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Director: Frei António Fidalgo Barros

ANO XXXVI – N.º 394 – ABRIL 2010


Administrador: Frei Bernardino V. Lima
Propriedade: Irmãos Capuchinhos de Cabo Verde FOTOCOMPOSIÇÃO E IMPRESSÃO EM OFFSET
Endereço: C. P. 166 — S. Vicente — Telf. 2322442 — Fax 2300277
E-mail: antoniofidalgo_2000@yahoo.it GRÁFICA DO MINDELO, LDA. – S. VICENTE

ORGÃO CRISTÃO DE FORMAÇÃO E INFORMAÇÃO/ CABO VERDE

Editorial PARABENS A VOCÊ!


Nas leis da Igreja, a tolerância é zero em relação à pedo-
filia. É verdade que, em alguns casos, houve Bispos que não
actuaram com a necessária firmeza, e o Papa falou disso, de
forma contundente, na sua carta aos católicos da Irlanda. Di-
rigindo-se aos Bispos, diz: “Não se pode negar que alguns de
vós e dos vossos predecessores falhastes, por vezes grave-
mente, na aplicação das normas do direito canónico codifica-
do há muito tempo sobre os crimes de abusos de jovens.
Foram cometidos sérios erros no tratamento das acusações.
Compreendo como era difícil lançar mão da extensão e da
complexidade do problema, obter informações fiáveis e to-
mar decisões justas à luz de conselhos divergentes de peri-
tos. Contudo, deve-se admitir que foram cometidos graves
erros de juízo e que se verificaram faltas de governo”.
Mas toda a gente sabe que Bento XVI é um alvo a abater. E
vai daí, organiza-se uma campanha contra o Papa, propalan-
do, por toda a parte, que ele teria contribuído para que certos
casos não viessem a ser conhecidos, quando ainda não era
Como país independente, Cabo Verde nasceu a 5 de Julho de 1975,
Papa. De nada serviram as refutações e esclarecimentos da portanto, há 35 anos. Quer dizer que este jornal é mais velho do que o
Santa Sé. Até porque a coisa “vende” e dá dinheiro aos jornais.
Ao mesmo tempo, porém, pretende-se desacreditar a Igreja nosso Cabo Verde (independente!), uma vez que é já com esta edição de
Católica, esperando que, desse modo, ela deixe de tomar as
posições que costuma tomar em matéria de ética e da moral.
Abril que ele festeja os seus 35 anos de vida. O mensário nasceu, pois,
Leia-se, a propósito, o que publicamos na página 7 e 8. cerca de dois meses antes do célebre acontecimento, quando ainda se vivia
Como diz o vice-Presidente da CEI, Dom Gualtiero Bas-
setti, em entrevista ao L’Osservatore Romano, “o Papa é uma
nas ilhas controversa fase do "independência sim", "independência não".
“testemunha corajosa da verdade” e o mundo não tolera isso, Abraçou o ideal e nem todos gostaram. Depois distanciou-se e passou a
porque quer assimilar a Igreja “para torná-la insignificante. Ao
invés, ela permanece sendo consciência crítica e fonte de questionar os que, de libertadores que eram, passaram a oprimir,como diria
segurança e esperança para aqueles que realmente aspi-
ram ao bem”.
o papa Paulo VI. Sentiu-se que nem o pequeno David, quando viu avançar
Porque perceberam muito bem que o interesse de deter- para ele, cheio de arrogância, o gigante Golias. O povo de Cabo Verde
minada imprensa não é o de defender as vítimas da pedofilia,
mas sim desacreditar a Igreja, um grupo de setenta intelec-
correu em seu socorro e ele acabou por sobreviver, ao passo que Golias foi
tuais, filósofos, jornalistas, dramaturgos, docentes universi- destronado. Resta saber por quanto tempo ainda sobreviverá aquele que é,
tários, artistas e personalidades da sociedade da França, num
comunicado-apelo que depois foi subscrito por um total de ainda hoje, um pequeno David no meio de tantos poderosos. Não se sabe.
12.509 pessoas, manifestou a sua solidariedade ante a cam-
panha difamatória contra o Papa Bento XVI, que pretende apre- Ou melhor, sabe-se. Será até quando Deus quiser!
sentá-lo como “encobridor”. Sem deixar de solidarizar-se com Mas os leitores podem também ajudar, renovando a assinatura, arran-
as vítimas e de pedir que tudo seja posto à luz do dia, os
subscritores da carta escrevem: “deploramos a ênfase da jando novas, divulgado o seu nome. E não se esqueçam de que é possível
escalada mediática que acompanha estes casos. A par do
direito à informação, legítimo e democrático, não podemos obter assinaturas para uma leitura on line, indo para www.recortes.cv.
mais que constatar, com tristeza, como cristãos, mas sobre- Um grande obrigado a todos quantos continuam a apoiar-nos.
tudo como cidadãos, que numerosos mass media de nosso
país (e no Ocidente em geral) tratam estes casos com par-
cialidade, escasso conhecimento ou viva satisfação”.
Os subscritores afirmam ainda que “com estas calúnias,
o rosto da Igreja que aparece actualmente na imprensa não
corresponde ao que vivem os cristãos católicos” e terminam
manifestando a sua proximidade em relação a “tantos sacer-
dotes que vivem com coragem, às vezes na solidão, a men-
Terra Nova
sagem de Cristo”. – C.P. 166 - S. Vicente - Cabo Verde –
Infelizmente, esta é uma mensagem que não encontrará Tel. 2322442 - 2320077
espaço em jornais como o New York Times, Le Parisien, Spi- Email: antoniofidalgo_2000@yahoo.it
egel, Publico, el Pais ou La Reppublica, nem em qualquer
“caixa de ressonância” dos países do sul.
N.º DA CONTA BANCÁRIA: BCA - 5758503
Frei António Fidalgo de Barros
Pág. 2 Abril 2010

ASSIM!... Português não é coisa


As estórias que se contam anos. Alguns destes, consci- sentante da SAA perante a do colonialismo
nem sempre correspondem a entes da dependência da Ilha insistência do pedido, contem-
História que se quer narrar. do Sal à escala dos aviões da porizou-se “concedendo-lhe” Senhor Director, quero rapidamente expressar através des-
Vem isto a propósito do que se SAA, cientes dos seus deve- os tais dias, acrescentando: ta carta uma preocupação que tenho sentido ao longo de anos.
Tento seguir as noticias de Cabo Ver menos de e dos Palop
passou com a South African res profissionais, da ingenui- “Não aceitarei mais nenhuma
através da RTP Africa e tenho notado que cada vez mais me-
Airways (SAA) no conturbado dade política dos manifestan- situação semelhante. Estou
nos pessoas falam Português nas Ilhas. Mas pode ser que
e agitado período (Maio/74 a tes e da inocuidade da mani- aqui a trabalhar há vários anos seja apenas impressão minha. No entanto, o que me leva a
Junho/75) que antecedeu a in- festação dado os interesses como sabes e não a fazer fazer tal afirmação é o facto de que, salvo alguma excepção
dependência de Cabo Verde. em jogo, indiferentes à barrei- política e respeito escrupulo- dos Governantes do país, na maior parte das peças ou há tra-
Era sabido que toda a Ilha ra, aos apupos e aos apodos samente as leis do território.” dução simultânea ou a matéria é legendada. Por outro lado,
do Sal e, por via disto, uma de “lacaios de colonialismo”, E foi no cumprimento da pro- quando alguém fala dos outros PALOP as pessoas falam orgu-
boa parte da nossa economia, “traidores”, “reaccionários” e messa de diligência que o lhosamente o seu Português. Mas, ainda a nossa oficial é o
era dependente da escala dos outros, contornaram a massa chefe de escala da TAP do Sal Português?
voos da SAA. Pois isto não humana, dirigiram-se ao avião se deslocou a Lisboa no pri- Pode parecer uma pergunta ingénua mas parece-me que
evitou que certos fervorosos e prestaram o serviço que era meiro avião, por iniciativa pró- países como Angola, Moçambique ou até a Guiné Bissau po-
jovens de então - hoje paca- necessário permitindo deste pria, para falar com o Director diam descartar o Português como língua oficial e adoptar uma
tos avós - com responsabili- modo que o avião partisse. da SAA para a região ibérica das muitas línguas faladas nos seus territórios. Ou o próprio
dade na administração, ges- Convém aqui lembrar que (sedeada em Lisboa) da qual Brasil podia pensar no Guarani como sua língua oficial e es-
quecer o Português e, assim libertar-se de vez daquele velho
tão e funcionamento das acti- se vivia o “apartheid” na Repú- Sal (e também Canárias) fa-
estigma do colonialismo. Mas não. São países maiores do
vidades económicas da Ilha, blica Sul-africana e que na zia parte. Pôs-lhe ao corrente
que Cabo Verde, alguns com problemas tribais e línguas tam-
tomados por uma onda de fer- sequência da natureza do re- da situação, reiterou-lhe o pe- bém tribais, mas continuam ensinando, falando e comunican-
vor independentista, ávidos de gime havia um boicote impos- dido de não fechar a escala do com outros povos através do Português.
apresentar serviço quiçá mo- to pela OUA ao qual, pragma- do Sal da SAA recomendan- Tenho notado que a Universidade dos Açores nos últimos
vidos pelo oportunismo mili- ticamente, Cabo Verde não do-lhe, para evitar futuramen- anos tem recebido um bom número de estudantes o que é lou-
tante que proliferava, organi- aderiu mesmo depois da Inde- te semelhantes situações à vável e algo que uma década atrás não acontecia. Em conversa
zassem uma manifestação pendência. Mas também não que se tinha verificado, uma com alguns deles tenho apercebido que o Português continua
contra a escala dos aviões será de mais referir que ape- conversa urgente com o Go- a ser o seu grande problema quando querem comunicar ou vão
dessa companhia (SAA) no sar desse boicote alguns paí- verno de Transição, designa- a uma prova oral ou têm de redigir um trabalho escrito.
Sal. Estava na ordem do dia ses da nossa costa africana damente com o membro des- Eu também gosto do meu crioulo. Sinto até que uma mor-
as manifestações espontâne- ditos “moderados” faziam-se à se Governo que se ocupava da na nunca é a mesma quando se tenta traduzi-la. Mas, pelo
as em nome e a favor do escala dos voos dos aviões da administração interna uma vez amor de Deus. O Crioulo como língua oficial? A não ser que
PAIGC consentidas e, por ve- SAA e há muito que se rumo- que apenas se tratava de ma- queiramos viver orgulhosamente sós num mundo globalizado
como este em que estamos inseridos.
zes, incentivadas e até sugeri- rejava acordos e protocolos nifestações e de acções im-
Aqui há anos o Doutor Rui Figueiredo Marcos perguntou-
das, pelo próprio Governo de secretos. peditivas projectadas e reali-
me no final de uma prova oral para melhoria de nota na cadeira
Transição através de certos Após o despacho e parti- zadas por um grupo de agita- de História do Direito Português quais eram as fontes do Direi-
membros e realizadas por “ini- da do avião, o representante dores. O representante ibéri- to Caboverdiano e eu respondi-lhe prontamente que o Direito
ciativa” de activistas cujos no- da SAA furiosíssimo deslo- co da SAA absorveu a reco- Português vinha em primeiro lugar. Faz parte do nosso DNA
mes e funções em nada vincu- cou-se ao gabinete do chefe mendação e deslocou-se de como povo. Não adianta sacudir o capote e achar que o Portu-
lavam o partido que diziam re- de escala da TAP – um cabo- imediato, no primeiro voo, a guês é coisa do colonialismo porque nesta ordem de ideias
presentar. Eram “peixe miúdo”, verdiano – dizendo-lhe que ia Cabo Verde tendo marcado muitos outros teriam razões de sobra para amaldiçoarem as
“carne para canhão”, como sói já telefonar e fazer um relató- com antecedência uma audi- suas línguas. Imaginemos os países da Africa Francófona, ou-
dizer-se, e que a realidade pos- rio pedindo o fecho da escala ência com o então membro do tros que foram colonizados pelos Ingleses. Ao contrário, há
teriormente confirmou que dis- do Sal e que se os cabo-ver- Governo para administração cada vez mais países que falam a mesma língua tentando unir
so não passavam. dianos não queriam os aviões interna. Durante a audiência em comunidade para se tornarem mais fortes comercialmente
Foi assim que certa tarde, sul-africanos havia já outras que se verificou na Praia, foi- e também para que as suas vozes sejam ouvidas.
uma turba encabeçada por alternativas negociadas. Foi lhe assegurado tranquilidade, Cabo Verde não pode dar-se ao luxo de adoptar como lín-
gua oficial o crioulo que mais ninguém fala a não ser nós e os
esses jovens se perfilou na dissuadido pelo chefe da es- que o Governo de Transição
nossos descendentes. Será que outros países estarão inte-
placa do aeroporto emitindo cala da TAP pedindo-lhe que garantiria os compromissos
ressados em aprender o Crioulo para se comunicarem con-
em grandes algazarras, pala- tivesse calma pois os mani- anteriormente assumidos, que nosco? E as nossas reacções comerciais? E os turistas que
vras de ordem contra a SAA e festantes não representavam o que havia ocorrido não vol- vão a Cavo Verde que passam algum tempo aprendendo pala-
a República Sul-africana, e a vontade do Governo. Implo- taria a acontecer e que não vras e expressões em Português pensando que verdadeira-
formando uma barreira huma- rou-lhe que aguentasse uns haveria mais manifestação mente a língua oficial do país é o Português. E as universida-
na com o fito de impedir que dias para permitir que a situa- nem acções obstrucionistas. des Portuguesas e Brasileiras devem continuar a conceder ao
ao avião da SAA se prestas- ção se aclarasse através dos Foi assim que a South Afri- país bolsas de estudos para os seus estudantes quando a
se qualquer assistência. Os órgãos competentes. Que ele can Airways manteve activa a língua oficial já não é o Português?
serviços de terra eram presta- próprio iria fazer as diligênci- escala do Sal e foi assim que Tenho seguido atentamente algumas reflexões neste jornal
dos pela TAP cujos trabalha- as necessárias para efectiva- aconteceu nos bastidores. por parte da Doutora Ondina Ferreira, eminente linguista Ca-
dores eram todos cabo-verdi- ção deste propósito. O Repre- Mais tarde, houve negocia- boverdiana, muito preocupada com o ensino da língua Portu-
ções abertas no quadro de um guesa nas Ilhas. Como ela muitos e muitos Caboverdianos
Cabo Verde independente. comungam da mesma preocupação. Modestamente, incluo-
me no rolo daqueles que acham que a língua Portuguesa é
A. Ferreira uma herança valiosa e que tem de ser acarinhada, ensinada e
cultivada cada vez mais e, principalmente num mundo globali-
Condições de assinatura P.S.: Por razões éticas (não me
zado como o nosso. Bem, espero que ninguém pense que
tenho alguma coisa contra o crioulo! salvo seja! O crioulo nas-
S. Vicente .............................................................600$00 foi possível falar com todos) e de ce connosco. Com ele expressamos sentimentos que são tão
Outras Ilhas .......................................................700$00 coerência (não faz sentido nominar intrínsecos que não têm tradução. Mas como somos peque-
U.S.A. ................................................................US25,00 uns e manter anónimos outros) não nos e precisamos comunicar com outros para que nos conhe-
Europa, ..............................................................20 Euros usei os nomes dos representantes çam então o Português é o veículo apropriado para tal. Tudo
Se não é assinante ou por qualquer motivo deixou de o da SAA, do membro do Governo de isto para expressar a minha tristeza sempre que vejo as tradu-
ser, abra hoje mesmo uma assinatura. Transição, nem do chefe de Escala ções simultâneas e conversas legendadas na RTP Africa de
Se tem quota atrasada, não prejudique mais o seu jornal! e dos trabalhadores da TAP que pessoas que se vê claramente que sabem e podem falar Por-
prestaram assistência ao avião da tuguês e só não o fazem porque não querem ou porque ouvi-
Envie já um vale postal ou cheque para:
SAA. Ao que parece estão todos ram alguém dizer que a língua é um vestígio de colonialismo.
Terra Nova – C. P. 166 – S. Vicente Um abraço Senhor Director e muito obrigado pela sua aten-
vivos e vivem (os cabo-verdianos)
Para quaisquer informações pode também telefonar para 2322442 ou utilizar o Fax 2300277 ção.
quase todos no estrangeiro desde
N.º DA CONTA BANCÁRIA: BCA - 5758503 1975… Pedro Lima
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Ao Sabor dos Ventos Recordando Pe. Massimo


fr. Danilson Ramos Andrade

Parabéns, Casa da Memória No dia 26 de Novembro de 2009,


depois de se ter sentido mal, viria a
Gilda Barbosa falecer aqui em Ceva (Itália) o Pe. Mas-
simo Operto, de 89 anos de idade! Os
amigos o chamavam carinhosamente
Não deveria ser eu a escrever os meses, até que a proprietária tivesse de Pe. Max. A minha intenção não é
parabéns à Casa da Memória, cujo chegado de vez a S. Filipe. homenagear este homem porque a
início esteve bastante associada à Foi na altura em que se começou grande e verdadeira homenagem a re-
minha pessoa, mas… se não são os a pensar em algo de carácter cultural, ceberá do Pai Eterno, a quem dedi-
mais próximos a lembrar-se, nunca a desenvolver-se na parte que era o cou toda a vida ao serviço do Evange-
serão os mais afastados. recinto do antigo Armazém, com tan- lho. Quero simplesmente recordá-lo
Lembram-se? Foi a teoria do meu ta história e polivalência na sua utili- como um exemplo de entrega, atra-
pai, que segui, ao dedicar à minha mãe zação. vés destas “memórias soltas”. Fez-se
três artigos «Meio Século de Profes- Para além das três salas da fren- humilde e pequeno com o nosso povo.
sora», em 2007. te, conservadas na versão original da Muitos caboverdianos, sobretudo os
No dia 20 de Abril do corrente ano sua construção, havia outras três de- da nossa diáspora nos Estados Uni-
dos, estarão ainda a lembrar-se do Pe.
de 2010, a iniciativa privada do espa- pendências que dão para a rua de trás.
Massimo que foi um dos primeiros
ço cultural da «Casa da Memória» Duas delas foram recuperadas para
missionários capuchinhos em Cabo
entrou no seu décimo ano de existên- sala e garagem e na do meio ficou a
Verde. À sua chegada, em 1958, ele os que tiveram oportunidade de con-
cia. entrada e escada para o primeiro an- foi destinado à ilha Brava, terra que versar com ele sabiam que era um
Nasceu como uma pequena se- dar. sempre lembrou com muito amor e homem bom, original ao seu modo.
mente deitada à terra, que foi crescen- Todo o madeiramento e telhas an- saudade. Infelizmente em 1965, por motivos
do numa árvore frondosa, com vários tigas foram aproveitados, não se alte- Tive a sorte de estar com o Pe. de saúde, teve de regressar à Itália.
ramos, que também se foram fortale- rando o aspecto frontal da casa, com Massimo quase um ano. Era meu vi- Porém era um “cidadão do mundo”.
cendo ao longo dos anos passados. as grandes portas para a rua e as pe- zinho de quarto e nas nossas conver- Ainda esteve, por exemplo, no Líba-
Houve uma fase preparatória, em que dras de alvenaria a envolvê-las. Pode- sações ele falava muito de Cabo Ver- no, experiência da qual tinha também
a intenção de três pessoas, a Moni- se dizer que foi das melhores recupe- de e de como a experiência de missi- muitas e boas recordações.
que Widmer, um primo meu e a minha rações de um património antigo, na onário o tinha marcado profundamen- Tantas vezes o Pe. Massimo era
pessoa, tentamos recolher dados so- cidade de S. Filipe. Arquitecto e tra- te. Apesar da idade, conservou a me- mesmo um inconformista, mas ao
bre o Fogo antigo, tanto no Arquivo balhadores colaboraram para o efeito, mória lúcida até ao fim. Apreciava a mesmo tempo um sacerdote muito
Histórico, na Praia, como noutros ins- sob a orientação da nova proprietária. tenacidade dos caboverdianos, a sim- culto, amante do silêncio e da oração,
plicidade e a nobreza de alma que sensível e interessado pelas proble-
tituições, em Lisboa. Cada um foi to- Tudo se tornava mais simples, pois
caracteriza este povo provado pelas máticas do homem contemporâneo.
mando as suas notas. a Monique, uma suíço-caboverdiana,
intempéries e ainda os dotes artísti- Isso fez dele um confessor atento e
A Monique ainda residia na Praia e era conhecida e amiga da família, que
cos e genuínos. Ele dizia muitas ve- preparado, com uma grande facilida-
eu, em S. Filipe, desde Janeiro de estava certa de que ela havia sempre zes: “os caboverdianos têm a música de de estabelecer relações, ganhan-
1996. de conservar todo o património. no sangue”. Foi também com esse do desta forma muita estima por parte
Depois do falecimento de uma tia Do grupo dos três que inicialmente espírito que ele ajudou a fundar a ban- daqueles que precisavam de uma pa-
minha, em Julho do mesmo ano de procuravam dados do Fogo, o primo da filarmónica em Nova Sintra. Ele lavra de conforto. Foi mesmo como
1996, fui eu que tratei de todo o pro- seguiu o caminho de uma iniciativa com contava, com muito entusiasmo, das confessor que gastou os últimos anos
cesso de herança, juntamente com fins lucrativos, baseado no turismo noites quando a banda tocava na pra- da sua vida. Estava bem na Itália mas
outros que estavam já em curso na ecológico, o «Dgarfogo», e ficamos a ça principal e esta se enchia de gente nunca esqueceu Cabo Verde e a sua
Repartição das Finanças. Aliás, pas- Monique e eu com uma outra ideia, vinda de todos os cantos da ilha. Uma querida ilha Brava que recordava com
sei mais de dois anos nesse trabalho que deu origem à «Casa da Memória, vez ele surpreendeu-me quando (em nostalgia e com os olhos ainda a bri-
Ao Sabor dos Ventos
de família. com uma exposição permanente e a bom crioulo!) começou a cantar a “mor-
na di despidida”: “Si bém é dor, bai é
lhar. A todos fazia rir quando contava,
com muito humor, as peripécias e fa-
Sendo muitos os herdeiros da tal dimensão cultural a ser desenvolvida.
tia, depois da partilha feita, com base Começou apenas com uma expo- magoadu, ma si ka badu ka ta bira- çanhas da sua vida na ilha. Ele repe-
du.” Quem diria! Depois de tantos tia muitas vezes o episódio do roubo
no testamento deixado, e sendo eu a sição de móveis e objectos antigos,
anos… Então, certas tardes, eu vinha da sua motocicleta. Certa vez, tendo
única a residir no Fogo, tornava-se que serviram a várias famílias, saídas
com a guitarra e cantávamos juntos ele entrado numa casa para cumpri-
necessário vender certos imóveis, des- do mesmo tronco, o casal dos meus
um bocado dessa morna que amava mentar algumas pessoas, uns rapa-
tinados a várias pessoas. avós maternos, Marino Barbosa Vicen- tanto. Vê-se que esta música tinha ido zes roubaram-lhe a moto de missio-
Um deles era o conhecido «Arma- te e Ana Maria Benedita de Vascon- ao encontro das suas aspirações po- nário que ele usava. Eles queriam ex-
zém», um rés-do-chão amplo, cons- celos Barbosa Vicente. Considerando éticas. Sim, o Pe. Massimo lia muita perimentar como funcionava. Só que
truído nas primeiras décadas de 1800, este século, encontramos objectos poesia, sobretudo na língua alemã que na descida perderam o controlo do
que estava muito deteriorado, mas em que serviram a várias gerações, até à ele aprendeu sozinho e que tinha em veículo e caíram. O Pe. Massimo di-
pleno centro histórico de S. Filipe. Não sexta. alta consideração. zia sorrindo: “Erano dei birichini” (eram
conseguia vendê-lo, pois não se po- Sendo o conteúdo pertença de vá- Como o Pe. Pio Gottin percorreu uns traquinas).
dendo alterar a parte da frente, os pos- rios herdeiros, a autorização da cedên- incansavelmente as estradas da ilha, Acho bem concluir esta pequena
síveis interessados desistiam. cia gratuita foi pedida à mais idosa ajudando a nossa gente e infundindo recordação com um extracto do Rito
Foi quando a Monique, que, depois dentre eles, com o conhecimento dos esperança, numa época de grandes das Exéquias que expressa toda a
de deixar o trabalho da Caritas, na restantes, quase todos ausentes de carências materiais. Mas ele não se nossa gratidão e a nossa esperança
Praia, tencionava mudar a residência Cabo Verde. A única que residia e ain- deixou intimidar pelas privações por cristã: “Nas vossas mãos, Pai de mi-
que passou. Último filho de uma famí- sericórdia, entregamos o nosso irmão
para o Fogo, pensou utilizar a heran- da reside no Fogo sou eu, a simples
lia numerosa, ele tinha sido acostu- Pe. Massimo, na firme esperança de
ça que tinha recebido, pela morte de guardiã do acervo que passaria para a
mado, desde tenra idade, a uma vida que ele ressuscitará com Cristo no
duas tias, na compra do prédio. Casa da Memória. austera e de grandes sacrifícios. No último dia, como todos os que em
Assim foi e as obras de recupera- Só foram expostos e se inaugurou seu carácter sentia-se mesmo essa Cristo adormeceram. Nós vos damos
ção tiveram início, respeitando o que a iniciativa, depois da recuperação de veia de um piemontês (da região de graças por todos os dons que lhe con-
existia e aproveitando a parte de trás móveis e objectos um pouco deterio- Piemonte, Itália) puro. O Pe. Massi- cedestes na sua vida mortal para que
para construir um primeiro andar que rados, a cargo da responsável. mo era directo, frontal, à primeira im- fossem sinais da vossa bondade e da
serviria de moradia. Ainda fui eu a to- pressão até rude. Como se costuma comunhão de todos em Cristo”.
mar conta das obras nos primeiros (continua) dizer: “não tinha papas na língua”. Mas Até, Pe. Max!
Pág. 4 Abril 2010

MIRADOURO
Confiáveis? mara ligada à oposição. O Governo vem refutando 80.000 contos para a festa da nossa independên-
as acusações, mas o que se constata é que existe cia. É sempre bom que alguém questione a viabili-
A Afrosondagem realizou uma pesquisa de opi- um divórcio entre o que se diz e o que acontece no dade de Cabo Verde como país independente, obri-
niões no mínimo confusa. Foi sobre a “confiabilida- dia a dia. Por exemplo, as inaugurações nos muni- gando-nos assim a reflectir e a responder não com
de”, onde se misturam nomes de políticos mais cípios ligados à oposição são feitas quase sempre teorias, mas com factos. Não, Dr. Mário Soares. É
«confiáveis» com os de profissões mais “confiáveis”. sem a presença de ministros, o que leva a concluir melhor assim, apesar dos gravíssimos erros come-
Já agora: confiáveis? Que é isso? Quem é que, que o mesmo município esteve sozinho na realiza- tidos ao longo dos 15 anos em que Cabo Verde foi
mesmo não trabalhando na pesca, não “confia” nela? ção da obra. Tudo isto é muito grave e indica um metido num saco de preconceitos ideológicos e se
E por que não haveria de confiar? Posso não gostar sinal menos para a nossa democracia. distanciou duma realidade ( a europeia) que nos
de futebol, mas não há razões para desconfiar dos poderia ter levado, já então, a um patamar de de-
futebolistas, salvo num ou noutro conhecido publi- Chiquinho? Só em fotocópias senvolvimento muitos mais elevado. A Independên-
camente. Mas nesse caso, o tipo já não estaria a cia foi uma coisa certa. Errada foi a altura da nossa
jogar em nenhuma equipa. Posso gostar ou não Parabéns ao Instituto da Biblioteca Nacional e aproximação da Europa que deveria ter sido muito
gostar, mas confiar é outra coisa. Costuma-se fa- do Livro pela iniciativa de homenagear Baltasar Lo- antes. Não foi, devido à ditadura que nos sufocou
zer pesquisa de opinião sobre instituições públicas pes da Silva, editanto ou reeditando obras do gran- durante 15 anos.
em quem os cidadãos mais confiam. Agora, profis- de mestre da literatura cabo-verdiana. Infelizmente
sões “confiáveis”? Fique claro que estamos a dizer não consta do programa a reedição de “Chiquinho”, SOS Transportes marítimos
isto com todo o respeito pela Afrosondagem que obra que não se encontra no mercado a não ser em
até hoje tem até “acertado” nalgumas sondagens. fotocopias! Isto num país que até possui hoje uma Os transportes marítimos em Cabo Verde conti-
Universidade que foi colocada sob o patrocínio de nuam a ser, no geral, uma lástima. A Ilha Brava
Politica do governo em relação Baltasar. É da responsabilidade do Governo (Edu- continua isolada e ai daqueles que precisarem de
aos municípios. cação, Cultura…), não deixar que em nenhum mo- ser evacuados por razões garves de saúde. O go-
Divórcio entre o que se diz e o que faz mento falte no Mercado esse clássico da literatura verno está-se nas tintas, continuando a acenar para
cabo-verdiana. o mês de Outubro, em que a campanha pré-eleito-
É muito difícil escondê-lo. O Governo vem dis- ral estará no seu máximo e se poderá então inau-
criminando, a olhos vistos os municípios do país. gurar o Fast-Ferry com pompa e circunstância. S.
Basta ver que municípios são frequentados pelos Mário soares e a nossa independência Nicolau é a outra ilha a sofrer, uma vez que tanto o
ministros, onde é que aparece o primeiro-ministro “Tarrafal” como o “Sal Rei” estão avariados. Valerá a
para inaugurar obras, com que Presidentes apare- Consta por aí que o Dr. Mário Soares afirmou pena lembrar, mais uma vez, o principio da subsidi-
ce de braços dados. Não os da Praia, Assomada, que sempre foi contrário à Independência de Cabo ariedade, um dos pilares da doutrina social da Igre-
Tarrafal de Santiago, S. Domingos, Calheta Ribeira Verde. Consta também que, comentando essa po- ja, segundo o qual deve o Estado exercer activida-
Grande, Maio, Maio, Boa Vista, Mindelo, Porto Novo sição, José Maria Neves disse que não tem sentido de supletiva, quando o sector privado, por si, não
ou Ribeira Grande. O Governo frequenta pouco os promover essa discussão neste momento. Nós, pelo consegue ou não tem meios de promover determi-
municípios onde o PAICV não havia ganho nas últi- contrário, achamos que se trata de um assunto que nada actividade, como também deve o Estado in-
mas eleições autárquicas. Não temos notícias de se pode discutir em qualquer momento, sobretudo tervir para evitar situações de desequilíbrio e de in-
um só contrato-programa assinado com uma Câ- neste em que o Governo se prepara para gastar justiça social?

À memória da mãe Joana sui o seu modus faciendi do


«Choro». No último dia da
Esteira faz-se “o amanhecer,”
Daí que, na minha opinião,
e um pouco na linha: “ao cam-
po o que é do campo, à cida-
Regressada recentemente Ondina Ferreira «manchida» em crioulo, em de o que é da cidade” não é
de Bissau, onde estive por que a noite da véspera é uma recomendável a transposição
ocasião da morte de um fami- possivelmente em noite de Guiné é o «Choro» por oca- vigia até ao nascer do sol. – porque inadequada e pertur-
liar muito querido, lembrei-me luar e com uma ambiência sião da morte de alguém. As Após isso, enrolam-se as badora – de práticas tradicio-
– em jeito de homenagem – adequada. Logo, isso não tem chamadas cerimónias, são esteiras. Reza-se a missa do nais rurais para o meio urba-
escrever este pequeno texto nada a ver com um estúdio normalmente animistas, mas sétimo dia – nos casos de sin- no, sob pena de uma desca-
sobre a transposição de algu- fechado e virado para outros comportam também ou, po- cretismo religioso – e cada racterização e de criação de
mas tradições do meio rural, fins. Fecho o parêntesis e vol- dem também comportar cele- familiar e cada visitante, que situações, por vezes, conflitu-
seu espaço de origem e de to ao assunto inicial. brações fúnebres cristãs, entretanto esteve albergada osas e constrangedoras.
prática obrigatória, para o Com efeito, muitas das tra- (missas e terço rezado) se o em casa do morto, regressa Para finalizar, gostaria de
meio urbano sem condições dições que se querem manter defunto ou a família assim pre- ao seu local de residência. aqui recordar aquilo que em
para o cumprimento do ritual, já não se adequam – sobretu- tenderem e tudo isto num per- Em linhas muito gerais, de vida dizia a nossa familiar que-
normalmente longo e comple- do nos nossos dias – na cida- feito sincretismo religioso. forma muito abreviada e mui- rida, conhecedora dos usos e
xo que acompanha as cerimó- de, em casas sem quintal, em Para além da matança/sacri- to superficial, fica a pretensão dos costumes da terra, mas
nias que as compõem. apartamentos, no meio do fício de alguns animais, o ritu- de uma descrição do «Choro». ao mesmo tempo pessoa es-
Ora bem, abro aqui um trânsito, com um tempo e uma al inclui a «Esteira», estendi- Acrescente-se que a dura- clarecida – com a perfeita no-
pequeno parêntesis, para di- movimentação diferentes do das pois que são muitas as ção das cerimónias e a “lar- ção de que a isso, não pode-
zer que todas as vezes que tempo e do movimento do esteiras – ocupadas pelas gueza” dos repastos depen- ria fugir quando a morte a vi-
sobre isso falo, trago à cola- meio rural. Enfim, estas tradi- mulheres mais velhas e da fa- dem obviamente do estatuto esse buscar – de tal modo que
ção a imagem do batuque em ções não foram pensadas, mília no sentido literal do ter- do defunto. ela deixou recomendações e
estúdio de televisão. Para nem configuradas para o meio mo – durante oito dias na Mas o que aqui gostaria de orientações no sentido de ha-
mim, essa dança assim apre- dito urbano. Daí toda uma ina- casa do defunto. A primeira enfatizar é que as tradições ver limites e contenção em
sentada ganha algum contor- dequação quando se força a refeição da manhã normal- acabam por ter de ser modifi- tudo que às cerimónias dis-
no de “grotesco” e de inestéti- transposição delas para a ci- mente “comida de panela” cuja cadas, alteradas e abreviadas, sesse respeito, para que os
co, pois que ele, o batuque, dade. base é o arroz é levada à boca pois que a sua realização no filhos, descendentes, certos
foi concebido para o “terreiro” Pois bem, uma das tradi- após uma espécie de invoca- espaço citadino não se com- familiares e amigos não se
espaço aberto de terra batida, ções (quase instituição) mais ção/homenagem ao morto. padece com a configuração sentissem incomodados com
do campo, com o céu à vista, fortemente implantadas na Cada etnia guineense pos- que elas trazem do meio rural. essa tradição.
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Aquecimento Global, Mudanças Climáticas e Energias Renováveis (1)


Não sendo engenheiro o objectivo de importar, arma- Foi Alfred Russel Wallace, Arsénio Fermino de Pina
meteorologista, como o ami- zenar e distribuir combustí- o cocriador (com Charles Da- (Pediatra e sócio honorário da ADECO)
go Pimenta Lima, nem biólo- veis, mas, volvidos 8 anos, o rwin) da teoria da evolução
go ou paleontólogo, venho pu- projecto ainda não saiu do pela selecção natural, que eficiente como hoje. Talvez a mais carbono do que a erva e
blicando artigos sobre o aque- papel e parece adiado sine cunhou a expressão “o gran- fragmentação dos primeiros o capim; também absorvem
cimento global, mudanças cli- die. Enfim, uma data de pro- de oceano aéreo” para des- continentes tenha aberto va- mais luz solar e produzem
máticas, ecologia e origem da messas, incongruências, he- crever a atmosfera, dada a las no fundo do mar que se mais vapor de água, o que in-
vida, por disserem algo ao meu sitações e zig zags que exi- sua semelhança com os oce- encheram rapidamente com flui na formação de nuvens e
costado médico, serem preo- gem, urgentemente, a defini- anos. Este grande oceano sedimentos organicamente ri- produção de chuva, donde o
cupações generalizadas, ex- ção de uma política energé- aéreo, indivisível e omnipoten- cos (em carbono), o que le- interesse das florestas, além
cluindo alguns decisores polí- tica que possa orientar e pôr te, tem mantido tão bem a vou a uma refrigeração des- da produção de oxigénio e
ticos que têm poder para mo- fim a essa trapalhada energé- temperatura do nosso plane- controlada do planeta. Seja absorção do CO2 pela fotos-
dificar a iminência de desas- tica. Parece-me óbvio que o ta durante quase 4 biliões de como for, com menos anidri- síntese.
tres e obstar à eliminação da desenvolvimento económico anos, que a Terra permanece do carbónico (CO2) na atmos- O grande oceano aéreo
espécie humana, mas olham do país está intimamente liga- como o único berço conheci- fera, a Terra começou a ficar Este grande oceano tem a
para o lado, como se de nada do ao sector energético. A res- do de vida no meio de uma muito fria. Por duas vezes, por propriedade maravilhosa de
se tratasse, preocupações ponsabilidade disso cabe à infinidade de gases, rochas e volta de 710 milhões de anos, permitir que os raios solares
que todos nós devemos ter a classe política e, também, ao poeiras inertes. e de novo há 600 milhões de passem através dele sem o
fim de participar activamente privado num diálogo franco e anos, a Terra atingiu um pon- aquecer Todavia, quando a ter-
na luta em defesa da mãe na- construtivo e não na tradicio- Em 1979, o matemático to crítico que quase extermi- ra é aquecida, o ar aquece em
tura, dado que, quanto mais nal mania governamental de, James Lovelock publicou um nou toda a vida, congelando- contacto com ela, e também,
forte for a sociedade civil, mais como descrevi em ês ka ta livro assaz interessante e po- se até ao equador. Esta situ- pelo calor irradiado da terra
responsáveis e dialogantes kdi, no mutismo arrogante, lémico, de que tratei em arti- ação só se modificou com quente. Isso acontece por-
serão os governantes, por de- com os responsáveis emper- gos publicados, intitulado erupções vulcânicas provoca- que, embora o ar puro e seco
ver ou simplesmente por tigados e alapados ao poder, Gaia, onde afirmava que a Ter- das pelo excesso de peso permita que esses raios es-
medo. Volto ao assunto com parecendo dar razão ao filóso- ra era um único organismo, exercido pelo gelo sobre as curos de calor passem por ele
mais vagar e algumas preci- fo, psicanalista e pensador da ao qual deu o nome de Gaia, camadas profundas ígneas da livremente, o vapor de água e
sões depois de ter lido Tim sociedade, Cornelius Castori- em homenagem à antiga deu- Terra. Congelado, recoberto anidrido carbónico (CO2) no ar
Flannery no seu volumoso tra- adis, que afirmou – eu disse o sa grega da Terra. Como abor- de gelo e neve, um terço de interceptam-nos e absorvem.
tado Os Senhores do Clima, mesmo, de outra guisa, no dei o assunto com certo deta- toda a energia que chega à
e Luís Teixeira, num artigo de artigo acima citado - que a lhe, resumirei que Lovelock Terra do Sol é reflectido para Precisamos de definir al-
opinião publicado no interes- classe política pode aferrar-se defendia que a manutenção da o espaço pelas superfícies cla- guns termos que ouvimos a
sante jornal on line FORCV ao cinismo e à irresponsabili- temperatura da Terra era con- ras do gelo e neve – o fenó- todo o momento para poder
sedeado nos EUA, ex-profes- dade porque não está sujeita trolada pela existência de al- meno é conhecido sob o avançar com segurança no
sor universitário na UNIPIA- a nenhum controlo nem a ne- gas e microrganismos que ha- nome de Albedo (do latim, que vos venho falando: gases
GET (Portugal), actualmente nhuma sanção; os cidadãos bitam pântanos salgados onde brancura, alvura). com efeito de estufa, aque-
investigador na China para não têm nenhum meio eficaz cristais de sal, ao reflectirem Por volta de 540 milhões de cimento global e mudança
efeitos de doutoramento em de os fazer reagir a solicita- a luz de volta para o espaço, anos atrás, os seres vivos co- climática.
energias renováveis. Tive co- ções pertinentes nem a pro- os mantêm frios. Esses mi- meçaram a construir esquele- Gases com efeito de estu-
nhecimento deste artigo atra- postas construtivas, mormen- crorganismos tornam-se ne- tos de carbonatos e, ao faze- fa são uma classe de gases
vés do Eng. António Pedro te quando a comunicação so- gros à medida que o Inverno rem isso, absorviam CO2 da que podem captar o calor pró-
Silva, presidente da ADECO, cial se encontra enfeudada ao se aproxima, absorvendo o água do mar onde viviam. Isso ximo da superfície terrestre. À
que, como eu, o Eng. Rui poder. Como recurso eficaz calor e aquecendo a Terra. afectou os níveis de CO2 da medida que aumenta a sua
Spencer Lopes dos Santos, utilizam a burocracia que pri- Portanto, a Terra dispõe, na atmosfera e, então, as eras de concentração na atmosfera, o
Eng. José Pedro Fonseca e ma pelo silêncio ou as evasi- teoria de Lovelock, de um gelo tornaram-se mais raras. calor extra que eles capturam
poucos mais vêm chamando vas. sistema de autoregulação Só duas vezes – entre 355 e leva ao aquecimento global.
a atenção dos poderes públi- Bem, viremos a agulha da da temperatura bastante com- 280 milhões de anos, e há 33 Esse aquecimento, por sua
cos para a necessidade de linha do pensamento para ou- plexo e eficaz que pode, no milhões de anos -, é que eles vez, exerce uma pressão so-
real empenhamento na afec- tra via, que não a política, mais entanto, como veio a acrescen- prevaleceram. A evolução do bre o sistema climático da
tação de recursos ao desen- construtiva, motivante e inte- tar mais tarde, ser perturbado minúsculo plâncton formador Terra e pode levar a uma mu-
volvimento desse tipo de ener- ressante. Falaremos das mo- pela acção abusiva e crimino- de conchas (que contêm car- dança climática. É importan-
gias. A recém anunciada Cabo dificações meteorológicas, do sa do homem que perturbou bonato), há mais de 300 mi- te conhecermos a diferença
Eólica (para gerir os parques clima e suas alterações provo- gravemente essa capacidade lhões de anos, foi um passo entre condições meteorológi-
eólicos) e a hipótese de a cadas naturalmente e pela ac- de autoregulação. crucial para a estabilização do cas - de que nos apercebemos
Martifer Solar construir duas ção do homem, de modo a Desde que a vida surgiu na termóstato da Gaia. Além dis- todos os dias – e clima, que é
centrais fotovoltaicas (em San- percebermos a necessidade Terra, os raios solares aumen- so, com a formação de gelo, o a soma de todas as condições
tiago e Sal) com uma potên- imperiosa de mudarmos de taram de intensidade em 30%, nível do oceano desceu. Ex- meteorológicas ao longo de
cia, respectivamente, de 5 e rumo energético, de privilegiar- mas a temperatura terrestre postas as plataformas conti- um certo período, para uma
2,5 MW, são boas notícias, mos as energias renováveis manteve-se praticamente nentais, permitiu-se que o oce- região ou para o planeta como
mas será necessário que não que possuímos em barda em constante, o que, segundo ano retirasse mais CO2 da at- um todo. E todos, é claro, são
fiquem, como já vem sendo Cabo Verde e só precisamos Lovelock, não se pode atribuir mosfera e que os plânctons da gerados pela atmosfera, esse
hábito, em conversa fiada e de as aproveitar. O assunto dá a um mero acaso, até porque superfície dos mares (mormen- grande oceano aéreo.
promessas eleitorais. pano para muitas mangas mas uma queda de apenas 0,1% te dos mares frios) aumentas- Até mesmo em Cabo Ver-
O interesse do artigo de irei entreter-vos somente com na radiação que chega à Ter- sem e se apropriassem de de nos damos conta da alte-
Luís Teixeira, um perito na factos de que raramente se ra pode provocar uma era de mais CO2 da atmosfera. ração das condições meteo-
matéria, é ele opinar claramen- fala, já que dos outros tratei em gelo (glaciar). Na época em que os plânc- rológicas – aumento de calor
te, sem eufemismos sobre o escritos publicados ou podem Cerca de 600 milhões de tons proliferavam, ocorriam tam- e humidade relativa do ar em
negócio da electricidade, exi- ser encontrados em publica- anos atrás, os níveis de oxi- bém outras mudanças que te- épocas outrora de temperatu-
gindo que “passe a estar cla- ções de outros patrícios, de génio tinham aumentado o riam um impacto profundo no ra amena e ar seco, maior plu-
ra e completamente aberta à entre os quais há que salien- suficiente para permitir a so- termóstato da Terra – Período viosidade e intempéries, pare-
concorrência, exigindo que a tar o precursor, o investigador brevivência de criaturas maio- Carbónico, quando as flores- cendo até que as mudanças
regulação seja feita por uma Eng. Humberto Duarte Fonse- res do que as algas e micror- tas cobriram as terras, pela pri- climáticas globais nos estão
entidade forte e independen- ca, cuja obra tivemos a honra ganismos. Esses primeiros meira vez, e se formou a maior beneficiando com mais chuva,
te”. Informa-nos o articulista de de publicar, por duas vezes, na organismos viveram durante parte dos depósitos de carbo- devido ao aumenta da humi-
que, em 2002, um estudo fi- revista ANAIS da Academia de um período de mudanças cli- no, que agora alimentam as dade e da aproximação da
nanciado pelo Banco Mundial Estudos de Culturas Compa- máticas drásticas, quando 4 nossas indústrias – os com- chamada Frente Húmida Inter-
recomendou ao nosso Gover- radas. Há algumas definições grandes eras glaciares toma- bustíveis fosseis (dessas flores- tropical situada mais a sul.
no a criação de uma empresa e precisões que se impõem, ram conta do planeta, o que tas primitivas que foram subter-
[continua]
única de combustíveis, englo- para melhor entrarmos nesta pressupõe que a manutenção radas a boas profundidades).
bando a Shell e Enacol, com série de artigos. térmica da Terra não era tão As florestas contêm muito Parede, Março de 2010
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Guardar a Memória Histórias de Padres (10)

A EPIDEMIA DE CÓLERA NO FOGO EM 1855


- parte III: OS HORRORES DE UMA EPIDEMIA
Por Monique Widmer
Padre Jerónimo Usera
Fundador das Irmãs do Amor de Deus
Continuando a dar a conhecer ter, negaram-lhe a livre pratica, e o abertas em frente das igrejas nas
este acontecimento trágico da epi- Capitão não se querendo sujeitar a proximidades da Villa; até dentro Nasceu em Madrid, a 15
demia de cólera que assolou a Vila soffrer quarentena, regressou à dos pateos se enterravam cadáve- de Setembro de 1810, no seio
de S.Filipe e a ilha do Fogo em 1855, ilha do Fogo, onde tornou a funde- res por serem encontrados em es- de uma família com profun-
vou hoje transcrever mais alguns ar». tado de decomposição adiantada.» das raízes cristãs, vasta cul-
excertos do relatório do cirurgião- Tendo ouvido noticias das mais «As inhumações eram feitas tura e grande patriotismo.
môr que demonstram como o terror aterradores do alastramento da epi- pelos escravos». Eles também ado- Esta herança familiar, uni-
e a confusão se apoderaram dos demia, ninguém quiz desembarcar, eceram, morreram, fugiram ou nem da ao talento e bondade natu-
habitantes. A perda do controle da excepto uma família numerosa que se queriam aproximar dos cadáve- ral, fizeram de Jerónimo Usera
situação provocou a fuga dos mo- seguiu viagem para a Praia a bordo res para os enterrar, de tão grande um homem de rica personali-
radores para o interior da ilha e de da chalupa Benjamim. O Capitão da era o pavor. dade e de virtudes sólidas, um
algumas famílias e parte das autori- chalupa Cordialidade viu-se força- «Ao passo que a população da espírito inquieto e amigo de
dades para a Vila da Praia, e, mais do a seguir também viagem. A bor- Villa passava por esta crise, a do saber, cheio de amor a Deus
ainda, a desgraça dos que ficaram. do havia «trinta e oito homens livres, interior não lhe prestava soccorro e de audácia e generosidade
«A epidemia de momento para vinte escravos, sessenta e cinco algum, por isso houveram famílias
em favor dos necessitados.
momento adquiria mais intensidade, senhoras e dezanove escravas. Na inteiras acommettidas pela epidemia
continuando a atacar de preferên- viagem, houve quem apresentasse
Muito jovem ainda, entra na
sem terem quem lhes fizesse o me-
cia os escravos, os taberneiros, e sinais de doença e um liberto de Ordem de Cister. Mas, expul-
nor serviço, nem quem lhes fosse
todos aquelles que em mais con- avançada idade morreu (…). Uma buscar um barquinho de água à fon- so do Convento com os seus
tacto tinham vivido com a gente da senhora teve um parto prematuro e te da Praia Ladrão, que sendo a confrades em 1835, devido a uma reviravolta política, decide viver
barca, e com a gravidade na rasão uma criança morta. E houve ainda mais próxima, dista da Villa quasi como monge enclaustrado.
directa d’estas comunicações. Os muitos casos de diarreias nos pri- duas léguas. Havia de ser horrível A tradição familiar e os seus estudos realizados dentro da Or-
casos mórbidos, que sem interrup- meiros dias de quarentena feita no o não ter uma gota de água para dem abrem-lhe as portas da Universidade de Madrid, onde leccio-
ção uns após outros se succedi- lazareto que o Governador montou humedecer os lábios na presença nou como professor de teologia, sagrada escritura, hebraico e Gre-
am, muitos gravemente, alguns mor- no ilhéu [de Santa Maria, na Praia]». de uma moléstia em que a sede é go.
taes em poucas horas, e poucos Uma outra parte dos morado- insaciável!» A sua experiência humana e apostólica como pregador e pro-
ligeiros; os choros (guisas) dos res abandonou a Vila «fugindo para Christiano José de Senna Bar- fessor, enriqueceu e completou-se no campo missionário.
parentes e dos amigos dos que suc- o interior da ilha, recorrendo ao abri- celos (1854-1915), oficial da Arma- O Padre Usera teve o Carisma pessoal de conseguir mobilizar
cumbiam, a passagem pelas ruas go das suas acanhadas e miseras da e investigador histórico, escre- e organizar grupos de apoio ao seu grande projecto: restaurar so-
dos cadáveres d’aquelles que ain- casas do campo.» ve nos «Subsídios para a história lidamente a vida cristã da sociedade e abrir aos povos um cami-
da n’esse mesmo dia se haviam le- «Raras eram as pessoas que de Cabo Verde e Guiné» (vol. IV, nho de progresso e de felicidade. Os destinatários, por excelência,
vantado cheios de vida, acrescen- se viam pelas ruas da Villa; com bem parte VI da reedição de 2003), das suas Obras foram as crianças, a mulher, os camponeses e a
do que esta catastrophe se passa- poucas excepções os seus habi- acrescentando: «O administrador do
raça negra. Pela dedicação de uma vida a estas causas é conside-
va no ponto mais saudável de toda tantes eram só os indigentes doen- concelho do Fogo, aterrado de ver
a ilha, onde a maior partes dos mo- tes, moribundos e alguns escravos
rado por todos como o pai dos pobres e defensor dos escravos.
morrer quatro pessoas de sua fa-
radores são parentes, e onde to- que abandonados por seus senho- As Ilhas do Golfo da Guiné, as Antilhas e Espanha foram as
mília, em poucas horas, fugiu com o
dos se conhecem pessoalmente, res andavam vagabundos, sem te- resto a bordo do seu navio, a cha- depositárias, em vida, dos dons desta actividade por amor, de en-
aterrou por tal forma alguns dos que rem quem lhes desse o triste sus- lupa Benjamim, para a Villa da trega activa e rica.
tinham protestado não abandonar a tento diário, nem quem os soccor- Praia.» A Obra fundamental do P. Usera é a Congregação das Irmãs do
ilha, que n’essa mesma noite fugi- resse, quando fossem feridos pela O governador ordenou «a in- Amor de Deus, com uma longa trajectória educativa, desde que o
ram também para bordo do patacho. epidemia. Muitos d’estes infelizes communicabilidade com os navios Fundador lançou a primeira semente em Toro (Espanha) no ano
O Capitão do Cordialidade não foram encontrados gravemente ata- procedentes do Fogo, avisando que de 1864.
tendo podido oppor-se a que o seu cados no meio dos quintaes, tendo só na Praia seriam recebidos no Jerónimo Usera morre em Havana - Cuba - pobre de bens
navio fosse apinhado pela gente da por colchão a calçada, por cober- Lazareto. Viu-se a braços com materiais, mas cheio de méritos, a 17 de Maio de 1891. O seu lema
ilha, nem tendo conseguido que ao tura a abobada celeste, e por en- essa epidemia numa ilha onde o "Dizer a verdade e fazer o bem" em serviço de Deus e dos homens,
menos parte d’ella voltasse para fermeiros os porcos e cães; e ou- povo soffria já os horrores da fome foi a razão das suas palavras, da sua pobreza, dos seus riscos e
terra, não teve remédio senão an- tros já mortos há dias em parte de- [nesta e nas outras ilhas]. Nas con- da obediência e submissão à Igreja.
nuir ao pedido de todos e saiu na vorados põe aquelles animaes es- dições pobríssimas do thesouro da Entretanto, foi aberto no em 15 de Setembro do ano passado
madrugada do dia 7 para a ilha Bra- faimados.» província, bem insignificantes foram do Bicentenário do nascimento de Pe. Jerónimo Usera.
va, onde chegou pelas oito horas «Nos primeiros dias de epide- os socorros alimentícios para alli "Foi uma festa simples mas calorosa - informa a congregação
de manha; porém as auctoridades mia os enterramentos foram feitos mandados pelo governador, de
- ,dando início às diversas actividades que acontecerão em toda a
d’aquella ilha, receiando pelo exces- no cemitério, que fica um pouco dis- modo que, só por este facto, regis-
sivo número de passageiros que na tante da Villa, mas logo que o núme-
geografia 'Amor de Deus' nos 19 países por onde a Congregação
tou-se grande mortalidade, esta
ilha do Fogo se tivesse desenvolvi- ro diário dos casos mortaes che- está hoje estendida, aprofundando na vida e obra do padre Usera
mais aumentou ainda por não haver
do alguma molestia de mau carác- gou a vinte, as sepulturas foram medicamentos na província». como homem aberto a Deus e às necessidades dos irmãos, agra-
decendo juntos ao Senhor pelo dom que ele foi e é para a Igreja e
aprendendo dele a comprometer-nos com fidelidade a favor dos
JOGO DE PENSAR irmãos mais necessitados".
O lema de toda a celebração do Bicentenário, "Nasceu para
fazer o Bem", sintetiza o lema de vida do fundador: "Dizer sempre a
– CUIDAR – Verdade e fazer sempre o Bem", conscientes, afirma a congrega-
ção, de que "a Verdade e a Caridade estão tão unidas que pode-
CUIDAR quer dizer: dedicar 6. Quem é que prepara a terra, 7. Quem é que promove os va-
mos dizer que não existe uma sem a outra: Jesus que disse; Eu
muita atenção; zelar por; esforçar- semeia, monda e cuida das plantas lores evangélicos e humanos e cui-
se para que fique bem; trabalhar até produzirem? da das almas?
sou a Verdade; e dele disse Pedro: passou fazendo o Bem".
com determinado objectivo. "É um momento de unidade espiritual em torno ao padre Usera
no qual rogamos a Deus que o ano de celebração seja tempo de
1. Quem é que protege a saúde 1 M graça, de compromisso e oportunidade bem aproveitada para avan-
e cuida dos doentes? çar por caminhos de santidade; também, se Deus assim quiser,
2 E que durante ela o padre Usera seja mais conhecido e acolhido
2. Quem é que tem por função como modelo de vida cristã, homem de profunda experiência do
escrever e cuidar pelos documen- 3 M amor de Deus em sua vida que sabia traduzir em gestos concretos
tos oficiais? (Cargo importante num
serviço administrativo antigamente). 4 O com os demais", afirma a congregação.
A celebração do encerramento do Bicentenário acontecerá em
5 R Madrid, na igreja de São Sebastião, onde o fundador foi baptizado
3. Quem é que cuida com com-
petência dos motores dos carros 6 I (16 de Setembro de 1810).
ou dos barcos? Recorde-se que a Congregação está presente em dezanove
7 A países: Cabo Verde, Moçambique e Angola, no continente Africano;
4. Quem é que ensina e cuida Chile, Peru, Bolívia, Brasil, México, Porto Rico, República
pela aprendizagem das crianças e 5.Padeiro 6.Agricultor 7.Padre
Dominicana, Cuba, Guatemala, Estados Unidos no continente
dos jovens? 1.Médico 2.Escrivão 3.Mecânico 4.Professor
Americano; Alemanha, Itália, França, Portugal e Espanha, no conti-
Sobre: «CUIDAR»
5. Quem é que junta cuidadosa- nente Europeu; Filipinas no continente asiático. Em Cabo Verde as
mente o fermento à farinha para
Solução do JOGO DE PENSAR Filhas do Padre Usera trabalham desde 1943, dedicando-se à
termos o pão de cada dia? Frei Fernando educação dos mais novos e à colaboração na pastoral paroquial.
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DIANTE DA CAMPANHA DA IMPRENSA CONTRA O PAPA


COMO EDUCAR A NOVA
Director agnóstico do Il Foglio: GERAÇÃO PARA O AMOR
A Igreja não pode renunciar a ser quem Ela é
Giuliano Ferrara é o direc- tida plenamente pelas leis do cristã, para transformar-se em Por Frei Bernardino Lima
tor do jornal italiano IL Foglio. estado, sem espaço para seu máquinas de burocracia penal
Ele se declara liberal e agnós- ‘sinistro’ teatro do divino e do ao serviço dos tribunais, que VI (b)
tico. Nestes dias escreveu um culto e da ‘repressiva e supers- devem por sua parte indagar
artigo intitulado “A carne e o ticiosa’ cura de almas. Os libe- sobre os delitos e sancionar os
O AMOR É UM BEM MORAL
Padre Murphy” no qual comen- rais, pelo menos de tom e mé- crimes”, afirma.
ta a campanha de mídia do todo, como procuramos ser nós Para Giuliano Ferrara “a Igre-
Dando continuidade a nossa reflexão, podemos afirmar, tam-
New York Times contra o Papa no Il Foglio, acreditam em uma ja deveria começar a dizer isto
bém, que a compreensão do amor como um bem moral ou como
Bento XVI e explica que a Igreja Igreja e um Estado livre, em sem complexos, explicando
um dom espiritual que a pessoa faz de si mesma à outra não é
não pode renunciar a ser quem uma Igreja que tem direito à que sua identidade, no núcleo
fácil na nossa sociedade actual, onde, deparamos que há uma
é, a seus critérios nem à sua palavra, de acção, de educação mais profundo, está ligada a
maneira de actuar ante o peca- e de autogoverno. E que sobre uma ideia do pecado que está
prevalência excessiva na busca do prazer sexual, do bem estar
do do homem, que o mundo tudo tem direito também ao individualizada, actua caso por económico, cultural e profissional. Uma cultura meramente mar-
não compreende. próprio ponto de vista ao distin- caso, não suporta as leis iguais cada pelo sensualismo derivado do sexo, da música, do desporto
Ferrara começa o artigo re- guir, sagrado princípio liberal, e indiferentes à alma de cada faz com que haja uma perda relevante do amor como valor huma-
latando algo do caso do Padre entre pecado e delito”, diz Fer- um, típicas do direito positivo”. no e interpessoal. De facto, a perda do sentido real da vivência
Lawrence C. Murphy que nos rara. “A Igreja deveria dizer aber- cristã e ética do amor entre as pessoas é a consequência de uma
Estados Unidos abuso de vári- Para o director do Il Foglio, tamente que o castigo penal, idealização exagerada do eros (sexo) como divertimento erótico à
os menores surdos confiados “a Igreja faz bem, no marco da legítima aspiração dos tribu- volta daquilo que tem sabor de publicidade, de moda, de imagem.
a ele em Milwaukee. Explica carta do Papa ao clero irlandês, nais do estado aos quais o cle- A ligeireza ou a superficialidade com que muitos vivem a própria
como o então Cardeal Ratzin- em colocar hoje o acento sobre ro pode oferecer cooperação, é, sexualidade desvinculada da procriação, da instituição social, da
ger, Prefeito da Congregação a culpa também legal constitu- contudo nulo, é um grão de religião e moral implica uma certa desconexão entre o desejo
para a Doutrina da Fé, não en- ída pelos comportamentos pe- areia disperso no vento; frente humano do sexo e o dom do amor cristão. Por causa dessa ruptu-
cobriu o caso mas o tratou dófilos, e a proclamar com mui- ao mecanismo de imputação ra nota-se na nova geração uma profunda discrepância moral,
como devia, de igual maneira o ta assertividade que os sacer- divina que leva à consciência espiritual e comportamental. Daí a necessidade de ajudar a nova
seu secretário, o então Arcebis- dotes que traíram a confiança do pecado, ao livre arrependi- geração no restabelecimento do seu mundo interior para que ela
po Tarcisio Bertone; e entretan- das crianças ou rapazes ou mento em consciência, à expi- possa encontrar a harmonia e sintonia no seu modo de ser ho-
to se usou de “modo simples- moças devem responder seja ação e ao perdão ou absolvi- mem e mulher.
mente escandaloso, como es- diante de Deus ou dos tribunais ção do especialíssimo direito
candalosa é a síntese do artigo civis”. que se realiza na cura de al- A consciência de que o amor é um dom divino que a pessoa
e os comentários do New York Ferrara assinala logo que mas”. acolhe e oferece faz com que ela perceba si mesma como sujei-
Times”. “provavelmente a Igreja deverá Finalmente Ferrara assina- to e protagonista do seu próprio ser e não considerada objecto
O diretor do Il Foglio explica dotar-se de instrumentos ins- la que “a Igreja tem seu modo de uso e consumo. O amor não é uma coisa que o ser humano
logo que estes ataques procu- pectivos e canónicos, ligados de castigar, julgar, considerar e possui, mas, é a expressão máxima do seu modo ser e de exis-
ram “transformar a Igreja Cató- à Congregação para a Doutri- ver o homem no pecado e o tir. De facto, o ser humano nasce por amor e vive por amor. Antes,
lica, secularizá-la a fundo e in- na da Fé, que realizam uma efi- pecado no homem: um modo é o amor que dá credibilidade à vivência moral de cada indivíduo.
duzi-la a comportar-se em ple- caz cooperação com os órgãos peculiar ao qual em nenhum Portanto, nem a beleza corporal, nem a honra e o prestígio, nem
no acordo com critérios mun- do direito comum”. caso pode renunciar. Trata-se o poder soberano das coisas e das instituições sociais, políti-
danos que são em parte estra- “Mas não acredito que os da tutela e a defesa de um cri- cas, culturais e religiosas poderão ser equiparados à essência
nhos a ela”. Se o caso não fos- laicos crentes, as irmãs, os tério, meio humano e meio divi- do amor que rege e determina a existência humana. Trata-se de
se usado assim, afirma, “pode- sacerdotes, os bispos, os ca- no, que é a pedra angular do uma realidade que transcende quer a materialidade corpórea do
ria ser utilizado para entender nonistas, os teólogos, os Pre- cristianismo que já tem dois nosso ser quer o aspecto sentimental que envolve a nossa vi-
como estão realmente as coi- feitos de cúria e os Papas po- milénios. A Igreja não pode re- vência psicológica e cultural. A dificuldade de compreender a
sas, sem perder-se em deta- derão jamais renunciar a tratar nunciar à noite do “Innomina- beleza do amor na sua globalidade, sobretudo, na nossa socie-
lhes inúteis”. o pecado como pecado, e ao to”: não restaria dela pedra so- dade pós-moderna, é devido ao factor de dissociação emergen-
“Os radicais querem uma arrependimento como porta bre pedra”. te da mentalidade comum à volta das finalidades da sexualida-
Igreja democratizada e subme- aberta ao perdão e à expiação Fonte: Acdigital de humana. Aliás, nutre-se no seio da nova geração a mentali-
dade de que o corpo humano é uma entidade absoluta e desco-
nexa do resto das dimensões humanas que constituem toda a
personalidade.

Mindelo: XIII Encontro Diocesano de Pastoral A absolutização do aspecto material que dá gosto, prazer e
satisfação em detrimento do aspecto espiritual e moral que soli-
difica e dignifica a pessoa na sua integridade, comporta necessa-
De 13 a 15 de Abril, teve lu- também uma oportunidade tário “São Tomé os Últimos riamente o depauperamento, degradação e diminuição do ser
gar em S. Vicente, sob a presi- para analisar o tema da Pedo- Contratados”, de Leão Lopes, humano. A dissociação que reina no interior da pessoa humana é
dência de D. Arlindo Gomes filia na Igreja, um assunto que e fizeram um “tour” pela ilha, causa de preocupação não somente pela sociedade civil, como
Furtado, Bispo de Santiago de tem feito sofrer toda a Igreja e que terminou com a Eucaristia também, de toda a comunidade cristã. Nesta perspectiva, o Santo
Cabo Verde e Administrador vêm merecendo intervenções na Capela de Salamansa, na Padre diz que “na verdade, encontramo-nos diante duma degra-
Apostólico de Mindelo, o XIII firmes por parte da Santa Sé. qual participaram muitos fiéis dação do corpo humano, que deixa de estar integrado no conjunto
Encontro Diocesano da Pasto- Também foi comentado a for- daquela localidade. da liberdade da nossa existência, deixa de ser expressão viva da
ral. ma desonesta e mal intencio- Não foi marcado o próximo totalidade do nosso ser, acabando como que relegado para o
No decorrer dos trabalhos, nada como determinada im- Encontro Diocesano da Pas- campo puramente biológico. A aparente exaltação do corpo pode
os Secretariados Diocesanos prensa vem tratando o assun- toral, o primeiro do próximo bem depressa converter-se em ódio à corporeidade. Ao contrário,
da Pastoral, nomeadamente, to, deixando entender o seu ano pastoral, que acontece
a fé cristã sempre considerou o homem como um ser uni-dual,
os da Catequese, Juventude, verdadeiro objectivo que não é habitualmente em Novembro,
em que espírito e matéria se compenetram mutuamente, experi-
Liturgia e Acção Social (Cari- tanto defender e fazer justiça às uma vez que, por essa altura,
mentando ambos precisamente desta forma uma nova nobreza”
tas) apresentaram o balanço vítimas como fomentar o ódio conta-se com a hipótese de a
das actividades e o que tenci- (Bento XVI; Deus é amor, 5). Somente o amor, visto e vivido como
contra a Igreja Católica. Diocese ter já o seu novo Bis-
onam fazer nos próximos tem- Os participantes dedicaram po. realidade transcendental, tem o poder de eliminar o dualismo
pos. A titulo de indicação suges- uma tarde à adoração ao San- Recorde-se, a propósito, criado pelas correntes ideológicas baseadas na filosofia, na soci-
tão, «tendo em conta a situa- tíssimo, como aliás vem sem- que o Núncio Apostólico, Mons. ologia e na psicologia de filo materialista e ateísta. A negação do
ção da Diocese que aguarda o pre acontecendo, em ocasiões Mariano Montemayor, durante a amor como um bem moral, não só põe em causa o equilíbrio
seu pastor, foram assumidos do género. Missa Crismal que presidiu em psicológico do homem, como também, poderá suscitar outros
alguns compromissos, entre Como actividades extras, os S. Vicente, pediu orações aos sentimentos negativos que poderão pôr em causa a estabilidade
os quais, um tema de reflexão agentes tiveram a oportunida- fiéis da Diocese que rezassem social e cultural de uma sociedade. As formas de violência e de
para o proximo ano pastoral: de de deslocar-se às Instala- por essa intenção, dizendo que delinquência emergentes na nossa sociedade actual são mani-
“Igreja em Cabo Verde que ções do ex-liceu Jorge Barbo- o processo da escolha do novo festações quer do vazio interior da nova geração quer de uma
missão hoje?” sa, no centro da Cidade, onde Bispo encontra-se já na sua sociedade que faz de tudo para minimizar aquilo que é sagrado e
O encontro acabou por ser puderam ver o filme-documen- última fase. divino.
Pág. 8 Abril 2010

ESCRITOR JUDEU DIZ QUE


Entre factos e mitos: cultura do CAMPANHA CONTRA O PAPA E A IGREJA SÓ PROCURA VENDER
atraso vs. cultura do progresso O poeta, escritor, colunista e
ensaísta judeu Jon Juaristi, publicou
Daniel Santos, escrevendo no Casimiro de Pina no domingo de Ressurreição um ar-
Expresso das Ilhas (n.º 437, p. 43), tigo no jornal espanhol ABC no qual
volta ao famoso encontro de José A “pobreza” e a “desigualdade” Uma outra falha lamentável do assinala que "não é necessário ser
Maria Neves com os “thugs”, criti- são apenas uma tentativa de legiti- discurso do Daniel é a associação católico" para ver aonde aponta a
cando, severamente, o Primeiro-Mi- mação, a posteriori, de uma vasta fácil entre os falhanços do actual campanha da mídia contra o Papa
nistro. decadência moral e espiritual, Governo e as receitas contidas nos Bento XVI e a Igreja, que só procura
O encontro, segundo Santos, incentivada, primeiro, enquanto rai- “manuais do liberalismo”. É um pre- vender e tirar os católicos da esfera
“poderá ser um convite à formação son d’État, pelo “materialismo dia- conceito. pública.
de novos grupos marginais”. léctico” do partido único e, depois, José Maria Neves falhou na Em seu artigo intitulado "Justicei-
E, mesmo, institucionalizar os pelo triunfo do relativismo moral no política económica, não por causa ros", Juaristi assinala que "com o ris- Desde esse momento, denuncia
thugs, enquanto “organização e sistema educativo e na imprensa, o do liberalismo, mas por causa do co de resultar um pedante, volto so- Juaristi, "o alvo dos ataques já não
parceiros do Estado”. que levou, sem uma consistente ESTATISMO. bre o tema de minhas colunas ante- constituem os sacerdotes pederas-
Os jovens delinquentes, rece- oposição, à “ditadura do politicamen- O Estado cabo-verdiano, con- riores, porque a turba segue rugin- tas e os bispos encobridores, mas o
bendo uma espécie de incentivo te correcto” e à gradual inversão sumindo cerca de metade da rique- do e muitos jornalistas e bloggers Papa, contra quem se mobilizou a
político ao mais alto nível, prenhe dos valores, que é, hoje, regra, e za nacional, esmaga a nação e im- livres pretendem agora que o Papa ala liberal justiceira, tomando a carta
de significado simbólico, erigir-se- não excepção, na sociedade cabo- pede a inovação e a criação da pros- apresente sua demissão. Uma hipo- em questão como um sintoma de
iam num como que “sindicato do cri- verdiana. (A “ética da malandragem” peridade. É um Estado assistencia- tética demissão papal tem mais mor- debilidade, quando foi, claramente,
me”. é o produto de uma lenta descons- lista. Rentista. bo para este tipo de pessoal, dito uma demonstração de força moral
Palavras certeiras, sem dúvida. trução da alma cabo-verdiana, ini- O que vigora em Cabo Verde seja de passagem, que os próprios que deixa em evidência a incapaci-
O que o Daniel Santos não diz é que ciada nos alvores do “socialismo não é o ideal económico de Adam atos de pedofilia ou efebofilia come- dade flagrante do progressismo para
tidos por sacerdotes, que vão se levar adiante uma crítica análoga de
o Governo de José Maria já é, por precário” do pós-independência, Smith.
revelando como puro pretexto para suas próprias iniqüidades".
mérito próprio, sem qualquer favor, cuja grande aposta era o alcançar É, antes, a “economia da cor-
encurralar Bento XVI".
um belo SINDICATO DO CRIME. do “homem novo”, um homem light rupção”, em que o Estado é “coloni-
"E resulta que só o Papa e a Igreja "Como neste caso não parece
O dr. José Maria Neves, primus e desprovido do sentido de trans- zado” por um partido e distribui fa-
tomaram a sério este assunto. Ex- que vai funcionar o princípio de que,
inter pares, cometeu, no dia 22 de cendência, mas fiel à lógica revolu- vores e subsídios consoante a cor
plorando o escândalo, a imprensa ferido o pastor, dispersar-se-ão as
Janeiro de 2006, meia dúzia de cri- cionária e à política subversiva do política dos felizardos. Não temos
amarela só procura vender, e a ala ovelhas, é previsível que a campa-
mes e até hoje, contando com a in- partido-guia e do seu exército de pioneiros como Bill Gates nem em- progressista, tirar os católicos do nha aumente durante algum tempo e
crível subserviência da “justiça” e intelectuais orgânicos, os guardi- presas criativas como a Google. espaço público, ou ao menos, se a que a cena se encha -já está pas-
das demais instituições da Repúbli- ões do Mito e das maravilhas ruti- Temos, ainda, aquilo que sem- campanha não desse para tanto, sando- de espontâneos que nos
ca, não respondeu pelo facto. lantes da propaganda; não se pode pre tivemos desde a fundação qui- deixar a reputação do clero pelos contem o que sofreram com o sa-
O ilustre Governo, que sobre- ignorar os estragos que a “enge- nhentista da nossa nacionalidade: chãos", prossegue. cerdote pedófilo que lhes corres-
tudo desgoverna, nos píncaros da nharia política” de inspiração totali- pessoas que, estrategicamente, se Juaristi recorda logo que "se por pondeu", continua.
“governança”, conserva ainda, no tária fez no tecido social cabo-ver- colocam no recinto do poder e, num acaso já não disse suficientes ve- Finalmente o colunista judeu
seu seio, um falsificador de atesta- diano, fragilizando as famílias, a ad- ápice, fazem fortunas admiráveis, zes, não sou católico, mas não me assinala que esta maneira de pro-
dos médicos (S.M.) e uma senhora ministração pública, a ética do tra- mexendo, habilmente, os cordeli- escapa a imensa talha moral do atual ceder "é o correlato obrigatório do
(M.M.) que esteve envolvida no es- balho e a sociedade civil). nhos oficiais e as “ligações” que Pontífice em comparação com seus justicierismo: a socialização da
cândalo do “saco azul”. É gente que Não, o nosso sistema de ensino abrem a roda da sorte e das fartas atuais e pululantes caluniadores, ver- condição de vítima, a cultura da
percebe da faina! não é “elitista”, como pensa o Dani- manigâncias. dadeira massa de perseguição". queixa. Mas a isto já têm acostuma-
Mas, por um deslize inexplicá- el. É, pelo contrário, massificado e O nosso “mal colectivo” não é o "Não é necessário ser católico dos. Que liberal progressista não
vel, Daniel entrou na ladainha das não promove a transmissão dos va- liberalismo: é o primado da burocra- para ver com claridade aonde con- tem um avô fuzilado por Franco,
“desigualdades” como explicação lores autênticos, tendentes à for- cia, o nepotismo selvagem, o rent- duz esta batida da mídia contra a enterrado em ravina ignoto ou em
do fenómeno da violência urbana. mação de uma cidadania dinâmica, seeking incorrigível, o viver prodi- Igreja, e, embora admita que a con- sarjeta poeirenta? O mal é que,
Ora, não faz qualquer sentido. As cosmopolita e responsável. gamente à custa do Leviathan e dos dição de judeu ajuda o seu a intuí-lo, como passa sempre, a moeda falsa
“desigualdades” não explicam Mesmo nos dias de hoje, se contribuintes. acredito que basta entendendo que expulsa a boa do mercado e o jus-
nada. compulsarmos as estatísticas, ve- O Governo do PAICV é orça- o justiceirismo supõe sempre uma ticeiro acabará por ocultar a dor das
Nos anos 90 do séc. XX, a desi- remos que os “thugs” são uma imen- mentívoro e centralizador. corrupção do reto sentido da justi- verdadeiras vítimas".
gualdade de rendimentos aumentou sa minoria no total dos jovens po- As nossas políticas “públicas”, ça. Este se eclipsou desde que Bento
nos Estados Unidos da América, bres, desempregados e excluídos. estafadas e improdutivas, resumem- XVI fez pública sua carta aos cató- Jon Juaristi
enquanto as taxas de criminalidade A pretensa explicação falha, por- se a isto: endividamento crescente licos irlandeses". In ACI- 06 /04/10
conheciam um declínio notório. tanto, redondamente. A diferença e construção de elefantes brancos
Foi neste período histórico que está nos valores, nas crenças in- (de duvidosa rendibilidade).
o major Giuliani pontificou em Nova dividuais. O que conta não é a criação de
Iorque, com a avisada política de “to- A maioria, mesmo sendo po- empregos, a base de uma econo- HUMOR POLÍTICO
lerância zero” (inspirada na “broken bre, sabe que o crime não é a via mia saudável. É a glória do príncipe
windows theory” de James Wilson mais aconselhável para se afirmar e a grandiloquência do reino.
e George Kelling, especialistas em numa sociedade. E tenta, como su- O mercantilismo ibérico, preo- Saúde para todos
criminologia), cujo êxito foi simples- blinhei num artigo pretérito, “subir cupado, avant tout, com os “cofres
mente espectacular e contagiante. na vida com princípios e honradez”. do Estado”, é o pensamento que – Bom dia, é da recepção? Eu gostaria de falar com
alguém que me desse informações sobre os doentes. Queria
A Europa passou a imitar esta Foi esta a via que o meu pai, um melhor se adapta ao actual estado
saber se determinada pessoa está melhor ou se piorou...
medida sensata, que privilegia a li- menino pobre e excluído do seu tem- de coisas.
– Qual e o nome do doente?
berdade e o respeito pelas leis. po, escolheu. No séc. XVI, os olhos dos buro-
– Chama-se José Tavares e está no quarto 54.
Em épocas recuadas, havia É esta a via que aconselho, cratas reluziam perante a acumu- – Um momentinho, vou transferir a chamada para o
muita desigualdade em Cabo Ver- hoje, a todos os miúdos pobres do lação dos metais preciosos; agora, sector de enfermagem...
de. Mas os jovens (pobres e “ex- meu país. O crime não compensa e exibem-se, na televisão, os milhões – Bom dia, sou a enfermeira Lourdes. O que deseja?
cluídos”, na célebre fraseologia crí- nem pode compensar. Esta é a men- de euros que o Governo negociou – Gostaria de saber as condições clínicas do doente
tica) não formavam grupos nem sagem que devemos passar à ju- lá fora! José Tavares do 54, por favor!
praticavam crimes de uma forma ventude; a mensagem certa. É esta a esplêndida filosofia – Um minuto, vou localizar o médico de serviço.
quase gratuita. A pobreza, quer para as pes- política da Neveslândia, a sua mar- – Aqui é o Dr. Manuel, de serviço. Em que posso ser-
Havia FOME (algumas fomes soas individuais, quer para as na- ca indelével: a “acumulação primi- lhe útil?
dramáticas foram, inclusive, cele- ções, pode ser vencida, se adop- tiva do capital”. A marca do subde- – Olá, Sr. doutor. Precisava que alguém me informasse
brizadas pela literatura e pelo can- tarmos, claro está, os VALORES senvolvimento e do atraso. sobre o estado de saúde do José Tavares que está
cioneiro popular) em Cabo Verde, correctos: trabalho, seriedade, de- Os países escandinavos (Sué- internado há três semanas no quarto 54.
miséria generalizada, carências de dicação, carácter, lealdade, confi- cia, Dinamarca, Finlândia) são apon- – Ok, vou consultar a ficha do doente... Só um instante!
toda a espécie, mas as pessoas ança, inteligência, criatividade. tados, frequentemente, como o mo- – Ora aqui está: ele alimentou-se bem hoje, a tensão
eram pacíficas e a criminalidade re- O Estado tem de fazer a sua delo ideal a seguir, por conciliarem arterial e a pulsação estão estáveis, responde bem à
duzida. parte, criando as condições insti- a liberdade com a solidariedade. Ora medicação prescrita e vai ser retirado do monitor cardíaco
Não havia “grade” nas residên- tucionais favoráveis. bem: veja-se a posição que eles até amanhã. Continuando bem, o médico responsável dar-
cias particulares. As famílias dormi- Mas nós também, we the peo- ocupam no índice da Heritage Foun- lhe-á alta em três dias.
– Ahhhh, Graças a Deus! São notícias óptimas! Que
am, aliás, e sobretudo nos dias de ple, como se diz na Constituição dation sobre a liberdade económi-
alegria!
calor, com as janelas abertas. Sem americana de 1787, temos de fazer ca.
– Pelo seu entusiasmo, deve ser alguém muito
medo. Havia um clima de confiança a nossa parte. Esta é uma respon- A Dinamarca aparece no 9.º lu-
próximo, certamente da família!?
e respeito mútuo. sabilidade indeclinável. Nós é que gar da lista. Pelos nossos padrões, – Não, sou o próprio José Tavares que telefona daqui
No Fogo, mesmo na cidade, o fazemos, em larga medida, o nosso é um país dominado pelo crudelíssi- do quarto 54!!! É que todo mundo entra e sai do quarto e
hábito de dormir com as portas e destino. mo “liberalismo selvagem”! E é prós- ninguém me diz a nada... só queria saber se estava melhor!!!
janelas franqueadas era frequen- Há 30/40 anos atrás, Singapu- pero e civilizado.
tíssimo, e na Praia também, pelos ra era um país pobre. Hoje, é uma A liberdade é a chave da pros-
relatos que ouço dos mais velhos. nação culta, próspera e confiante. peridade

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