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Células procarióticas

O modelo de célula procariótica é o que nos é apresentado pelos organismos mais


primitivos, como as bactérias, por exemplo. Foi esse modelo celular que
protagonizou a evolução bioquímica que acabámos de resumir no capítulo anterior
e que, morfológica e fisiologicamente, poucas alterações deve ter sofrido desde os
primórdios da biosfera.

Estrutura da célula procariótica

Não é nosso objectivo determo-nos na biologia dos organismos procariontes.


Assim, seria fastidioso e sem sentido, no contexto desta obra, a exposição
detalhada dos diversos tipos de células procarióticas. Recorreremos a uma
síntese, traduzida no esquema de uma hipotética bactéria que reunisse em si
todos os atributos de todas as bactérias (fig. 4.1).

Fig. 4.1- Esquema de uma bactéria hipotética

A principal característica comum a todas as células procarióticas é não terem


núcleo: o seu cromossoma não está encerrado num espaço delimitado, como
acontece em muitas outras células.

Todas estas células possuem uma membrana plasmática. É ela que delimita o
espaço vital e lhe confere individualidade. Habitualmente, a membrana é revestida
externamente por uma parede celular de composição química complexa. Deste
modo, a célula encontra-se encerrada num estojo que lhe confere a forma e a
protege contra o rebentamento induzido por uma elevada pressão osmótica. Entre
a membrana e a parede subsiste por vezes um espaço periplasmático, onde
residem enzimas hidrolíticos (exoenzimas), destinados a intervir em processos de
digestão extracelular. Algumas bactérias possuem ainda uma cápsula
polissacarídica, externa à parede.

Parede celular

A composição e a estrutura da parede celular determina o comportamento da


célula face a um dos métodos de coloração utilizado em bacteriologia: a coloração
de Gram. Distinguem-se deste modo dois grupos principais de paredes celulares:
a parede das bactérias gram-positivas, a parede das bactérias gram-negativas.

As bactérias gram-positivas (que se deixam corar pela coloração de Gram)


possuem uma parede espessa e homogénea, ligada e encostada directamente à
face externa da membrana plasmática. Nestes casos, não existe espaço
periplasmático. A parede é composta por um complexo mucoso formado
essencialmente por um polímero de malha tridimensional, cujo monómero é o
peptidoglicano (fig. 4.2). Consoante a espessura da parede, assim esta será
diferentemente permeável a moléculas.

Pelo contrário, a parede das bactérias gram-negativas é formada por dois folhetos:
o folheto interno, constituído por uma delgada camada de mucocomplexo não
encostado à membrana plasmática; o folheto externo, também designado por
membrana externa dada a sua estrutura ser semelhante à de uma membrana
unitária (fig.4.2). A coesão entre os dois folhetos estabelece-se através de
lipoproteínas integradas no folheto externo e ligadas por ligações covalentes a
peptidoglicanos. No folheto externo existem ainda canais proteicos através dos
quais passa a água e diversos metabolitos.

Alguns antibióticos, como a penicila e a cefalosporina, interferem com a síntese da


camada de peptidoglicano. Incapazes de produzir a parede celular, as células
tornam-se assim vulneráveis à pressão osmótica.

A lisozima é um enzima que se encontra nas secreções nasais e na clara dos ovos
e que corta especificamente as ligações entre o ácido acetilmurâmico e a
acetilglucosamina do peptidoglicano. Desintegrando-se a parede, a bactéria não
poderá resistir á pressão osmótica.

A diferença de comportamento das duas paredes relativamente à coloração de


Gram reside essencialmente na técnica de coloração utilizada e não na afinidade
das duas paredes para o corante. Com efeito, ambas as paredes são coradas pelo
corante de Gram (violeta de genciana e lugol). Contudo, no final, as células são
lavadas com um solvente não polar (acetona ou álcool), que dissolve e elimina a
membrana externa, quando existe. Se bem que a parede mucossacarídica
subsistente seja suficientemente rígida para garantir a integridade da célula, pela
sua espessura delgada, ela não retém suficientemente o corante. Pelo contrário,
as bactérias Gram positivas retêm o corante nas suas espessas paredes.

Cápsula
Muitas bactérias fabricam e exportam moléculas de polímeros que aderem
externamente à parede celular e formam uma cápsula. Por vezes a espessura da
cápsula ultrapassa a própria espessura da célula. Esses polímeros são
geralmente polissacáridos que ajudam as bactérias a aderirem a superfícies, como
certas bactérias que contribuem para as cáries dentárias, ou a evitar serem
fagocitadas pelos glóbulos brancos, como algumas que causam doenças
infecciosas, como certos pneumococus.

Nucleoide

Todas as bactérias possuem uma zona geralmente central, o nucleóide, onde se


localiza um único cromossoma, constituído por uma molécula circular e bicatenária
de DNA, relativamente longa, mas enovelada. Em Escherichia coli, por exemplo, a
célula mede 2 por 6  m e o anel de DNA, se estivesse todo desenovelado, teria
um perímetro de 1.400  m ! A análise química do nucleóide revela a presença,
para além de DNA, de RNA e de proteínas.

Algumas bactérias possuem ainda pequenas moléculas circulares de DNA, os


plasmídeos, com autonomia de replicação independente do cromossoma.

O citoplasma das células procarióticas apresenta raramente estruturas


membranares internas. Aquelas que existem resultam de extensões da membrana
plasmática, adaptadas às funções específicas de fotossíntese ou respiração. São:

o Os tilacóides lamelares das cianobactérias, onde se localizam


alguns dos pigmentos fotossintéticos utilizados por estas bactérias;
o As lamelas fotossintéticas das bactéria púrpura (ou roxas), onde se
situam as bacterioclorofilas a e b;
o As lamelas respiratórias, nas bactéria nitrificantes, onde se
localizam possivelmente os complexos enzimáticos da fosforilação
oxidativa.

O citoplasma destas células pode apresentar alguns organitos:

o Os ribossomas são os organitos onde se realiza a síntese proteica


e encontram-se em todas as bactérias. O diâmetro é de cerca de
15nm. São formados por RNA e proteínas e constituídos por duas
sub-unidades caracterizadas por diferentes velocidades de
sedimentação expressas em unidades de Svedberg (S): 50S e 30S;
o Os clorossomas são pequenas vesículas elípticas, presentes nas
bactérias verdes. São organitos onde se localizam pigmentos
fotossintéticos e, se bem que estejam ligados à membrana
plasmática, não estabelecem nenhuma continuidade com ela;
o Os ficobilissomas ou cianossomas são corpúsculos das
cianobactérias, onde se localizam pigmentos fotossintéticos do grupo
das ficobilinas;
o Os vacúolos de gás são organitos de flutuação, presentes em
muitas bactérias fotossintéticas. São formados pela aglutinação de
inúmeras vesículas gasosas tubulares, de paredes proteicas.

Nas bactérias encontra-se ainda uma relativa variedade de inclusões, tais como:

o Grãos de glicogénio ou grãos de poli- -hidroxibutirato, que


constituem reservas de carbono;
o Grãos de cianoficina, próprios das cianobactérias, que constituem
reservas de azoto sob a forma de aminoácidos, arginina e
asparagina;
o Carboxissomas, presentes em muitas cianobactérias e bactérias
nitrificantes e que são reservatórios da enzima ribulose-1,5-difosfato
carboxilase, específica do mecanismo bioquímico de fixação do CO 2.
o Magnetossomas, presentes em bactérias aquáticas, e que
proporcionam orientação no campo magnético terrestre. São
partículas de magnetite (Fe3O4), de 40 a 100 nm, limitadas por uma
membrana.

Algumas bactérias possuem um ou mais flagelos, constituídos por um único


microtúbulo proteico e oco, com cerca de 20 nm de diâmetro, suportado por um
corpo basal, complexo. As espiroquetas (bactérias vermiformes) possuem um
conjunto vasto de flagelos enrolados externa e helicoidalmente em volta da célula,
denominados flagelos periplasmáticos.

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