência, desempenho dos alunos e equidade. Na segunda parte, são analisados os avanços
na implementação de políticas públicas em cinco áreas consideradas indispensáveis para o
desenvolvimento da educação. São elas: padrões educacionais, sistemas de avaliação, autoridade e
responsabilidade no nível da escola, carreira docente e investimento em educação básica.

Elaborado pela Fundação Lemann, organização sem fins lucrativos, voltada para a melhoria da educação
pública no país, o Boletim da Educação no Brasil faz parte de uma iniciativa do Programa de Promoção da
Reforma Educativa na América Latina e Caribe (Preal), que já publicou mais de 25 boletins da educação na
região.

Nesta versão resumida, encontram-se as notas atribuídas a cada tema e os principais dados e comentários
apresentados no documento. A íntegra da publicação, ainda em versão preliminar, está disponível em
www.fundacaolemann.org.br.

O panorama é preocupante. Esperamos que com as informações em mãos, seja mais fácil fazer pressão
pelas mudanças necessárias – e urgentes.
O boletim da educação no Brasil
Disciplina Conceito Tendência Comentários
Matrículas B Aumentaram sensivelmente, mas ainda há muitas
crianças e jovens fora da escola, especialmente no
ensino médio
Permanência C Apesar de frequentar a escola por alguns anos, os
estudantes não conseguem completar 12 anos de
estudo
Desempenho D Os alunos não aprendem o esperado para sua idade e
estão em clara desvantagem de aprendizado em
comparações internacionais
Equidade C As desigualdades de acesso diminuíram, mas as
oportunidades de educação de qualidade ainda não
são distribuídas de forma equitativa para toda a
população
Padrões D Existem referências curriculares, mas ainda não há
educacionais padrões claros e detalhados que garantam um mínimo
de qualidade em todas as salas de aula
Sistemas de B São bastante avançadas em relações a muitos países,
avaliação mas seus resultados ainda não são usados para
melhorar a qualidade da sala de aula
Autoridade e C Houve descentralização no atendimento, mas as
responsabilidade escolas ainda não podem decidir sobre variáveis
no nível da escola cruciais para o serviço que oferecem
Carreira docente D A escolarização dos professores aumentou, mas a
qualidade dos cursos de formação ainda é precária.
Como consequência, os professores não estão
preparados para a sala de aula
Investimento em C Os recursos públicos disponíveis mostram que
educação básica educação ainda não é prioridade para os brasileiros

Conceitos Tendência

A – Excelente Melhorando
B – Bom
C – Regular Sem tendência definida
D – Insatisfatório
Piorando
1. Diagnóstico: como estão os indicadores de matrícula, permanência, desempenho e
equidade

1.1. Matrículas: Aumentaram em todos os níveis, mas o ensino médio ainda é um desafio

- Começamos a universalização da educação atrasados e ainda não terminamos. Entre 1970 e 2007,
foram criadas mais de 29 milhões de vagas da creche ao ensino médio, sendo dezesseis milhões somente no
ensino fundamental (Gráfico 1). Apesar do avanço, ainda hoje, menos da metade dos jovens entre 15 e 17
anos estão matriculados no ensino médio (Gráfico 2).

Gráfico 1: Evolução do número de matrículas, por nível de ensino (1970-2007)

Fonte: Anuários Estatísticos


IBGE e INEP/MEC.

Gráfico 2: Evolução das taxas líquidas de matrícula, por nível de ensino (1992-2008)

Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de


Domicílios/IBGE. Estimativa do Instituto de Estudos do
Trabalho e Sociedade (IETS).

1.2. Permanência: As crianças e jovens saem da escola antes de completar 12 anos de estudo

- O nível de escolaridade da população brasileira ainda é muito baixo. Em 2007, os brasileiros tinham
uma taxa média de escolarização de sete anos – aquém dos oito anos garantidos pela Constituição e muito
abaixo da referência internacional, que estima doze anos de estudos como um requisito mínimo para o
acesso a bons empregos. Mesmo as gerações mais jovens ainda não conseguiram alcançar o patamar
desejado. O grupo etário com maior escolaridade no Brasil (de 20 a 24 anos) concluiu, na média, apenas
nove anos de estudo (Gráfico 3).

Gráfico 3: Escolaridade média da população, por faixa etária (2007)

Fonte: Pesquisa Nacional por


Amostra de Domicílios/IBGE.

- A mão de obra que ingressa no mercado de trabalho está em clara desvantagem em relação à de
outros países. Embora tenha havido avanços quando se compara a escolarização de duas gerações
brasileiras, ainda estamos para trás na comparação internacional (Gráficos 4A e 4B ).

Gráfico 4A: Percentual da população economicamente ativa com pelo menos ensino médio completo: comparação entre duas
gerações – países selecionados (2005)

Fonte: Education at a
Glance 2007/OCDE.

Gráfico 4B: Percentual da população economicamente ativa com pelo menos ensino superior completo: comparação entre duas
gerações – países selecionados (2005)

60
25-34 anos
50 55-64 anos
Porcentagem

40

30

20

10

0 Fonte: Education at a
México
Média OCDE
Coreia

Irlanda

França

Alemanha
Japão

Reino Unido

Chile
Canadá

Itália
Finlândia

Brasil
Espanha

Estados Unidos
Rússia

Glance 2007/OCDE.

País
- Muitas crianças e jovens abandonam a escola antes de completar o ensino fundamental e médio. A
partir dos 12 anos, os estudantes brasileiros iniciam um processo de abandono da vida escolar que se
acelera a partir dos 16 anos, idade legal para acesso formal ao mercado de trabalho. (Gráfico 5)

Gráfico 5: Percentual da população que frequenta a escola, por idade (2007)

Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de


Domicílios/IBGE. Estimativa de Ruben Klein em “A Crise
de Audiência no Ensino Médio”, 2008.

1.3. Desempenho: O Brasil é a 8ª economia do mundo, mas está entre os piores nos
rankings de educação

- Comparados aos estudantes dos países mais desenvolvidos, os alunos brasileiros têm resultados
pífios. Desde 2000, o Brasil participa do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) da
OCDE, que testa jovens de 15 anos em leitura, matemática e ciências. Na edição de 2006, o Brasil se
classificou em 49º lugar entre os 56 países participantes na prova de leitura. Em matemática e ciências o
país se saiu ainda pior: ficou em 54º e 52º, respectivamente, entre 57 países. Em leitura, a maioria dos
jovens brasileiros que fez o PISA em 2006 foi classificada no nível mais baixo de proficiência (nível 1 ou
abaixo). Há dez vezes mais alunos brasileiros neste nível de proficiência que finlandeses ou coreanos
(Gráfico 7). Chegar à adolescência sem dominar uma das habilidades mais básicas da vida moderna limita a
capacidade dessas pessoas de continuar estudando ou de competir por bons empregos.

Gráfico 7: Percentual de estudantes nos níveis mais baixos de proficiência em leitura no PISA – países selecionados (2006)
60

50

40
m
e
g
at
n 30
e
rc
o
P 20

10

0
isl o lei ias ial a aç E a o o a á ia ia
ar icx h s á
h
n n D h
n id ã
p
d
n
d
a er d Fonte: PISA 2006/OCDE.
é C ú It a ar C a n aJ al n o n
B R p F O U rI a C lâ
M sE ai m o C n
el iF
d
é A in
e
M R
Países
- Uma comparação apenas com países da América Latina e com alunos mais novos também mostra
um péssimo cenário. Um recente estudo da UNESCO (SERCE - Segundo Estudo Regional Comparativo e
Explicativo) avaliou o desempenho de alunos de terceiras e sextas séries do ensino fundamental de
dezesseis países da América Latina em linguagem, matemática e ciências. Na maioria dos países da região,
com exceção de Cuba, os resultados mostram uma alta concentração de alunos nos níveis menos avançados
de competência (Gráfico 9).

Gráfico 9. Percentual de estudantes da 3ª série do ensino fundamental nos níveis mais baixos de proficiência em leitura no SERCE – vários
países (2007)

Fonte: SERCE-LLECE/
Unesco

- Mesmo as avaliações nacionais mostram que os alunos aprendem muito pouco do que se espera,
qualquer que seja o nível de ensino. O governo brasileiro estabeleceu alguns parâmetros de proficiência
esperada para o final de cada um dos ciclos de ensino (4ª e 8ª séries do ensino fundamental e 3ª série do
ensino médio). No 3º ano do ensino médio, os alunos ainda não aprenderam as habilidades esperadas para
a 8ª série do ensino fundamental (Gráfico 10).

Gráfico 10: Evolução da média de proficiência em leitura no SAEB, para 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e 3ª série do
ensino médio (1995-2007)
400

350

300

o 250 Média Brasil 4ª série


ãç
a Esperado para a 4ª série
u
t 200
n Média Brasil 8ª série
o
P 150
Esperado para a 8ª série
100 Média Brasil 3ª série
Esperado para a 3ª série
50

0
1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007*
Fonte: INEP/MEC.
Anos
1.4. Equidade: As oportunidades de educação ainda não são iguais para todos

- O acesso dos mais pobres à escola cresceu, mas as taxas de escolarização ainda são muito
diferentes na comparação entre os dois extremos de renda do país. No ensino médio, por exemplo,
estão na escola 75% dos jovens do quintil mais rico e apenas 25% de seus pares do quintil mais pobre
(Gráficos 11A e 11B).

Gráfico 11A: Evolução do percentual de alunos Gráfico 11B: Evolução do percentual de alunos frequentando
frequentando a escola, por nível de ensino, segundo a renda a escola, por nível de ensino, segundo a renda (2005)
(1995)

100 100

80 80
m
e m
e
ga 60 ga 60
t t
n
e n
e
cr 40 20% mais pobres cr 40 20% mais pobres
o o
P 20% mais ricos P 20% mais ricos
20 20

0 0
1ª a 4ª séries 5ª a 8ª séries Ensino Médio 1ª a 4ª séries 5ª a 8ª séries Ensino Médio
Níveis de ensino Níveis de ensino

Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios/IBGE (1995 e 2005). Elaborado pelo Núcleo de Estudo de Políticas Públicas (NEPP) da
UNICAMP.

- A baixa qualidade da educação se estende a todas as faixas de renda. Mesmo os brasileiros de nível
socioeconômico mais alto tiveram desempenho na prova de leitura do PISA muito inferior aos dos
estudantes mais pobres de países como Irlanda, Canadá, Finlândia e Coreia. (Gráfico 12).

Gráfico 12: Diferença de desempenho em leitura no PISA, segundo a renda – países selecionados (2006)

Nota: Para cada um dos países, o ponto


superior indica a média de desempenho para
os jovens do quintil superior de renda (25%
mais ricos). O ponto inferior indica a média
para os jovens do quintil inferior (25% mais
pobres). A distância entre os pontos marca a
desigualdade entre esses dois extremos. O
ponto central é a média do país. O gráfico está
em ordem crescente segundo a diferença
entre os dois extremos.

Fonte: PISA 2006/OCDE.


- Raça e gênero também podem ser limitantes das oportunidades educacionais. No Brasil, as pessoas
de raça branca ou amarela, independente da renda, têm maiores chances de avançar academicamente que
os de raças negra ou indígena. Mesmo entre os mais ricos, apenas três de cada dez indivíduos da raça negra,
parda ou indígena tiveram acesso ao ensino superior, enquanto entre os brancos na mesma faixa de renda,
essa relação sobe para cinco em cada dez. (Gráfico 13). Da mesma forma, em todas as faixas de renda, um
maior contingente de mulheres jovens consegue atingir níveis mais elevados de escolaridade que os
homens (Gráfico 14).

Gráfico 13. Escolarização da população de 18 a 24 anos, segundo raça e renda (2006)


si
a s branca/amarela
m o
% icr
0 preta/parda/indígena
2
branca/amarela
o
ãç 4
al preta/parda/indígena
u
p
o branca/amarela Até o Ensino
p
a 3
d Fundamental
ist preta/parda/indígena
in Ensino Médio
u branca/amarela
Q 2
preta/parda/indígena Ensino Superior
is se
a branca/amarela
m rb
% o preta/parda/indígena
0 p
2
0% 20% 40% 60% 80% 100%
% da população

Gráfico 14: Escolarização da população de 18 a 24 anos, segundo gênero e renda (2006)

Fonte: Gráficos elaborados por Rafael Neves, a


partir dos dados da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios/IBGE.
2. Perspectivas de melhoria: as políticas públicas que precisamos implementar para o país
avançar rápido

2.1. Padrões educacionais: o Brasil começa a desenvolvê-los, mas sua implementação ainda
esbarra em resistências e fragilidade técnica

Em qualquer processo no qual se queira obter resultados concretos é fundamental a existência de


padrões. Com eles, é possível alinhar expectativas, medir e comparar resultados.

Nas atividades de educação não é diferente. Portanto, um sistema de ensino que busque qualidade e
equidade deve estabelecer padrões educacionais. Existem pelo menos três tipos de padrão
indispensáveis para o desenvolvimento do ensino. A tabela a seguir traz uma definição de cada um
deles e descreve o atual cenário brasileiro:

TIPO DEFINIÇÃO SITUAÇÃO NO BRASIL


Padrões curriculares Indicam as habilidades e Já existem parâmetros nacionais, mas,
competências que os estudantes no nível das escolas, ainda não há
devem dominar em cada etapa padrões claros sobre o que deve ser
escolar. ensinado em cada ciclo, em cada área
do conhecimento.
Padrões de desempenho Definem os níveis de proficiência Alguns pesquisadores e organizações
adequados para cada área de do setor educacional já descreveram,
conhecimento, em cada uma das individualmente, o que entendem
etapas de ensino. como desempenho mínimo e
satisfatório dos alunos. Mas, não
existe ainda uma definição oficial
deste padrão.

Padrões de Determinam os recursos técnicos, Embora a legislação mencione a


oportunidades de financeiros e humanos necessários necessidade de garantir “padrões
aprendizagem para que todos os alunos possam mínimos de qualidade” estes jamais
atingir o desempenho esperado. foram definidos e, portanto, nunca
chegaram às escolas e redes de
ensino.

O resultado é que, de modo geral, ainda faltam padrões para controlar a qualidade da sala de aula. A
dificuldade de estabelecê-los prejudica principalmente os mais pobres, que contam com menos
referências sobre o que cobrar das escolas e das autoridades.
2.2. Sistemas de avaliação: o país conta um sólido sistema de monitoramento da educação,
mas ele ainda é pouco utilizado pelas escolas

- O Brasil desenvolveu sistemas de avaliação regulares, comparáveis no tempo e tecnicamente


sólidos. Atualmente, o país coleta regularmente, através de diversas avaliações, informações sobre o
desempenho dos alunos em Língua Portuguesa e Matemática, seu perfil socioeconômico, características
dos professores e das escolas. Além disso, são feitos censos de vários tipos para todos os níveis e
modalidades de ensino. Este conjunto de dados permite um entendimento aprofundado dos
determinantes do processo de aprendizagem e facilita o desenho e avaliação das políticas públicas do
setor. A divulgação dos dados na internet, de forma clara e simples, dá acesso ao público em geral à
informação. É possível consultar resultados e indicadores no nível de cada escola. A cultura de
transparência que está nascendo é bastante positiva.

- A criação de um índice de fácil leitura mobilizou o país no acompanhamento do progresso da


educação. O Ministério da Educação criou um indicador de qualidade da educação que combina as
informações de desempenho dos alunos em uma avaliação (Prova Brasil) com as de fluxo escolar (taxa
de aprovação), em uma escala de fácil compreensão (zero a dez). É o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb). Para cada escola, estado e município do país, foi definida uma meta a ser
atingida até 2021. A cada dois anos, o governo realiza uma ampla campanha de divulgação dos dados,
evidenciando quem conseguiu atingir suas metas parciais e dando visibilidade à evolução do
desempenho. Com isso, mobiliza a atenção da população em torno da melhoria do índice. A meta
brasileira é atingir a nota 6,0 em 2021. Segundo o MEC, isso significaria se equiparar ao atual padrão
dos países desenvolvidos, membros da OCDE. Em 2007, o Ideb nacional foi de 4,2 e 3,8 para o primeiro
e segundo ciclos do ensino fundamental, respectivamente, e 3,5 para o ensino médio.

- Apesar dos avanços, a análise dos resultados das avaliações ainda não é utilizada pelas escolas
para melhorar a aprendizagem. As informações obtidas nas avaliações ainda não são plenamente
utilizadas no nível das escolas para a tomada de decisões pedagógicas e para a construção e ajustes de
currículos. Existe ainda uma grande dificuldade de traduzir os resultados de desempenho dos alunos
para professores e gestores escolares, de maneira a evidenciar as lacunas de aprendizagem. E, no
entanto, para gerar mudanças nas escolas e salas de aula, é essencial que estes profissionais sejam
capazes de identificar os problemas que estão levando seus alunos a não dominarem determinadas
habilidades e competências e, a partir daí, reformular suas práticas de ensino.

- A cultura de participação em avaliações internacionais também vem se consolidando.


Complementarmente às avaliações nacionais, o Brasil engajou-se em um esforço internacional de
monitoramento do desenvolvimento da educação, participando, desde a primeira edição, tanto do PISA,
quanto do LLECE. Este tipo de comparação permite que a sociedade brasileira se mobilize não só em
torno de seu próprio progresso educacional, mas que consiga se manter conectada aos avanços de
outras nações. A adesão aos exames internacionais também dá maior transparência e credibilidade aos
dados divulgados nacionalmente sobre educação.
2.3. Autoridade e responsabilidade: a maioria das escolas não tem poder de decisão e não
se responsabiliza por seus resultados

- Autonomia escolar é necessariamente um equilíbrio de forças entre poder e responsabilização.


Uma vez que as escolas são, em última instância, as responsáveis pela oferta da educação, decisões que
afetam a qualidade do que acontece na sala de aula deveriam ser tomadas pelos seus gestores e equipe. Se
por um lado é importante que as escolas tenham maior poder de decisão, por outro, para exercer esta
autonomia com competência, elas precisam dispor de capacidade técnica e se responsabilizar por seus
resultados perante a comunidade.

- No Brasil, as escolas têm pouca autoridade para tomar decisões cruciais sobre seu funcionamento.
Escolhas que definem o rumo de cada escola ainda são centralizadas nas esferas administrativas: Governo
Federal, estados e municípios. As escolas não têm autonomia para tomar as decisões mais importantes
associadas à qualidade do ensino e ao efetivo aprendizado dos alunos, como a atribuição de aulas, as
opções pedagógicas e a alocação dos recursos humanos e materiais. Os diretores, de modo geral, têm pouco
ou nenhum poder sobre a composição de suas equipes ou sobre a escolha das características de formação
continuada para seus profissionais, por exemplo. As escolas não contam com orçamentos relevantes para
seus projetos, mas ficam com o ônus de administrar parcos recursos ligados à sua manutenção corriqueira.
A maior parte dos diretores de escola no Brasil ainda é selecionada por interesses políticos.

- Para as escolas se responsabilizarem por seus resultados, além de rankings, é preciso apoio
técnico e financeiro. No Brasil, este processo de “empoderamento” ainda é dificultado por uma conjunção
de fatores, que esvaziam as escolas do necessário senso de autoridade e responsabilidade: limitações legais,
pouca tradição de participação das famílias, falta de qualificação técnica do corpo docente e sobrecarga de
atribuições não pedagógicas do diretor. Para que isso mude, os dirigentes municipais e estaduais de
educação devem ser parceiros e apoiadores dos diretores de suas redes. Alguns programas do Governo
Federal também podem oferecer recursos e capacitação diretamente às escolas e aos municípios.

2.4 Carreira docente: o ensino de qualidade depende de melhorias na qualificação dos


professores e da gestão competente de suas carreiras

- Atualmente, a profissão do magistério é muito pouco atrativa no Brasil para jovens em início de
carreira. Os salários ainda baixos, a progressão profissional limitada e o pouco prestígio social afastam os
melhores alunos da docência. Grande parte dos estudantes que decidem seguir esta carreira partem de
uma educação básica muito ruim: os dados do ENEM mostram que 30% dos que ingressam nos cursos de
pedagogia e licenciatura estão entre os piores alunos do ensino médio.

- A escolaridade dos professores brasileiros aumentou recentemente, mas nem todos completaram
o ensino superior ou têm formação na disciplina que ministram. Entre 1997 e 2007, o percentual de
professores de 1ª a 4ª série com formação universitária passou de 19% para 61% (Gráfico 16). Apesar
desse avanço, quase um terço dos professores de ensino fundamental tem apenas o ensino médio completo,
a maioria deles concentrados nas regiões mais pobres do país. No Norte e Nordeste quase a metade dos
professores da educação básica ainda não chegou ao ensino superior. Mesmo quando graduados, muitos
professores não têm formação específica na disciplina que efetivamente lecionam. No ensino médio, menos
de 40% dos professores de física, química, artes e inglês são formados na disciplina que ministram (Gráfico
17).

Gráfico 16 – Distribuição dos professores de 1ª a 4ª série, por nível de escolaridade (1991- 2007)
100%

90%

80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1991 1992 1993 1994 1995 1996 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Fonte: INEP/MEC.
Ensino Fundamental Ensino Médio Completo Ensino Superio Completo

Gráfico 17 - Proporção de professores do ensino médio, segundo a disciplina que lecionam e a área de formação na graduação
(2007)

Nota: “Mesmo curso” indica que o professor se formou na


mesma disciplina que leciona; “áreas afins” indica que o docente
se formou em áreas próximas/equivalentes à disciplina que
ministra.

Fonte: Estudo exploratório sobre o professor brasileiro, 2007 –


INEP/MEC.

- O diploma de curso superior não implica necessariamente em um profissional adequadamente


preparado para enfrentar os desafios de uma escola. Um levantamento recente da Fundação Carlos
Chagas (2008) mostra que, no Brasil, os cursos de formação docente, em sua grande maioria, são
desvinculados da prática: apenas 28% das disciplinas do currículo de Pedagogia – curso que forma os
professores de 1ª a 4ª séries – tratam sobre o “quê” e o “como” ensinar. Por outro lado, 40% das disciplinas
tratam de fundamentos teóricos da educação, como, por exemplo, sociologia e filosofia da educação.

- A remuneração melhorou, mas ainda não é competitiva para atrair os melhores. O salário médio dos
docentes da rede pública foi o que mais cresceu no período de 1995 a 2006, comparado ao de outras
ocupações do setor público e privado (Gráfico 18). Apesar disso, ele ainda é mais baixo que a remuneração
média das demais profissões que requerem ensino superior. No contexto internacional, os professores de
educação básica brasileiros estão em desvantagem em relação aos países da América Latina com renda per
capita próxima à brasileira (Gráfico 19).

Gráfico 18 - Aumento percentual acumulado das médias salariais para profissionais com formação em nível superior (1995 a 2006)

Fonte: Moriconi (2008), a partir de dados da PNAD/IBGE.

Gráfico 19: Remuneração mensal média de professores, em dólares com paridade de poder de compra – América Latina (2005)

Nota: *somente zonas urbanas

Fonte: Morduchowicz e Duro (2007).

- Os planos de carreira devem ter como foco a melhoria do aprendizado dos alunos e um maior
equilíbrio entre direitos e deveres dos profissionais da educação. No Brasil, a legislação que
regulamenta a gestão da carreira dos profissionais do magistério público prevê, entre outras coisas, a
entrada na profissão exclusivamente por concurso, a promoção baseada na titulação e tempo de serviço e a
estabilidade na função. Tais práticas dificultam a valorização dos melhores professores, além de criar
obstáculos para o afastamento daqueles cujo perfil profissional não condiz com as atividades de ensino.
Para assegurar o direito de aprender dos alunos, portanto, é preciso implementar mudanças na carreira
docente. Atualmente, propostas de reforma nesse sentido incluem: políticas de pagamento de bônus aos
docentes de acordo com seus resultados e estabelecimento de planos de carreira que mantenham os bons
professores em sala de aula com perspectivas de ascensão salarial e novas atribuições profissionais.
2.5 Investimento em educação: os gastos públicos no setor mostram que o ensino básico
ainda não é prioridade

- O gasto público com educação aumentou recentemente. Desde que União, estados e municípios foram
obrigados por lei a investir percentuais fixos de sua receita de impostos na educação, os gastos no setor
cresceram. Além da vinculação orçamentária, foi criado um sistema de equalização, que garante um
patamar nacional mínimo de gasto por aluno para cada uma das etapas do ensino básico. Assim,
proporcionalmente à sua produção de riqueza (Produto Interno Bruto – PIB) o Brasil passou a gastar com
educação básica, uma porcentagem não muito diferente da média dos países da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Gráfico 20. Evolução do gasto com educação básica como percentual do PIB – países selecionados (1995-2006)
5,0
1995 2000 2006
4,5

4,0

3,5
Percentual do PIB

3,0

2,5

2,0

1,5

1,0

0,5

0,0 Nota: os países estão ordenados pelo percentual de


investimento de 2006.
a

a
ia


s

o
sil

lia
da

ha

ia
ia
o

il e
ç
do

nh


ic
id
re

ss
nd
an

Itá
na

an

Ch

an
éx
n

Br
ni

pa

Ja
Co

Ru

Fr
U

Ca

Irl

em
M
sU

Es
Fin
o
in

Al
do
Re

Fonte: Education at a Glance 2009/OCDE.


ta

País
Es

- Os gastos com ensino superior ainda são desproporcionais aos gastos com educação básica. Do
total de gastos com educação, 85% vão para a educação básica e 15% para educação superior. Em termos
de gasto por aluno, entretanto, há uma enorme desproporção (Gráfico 22). Em 2007, o valor investido por
aluno no ensino superior (R$12.322) foi seis vezes maior do que o investido na educação básica (R$2.005).

Gráfico 22. Gasto anual por aluno e por nível de ensino em Educação em relação ao PIB percapita – países selecionados (2005)
Percentual de investimento pelo PIB per capita

100
Ensino Fundamental - anos iniciais

Ensino Fundamental - anos finais


80
Ensino Médio

60 Ensino Superior, sem incluir P&D Notas: Para Itália, os dados são de 2004; para a
Espanha, as duas etapas de ensino fundamental foram
somadas; e para o Brasil e Chile, os dados são de 2006.
40

20 Fonte: Education at a Glance 2008/OCDE.

0
ic o
a
DE

do

le
ha
a
o

ça
lia

il
s

ia

a
i

nh
do

as

d
re

i
d

an

an

Ch
It á

i
OC

éx

an
Un

ân

Br
Co
Ja

pa
ni

em
Fr

Irl
sU

nl
ia

Es

no
éd

Fi

Al
do

i
Re
M

ta
Es

País
- O mínimo garantido para a educação ainda não reflete uma efetiva priorização da educação básica
para todos. Apesar do aumento nos gastos educacionais, tanto em valores reais como em proporção à
riqueza do país, o gasto por aluno, principalmente na educação básica, ainda é baixo se comparado aos
países desenvolvidos e mesmo aos da região, como o México e o Chile (Gráficos 23).

Gráfico 23. Gasto anual por estudante, segundo o nível de ensino – países selecionados (2005)
$12.000 Pré-escola
Fundamental

$10.000 Médio
Investimento por aluno, em US$

$8.000
Nota: Os países estão ordenados pelo
investimento por aluno no ensino
$6.000
fundamental
* apenas investimentos públicos para
$4.000
todos os níveis de ensino

$2.000

$0
Fonte: Education at a Glance,
ça
*

a
ia
o

s
li a
ha

ia

o
il e

do
nh


nd
ic

id
sil

nd
an

Itá
Ch

an
éx

Un

ni
pa

Ja
a

Co

2008/OCDE.
Fr


Br

Irl
em
M

sU
Es

Fin

o
in
Al

do
Re

ta
Es

País

- O Brasil tem condições de investir mais e melhor em educação. A carga tributária do Brasil está bem
próxima à de outros países usados como comparação neste documento (a média nos países da OCDE é de
36% e no Brasil, de 35%). Uma comparação entre México e Brasil é interessante: com uma carga tributária
menor que a brasileira (20% contra 35%), com um PIB menor (US$1,1 contra US$1,6 trilhão) e um
percentual de pessoas em idade escolar maior (31%) que o Brasil (27%), o México gasta mais por aluno na
educação básica que Brasil. Não é surpresa, portanto, que a pontuação em leitura dos alunos mexicanos no
PISA 2006 tenha sido de 410 pontos, contra 393 dos brasileiros, para uma média dos países da OCDE de
492. (Gráfico AX). Além disso, contrariando a legislação vigente, o Brasil ainda não definiu quais são os
recursos necessários para o estabelecimento de um “padrão mínimo de qualidade”. Sem esse parâmetro, o
investimento nem sempre é direcionado para os insumos e processos que, de fato, são capazes de
promover um impacto positivo no desempenho dos estudantes.

Gráfico A.X: Percentual de carga tributária sobre o PIB e percentual da população em idade escolar – países selecionados (2007)

Fonte: Secretaria da Receita Federal/MF - Education at a


Glance 2009/OECD

Você também pode gostar