De origem campesina, filósofo de formação, chegou a docente na
École de Sociologie du Collège de France, instituição que o consagrou como um dos maiores intelectuais de seu tempo. Desenvolveu, ao longo de sua vida, mais de 300 trabalhos abordando a questão da dominação e é, sem dúvida, um dos autores mais lidos, em todo o mundo, nos campos da Antropologia e Sociologia, cuja contribuição alcança as mais variadas áreas do conhecimento humano, discutindo em sua obra temas como educação, cultura, literatura, arte, mídia, lingüística e política. Também escreveu muito analisando a própria Sociologia enquanto disciplina e prática. A sociedade cabila, na Argélia, foi o palco de suas primeiras pesquisas. Seu primeiro livro, Sociologia da Argélia (1958), discute a organização social da sociedade cabila, e em particular, como o sistema colonial interferiu na sociedade cabila, em suas estruturas e desculturação. Dirigiu, por muitos anos, a revista "Actes de la recherche en sciences sociales" e presidiu o CISIA (Comitê Internacional de Apoio aos Intelectuais Argelinos), sempre se posicionado clara e lucidamente contra o liberalismo e a globalização. Sua discussão sociológica centralizou-se, ao longo de sua obra, na tarefa de desvendar os mecanismos da reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação. Para empreender esta tarefa, Bourdieu desenvolve conceitos específicos, retirando os fatores econômicos do epicentro das análises da sociedade, a partir de um conceito concebido por ele como violência simbólica, no qual Bourdieu advoga acerca da não arbitrariedade da produção simbólica na vida social, advertindo para seu caráter efetivamente legitimador das forças dominantes, que expressam por meio delas seus gostos de classe e estilos de vida, gerando o que ele pretende ser uma distinção social. Biografia Nascido numa família campesina, ingressa em 1951 na Faculdade de Letras, em Paris, na Escola Normal Superior e em 1954 gradua-se em Filosofia, assumindo a função de professor em Moulins. Após prestar serviço militar na Argélia, assume, em 1958 o cargo de professor assistente na Faculdade de Letras em Argel, quando inicia sua pesquisa acerca da sociedadecabila.Em 1960 torna-se assistente de Raymond Aron, na Faculdade de Letras de Paris e principia seus estudos acerca do celibato na região de Béarn. Ainda em 1960 integra-se ao Centro de Sociologia Européia, do qual torna-se secretário geral em 1962. Desenvolve ao longo das décadas de 1960 a 1980 farta obra, contribuindo significativamente para a formação do pensamento sociológico do século XX. Na década de 1970 estende sua atividade docente a importantes instituições estrangeiras, como as universidades de Harvard e Chicago e o Instituto Max Planck de Berlim. Em 1982 ministra sua aula inaugural ( Lições de Aula) no Collège de France (instituição que três anos mais tarde se associa ao Centro de Sociologia Européia), propondo uma "Sociologia da Sociologia", constituída de um olhar crítico sobre a formação do sociólogo como censor e detentor de um discurso de verdade sobre o mundo social. Neste sentindo, esta aula inaugural encontra-se com a ministrada por Barthes (A aula) e Foucault (A Ordem do Discurso), privilegiando a discussão acerca do saber acadêmico. É consagrado Doutor 'honoris causa' das universidades Livre de Berlim (1989), Johann-Wolfgang-Goethe de Frankfurt (1996) e Atenas (1996). Morre em Paris, em 23 de janeiro de 2002, depois de finalizar um curso acerca de sua própria produção acadêmica, que servirá de fundamento ao seu último livro, Esboço de auto-análise. Teoria Social Na agenda teórica proposta à Teoria Sociológica contemporânea, alguns elementos merecem destaque: a releitura dos clássicos, a construção de conceitos e a postura crítica do intelectual diante de uma tomada de posicionamento político, elementos estes amalgamados em sua discussão sociológica. Ao compor, por exemplo a idéia de campo, Bourdieu dialoga com a idéia de esferas, proposta por Max Weber e, ainda, com o conceito de classe social de Marx.Construtivismo estruturalista ou estruturalismo construtivista. Bourdieu, permitindo ter seu pensamento rotulado, adota como nomenclatura o construtivismo estruturalista ou estruturalismo construtivista. Esta postura consiste em admitir que existe no mundo social estruturas objetivas que podem dirigir, ou melhor, coagir a ação e a representação dos indivíduos, dos chamados agentes. No entanto, tais estruturas são construídas socialmente assim como os esquemas de ação e pensamento, chamados por Bourdieu de habitus. Bourdieu tenta fugir da dicotomia subjetivismo/objetivismo dentro das ciências humanas. Rejeita tanto trabalhar no âmbito do fisicalismo, considerando o social enquanto fatos objetivos, como no do psicologismo, o que seria a "explicação das explicações". O momento objetivo e subjetivo das relações sociais estão numa relação dialética. Existem realmente as estruturas objetivas que coagem as representações e ações dos agentes, mas estes, por sua vez, na sua cotidianidade, podem transformar ou conservar tais estruturas, ou almejar a tanto. A verdade da interação nunca está totalmente expressa na maneira como ela se nos aprensenta imediatamente. Uma das mais importantes questões na obra de Bourdieu se centraliza na análise de como os agentes incorporam a estrutura social, ao mesmo tempo que a produzem, legitimam e reproduzem. Neste sentido se pode afirmar que ele dialoga com o Estruturalismo, ao mesmo tempo que pensa em que espécie de autonomia os agentes detêm. Bourdieu, então, se propõe a superar tanto o objetivismo estruturalista quanto o subjetivismo interacionista (fenomenológico, semiótico). O pesquisador da desigualdade em sala de aula
Embora a maioria dos grandes pensadores da Educação tenha
desenvolvido suas teorias com base numa visão crítica da escola, só na segunda metade do século 20 surgiram questionamentos bem fundamentados sobre a neutralidade da instituição. Até então, a instrução era vista como um meio de elevação cultural que se encontrava mais ou menos à parte das tensões sociais. O francês Pierre Bourdieu (1930- 2002) empreendeu uma investigação sociológica do conhecimento que detectou, na circulação dos bens culturais e simbólicos, um jogo de dominação e reprodução de valores. Outros pensadores, como o francês Michel Foucault (1926-1984) e a argentina Emilia Ferreiro, fizeram análises semelhantes. Todos exerceram influência nos ambientes pedagógicos entre as décadas de 1970 e 1980. "Depois disso, as teorias de reprodução de Bourdieu foram criticadas por exagerar a visão pessimista sobre a escola", diz Cláudio Martins Nogueira, da Universidade Federal de Minas Gerais. "Vários autores passaram a mostrar que nem sempre as desigualdades sociais se reproduzem completamente na sala de aula." Na essência, contudo, as conclusões de Bourdieu não foram contestadas. Na mesma época em que as restrições a sua obra acadêmica se tornaram mais freqüentes, a figura pública do sociólogo ganhou notoriedade pelas críticas à mídia, aos governos de esquerda da Europa e à globalização (leia o quadro nesta página). Ele costuma ser incluído na tradição francesa do intelectual público e combativo, a exemplo do escritor Émile Zola (1840-1902) e do filósofo Jean Paul Sartre (1905-1980). Mesmo em seu trabalho de circulação mais restrita, Bourdieu foi um caso raro de cientista social que, durante toda a carreira, conciliou pesquisa de campo e reflexão teórica - ele via na atividade intelectual um terreno de luta contra o que considerava injusto.
Para Bourdieu, a escola é um espaço de reprodução de estruturas
sociais e de transferência de capitais de uma geração para outra. É nela que o legado econômico da família transforma-se em capital cultural. E este, segundo o sociólogo, está diretamente relacionado ao desempenho dos alunos na sala de aula. Eles tendem a ser julgados pela quantidade e pela qualidade do conhecimento que já trazem de casa, assim como por várias heranças, como a postura corporal e a habilidade de falar em público. "Só os alunos oriundos das camadas superiores da sociedade têm como responder às expectativas do sistema de ensino", diz Cláudio Martins Nogueira. A escola costuma considerar essas características como naturais nos alunos das classes mais altas, assim como costuma ver nas crianças menos privilegiadas economicamente um desafio. Pior que isso, os próprios estudantes mais pobres acabam encarando a trajetória dos bem-sucedidos como resultante de um esforço recompensado. Nesse contexto, a avaliação escolar funciona como um julgamento moral e estético, além de exercer uma triagem social.
Uma amostra dos mecanismos de reprodução de desigualdade está
no fato, facilmente verificável, de que a frustração com o fracasso escolar leva muitos alunos e suas famílias a investir menos esforços no aprendizado formal, desenhando um círculo que se auto-alimenta. Ao mesmo tempo, quanto maior o acesso a um certo grau de ensino, menos ele é valorizado como capital cultural. Nos primeiros livros, Bourdieu previa a possibilidade de superar essa situação se as escolas deixassem de supor o que os alunos trazem de casa e partissem do zero, "ensinando a todos as referências e habilidades necessárias para um bom desempenho", segundo Nogueira. No entanto, o pessimismo foi crescendo na obra do sociólogo: a competição escolar passou a ser vista como inevitável e forçosamente injusta.