4 • Público • Sexta-feira 1 Junho 2007
Portugal
Debate mensal Sócrates anuncia medida para estudantes, professores e trabalhadores
Computador
portátil e
Internet para
meio milhão
Alunos de famílias com baixos
rendimentos terão equipamentos
gratuitos e acesso à Internet muito
abaixo dos preços de mercado
Lurdes Ferreira
a O Governo diz ter recuperado uma
antiga obrigação dos operadores de
telecomunicações, não cumprida,
para financiar a medida que o pri-
meiro-ministro anunciou ontem no
Parlamento: garantir a mais de meio
milhão de portugueses, entre estu-
dantes, professores e trabalhadores
em formação, o acesso a um com-
putador a preços baixos e o acesso
à Internet de banda larga a preços
“significativamente reduzidos” a
partir de Setembro próximo.
Com o licenciamento dos opera-
dores de comunicações móveis de
terceira geração, as entidades vence-
doras ficaram obrigadas a contribuir
para projectos ligados à sociedade da
informação, mas essa imposição “es-
tava praticamente esquecida e desa-
proveitada pelo Estado”, disse José
Sócrates, justificando a medida com
o facto de 57 por cento das famílias
portuguesas ainda não terem com-
putador ou não estarem ligados em
banda larga. O montante do fundo,
a ficar sob a tutela do Ministério das
Obras Públicas, Transportes e Co-
municações, deverá ser anunciado
em breve.
A mais nova medida do Plano
Tecnológico pretende atingir um
universo de 240 mil estudantes do
10º ano nos próximos três anos. Estes
terão acesso a um computador a um
preço reduzido ou gratuitamente e à
Internet de banda larga a tarifas mais
reduzidas do que as do mercado. O
critério será o rendimento do agre-
gado familiar.
De acordo com o primeiro-minis-
tro, haverá dois escalões que terão
acesso a computadores portáteis
gratuitos. Serão os alunos beneficiá-
rios da acção social escolar e os que,
não recorrendo a este mecanismo
de apoio, tenham agregados de bai-
xo rendimento. Os primeiros terão
acesso à banda larga pagando cinco
euros por mês durante três anos. Os
segundos pagarão uma mensalida-
de pelo acesso à Internet de 15 euros
também por três anos. Os restantes
alunos terão acesso a um portátil pelo
valor de 150 euros e acesso à Internet
por uma mensalidade cinco euros in-
DANIEL ROCHA
Computadores
“Impacto compensa
o risco” da medida
Esta medida é “uma grande
prova de confiança nos
portugueses e o seu impacto é
suficiente para poder compensar
algum risco que possa encerrar”,
respondeu o coordenador do
Plano Tecnológico, Carlos
Zorrinho, ao PÚBLICO, ao
ser questionado sobre os
mecanismos que previnam
eventuais abusos na atribuição
de computadores portáteis
gratuitos ou a preços reduzidos.
Através de um fundo financiado
pelos operadores de telemóveis,
os estudantes inscritos no
10º ano podem receber um
computador portátil gratuito,
se beneficiarem da acção social
escolar ou pertencerem a
famílias de baixos rendimentos.
E os computadores serão parte
do material escolar obrigatório.
Chefe do Governo diz que medida beneficiará 240 mil alunos em três anos
ferior ao preço de mercado, durante
três anos. Sócrates não se mostra aberto a acordo sobre novo aeroporto
No grupo dos professores, são Primeiro-ministro diz que Marques Mendes é “oportunista”
abrangidos todos os do ensino bási-
co e secundário. Pagarão 150 euros
pelo computador portátil com uma Primeiro, foi Marques Mendes sensibilizado José Sócrates. Portela; “há semanas atrás”, quis
mensalidade para acesso à Internet a fazer o repto. “Numa matéria Antes pelo contrário. O primeiro- novamente um novo aeroporto,
que o primeiro-ministro garante desta natureza é preciso consenso ministro voltou a rebater qualquer mas no Poceirão; e que, por fim,
será também cinco euros inferior técnico e político.” Sócrates outra possibilidade que não a “disse que devemos manter a
ao preço do mercado. Trata-se de permaneceu silencioso. Seguiu- construção da empreitada na Portela só porque há eleições em
uma opção para José Sócrates “pe- se Paulo Portas: “Foi o Presidente Ota. E o argumentário e o tom Lisboa”. “Andar sempre a saltitar
lo contributo que os professores quem pediu mais debate nesta usados terão extremado ainda é sinal claro de oportunismo
podem dar para a difusão e para o câmara.” Do primeiro-ministro mais as posições. Sobretudo político”, concluiu. O líder do PSD
sucesso de uma economia baseada nem uma palavra – nenhum nos diálogos com Marques negou que o seu partido tivesse
no conhecimento”. sinal de que o Governo poderá Mendes, o primeiro- uma posição definitiva sobre o
Para os trabalhadores em forma- vir a consultar os partidos ministro respondeu com assunto. O presidente do CDS-PP,
ção, inscritos no Programa Novas parlamentares sobre a palavras duras. Sócrates Paulo Portas, por sua vez, mostrou-
Oportunidades – actualmente conta localização do novo afirmou que, enquanto se inclinado para uma solução que
com 250 mil trabalhadores –, está aeroporto de Lisboa. membro do Governo de “maximize” o aeroporto da Portela
prevista a atribuição de um com- O apelo feito por Durão Barroso, Marques e que crie condições na base do
putador portátil pelo valor de 150 Cavaco Silva, Mendes defendeu a Montijo para receber voos low
euros, e a mensalidade para acesso para um acordo o localização na Ota e cost e charter. E quis saber qual
à Internet em banda larga, pelo perío- mais abrangente que, depois, como será o custo global da obra na Ota,
do de um ano, cinco euros abaixo do possível sobre líder da oposição, incluindo todas as infra-estruturas.
valor de mercado. Este grupo, disse o assunto, não bateu-se pela Nem Sócrates, nem Mário Lino
o primeiro-ministro, pode “desde já terá, assim, permanência na responderam. R.D.F.
beneficiar desta medida”.
P
46 • Público • Sexta-feira 1 Junho 2007

Público

N
Editorial
um dos vários índices sobre ontem gongoricamente anunciada pelo esforço, e o que o país necessita é de
Oferecer a competitividade dos primeiro-ministro de que vai oferecer premiar quem se esforça. Só se chegará
diferentes países, Portugal computadores portáteis e acesso à a algum lado criando condições para
computadores surge em 22.º lugar. Mas banda larga aos estudantes que se que os melhores progridam num

é um erro. como este índice é feito

a partir de outros índices, quando
E revela verificamos a sua decomposição
vemos que, no que diz respeito ao
populismo desenvolvimento tecnológico, Portugal
está em 20.º lugar. Isto é, melhor do
que a média dos outros índices. Qual
Será que dar o índice que puxa o país para baixo?
computadores como A situação macroeconómica e, em
quem distribui pães especial, o défice público. O que quer
é que vai provocar dizer que o nosso primeiro problema
o famoso “choque não é tecnologia.
tecnológico”? Não. Num outro índice construído por
outra organização, Portugal surge em
Mais depressa 34.º lugar. Contudo é 16.º quando se
chamará a atenção olha para os rankings dos serviços que
da ASAE para as feiras oferece na área da saúde e educação.
de beira de estrada... Vem para baixo por causa do peso
do Estado, da macroeconomia, pois
nesse ranking é 80.º. Ou seja, mesmo
admitindo que os índices estão mal
construídos, pelo menos o nosso
problema também não é falta de
investimento em educação.
Ora se não é por falta de investimento
na educação ou nas tecnologias
disponíveis que Portugal tem ficado
para trás nos últimos anos, isso apenas
reforça a convicção de que problema
esteve, está e estará na má gestão do
Estado. No desperdício público. No
muito que o Estado consome para
pouco oferecer qualidade. É por isso
um disparate sem nome a medida
inscreverem no 10.º ano. Os professores
também levam computadores, assim
como quem estiver no programa Novas
Oportunidades. Será dinheiro de outros
(as empresas de telecomunicações)
lançado à rua, sem garantias de
retorno.
Senão vejamos. O que se ganha com
essas ofertas? Nada ou quase nada.
Muitos computadores irão para casa
de quem já possui computador. Outros
para quem vale muito mais o dinheiro
que pode ganhar vendendo a dádiva
do que utilizando-a. O que sobra no
meio não justifica o que custa, pelo
que é bem provável que, tal como já
sucedeu em promoções que incluíam
oferta de tecnologia, os verdadeiros
beneficiários sejam os que operam os
contentores que rapidamente levarão
os equipamentos para fora do país
ou, então, os que os puserem à venda
numa feira de beira de estrada. Porquê?
Porque nenhum regime garantirá que
os beneficiários de tal programa o
utilizem para realmente progredir na
sua literacia tecnológica.
Má vontade? Desconfiança dos
portugueses? Não: apenas realismo
puro e duro. É que não é oferecendo
equipamentos que se consegue o
desenvolvimento sustentado, pelo
contrário. O que é oferecido tende a ser
desvalorizado, pois é obtido com pouco
ambiente de empreendedorismo e
concorrência. Com o Governo o mais
longe possível.
E se este se lamenta de muitos
lares não terem ainda computador e
poucos estarem ligados à Internet de
banda larga, devia era estar calado
e tratar de garantir, por exemplo,
que o preço de acesso à banda larga
diminuía para todos e não para uns
felizardos que nem a vão utilizar.
Como? Assegurando a concorrência
num mercado ainda protegido por este
Governo, tal como pelos anteriores
(o que inclui os do PSD-CDS). É aí que
está a chave do problema, não em o
Estado se substituir às escolhas dos
cidadãos, enfiando-lhes tecnologia
pela goela abaixo e, ao mesmo tempo,
penalizando as empresas que inovam.
Só que Sócrates vê o mundo de pernas
para o ar pois não concebe nada que
não seja ele a controlar, até para poder
oferecer como “bodo aos pobres” a este
triste país que nem repara no logro.
É por tudo isto e muito mais que não
cabe no curto espaço deste texto que este
é um disparate caro que, como medida,
como método de actuação e como
discurso populista, só tem um nome,
bem cunhado por Pacheco Pereira: é um
exemplar “momento Chávez” do pior de
Sócrates no seu apogeu.
José Manuel Fernandes

Cartas ao Director
Esclarecimento
do Expresso
Na edição de 29 de Maio do
PÚBLICO, em artigo assinado por
Vital Moreira, são feitas acusações
ao Expresso on-line que justificam
alguns esclarecimentos.
A partir da manipulação de
uma notícia publicada no site do
Expresso, Vital Moreira sente-se no
direito de opinar que o Expresso tem
uma posição contra a localização
do aeroporto na Ota e afirma que
procuramos manchetes “assassinas”
contra o projecto.
Nada, na notícia em causa, permite
tirar tais conclusões.
1) A afirmação de que “a Ota pode
afundar em caso de sismo” foi
proferida por “um alto quadro da
Autoridade Nacional de Protecção
Civil (ANPC), responsável pela
análise de riscos”, que foi
“conferencista no seminário sobre
protecção civil” realizado na
Escola Prática da GNR. A notícia
referia o nome da sua autora:
Maria Anderson, geóloga, que na
ocasião representava a ANPC. Vital
Moreira não pode por isso afirmar
que a origem da informação é
“alegadamente uma exposição de
uma técnica”. A mesma geóloga foi,
aliás, citada num despacho da Lusa,
sem que Vital Moreira visse nesse
facto qualquer intuito assassino.
2) Acusa-nos ainda Vital Moreira de
termos ignorado uma nota da ANPC
que considerava “abusiva” a notícia.
O Expresso só hoje (dia 30), e após
várias insistências, teve acesso a esse
“desmentido”, que, aliás, também
não foi divulgado pela Lusa. Maria
Anderson não nos fez qualquer
reparo e o gabinete de imprensa da
ANPC não contraria as afirmações
feitas no seminário. Na última
linha do comunicado afirma-se que
“parece abusiva a notícia publicada”
– única parte que Vital Moreira terá
lido –, pois o texto também refere
que no concelho de Alenquer o risco
de liquefacção “é médio”.
3) Numa interpretação muito
própria, Vital Moreira acusa-nos de
termos tentado transformar uma
discussão entre técnicos numa
questão política, ao termos titulado,
numa notícia posterior, “Governo
contraria ANPC”. Para sustentar
esta insinuação, o autor omite que o
antetítulo, a vermelho, dessa notícia
era “LNEC não considera que Ota
seja zona de alto risco”. A referência
ao Governo justifica-se por ter
sido um elemento do gabinete do
ministro das Obras Públicas que
contactou o Expresso para que
ouvíssemos sobre esta matéria o
presidente do LNEC. Tal sugestão
foi aceite. Basta consultar o dossier
disponibilizado em www.expresso.pt
para se verificar da independência
com que o Expresso tem tratado
todo este caso. Infelizmente, de Vital
Moreira, que se arvora em arauto
do combate à manipulação, não se
pode o mesmo dizer.
João Garcia
Subdirector do Expresso
Sócrates
e As 1001 Noites
Segundo nos dizem, Vladimir Putin
é “cinturão não sei quantos” de
“não sei quê” – um desportista,
portanto. Quer isso dizer que não
estamos livres de que, um dia, de
visita a Portugal, o Governo Civil
mande cortar o trânsito na Praça
do Comércio para ele dar umas
corridinhas – se tal for o seu capricho?
Não me palpita, pois o homem, pense-
se dele o que se pensar, aparenta
ter o senso das proporções e – por
maioria de razão – do ridículo. Não
parece, no entanto, ser esse o
caso de José Sócrates, que não se
importou nada que um dos locais
mais famosos do mundo (a Praça
Vermelha, de Moscovo) tivesse
esse bizarro tratamento para que ele
pudesse fazer o seu jogging matinal.
Ah, como tinham razão os autores
anónimos d’ As 1001 Noites quando
punham o califa Harun-al-Raschid
a disfarçar-se de mercador para,
circulando anonimamente nas ruas e
mercados do país, saber o que o povo
pensava de si! (...)
C. Medina Ribeiro
Lisboa
As ambulâncias
e a política de saúde
Quem anda na estrada decerto
já notou que a quantidade
de ambulâncias que por lá
circulam diariamente aumentou
consideravelmente desde que
este Governo decidiu optimizar
a política de saúde. Em alguns
troços, nomeadamente os que
ligam o interior do país ao litoral,
o aglomerado destes veículos é
completamente despropositado.
Visitei há pouco, em visita a um
amigo, uma urgência de um
hospital. Enquanto esperava, uma
ambulância de uma empresa privada
estacionava. A porta de trás abriu-se
para retirar o doente, um velho. O
interior, de cor imprecisa, estava sujo
e degradante, tal como o motorista
que era ao mesmo tempo camareiro
e sei lá mais o quê. Retirou o doente
da carrinha (ambulância), sem farda,
vociferando ao mesmo tempo umas
vergonhosas calinadas gramaticais. O
velho – o doente – nada dizia: ouvia.
Só espero que não tenham sido essas
as últimas palavras que ouviu.
J. Ricardo
Torre de Moncorvo
O PÚBLICO errou
No texto de Ana Vaz Milheiro sobre
a trienal de arquitectura publicado
ontem no P2 é referido erradamente
que as fotografias da Torre de Burgo
(projecto de Eduardo Souto Moura)
são de Fernando Guerra. De facto, o
seu autor é Luís Ferreira Alves.
E na reportagem “Há dirigentes que
estão 14, 15 e mais horas a trabalhar”,
publicada na edição de 30 de
Maio, o dirigente sindical Arménio
Carlos, coordenador da União dos
Sindicatos de Lisboa, foi erradamente
identificado como Arménio Santos.
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